as agremiações partidárias a contribuir para as campanhas de outros partidos e, por conseguinte, de candidatos dessas outras legendas. 7. Interpretação que se afigura razoável em virtude da natureza pública dos recursos do Fundo Partidário, os quais são distribuídos aos partidos para o financiamento da própria atividade partidária e com base nos critérios estabelecidos no § 3º do art. 17 da Constituição, vinculados ao número de votos válidos obtidos pela grei nas eleições para a Câmara dos Deputados ou ao número de deputados federais eleitos pela legenda. 8. A irregularidade constatada atrai a incidência da regra prevista no art. 33, § 2º, da Res.-TSE 23.553, a qual determina que o donatário devolva ao doador os recursos recebidos de fonte vedada. 9. O pedido recursal de que, em atenção aos princípios da segurança jurídica e da anualidade eleitoral, o entendimento adotado na solução do presente caso seja aplicado apenas em feitos de eleição futura não merece acolhimento, pois não há falar em mudança de jurisprudência na espécie. A questão controvertida é analisada pela primeira vez por este Tribunal Superior, tanto que o recorrente não apontou nenhum aresto desta Corte que tenha examinado a matéria e decidido em sentido diverso. CONCLUSÃO Recurso especial a que se nega provimento. RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS: Senhor(a) Presidente, José Tupinambá Pereira de Sousa interpôs recurso especial (ID 5414438) em face de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá (ID 5414088) que, por unanimidade, desaprovou as suas contas de campanha referentes às Eleições de 2018, nas quais concorreu ao cargo de deputado estadual, e determinou a devolução ao doador da quantia de R$ 25.000,00, referente a recursos financeiros oriundos de fonte vedada, nos termos do art. 33, I e § 2º, da Res.-TSE 23.553. Eis a ementa do acórdão recorrido (ID 5414088): ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. RESOLUÇÃO TSE Nº 23.553/2017. DOAÇÃO DE PARTIDO POLÍTICO QUE NÃO COMPÔS A COLIGAÇÃO. FONTE VEDADA. ART. 33. INC. I. RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DEVOLUÇÃO AO DOADOR. ART. 33, § 2º. PRECEDENTES TRE/AP. DESAPROVAÇÃO. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 251
1. A doação de recursos do Fundo Partidário recebida de Partido Político que não compôs a Coligação, constitui doação de fonte vedada, na forma do art. 33, inc. I da Resolução TSE nº 23.553/2017, configurando irregularidade grave, impondo ser devolvida aquela ilegal doação ao doador, consoante dispõe o § 2º do mesmo artigo. Precedentes TRE/AP. 2. Prestação de contas desaprovada. O recorrente alega, em suma, que: a) houve afronta ao art. 33, I, da Res.-TSE 23.553, pois não há ilegalidade no recebimento de doação proveniente de partidos políticos, os quais não podem ser tidos como pessoas jurídicas proibidas de doar valores para campanha eleitoral; b) o acórdão recorrido negou vigência ao art. 31, II, da Lei 9.096/95 ao entender que a doação recebida diretamente da conta do Fundo Partidário de outro partido político configuraria recursos oriundos de fonte vedada, uma vez que tal liberalidade obedece ao disposto no art. 38 da citada lei e que não existe proibição expressa de que as agremiações doem valores provenientes do Fundo Partidário para candidatos de diferentes partidos ou coligações; c) o art. 24 da Lei 9.504/97 não veda a doação de partidos políticos para candidatos; d) a interpretação adotada pela Corte de origem, na espécie, ofende os princípios da segurança jurídica e da anualidade eleitoral; e) as normas restritivas de direitos devem ser interpretadas de forma restritiva; f) o recurso não demanda o reexame de matéria fática, mas, sim, o reenquadramento jurídico dos fatos constantes da moldura do acórdão regional. Requer o conhecimento e o provimento do recurso especial, a fim de que seja reformado o acórdão recorrido para aprovar as contas. Caso assim não se entenda, pugna pelo reconhecimento da licitude da doação efetuada e, sucessivamente, que o entendimento adotado seja aplicado apenas a feitos de eleição futura, aprovando-se as contas sob análise. O Ministério Público Eleitoral apresentou contrarrazões (ID 5414838), nas quais pugna pelo parcial conhecimento do recurso especial e pelo seu não provimento. 252 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
A douta Procuradoria-Geral Eleitoral, no parecer ofertado nos autos (ID 11575338), manifestou-se pelo parcial provimento do recurso especial. Os autos foram redistribuídos à minha relatoria, em razão do término do biênio do Ministro Admar Gonzaga. É o relatório. VOTO O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Senhor(a) Presidente, o recurso especial é tempestivo. O acórdão recorrido foi publicado em sessão no dia 10.12.2018, segunda-feira, e o apelo foi interposto em 13.12.2018 (ID 5414438), quinta-feira, em petição assinada eletronicamente por advogado habilitado nos autos (ID 5413988). No caso, o Tribunal de origem desaprovou as contas de campanha do recorrente por entender que “a doação de recursos do Fundo Partidário recebida de partido político que não compôs a coligação constitui doação de fonte vedada [...] e irregularidade grave” (ID 5414088), impondo-se a devolução da quantia ao doador. Destaco o teor do acórdão recorrido (ID 5414088): No caso em análise, conforme evidenciado no Parecer conclusivo do Órgão de Controle, assim como no Parecer do Ministério Público Eleitoral, o candidato recebeu a quantia de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), relativa a recursos do Fundo Partidário doados pela Direção Nacional do Partido da República – PR, o que, conforme o entendimento sedimentado neste Regional, constitui recebimento de recursos de fonte vedada, na forma do art. 33, inc. I da Resolução TSE nº 23.553/2017. Confiram-se os acórdãos de minha relatoria: “AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA DE AIJE. DOAÇÃO DE PARTIDO À CANDIDATA DE OUTRO PARTIDO ADVERSÁRIO NÃO PERTENCENTE À MESMA COLIGAÇÃO. CRITÉRIOS DE DIVISÃO DOS RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 17, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 44, INC. III, DA LEI Nº 9.096/1995. NÃO ENQUADRAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. SUBVERSÃO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DO FUNDO PARTIDÁRIO. LIMINAR DEFERIDA PARA BLOQUEIO DO VALOR DOADO. CONFIGURAÇÃO DE DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, INC. II, DA LEI Nº 9.096/1995. ART. 33, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.553/2017. CAUTELAR PROCEDENTE. DECISÃO LIMINAR DE TUTELA PROVISÓRIA CONFIRMADA. AGRAVOS PREJUDICADOS. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 253
1. De acordo com as regras constitucionais dispostas no art. 17, § 3º, da Constituição da República, somente terão direito a recursos do Fundo Partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas, ou tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação. 2. Partindo dessas regras constitucionais de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e mediante a interpretação teleológica do art. 44, inc. III, da Lei nº 9.096/1995, infere-se que a finalidade da norma é permitir aos Partidos Políticos que apliquem recursos do Fundo Partidário nas campanhas eleitorais de seus próprios candidatos ou de candidatos de Partidos aliados por coligação. 3. Permitir-se a livre doação de Partido Político a candidato não filiado à Agremiação doadora e que sequer faz parte de Partido que compõe Coligação com o Partido doador, subverte o sistema constitucional de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e, por isso, configura doação de fonte vedada (pessoa jurídica), por força do disposto no art. 31, inc. II, da Lei nº 9.096/1995 e do art. 33, inc. I, da Resolução TSE nº 23.553/2017. 4. Nesses casos, a moralidade da campanha eleitoral deve ser preservada com a devolução da doação ilegal, na forma do art. 33, § 2º, da Resolução TSE nº 23.553/2017, evitando- se, assim, a indevida vantagem econômica frente aos demais candidatos. 5. Confirmação da liminar que determinou o bloqueio do valor doado. 6. Ação procedente. Agravos Regimentais prejudicados.” (TRE-AP. AC nº 0600937-41.2018.6.03.0000. Julg. de 04.10.2018. Rel. Juíza Sueli Pini. DJe de 08/10/2018 ). “AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA DE REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. DOAÇÃO DE PARTIDO À CANDIDATA DE OUTRO PARTIDO ADVERSÁRIO NÃO PERTENCENTE À MESMA COLIGAÇÃO. CRITÉRIOS DE DIVISÃO DOS RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 17, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 44, INC. III, DA LEI Nº 9.096/1995. NÃO ENQUADRAMENTO. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA. SUBVERSÃO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO CONSTITUCIONAL DO FUNDO PARTIDÁRIO. LIMINAR DEFERIDA PARA BLOQUEIO 254 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
DO VALOR DOADO. CONFIGURAÇÃO DE DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, INC. II, DA LEI Nº 9.096/1995. ART. 33, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.553/2017. CAUTELAR PROCEDENTE. DECISÃO LIMINAR DE TUTELA PROVISÓRIA CONFIRMADA. AGRAVOS PREJUDICADOS. 1. De acordo com as regras constitucionais dispostas no art. 17, § 3º, da Constituição da República, somente terão direito a recursos do Fundo Partidário e acesso gratuito ao rádio e à televisão, na forma da lei, os partidos políticos que obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados, no mínimo, 3% (três por cento) dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 2% (dois por cento) dos votos válidos em cada uma delas, ou tiverem elegido pelo menos quinze Deputados Federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da Federação. 2. Partindo dessas regras constitucionais de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e mediante a interpretação teleológica do art. 44, inc. III, da Lei nº 9.096/1995, infere-se que a finalidade da norma é permitir aos Partidos Políticos que apliquem recursos do Fundo Partidário nas campanhas eleitorais de seus próprios candidatos ou de candidatos de Partidos aliados por coligação. 3. O dinheiro que compõe o Fundo Partidário, então advindo de multas pecuniárias, recursos financeiros destinados em lei, dotações orçamentárias e doações de pessoas físicas ou jurídicas, tem natureza jurídica de verba pública por excelência, devendo seu uso obedecer rigorosa liturgia emoldurada pelos caros princípios da supremacia do interesse público da moralidade, da eficiência e claro, da legalidade. 4. Permitir-se a livre doação de Partido Político a candidato não filiado à Agremiação doadora e que sequer faz parte de Partido que compõe Coligação com o Partido doador, subverte o sistema constitucional de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e, por isso, configura doação de fonte vedada (pessoa jurídica), por força do disposto no art. 31, inc. II, da Lei nº 9.096/1995 e do art. 33, inc. I, da Resolução TSE nº 23.553/2017. 5. Nesses casos, a moralidade da campanha eleitoral deve ser preservada com a devolução da doação ilegal, na forma do art. 33, § 2º, da Resolução TSE nº 23.553/2017, evitando- se, assim, a indevida vantagem econômica frente aos demais candidatos. 6. Confirmação da tutela liminar que determinou o bloqueio do valor doado. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 255
7. Ação Cautelar procedente. Agravos Regimentais prejudicados.” (TRE-AP. AC nº 0601544-54.2018.6.03.0000. Julg. de 06.10.2018. Rel. Juíza Sueli Pini. DJe de 09/10/2018). “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO CAUTELAR. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. DOAÇÃO. FONTE VEDADA. PESSOA JURÍDICA. DEVOLUÇÃO DOS RECURSOS. PROVIDÊNCIA NATURAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 24, § 4º, DA LEI Nº 9.504/1997 E ART. 33, § 2º, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.553/2017. NÃO CONHECIMENTO. 1. Reconhecida a doação de fonte vedada (Pessoa Jurídica), a devolução ao donatário é providência lógica e sequencial decorrente, prevista no art. 24, § 4º, da Lei nº 9.504/1997 e art. 33, § 2º, da Resolução TSE nº 23.553/2017. Preliminar de nulidade por julgamento extra petita rejeitada. 2. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, mormente quando já tenha encontrado fundamentação suficiente para proferir a decisão, sendo que deverá enfrentar apenas as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida. Precedentes. 3. Embargos não conhecidos.” (TRE-AP. EDcl. Na AC nº 0601544-54.2018.6.03.0000. Julg. de 26.10.2018. Rel. Juíza Sueli Pini. DJe de 30/10/2018). Sendo assim, na linha do entendimento dessa Corte Regional e dos Pareceres do Controle Interno e do Ministério Público Eleitoral, a doação recebida pelo candidato do Partido da República, constitui doação de fonte vedada, configurando irregularidade grave a ensejar a desaprovação da prestação de contas, na forma do art. 77, inc. III, da Resolução TSE nº 23.553/2017, que dispõe, in verbis: “Art. 77. Apresentado o parecer do Ministério Público e observado o disposto no parágrafo único do art. 76 desta resolução, a Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas, decidindo (Lei nº 9.504/1997, art. 30, caput): [...] II – pela desaprovação quando constatadas falhas que comprometam sua regularidade;” Quanto ao pedido do Ministério Público Eleitoral no sentido de que os recursos sejam devolvidos ao erário, consultei a Resolução de regência e constatei que há previsão de devolução ao doador (art. 33, § 2º), razão pela qual entendo que é a medida a ser adotada, até porque a Agremiação doadora prestará contas junto à Justiça Eleitoral. Ante o exposto, o voto é pela DESAPROVAÇÃO das contas de campanha apresentadas por JOSÉ TUPINAMBÁ PEREIRA DE SOUSA, que pleiteou 256 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
o cargo de deputado estadual nas Eleições 2018, nos termos do art. 77, inc. III, da Resolução TSE nº 23.553/2017. No mais, o candidato deverá devolver ao doador os recursos recebidos de fonte vedada, no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), na forma do art. 33, § 2º da Resolução TSE nº 23.553/2017. Vê-se, portanto, que a Corte de origem desaprovou as contas de campanha do recorrente por entender configurada a captação de recursos provenientes de fonte vedada, nos termos do art. 33, I, da Res.-TSE 23.553, em virtude do recebimento de doação com recursos do Fundo Partidário, no valor de R$ 25.000,00, realizada pelo órgão nacional do Partido da República (PR), o qual não estava coligado com a agremiação pela qual o candidato concorreu ao pleito estadual. O recorrente alega ofensa aos arts. 31, II, da Lei 9.096/95 e 33, I, da Res.-TSE 23.553, sob o argumento de que não ocorreu o recebimento de recursos provenientes de fonte vedada, tendo em vista não haver proibição legal de que partidos políticos realizem doações para a campanha eleitoral e porque as agremiações partidárias não seriam proibidas de doar recursos oriundos do Fundo Partidário a candidatos de outros partidos ou coligações. Defende que as normas restritivas de direito devem ser interpretadas de forma estrita e que a orientação adotada pela Corte de origem ofendeu os princípios da segurança jurídica e da anualidade eleitoral. É cediço que os recursos oriundos do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) são públicos e têm a sua aplicação vinculada ao disposto no art. 44 da Lei 9.096/95, devendo todo e qualquer gasto ser voltado à própria atividade partidária e comprovada a sua vinculação. Nesse sentido, já se decidiu que “o dispêndio do dinheiro público pelo partido político, recebido por meio de recursos do Fundo Partidário, submete-se ao rol taxativo estabelecido no art. 44 da Lei nº 9.096/95, devendo todo e qualquer gasto ser voltado para a própria atividade partidária e comprovada sempre a sua vinculação” (PC 247-55, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 1º.3.2018). Destaco o teor do art. 44 da Lei 9.096/95, na parte que interessa ao deslinde da controvérsia estabelecida no presente feito: Art. 44. Os recursos oriundos do Fundo Partidário serão aplicados: I – na manutenção das sedes e serviços do partido, permitido o pagamento de pessoal, a qualquer título, observado, do total recebido, os seguintes limites: 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 257
a) 50% (cinquenta por cento) para o órgão nacional; b) 60% (sessenta por cento) para cada órgão estadual e municipal; II – na propaganda doutrinária e política; III – no alistamento e campanhas eleitorais; IV – na criação e manutenção de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política, sendo esta aplicação de, no mínimo, vinte por cento do total recebido. V – na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, criados e mantidos pela secretaria da mulher do respectivo partido político ou, inexistindo a secretaria, pelo instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política de que trata o inciso IV, conforme percentual que será fixado pelo órgão nacional de direção partidária, observado o mínimo de 5% (cinco por cento) do total; VI – no pagamento de mensalidades, anuidades e congêneres devidos a organismos partidários internacionais que se destinem ao apoio à pesquisa, ao estudo e à doutrinação política, aos quais seja o partido político regularmente filiado; VII – no pagamento de despesas com alimentação, incluindo restaurantes e lanchonetes. [...] (Grifo nosso.) Infere-se do dispositivo legal acima transcrito que, nos termos da legislação partidária, é facultada ao partido político a utilização de recursos oriundos do Fundo Partidário em campanhas eleitorais, além de outras destinações nele previstas. Todavia, a norma em referência não especifica, de forma expressa, se tal destinação estaria limitada ao apoio aos candidatos próprios da legenda ou se abrangeria candidaturas promovidas por outras agremiações. Também o art. 21, caput, da Res.-TSE 23.553, que dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos e sobre a prestação de contas nas Eleições de 2018, estabelece que “os partidos políticos podem aplicar nas campanhas eleitorais os recursos do Fundo Partidário, inclusive aqueles recebidos em exercícios anteriores”, sem expressamente limitar tal aplicação às candidaturas próprias da agremiação. Por sua vez, o art. 17 da Res.-TSE 23.553 prevê a possibilidade de serem destinados às campanhas eleitorais recursos oriundos de doações de outros partidos políticos e de outros candidatos (inciso III), assim como valores próprios dos partidos políticos, inclusive os provenientes do Fundo Partidário (inciso V, a), in verbis: Art. 17. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos, somente são admitidos quando provenientes de: 258 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
[...] III – doações de outros partidos políticos e de outros candidatos; [...] V – recursos próprios dos partidos políticos, desde que identificada a sua origem e que sejam provenientes: a) do Fundo Partidário, de que trata o art. 38 da Lei nº 9.096/1995; [...] De acordo com a doutrina de José Jairo Gomes, “a permissão de doação para campanha eleitoral entre partidos atende aos interesses das coligações. Isso porque a possibilidade de os partidos coligados doarem entre si contribui para o fortalecimento do consórcio em disputa” (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 427). Todavia, o caso dos autos guarda a particularidade de que não se trata de doação efetuada por partido político para candidato de agremiação com ele coligada, mas, sim, de liberalidade realizada com recursos do Fundo Partidário por órgão nacional de partido e em benefício da campanha de candidato a deputado estadual registrado por agremiação que não formou coligação com a grei doadora. A titulo de obiter dictum, observo que o recorrente disputou as eleições para deputado estadual pelo Partido Social Cristão (PSC) e que, em consulta ao Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, verifica-se que a citada agremiação participou do pleito isoladamente, ao passo que o órgão estadual da grei doadora, o Partido da República (PR), se aliou ao Partido Humanista da Solidariedade (PHS) para a disputa do mesmo cargo, formando a Coligação Atitude e Verdade, de forma que os citados partidos eram adversários na eleição para a Assembleia Legislativa do Amapá. Diante do contexto verificado nos autos, cumpre lembrar a lição que se extrai do voto proferido pelo Ministro Fernando Neves na Cta 773 (Res.-TSE 21.098, DJ de 2.7.2002), que, ao registrar a impossibilidade de que um partido ou coligação promova, às suas custas, propaganda de qualquer espécie em benefício de candidato filiado a outra agremiação, assinalou que “os partidos políticos recebem recursos provenientes do Fundo Partidário e estes devem ter a destinação estipulada por lei que é a de divulgar as diretrizes e plataformas do partido político e de seus próprios candidatos. Não há como registrar, nas prestações de contas, gastos realizados em benefício de candidato ou partido adversário” (grifo nosso). Na mesma linha de entendimento, cito a decisão individual proferida pelo eminente Ministro Og Fernandes no MS 0601641-38 (DJE de 8.2.2019), que versa sobre hipótese fática semelhante ao presente caso e que também se refere às Eleições de 2018 no Estado do Amapá, da qual destaco o seguinte trecho: 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 259
[...] Na hipótese, não há teratologia no ato impugnado capaz de embasar o acolhimento do pleito da impetrante. O caso versa sobre doação eleitoral, com recursos do Fundo Partidário, feita pelo PR a candidata que não integrava o quadro de filiados e que disputou as eleições em coligação proporcional composta por partidos adversários. O art. 17, III, da Res.-TSE nº 23.553/2017 preconiza que: Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos, somente são admitidos quando provenientes de: [...] III – doações de outros partidos políticos e de outros candidatos. Não parece compatível com o modelo democrático exigido pelo caput do art. 17 da Lei Maior eventual interpretação do dispositivo transcrito que considere possível doação realizada por partido político a candidato que não esteja incluído em seu quadro de filiados ou que dispute o pleito por agremiação partícipe de coligação proporcional adversária. As verbas pertencentes ao Fundo Partidário, nos termos do art. 44 da Lei nº 9.096/1995, destinadas aos partidos somente podem servir à própria agremiação, para a difusão de sua ideologia e de suas iniciativas sociais, bem como para o fortalecimento de sua estrutura interna, de seus candidatos ou de candidatos pertencentes a greis coligadas, pois, neste último caso, há claro interesse de beneficiamento recíproco das candidaturas. Nesses termos, conforme acentuado pela PGE em seu parecer (ID 2868888, fls. 4-5): Admitir-se a pretensão deduzida pela impetrante implicaria autorizar, no limite, um cenário de verdadeira “canibalização” partidária, conferindo-se aos partidos uma excessiva autonomia na gestão dos recursos oriundos do Fundo Partidário, dando margem a toda sorte de acordos temerários entre partidos políticos e colocando em risco a própria viabilidade financeira das atividades que são verdadeiramente afetas aos interesses programáticos das agremiações beneficiados pelo Fundo Partidário. A autonomia partidária outorgada sobre a gestão dos recursos públicos não pode autorizar o desvirtuamento da finalidade constitucional democrática que a anima e que constitui a própria base do sistema partidário. [...] 260 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Ressalto que a análise acerca da existência de eventual interesse político do órgão nacional do partido doador em apoiar candidato de agremiação com ele não coligada no pleito estadual esbarraria na vedação ao reexame fático-probatório em recurso especial, nos termos do verbete sumular 24 do TSE. Ademais, anoto que a proibição da destinação de recursos públicos para o financiamento da campanha de outros partidos não coligados com a grei doadora não constitui situação nova no entendimento do Tribunal Superior Eleitoral. Com efeito, versando sobre a aplicação dos recursos públicos do Fundo Eleitoral distribuídos aos diretórios nacionais dos partidos políticos para aplicação nas campanhas, o § 1º do art. 19 da Res.-TSE 23.553 prevê que, “inexistindo candidatura própria ou em coligação, é vedada a distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para outros partidos políticos ou candidaturas desses mesmos partidos”. Tal como consignado no parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral, “é evidente, sendo para isso desnecessária qualquer regra expressa, que candidatos e partidos que recebam recursos públicos, decorrentes da representatividade de sua ideologia, não podem usá-los para financiar seus adversários” (ID 11575338, p. 4). Assim, entendo que está correta a conclusão do Tribunal de origem de que configura irregularidade grave o recebimento de doação financeira efetuada por órgão nacional de partido político, com recursos do Fundo Partidário, para a campanha de candidato ao pleito estadual registrado por outra agremiação que não está coligada com a grei doadora. Não bastasse, compreendo que a doação versada nos presentes autos configura o recebimento de recursos oriundos de fonte vedada. Com efeito, as pessoas jurídicas são proibidas de realizar doações de recursos para partidos e para candidatos, nos termos dos arts. 33, I, da Res.-TSE 23.553 e 31, II, da Lei 9.096/95. Destaco o teor do art. 33, I, da Res.-TSE 23.553: Art. 33. É vedado a partido político e a candidato receber, direta ou indiretamente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de: I – pessoas jurídicas; Conquanto os partidos políticos sejam pessoas jurídicas de direito privado, a teor do art. 44, V, do Código Civil, tais entes gozam de tratamento diferenciado na legislação eleitoral e partidária, as quais preveem hipóteses nas quais as greis estão autorizadas a destinar recursos para campanhas eleitorais, inclusive os provenientes do Fundo Partidário, conforme dito anteriormente. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 261
Porém, na situação fática dos autos, a doação feita ao recorrente pelo Diretório Nacional do Partido da República (PR) não se enquadra em nenhuma das hipóteses legais e regulamentares que autorizam as agremiações partidárias a contribuir para as campanhas de outros partidos e, por conseguinte, para candidatos dessas outras legendas. Em tal circunstância, entendo que está configurada a captação de recursos financeiros oriundos de fonte vedada, precisamente de pessoa jurídica, tendo em vista que os recursos públicos recebidos pelos partidos políticos não podem ser utilizados para o financiamento de candidaturas registradas por outras agremiações, com as quais a grei doadora não esteja coligada. Ademais e a despeito de haver previsão específica de doação de partidos políticos para campanhas eleitorais, não vislumbro contradição, apontada no parecer ministerial, em se considerar como oriunda de fonte vedada a liberalidade em questão, pois essa ocorreu fora das hipóteses permitidas. Entendo que a interpretação ora preconizada se afigura razoável em virtude da natureza pública dos recursos do Fundo Partidário, os quais são distribuídos aos partidos para o financiamento da própria atividade partidária e com base nos critérios previstos no § 3º do art. 17 da Constituição, vinculados ao número de votos válidos obtidos pela grei nas eleições para a Câmara dos Deputados ou ao número de deputados federais eleitos pela legenda. Por outro lado, anoto que a irregularidade constatada atrai a incidência da regra prevista no art. 33, § 2º, da Res.-TSE 23.553, a qual determina que o donatário devolva ao doador os recursos recebidos de fonte vedada, de forma que o acórdão recorrido não merece reparos quanto ao ponto. Por fim, anoto que a tese de repercussão geral assentada pelo Supremo Tribunal Federal no RE 637.485 estabelece que “as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior” (grifo nosso). Todavia, não há falar em mudança de jurisprudência na espécie, pois a questão controvertida é analisada pela primeira vez por este Tribunal Superior, tanto que o recorrente não apontou nenhum acórdão em que esta Corte tenha examinado a matéria e decidido em sentido diverso. Ademais, é fato que o julgamento da presente demanda ocorreu após a proibição de doações oriundas de pessoas jurídicas para partidos e candidatos e a criação do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC). 262 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Assim, o pedido recursal de que, com base nos princípios da segurança jurídica e da anualidade eleitoral, o entendimento adotado na solução do presente caso seja aplicado apenas em feitos de eleição futura não merece acolhimento. Por essas razões, voto no sentido de negar provimento ao recurso especial eleitoral interposto por José Tupinambá Pereira de Sousa. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 263
COPEJE COLÉGIO PERMANENTE DE JURISTAS DA JUSTIÇA ELEITORAL MINISTRO EDUARDO ALCKMIN (MINISTRO DO TSE) TSE/MG - RESPE - Nº 16.183 TEMA Propaganda Eleitoral RECURSO ESPECIAL - PROPAGANDA ELEITORAL CONTENDO MENSAGEM DE BOAS FESTAS - CONDUTA QUE NÃO SE TIPIFICA COMO ILÍCITA. O MERO ATO DE PROMOÇÃO PESSOAL NÃO SE CONFUNDE COM PROPAGANDA ELEITORAL. Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a açâo política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoção pessoal - apta, em determinadas circunstâncias a configurar abuso de poder econômico – mas não propaganda eleitoral. RECURSO NÃO CONHECIDO. 264 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
RELATÓRIO O SE.NHOR MINISTRO EDUARDO ALCKMIN: Senhor Presidente, o eg. Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais reformou sentença que condenou Rui Eustáquio Alves Resende ao pagamento de multa no valor de 20.000 (vinte mil) UFlRs por propaganda eleitoral irregular consistente na divulgação de outdoors contendo a seguinte mensagem: “Rui Resende agradece ao povo de BH o apoio expressivo na eleição/96 e deseja e todos um Feliz Natal e um próspero 1998.” O aresto regional está assim ementado (fls. 79), verbis: “Recurso. Alegada ocorrência de propaganda eleitoral extemporânea. Não- configuração. Divulgação de mensagem de Boas Festas, sem conotação eleitoral. Inexistência de violação ao art. 36 da Lei n° 9.504/97. Recurso provido.\" Houve a interposição de embargos de declaração, que foram rejeitados (fls. 94/98). Nas razões do recurso especial, o Ministério Público alega contrariedade ao art. 36, caput, da Lei 9.504/97, sustentando ser evidente que os dizeres consignados não se limitaram a uma felicitação de final de ano, mas vincularam o nome do recorrido ao certame eleitoral, com propósito de promoção de futura candidatura. A douta Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pelo não- conhecimento do recurso no parecer de fls. 134/136, entendendo que, por não ter sido comprovado o prévio conhecimento do recorrido, o aresto regional não merece reforma. É o relatório. VOTO O SENHOR MINISTRO EDUARDO ALCKMIN (Relator): Senhor Presidente, não merece reparo a decisão da Corte Regional, do qual destaco o seguinte trecho do voto condutor (fls. 82): “Ocorre que já entendo que esta propaganda não configura propaganda eleitoral. Por isso, estou dando provimento ao recurso, porque no entendimento do colendo Tribunal Superior Eleitoral, em alguns casos, segundo o próprio Ministro Eduardo Alckmin, trata-se de mera promoção pessoal, apta, em determinadas circunstâncias, a caracterizar, inclusive, abuso de poder econômico, mas não propaganda eleitoral (...)\" 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 265
'Verifica-se que no texto veiculado no outdoor não há qualquer divulgação de proposta política, não tendo, tampouco, o recorrido se apresentado como candidato a qualquer cargo eletivo ou pedido votos. Não há dúvida de que a mencionada publicação traduz o intuito de promoção pessoal do recorrido, mas tal incidência, por si só, não configura hipótese apta a ensejar a incidência de multa por propaganda eleitoral vedada. Neste sentido tem este Tribunal se inclinado em diversos julgados, como, por exemplo, no de n° 15.732, julgado recentemente, assim ementado: “RECURSO ESPECIAL - MULTA POR PROPAGANDA ELEITORAL VEICULADA ANTERIORMENTE AO PERÍODO ESTABELECIDO POR LEI. MENSAGEM DE POSSÍVEL CANDIDATO, PUBLICADA EM JORNAL, PARABENIZANDO MUNICIPIO PELO ANIVERSÁRIO DE SUA FUNDAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE PROPAGANDA VEDADA. Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoção pessoal - apta, em determinadas circunstâncias a configurar abuso de poder econômico - mas não propaganda eleitoral.\" Cito, também, decisão deste Tribunal em caso similar ao presente, Acórdão 15.318, de 3.12.1998. assim ementada: “RECURSO ESPECIAL – PROPAGANDA ELEITORAL ANTERIOR AO TERMO INICIAL ESTABELECIDO EM LEI – PUBLICAÇÃO EM JORNAL DE COMUNICADO PARABENIZANDO AS MÃES PELO SEU DIA, CONTENDO FOTO DE VEREADOR E MENÇÂO AO CARGO DE PRESIDENTE MUNICIPAL DE PARTIDO POLÍTICO AUSÊNCIA DE MENÇÃO A CIRCUNSTÂNCIAS ELEITORAIS - CONDUTA QUE NÃO SE TIPIFICA COMO ILÍCITA. O MERO ATO DE PROMOÇÃO PESSOAL NÃO SE CONFUNDE NECESSARIAMENTE COM PROPAGANDA ELEITORAL.\" Do exposto, não conheço do recurso. Recorrente: lraci Lukenczuk Said e outros. Advogado: Dr. Francisco Anis Faiad e cutros. Recorrida: Procuradoria Regional Eleitoral/MT. Propaganda eleitoral extemporânea - Art 36, § 4º, da Lei nº 9.504/97 - Aplicação da multa. 1. Outdoors contendo mensagem de felicitação pelo Dia 'internacional da Mulher - Ausência de menção à eleição ou a plataforma política da possível candidata - Conduta que não se tipifica como ilícita. O ato de promoção pessoal não se confunde com propaganda eleitoral. 266 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
“Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoçao pessoal - apta, em determinadas circunstâncias, a configurar abuso de poder econômico - mas não propaganda eleitoral” (Acórdão nº 16.183, Rel. Min. Alckmin). 2. Folhetos distribuídos por ocasião do Dia das Mães, contendo reterência ao cargo almejado e à ação política que pretende desenvolver. Não comprovação da responsabilidade ou prévio conhecimento dos recorrentes. Impossibilidade de imputação de multa baseada em mera presunção. Hipótese da Súmúla 17. 3. Recurso conhecido e provido. Vistos, etc., Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão Sala de Sessões do Tribunal Superior Eleitoral. Brasília, 28 de novembro de 2000. Ministro FERNANDO NEVES, relator RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO FERNANDO NEVES: Sr. Presidente, trata-se de recurso especial contra acórdão do egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso que, embora reduzindo o valor da multa aplicada, manteve condenação imposta com base no art. 36. § 3º, da Lei nº 9.504/97 - propaganda eleitoral prematura. De acordo cone o acórdáo recorrido, a prática de propaganda eleitoral antecipada, que implicou benefício eleitoral para a primeira recorrente Iraci Said, pela divulgação de seu nome, sua imagem e e opinião, criando desigualdade em relação aos demais candidatos, consistiu na divulgação de mensagem por meio de 12 outdoors com foto da candidata os seguintes dizeres: “Mulher, que a nossa grande luta seja pela justiça social. Parabéns pelo seu dia! 8 de março — Dia Internacional da Mulher. Dra. Iraci Médica pediatra”. Na decisão recorrida, ficou assentado que o serviço foi contratado pelo recorrente e marido da pré-candidata, Raimundo Barroso Said, e pago por uma amiga, Gracinete Tavares Sampaio, também recorrente. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 267
A condenação deveu-se, também, à distribuição de folhetos contendo nome e foto da candidata, acompanhado de texto intitulado “Mãe, e a nossa participação política?\", no qual se faria referência a sua canclidatura ao cargo de vereador e à sua plataforma política. Foi afastada a alegação de desconhecimento quanto à confecção e distribuição dos folhetos, ao entendimento de que não seria incrível que a propaganda tivesse sido efetuada por adversário político com o intuito de prejudicar a candidata. Ressaltou-se, de outra parte, ser idêntico o grafismo utilizado no destaque do nome “Dra. Iraci”, nos panftetos e nos outdoors, o mesmo ocorrendo em relação à fotografia utilizada. Daí o presente recurso especial, no qual se alega, primeiramente, que a decisão recorrida se fundou em presunção, afirmando que a semelhança entre as duas propagandas, ao invés de significar terem sido feitas pela mesma pessoa, demonstraria justamente o contrário (fls. 75): “A alegação de que a primeira recorrente aparece nas fotos dos 'outdoors’ e dos panfletos com a mesma roupa e mesmo par de brinco, ao invés de induzir à premeditaçâo para a publicidade, induz exatamente o contrário. Caso fosse a primeira recorrente pousar para fotos que seriam veiculadas em publicidades diversas, por certo teria mudado de roupa e acessórios, a fim de que as propagandas não fossem iguais...Ora, entender como se entendeu na sentença confirmada pelo TRE, da qual se recorre, é ignorar a vaidade feminina... As fotos colacionadas aos ‘outdoors’ e aos panfletos já existiam e foram tiradas pela recorrente muito tempo antes dessa utilização. Para os ’outdoors’ as fotos foram entregues a terceira recorrente pelo segundo. Para os pantletos, desconhecem os recorrentes como se pode ter acesso a tal fotografia, por quem mandou fazê-los\". No que se refere aos outdoors, os recorrentes assumem que foram responsáveis por sua divulgação, alegando, no entanto, que se tratou apenas de homenagem feita por Gracinete Sampaio, intermediada pur Raimundo Said, à Dra. lraci e às mulheres em geral, pelo Dia Internacional da Mulher. Aduzem que não estaria configurada propaganda eleitoral. Pelo fato de que, na mensagem, não há nenhuma manifestação cujo teor ao menos sugerisse que a primeira recorrente poderia ser candidata a qualquer cargo nas eleições de 2000, não se mencionando sigla partidária, nem se pedindo votos. Quanto aos pantletos, alega a primeira representada que foi surpreendida com sua divulgação, visto que não os confeccionou nem os distribuiu. Afirma que tentou, sem sucesso, descobrir sua origem, o mesmo acontecendo com o oficial de justiça designado para tal, conforme Auto Circunstanciado que se encontra às fls. 27. E lembra o Acórdão TSE nº 1.273, relator o Ministro Eduardo Alckmin, segundo o qual o ônus da prova do conhecimento do beneficiário é do autor da representação, do que não se teria desincumbido o representante. 268 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
O recurso termina pedindo sejam os recorrentes absorvidos das punições impostas, uma vez que não teria existido prática de propaganda eleitoral irregular, além da falta de provas contundentes e concretas, a cargo da recorrida, para embasar uma decisão condenatória. Contra-razões pela manutenção do julgado e parecer do Ministério Público pelo não-provimento do recurso. E o relatório. VOTO O SENHOR MINISTRO FERNANDO NEVES (relator): Sr. Presidente, como visto, os recorrentes furam condenados ao pagamento de multa pela prática de dois tipos de propaganda consideradas irregulares. No que se refere à primeira, etetuada por meio de outdoors, entendo que razão assiste aos recctrentes quantia afirmam que a mensagem veiculada não configura propaganda eleitoral. Lembro seu teor: “Mulher, que a nossa grande luta seja pela justiça social! Parabéns pelo seu dia! 8 de março – Dia internacional da Mulher. Dra. Iraci Médica pediatra”. Creio que tem perfeita aplicação ao caso o entendimento deste Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que meros atos de promoção pessoal não caracterizam necessariamente propaganda eleitoral. Cito alguns julgados, proferidos em situações praticamente idênticas: “Recurso Especial - Multa por propaganda eleitoral veiculada anteriormente ao período estabelecido por lei. Mensagem de possível candidato, publicada em jornal, parabenizando município pelo aniversário de sua fundação. Não caracterização de propaganda vedada\". (Acórdão n° 15.732, Rel. Min. Alckmin, em 15.4.99) “Recurso Especial - Propaganda eleitoral contendo mensagem de boas festas - Conduta que não se tipifica como ilícita. O mero ato de promoção pessoal náo se confunde com propaganda eleitoral. Entende-se como ato de propaganda eleitoral aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura, mesmo que apenas postulada, a ação política que se pretende desenvolver ou razões que indicam a concluir que 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 269
o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública. Sem tais características, poderá haver mera promoçăo pessoal - apta, em determinadas circunstâncias, a configurar abuso de poder econõmico - mas não propaganda eleitoral. Recurso não conhecido\". (Acórdäo n° 16.183, Rel. Min. Alckmin em 1“7.2.00) “Recurso Especial – Propaganda eleitoral anterior ao termo inicial estabelecido em lei - Publicação em jornal de comunicado parabenizando as mães pelo seu dia. Contendo foto de vereador e menção ao cargo de presidente municipal de partido político - Ausência de menção à circunstâncias eleitorais - Conduta que não se tipifica como ilícita. O mero ato de promoção pessoal não se ccnfunde necessariamente com propaganda eleitoral”. (Acórdão n° 15.318, Rel. Min. Alckmin em 3.12.98) “Recurso Especial - Propaganda eleitoral anterior ao termo inicial estabelecido em Rei - Foto estampada em exemplar do código de trânsito sem nenhuma menção à circunstâncias político-eleitorais - Conduta que não se tipifica como ilícita. O mero ato de promoção pessoal näo se confunde necessariamente com propaganda eleitoral”. (Acórdão n° 15.234, Rel. Min. Alckmin, em 19.8.98) Quanto aos folhetos, embora concorde que o texto apresentado contém cIara propaganda de cunho eleitoral, entendo que eles não podern justifìcar a manutenção da multa imposta, uma vez que a responsabilidade e o prévio conhecimento dos recorrentes não foram comprovados, apenas presumidos, conforme se verifica da seguinte passagem do acórdão regional, acatando pronunciamento do Ministério Público (fls. 160/161): ‘Quanto às alegaçoes de desconhecimento pela confecção dos folhetos e possível atribuição à adversários, melhor sorte não assiste aos Recorrentes. Sob tal aspecto, o eminente Procurador Regional Eleitoral muito bem elucidou a questão, ao pronunciar-se nos seguintes termos, verbis. “É muito romantismo acreditar que quem fez veicular sua imagem e nome em outdoors e panfletos, tratando de assuntos interligados, não deseje fazer marketing da sua imagem, tentando, assim, conquisłar simpatia e votos futuros, antes dos demais candidatos aos cargos eletivos, o que revela, com toda segurança, que os Recorrentes são divulgadores e beneficiária (candidata Iraci) de propaganda irregular subliminar, subsumindo-se assim na hipótese do parágrafo 3ᵉ, do artigo 36, da Lei 9.504/97. Não seria crível demais disso, que o adversário da Primaira Recorrente, como ela própria assim se intitula, pudesse gastar recursos financeiros consideráveis, com o propósito único de divulgar o seu nome e causar-lhe prejuízo. 270 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Com certeza, ninguém faz propaganda de outrem com o intuito danoso. Admitindo-se raciocinar na linha da Primeira Recorrente, se o seu adversário, de fato, tivesse feito a divulgação de seu nome e imag.m com o fim de prejudicá-la, poderia sim, a contrário senso, estar atraindo contra si prejuízo maior, pois divulgaria com intensidade o nome da adversâńa, dai resultando não apenas um prejuízo financeiro para o adversário, mas, possive/mente, um prejuízo eleitoral de difícil avaliação. O argumento da Primeira Recorrente, no particular, não procede, até porque se atibui a confecção e divulgação da propaganda a adversário seu está a confessar ser candidata, como de fato restou confirmado por sua escolha em convenção” (fls. 146/147)”. Ora, a jurisprudência deste Tribunal consolidou-se no sentido de que, para a imposição de multa pela prática de propaganda prematura, é necessária a prova do prévio conhecimento do beneficiário, sendo tal entendìmento objeto da Súmula nº 17: “Não é admissível a presunção de que o candidato, por ser beneficiário de propaganda eleitoral irregular, tenha prévio conhecimento de sua veiculação. (Arts. 36 e 37 da Lei 9.504, de 30.9.97).\" Assim, também em relação ao segundo motivo, assiste razão aos recorrentes. Por isso, voto pelo conhecimento e provimento do recurso para tornar insubsistente a multa aplicada aos representados. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 271
COPEJE COLÉGIO PERMANENTE DE JURISTAS DA JUSTIÇA ELEITORAL MINISTRO JOELSON DIAS (MINISTRO DO TSE) TSE - RE NA REPRESENTAÇÃO - Nº 3002-23.2010.6.00.0000 TEMA Propaganda Eleitoral REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL. HORÃRIO GRATUITO. PEDIDO DE RESPOSTA. ATUAÇÃO POLÍTICA DE CANDIDATO. CRÍTICA. POSSIBILIDADE. OFENSA. AFIRMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA. NÃO COMPROVAÇÃO. Além da apresentação de ideias e propostas, a exploração de aspectos supostamente negativos da atuação política de determinado candidato também é legítima na propaganda eleitoral gratuita, inclusive porque a crítica é salutar à democracia e é necessária para formação do convencimento do eleitor. Ainda que questione a aptidão de candidato para o exercício do cargo postulado, a propaganda eleitoral que não resvala para a ofensa nem divulga afirmação sabidamente inverídica configura mera critica política e não revela, portanto, os requisitos para a concessão de direito de resposta. Recurso a que se nega provimento. 272 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO JOELSON DIAS: Senhor Presidente, A Coligação Para o Brasil Seguir Mudando e Dilma Rousseff ajuizaram representação contra a Coligação O Brasil Pode Mais, alegando que a representada teria veiculado “propaganda eminentemente injuriosa e negativa” contra a segunda representante, durante a exibição de sua propaganda eleitoral na televisão, na modalidade inserção, nos dias 19 (3º e 4º blocos) e 20.9.2010 (1º e 2º blocos) (fls. 9-10). A inserção impugnada tem o seguinte teor (fl. 3): VÍDEO ÁUDIO Capa da Folha de São Paulo, 17/09/10 Novas acusações derrubam ex-braço manchete “Novas acusações derrubam direito da Dilma ex-braço direito da Dilma” Pense bem, se a Dilma não consegue Foto Dilma e Erenice escolher direito nem uma auxiliar, Imagem Dilma e Zé Dirceu, com letter: imagina um ministério inteiro Dilma, ela “Ela não vai dar conta” não vai dar conta Asseveraram que “a propaganda contém afirmação claramente injuriosa em relação à candidata Dilma Rousseff, para atingir, de forma direta, o conceito, a honra e a imagem da candidata perante a população brasileira” (fl. 4). Argumentaram que a propaganda “é injuriosa, pois pretende diminuir e menoscabar a candidata Dilma Rousseff, afirmando que ela não vai conseguir escolher seus auxiliares, ou seja, seus Ministros de Estado” ao afirmar, “com todas as letras, que ’ela não vai dar conta”’ (fl. 4). Sustentaram estar clara a intenção de injuriar, uma vez que a propaganda “imputa à candidata Dilma uma qualificação de má administradora” (fl. 4). Defenderam que “a propaganda permitida deve ser pautada pela apresentação de idéias e propostas, contribuindo para a formação da maturidade democrática do país” (fl. 5), razão pela qual a propaganda eleitoral veiculada teria de se desvirtuado “por completo” de sua finalidade. Alegaram, ainda, que a propaganda teria ultrapassado os limites da crítica política, o que justificaria, então, a concessão do pretendido direito de resposta. A respaldar a sua tese, invocaram, como precedente, a Representação n° 1.194, da relatoria do Min. Ari Pargendler. Argumentaram se tratar de “propaganda eminentemente injuriosa e negativa, tendente a degradar a honra e a imagem da candidata Dilma Rousseff, bem como a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais contrários à candidata, o que é vedado pela legislação eleitoral, pelo art. 242 do Código Eleitoral, art. 5º da Resolução TSE n° 23.191/2009 e art. 53, §§ 1º e 2o da Lei no 9.504/1997” (fls. 5-6). 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 273
Requereram medida liminar para suspender a veiculação da propaganda e, no mérito, a concessão de direito de resposta. A representada protocolou, tempestivamente, defesa. No mérito, ressaltou que “a petição inicial destaca apenas uma expressão que diz ser injuriosa: ‘ela não vai dar conta”’ (fl. 20), o que revelaria “mera critica âs aptidões administrativas da candidata adversária a partir dos fatos jornalísticos e amplamente divulgados” (fl. 28). Citou julgados do TSE que estariam a respaldar a sua tese. Refutou a alegação das representantes de que a propaganda deveria ser pautada apenas pela apresentação de ideias e propostas, ao entendimento de que deve ser “assegurado aos candidatos, especialmente aos de oposição, o direito de apontar o que consideram errado, incoerente ou inconfiável em seus concorrentes” (fl. 24). Reivindicou a improcedência do pedido inicial formulado ao argumento de que “a propaganda não maltrata a honra da candidata, limitando-se a emitir opinião sobre a sua capacidade de bem escolher seus auxiliares” (fl. 26)a A Procuradoria-Geral Eleitoral, no parecer de fls. 31-34, manifestou-se pela improcedência do pedido inicial porque a propaganda não teria ultrapassado os limites da crítica política. Em 25.9.2010, julguei improcedente o pedido formulado na representação, ao fundamento de que a afirmação citada estaria inserida no campo da crítica política e não possuiria o condão de ofender a honra ou a imagem pessoal da candidata. A Coligação Para O Brasil Seguir Mudando e Dilma Rousseff interpõem, tempestivamente, recurso (fl. 46). Argumentam que, ao contrário do consignado na decisão recorrida, a crítica teria caracterizado ofensa apta a atingir a reputação da candidata e sua credibilidade perante o eleitorado. Sustentam que a propaganda teria extrapolado os limites da crítica meramente política “ao imputar à candidata Dilma uma qualificação de má-administradora, e de incapaz de chefiar e montar uma equipe de trabalho” (fls. 47-48). Citam a Rp n° 861, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ de 22.5.2007. Asseveram desvirtuamento da propaganda na medida em que não foi feita “em momento algum da propaganda veiculada, por meio segundo que fosse, qualquer menção à candidatura apoiada pela representada, sequer uma frase, uma palavra, um sinal a favor do seu candidato! O que se viu foi única e exclusivamente ofensas injuriosas à honra da candidata Dilma Rousseff’ (fl. 49). Alegam tratar-se de “clara e concentrada ação direcionada contra os adversários do partido representado (Representação n° 1289-13 - Ministro Henrique Neves), especialmente pelo fato de ter sido veiculada por 3 dias seguidos” (fl. 49). Pedem o conhecimento e provimento do recurso para, reformada a decisão monocrática, seja concedido o direito de resposta. A Coligação O Brasil Pode Mais apresentou, tempestivamente, contrarrazões ao recurso (fls. 54-62). 274 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Alega que “a propaganda impugnada não fez outra coisa senão tecer crítica a respeito das escolhas que Dilma faz no que toca à sua assessoria” (fl. 56). Defende que “a crítica aos adversários quanto às suas escolhas, alianças, posturas e ações pretéritas é algo comum e mais do que aceitável no debate político eleitoral” (fl. 56). Citam precedentes desta Corte para respaldar a sua tese. É o relatório. VOTO O SENHOR MINISTRO JOELSON DIAS (relator): Senhor Presidente, as recorrentes não lograram infirmar os fundamentos da decisão recorrida, razão por que a mantenho pelos seus próprios fundamentos. No caso específico dos autos, as recorrentes alegam, em síntese, que a propaganda teria extrapolado os limites da crítica meramente política, pois nela se teria veiculado mensagem ofensiva contra a segunda recorrente na medida em que Ihe teria imputado uma qualificação de “má administradora” (fl. 4). Pedem a reforma da decisão para que seja concedido direito de resposta. Garantia constitucional, o direito de resposta é assegurado também no âmbito do direito eleitoral, pela Lei n° 9.504/1997, em seu artigo 58, ao candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social. A concessão de direito de resposta, pela legislação eleitoral, pressupõe, assim, sempre uma ofensa, ainda que indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica. Como consignei na decisão recorrida, entendo que a afirmação impugnada não extrapolou os limites da critica meramente política, apesar de, realmente, ter sido questionada a aptidão da candidata para o exercício do cargo postulado. Contudo, ao contrário do que alegado, tenho que a crítica não resvalou para ofensa apta a atingir a credibilidade da candidata perante o eleitorado. Para fundamentar minha decisão, citei o que consignado pelo il. Min. Peçanha Martins, na Rp n° 5991: o conceito que fazem da administração não caracteriza gravame à honra ou à imagem dos representantes. Efetivamente, o direito de crítica só pode ter por limite a integridade e honorabilidade das pessoas. E a pugna política se caracteriza até pelas críticas azedas feitas aos governos”. Afinal, prosseguiu o e. ministro, “o exercício do direito de crítica é corolário da liberdade, imprescindível à democracia. 1. Rp n° 599/RS, rei. Min. Peçanha Martins, publicado em sessão em 21.10.2002. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 275
E, no tocante ao já decidido por este Tribunal no sentido de que a realização de críticas, ainda que desabonadoras, não enseja direito de resposta, transcrevi o seguinte precedente2: - A orientação da Corte está assentada no sentido de que a crítica aos homens públicos, por suas desvirtudes, seus equívocos, falta de cumprimento de promessas eleitorais sobre projetos, revelando a posição do partido diante dos problemas apontados, por mais ácida que seja, não enseja direito de resposta (Precedentes: Respe n° 20.480, de 27.9.2002, Rp no 381, de 13.8.2002). - Representação julgada improcedente. Assim, as críticas, mesmo que veementes, não autorizam, por si só, a concessão de direito de resposta, desde que não ultrapassem os limites do questionamento político e não se desvirtuem, nem para a ofensa pessoal, nem para a difusão de inverdades. Ademais, as criticas buscando a responsabilizaçäo dos governantes, pela má condução das atividades de governo, também não configuram ofensa que reclame a outorga de direito de resposta. Nesse sentido, a jurisprudência da Corte3. Agravo regimental. Negativa de seguimento. Recurso especial. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Horário gratuito. Alegações. Criticas. Desempenho. Governador. Ausência hipótese art. 58 da Lei n° 9.504/97. Não ocorrência de ofensa. Fundamentos não infirmados. As críticas apresentadas em programa eleitoral gratuito, buscando a responsabilização dos governantes pela má condução das atividades de governo, consubstanciam típico discurso de oposição, não se enquadrando nas hipóteses do art. 58 da Lei n° 9.504/97 (ARespe n° 26.780, rel. Min. Gerardo Grossi, publicado em sessão em 26.9.2006). Tenho, ainda, por insubsistente a alegação de desvirtuamento da propaganda porque teria tão somente veiculado ataques à candidata recorrente. As criticas, mesmo que veementes, fazem parte do jogo eleitoral, desde que não ultrapassem os limites do questionamento político e não se desvirtuem, nem para a ofensa pessoal, nem para a difusão de inverdades. Como bem ressaltado pela Procuradoria-Geral Eleitoral, em certa ocasião, na propaganda eleitoral gratuita, “a exploração de aspectos supostamente negativos da atuaşão política de determinado candidato também é legítima — inclusive porque a crítica é salutar à democracia e é necessária para formação do convencimento do eleitor4. 2. RP n° 588/DF, rei. Mm. Caputo Bastos, publicado em sessão de 21.10.2002. 3. ARespe n° 26.780/BA, rei. Min. Gerardo Grossi, publicado em sessão em 26.9.2006. 4. Parecer ofertado nos autos da RP n° 2978-92/DF, de minha reiatoria, decisão monocrática de 24.9.2010. 276 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
As criticas, os embates ideológicos e os discursos oposicionistas são perfeitamente aceítáveis em um Estado Democrático de Direito, mesmo porque despertam o eleitorado e contribuem para o debate eleitoral. Além disso, jurisprudência da Corte não assegura direito de resposta em decorrência de simples comentário de notícias publicadas na imprensa no espaço reservado à propaganda eleitoral gratuita5. A meu ver, afirmação citada está inserida no campo da crítica política e não possui o condão de ofender a honra ou a imagem pessoal da candidata6. Ademais, é próprio do embate político querer se sobrepor como melhor que o candidato adversário. Melhor sorte não assiste às recorrentes ao invocar a seu favor o que decidido na Rp n° 861. lsso porque inaplicável ao caso. Afinal, o que se discutia naquela ocasião era a imputação direta ao ofendido da prática de ilícito, e não, propriamente, como na espécie, simplesmente se questionava a aptidão de candidato para o exercício do cargo postulado. Por fim, entendo que, em casos como este, aquele que eventualmente se sentir atingido poderá dispor do próprio tempo de propaganda eleitoral para responder à crítica ou prestar os esclarecimentos que reputar necessários. Ausentes os requisitos para concessão do direito de resposta pleiteado, nego provimento ao recurso. 5. RP n°. 1.269/DF, rel. Min. Ari Pargendler, publicado em sessão de 24.10.2006. Ver, ainda, RP n° 272/DF, Resolução n° 20751, rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 23.2.2001. 6. RP n°. 1309/DF, rel. Min. Marcelo Ribeiro, publicado em sessão de 26.10.2006. No mesmo sentido: RP n°. 1304/DF, rel. Min. Marcelo Ribeiro, publicado em sessão de 26.10.2006; RP 1305/DF, rel. Min. Marcelo Ribeiro, publicado em sessão de 26.10.2006. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 277
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COPEJE COLÉGIO PERMANENTE DE JURISTAS DA JUSTIÇA ELEITORAL ADRIANO COUTINHO (JUIZ DO TRE - ES) TRE/ES - RE - Nº 258-57.2016.6.08.0021 TEMA Abuso de Poder VOTO VISTA O Sr. JURISTA ADRIANO ATHAYDE COUTINHO:- Senhor Presidente, demais Pares, rememoro que à exemplo do Des. SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, pedi vistas dos autos mesmo após já ter proferido voto e então acompanhado o eminente Relator, Dr. MARCUS VINÍCIUS FIGUEIREDO DE OLIVEIRA COSTA. Relembro que, nesse voto que proferi na sessão do dia 27-09-2017, registrei a existência de precedente deste Regional (recurso nº 443-86.2016.6.08.0024), de minha relatoria, em que um dos fundamentos utilizados foi “que o c. TSE tem o entendimento que a filantropia promovida por associação sem fins lucrativos, via de regra, não caracteriza, por si só, abuso de poder econômico, sendo necessário a comprovação do fim eleitoreiro dessa atividade”. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 279
Portanto, com o objetivo de afastar incoerência – de minha parte -, então manifestei nos presentes autos apontando como distinguish o seguinte fundamento: “[...] o ponto nodal da questão foi a vinculação entre o nome e a marca estampada nos veículos, de modo que eu acompanho o eminente Relator quanto à conclusão de seu voto, ressalvando que essa atitude de ajudar ao próximo, de colaborar com a população não deve ser desestimulada, muito pelo contrário, deve ser feita com os devidos cuidados que o pleito eleitoral exige.” Naquela sessão de julgamento, todos haviam votado com o Relator, à exceção do Dr. RODRIGO MARQUES DE ABREU JÚDICE, tendo este pedido vista dos autos e proferido voto divergente na sessão do dia 09/10/2017. Agora, após pedido de vista e voto do Des. SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, temos duas robustas vertentes de votos meritórios: A primeira, cuja maioria está a encampar, traz fortes fundamentos em que os cultos Relator e Revisor concluíram “indubitavelmente a ocorrência do abuso de poder econômico, suas circunstâncias, bem como a gravidade das irregularidades, não deixando qualquer dúvida acerca da configuração do ilícito eleitoral”. Já a segunda vertente, adotando uma “visão holística da realidade”, concluiu por afastar o abuso de poder econômico, por considerar não ser possível extrair nenhum viés eleitoreiro na prática de distribuição de água à população de São Mateus; e, afirmando que “o Recorrente não distribuiu água com conotação eleitoreira, elemento esse que seria indispensável à configuração do abuso de poder econômico”. Registro que ambas vertentes utilizaram em seus fundamentos das provas constantes dos autos, cada qual interpretando fatos, argumentos jurídicos e provas, de forma exaustiva nos detalhes. Em razão dos fortes fundamentos dos votos com conclusões diametralmente opostas, bem como em razão de novos memoriais apresentados pelo combativo advogado de um dos recorrentes, Dr. ALTAMIRO THADEU FRONTINO SOBREIRO, optei por sentir melhor os autos, olhar nos detalhes as provas; principalmente, por identificar que tanto o Advogado como o Dr. RODRIGO JÚDICE utilizaram-se de aresto proferido pelo Colendo TSE, o Recurso Especial Eleitoral nº 36628, onde foi Relatora a Min. CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA e Relator designado o Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI. Ou seja, utilizaram-se do mesmo acórdão que utilizei para nortear minha conclusão nos autos do recurso nº 443-86.2016.6.08.0024, repito, do qual fui relator neste Regional e fui acompanhado no sentido de que a “prestação de serviços gratuitos por associação sem fins lucrativos não configura, por si só, abuso de poder econômico ou captação ilícita de sufrágio, pois, para tanto, faz-se necessária a comprovação do viés eleitoreiro de tais práticas”. Também registro que ao longo do julgamento, venho sendo ouvido dos mais variados argumentos e visões sobre o caso em tela, havendo argumentos dos advogados dos recorrentes, do Ministério Público Eleitoral, Lideranças e Populares Mateenses em geral que para nossa satisfação vêm prestigiando as sessões deste Regional. Com efeito, imbuído nas palavras de TOBIAS BARRETO: “Direito não é só uma coisa que se sabe, mas também uma coisa que se sente”; noto que o caso dos autos envolve um sentimento – posso dizer, um ponto comum - entre todos argumentos que li e ouvi, qual seja, o sofrimento vivido pela População Mateense, em razão de notória crise hídrica iniciada no ano de 2014 e que vem sendo recorrente até os dias de hoje, em todo Estado, atingindo de forma mais severa o Norte e Noroeste do Espírito Santo. 280 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Pois bem. É com este sentimento de sofrimento da população que recebia e - pelo que pude abstrair - ainda recebe água salobra em suas residências, quando deveriam receber água tratada e de qualidade, em contrapartida à tarifa que pagam ao ente público; passo a interpretar as provas dos autos, considerando as características próprias do caso concreto, reconheço, complexo. Primeiramente, apresento minha conclusão pessoal sobre o argumento que utilizei como distinguish na sessão do dia 27-09-2017, ou seja, “a vinculação entre o nome e a marca estampada nos veículos”. Após analisar as provas constantes dos autos, vejo que meu raciocínio não se confirma. Explico: Afirmei que a vinculação entre o nome do candidato (Daniel da Açaí) e a marca da água Açaí estampada nos caminhões pipa utilizados para a distribuição de água à população Mateense no ano de 2016 seria o ponto nodal para reconhecer a prática do abuso econômico. Entretanto, reconheço que na ocasião não considerei que o recorrente Daniel da Açaí já havia concorrido às Eleições no ano de 2004 (fls. 104) e, à exemplo das Eleições 2016, teve seu registro deferido, não havendo decisão desfavorável à grafia de seu nome tal qual o fora realizado. Neste particular, verifico que a notoriedade de suas atividades empresariais junto à marca Água Mineral Açaí, garantiria a disputa com o nome “Daniel da Açaí”, sendo inclusive fundamento legal1 de preferência na escolha do nome, quando existente situação de homonímia. Assim, retomando o confronto do raciocínio com os autos, verifico que a inicial alega a existência de distribuição de água com propósito eleitoreiro “desde setembro de 2015 até a efetivação da decisão cautelar”2 (fls. 03) pela denominada “Liga da Solidariedade”, o que me faz questionar e duvidar da alegação do representante HERMAS AUGUSTO DE OLIVEIRA CARDOSO: Se a distribuição de água ocorria desde setembro de 2015, por qual motivo não houve a impugnação do registro de candidatura em período eleitoral deflagrado no ano 2016? Uma simples alteração do nome no registro de candidatura do ora recorrente Daniel Santana Barbosa, não poderia ter sido provocada oportunamente e solucionado a alegada vinculação do nome da marca e do candidato? Agora, após acessar mais de perto as provas dos autos com meu pedido de vista, posso concluir por afastar o fundamento por mim então adotado como distinguish; pois, a pseudo certeza que havia adotado, não se confirmou de forma suficientemente hígida. Assim, ultrapassada a conclusão inicial, passo a expor meu voto e conclusão quanto à prática ou não de conduta configuradora de abuso de poder econômico. 1. Lei 9.504/97: Art. 12. O candidato às eleições proporcionais indicará, no pedido de registro, além de seu nome completo, as variações nominais com que deseja ser registrado, até o máximo de três opções, que poderão ser o prenome, sobrenome, cognome, nome abreviado, apelido ou nome pelo qual é mais conhecido, desde que não se estabeleça dúvida quanto à sua identidade, não atente contra o pudor e não seja ridículo ou irreverente, mencionando em que ordem de preferência deseja registrar-se. § 1º Verificada a ocorrência de homonímia, a Justiça Eleitoral procederá atendendo ao seguinte: I - havendo dúvida, poderá exigir do candidato prova de que é conhecido por dada opção de nome, indicada no pedido de registro; II - ao candidato que, na data máxima prevista para o registro, esteja exercendo mandato eletivo ou o tenha exercido nos últimos quatro anos, ou que nesse mesmo prazo se tenha candidatado com um dos nomes que indicou, será deferido o seu uso no registro, ficando outros candidatos impedidos de fazer propaganda com esse mesmo nome; III - ao candidato que, pela sua vida política, social ou profissional, seja identificado por um dado nome que tenha indicado, será deferido o registro com esse nome, observado o disposto na parte final do inciso anterior;[...]” Também é aplicável a doutrina capixaba de Flávio Cheim Jorge, Ludgero Liberato e Marcelo Abelha Rodrigues, in Curso de Direito Eleitoral, 2. ed. rev. ampl. atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 492, no sentido de que “é muito comum que determinadas pessoas sejam conhecidas e reconhecidas em seus redutos eleitorais por nomes ou apelidos variados, que tanto podem estar atrelados à sua condições física, ao seu trabalho, a algum fato importante da vida etc.”. 2. Também observei que o representante HERMAS AUGUSTO DE OLIVEIRA CARDOSO, também alega que a distribuição de água com propósito eleitoreiro estava a ocorrer desde setembro de 2015 (fl. 26, dos autos cautelares em apenso). 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 281
Neste viés, mantendo simetria e coerência com posição que adotei como relator do Recurso nº 443-86.2016.6.08.0024, entendo que a Ação de Investigação Judicial Eleitoral, nos moldes delineados na Lei Complementar nº 64/90, tem como propósito reprimir a influência abusiva exercida por detentores do poder econômico ou político (ou de autoridade) e, ainda, o uso indevido dos meios de comunicação social em benefício de determinada candidatura ou partido político. Não há que se negar a existência de distribuição de água à população de São Mateus pela denominada Liga da Solidariedade desde o ano de 2015, em decorrência da notória crise hídrica e incontestável deficiência estatal em garantir item essencial à vida. No entanto, não podemos afirmar que esse projeto seria mantido exclusivamente pelo Recorrente Daniel Santana Barbosa – embora, também seja inconteste sua ligação com a pessoa jurídica Empresa Mineradora Litorânea S/A, uma das principais ‘colaboradoras’ da Liga da Solidariedade. Ademais, infere-se que a disponibilização de água aos necessitados por parte da pessoa jurídica Empresa Mineradora Litorânea S/A remonta aos anos de 2013 (aos munícipes de Linhares/ES, em razão de enchente – fls. 47, Ofício da Rede Gazeta solicitando doação de galões d´água), 2015 (ao Conselho Tutelar de Conceição da Barra/ES – fls. 50) e 2016 (à Paróquia São João Evangelista em Pinheiros/ ES -fls. 49); além das doações feitas à Liga da Solidariedade e consequentemente a grande parte da população Mateense nos anos de 2015 e 2016. Entretanto, a partir da análise das provas colacionadas aos autos, especialmente do depoimento prestado pelo representante HERMAS AUGUSTO DE OLIVEIRA CARDOSO (principal testemunha autoral) pude observar que ao ser indagado em Juízo o mesmo não possuía tanta certeza quanto ao propósito eleitoreiro alegado e narrado em sua representação com tanta “convicção”. Vejamos trechos extraídos de sua oitiva à fl. 288: “[...] que não presenciou a distribuição de santinho no momento do fornecimento da água; que ouviu comentários nesses sentidos, mas não viu; que a água era distribuída para todas as pessoas; [...] que não viu a presença do Sr. Daniel; que não viu o Sr. Daniel no momento em que os caminhões da liga da solidariedade estava [sic] distribuindo água; que ouviu dizer mas não viu; [...]” A oitiva KEVINY BRITO DOS REIS também deixou dúvidas sobre o propósito eleitoreiro (fls. 290/291): “[...]que nunca presenciou o candidato Daniel fazer a distribuição de água; que já viu fotos em facebook do requerido Daniel distribuindo água antes do período eleitoral; que durante o período eleitoral a distribuição de água foi feito pela “liga da solidariedade”; [...] que durante a campanha nos caminhões não tinha os adesivos da água mineral açaí; [...] que nunca viu ninguém pedindo algo em troca da água fornecida, mas esclarece que quem pegava água era pai do depoente; que não tomou conhecimento de distribuição de água pelo poder público municipal;[...]” 282 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
A também testemunha do Ministério Público Eleitoral, LEONARDO SANGEORGIO NOGUEIRA, afirmou às fls. 294: “[...] que presenciou uma vez a distribuição de água no bairro San Remo; que o Sr. Daniel não estava presente; que não viu a distribuição de santinho durante a distribuição de água; que no momento só viu no caminhão o nome “liga da solidariedade”; que não viu o adesivo da água mineral açaí; que acredita que a água era distribuída indistintamente, independente da pessoa ser eleitora do Daniel ou não; [...]” Neste particular do confronto entre as alegações do representante HERMAS AUGUSTO DE OLIVEIRA CARDOSO (lançadas em representação originadora de procedimento preparatório) e sua insegura oitiva extraída da colheita da prova testemunhal em Juízo, reconheço que a estreita ligação entre o representante e candidato de oposição3 possa ter sido o real motivo para alegar o abuso do poder econômico. Com efeito, a iniciativa da ora testemunha me parece estar a revelar constatação em pesquisa feita por JULIANA COSTA MEINERZ ZALAMENA, dando origem ao texto Judicialização da competição política e eleições municipais no Rio Grande do Sul4: “[...] Sendo assim, não é o combate à corrupção eleitoral que vem prevalecendo, e sim, a busca pelo erro do adversário em relação à condutas ilegais e seu uso em juízo, para a alteração de resultados. Por outro lado, percebemos na análise dos dados referentes aos processos de cassação, que a Justiça Eleitoral tem feito intervenções incisivas em uma parcela diminuta dos casos, o que não tem desencorajado os atores políticos a continuarem usando esse meio na competição política local. Argumentamos que basta a possibilidade de adentrar com o processo, e a chance ainda que remota que conquistar algum resultado positivo – a cassação ou a mera desestabilização da candidatura do oponente – já serve de incentivo para a busca cada vez maior dos atores políticos pelo Judiciário nesse tipo de situação. [...] Ainda, vislumbramos um importante indicativo: nenhum processo chegou a via judicial pela iniciativa de um eleitor comum, um cidadão indignado com a corrupção, um habitante de determinada cidade que se sentiu ferido em sua dignidade quando lhe foi ofertado algo em troca do seu voto. Na maioria dos casos, foram atores políticos interessados e diretamente envolvidos no pleito que efetuaram a denúncia e arrolaram as provas, exceto nos casos em que o processo veio da iniciativa do Ministério Público Eleitoral. Assim, tendo em mente tal perfil, interpretamos que a possibilidade da cassação de um mandato consolidar-se, tem tornado os mecanismos judiciais mais um instrumento na busca pelo poder. Ou seja, mesmo que determinado oponente vença as eleições, é possível reunir provas, e derruba- lo no âmbito jurídico, cassando o seu registro de candidatura ou 3. No caso, a esposa da testemunha/representante possui vínculo de trabalho com candidato de oposição e a própria testemunha reconheceu estar a trabalhar no campo jurídico da campanha da oposição. 4. Disponível em https://jus.com.br/artigos/23021/judicializacao-da-competicao-politica-e-eleicoes-municipais-no-rio- grande-do-sul/3 . Publicado em 11/2012. Acesso em 30/10/2017. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 283
mesmo seu mandato, caso já tenha sido empossado. E mesmo que esse objetivo maior não seja atingido, por motivos vários, o fato de ser alvo de um processo na Justiça Eleitoral desestabiliza e fragiliza a candidatura do adversário, tendo seus benefícios imediatos de qualquer forma. Os dispositivos instituídos pela legislação eleitoral, portanto, aliados aos mecanismos de aplicação do organismo eleitoral responsável, tornam-se utilitários para desbancar um adversário.[...]” (destacamos) Por oportuno, registro que o c. TSE tem o entendimento que a filantropia promovida por associação sem fins lucrativos, via de regra, não caracteriza, por si só, abuso de poder econômico, sendo necessário comprovar o fim eleitoreiro dessa atividade. Nesse sentido, destaco o seguinte excerto: “ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CENTRO SOCIAL. FILANTROPIA. AUSÊNCIA DE PROVA QUANTO AO CARÁTER ELEITORAL DA CONDUTA. REVALORAÇÃO. ABUSO DE PODER NÃO COMPROVADO. FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. SÚMULA 182/ STJ. DESPROVIMENTO. 1. O exercício de atividade de filantropia por associação sem fins lucrativos não configura, por si só, abuso de poder político ou econômico, sendo imprescindível, a partir de elementos objetivos, a demonstração do caráter eleitoral da conduta para a sua configuração. 2. Não infirmados os fundamentos da decisão agravada, incide, por analogia, a Súmula 182 do STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (TSE - RESPE: 00012182620126190157 NOVA IGUAÇU - RJ, Relator: Min. Maria Thereza Rocha De Assis Moura, Data de Julgamento: 17/11/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume , Tomo 34, Data 19/02/2016, Página 131) “RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÃO 2008. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. SERVIÇOS DE ASSESSORIA JURÍDICA. ASSISTÊNCIA MÉDICA, ODONTOLÓGICA E OFTALMOLÓGICA. PRECARIEDADE DO ACERVO PROBATÓRIO. DESPROVIMENTO. 1. A prestação de serviços gratuitos por associação sem fins lucrativos não configura, por si só, abuso de poder econômico ou captação ilícita de sufrágio, pois, para tanto, faz-se necessária a comprovação do viés eleitoreiro de tais práticas. In casu, as atividades já eram desenvolvidas há vários anos, não sendo possível concluir que foram instituídas para a obtenção de votos. Sendo praxe, no contexto analisado, bem como em todo o Brasil, a atuação de organizações não governamentais que prestam uma série de serviços assistência judiciária gratuita, serviços médicos, serviços sociais deve ser resguardada a sua liberdade de manifestação política. 2. Recurso especial desprovido.” (Recurso Especial Eleitoral nº 36628, Acórdão de 12/11/2013, Relator(a) Min. CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA, Relator(a) designado(a) Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 48, Data 11/03/2015, Página 166 ) 284 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Mas não é só o C. TSE que assim entende, valendo colacionar recentíssimo julgado do Eg. TRE-CE, o qual a Jurista Cearense Desembargadora Eleitoral Dra. KAMILE MOREIRA CASTRO assim ementou acórdão publicado em 26/07/2017: “ELEIÇÕES 2016. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DE PODER. DISTRIBUIÇÃO DE BENS. FESTIVIDADE BENEFICENTE. FILANTROPIA. DIA DAS MÃES. NÃO COMPROVAÇÃO. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Extrai-se dos autos, que embora tenham os recorridos angariado a simpatia da população que se fez presente ao evento do dia das mães, com o sorteio de bens doados possivelmente por comerciantes da cidade, que sempre se engajam em filantropias, não emerge dos fólios atos configuradores de compras de voto, de enaltecimento de pretensa candidatura, de distribuição ou afixação de atos propagandísticos, de forma a gerar desvio da finalidade do encontro para beneficiar a candidatura. 2. A prova oral arrolada é frágil e não dá suporte aos indícios materiais. A recorrente não se desincumbiu de demonstrar a gravidade do ato de forma a configurar abuso em qualquer de suas modalidades e o especial fim de agir, consubstanciado no condicionamento da entrega do benefício à obtenção do voto, bem como a autorização, ou ao menos a anuência, dos recorridos com a prática de conduta vedada realizada por terceiros a fim de caracterizar ofensa à legislação eleitoral. 3. Quanto aos brindes, colhe-se dos autos, que a distribuição ocorreu de maneira aleatória e que certamente pessoas de outros municípios participaram do evento (proximidade com o Município de Jaguaribara), bem como que podem ter sido doados por comerciantes que sempre ajudam os eventos realizados pela irmã da candidata eleita. 4. Segundo o TSE “a aplicação das sanções previstas no art. 41-A da Lei das Eleicoes exige prova robusta de que o candidato participou de forma direta com a promessa ou a entrega de bem em troca do voto ou, de forma indireta, com ela anuiu ou contribuiu, não bastando meros indícios e presunções” (AgR-REspe nº 385-78/SP, de rel. Ministra Luciana Lóssio, DJe de 19.8.2016). 5. O Art. 41-A exige para a sua configuração que o ato ocorra desde o registro da candidatura até o dia da eleição. 6. Conforme precedentes o “abuso de poder não pode ser presumido, reclamando, para sua configuração, a comprovação da gravidade das circunstâncias do caso concreto que caracterizam a prática abusiva, de forma a macular a lisura da disputa eleitoral, nos termos do art. 22, XVI, da LC nº 64/90” (AgR-REspe nº 349-15/TO, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 27.3.2014 e REspe nº 130-68/RS, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 4.9.2013). 7. Recurso improvido. Sentença mantida. Improcedência da ação.” (TRE- CE - RE: 12046 ALTO SANTO - CE, Relator: KAMILE MOREIRA CASTRO, 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 285
Data de Julgamento: 24/07/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 139, Data 26/07/2017, Página 25/26)5 E para espancar qualquer dúvida, transcrevo trecho do inteiro teor de julgamento proferido pelo Eg. TRE-PE6, onde a situação sob análise é muito similar à presente7. Ressalto que perante a Corte Regional Pernambucana, a Procuradoria Regional Eleitoral (institucionalmente, una e indivisível) apresentou parecer no sentido de manter a sentença de improcedência que afastou o abuso de poder econômico. Vejamos: “[...] Pontuo, por fim, que, de fato, restou incontroverso que familiares da representada tinham a prática de distribuir água a pessoas que necessitavam desse tão valoroso bem de consumo, de modo que é indiscutível o proveito eleitoral que tal entrega poderia vir a oferecer. Poder-se-ia concluir também que, dentro da conjectura analisada, ou seja, diante da tamanha necessidade enfrentada por aqueles munícipes em obter água potável, sua farta disponibilidade em mananciais que apenas eram encontrados em terras de alguns poucos teria o condão de vir a se transformar em ferramenta de viés econômico, passível de quebrar a paridade de condições entre concorrentes em certame eleitoral, como bem destacou o Procurador Regional Eleitoral. Contudo, anoto que tais ilações sequer merecem maiores considerações in casu, pois, a premissa de uma condução abusiva do fator econômico reside na conotação eleitoral, circunstância que, como acima exposto, não vislumbrei aqui evidenciada. Assim, penso que a adjetivação utilizada para a prefeita eleita, prefeita da água, pelo que se tem nos autos, pode advir do histórico de sua família, ou mesmo dela própria, de promover essa distribuição de água, já que fora dito que, na região, dispõem de fonte de água potável em abundância. Nada nos autos, entretanto, comprova essa prática em período eleitoral, muito menos de maneira vinculada à obtenção de votos em prol da chapa recorrida, de forma direta ou indireta pelos demandados. Não merece reparo, pois, a decisão atacada. Por este entender, em consonância com a Procuradoria Regional 5. No mesmo sentido: “RECURSO ELEITORAL. ASSOCIAÇÃO DOS CICLISTAS AMADORES DO ESTADO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FILANTROPIA E ASSISTÊNCIA À SAÚDE. NÃO CONFIGURAÇÃO DE ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PROVIMENTO. SENTENÇA REFORMADA. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL E DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. IMPROCEDENTES. A simples e normal prestação de filantropia e assistência médico-odontológica por particular, ainda que político, candidato ou não a cargo eletivo, não é impedida por qualquer ato normativo ou regras de conduta consubstanciadas no direito escrito. O que se afigura abuso de poder econômico é a exploração dessas atividades como forma de captação de votos, mesmo porque tal conduta, além de antiética e imoral, estabelece profunda desigualdade entre aqueles que disputam o pleito, levando vantagem aquele que dispuser de maiores recursos financeiros. Ademais, tendo-se que o recorrente não se encontrava à frente da associação na condução da prestação dos serviços nem realizando reuniões com os assistidos naquele lugar, não há que se falar em ilicitude. Folheto, simples e normal instrumento de propaganda eleitoral, endereçado aos associados de entidade de segmento social, sem conteúdo ilícito, imoral ou que atente contra a liberdade de escolha do eleitor não se revela abuso de poder econômico que influencia no resultado das eleições, porquanto de livre veiculação, que não se enquadra em nenhuma das hipóteses de propaganda proibida pelo art. 243 do Código Eleitoral.” (TRE-MS - RE: 1332 MS, Relator: RÊMOLO LETTERIELLO, Data de Julgamento: 15/09/2009, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Tomo 2054, Data 28/09/2009, Página 474) 6. (TRE-PE - RE: 12802 PASSIRA - PE, Relator: VLADIMIR SOUZA CARVALHO, Data de Julgamento: 15/05/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 106, Data 19/05/2017, Página 18-19) 7. Similar até na quantidade de caminhões-pipa envolvidos, sendo que na cidade de Passira/PE eram quatro caminhões e no caso presente estamos a falar de três caminhões. Para fins comparativos, tive a curiosidade acessar os dados populacionais disponíveis no site do IBGE < https://cidades.ibge.gov.br/>, tendo Passira/PE a população estimada de 28.889 pessoas e São Mateus/ES a população estimada de 128.449 pessoas. 286 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Eleitoral, nego provimento ao recurso, devendo se manter incólume a sentença de primeiro grau.” (Destacamos. Trecho de voto condutor proferido pelo Desembargador Eleitoral VLADIMIR SOUZA CARVALHO, acompanhado à unanimidade)8 Assim, entendo ser crível admitir que nos presentes autos não houve suficiente comprovação de viés eleitoreiro na prática de distribuição de água colhida em fonte da pessoa jurídica onde o candidato eleito/recorrente é sócio. À propósito, pedindo vênia para aderir ao raciocínio argumentativo desenvolvido pelo Dr. RODRIGO JÚDICE, é necessário ter em mente que acaso tivesse o recorrente DANIEL SANTANA BARBOSA negado auxílio à população necessitada, o comportamento certamente seria explorado politicamente pelos candidatos opositores. Ou seja, a análise do caso sob julgamento não pode deixar de considerar o perigo de dano reverso (in casu, podemos chamar de abuso de poder econômico reverso e cuja decisão cautelar não considerou à época) que teria o candidato caso passasse a vender a água aos populares Mateenses ao invés de auxiliar no período de reconhecida crise hídrica. Ademais, também foi oportuno o raciocínio desenvolvido pelo voto divergente no seguinte: “[...] Voltando aos autos, observo que a acusação impingida aos recorrentes é de abuso do poder econômico devido ser a água, por certo, um bem economicamente apreciável e, digo mais, imprescindível à vida. Teriam eles, então, a partir da versão constante da representação eleitoral, absorvida e ratificada pelo Ministério Público Eleitoral, aproveitado a oportunidade da crise hídrica para, exclusivamente, em benefício próprio captar dividendos (votos) eleitorais para a eleição de 2016. Penso ser uma interpretação e uma conclusão equivocadas, pequenas diante da magnitude da crise que assolou e ainda assola o município de São Mateus que sofre há anos com a falta água. Agiu certo a Empresa Litorânea S/A, da qual Daniel Santana Barbosa é seu acionista, pois atendeu prioritariamente o que está no inciso II, do art. 1o da Lei no 9.433/97. No caso concreto dos autos, à luz de toda a realidade fático-jurídica retratada, o confronto entre as regras infraconstitucionais 8. Digno de nota registrar que a questão chegou a ser novamente reafirmada em julgamento de embargos declaratórios, onde a ementa foi a seguinte: “Eleições de 2016. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Captação ilícita de sufrágio não reconhecida. Embargos de Declaração. Omissão e contradição no julgado recorrido. Inexistência. 1. Os embargos de declaração são admissíveis quando houver obscuridade a ser esclarecida, contradição a ser eliminada, omissão a ser suprida e/ou erro material a ser corrigido (Código Eleitoral, art. 275). 2. Hipótese em que o julgado rechaçado analisou a pretensão da recorrente à luz do conjunto de elementos reunidos nos autos, tendo a Corte entendido que o cenário fático-jurídico examinado não caracterizou a prática de captação ilícita de sufrágio, nos termos da legislação de regência (Lei 9.504, de 1997, art. 41-A), porquanto, para tanto, far-se-ia elementar que a distribuição de água verificada, sobretudo a partir da prova testemunhal, estivesse associada ao específico fim de obtenção de voto descrito na norma, o que ficou aqui claramente afastado, pelos argumentos consignados na oportunidade, sendo certo que sequer restou comprovado que a então candidata tivesse, pessoalmente, distribuindo água por caminhão-pipa, já que a ação identificada, nesse sentido, envolveu familiares da demandada, dentro de um contexto em que a conduta ocorre há muitos anos e sem qualquer conotação eleitoral. As razões de decidir, devidamente trazidas no acórdão, desconfiguram a omissão suscitada pela embargante, o que igualmente se tem quanto ao outro vício levantado, porquanto a contradição é defeito interno do julgado, ao asseverar o tempo inteiro uma verdade e, no final, concluir com outra, o que, aqui, no caso, também não ocorreu. 3. Inocorrência de omissão e de contradição. 4. Aclaratórios desprovidos.” (TRE-PE - RE: 12802 RECIFE - PE, Relator: VLADIMIR SOUZA CARVALHO, Data de Julgamento: 14/08/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 181, Data 18/08/2017, Página 8-9 - destacamos) 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 287
constantes do inciso II, do art. 1o da Lei no 9.433/97 e do art. 22 da Lei da Lei Complementar no 64/90, prevalece o comando normativo da primeira, excluindo a aplicação das consequências político-jurídicas previstas na segunda. Em conflito de regras, uma está a excluir a aplicação da outra. No plano principiológico, o conflito entre princípios constitucionais, aplica-se a ponderação. No caso concreto, o entrechoque, de um lado, entre os princípios da preservação da vida e da dignidade humana, e, de outro, do princípio da repressão ao abuso do poder econômico para fins eleitorais, prevalecem os primeiros dado a sua primazia na escala de valores constitucionais.” (Destacamos) Ainda na mesma toada de pensamento, trago algumas recomendações feitas pelo Professor FABIO KONDER COMPARATO9, que reputo aplicáveis ao caso sob julgamento: “Com isto, ao concluir esta segunda parte de minha exposição, permito- me fazer aos juizes as seguintes recomendações: [...] 2. Ao verificar que a aplicação de determinada regra legal ao caso submetido a julgamento acarreta clara violação de um princípio fundamental de direitos humanos, muito embora a regra não seja inconstitucional em tese, o juiz deve afastar a aplicação da lei na hipótese, tendo em vista a supremacia dos princípios sobre as regras, o que acarreta a necessidade lógica de se interpretarem estas em função da norma de princípio. 3. Na eventual colisão entre dois princípios para a solução da lide, o juiz deve preferir aquele cuja aplicação ao caso representa maior respeito à dignidade humana. 4. No exercício da função jurisdicional, os magistrados, como todos os demais agentes públicos, devem orientar-se pelos objetivos supremos de nossa organização política, expressos no art. 3. da Constituição Federal, os quais expressam os grandes valores de liberdade, igualdade e solidariedade, em função dos quais constituiu-se, progressivamente, o sistema de direitos humanos. [...]” De igual modo, o raciocínio trilhado encontra guarida nos ensinamentos de ROBERT ALEXY10 ao propor um método de solução. O autor que esteve Espírito Santo na semana passada, leciona que por mais que um princípio prevaleça em face do outro, isso não enseja na invalidação do tal enunciado principiológico e, nem que haja a necessidade de se apresentar uma cláusula de exceção. Desta feita, aponta que a solução dar-se-ia na 9. COMPARATO, Fabio Konder. O papel do juiz na efetivação dos direitos humanos. Disponível em: <http://www.dhnet. org.br/direitos/militantes/comparato/comparato_juiz.html>. Acesso em: 30/10/2017. 10. Tradução livre. ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. 3.ed. Madrid, 2002, p.90 288 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
base da ponderação de interesses opostos apresentados no caso concreto. E assim, verificar na situação, qual princípio possui mais peso. Por derradeiro, importante registrar apontamento do Professor SAMUEL MEIRA BRASIL JÚNIOR11, que em sua festejada obra (que não me canso de citar) conclui existir dificuldade de atribuição para cada argumento, ao aplicar o critério de ponderação aos princípios; e afirma que “esse problema revela-se uma questão aberta, pois a ponderação envolve um juízo qualitativo, e não um juízo meramente quantitativo de razões”.12 Em conclusão, para não me alongar ainda mais, ratifico os demais fundamentos apresentados pelo voto divergente – respeitosamente, adotando-os também como meus -, por acreditar terem sido fruto do mais adequado reflexo jurídico do propósito poético pensado por TOBIAS BARRETO ao referir-se ao ‘direito’; ou seja, certamente o voto foi fruto do sentimento que Sua Excelência, Dr. RODRIGO JÚDICE, experimentou como Secretário Estadual de Meio Ambiente no período de janeiro de 2015 a abril de 2016. Mas também ressalto que os votos manifestados em sentido contrário à divergência, são igualmente carregados de sentimento, percepção e grande técnica aplicada, principalmente pelo Dr. MARCUS VINICIUS COSTA, em seu minucioso voto. Ao fim e ao cabo, creio estamos diante de um dos “casos difíceis” que a doutrina de RONALD DWORKIN exemplifica. Portanto, parabenizo publicamente os Colegas que demonstraram em seus votos características do “juiz Hércules” (aquele juiz com completude de conhecimentos). Assim, pedindo vênia aos que entendem em contrário e ressaltando a qualidade do voto elaborado pelo sobremodo culto Relator Dr. MARCUS VINICIUS COSTA, reformulo meu voto para aderir à divergência iniciada pelo também culto Dr. RODRIGO JÚDICE e votar no sentido de dar provimento aos recursos interpostos por DANIEL SANTANA BARBOSA e JOSÉ CARLOS DO VALLE ARAÚJO DE BARROS. É como voto. 11. BRASIL JÚNIOR, Samuel Meira. Justiça, direito e processo: a argumentação e o direito processual de resultados justos. São Paulo: Atlas, 2007, p. 108. 12. Também afirma conclui que “39. No domínio jurídico, o peso dos argumentos pode ser atribuído por uma regra ou por um princípio. Para sobrepujar o peso de uma regra legal, é necessário outra legal ou um princípio com peso superior ao da regra.” (Op. Cit. p. 187) E me parece ser o caso de obter um julgamento justo, reconhecendo que a conduta altruísta do recorrido deva ser valorizada em razão do caráter social e humanitário inafastáveis diante da crise hídrica notória; afastando-se no caso concreto o abuso de poder econômico. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 289
COPEJE COLÉGIO PERMANENTE DE JURISTAS DA JUSTIÇA ELEITORAL ÂNGELA ISSA HAONAT (JUÍZA DO TRE - TO) TRE/TO - RE - Nº 290-85.2016.6.27.0004 TEMA Abuso de Poder RELATÓRIO Trata-se de Recurso Eleitoral interposto pelo Ministério Público Eleitoral – 4ª ZE em face da sentença em juízo de retratação proferida pelo Juízo da 4ª Zona Eleitoral (Colinas do Tocantins/TO), que, acolheu os Embargos de Declaração com Efeitos Infringentes interposto pelos recorridos Paulo Izaias Primo e Leandro Coutinho Noleto e, ainda, em juízo de retratação o Recurso Eleitoral interposto por José Edson Aquino, todos candidatos eleitos a vereadores no Município de Colinas do Tocantins/TO nas Eleições 2016, tendo a referida decisão extinguido a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), nos termos dos artigos 485, inciso IV e 487, inciso I, ambos do CPC/2015. Sentença Publicada no DJE/TO em: 29/06/2017 (fl. 750); Recurso Eleitoral interposto em: 03/07/2017 (fl. 751-765); Atribuído ao gabinete em: 16/10/2017 (fl. 856); 290 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Ação: AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada pela COLIGAÇÃO “É TEMPO DE MUDAR PARA MELHORAR” (PRB/PROS/PTN/PPL/PPS/PHS/PRP/PTC/ PSDC/SD/PSL/) em desfavor de (a) FABRYCIO JERÔNIMO SANTANA DA SILVA e (b) JOSÉ MARCELINO SOBRINHO, respectivamente candidatos a prefeito e vice-prefeito no Município de Colinas do Tocantins/TO pela Coligação “COLINAS NO RUMO CERTO” (PT/ PV/PMN/PSC/DEM/PSD/PC DO B/PRTB/PMDB), (c) LEANDRO COUTINHO NOLETO, candidato a vereador pela Coligação “COLINAS SEMPRE AVANÇANDO” (PT/PC DO B) e (d) JOSÉ SANTANA NETO, Prefeito Municipal do Município de Colinas do Tocantins/TO, por abuso de poder político configurado por meio de manipulação na distribuição de casas populares construídas por via do programa Minha Casa Minha Vida do Governo Federal no Município de Colinas do Tocantins/TO, com o fito de captação ilícita de sufrágio nas Eleições 2016, na qual requer a cassação dos registros dos candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador, e ainda a declaração de inelegibilidade dos candidatos e do prefeito em exercício. Consta na inicial que o prefeito em exercício José Santana Neto para beneficiar a campanha eleitoral do seu sobrinho, o candidato a prefeito Fabrycio Jerônimo Santana da Silva, que também seria filho da deputada Amália Santana, juntamente com o ex-secretário de habitação e candidato a vereador, o Sr. Leandro Coutinho Noleto, distribuíram de forma manipulada, por meio de indicação e escolha de pessoas, em torno de 1.000 (mil) casas, construídas nos anos de 2015 e 2016 por meio do programa Minha Casa Minha Vida do Governo Federal no Município de Colinas do Tocantins/TO. A distribuição por meio de indicação de pessoas tinha por objetivo a captação de votos dos beneficiados com os imóveis para que estes votassem nos candidatos Fabrício Jerônimo Santana da Silva, José Marcelino Sobrinho e Leandro Coutinho Noleto (fls. 2-8); Documentos que instruíram a inicial: Os requerentes juntaram com a inicial: 1. 01 CD contendo fotos e vídeos da campanha do candidato a prefeito Fabrycio Jerônimo Santana da Silva na qual faz referência ao programa habitacional de construção e distribuição de casas, vídeo da Prefeitura de Colinas do Tocantins/ TO divulgando a construção e distribuição das casas, e ainda dos documentos de fls. 10-44 (fls. 09); 2. Portaria de instauração de Inquérito Civil Público n. 001/2016 do Ministério Público do Estado do Tocantins (fls. 10/11); 3. Portaria nº 03 – Instauração de Procedimento Administrativo do Ministério Público do Estado do Tocantins (fls. 12/13); 4. Impressão da página do site t1noticias.com.br informando a divulgação de lista de pré-selecionados no programa habitacional (fls. 14/15); 5. Ofício do Prefeito Municipal, José Santana Neto, convidando a representante do Ministério Público Estadual para entrega das casas (fls. 16); 6. Ofício do Secretário de Habitação, Leandro Coutinho Noleto, ao Ministério Público Eleitoral prestando esclarecimentos sobre o programa habitacional (fls. 17-18); 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 291
7. Termo de declarações no Ministério Público Eleitoral de Leandro Coutinho Neto (fls. 19-20), Marcos Antônio Lopes Lima (fls. 36-38), Beatriz Maria da Silva (fls. 39/40); 8. Relação de beneficiários aptos para sorteio (fls. 22-35). Recebimento da inicial: 18/09/2016 (fls. 46); Comunicação ao Ministério Público Eleitoral de ajuizamento da AIJE: Ofício recebido em 19/09/2016 (fls. 47). Contestação: A notificação dos requeridos efetivou-se em 19/09/2016 (fls. 48), tendo estes apresentado defesa e documentos (fls. 49-85) em 24/09/2016, alegando, em suma, que as acusações são inverídicas, não havendo nos autos provas que comprovem a ocorrência de condutas ilícitas por parte dos representados, e ainda que as provas juntadas aos autos são reproduções do Inquérito Civil instaurado pelo Ministério Público Eleitoral, procedimento este realizado sem o crivo do contraditório e da ampla defesa. Requer a rejeição da AIJE (fls. 49-85); Despacho saneador determinando a designação de audiência de instrução e julgamento do processo: 25/09/2016 (fls. 87); Juntada de documentos pelo Ministério Público Eleitoral oriundos dos autos da Ação Civil Pública n.º 0003496-63.2016.827.2713: 28/09/2016 (fls. 88-122) e 03/10/2016 (fls. 123-128); Despacho determinando vista ao Ministério Público Eleitoral: 11/10/2016 (fls. 130); Aditamento da inicial efetivado pelo Ministério Público Eleitoral: 14/11/2016 (fls. 131-207) com inclusão de 7 (sete) requeridos no polo passivo da AIJE: a) José Edson de Aquino – candidato a vereador - reeleição; b) Marceli Rodrigues de Amorim – candidato a vereador - reeleição; c) Raimunda Almeida de Souza – candidata a vereadora - reeleição; d) Paulo Izaiais Primo – candidato a vereador - reeleição; e) José Inácio de Moura – candidato a vereador - reeleição; f) Ivanilson Maranhão dos Santos – candidato a vereador; g) João Francisco Coelho – candidato a vereador. Despacho determinando a manifestação da parte requerida: 15/11/2016 (fls. 207-verso); Manifestações ao aditamento da inicial: 27/11/2016 (fls. 210-214) Os requeridos insurgem-se quanto ao aditamento da inicial por parte do Ministério Público Eleitoral, por importar em alteração dos polos ativo e passivo da ação, requerimento de juntada de novos documentos, arrolamento de novas testemunhas e, ainda, não havendo nos autos pedido desistência por parte autora “É TEMPO DE MUDAR PARA MELHORAR” (PRB/ 292 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
PROS/PTN/PPL/PPS/PHS/PRP/PTC/PSDC/SD/PSL/), sendo que somente a parte autora estaria legitimada para propor substituição do polo ativo e passivo da demanda. Assevera, ainda, que a alteração do pedido inicial após a formação da triangulação processual, somente é possível até a citação do réu, sob pena de nulidade processual. Manifestam-se de forma contrária ao aditamento e requerem o desentranhamento da petição e dos documentos juntados aos autos pelo Ministério Público Eleitoral; Despacho recebendo o aditamento do Ministério Público 4ª Zona Eleitoral: 07/12/2016 (fls. 218); Juntada de novos documentos pelo Ministério Público da 4ª Zona Eleitoral: 08/12/2016 (fls. 221-245); Defesas apresentadas pelo requeridos incluídos no aditamento do Ministério Público 4ª Zona Eleitoral. José Inácio de Moura (fls. 263-267); Raimunda Almeida de Souza (fls. 268-284); João Francisco Coelho, José Edson de Aquino, Ivanilson Maranhão dos Santos, Paulo Izaías Primo e Marceli Rodrigues de Amorim (fls. 285–332); Juntada de novos documentos pelo Ministério Público 4ª Zona Eleitoral: 05/01/2017 (fls. 342-423); Despacho de designação audiência de instrução: 12/01/2017 (fls. 426); Documentos juntados em audiência pelos requeridos: fls. 431-523; Alegações finais: Raimunda Almeida de Souza (fls. 528-546); Fabrycio Jerônimo Santana da Silva, José Marcelino Sobrinho, Leandro Coutinho Noleto, José Santana Neto, João Francisco Coêlho, José Edson de Aquino, Ivanilson Maranhão dos Santos, Paulo Izaias Primo e Marceli Rodrigues de Amorim (fls. 547-565); Sentença: 31/01/2017 (fls. 566-578) julgou: a) Improcedentes os pedidos em relação aos requeridos: 1. José Santana Neto; 2. Fabrycio Jerônimo Santana da Silva; 3. José Marcelino Sobrinho; 4. Marceli Rodrigues de Amorim; 5. Raimunda Almeida de Souza; 6. José Inácio de Moura; 7. Ivanilson Maranhão dos Santos; 8. João Francisco Coêlho. b) Procedentes, em parte, os pedidos em relação aos requeridos: 1. Leandro Coutinho Noleto; 2. José Edson de Aquino; 3. Paulo Izaias Primo. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 293
Recurso Eleitoral de José Edson de Aquino (fls. 582-611): requereu a reforma da sentença, preliminarmente, por violação do devido processo legal e da ampla defesa ocorridos em virtude do aditamento do Ministério Público Eleitoral e, no mérito, por insuficiência de provas; Paulo Izaias Primo interpôs Embargos de Declaração com Efeitos Infringentes (fls. 617-640): requereu a reforma da sentença, preliminarmente, por violação do devido processo legal e da ampla defesa ocorridos em virtude do aditamento do Ministério Público Eleitoral e, no mérito, por insuficiência de provas; Leandro Coutinho Noleto interpôs Embargos de Declaração com Efeitos Infringentes (fls. 641-661): requereu a reforma da sentença, preliminarmente, por violação do devido processo legal e da ampla defesa ocorridos em virtude do aditamento do Ministério Público Eleitoral e, no mérito, a improcedência por ausência de ato ilícito e insuficiência de provas; Contrarrazões do Ministério Público Eleitoral aos Embargos de Declaração com Efeitos Infringentes de Paulo Izaias Primo e Leandro Coutinho Noleto (fls. 666-680); Certidão de trânsito em julgado parcial da sentença, com data de 03/02/2017 (fls. 681), em relação aos requeridos: 1. José Santana Neto; 2. Fabrycio Jerônimo Santana da Silva; 3. José Marcelino Sobrinho; 4. Marceli Rodrigues de Amorim; 5. Raimunda Almeida de Souza; 6. José Inácio de Moura; 7. Ivanilson Maranhão dos Santos; 8. João Francisco Coêlho. Continuando a ação em relação aos recorridos Paulo Izaias Primo, Leandro Coutinho Noleto e José Edson Aquino Contrarrazões do Ministério Público 4ª Zona Eleitoral ao Recurso Eleitoral interposto por José Edson de Aquino (fls. 684-692); A Sentença do Juízo de Retratação após sentença proferida em 31/01/2017 (fls. 694-748), datada de 28/06/2017, julgou: 294 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
a) Acolhido os Embargos de Declaração de Paulo Izaias Primo e emprestou, em parte, efeitos infringentes, para decretar a nulidade do processo a partir da decisão de recebimento do aditamento em relação ao embargante, incluído no polo passivo da demanda pelo Ministério Público Eleitoral; b) Acolheu o Recurso Eleitoral interposto por José Edson de Aquino, em juízo de retratação, a preliminar de nulidade levantada no recurso eleitoral e decretou a nulidade do processo a partir da decisão de recebimento do aditamento, incluído no polo passivo da demanda pelo Ministério Público Eleitoral; c) Acolhido, em parte, os efeitos infringentes, nos Embargos de Declaração de Leandro Coutinho Noleto, para julgar improcedentes os pedidos da inicial. Razões recursais do Ministério Público Eleitoral: (fls. 751-765) Aduz que o aditamento da inicial após a contestação dos recorridos não afrontou o princípio da estabilização da demanda, porquanto houve a oportunidade destes regularmente se manifestarem no processo. Arrazoa que todos os fatos elencados no mencionado aditamento tiveram como objetivo comprovar o exposto na petição inicial, na tentativa de melhor formar o juízo de convicção do magistrado. Pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja restaurada a sentença inicial (fls. 566-578); Contrarrazões de Paulo izaias Primo ao Recurso Eleitoral do Ministério Público Eleitoral (fls. 767-789): Em contrarrazões, sustentou, preliminarmente, (a) a ocorrência de ofensa ao princípio do devido processo legal com o aditamento da inicial pelo Ministério Público Eleitoral após a contestação dos recorridos, (b) nulidade da prova colhida nos autos da Ação Civil Pública – aplicação da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada –, (c) impossibilidade de violação da regra da estabilização da demanda com o aditamento da petição inicial sem o consentimento dos requeridos, e, (d) no mérito, pediu a improcedência dos pedidos dos recorrentes, por insuficiência de provas, e a manutenção da sentença de fls. 694-748. Contrarrazões interpostas por Leandro Coutinho Noleto ao Recurso Eleitoral do Ministério Público Eleitoral (fls. 790-816): Em contrarrazões sustenta, preliminarmente, (a) possibilidade ou não de aditamento da inicial pelo Ministério Público Eleitoral após o saneamento do processo, (b) a existência de omissões e contradições na sentença de 31/01/2017 (fls. 566-578), (c) no mérito pede a improcedência dos pedidos dos recorrentes por insuficiência de provas e consequente manutenção da sentença de fls. 694-748. Contrarrazões interpostas por José Edson de Aquino ao Recurso Eleitoral do Ministério Público Eleitoral (fls. 819-846): (a) preliminarmente alega a nulidade do processo a partir do aditamento feito pelo Ministério Público Eleitoral por violação do devido processo legal, (b) no mérito alega que o Ministério Público Eleitoral nas razões recursais não indicou a conduta ou provas da participação do recorrido nas condutas relatadas no aditamento efetuado. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 295
Parecer do Ministério Público Eleitoral: O Procurador Regional Eleitoral opinou pelo provimento do recurso (fls. 852-855). Vieram-me conclusos os autos. É, em apertada síntese, o relatório. VOTO 1. Juízo de admissibilidade. Conheço do recurso, pois é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade. O recurso eleitoral interposto pelo Ministério Público Eleitoral tem por objeto a reforma da sentença (Sentença em juízo de retratação de fls. 694-748), que acolheu os Embargos de Declaração com Efeitos Infringentes interpostos pelos recorridos Paulo Izaias Primo e Leandro Coutinho Noleto e, ainda, em juízo de retratação o Recurso Eleitoral interposto por José Edson Aquino, todos candidatos eleitos a vereador no Município de Colinas do Tocantins/TO nas Eleições 2016, tendo a referida decisão extinguido a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), nos termos dos artigos 485, inciso IV e 487, inciso I, ambos do CPC/2015, em que lhes foram imputadas condutas que caracterizariam abuso de poder político configurado por meio de manipulação na distribuição de casas populares do programa Minha Casa Minha Vida do Governo Federal no Município de Colinas do Tocantins/TO, com o fim de captação ilícita de sufrágio nas Eleições de 2016. Como há preliminares, passo inicialmente à sua análise. 2. Preliminares. 2.1. Afronta ao Princípio do Devido Processo Legal e ao Princípio da Estabilização da Demanda. O recorrente pugna pela reforma da sentença de fls. 694-748 que acolheu a preliminar de afronta ao Princípio da Estabilização da Demanda nos embargos de declaração com efeitos infringentes interpostos pelos recorridos Paulo Izaias Primo e Leandro Coutinho Neto e, ainda, em juízo de retratação, no recurso eleitoral interposto pelo recorrido José Edson de Aquino. 296 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
Os recorridos reiteram, preliminarmente, a afronta ao Princípio do Devido Processo Legal e ao Princípio da Estabilização da Demanda ocorrido com o aditamento da inicial pelo Ministério Público Eleitoral da 4ª Zona que até então atuava como fiscal da ordem jurídica. A controvérsia cinge-se na análise se ocorreu ou não afronta ao Princípio da Estabilização da Demanda, a partir do aditamento da inicial efetivado pelo Ministério Público Eleitoral, que atuava como fiscal da ordem jurídica (custus iuris), ocorrido sem o consentimento dos requeridos, sendo o aditamento posterior à citação e ao despacho saneador. O Novo Código de Processo Civil prescreve que: Art. 329. O autor poderá: I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu; II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar. Marinoni, Arenhart, Mitidiero1 ensinam que “Alteração é gênero de que é espécie a modificação e a adição (art. 329, CPC). Com a modificação altera-se o preexistente; com a adição soma-se algo novo ao que preexiste. É possível alterar a causa de pedir e o pedido, sem o consentimento do demandado, até a citação; com o seu consentimento é possível alterá-los até o saneamento do processo.” A análise da cronologia processual demonstra que o aditamento efetivado pelo Ministério Público Eleitoral, que até então atuava como fiscal da ordem jurídica (custus iuris), ocorreu 54 dias após tomar conhecimento da ação (fls. 47). Cabe pontuar, ainda, que a citação dos requeridos arrolados na inicial ocorreu em 19/09/2016 (fls. 48), defesas apresentadas em 24/09/2016 (fls. 49) e despacho saneador (fls. 87) efetivado em 25/09/2019. Os recorridos ao serem intimados manifestaram-se contrários ao aditamento da inicial efetivado pelo recorrente (fls. 210-214). O recorrente sustenta que os recorridos tiveram ciência do aditamento da inicial, foi-lhes oportunizado manifestar-se, o que por si só seria o bastante para corroborar a decisão que deferiu o aditamento. O Tribunal Superior Eleitoral fixou o entendimento que a estabilização da demanda se aplica às ações eleitorais: “Consoante a teoria da estabilização objetiva da lide, 1. Marinoni, Arenhart, Mitidiero, Novo Código de Processo Civil Comentado, 3 ed., 2017, p. 433. 297 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
o pedido ou a causa de pedir podem ser modificados até a fase de saneamento do processo e desde que anuído pelo réu, reabrindo-se o prazo para o contraditório e para que se produzam provas, nos moldes do art. 329, II, do CPC/2015. Precedentes, destacando-se a AIJE 1943-58/DF – 9/6/2017 (caso “Chapa Dilma-Temer” ) - RESPE - Recurso Especial Eleitoral n.º 4-38.2017.600.0000, Relator Min. Jorge Mussi, em 10-4-2018).” A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assenta-se no sentido que mesmo diante fatos novos não é possível a alteração objetiva da demanda, sem o consentimento do demandado, vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. EMENDA APÓS APRESENTAÇÃO DA CONTESTAÇÃO E DO SANEAMENTO DO PROCESSO. MODIFICAÇÃO DO PEDIDO OU DA CAUSA DE PEDIR. IMPOSSIBILIDADE. 1. Recurso especial interposto em 06/08/2015 e atribuído ao gabinete em 25/08/2016. 2. Descabe a emenda da petição inicial após o oferecimento da contestação e o saneamento do processo, quando essa providência importar alteração do pedido ou da causa de pedir (art. 264, parágrafo único, CPC/73). 3. A adoção desse entendimento não se confunde com o rigorismo do procedimento. Ao contrário, firma-se no princípio da estabilidade da demanda, consubstanciado no art. 264 do CPC/73. 4. Com a estabilização da demanda, é inaplicável o art. 284 do CPC/73, quando a emenda implicar a alteração da causa de pedir ou do pedido, ou violar os princípios do contraditório e da ampla defesa. 5. Recurso especial conhecido e não provido. (STJ - REsp 1678947/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/03/2018, DJe 20/03/2018). Como consigna Hermes Zanetti Júnior o Brasil adotou com o CPC de 2015 um modelo de precedentes normativos formalmente vinculantes. (2017, p. 525-526) consignando em rol não taxativo no art. 927 a forma das técnicas para a externalização das decisões jurídicas, que se aplicam com força normativa independentemente das boas razões – a partir da identificação dos fundamentos determinantes e da relação desses fundamentos com o caso em julgamento (art. 489, § 1º, V). Ademais, os juízes ao decidir devem observar as regras prescritas no art. 9272 em sua integralidade, destacando-se aqui os incisos IV e V, os quais vislumbro, foram 2. Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. 298 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
devidamente corrigidos na sentença que em juízo de retratação extinguiu a AIJE em questão. Neste sentido rememoro as lições de Joseph Raz citado por (Enríquez, 2015, p.348), para quem, ao se trabalhar com o direito, faz-se fundamental estabelecer o que foi feito pelas autoridades produtoras da norma, bem como qual norma se aplica ao caso. Evidente nos autos que os recorridos a todo tempo consignaram o seu inconformismo com aditamento efetivado pelo recorrente após a citação dos primeiros representados, demonstrando que houve afronta às garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa e ao Princípio da Estabilização da Demanda. No meu sentir ao Juiz Eleitoral, condutor do processo à época, cabia corrigir a postura ministerial, por manifesta afronta ao Princípio da Estabilização da Demanda, no entanto o mesmo deu desenvolvimento à instrução e julgamento. A atividade jurisdicional está limitada ao pedido e a causa de pedir deduzida pela parte, sob pena de incorrer a sentença em nulidade por ofensa ao princípio da congruência. Observa-se que na sentença de retratação recorrida, o magistrado, por estar em desacordo com as regras processuais, chamou o feito a ordem e procedeu à correção da marcha processual ao acolher os embargos de declaração com efeitos infringentes e o recurso eleitoral, em juízo de retratação, interposto pelos recorridos, ao decretar a nulidade do processo a partir da decisão de recebimento do aditamento em relação a Paulo Izaias Primo e José Edson de Resende, tendo, no entanto, ressalvaldo os atos processuais e provas em relação ao recorrido Leandro Coutinho Noleto. Os recorridos em suas contrarrazões, reiteram que o aditamento a um só tempo alterou os polos ativo e passivo da ação, juntou novos documentos e arrolou novas testemunhas. Apontam, também, a inexistência de pedido de desistência expresso ou tácito por parte da Coligação autora que legitimasse a substituição processual e, registra que a inclusão dos novos requeridos na ação, não se tratava de litisconsórcio unitário ou litisconsórcio passivo necessário. O recorrente em suas razões informa que o aditamento ocorreu somente em 14- 11-2016 em razão pois aguardava o desenrolar da Ação Civil Pública n.º 0003496- 63.2016.827.2713 que foi ajuizada em 8/9/2016. No entanto, foge à razoabilidade o extenso prazo de 68 dias, após a propositura da ACP, para a efetivação do aditamento visto que a cronologia dos fatos demonstra que não foram causas supervenientes (art. 342, I, do CPC) que foram trazidas na peça ministerial, mas sim os mesmos fatos que motivaram o ajuizamento da ACP. Registra-se que o recorrente poderia de igual modo ter ajuizado ação eleitoral específica desde o registro de candidatura até a diplomação dos eleitos ou ter efetivado o aditamento em 19-9-2016 com as mesmas provas colhidas no inquérito civil que subsidiou a propositura da ACP a fim de apurar se as condutas dos demandados estariam ligadas ou não ao pleito municipal de 2016. 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 299
O magistrado manifestou-se com propriedade sobre os fatos na sentença recorrida: ‘Percebe-se que não houve motivo plausível para o retardamento da emenda da petição inicial, fato que inclusive gerou tumulto processual, em razão da demora da oitiva das testemunhas. Embora seja louvável a atuação do Ministério Público Eleitoral, não é dado, entretanto, subjugar os cânones fundamentais do ordenamento jurídico ao interesse público, sem atentar que os outros direitos e valores igualmente relevantes são ofendidos, quando se potencializa a preservação interesse público. Não se autoriza o Ministério Público Eleitoral alterar a demanda no seu aspecto objetivo e subjetivo a qualquer tempo, nem quando é o autor, nem quando figura como fiscal da ordem jurídica. A preservação das regras processuais de estabilização da demanda (art. 329, CPC) é fluido decorrente do princípio da segurança jurídica e do devido processo legal, tendo em vista que o salto a esses postulados quebra a confiança em relação às expectativas básicas de quem participa do processo (fls. 726-727).’ Ademais, o entendimento desta Corte é de que o rito da ação de investigação judicial eleitoral (art. 22 da LC n.º 64/90) não contempla a hipótese de aditamento da inicial, vejamos: RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. PRIMEIRA PRELIMINAR. DESENTRAMENTO DE DOCUMENTOS. REJEITADA. SEGUNDA PRELIMINAR CERCEAMENTO DO DIREITO DE ACUSAÇÃO. OITIVA DE TESTEMUNHAS. INTIMAÇÃO JUDICIAL PARA AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. POSSIBILIDADE. BUSCA DA VERDADE REAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O rito da investigação judicial, prevista nos incisos do art. 22 da LC nº 64/90, não contempla a hipótese de aditamento da inicial. Assim, necessária se faz a aplicação subsidiária dos preceitos ditados pelo Código Processo Civil para a matéria. 2. O aditamento feito após a citação e até o saneamento do processo, que modifica o pedido ou a causa de pedir, exige o consentimento do réu (art. 329, inciso II, do CPC). 3. (...). 4. (...). 5. (...). 6. Recurso conhecido e provido. (TRE-TO - RECURSO ELEITORAL n 67625, ACÓRDÃO n 67625 de 16/10/2017, Relator(a) DENISE DIAS DUTRA DRUMOND, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 188, Data 18/10/2017, Página 4 e 5). 300 2ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE
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