POR QUE FUI ABANDONADO História, ilustração e diagramação Veridiana P.R. Castro
Isak, jovem inconformado com o abandono, revoltava-se contra tudo, contra todos e contra Deus. Não queria viver. Isolava-se de todos. Ia mal na escola e era agressivo com os colegas. Isak era revoltado porque tinha a lembrança de outra existência, de outra vida. Lembrava-se de ter vivido em outro lugar. De ter sido muito rico, dono de fazenda de engenho. Não se conformava de estar vivendo em orfanato. Não entendia porque vivia tão longe de tudo que fora na existência passada. Quando completou dezoito anos, recebeu o convite para passear no interior do Sudeste, em uma região onde havia várias propriedades que foram, no tempo do Brasil Império, ricos engenhos de açúcar ou fazendas de café. Durante a viagem, que se passou de carro, Isak foi observando a paisagem e, apesar de modificadas pelo tempo e pelos homens, reconheceu alguns lugares, rios e montanhas. Coração disparado pelas imagens, não sabendo bem o que ia encontrar, Isak permaneceu em silêncio.
Os amigos resolveram parar em um ponto turístico. Uma fazenda, antiga produtora de açúcar. O novo proprietário mantinha as construções e objetos do tempo em que o engenho estava ativo.
Isak afastou-se do guia e do grupo. Adentrou ambientes, observou móveis e objetos. Nas paredes haviam informações sobre os antigos donos, costumes e atividades desempenhadas pelos patrões e escravos. E, à medida que foi adentrando o casarão, descortinaram- se novas memórias.
De repente, lembrou-se de mulheres escravas implorando para que não lhes retirassem os filhos amados e pequenos. Mas, frio e calculando o lucro com a venda das crianças, as vendia como meras mercadorias. Uma das crianças se parecia com um amigo da escola. Aterrorizado perante as lembranças, Isak perde os sentidos e caiu desacordado no chão.
Alvoroço e cuidados para restabelecer-lhe os sentidos. Isak despertou angustiado. Queria sair dali o mais rápido possível. Seus amigos queriam saber se estava tudo bem. Como poderiam auxiliá-lo. Mas Isak apenas agradece os cuidados e disse que estava bem. Disse que deveria ter sido o calor. Afinal, estava muito quente aqueles dias. Isak retornou ao abrigo. Precisava refletir sobre as novas lembranças. Juntar as peças do quebra-cabeça. Sim, parecia tudo se encaixar, agora. Fôra rico fazendeiro, dono e comerciante de escravos. Agora, para saldar sua dívida perante a lei divina, cresceu órfão, para sofrer a dor da solidão.
Isak decidiu não reclamar mais de nada. Empenhou-se nos estudos. Arranjou emprego. Conheceu pessoas que lhe auxiliaram nesse novo aprendizado. Mais maduro, deixou o abrigo e foi morar sozinho. Isak, já rapaz, termina sua faculdade, casa-se e forma sua família. Daquele dia em diante, passou a viver com respeito e muita responsabilidade perante as leis divinas, porque compreendeu que a vida segue uma sucessão de acontecimentos, que toda ação gera uma reação – a chamada lei de causa e efeito – e, que as existências são solidárias, ou seja, nossas ações e conquistas morais e intelectuais não se perdem no fim de uma encarnação, mas nos acompanham pelas nossas diversas encarnações, onde quer que estejamos, porque estaremos sempre construindo nossos destinos sob a lei e a proteção de Deus – tal a lei do progresso e da nossa evolução.
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