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COLECTÃNEA-2.º CADERNO

Published by dvazchaves, 2020-06-01 11:29:52

Description: O Concelho de Montalegre ao vivo

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BARROSÕES ILUSTRES 50 BENTO da CRUZ Em nome da terra… Adão e Eva foram escorraçados para este vale de lágrimas. Mas hoje que estou velho, compreendo, final e dolorosamente, o mito dos paraísos Manuel Marinheiro, pai de Bento da Cruz, tinha catorze anos quando lhe morreu o perdidos. (…) . pai, deixando-lhe a pesada herança da responsabilidade de trabalhar e ajudar a criar sete irmãos. Com os seus irmãos crescidos, decidiu, aos trinta anos, constituir A Obra a sua própria família, casando com Maria Alves, da “Casa dos Morenos”. O seu enorme sentido de independência obrigou-o a começar de novo, já que não trouxera praticamente nada da casa de sua mãe. Com alguma ajuda do avô materno, foi erguendo a casa onde criou os oito filhos, dos quais formou três: Bento da Cruz, médico, Joaquim da Cruz, professor e advogado, e António Cruz, advogado. É por isso que, para Bento da Cruz, o pai foi o maior exemplo do valor da vida, do trabalho, da honestidade e do esforço abnegado em favor dos outros, experiência intensa e marcante para toda a vida. Aos quinze anos, Bento da Cruz entra para o Seminário, o Mosteiro Beneditino de Singeverga, onde estudou Humanidades. Desse tempo de noviço guardou uma firme e resistente formação, sustentada quer pela leitura das Escrituras, quer pelo contacto com os escritores da antiguidade clássica. Forma-se em Medicina em 1955, pela Universidade de Coimbra, tendo aberto, pouco tempo depois consultório em Montalegre. Regressa à terra já um homem, médico e poeta, que assume um compromisso com a verdade e correndo todos os riscos inerentes a esse empenhamento. É já na idade adulta que percebe a dimensão e a desdita de um povo encolhido, Paraíso da minha infância. Tempo de maravilhas. Era das repleto de saberes antigos, mas firmemente condenado ao isolamento e ao descobertas. Das coisas vistas pela primeira vez, das palavras ouvidas sofrimento. Depois de quinze anos do exercício da medicina na sua terra natal, pela primeira vez. fixa-se no Porto. Sempre que pode, percorre os caminhos de Barroso. A profundidade dos horizontes, o silêncio dos vales, o misticismo dos píncaros, a limpidez das torrentes, a garrulice das águas, a música dos pássaros, o perfume das plantas, a leveza da aragem, o límpido cristal das albufeiras, e melhor do que tudo isso, o carácter aberto, simples, generoso, acolhedor do povo barrosão. É deste entranhado apego à terra e às gentes, comparáveis a um paraíso, que os seus livros são inesquecíveis testemunhos. “Quando eu era um devorador de Bibliotecas, nem o Paradise Lost de Milton me escapou. E confesso que não fiquei muito entusiasmado (…). Nem admira. Era jovem de mais para me preocupar com a perda de qualquer paraíso, fosse a daquele donde os anjos rebeldes se precipitaram (…), fosse a daqueloutro donde

51 BARROSÕES ILUSTRES BENTO DA CRUZ A Obra | Continuação Em “nome da terra”… E noutro passo, Bento da Cruz refere-se assim às terras de Barroso, como um paraíso. É na expressão deste conceito que assenta toda a sua vida e toda a obra, e para o entendermos, é fundamental que saibamos observar e interpretar a sua existência como homem, como médico e como escritor. Em primeiro lugar, estão os pais, que surgem sempre aureolados de uma força e energia hercúleas; depois, a visão solidária com as gentes de Barroso, dos anos trinta e quarenta, procurando na compreensão dos outros, alento para os amar melhor. Foi esta tentativa de compreender os outros e de defender a verdade à qual se manteve sempre fiel, que alicerçou a sua obra. É um escritor que num contexto de vazio cultural de um país subdesenvolvido dos anos quarenta - principalmente pelo egoísmo de uns, a insensibilidade de outros e a fraqueza de muitos -, dedicou parte da vida na demanda da identidade desta região e desta gente, transmitindo, essencialmente hábitos, sentimentos e valores e perspectivando sempre a exemplaridade. A sua obra é o resultado de um trabalho exaustivo que percorre os lugares das suas próprias vivências, ouvindo, anotando e aprofundando tudo. Ainda que se considere que a vida e a obra são universos autónomos, existe aproximação entre eles e isto é, sem dúvida, revelador em Bento da Cruz pois, ao tratar-se de arte, estamos perante “um produto da experiência, de um modo de ser e de estar no mundo que se torna partilhável através da obra”, e além disso, “os modos de ser, sobrepõem-se na criação artística aos modos do fazer”. Assim, ficção e história pessoal projectam-se mutuamente. A sua escrita encontra fundamento na experiência directa dos campos, na vida vivida e partilhada, na força de carácter de todos quantos viveram nesse tempo e local onde o homem tinha como aspiração máxima, “até aos trinta anos ser valente e depois dos trinta ser honrado”. Não há dúvida, de que mesmo perante as vicissitudes do deserto cultural dos anos trinta e quarenta, este escritor teve a capacidade de observar e exprimir de forma exemplar, a dignidade de um povo, “criminosamente atrasado, ancorado em verdades simples, evidências, entreajudas, homens e mulheres maravilhosos que sempre souberam sublimar a incontornável submissão bíblica através de gestos inocentes e melodias breves que os fez criadores de mundos e de montanhas, e por isso talvez mais próximos das realidades divinas”. Urbano Tavares Rodrigues acentua, no prefácio de Contos de Gostofrio e Lamalonga, o esbatimento das fronteiras que separam o regional e o universal na obra de Bento da Cruz: “Eis como um livro tão voluntariamente localizado, fruto e expressão da experiência tão aderente de simpatia que permi- tiu a Bento da Cruz erguer a sua galeria de homens e bichos, e às vezes de homens-bichos, assim alcança a sua ampla universalidade”. Sem dúvida que este “Planalto de Gostofrio” - Terras de Barroso, é esse local sem paredes, esse punhado de terra onde habita um povo “espelho do mundo todo”. Assim, na obra do autor, o limite está, por um lado, nas fronteiras geográficas, e por outro, na psicologia/interioridade das pessoas que retrata. Sem dúvida que Bento da Cruz tem, na unidade da sua vasta obra, diversas faces e vertentes que ultrapassam a denominação restritiva de escritor regionalista. Sem dúvida que este “Planalto de Gostofrio” - Terras de Barroso, é esse local sem paredes, esse punhado de terra onde habita um povo “espelho do mundo todo”. Assim, na obra do autor, o limite está por um lado, nas fronteiras geográficas, por outro, na psicologia/interioridade das pessoas que retrata. Sem dúvida que Bento da Cruz tem, na unidade da sua vasta obra, diversas faces e vertentes que ultrapassam a denominação restritiva de escritor regionalista. Embora trate o regional, entende-se na sua obra força e exemplaridade suficientes para nos remeter para o universal. Bento da Cruz une o local e o universal na sua obra, servindo-se sobretudo, de estratégias narrativas que destacam o ser humano, as suas dores, alegrias e anseios em harmonia com a natureza e num contexto histórico que é constantemente actualizado pelo leitor, que o vê com fascínio, uma vez que toca a sensibilidade e as emoções do homem de qualquer tempo e lugar. Detectamos, na produção literária deste autor, a enorme capacidade de pintar com todas as cores as facetas do homem barrosão. Às vezes, ele próprio se confunde com as personagens das suas narrativas, “a riqueza de tintas emocionais da participação”, como lhe chamou Urbano Tavares Rodrigues, ao compartilhar com elas os dramas, as alegrias, as emoções das suas histórias impregnadas de sentimento humano. Ainda que a matéria-prima pareça confinada a uma região do país, as situações criadas por ele, rompem as barreiras temporais e geográficas, tornando-se comuns ao Homem. Bento da Cruz partilha connosco a viva experiência, distribuída em páginas bem escritas e significativas, e apesar de o seu espaço ser limitado geograficamente, os costumes e a linguagem transmitem a sensibilidade dos seres humanos que a habitam, encontrando, no fundo, eco nas maneiras de ser de todo o mundo e em toda a parte. Inevitavelmente, dá-se a partilha de uma arte tradicional que nos toca de tal modo, que persiste, resiste e não nos deixa indiferentes. “Não serão as marcas regionais, modalizações da sensibilidade do Homem e da Língua, num todo linguístico cultural?!.. ?!... ” Mais do que narrar a saga de um punhado de aldeões isolados do resto do país, e entregues à própria sorte, Bento da Cruz denuncia, com “tintas fortes”, a acção covarde dos que na década de quarenta, semearam a desigualdade, a fome e o medo. (Continua)

BARROSÕES ILUSTRES 52 A Obra | Continuação Em “nome da terra”… BENTO DA CRUZ É esta preocupação do autor que nos permite perceber como as linguagens popular e sobretudo regional, constituem elementos expressivos e estruturantes da obra em estudo. Nos seus romances, a adopção de princípios estéticos e de uma estratégia comunicativa relevantes, imprime-lhes singularidade e valor estilístico. Parece ser, então, intenção de Bento da Cruz, registar a linguagem vernácula, original, popular para reconstituir integralmente a vivência das gentes de Barroso, em particular do aldeão que habita as faldas do Larouco. Considerando que é a partir do local que se ascende ao universal, percebemos que Bento da Cruz possui aquela sabedoria, natural aos grandes criadores, que lhe permite, onde quer que se encontre, apreender o real, e a partir dele, construir as suas narrativas, O seu discurso, ultrapassa portanto a especificidade local, e na sua abrangência, integra a tradução de um código ético, o testemunho histórico, a revelação psicológica. Efectivamente, a obra deste escritor tem valor documental na medida em que traz No fundo, integra a essência folclórica, a utilização literária da fala dialectal, confrontando sempre o homem e a natureza, para as suas narrativas acontecimentos históricos, misturando verdade e ficção, difundindo uma qualidade simbólica ao mundo ficcionado. Assim, encontramos um desses raros momentos em que o principalmente na denúncia dos dramas, da miséria e da coragem de algumas das “regionalismo português” se desprende e afasta do simples documentário. Os Barrosões estar-lhe-ão por tudo isto personagens, apontando em particular, as causas dos excluídos. Nesse universo eternamente agradecidos. ficcional destaca-se um herói colectivo – o povo – “desses que (…) representavam a comédia da vida”, voluntariamente localizado, é certo, mas a viver e a sentir os sentimentos que não têm fronteiras. O ambiente geral dos seus romances é constituído pelos fragmentos de uma existência transmontana, pautada por diferentes lutas: a sobrevivência, a coesão social e até as variações políticas No Barroso, há a percepção do peso dessas variantes políticas, pois do mesmo modo que “muda o Governo, mudam as câmaras. Na de Montalegre, saíu a comandita dos camelos, clerical e monárquica, entrou a seita do Bitro, laicizante e democrática”, bem como da consciência da ditadura de Salazar e de Franco, porquanto os homens sentiam a necessidade de “iludir a vigilância dos “bufos” da PIDE” e de “ser solidários com “nuestros hermanos”, perseguidos pela barbárie fascista”, mesmo sabendo os riscos que corriam, pois sempre foram homens “amantes da liberdade, e da democracia”. Os transmontanos aprenderam a não ver “a Guerra Civil Espanhola como uma desgraça em casa do vizinho”, mas “seguir a par e passo as vicissitudes da guerra civil e “chorá-las” como perdas próprias. Bento da Cruz lembra e liberta - em termos artísticos de claro valor - o impasse, consequência das desigualdades sociais, através de um enorme sentido humano. É desta forma, com determinação e coragem, que a sua obra entra no quadro literário do país. Bento da Cruz também demonstra ter plena consciência da funcionalidade da língua e do domínio da componente lexical, procurando enquadrá-la e modelá-la naquele mundo, de forma coesa e lógica. As manifestações singulares da literatura oral, tanto de provérbios como de Fonte:Regionalismo/Universalismo em Bento da Cruz|Tese crenças, foram utilizadas e contextualizadas de forma natural e engenhosa. de Mestrado em estudos literários, apresentado à Faculdade Acentua-se sempre, o propósito de tornar presente a linguagem de uma região rica de Letras da Universidade do Porto, pela Dr.ª Cândida Pereira e exuberante a este nível. Assim este uso, para além de nos remeter para o dia-a- Gonçalves dia do povo de Barroso e caracterizar simultaneamente o seu modus vivendi e o mundo ancestral de transmissão de um saber colectivo, permite-nos também, detectar a alma das personagens, a íntima e profunda relação entre linguagem e psicologia.

53 UMA LIÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA Os quase 100 anos que vão de 1926 até aos nossos dias, são muito mais do que quase um século. Representam o fim de um ciclo e o princípio de todas as esperanças, de todas as ilusões e dos mais fantásticos anos das nossas vidas. Nesta edição da A Barrosana, recorda-se o velho ditador, desaparecido fez 50 anos ,neste passado mês de Agosto. IRENE FLUNSER PIMENTEL HISTORIADORA Geringonça!... “Eu achei 1926 – 2019 interessantíssima. NOVENTA E TRÊS ANOS QUE Cá está uma mudança, que não é VALEM POR UMA VIDA… revolucionária, não é uma mudança através de golpe de Estado e é uma mudança que ninguém esperou”. Irene Flunser Pimentel, nasceu em Lisboa, a 2 de Maio de 1950. É uma historiadora e investigadora portuguesa, dedicada ao estudo do período contemporâneo da História de Portugal. É licenciada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Mestre e Doutora em História Institucional e Politica do século XX, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Foi galardoada com o Prémio Pessoa em 2007 e recebeu o Prémio Máxima de Literatura, na categoria de Ensaio por A Cada Um o Seu Lugar. Foi condecorada com a Legião de Honra em Maio de 2015.

54 IRENE PIMENTEL \"Salazar tinha um certo desprezo pelos HISTORIADORA portugueses\" António de Oliveira Salazar é uma figura incontornável da história portuguesa e que continua a exercer fascínio sobre a população. É um caso semelhante ao de outros ditadores como Adolf Hitler ou Benito Mussolini. Não é por isso de estranhar o interesse da historiadora Irene Pimentel neste tema. Salazar e a PIDE já deram origem a livros da autora, que volta a debruçar-se sobre o ditador português. Desta vez porém, com um ângulo diferente. “Inimigos de Salazar” foi publicado pelo Clube de Autor e lançado no final de março. Este livro de Irene Pimentel destaca os homens das mais diversas áreas da sociedade portuguesa que fizeram frente a Salazar e ao Estado Novo. O livro deu o mote para esta entrevista de Irene Pimentel, na qual falámos ainda sobre o paralelismo que se pode traçar entre o período do Estado Novo, onde proliferavam várias ditaduras na Europa, e o período que se vive actualmente com o crescimento da extrema-direita e do populismo no Velho Continente. O percurso de vida de da historiadora e o seu gosto pela política foram outros dos assuntos abordados. Já escreveu vários livros relacionados com Salazar, o Estado mente ditas que se opuseram ao regime. Novo, a PIDE. Porque resolveu agora escolher este ângulo Este livro acaba por ter esse lado mais pessoal de cada dos inimigos de Salazar, estas várias figuras da vida militar, uma dessas figuras. política, civil? Exactamente. Embora sejam sempre pequeníssimas Eu já tinha dois livros, ou pelo menos dois temas de estudo, que biografias, porque houve muitas pessoas, e sejam sobretudo eram por um lado a polícia política do Estado Novo e portanto biografias políticas, portanto as opções políticas e de que do regime de Salazar e de Marcelo Caetano, e por outro lado um forma eles atuaram contra o regime ditatorial. livro sobre a oposição ao regime desde 1926 até 1974. Mas Temos aqui algumas figuras que a maioria dos eram livres bastante académicos. Aquele sobre a PIDE tinha a portugueses conhece. São os casos de Mário Soares, ver com a minha tese de doutoramento e o outro era bastante General Humberto Delgado, Álvaro Cunhal, mas depois volumoso. Vários professores de História perguntaram quando é temos muitas figuras que não são tão conhecidas. que fazia um livro mais ágil, por assim dizer, sobre o tema. E Muitos deles porque são mais velhos. Muitos deles atuaram resolvi, pegando nesses dois livros e na investigação que fiz já no período quer da República, quer depois da ditadura para esses dois livros, fazer um livro mais pequeno e mais militar e do salazarismo e muitos até morreram durante o agilizado sobre os inimigos de Salazar. Portanto é menos sobre período salazarista e muitos ficaram esquecidos. as instituições da oposição mas mais sobre as figuras própria- Há um aspeto muito importante. (Continua na página seguinte)

55 3 IRENE PIMENTEL “Eu tento dar um pouco uma imagem de HISTORIADORA todos os representantes dessa luta, muita (Continuação) dela inglória porque muitos nasceram, viveram e morreram em ditadura porque foi de tal maneira longa” O facto de ter havido censura, uma censura muito forte, União Soviética de Estaline. Porque é que isso acontece? É impediu essas pessoas de se expressarem na imprensa ou até porque os seus regimes estão muito bem organizados, publicamente e portanto não temos fontes que nos lembrem estruturados que silenciam quase completamente os quem foram essas figuras. Eu posso dar o exemplo do Francisco opositores? Cunha Leal, que foi claramente uma pessoa que se tornou num A ditadura portuguesa está bem estruturada e tem um quantidade inimigo político pessoal de Salazar. Havia um ódio muito grande enorme de ferramentas para não ser derrubada. Para falar só em de Salazar relativamente a ele e é uma inimizade que começa algumas, as próprias Forças Armadas que Salazar conseguiu logo na ditadura militar, ali por volta dos anos 30, e que tinha a domesticar a partir de 1937. E não é por acaso que quando uma ver com o facto de Cunha Leal, que era Governador do Banco de parte das Forças Armadas se revolta contra o regime devido à Angola, erguer-se contra a política colonial de Salazar. Guerra Colonial e é quando se dá o 25 de Abril. Mas depois E depois ao longo dos anos foi sempre uma figura que esteve tinha as polícias todas. Tinha a polícia política, que servia contra Salazar. Muitas vezes ele até era um colonialista, sobretudo para reprimir e neutralizar uma minoria, que era a digamos que ele não um crítico da política colonial por si mas minoria que atuava organizadamente, como o Partido Comunista da política colonial de Salazar. Mas havia ouras figuras mais e outras organizações. E mais tarde com o marcelismo, que não é jovens, estudantes, trabalhadores mas sobretudo a focado no livro, surgem outras organizações de luta armada e da intelectualidade que ao longo dos anos se foi renovando. esquerda radical. Escritores que também foram alvo da ditadura, artistas. Eu A censura é outro dos factores e também outra grande instituição tento dar um pouco uma imagem de todos os representantes que penso que apoiou muito o regime, que foi a Igreja Católica. dessa luta, muita dela inglória porque muitos nasceram, A Igreja e o Estado Novo têm uma matriz comum doutrinal e viveram e morreram em ditadura porque foi de tal maneira ideológica e aquilo que verificamos é que não só esta matriz é longa. E sobretudo a censura, a PIDE, eles desapareceram do comum ao Estado e à Igreja, como a ditadura é quase sempre espaço público e é um pouco fazer o papel da memória. apoiada pela hierarquia da Igreja. Não quer dizer que tenha sido Obviamente a censura teve um papel muito importante apoiada pela Igreja Católica no seu conjunto. A partir dos anos porque se calhar muitas pessoas não conhecem a 60 claramente se vê que começam a haver divergências. No caso preponderância que essas pessoas tiveram. Desde o 25 de da hierarquia, há a grande divergência em 58 do bispo do Porto, Abril levámos algum tempo a conhecer alguma dessas mas sobretudo depois de católicos, nomeadamente jovens histórias. estudantis e operários. E isso também é muito importante.No Por exemplo, outra figura que acho que é muito importante e entanto, não foram só estas questões. Internacionalmente o que não se fala muito, ao contrário de Delgado, é o Henrique Estado Novo pôde manter-se para além da derrota dos fascistas e Galvão. Ele é um figura, que tal com Humberto Delgado, vem de dos nazis. Em 1945 termina a guerra, são derrotados os fascistas dentro do regime, aliás de tal forma que ele era um dos e os nazis pelos aliados ocidentais, e toda a oposição pensou que Tenentes do 28 de Maio e o Estado Novo depois nomeia-o os Aliados não iriam deixar que o franquismo aqui ao lado e diretor da Emissora Nacional , que era um dos principais meios de propaganda do regime. Ele depois vira-se tanto contra o (Continua na página seguinte) regime que inclusive inaugura novas modalidades de oposição, como por exemplo a tomada do navio Santa Maria e o desvio do avião da TAP. É um inimigo que depois morre também no exílio. O Cardoso Pires, e eu cito essa frase no livro, diz que o período mais terrível que foi entre 1965 até 1968, aqueles últimos anos do salazarismo, e lembra-se que a própria censura usava o termo ‘essas figuras desapareceram’. Só para mostrar que havia esse propósito. Era um sinal que dizia à imprensa estes escritores não serão nunca publicados, não haverá entrevistas com eles, nada. Temos aqui um leque variado de figuras que foram inimigos de Salazar mas que não conseguiram derrubar esta figura. Mesmo depois de Salazar houve uma continuação do regime. Isso foi algo que aconteceu noutras ditaduras daquele período como na Alemanha nazi ou na

56 IRENE PIMENTEL HISTORIADORA “Os Aliados acharam que era preferível Salazar (Continuação…) continuar no poder do que uma democracia em que eventualmente o Partido Comunista tivesse mais força” o salazarismo permanecessem. Mas não se aperceberam na Foi um regime que de facto manteve-se durante muito tempo altura que estávamos a entrar numa nova fase, noutra e abrangeu várias gerações. Muitas gerações foram guerra, a Guerra Fria. Aí os Aliados tiveram como principal influenciadas desde muito cedo. Esse foi um dos fatores que adversário a União Soviética. Em 1949, quando Salazar contribuiu para solidificar o regime e para que se mantivesse consegue que Portugal seja um dos primeiros países da durante aquele tempo? NATO, a partir daí ele está praticamente garantido porque É um processo de ciclo vicioso. Eu acho que outra das os Aliados acharam que era preferível Salazar continuar no características de Salazar é que percebia bastante bem de que poder do que uma democracia em que eventualmente o forma os portugueses eram de uma forma geral. Temos de nos Partido Comunista tivesse mais força. O nazismo tem lembrar que a população daquela altura não tinha nada a ver com grandes diferenças. Além de ter o mesmo anti-comunismo, a população portuguesa atual. Era uma população muito rural, o mesmo anti-liberalismo, a anti-democracia, tem uma analfabeta, muito influenciada pela Igreja Católica. Salazar tinha componente racial que o salazarismo não teve. E por um certo desprezo pelos portugueses. Chegou a dizer que não exemplo, quer a Igreja Católica e a Igreja Protestante não eram rigorosos, que tendiam sempre a esperar que as coisas têm a preponderância no nacional-socialismo alemão, onde viessem de cima. Mas ele conseguiu que esse processo o poder gira todo em torno do Führer. E depois há muitas continuasse, ou seja transformou-se quase num código genético rivalidades. Eu não diria que o nacional-socialismo fosse um que podia não estar lá no início mas que ele foi reforçando. Penso regime unificado. Era um regime que assentava em muitos que essa tendência de esperar que as decisões venham de cima é pequenos poderes, todos com rivalidades uns com os algo que ainda se mantém. Qualquer dia já temos tantos anos de outros, sob a arbitragem de Hitler. A questão do racismo, e pós-ditadura como de ditadura e não podemos estar sempre a sobretudo do racismo anti-semita, vem diferenciar muito o culpabilizar o antigo regime pelo que se passa hoje. Mas é nacional-socialismo alemão do salazarismo português. E verdade que as mentalidades são o que mais demora a mudar. depois também há a questão expansionista. Enquanto que a Demoram a fixar-se e depois demoram muito a transformar-se. Alemanha e a Itália queriam a expansão, a atitude de Destes inimigos de Salazar, é possível eleger uma figura que Portugal era completamente diferente, era mais ele temesse mais? conservadora, de manutenção das colónias que já tinham e Eu diria que Delgado, a dada altura, é considerado um inimigo por outro lado de manutenção da neutralidade durante a principal, tanto que é assassinado pela PIDE. Como eu também Segunda Guerra Mundial, esperado passar entre os pingos refiro no livro, segundo a minha interpretação, a PIDE era um da chuva e realmente conseguiu. Estado dentro do Estado e Salazar podia não ter sabido o que iria Salazar parece ter conseguido jogar sempre bem. acontecer e sabido apenas posteriormente de que forma é que se Apesar da relação aos outros regimes fascistas, ele lidou com o caso de Delgado, mas havia aquela vontade de conseguiu manter sempre um distanciamento neutralizá-lo. Penso que ele é uma dessas figuras mais temidas, e suficiente ao ponto dos Aliados não acharem necessária isso pelas eleições de 1958. Mas Salazar também odiava Cunha a mudança de regime. Leal, por exemplo. Ao ponto dos académicos no estrangeiro, quando começam a analisar o salazarismo, têm tendência para dizer que é um (Continua na página seguinte) regime autoritário, mas não se referem tanto a ele como a uma ditadura e sobretudo diferenciam-no muito de outros regimes fascistas, e dando quase a entender que era uma democracia musculada, orgânica. Não estou muito de acordo com isso mas essa imagem foi passada por Salazar e teve uma eficácia. Ele refere o nazismo, o fascismo italiano nos ano 30 e 40 em textos e entrevistas, mas diz que o caso português é completamente específico com algumas parecenças mas com muitas diferenças. E isso foi muito eficaz até para com a própria oposição porque no pós- guerra teve dificuldade em analisá-lo concretamente da forma que era e foi um regime terrível para a maioria dos portugueses devido à longevidade. O nacional-socialismo alemão cai ao fim de alguns anos, ao contrário do que se pensava que ia ser o Reich dos mil anos, e este manteve-se até 1974. Muito reforçado pela Guerra Colonial, que depois vai ser a causa do derrube do Estado Novo.

57 IRENE PIMENTEL “Ditadores? Fascina como é que um ser humano sozinho tem um papel…” HISTORIADORA É o tempo da história. Ainda falta fazer o trabalho histórico e (Continuação…) do seu relacionamento com a memória. Ainda não está muito estudado. Sobre a repressão da ditadura, há muitas peças de É um caso diferente porque Cunha Leal era um conservador, mas teatro, há muitos filmes, há depoimentos, há memórias de era um conservador que Salazar nunca conseguu levar para o seu pessoas individuais, há livros de história. A Guerra Colonial lado. Penso que também o Partido Comunista porque ele era ainda é um assunto relativamente tabu. Já devíamos estar a profundamente anti-comunista, e aí poderá falar-se de Cunhal, mas fazê-lo pois já passaram 44 anos, mas se calhar ainda tem de também dos dirigentes anteriores, como Bento Gonçalves. passar mais algum tempo. Existe um certo fascínio por figuras como Salazar, Hitler. Basta ir a uma livraria e vemos na montra livros sobre estas figuras. A Irene é filha de pai português e de mãe suíça, estudou Porque é que isso acontece? no Liceu Francês. Comparando com grande parte da Porque foram figuras individuais que tiveram uma preponderância população que viveu durante o Estado Novo, de que tão grande na história, que moldaram não só regimes como tiveram forma é que ter acesso a uma cultura diferente e estudar consequências terríveis para as pessoas de um modo geral. Eu num sítio onde havia mais liberdade do que nas outras própria digo que estou fascinada, não no sentido de gostar das escolas portuguesas, ajudou a que a Irene tivesse um personagens mas sinto-me um pouco fascinada por elas tanto que pensamento diferente? ando a estudá-las há vários anos. Tentar perceber como é que Penso que isso influenciou. Eu tenho uma tendência para o Estaline, na União Soviética, e o Hitler, na Alemanha nazi, cosmopolitismo, sou anti-nacionalista. E como a minha mãe destruíram tantas pessoas. Isso não aconteceu com Salazar, mas é suíça, e sempre tive parte da família na Suíça, sempre também aconteceu com Franco, por exemplo. Fascina como é que convivi com essa família também. Mesmo cá em Portugal um ser humano sozinho tem um papel tão preponderante. Claro que também estava num microcosmo. Todos os meus primos sempre com muitos cúmplices mas politicamente como é que têm o andavam nos liceus portugueses e eu lembro-me que havia poder que tiveram. uma grande diferença. Pode se dizer que se trata de um fascínio pelo próprio poder em Por outro lado, sempre gostei muito de história porque havia si? uma grande liberdade de ensinar história no Liceu Francês. É claro. O poder político. A mim fascina-me. É ele que nos governa Nós podíamos pegar na questão do Marxismo, quando aqui e é por causa dele que pagamos impostos, que lutamos para que se ninguém pegava. Apesar de ser um liceu conservador, era mantenha ou, pelo contrário, para que seja derrubado. E eu sou de um liceu de uma democracia. Apesar da disciplina, havia uma geração muito politizada, até porque vivi naquela fase mais mais liberdade. Deu-me um olhar crítico, de interpretação a crucial da idade adulta ainda jovem do 25 de Abril. Eu tinha 18 partir de fora e talvez isso tenha contribuído, sim. anos em 1968. Em que momento é que a Irene percebeu que tinha gosto Em alguns países, como na Alemanha, parece ser pela política? Foi ainda antes de 1968? desconfortável falar dos períodos em que estes regimes fascistas Eu tinha gosto pela história política. Depois houve algo que dominavam. Aqui em Portugal não parecemos sentir-nos tão me influenciou muito. Eu tinha um diário e fartei-me de desconfortáveis em falar da ditadura, abordamos esse tema de escrever coisas contra o racismo logo aos 13 anos. forma mais aberta. Mas há uma coisa em que diria que não estamos com essa postura (Continua na página seguinte) mais cómoda, que é a questão da Guerra Colonial. Penso que ainda não foi trabalhada na história, na memória de gerações porque foi muito traumática para gerações de pessoas que participaram na guerra e esses normalmente foram silenciosos relativamente aos seus filhos. Mas agora alguns falam mais com os netos. Isso aconteceu porque o 25 de Abril veio alterar, por rutura, de um dia para o outro a realidade. Não foi só a democratização, foi a independência das colónias, a entrada na Europa. Isso provocou um certo silêncio. Muitas das pessoas que participaram na Guerra Colonial de um dia para o outro passaram de heróis a vilões e portanto remeteram-se ao silêncio. Sei que a Irene já sugeriu a criação de uma Comissão da Verdade para apurar o que se passou nas colónias? Acho que é uma tarefa dos países independentes porque houve massacres. As guerras coloniais foram muito violentas. Em Portugal, e falo sobre isso no meu livro anterior ‘O Caso da PIDE/DGS’, acho que já passou o tempo da Comissão da Verdade e da justiça.

IRENE PIMENTEL 58 (Continuação…) HISTORIADORA 3 Eu tinha um diário e fartei-me de escrever coisas contra o “Geringonça? Acho muito interessante. racismo logo aos 13 anos. A desigualdade a que assistia em É um caso completamente contrário Portugal também era algo que me incomodava. Isto também tem ao que se está a passar no resto da a ver com a minha família. Na Suíça o meu avô era ferroviário, Europa” ao passo que o meu avô em Portugal tinha cinemas e laboratórios. No maio de 68 eu estava no meu último ano no rias, e ainda bem. Eu acho que têm todos à partida o seu Liceu Francês e ia fazer o exame de saída, o célebre próprio comité central e espero que não sejam atreitos aos Baccalauréat, e sentia-me, culturalmente, muito próxima de populismos e a esse tipo de coisas. Depois são gerações que França. Seguia o que se passava lá. O maio de 68 influencia-me admiro porque estão ligadas a um humanismo que nós não depois porque ainda faço essa exame, em França não fizeram. tínhamos naquele período. É também uma geração muito Fui estudar para a Suíça e ao fim de um ano e meio fui para mais sensibilizada para a questão da ecologia e do clima até Paris. Foi um período que teve muita influência na minha porque percebe melhor as transformações que aconteceram. maneira de estar, na minha mentalidade, como também E, por exemplo, eu gosto muito do que se está a passar agora influenciou muitas pessoas da minha geração. nos Estados Unidos em que uma juventude muito nova está a reagir a questões que têm a ver com eles, como é a questão Depois do 25 de Abril teve um corte com a vida política mais das armas. Irem para a escola e não correrem o risco de ativa. Sentiu-se desiludida? serem mortos. Eu que não gosto nada do Trump, acho Senti-me completamente desiludida. Ainda agora quando o fabuloso o que se está a passar. Mas na Europa também. Manuel Reis morreu, houve este debate em torno dos anos 80. Contra o racismo, a xenofobia. Eu não vivi nada disso. Nesse período eu estava a ver o refluxo. Neste momento temos uma solução política em Portugal Eu saí da vida partidária em 1978 e no próprio dia em que saí, diferente do que já se viu no passado. Já passámos mais disse a uma amiga minha que sabia pela primeira vez o que era a de metade do mandato. Como é que a Irene está a liberdade de pensamento, mas que esse tipo de liberdade era analisar a Geringonça? muito duro. De repente senti-me despida só a contar comigo. Eu acho interessantíssima. Cá está uma mudança, que não é Esse período seguinte não foi muito feliz para mim. Mas também revolucionária, não é uma mudança através de golpe de aconteceu com muitas pessoas. Foram períodos de isolamento Estado e é uma mudança que ninguém esperou. Nunca mais porque nós tínhamos uma socialização com os partidos e a vida me vou esquecer daquela frase do Jerónimo de Sousa na noite política, e de repente ficámos sozinhos. Como dizia o Zeca das eleições, a dizer que o PS só não governava se não Afonso, ele era o seu “próprio comité central” e que isso às quisesse. Eu ouvi aquilo e disse ‘Há aqui qualquer coisas que vezes era muito duro. E eu também passei a ter o meu comité está a gerar uma grande mudança’. Mas não percebi o efeito central, em vez de obedecer ou seguir os outros. que isto ia ter, fomos depois percebendo. Acho muito A sua geração era muito politizada. O que lhe parece a interessante. geração atual? A minha geração é aquela que reage mais contra a autoridade dos É um caso completamente contrário ao que se está a passar pais e dos ascendentes e agora não é bem assim. Não é necessário ter essa luta dessa forma e acho que isso às vezes faz no resto da Europa. Uma das coisas que eu temo um pouco é falta. As novas gerações são sempre diferentes, são menos ideologizadas e partidarias, e ainda bem. esta atitude anti-políticos, que eu não gosto. Tendo em conta a questão do Brexit, o projeto europeu vai sempre sair mais fragilizado. Mas está condenado? Espero que não esteja condenado. É um projeto muito interessante. Mas foi dominado pela onda neoliberal, do ponto de vista financeiro e económico. Em vez de caminhar para uma Europa mais social, preocupada com a unidade a nível de impostos. (Continua na pagina seguinte…)

59 IRENE PIMENTEL “A xenofobia e o racismo são coisas que ainda não são muito bem vistas aqui, ao contrário do que sucede em HISTORIADORA França já há muitos anos ou na Alemanha” (Continuação…) E muitos deles foram chacinados. Nós hoje sabemos isso, vamos Em cada país, as pessoas estão muito afastadas do projeto maltratar os refugiados que aí vêm? Não os vamos integrar europeu e nem sabem muito bem o que representa, o que se noutras zonas? Amanhã podemos ser nós. A história serve para discute lá. É necessária mais Europa cultural, social. Mas isso. Mas só se as pessoas a conhecerem e se se interessarem por face ao escândalo da Cambridge Analytica, já se fala na ela. possibilidade de novo referendo do Brexit. Atualmente temos um paralelo entre aquele período da Segunda Em Portugal, não há partidos de extrema-direita e populistas Guerra Mundial, com várias ditaduras na Europa, e no Parlamento. Porque é que continuamos a ser uma agora não havendo ditaduras, assistimos a um exceção, quando comparado com muitas realidades crescimento da extrema-direita, da intolerância, de europeias? xenofobia. Não estamos a aprender com a história? Acho que tem a ver com o facto do 25 de Abril ser recente. É sempre aquela velha questão de ‘E para que é que serve a Houve uma diabolização do antigo regime e sobretudo nenhuma história?’. Eu acho que a história de facto nunca se repete. Se organização parlamentar de direita, PSD e CDS, por exemplo, temos parecenças com os anos 30 do século XX, e nenhuma delas defende o regime ditatorial. Ninguém defende a claramente temos devido à crise do regime liberal, da PIDE. Depois a nossa própria ditadura não teve essa componente democracia, a história pode sobretudo indicar para onde não racial, teve uma imperial. A xenofobia e o racismo são coisas que queremos ir. Uma das coisas que a história nos indica é ainda não são muito bem vistas aqui, ao contrário do que sucede relativamente aos refugiados. Durante a Segunda Guerra em França já há muitos anos ou na Alemanha. Além disso, Mundial houve muitos refugiados que não encontraram também somo um país de emigrantes. A tendência é para sermos refúgio em muitos países da Europa, vieram a ser apanhados ou podermos ser alvos da xenofobia lá fora e aqui não sermos e muitos deles foram chacinados. Nós hoje sabemos isso, assim. Por outro lado, ainda não houve ataques terroristas cá. vamos maltratar os refugiados que aí vêm? Não os vamos Já tem alguma ideia para um futuro livro? Vai continuar a integrar noutras zonas? Amanhã podemos ser nós. A história debruçar-se neste tema de Salazar e do Estado Novo? serve para isso. Mas só se as pessoas a conhecerem e se se Eu vou voltar à PIDE. Todas dizem-me ‘Que horror!Livra-te interessarem por ela. disso!’, mas vou voltar porque interessam-me dois aspetos. Fala- se do Silva Pais, o Rosa Casaco também é falado, o Casemiro Atualmente temos um paralelo entre aquele período da Monteiro porque matou o Delgado, ou pelo menos foi condenado Segunda Guerra Mundial, com várias ditaduras na por matá-lo. Eu vou pegar nessas figuras mas vou tentar ver de Europa, e agora não havendo ditaduras, assistimos a um que forma se fabricou um PIDE. E depois por outro lado também crescimento da extrema-direita, da intolerância, de interessa-me o relacionamento com agências secretas de países xenofobia. Não estamos a aprender com a história? democráticos porque comecei já a estudar a questão da É sempre aquela velha questão de ‘E para que é que serve a espionagem durante a Segunda Guerra Mundial, mas interessa- história?’. Eu acho que a história de facto nunca se repete. Se me o pós-guerra. O relacionamento com os franceses, com a temos parecenças com os anos 30 do século XX, e CIA. In Vozes ao Minuto” claramente temos devido à crise do regime liberal, da democracia, a história pode sobretudo indicar para onde não queremos ir. Uma das coisas que a história nos indica é relativamente aos refugiados. Durante a Segunda Guerra Mundial houve muitos refugiados que não encontraram refúgio em muitos países da Europa, vieram a ser apanhados

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61 A norte 3 há uma “porta para o paraíso”… TerrasTEdRDeREBASarroso BARROSO O turismo tem vindo a ganhar espaço crescente nas estratégias de desenvolvimento dos territórios. Contudo, para que possa constituir- se num instrumento de desenvolvimento, torna-se necessário – para além das muitas exigências ao nível das infra-estruturas, equilíbrio ambiental e valorização do património – fazer um esforço no sentido de criar produtos turísticos inovadores e diversificados. Situada lá bem no norte de Portugal - em Trás-os-Montes, ficam as Terras do Barroso e a “capital da república” Montalegre, as quais fazendo fronteira a norte com a Galiza espanhola, com os “vizinhos” Chaves, Cabeceiras de Basto, Vieira do Minho, Terras de Bouro e cada vez mais beneficiada por facilidades de acesso através da A52 espanhola, N103, A24 e agora também pela M508, aliadas à sua proximidade com Espanha, permitem colocar a região num plano privilegiado do mercado turístico receptor português. No que se refere às potencialidades da região, a envolvência natural confere-lhe uma riqueza e variedade paisagística e uma enorme diversidade de fauna e flora características, que permitem o desenvolvimento de um turismo activo. O seu património histórico-cultural que se encontra disperso por toda a região, sendo constituído por uma enorme diversidade que abrange testemunhos arqueológicos - megalíticos, romanos, medievais -, passa pelas edificações de carácter religioso - igrejas, capelas, cruzeiros, e monumentos destinados à defesa – castelos e castros, entre outros. As manifestações populares atraem também um número cada vez maior de pessoas e ocupam já um lugar de destaque, fazendo as romarias e as festas, maioritariamente religiosas, parte da sua oferta cultural. O artesanato é outra das actividades de carácter popular em expansão e que mais atrai o turista. Os produtos regionais enriquecem a oferta local ao associarem a gastronomia, outro ponto forte da região, para o qual contribuiem fundamentalmente a posta e o cozido barrosão bem como o cabrito, componentes turísticas de grande importância para a região. Muitos dos produtos, porque possuem características únicas, estão certificados, como é o caso do mel, da carne barrosã, agora também do vinho, e como não podia deixar de ser, do famoso fumeiro barrosão, actividades muito enraizadas social e culturalmente na região. A oferta de alojamento turístico, fulcral para o seu desenvolvimento, é disponibilizada em unidades de turismo rural, assim como por hotéis, pensões, estalagens e residenciais, consideradas pelos visitantes como de qualidade. São pois todas estas características, que fazem da região do Barroso um local maravilhoso e apelativo.

SERRA DO LAROUCO 62 3 O grande farol do Barroso… Terras de Barroso Do planalto barrosão, a nordeste da capital do Barroso, sobressai o espigão de uma serra que no Outono é escura e ameaçadora, no Inverno é branca, na Primavera verde e no Verão garrida. É a serra do Larouco, cuja altitude máxima atinge os 1527 metros acima do nível do mar. Está disposta na direcção norte/sul, atravessando a fronteira e prolongando-se para terras da Galiza, com um comprimento de cerca de 10 quilómetros. Chega-se lá, partindo de Montalegre pela estrada que vai para Vilar de Perdizes, que depois se deixa na direcção de Padornelos. Daqui, toma-se a estrada de Sendim e do antigo posto fronteiriço, cuja estrada se deixa para a direita, na direcção da pendente ocidental da serra. Até aqui a estrada é pouco pronunciada, a partir de então começa a subir, mas é de fácil acesso, dado terem ali ocorrido obras de beneficiação há muito pouco tempo. O panorama imenso que daqui se avista, consoante se vai subindo, compensa o esforço da subida, seja ela feita a pé, de automóvel, ou através de qualquer outro meio. A zona do topo, próxima já da raia, é conhecida por Fonte da Pipa. Trata-se de um planalto a cerca de 1500 metros de altitude, que no Inverno e na Primavera está sempre bastante molhado, por reter as águas pluviais. Um pouco mais abaixo, na encosta poente da serra, com esta água começa a formar-se o rio Cávado. Aos 1527 metros de aItitude, num plateau rochoso, está um marco geodésico, de onde o panorama é fabuloso. Avista-se todo o Barroso, o Alto Tâmega e o Gerês, como se fossem vistos de avião. O seu nome provem do Deus Celta Larauco, que originou também Larouco - Município espanhol que integra a província de Ourense. (Continua na página seguinte)

63 SERSREARDROALADROOULCAOROUCO 3 O grande farol do Barroso… (Continuação) Terras de Barroso Integra-se no sistema montanhoso da Peneda/Gerês e serve de fronteira entre o distrito de Vila Real e a Galiza espanhola. Nesta grande massa granítica distinguem-se, na vertente poente, manchas de xisto metamorfizado que originam encostas abruptas onde aves de rapina, como a águia-de-asa-redonda ocupam o território. A Serra do Larouco apresenta, ainda, uma vegetação em função da altitude, constituída nomeadamente por matos de urzes, sargaços e giestas, e algumas pastagens que se situam junto a cursos de água segundo a antiquíssima técnica dos prados de lima. Nas suas vertentes constatam-se campos de cultivo e algumas manchas de mata climática, como sejam o carvalho-alvarinho, o carvalho-negral e o vidoeiro. Os aglomerados urbanos de que são exemplo, as freguesias de Gralhas e de Santo André, estão rodeados por campos outrora intensamente trabalhados. Para além do Cávado, que como se disse tem aqui origem, também por aqui nasce o Rio Salas. Um e outro sulcam as encostas desta serra e a “galeria ripícola” é o habitat de inúmeras espécies de fauna e flora. Por debaixo da protecção fornecida pela vegetação típica das linhas de água, persistem ainda mamíferos como o lobo, a raposa, o corço, o javali, a par de répteis como o lagarto-de-água, a cobra- bordalesa e o sapo-parteiro. À serra chamavam os romanos Monte Ladiço. Nas suas encostas foi colocada na Idade Média uma atalaia, que mais tarde se transformou em castelo, dividindo inicialmente as dioceses de Braga e Lugo, e depois, Portugal da Galiza. No caso do Salas, trata-se de um rio internacional que nasce já em território galego, na vertente norte da Serra, concelho de Baltar. Atravessa o território do antigo Couto Misto e o extremo norte da freguesia raiana de Tourém, do concelho de Montalegre e tem a sua foz no rio Lima, ainda em território espanhol. na povoação galega de Lobios. A historiografia galaica, diz que no cimo do Larouco havia há dois mil anos, um templo a Júpiter. Arqueólogos da região raiana, de ambos os lados da fronteira, apoiados por populares, têm feito nos últimos anos, no verão, réplicas das festas pagãs que havia outrora. À serra chamavam os romanos Monte Ladiço. Nas suas encostas foi colocada na Idade Média uma atalaia, que mais tarde se transformou em castelo, dividindo inicialmente as dioceses de Braga e Lugo e depois Portugal da Galiza.

64 ENTRE A PAISAGEM E O PATRIMÓNIO 3 HISTÓRICO… Descobrir as Terras do Barrosoo é descobrir a A “Grande Rota”… paisagem diversa de miradouros com vistas de cortar a respiração, arquitectura religiosa abundante e profundas marcas da história… Diz-se que por aqui não “passou Cristo”!... Mas também não foi preciso, tamanha é a beleza desta zona que teima em resistir aos atentados contra a natureza. Trata-se da “Grande Rota”, uma junção de vários trilhos pedonais do Parque Nacional da Peneda-Gerês num principal, que se vai estender ao longo de 200 quilómetros, ligando as extremidades do território e visando um aumento de 5000 visitantes por ano. Dentro de dois anos, vai poder percorrer-se o de 2,5% no número de dormidas no alojamento deste Parque, segundo dados que Parque Nacional da Peneda-Gerês a pé de uma constam no plano provisório. A iniciativa, que tem um orçamento de 300 mil euros, extremidade à outra. Basta que se tenha energia é financiada pelo Norte 2020 - Programa Operacional Regional do Norte, e e tempo para isso, claro está. O projecto em responsabilidade da Adere Peneda-Gerês -Associação de Desenvolvimento das questão, chamado “Grande Rota”, está em Regiões do Parque Nacional da Peneda Gerês -, e pretende também chamar a processo de implementação e vai unir vários atenção de visitantes estrangeiros, ou não fosse o nosso país estar a atravessar um trilhos deste parque natural para formar um pico de procura turística. Para esse efeito, será criado brevemente um site principal, de acesso pedonal. promocional desta nova Grande Rota. Além disso, visa aumentar a segurança dos O plano provisório foi apresentado fáz um ano e seus visitantes com este trilho principal, e diminuir o número de pessoas que se prevê um trilho que se estende ao longo de 200 perdem dentro do Parque. A Adere Peneda-Gerês já frisou que as obras de quilómetros e de 18 localidades, entre Inverneira requalificação vão começar em breve e que não irá afectar, de qualquer forma, a da Ameijoeira, em Melgaço - o início da rota - e sustentabilidade ambiental deste território. Prevê-se que o plano que vai revigorar Tourém, já no concelho de Montalegre como o Parque Natural, que inclui ainda o melhoramento da cobertura móvel e o restauro meta. Esta reorganização tem como objectivos, de áreas ardidas, esteja terminado dentro de dois anos. dinamizar o turismo no Parque Nacional da Peneda-Gerês, nomeadamente um aumento anual de 5000 visitantes e uma subida

POLITICA DESPORTIVA LOCAL 65 3 MUNICIPIO RENOVA APOIO NA FORMAÇÃO DESPORTIVA Em sessão informal, a Câmara de Montalegre assinou um conjunto de protocolos com os clubes do concelho - tal como em anos anteriores - com vista à presente temporada desportiva. São cerca de 250 mil euros dirigidos para a formação de atletas nas mais diversas categorias. Após a sessão, ficam para registo e memória futura, aa palavras do Presidente Orlando Alves e dos representantes das agremiações desportivas presentes: Orlando Alves|Presidente da Câmara Paulo Viage|Presidente do C. D.C. de Montalegre «Está formalizado o contrato de financiamento dos clubes para a nova temporada que se inicia no mês de setembro até ao mês de maio do «Este apoio é essencial para o nosso clube permanecer próximo ano. Importa dizer que estamos a falar de apoios substanciais às na competição em que estamos inseridos. Seria quatro coletividades do concelho, que se empenham e fazem um excelente impossível sem o apoio do município. É com muito trabalho na formação e no entretenimento. Louvo as direções dos clubes agrado e satisfação que recebemos este financiamento. que se prestam a desenvolver este trabalho de sentido cívico e de um Só para terem uma ideia, só nos jogos que exemplar modelo de cidadania. No distrito de Vila Real, a Câmara de organizamos no nosso estádio temos uma despesa que Montalegre é a autarquia que mais gasta no apoio aos clubes. São cerca de ronda os 17 mil euros anuais. São mil euros por cada 250 mil euros por ano. Sabemos que é pouco, mas ninguém dá mais do que partida que se joga em casa. Só nós sabemos as nossas o nosso município. Tenho a consciência do grande esforço dos dirigentes dificuldades, dado o escalão desportivo onde nos para manterem o funcionamento das coletividades, mas importa referir que mantemos. Queremos continuar a levar o nosso clube e os clubes são dos sócios e não da autarquia. Não podem continuar a ser a nossa região pelo país fora». financiados, quase na íntegra, pelo orçamento municipal. Uma coletividade que não desenvolva atividades ao longo do ano para a angariação de Jorge Carvalho|Presidente do G.D. de fundos, não está a dinamizar a formação cívica e cultural. Devem aproveitar Salto os eventos e festas locais. Temos, também, eventos como a \"Sexta 13\" e o Mundial de Rallycross que podem ser aproveitados para a angariação de «É um apoio muito importante e sem este fundos e não vejo ninguém a fazê-lo. São comerciantes de fora do concelho financiamento era impossível mantermos cinco que aproveitam essas oportunidades. Para os clubes, atletas, associados e equipas ativas. A verba é utilizada em todas as equipas dirigentes, desejo uma época coroada de êxitos, onde prevaleça a educação do grupo. Exige que sejamos rigorosos na gestão e na e onde a sociabilização entre claques e equipas seja uma constante todos os utilização que é praticamente igual de ano para ano». dias». Paula Solange Silva|Academia de Futebol e Futsal Abelhas Márcio Rodrigues|Presidente do G.D. de Vilar de Perdizes Azuis As circunstâncias geográficas das nossas equipas, os «Somos uma academia que forma jovens para o desporto e precisamos de patrocínios e os sócios são cada vez menos. Há cada contar com todos os apoios possíveis. É uma ajuda essencial para todos os vez menos pessoas. O nosso município apoia muito o nossos escalões. Temos cerca de 100 atletas. É uma verba utilizada nos desporto e nós tentamos corresponder da melhor transportes, alimentação, equipamentos, que são constantemente atualizados. maneira, dignificando o nosso nome. Neste momento Agradecemos que o público venha assistir aos nossos eventos desportivos. temos sete equipas no ativo». Queremos a participação dos nossos jovens. Eles são o futuro e queremos que estejam muito bem preparados. Investir na formação desportiva é, sem dúvida, uma boa aposta».

66 3 VIAGEM PELAS ALDEIAS Codeçoso da Chã CODEÇOSO é uma das aldeias mais próximas da vila de esteios aos quais o povo chamava “O Casulo do Facho”, mas situa Montalegre, sede do concelho. A origem do topónimo deriva de esse espólio no termo de Meixedo. Se for entendido como “codesso”, um arbusto que pertence à família das leguminosas e que freguesia compreende-se, se for entendido como lugar, então é típico da região nortenha. Inicialmente a palavra escrevia-se com deve dizer-se, no termo de Codeçoso. No termo de Codeçoso, dois “ss”, porém a evolução semântica generalizou o topónimo em houve dois antigos povoados: um nos “Pardieiros” e outro em “ç”. “Portela da Urzeira”. Por ambos passava a via romana. E foi pena Por aqui andaram os mais antigos povos que deixaram vestígios que no fim do século XX, já nos nossos dias, com o intuito de ainda hoje bem visíveis nos dólmenes, antas, castros, pedaços de via arranjar os caminhos para os tractores fosse entupido esse romana, marcos miliários e moedas. Isto confirma que as “Terras de troço de via romana. Afinal, prova-se que o progresso nem Barroso” foram pertença dos Alanos, dos Vândalos, dos Celtas, dos sempre é aliado da arqueologia. Romanos, dos Suevos, dos Godos, dos Visigodos, enfim, dos Iberos, Também no lugar das Motas, onde a estrada que serve Codeçoso nome que melhor traduz todos quantos povoaram a Península se cruza com a nacional, ainda é visível uma anta, também Ibérica. conhecida por “Cova da Moura”. Esse relevo orográfico foi vandalizado aquando do arranjo da estrada. Foi pena porque IMPORTÂNCIA CASTREJA E RELIGIOSA - Durante muitos anos nunca fora estudado. Em Vale Ferreiro, já dentro do terreno que Codeçoso pertenceu à freguesia de S. Vicente da Chã. É por isso que foi subtraído à aldeia para delimitar o Posto Experimental, habitualmente aparece com esse designativo. Como a Chã, desde o existem uns penedos rasteiros, quase invisíveis com a tempo de Dinis, pertencia à Comenda do Convento de Santa Clara de vegetação, que há 60 ou 70 anos, tinham várias letras e outros Vila Conde, Codeçoso pagava igualmente os tributos religiosos a símbolos. Valia a pena estudá-los, tendo em conta que são esse Convento, ao contrário da maior parte das restantes freguesias e vestígios rupestres, possivelmente de grande importância aldeias de Barroso que pertenciam à Ordem Militar dos Templários. histórica. A Igreja paroquial ainda é hoje considerada monumento nacional. Se referimos aqui, com este relevo, a freguesia de S. Vicente é pelo facto de nessa altura Codeçoso lhe pertencer, religiosamente. Mas Codeçoso valeu e vale, sobretudo, pelos vestígios românicos. Erradamente vários autores atribuem a Medeiros e a Meixedo castros, dólmenes e antas que lhe pertencem. O Castro que dista para poente cerca de 500 metros da E. N. Montalegre-Chaves, inscreve-se no termo de Codeçoso. Chama-se “o Cabeço dos Mouros” e está por escavar. É sempre citado como sendo de Medeiros o que constitui um erro. Aí apareceu uma “ara” na veiga de Carigo que actualmente se encontra no Museu Etnográfico com o n.º 5.206, escreve João Gonçalves da Costa, páginas 30-31. Nas mesmas páginas se diz que existe um dólmen no Monte do Facho que há anos ainda tinha três esteios

67 VIAGEM PELAS ALDEIAS Codeçoso da Chã CAPELA DE S. NICOLAU - Embora não seja sede de Freguesia, ter alunos. A Junta solicitou a cedência, alegando que ela fora Codeçoso tem uma das mais sugestivas capelas com Sacrário, onde com alguma frequência se celebram actos religiosos, para além de aí feita pela gente do Povo, facto a que a Câmara foi sensível. se fazerem todos os funerais. É dedicada a S. Nicolau, padroeiro da aldeia. Quase todos os anos, quando a emigração não a tinha CRUZEIRO REMODELADO - A Junta de Freguesia desertificado, se celebrava a ali a festa anual. No começo deste século, a colónia de Codecenses radicados na cidade de Bridgeport, mandou rodear o sopé do histórico cruzeiro do mais bonito nos Estados Unidos da América, tem-se substituído aos resistentes que pela aldeia ficaram, promovendo a festa religiosa e profana, o largo comunitário com um interessante muro de granito, como que constitui um acontecimento comunitário que tem merecido nalguma imprensa luso-americana, justos aplausos. Diga-se que a convinha que fosse. Também colocou do lado oposto um talha dessa linda e fascinante capelinha é das mais ricas da região. Não se conhece a data da sua construção, mas sabe-se que já por mostruário com vitrinas para colocar os avisos e editais. Do alturas de 1700 foi alvo de beneficiações que foram retomadas nos nossos dias. Ferruco deslocou, melhorando, as alminhas que foram FORNO DO POVO - Codeçoso tem um forno comunitário que tão aproximadas da aldeia e em frente ao Cemitério. Ali bem perto útil foi pelos tempos fora, a quantos ali nasceram e cresceram ou foi construído um abrigo para segurança dos alunos que em que mendigavam de terra em terra. Para estes sempre foi a autocarro, se deslocam para as Escolas Preparatórias e hospedaria que nunca se fechou, fosse aos “da volta”, fosse a quem Secundárias da sede de concelho. Entretanto foi alcatroado o fosse. Esse imóvel, a exemplo dos fornos de outras aldeias, deixou ramal que liga o lugar do Cemitério a Lavrateixeira, encurtando de funcionar, porque passaram a existir os fornos particulares e o o espaço e retirando o movimento desnecessário pelo centro da pão comercializa-se hoje já prontinho a comer. aldeia, cujas ruas são estreitas. Medidas que se louvam, porque O BOI DO POVO - Também o boi do povo, que era património de agradam e servem a todos. toda a aldeia, deixou de existir, praticamente, pelas mesmas razões. POPULAÇÃO - Codeçoso foi sempre, desde que há dados As lamas do boi que como ele eram comunitárias, deixaram de ter estatísticos, uma aldeia média em termos de densidade sentido. E também a corte do boi, por desnecessária, foi em populacional. Talvez pelo facto de ser a segunda aldeia mais plebiscito comunitário transaccionada a favor do arranjo urbanístico. próxima da vila tenha contribuído para isso. Como sucedeu A Junta de Freguesia consultou o povo que por esmagadora maioria com outras gentes de terras vizinhas, a agricultura e agro- trocou essa corte por um sobrado junto ao largo da capela, com vista pecuária foram pelos tempos fora, a única forma de a ser este demolido, para ampliar o largo. subsistência. Como não havia artistas daqui naturais, muitos A ESCOLA FOI DOADA À COMUNIDADE - A mesma decisão dos que vinham de fora, nomeadamente do Minho - trolhas e implicava a escola primária que fora construída pela população em carpinteiros - por aqui casavam e ficavam. Mas pelos anos 1950/1951 e aberta em 1952. Meio século depois deixou de cinquenta/sessenta do último século, as coisas mudaram. A emigração levou os mais corajosos para a América, para o Brasil e para os países da Europa Central. Aí por volta de 1950 Codeçoso teria cerca de meio milhar de habitantes. Havia lares com dez e onze filhos. Fonte:Monografia da aldeia – de Barroso da Fonte

68 A ORGANIZAÇÃO SOCIAL EM BARROSO NOS SEC, XIX E XX “ESTÓRIAS DE ANTANHO” A organização social, o clima e a morfologia do solo, condicionaram claramente e desde sempre, as actividades rurais das populações de Barroso, que viveram durante anos entregue às suas tradições mais antigas, algumas das quais perduraram até aos dias de hoje. A base dessa organização até meados do século XIX, assentou na «assembleia» dos representantes das várias famílias em cada povoação, que reúniam com uma certa periodicidade, junto às igrejas, quando tal se tornava necessário. Essa assembleia chamava-se Junta, Acordo, ou Conselho e foi herdeira do antigo “conventus publicus vicinorum”, que significa assembleia pública dos vizinhos, do reino visigótico. Era nessa «assembleia» que se analisavam até à exaustão, os problemas que a todos diziam respeito, e se decidia por vontade expressa da maioria, as soluções a adoptar. A Junta, era a mais perfeita expressão da Democracia Popular, e foi dirigida até aos primeiros anos do século XX por um «Juiz», um «Zelador», um «Juiz de Vintena», um «Procurador», um «Mordomo» ou um «Chamador», e a partir daí, até meados dos anos setenta da mesma era, pelo Regedor ou Presidente, o primeiro escolhido pelo povo das aldeias e o segundo pelas corporações concelhias, afectas ao regimo tatalitário da II República. Os Regedores nomeados, eram normalmente as pessoas mais respeitadas das aldeias e totalmente independentes das autoridades administrativas oficiais, e quando da escolha, tinham a obrigatoriedade de permanecer no cargo, por um periodo minimo de 6 meses. Não eram remunerados, nem tinham qualquer tipo de privilégios pelo seu desempenho. A estes homens, competia fundamentalmente convocar as «assembleias», o que era feito normalmente através do toque do sino das igrejas ou das capelas onde elas existissem, e verificar as presenças e as ausências dos cabeças-de-casal. . (Continua)

69 A ORGANIZAÇÃO SOCIAL EM BARROSO NOS SEC, XIX E XX “ESTÓRIAS DE ANTANHO” Eram muitos e variados os assuntos que se apresentavam às «assembleias» e estas tinham obrigatoriamente de encontrar soluções, (Continuação) para cada caso concreto, designadamente, no que dizia respeito à reparação e abertura de caminhos, organização da vida pastoril, distribuição das águas de rega, locais de roça, limpeza das» igrejas e dos tanques, trabalhos para comunidade e tantos outros necessários à melhoria das condições nas aldeias. Esta tipo de organização durou séculos e passou de geração em geração através dos usos e costumes da terra. A partir dos finais da década de setenta do século passado, este tipo de organização social viria a ser substituída por uma espécie de «Conselho Dominical», cujos moldes de funcionamento eram muito semelhantes, senão vejamos: No final das missas de domingo, era recomendado a todos os aldeões presentes nas mesmas, de que deverim aguardar, normalmente no largo fronteiriço às igrejas, onde teria lugar uma «reunião para decidir sobre determinado assunto. Estas reuniões, eram «presididas» pelo Presidente ou Secretário da Junta, a quem competia colocar as questões em discussão e avaliar as Aqueles que sem justificação não estivessem presentes, eram como que respectivas votações. À semelhança do que acontecia no passado, nada «excomungados» pelas populações, já que a todos era exigida a presença, ficava escrito e o registo das decisões tomadas, ficava no subconsciente de cada um, que as acatava. Actualmente, este método caíu quase em fosse para o bom ou para o mau. desuso. O Conselho Dominical, poucas vezes vai a votos e foi Após a verificação das presenças, apresentavam-se então os assuntos a substituído pela moderna Assembleia de Freguesia. A coberto de tal tratar. Todos em conjunto, ou individualmente. Eram calorosamente modernidade e amiudadas vezes, os senhores Presidentes cedem à discutidos, mas mandavam as regras, que teriam sempre de ser tentação fácil de decidir sem ouvir o povo e de o informar, preferindo encontradas soluções e de acordo com a vontade da maioria presente. Em afixar papéis em determinados locais, que poucos se dão ao trabalho de caso de empate, cabia ao «Juiz» tomar a decisão. ler.

Barrosões ilustres… 70 DR. AMÉRICO CANEDO A FUNDAÇÃO DO COLÉGIO Américo José Rodrigues Canedo, nasceu na vila e freguesia do Em 1953 e como já foi referido, em parceria com a sua concelho de Montalegre, em 9 de Março do ano de 1922, local esposa, abriu na sede do concelho o Colégio de onde concluíu a instrução primária. A partir daí, frequentou o Montalegre, um propósito levado a cabo, graças então Liceu Nacional de Chaves, onde permaneceu até à tambem à sensibilidade intelectual da Doutora conclusão do antigo Curso Complementar, tendo-se constituído Margarida Maria Figueiredo Pias. Um acto muito como um brilhante aluno. No dito Liceu, teve como professor corajoso ao tempo, mas que teve o condão de mostrar o outro distinto Barrosão – o Dr. Domingos Barroso, natural da altruísmo e a solidariedade de um Homem e de uma Vila da Ponte, um dos mais célebres oradores de Trás-os- Mulher, que proporcionaria o “rasgar dos caminhos do Montes, que preteriu a ascenção ao cardinalício, a troco do obscurantismo” a milhares de jovens do Barroso, apostolado e exercício da docência na sua região. dando-lhes todas as possibilidades para o seu desenvolvimento cultural, numa terra pobre e Um “fatalismo” que mais tarde se viria a repercutir na vida do abandonada. E os resultados são conhecidos e falam jovem Américo José Canedo, quando após concluir o Curso de por si!... Por ali passaram mais de 2.500 alunos, Medicina que havia iniciado no Porto, e concluíu com elevada dezenas dos quais concluíram cursos superiores e mais valorização na Faculdade de Medicina de Lisboa, preteriu cerca de cinco centenas cursos médios. igualmente o convite do Professor Doutor Pulido Valente, para com ele trabalhar nos Hospitais Civis da capital, por troca com ... a docência e o exercício da Medicina em terras de Barroso, que ao tempo, calcorreou a pé ou a cavalo, e que fizeram dele um notável médico e um exemplo de humanismo e solidariedade para com o povo barrosão. Em tudo quanto fazia, o Doutor Américo Canedo, punha um elevado profissionalismo e sentido de rigor. Numa região sempre desprotegida, pobre e abandonada pelo Poder Central, o Doutor Américo, ainda que sem condições ou recursos, nunca hesitou e o seu lema foi sempre o de que “a esperança tem asas e faz a voar alma – desistir nunca. Foi imbuído deste espirito que chegou a fazer cirurgia à luz da vela ou da candeia e assistiu parturientes em situações de extrema dificuldade. Só a sua elevada intuição clínica e subtiliza de dedos, fez com q”.ue a cada dia que passava operasse verdadeiros milagres. Já quase em fim de carreira, o Doutor Américo Canedo, ainda teve ânimo e força, para entrar para o quadro da Casa do Povo de Montalegre e exercer o cargo de Delegado de Saúde. Dotado também de profunda sensibilidade artística, ao longo da sua vida, conseguiu ainda tempo para se dedicar à pintura, ao desenho e à escrita, onde através dos contos que nunca publicou e a que só alguns amigos mais próximos tiveram acesso, se sente hoje ter passado igualmente ao lado de uma brilhante carreira literária. Em parceria com a sua esposa, Doutora Margarida Pias Canedo, fundou ainda na capital do Barroso, o Colégio de Montalegre por onde passaram muitos estudantes dos Concelhos de Montalegre e Boticas. Homem disciplinador e dotado de grande inteligência fez da sua “escola” uma instituição prestigiada, fruto da excelente preparação de de que foram alvo todos quantos ali estudaram. O Doutor Américo Canedo, esteja hoje onde estiver, constituir-se-à eternamente, como um “credor de Barroso e dos Barrosões

71 3 5 de Outubro 1910

72 “O MINISTÉRIO DO TEMPO”… “Viage entre as curiosidades da Foto: Artur Pastor Foto: Artur Pastor História Barrosã guardadas no arquivo do Ministério do Tempo, e faça parte desta patrulha intemporal que tem como objectivo a salvaguarda do passado, o alicerçar do presente e a consolidação do futuro”… Fotos: Artur Pastor

73 Por aqui, a “poesia” também se serve à me3 sa… À mesa dos restaurantes do Barroso também se serve \"poesia\" . Uma “poesia” sempre dedicada à gastronomia, com especial realce para o cabrito e para a carne barrosã, com especificidade regional e certificada pela Associação de Criadores de Gado Barrosão A ECONOMIA A agricultura é já hoje uma actividade muito importante neste concelho, que gradualmente vai deixando de ser de subsistência, modernizando as suas explorações ao mesmo tempo que se investe na promoção e valorização de produtos tradicionais regionais. Por aqui, a existência de águas abundantes favorece as pastagens, que A “Grande Rota”…muitas vezes ocupam socalcos, onde se cria uma raça bovina particular - abarrosã. A pecuária e a criação de porcos são também actividades “Oh… ingénuas mesas honradas/Toalhas brancas, Tradicional é também o hábito de utilizar o marmeladas/Vinho virgem no copo a rir./O cuco da cabrito como prato principal, sempre que importantes. A criação de parques industriais foi sala cantando/Mas o Cabanelas entrando/Vendo a hora: é há convidados especiais, sobretudo na outro aspecto relevante na economia do concelho. preciso partir”. As palavras são de Almeida Garrett, em “Viagens na Minha Terra” e uma vez gravadas na toalha altura da Páscoa. Cabritos que em tempos O Parque Industrial da Vila de Montalegre e o de linho, pontuam a refeição. Noutras mesas outros poemas. Cesário Verde, Luís de Camões, Eça de já serviram como presente de honra para Parque Industrial de Salto são duas importantes Queirós, Florbela Espanca, Manuel Alegre. Poemas e frases soltas dos escritores da terra, com temas alusivos obsequiar as entidades importantes - outros referências. No entanto, o turismo é considerado à gastronomia do Barroso. tempos. nos dias de hoje, como a actividade económica Um verdadeiro mundo de “poesia gastronómica”. Um mundo, onde há mais de dois mil anos, no Depois, com o cunho dos prados verdes dos com mais possibilidades de desenvolvimento nosso território os enchidos são reis e senhores. lameiros e pastos naturais, lá vem a neste concelho, não só devido aos recursos Um mundo, onde ao fim de tanto tempo, nos locais onde a tradição foi mantida, a sua excelência da carne barrosã. Não terá sido naturais existentes, como também pelo seu fabricação é hoje arte. Os fumados estão profundamente ligados à agricultura e à pecuária por acaso, que já no século XIX, muitas património cultural. Paralelamente, existem da nossa região e são ainda hoje feitos de forma embarcações transportavam milhares de depois outros domínios onde o desenvolvimento artesanal com carnes de excelente qualidade, animais directamente para a Corte Inglesa. é também possível com inerentes vantagens para temperos feitos com critério e que através de um lento processo de maturação, enriquece os Ainda hoje é muito vulgar encontrar-se a as populações, designadamente aquelas que estão aromas finais. designação de \"portuguese beef\" em relacionadas com as energias renováveis e as restaurantes londrinos, tendo na Carne produções agroflorestais. Tudo matéria-prima seleccionada com um Barrosã a sua origem. Carne Barrosã, que processo lento de maturação, com tempêros naturais-sem aditivos - e fazendo a fumagem com tem uma cor rosada a vermelha escura, com ECOMUSEU DE BARROSO a mesma lenha de sempre-a dos carvalhos da gordura branca a branca suja, conforme se região, conferindo-lhes o cheiro e o paladar que os caracteriza e os torna simplesmente diferentes. trate de vitela ou animal adulto. A carne é De igual fama e qualidade é o Presunto de Barroso, produzido da mesma matéria prima de deveras tenra, extremamente suculenta e excelência e sublimemente temperado pelo clima único das nossas terras. muito saborosa. O sabor, sensação Considerada a \"Meca\" dos apreciadores destas complexa que se obtém pela combinação iguarias, a Feira do Fumeiro e Presunto do Barroso atrai anualmente, no final de Janeiro, das múltiplas características perceptíveis milhares de visitantes que adquirem, neste certame, toneladas de produto directamente às durante a mastigação, mantém-se com dezenas de produtores artesanais aí presentes. Também a carne do Cabrito de Barroso é bastante excelente nota e muito semelhante em famosa na região, sendo por tradição assada em forno de lenha e tomando papel principal nas todos os pesos de abate. várias festas religiosas da terra. Esta característica, tal como a suculência O património natural e cultural do Barroso está deve-se em grande medida ao \"marmoreado exemplarmente explicado nos vários pólos do da carne\" estando por isso correlacionada Ecomuseu. A porta de entrada é em Montalegre, no com a repartição da gordura e a sua interactivo Espaço Padre Lourenço Fontes. Todos composição lipídica. Na realidade, estas os demais se encontram espalham pelo resto do valências, textura, cor, suculência e flavor, território barrosão, de forma a promover o dão à \"Carne Barrosã\" uma qualidade conhecimento etnográfico e a educação ambiental. ímpar. E temos ainda a batata, por assim Na muito genuína aldeia de Pitões das Júnias dizer, o produto mais famoso de começam vários dos trilhos que levam ao Parque Montalegre, porque é a melhor batata que Nacional da Peneda-Gerês, cujo cerca de um terço há para consumo. Longe vai o tempo em do território protegido pertence ao concelho de que se produziu em enormes quantidades e Montalegre. quebrou décadas de pobreza extrema e até de criação de riqueza em Montalegre. Hoje produzida em menor escala, continua com a qualidade de sempre.

74 ROTAS PERCURSOS E TRILHOS… 3 Um território ainda desconhecido… A Paisagem cultural do Alto Barroso Como turismo interpretativo, designamos um processo activo e participado de análise e compreensão do território e da paisagem Rotas, percursos ou trilhos constituem valiosos guias que nas suas múltiplas dimensões: ambiental, biogeofísica, histórica e orientam a descoberta de um território desconhecido. A produtiva. A definição de percursos de observação, é nesta exploração de um espaço geográfico e a compreensão da sua modalidade turística, fundamental para o estímulo e orientação do identidade é um processo que implica uma relação longa e olhar interpretativo, fomentando o contacto com realidades em exigente entre o observador e o território. Este processo de interacção que no seu conjunto moldam a identidade dos lugares e conhecimento requer disponibilidade para permanecer, das regiões. O turismo cultural, complementar do primeiro, percorrer, ver, cheirar, sentir, interpretar, relacionar elementos, promove a experiência concreta de ambientes culturais específicos apreender padrões, identificar contrastes. Devido à de determinadas regiões ou comunidades, através da aproximação morosidade e exigência deste processo, a riqueza e diversidade aos seus valores, tradições e estilos de vida, do conhecimento do de uma paisagem permanecem frequentemente ocultas face ao seu património e das suas artes visuais e decorativas ou até mesmo olhar do turista. É precisamente este o papel desempenhado da participação lúdica nas suas actividades quotidianas da esfera por uma rota turística: conduzir e motivar o olhar produtiva, lúdica e religiosa. interpretativo, sem no entanto, condicionar a liberdade de opção e o interesse pessoal do turista. Nesse sentido, uma rota turística não deve restringir-se em traçar um dado trajecto, tendo por missão dar visibilidade a todas as dimensões da paisagem e contribuir para a compreensão da interacção de factores que se encontram na sua génese. A concepção de uma rota original, tendo como tema âncora a Paisagem cultural do Alto Barroso, lá bem no Norte de Portugal, tem como objectivo demonstrar o nosso conceito de rota turística, salientando a sua inegável importância enquanto instrumento de apoio à exploração de um território sob o ponto de vista do turismo interpretativo, cultural e sensorial. Por último, o turismo sensorial, situando-se na esfera da vivência pessoal do processo de descoberta de um novo espaço, apreende o território através dos sentidos, propondo percursos de exploração de territórios musicais, de novos olhares sobre paisagens evolutivas ou de rotas de sabores gastronómicos regionais. É neste sentido que defendemos uma perspectiva inovadora dos territórios enquanto produto turístico e uma visão do turismo como eixo de mobilização de actores e dinâmicas de desenvolvimento. A rota aqui proposta pretende abarcar, para além da interpretação da paisagem, algumas vivências culturais do povo do Alto Barroso e ainda, sentir a essência dos territórios que constituem esta região. Tem como base um percurso para veículos motorizados, mas houve a preocupação de fazê-la passar por locais que permitissem a ligação com percursos pedestres ou pequenas rotas assinaladas na região, e para as quais já existe sinalização e/ou informação disponibilizada por organismos locais, nomeadamente na Câmara Municipal e Ecomuseu do Barroso. Fonte: PEREIRA, PEDROSA, 2007, 2010.

75 POLITICA LOCAL DOIS ANOS DE MANDATO AUTÁRQUICO3 NA HORA AS AVALIAÇÕES CADA QUAL FICA COM AS SUAS Uma Oposição que se autoflagela admitindo estar apagada, que se diz sem liderança visível, e elogia o aparecimento de movimentos sem rosto como solução para o concelho, não pode ser levada a sério. Discursos destes, são sinónimos de incapacidade, de desistência e do atirar da toalha ao chão. O Poder Executivo diz respeito a quem comanda!... E comandar, significa continuar a “puxar pela carroça”, nas suas decisões exclusivas e na soberania do procurar atravessar as cinzas do desânimo e da desistência, para desse interesse do concelho, ao invés da maledicência, dos ataques pessoais, dos modo se poder chegar ao centro onde o calor se oculta, se contém e se discursos requentados e fora de prazo e do quanto pior melhor. contagia. É o dever de procurar dar firmeza ao que afrouxa, e vigor aos que o perderam. É enfim, a procura permanente da ambição e da exigência. Neste dois anos de mandato, pese embora todas as dificuldades conhecidas, as calúnias “saloias” e nunca confirmadas e o despoletar contínuo de programas À Oposição, cabe por sua vez o dever e o direito de participação através ditos de investigação feitos à “medida do dono”, e cujo objectivo já se viu é o de dos seus representantes partidários, quer nas Assembleias Deliberativas, potenciarem o contrapoder, o povo de Barroso só tem que se sentir orgulhoso do quer nas Câmaras Municipais, ainda que não assumam pelouros, poderes seu “governo”!... Uma equipa que os honra, que dignifica a região e que na delegados ou outras formas de responsabilidade directa pelo exercício de medida do possível, contra ventos e marés, vai puxando pela terra – não há funções executivas. milagres… De qualquer modo, cabe-lhe neste caso, o acompanhamento, fiscalização e É verdade que nem tudo corre como seria desejável, é verdade que é preciso crítica das orientações políticas dos órgãos executivos, bem como a fazer ainda melhor, ter políticas municipais mais eficazes e consequentes, fazer apresentação de propostas visando os superiores interesses das populações mais força para desfazer os nós que o Poder Central nos impõe, porém “Roma e e do concelho. Pavia não se fizeram num dia” e se olharmos para trás, a diferença do avanço conseguido nos últimos 30 anos comparativamente ao antecedente, está à vista De um e do outro lado, as diferenças têm-se revelado acentuadas – tudo de todos. normal, em nome da liberdade democrática e da democracia representativa. Analisando porém estes dois primeiros anos de mandato autárquico, há que É preciso por isso continuar a aposta, continuar a falar com a clareza e a ser justo, preciso e conciso na análise dos factos que os mesmos nos coragem que não tem faltado, esclarecer para motivar e mobilizar e não o seu ofereceram. Assim, estamos perante um Executivo que faz das “tripas contrário, procurar captar sinais dispersos que sabe-se existirem, e demonstrar coração para que a república continue a sua marcha” na senda do êxito, e uma postura e ética política indubitável e coerente, consistente e constante. uma Oposição tentada em deixar-se transformar numa “vitima dela própria, numa potência sem acto, numa face sem cor, numa voz sem timbre, Se este continuar a ser o caminho, Montalegre e o concelho, ficarão com certeza ou numa qualquer contrafacção sem autenticidade”. a ganhar e os barrosões agradecem… Não vale a pena “tapar o sol com uma peneira” – esta é a realidade. Parque do Cávado nos anos 80 Estamos perante um “Governo” que carrega uma região, e uma Oposição que vive apenas de rótulos e que já se viu nada ter para oferecer aos barrosões. Senão vejamos: uma Oposição que se autoflagela, admitindo estar apagada, que se diz sem liderança visível e elogia publicamente o aparecimento de movimentos sem rosto como solução para o concelho, não pode ser levada a sério. Discursos destes – que diga-se não são novos, são sinónimo de incapacidade, de desistência e do atirar da toalha ao chão. Bastará a quem tiver dúvidas, estar atento ao que se passa, através dos seus canais de informação e às actas – que são públicas, para poder constatar tais condutas e discursos. Ora chegados então aqui, a conclusão só pode ser óbvia: estamos perante Parque do Cávado em 2018 uma Oposição onde não se vislumbra uma voz de comando e completamente à margem daquilo que dela se espera e exige. Estamos perante uma Oposição sem “escola e formação politica”, constituída por “grupos a agir por conta própria”, que vive de casos já politicamente julgados e espremidos na praça pública e nas redes e que não tem noção de que há mais vida para além de um reiterado clima de desconfiança, de mitos, e das bandeiras da demagogia e do populismo. Muito pouco para quem hà dois anos se apresentou como alternativa para gerir os destinos da “nação barrosã”. Propostas devidamente fundamentadas e consistentes que possam promover o desenvolvimento do concelho, ou esbarram na utopia das já referidas redes sociais, ou pura e simplesmente não existem. O último Plano e Orçamento para 2020 é disso um verdadeiro exemplo. No último verão, o signatário percorreu o concelho de lés a lés, falou com vários autarcas – alguns até eleitos através da então chamada Coligação A Força da Mudança, e a resposta foi sempre a mesma: ninguém os vê em lado nenhum – esqueceram as aldeias. Ora sendo assim, resta aos barrosões continuarem a apostar na persistência e na vontade de quem teima em

“PRÈMIO MUNICIPIO DO ANO 76 PORTUGAL 2018” PRÉMIOS MUNICIPIO DO ANO PORTUGAL 2018 MONTALEGRE FOI O GRANDE VENCEDOR NA CATEGORIA “MENOS DE 20.000 HABITANTES” A autarquia de Montalegre, integrou os 35 Municípios os projectos Sexta Feira 13 – Noite das LISTA DAS CÃMARAS FINALISTAS nomeados para a cerimónia de entrega dos Prémios Bruxas. A cerimónia de entrega dos dez Município do Ano - Portugal 2018, que ocorreu no dia 16 galardões a concurso foi antecedida pela Norte de Novembro, em Guimarães, evento que foi organizado conferência \"Como os Municípios podem Alfândega da Fé, Armamar, Montalegre, pela Universidade do Minho através da plataforma UM- contratar transportes públicos e Valpaços, Braga, Ponte de Lima, Viana do Cidades e pela Câmara de Guimarães. Os Prémios partilhados\", proferida por Robert Stussi, Castelo e Vila Real. Município do Ano – Portugal 2018 \"visam reconhecer as Vice-Presidente da Associação Portuguesa boas práticas de projectos implementados pelos do Veículo Eléctrico. No final e “feitas as Área Metropolitana do Porto Municípios com impacto no território, na economia e na contas” para atribuição do galardão ao Arouca, Espinho, Gondomar e Vila Nova de sociedade, promovendo o crescimento, a inclusão e a “Municipio do Ano-Portugal 2018” na Gaia. sustentabilidade\". categoria de menos de 20.000 habitantes, O galardão \"pretende também colocar na agenda, a este acabaria por ser entregue a Orlando Centro temática da territorialização do desenvolvimento, Alves, Presidente do Municipio de Figueira de Castelo Rodrigo, Idanha-a-Nova, perspectivada a partir da acção das autarquias, bem como Montalegre, com o evento \"Sexta 13 - Noite Lousã, Sátão, Águeda, Mealhada, Oliveira do valorizar realidades diversas que incluam as cidades e os das Bruxas“ a ser premiado como grande Hospital e Seia. territórios de baixa densidade nas diferentes regiões do vencedor nesta categoria, no ano de 2018. país\". O Municipio de Montalegre foi nomeado na Um prémio também para o povo barrosão e Área Metropolitana de Lisboa categoria Norte com menos de 20 mil habitantes com para todos quantos pugnam pelo seu Cascais, Lisboa, Mafra e Sesimbra. desenvolvimento. Alentejo AS PALAVRAS DE ORLANDO ALVES, PRESIDENTE DO MUNICIPIO Avis, Coruche, Santarém e Sines. “Mais um reconhecimento ao fantástico trabalho de promoção que está a ser praticado no território”, Algarve disse o autarca na cerimónia de entrega do prémio que decorreu no Paço dos Duques de Bragança, em Albufeira, Alcoutim e Loulé. Guimarães. Regiões Autónomas “Sermos distinguidos desta forma é uma grande honra. Para o conjunto dos municípios portugueses, com Horta, Madalena do Pico, Ribeira Grande e Vila menos de 20.000 habitantes, sermos o melhor na região Norte, é um reconhecimento extraordinário”, Praia da Vitória. sublinhou. Orlando Alves lembrou que, apesar de a autarquia não trabalhar para prémios, mas para a ... “assunção dos compromissos que decorrem do exercício da missão” municipal, é sempre gratificante reconhecerem o seu trabalho. “Se pelo nosso trabalho, empenho, criatividade, dedicação e pela forma SEXTA 13-NOITE DAS BRUXAS como envolvemos a comunidade nos projetos que idealizamos, se isso merecer o reconhecimento do CONQUISTA SIMPATIA GENERALIZADA público em geral – como foi o caso – naturalmente que nos dá uma grande animação e vontade de De acordo com o Município, esta “foi a primeira continuar. É sinal de que o nosso trabalho tem aceitação, é respeitado e dá-nos força para continuar”, vez que a autarquia avançou para iniciativa. A escolha do projecto “Sexta13 – Noite das sustentou o autarca. Nesta quinta edição, estiveram a concurso 54 candidaturas. Júri nomeou 35 projetos Bruxas” não podia ter sido mais feliz a ponto de conquistar a simpatia generalizada”. O concurso para o prémio final e para nove categorias, entre estas a que Montalegre se consagrou vencedora. Municípios do Ano Portugal 2018 é uma iniciativa promovida pela Universidade do Minho, através da plataforma UM-Cidades, que visa reconhecer as boas práticas de projetos implementados pelos municípios com impacto no território, na economia e na sociedade, promovendo o crescimento, a inclusão e a sustentabilidade.

77 BARROSÕES ILUSTRES Dr. Barroso da Fonte Um Homem de causas e de luta pelos valores da honestidade, da competência e da lealdade… Biografia João Barroso da Fonte, de seu nome, nasceu em Codeçoso da Chã, Além da sua vasta obra, fez ainda os prefácios de cerca de meia uma aldeia do concelho de Montalegre, a 19 de Fevereiro de 1939. centena de livros, sobretudo poesia, de vários autores. Frequentou o Seminário de Vila Real de 1952 a 1962, licenciou-se em Enquanto militar, enumeram-se as condecorações recebidas: Filosofia no ano de 1982 e concluíu o respectivo Mestrado na Insígnias da Ordem do Rio Branco, com o grau de Oficial, pelo Universidade do Minho em 1997. Barroso da Fonte é um homem Presidente da República Federal do Brasil em 1990; Medalha do “polémico”, um conhecedor de causas e um lutador pelos valores da Primeiro Centenário da Abolição da Escravatura Negra do honestidade, da competência e a da lealdade. Barroso da Fonte, veio de Amazonas em 1991; Medalha de Mérito Militar por acções em um lar de dez irmãos e trouxe consigo as cicatrizes da enxada, do combate, e Medalha Comemorativa das Campanhas de Angola - gadanho e apresenta-se onde quer que esteja com as caraterísticas 1965-1967. Barroso da Fonte é daqueles homens que subindo a herdadas de seus pais:a frontalidade barrosã como “marca registada”. pulso alcançou o pódio da estabilidade moral e social que os É casado, pai de dois filhos, e autor de mais de meia centena de títulos, distingue. entre os quais “D. Afonso Henriques – Um Rei polémico” e “D. Afonso Henriques 900 anos”. Porém a História que escreveu é bem maior… Depois de trabalhar na Barragem de Pisões, leccionou no Liceu Nacional de Chaves. Em 1975, transferiu-se desta cidade para Guimarães, para trabalhar na Inspecção do Trabalho e no IEFP- Instituto do Emprego e Formação Profissional. Como se referiu, é autor de mais de meia centena de livros em prosa e verso, e actualmente divide a sua permanência pelas Terras do Barroso e de Guimarães, onde exerceu cargos de responsabilidade, entre os quais os de director da delegação do Porto da comunicação social, Vereador a tempo inteiro do pelouro da Cultura do Município local, de O gosto pela História está omnipresente nas suas conversas e director do semanário O Comércio de Guimarães - o mais antigo jornal quando chegou a altura de defender D. Afonso Henriques, do distrito de Braga; esteve entre os fundadores da Rádio Santiago; e ergueu bem alto os seus argumentos para refutar a ideia que o foi director da revista Gil Vicente, do jornal Voz de Guimarães e primeiro rei de Portugal havia nascido em Viseu, liderou a do Poetas & Trovadores com já com mais de três décadas de vida. contestação à teoria de Almeida Fernandes, ganhando a João Barroso da Fonte, que se iniciou no jornalismo em 24 de Janeiro de 1953, leva já 65 anos de labuta nesta actividade e promete não se (Continua na página seguinte) ficar por aqui.

78 BARROSÕES ILUSTRES João Barroso da Fonte Barroso da Fonte, veio de um lar de dez irmãos e trouxe consigo as cicatrizes da enxada e do gadanho… Continuação… “batalha” à Academia Portuguesa de História. EM “NOME DA TERRA” Domingos Chaves UM LOUVOR AO HOMEM A teoria do nascimento do nosso primeiro rei em Viseu, acabaria Falar algo daquilo que já muitos sabiamente falaram, não é coisa fácil. Mas falar exactamente ali. do Doutor João Barroso da Fonte, é o mesmo que dizer, que é um desses tais favorecidos pelo seu mérito enquanto cidadão irrepreensível, homem de letras e Barroso da Fonte, junta ainda ao seu currículo literário, o galardão figura pública propagada nas Terras do Barroso e em Portugal inteiro. Barrosão que o premiou como vencedor do “Prémio Nacional de Poesia de gema, nascido na aldeia de Codeçoso da Chã, do concelho de Montalegre, ao Fernão de Magalhães Gonçalves no ano de 2015”. 19.º dia do mês de Fevereiro de 1939, o Dr. Barroso da Fonte, é daqueles – honra lhe seja feita - que subindo a pulso, alcançou o pódio da estabilidade moral e social que distingue os homens de bem. Trata-se de um galardão anual atribuído pela editora Tartaruga, Conheci-o pessoalmente e fiz-me seu amigo há cerca de meia dúzia de anos, mas instituído pelas Câmaras Municipais de Chaves e Murça, que tem o seu nome e a admiração que nutro pela sua pessoa e pela sua obra, há muitos dado a conhecer muitos dos autores contemporâneos, em particular mais que me é familiar. Tendo ao longo do tempo acompanhado a sua fértil os de Barroso e restante região transmontana. actividade intelectual que sob a sua chancela tem nas mais de meia centena de obras publicadas, chegou a hora de também aqui, lhe prestar a minha singela homenagem. Barroso da Fonte, é um exemplo para todos os barrosões. Um exemplo aliás, que já lhe mereceu ser justamente agraciado pela Câmara Municipal do meu concelho. Precisamente o dia, em que na presença de outros vultos da cultura barrosã – o escritor Bento da Cruz e o Padre António Lourenço Fontes - lhe foi atribuída a mais alta condecoração municipal, em ouro, pela sua inabalável paixão por tudo o que é barrosão. O dia, em que no excelente espaço cultural, como é o Ecomuseu do Barroso, inaugurou uma exposição dos seus livros, artigos, condecorações e pertences diversos recolhidos ao longo de uma vida e que anunciou pretender doar ao Município. Quero por isso aqui nestas páginas, dizer da minha felicidade por poder testemunhar o apreço com que o Dr. Barroso da Fonte é tido em Montalegre e no país. Um homem que sempre me transmitiu palavras amigas e solidárias, próprias de um ser humano de excelência. Um grande Homem, um homem bom, aguerrido e que não hesita em ir à luta, na defesa dos ideais em que acredita. Na ausência repetida do Poder Central reconhecer os vultos da nossa terra, é chegado pois o momento de se lhe fazer Justiça. Barroso da Fonte, Bento da Cruz e Lourenço Fontes, fizeram muito mais pela nossa terra, que muitos “D. Nunos juntos”…

79 SOBRE AS TERRAS DO BARROSO RELATOS DE FERREIRA DE CASTRO Ferreira de Castro era um homem que gostava de conhecer o Lá bem no alto das Terras do Barroso, há ser humano em todas as suas vicissitudes, um estudioso das quem lhes chame também a “Terra Fria”!... questões sociais, utilizando as suas observações para a Região de vida primitiva, baixa densidade realização da maioria dos seus livros. “Terra Fria” é um dos populacional, de pequenos e médios romances onde ele aplica o fruto das suas longas observações, proprietários, de jornaleiros e pastores, traçando-nos um retrato da vida do povo do nordeste de montanhas despidas de vegetação, de transmontano, evidenciando o sofrimento, a luta quotidiana e o economia agricola dominada pelo cultivo modo de vida quase medieval que se fazia sentir nos inícios dos do centeio, batata e pastoril, e equilibrada anos 30 do século passado. E, para mim, é aqui que reside a pela criação de gado, em que o bovino de principal beleza deste romance. Escrito em 1934, Ferreira de raça barrosã se tornou justamente Castro pretendeu transmitir a imagem de vida nessa região. famoso. Os varões, alguns na Hoje em dia, mais de 80 anos depois, esse cenário desapareceu adolescência, emigravam para a América ou poucos vestígios existem, pelo que, é nas páginas de “Terra ou para o Brasil!... “ Metem – anotou Fria”, que descobrimos esse passado e que faz deste livro uma Miguel Torga – toda a quimera num saco espécie de romance histórico. Na aldeia de Padornelos, de retalhos, e lá vão eles. Mourejam como Leonardo luta dia a dia pelo sustento da sua família. Ele e a leões, fundam centros de solidariedade mulher, ainda sem filhos, procuram em trabalhos esporádicos e humana por toda a parte, deixam um principalmente no contrabando, ganhar algum dinheiro rasto luminoso por onde passam, e voltam enquanto sonham em se estabelecer por conta própria com uma venda. É neste contexto que Ferreira de Castro nos descreve a mais tarde, aos sessenta, de corrente ao actividade do contrabando, tão em voga nessa altura e nos dá como exemplo um homem que havia estado emigrado na peito, anel no dedo e com a mesma quimera América, e que como era apanágio, fica conhecido pelo “americano”. Depressa dá mostras da sua riqueza que o leva a numa mala de couro. Gastam cem contos ser considerado um dos homens mais importantes e influentes da aldeia e é ele que dá origem ao drama que irá assolar a terra. numa pedreira para fazerem uma leira, É um romance que nos faz sentir uma constante solidão!... Somos assaltados por imagens de uma terra desoladora, fria, constroem um casarão com duas águias no onde a pobreza é a única condição conhecida e onde o rico julga ter todo o poder sobre o pobre. A meu ver, Ferreira de telhado, e respondem com ar manhoso a Castro para além de evidenciar a pobreza do Portugal profundo, neste caso em Terras do Barroso, lança aqui uma crítica feroz quem lhes censura um amor tão desvairado ao abuso de poder do regime caracterizado no “americano” e a às berças: - “infeliz pássaro que nasce em sua forma de agir. ruim ninho”. Continuam a comer talhadas de presunto crú e a cavar a vida inteira. A Serra do Larouco, ponto mais elevado – 1527 metros – do Alto Barroso, vai marcando o limite transmontano a separar o solo português do galego espanhol, com limite impreciso durante larga duração. Ainda no século XVI, escreveu Virgilio Taborda: “a Serra do Larouco não estava delimitada, levando galegos e portugueses a pastar aí em comum os seus gados”. Na aldeia de Tourém, até parecia existirem por ali outros enclaves no espaço galego, propícios quanto bastassem ao contrabando. Documento humano, de impressionante e trágico verismo é “Terra Fria” de Ferreira de Castro, romance ligado ao ciclo da sua ficção e ao jornalismo profissional de reportagem a que se dedicava, ou seja: à experiência pessoal e à observação experimentada. Escreveu-o já no último século, em pleno Estado Novo, depois de passar diversas épocas do ano entre essa gente barrosã, humilde e boa. Também para Alves Redol, a Terra Fria barrosã, “constitui um marco relevante na germinação que começa a desvendar-se igualmente nessa época, da forte geração que lançou em Portugal o movimento neo-realista”. Na aldeia de Padornelos e imediações, enraízam quer um, quer o outro, mas principalmente Ferreira de Castro com a intriga romanesca (continua na página seguinte)

80 O BARROSO DO PRIMEIRO TERÇO DO ESTADO NOVO VISTO EM ROMANCE POR FERREIRA DE CASTRO… Continuação… TERRA FRIA|A DESCRIÇÃO Com a Espanha ao lado e a mira numa habitação melhor e sobrevivência com a intriga romanesca que acaba em tragédia com a morte de um barrosão mais protegida, alguns destes raianos deixavam-se aliciar pelo contrabando adúltero, emigrado da Califórnia donde regressara rico. Padornelos é ainda hoje uma das demarcações da raia luso-espanhola, ao tempo uma aldeia de de peles, levadas por trilhos pedregosos, para o país vizinho. Ao tempo, sorte igual à de outras aldeolas barrosãs, que no inverno mais parecia uma porém, os lucros eram magros: “os galegos estragavam tudo, quer pagando pocilga, que um lugar habitado por humanos. A pobreza e o desconforto, tomavam-na quase por inteiro. Lembra o autor de Terra Fria: “as casas quantos direitos os Guardas Fiscais exigiam, quer andando na calada da possuíam dois pisos!… Em baixo para vacas, suínos, cabras ou ovelhas. Em noite”, clandestinamente a fazer concorrência. cima, para os homens, as mulheres e a filharada. Não se sabia onde acabava o curral e onde começava a habitação para gente. As crianças cresciam entre ao Ainda na região do Barroso, a partir da aurícula do Gosto Frio, confinante animais nas vielas, nos pátios, por toda a parte, e muitas vezes, o choro manso de um recém-nascido, era abafado pelo mugir lamentoso da vaca a quem com a fronteira, serpenteando por Montalegre, Donões, Vilar de Perdizes, tinham vendido a cria. Havia casebres em que pais, filhos e netos viviam em Gralhas, e canalizado pela raia de Padroso e Tourém – aldeia setentrional da tal promiscuidade - oito, dez, doze corpos de sexos e idades diferentes dormindo no mesmo quadrilongo fosco, com as camas a procurar a vizinhança cordilheira que liga o Larouco ao Gerês, e uma das mais populosas e ricas do borralho, hoje como hà cem anos, hà quinhentos hà mil”. daqueles lugares, de influências galegas e relações coniventes, compreensíveis pela chegada vizinhança – situa-se o Lobo Guerrilheiro, romance de Bento da Cruz, médico, largo tempo em terras do Barroso, aparecido em 1992, de sabor camiliano e aquilinesco. Os anos do segundo quadriénio do século em que arranca a dinâmica da estória, eram, na região, vedados ao progresso e presos dos males endémicos, o analfabetismo, a ignorância, a superstição, o trabalho, a fome, o frio, e doenças e misérias vergonhosas. Do tempo anterior à guerra civil espanhola, o contrabando já se praticava por ali, mas acentuou-se durante a mesma. Eram terrenos de passagem, os Picos de Sendim e do Portelo, “com um caminho de carros entre touças e batedoiros de lobos e contrabandistas”, onde se traçavam dois consagrados circuitos: o galego e o português. O primeiro era mais curto uns quinze quilómetros, mas tinha o inconveniente de atravessar o termo e a população galega de Vilar, paróquia de Randin. O segundo media aproximadamente trinta, e atravessava a serra da Mourela, indo por Covelães. Estreitos e fraternos eram os contactos das populações de uma e outra banda, e colaborantes também mutuamente, as duas autoridades do policiamento: a Guarda Fiscal e a Guarda Civil. Simpatias que conduziram até, à fuga para França dos dois principais protagonistas do romance: o Guarda Fiscal Lobo, desertor e guerrilheiro, e a professora Consuelo, confessa militante frente-populista. Envolvidos no contrabando, num sentido e no outro, contavam-se entre os residentes, famílias com mulheres empenhadas no tráfico, gente de alguma posição económica e social, ao lado dos “pataqueiros”, e até clérigos galegos, que alcançavam por esse meio largos lucros – tudo servindo para se investir em Espanha, mesmo dinheiro surripiado. Era o tempo em que se deixava esposa na “flor da idade” com filhos de colo para alimentar, de quem o marido, emigrante na América nunca mais se lembrara, e que para enfrentar a vida, abrira uma chafarica na aldeia, vendia por feiras e arraiais, metida no contrabando, e encontrada “de noite pelas encruzilhadas da pistola à cinta e alazão lançado a galope”. Cabia neste mundo gente de toda a espécie: o marginal, o “vadio, o contrabandista, o assassino, o ladrão, o mulherengo, o arruaceiro, ou o filho rebelde e mau”. Será que aqui a realidade imitaria a ficção?!... A dúvida foi-nos deixada por Ferreira de Castro…

81 O NATAL ESTÁ JÁ AÍ… 5 de Outubro 1910

82 SOCIEDADE… UM TEMA PARA REFLEXÃO QUEM ACODE À DESERTIFICAÇÃO E AO ABANDONO DAS “O ÚLTIMO SOPRO TRANSMONTANO” REGIÕES DO INTERIOR!... Por: Ana Marques - in Publico3 Por: Domingos Chaves \"Daqui a uns 10 ou 20 anos, a população destas aldeias ter- Depois das mais variadas polémicas e discussões à volta da desertificação e da se-á finado\", constata Ricardo Ramos. \"Eu estou a requalificação das vias rodoviárias na nossa região, apráz-me referir através de uma documentar o último sopro de Trás-os-Montes.\" O Inverno opinião meramente pessoal - mas que presumo poder funcionar como reflexão e aproxima-se e com ele os dias de reclusão dos idosos que discussão deste drama - de que se nada fôr feito a curto/médio prazo, de modo a que habitam as aldeias do concelho de Valpaços. É sobretudo possam ocorrer significativas alterações à forma como estão organizadas e como nesse período que os idosos são visitados por pessoas que funcionam as diversas regiões do interior do nosso país, bem poderemos “prégar no fazem parte de um projecto de acompanhamento a idosos, deserto” e \"esperar sentados” pela sua revitalização. A sua “morte” está anunciada, e grupo que Ricardo integra. \"Somos muitas vezes as únicas não é com os paliativos da descentralização que aí vem ou que se projecta, que o pessoas que eles vêem ao longo de uma semana\", explica o problema será resolvido. Grande responsável pelo que se verifica, o PODER fotógrafo amador, que é também técnico de apoio social. CENTRAL, que desde hà muitos anos vem contribuíndo para a degradação do \"Os idosos ocupam o tempo a ver um dos quatro canais de interior, tem de assumir de uma vez por todas as suas responsabilidades. Quem não televisão de que dispõem. Não têm Internet, não têm cumpriu a regionalização do Continente e a aprofundou nos Açores e Madeira, telemóvel.\" cujos Orçamentos representam cerca de 60% de receitas próprias - a totalidade dos Maria vive numa aldeia com 15 habitantes. Tem 75 anos e impostos aí gerados - e o restante é oriundo do Continente e da União Europeia, tem perdeu o marido recentemente. \"Os cães são a sua única a obrigação moral e legal, de olhar o interior do país com outros olhos, sob pena de companhia\", descreve Ricardo, em entrevista telefónica ao discriminação e da promoção do seu “último sopro”. É pois chegado o momento de jornal Público. \"Eles ajudam-na a superar a solidão.“ trazer de volta o tema das regiões administrativas à discussão, e tendo em conta o Marcelino era um jovem bonito quando partiu a salto para momento eleitoral que se aproxima e os que se lhe seguem, é também a altura França. \"Amealhou uma pequena fortuna, ao longo da vida, propícia, para que os diversos intervenientes neste processo, digam de sua justiça. mas o destino quis que regressasse sem nada\", explica o Portugal é um Estado-Nação alicerçado em mais de 800 anos de história como país, fotógrafo. Hoje vive na casa que pertenceu à sua mãe, numa como povo, como território e como poder politico organizado. As suas fronteiras aldeia que tem cerca de 30 moradores. “Diz que é feliz mantêm-se estáveis e são das mais antigas da Europa. Somos um país constituído sozinho.\" Alice tem 92 anos e vive numa aldeia com dez por realidades geográficas distintas!... Desde o Minho ao Algarve, somos um país habitantes. \"No Inverno, ela fica presa dentro de casa, o que com causas comuns e sociologicamente coeso. Porém, como todos sabemos, este a faz sentir muito só.\" O seu marido morreu jovem. \"Criou modelo de organização territorial, ditou ao longo dos anos o desenvolvimento de oito filhos sozinha. Conta-me histórias incríveis, eu podia assimetrias entre o Norte e o Sul, entre o Litoral e o Interior, com prejuízos nefastos falar com ela durante horas.“ Gracinda perdeu quase toda a para este último. No sentido de contrariar esta tendência, chegou pois o momento de família num acidente. \"Os santos ajudam-me a manter-me todos nós, cidadãos em geral organizados em Associações, e autarcas em particular, viva (...) Se não fosse por eles, já teria cometido suicídio\", trazerem à discussão pública o tema das REGIÕES ADMINISTRATIVAS, tema contou a idosa a Ricardo, enquanto lhe mostrava uma esse que não sendo proibitivo, até se encontra constitucionalmente consagrado e que enorme colecção de pequenas estátuas sagradas. no meu ponto de vista, se constituirá, como a única via que poderá minorar este Como se sabe, as aldeias de Portugal estão a perder estado de coisas. Precisamos de uma politica regional integrada, facto impensável população. Ricardo Ramos, natural de Valpaços, tem como com as prometidas politicas de descentralização que não levarão a nada e poderão objectivo documentar uma realidade na iminência da até trazer prejuízos acrescidos para os Municipios, que pese embora a luta que extinção. \"Pretendo, com o projecto, sensibilizar as pessoas travam contra o drama da interioridade, não podem fazer milagres. As Regiões para o flagelo da solidão na terceira idade e para o Administrativas, devem por isso ser vistas – têm de ser vistas – no actual contexto problema do despovoamento do interior do país.“ europeu, como um processo em evolução de baixo para cima, para desse modo se poder assumir a construção de um país mais igualitário. ... ... Marcelino era um jovem bonito quando Gracinda – diz, perdeu quase toda a família num acidente. partiu a salto para França. \"Amealhou uma Hoje, os santos ajudam-me a manter-me viva (...). Se não fosse pequena fortuna, ao longo da vida, mas o por eles, já teria cometido suicídio\", destino quis que regressasse sem nada\", ... explica o fotógrafo. Hoje vive na casa que Claro que os filhos podiam pertenceu à sua mãe, numa aldeia que tem recolher, gravar mas dizem que dá muito trabalho. \"Eu no meu cerca de 30 moradores. \"Hoje, diz que é tempo sabia muita coisa, agora.... Mas ficai ai mais um cibo a fazer- feliz sozinho.\" me companhia\" Desabafa o Serafim. ... Alice tem 92 anos e vive numa aldeia com dez habitantes. \"No Inverno, ela fica presa dentro de casa, o que a faz sentir muito só.\" O seu marido morreu jovem. \"Criou oito filhos sozinha. Conta-me histórias incríveis, eu podia falar com ela durante horas.“

83 Ditos de Antan3ho Padornelos vale pouco Sendim pouca terra e essa má!... Respondem os de Padroso: Tomáramo-la nós por cá... O lugar de Padornelos Pequenino tem dois erros: Estar rodeado de bruxas E passeado de galegos. Se o casar fosse no fim Como foi ao começar Não saía de Sendim Para tão longe casar. VIAGEM PELAS ALDEIAS Sendim Terra de gente ruím. Sendim-A aldeia “gigante”… nosso rio Lima, e vice-versa. Na fronteira Outras têm a fama, mas é Sendim com os seus Porém, desconhecem-se quaisquer actual existe hoje uma área de serviço 1150 metros de altitude a aldeia mais alta de moderna, com bomba, café e loja, situada Portugal!... Fica próximo da fronteira com documentos ou testemunhos que do lado português, para além de centro de Espanha e chega aos 1150 metros de altitude, lavagem e outros serviços, mas o constituindo-se como uma das maiores elevações permitam traçar uma história do castelo interesse vai para as aldeias vizinhas ali bem próxima da Serra do Larouco, cuja altitude máxima atinge os 1527 metros. Da medieval, que se acredita remonte à época que tanto na Galiza como no Barroso se História de Sendim pouco se sabe!... Apenas que caracterizam pela dualidade entre os usos ali existiu o Castelo do Portelo, o qual se da Reconquista cristã da península tradicionais do campo, com casas em pedra, localizava no lugar do Coto, em posição sobretudo de granito, e as novas tendências dominante sobre uma penedia rochosa na base da Ibérica, em algum momento entre o impulsionadas pelos emigrantes. O contraste é vertente oeste da serra do Larouco, na fronteira por vezes espantoso, até ao ponto de muitas com a Galiza e que juntamente com os castelos da século XI e o século XII. Sendim, faz vezes se pode saber quem emigrou e quem não Piconha, de Montalegre, de Monforte de Rio através do casario, sendo isto talvez mais Livre e de Chaves, assegurava a defesa dos igualmente parte de uma das regiões onde marcante na Galiza, já que na região da Limia acessos aos vales do rio Cávado e rio Tâmega, na mais postos fronteiriços existem –as houve muitos que emigraram para a Suíça Idade Média. Complementarmente, defendia designadamente, enquanto no Barroso foi mais a ainda as terras do Couto Misto, actualmente Terras do Barroso. É tradicional a relação tradicional emigração para a França. Outro fazendo parte do território da Galiza. Acredita-se ponto de destaque é a gastronomia!... Quem que a primitiva ocupação humana de seu sítio da aldeia com as vizinhas aldeias galegas. gostar do polvo, não pode deixar de ir até Baltar remonte a um castro pré-histórico romanizado, ou à feira de Xinzo de Limia onde comerá um dominando a via natural de trânsito entre os vales No entanto, nos últimos anos abriram-se bom polvo à feira, feito ao estilo galego. Mas dos rios Cávado e Salas, sobre os quais se desfruta quem gostar da carne, nada melhor do que uma de uma ampla panorâmica. novos pontos de passagem que posta de vitela barrosã. Isso sem falar dos enchidos, que são do bom e do melhor. atravessam a Serra do Larouco, limite natural desta região barrosã com a Galiza, das quais a mais importante pela ligação com Montalegre é a fronteira de Sendim- Baltar. A fronteira está situada perto da aldeia numa pequena passagem situada entre as montanhas envolventes da Serra do Larouco. Estas terras, tão ricas em estórias de contrabando, têm agora umas boas comunicações que permitem chegar rapidamente de Montalegre até Xinzo de Limia, na região de Ourense, onde nasce o

84 Por cá, a “poesia” também se serve à mesa | Feira do Fumeiro um evento d3e milhões … AS POTENCIALIDADES DA REGIÃO 1992 A Feira do Fumeiro e Presunto de Barroso é organizada pela O primeiro… Câmara Municipal de Montalegre desde o ano de 1992 e a partir de 2002, em parceria A “Grande Rota”…com a Associação dos Produtores de Fumeiro da Terra Fria Barrosã. 2019 E … o último retrato. Promoveu já ações de formação na área da qualidade alimentar, visitas a unidades de produção de fumeiro em Salamanca e formação de novos produtores de fumeiro. Para além das mais-valias que esta Feira gera diretamente para os produtores de fumeiro, são já notórios, no território, os impactos sociais e económicos do aumento Só a partir de 1999 foi possível organizar uma do fluxo turístico Feira com todos os produtores presentes. Iniciada numa pequena garagem com 50m2 e 4 dias de A ideia nasceu e o desenho deste projecto edição, onde estava presente fumeiro de 35 produtores e 1.226 Kgs , logo no 1º dia de edição, também. Mas, quando chegou o momento a organização viu todo o seu produto esgotado. Esta foi a prova de que a aposta da Câmara de procurar produtores, a organização Municipal de Montalegre na realização deste certame estava ganha. confrontou-se com barreiras culturais A garantia de qualidade que a organização assumia perante os compradores, aceitando extremamente enraízadas na população devoluções se aqueles não ficassem satisfeitos, local: tradicionalmente só os “pobres” foi a principal razão deste sucesso. Nos anos seguintes, esta Feira foi crescendo Durante o ano, todos os produtores são visitados, de uma vendiam os presuntos e as chouriças sistematicamente. A relutância dos produtores de fumeiro em venderem os produtos, que forma aleatória, por uma comissão constituída também por produzidas em casa, na maioria das vezes carinhosamente produziam para consumo próprio, foi-se desvanecendo à medida que produtores, que verifica se alimentação dos animais é a de forma escondida e os produtores que constatavam que a qualidade daquilo que produziam tinha uma grande aceitação no alimentação tradicional. Este controlo de qualidade continua poderiam dispensar fumeiro para venda mercado, contrabalançando com os produtos agrícolas tradicionais que, por razões estruturais na matança, com a presença obrigatória do veterinário sentiam-se envergonhados em fazê-lo deixaram de ser comercializados (a batata e o centeio). Os modelos de organização foram sendo municipal. Posteriormente, termina com a entrada dos publicamente. alterados e adaptados à realidade conjuntural e ás avaliações efetuadas, tendo sempre como produtos na Feira. A quantidade de cada um dos produtos Estrategicamente, a comissão organizadora pressuposto base a manutenção da qualidade dos produtos vendidos. O sistema de controlo iniciou- confeccionados, por cada produtor é pesado, conferindo se é redesenhou um novo modelo do projeto: ía se no mês de Fevereiro do ano anterior à realização da Feira, com a inscrição dos proporcional ao número de animais criados e passa depois a casa dos produtores buscar os produtos produtores e do número de animais que pretendia criar para produção de fumeiro. Posteriormente, pela comissão de controlo, constituída pelo veterinário que eram pesados e preçados, vendia-os em visita domiciliária, é confirmado o número de animais que cada produtor detém e são municipal e dois elementos conhecedores da confecção do sem referência ao nome do seu produtor, sinalizados com brincos. fumeiro tradicional que avaliam a apresentação do produto, a apenas com um código que só ela própria textura, o cheiro e o sabor de cada um dos produtos conhecia e, posteriormente, entregava ao apresentados. produtor o dinheiro resultante da venda. Actualmente, os produtores mais idosos, que eram aqueles Este modelo vingou durante os dois que mantinham o “saber fazer” tradicional, estão já a ser primeiros anos. A partir do terceiro ano substituídos por jovens produtores que apostam no alguns produtores começaram a permitir desenvolvimento de métodos mais modernos e consentâneos que o seu nome fosse colocado nos rótulos com as exigências atuais do mercado. As cozinhas dos produtos e, só a partir do quinto ano de tradicionais da casa barrosã, onde se produzia o fumeiro, edição, é que alguns produtores se estão já a dar lugar a modernas cozinhas de produção, onde o mostraram disponíveis para estarem factor higiene e comodidade se alia aos métodos tradicionais presentes na Feira e eles próprios de produção, mantendo toda qualidade e sabor tradicional do venderem o seu fumeiro, ao mesmo tempo produto. Desde 2002, os produtores de Fumeiro estão já que, em espaço diferenciado, a Câmara organizados em Associação–Associação de Produtores de continuava a vender o fumeiro daqueles Fumeiro da Terra Fria Barrosã, sendo uma das suas que continuavam a não querer assumir a preocupações a formação dos seus associados. venda.

ECONOMIA LOCAL… Feira de 2020, está já aí… 85 A voz do Presidente… 3 É a conjugação de todos estes factores que fazem com que o fumeiro de Montalegre seja valorizado, apreciado e conhecido um pouco por NA Fumeiro: um impulso para o concelho todo o território nacional e já agora porque também não dizê-lo, além- HORA fronteiras, nomeadamente na região da Galiza, pela proximidade geográfica que temos com ela. Diga-se, que Montalegre sempre foi Montalegre é o concelho onde a produção de uma terra conhecida em todo o país como a terra da batata, fumeiro está mais fortemente implementada. Além actualmente porém, está a fazer um trabalho com os produtores de do dinamismo que injecta à economia local, esta fumeiro, que nos próximos anos será certamente falada não só como a atividade é também ela importante, na medida em terra da batata que continua a ser produzida, como também como a que impulsiona paralelamente a agricultura, como terra do “Bom Presunto”. mantém vivos saberes e práticas ancestrais. Fomos É desta forma que Orlando Alves começa por falar da importância saber que impacto real tem o fumeiro tradicional na deste sector no concelho, pelo qual é o primeiro responsável. “É do capital do Barroso. porco criado em regime tradicional e alimentado com os subprodutos Em Montalegre por esta altura do ano, é impossível falar de da actividade agrícola que se desenvolveu o sector económico de gastronomia sem falar no fumeiro e seus derivados, em maior importância da comunidade Barrosã – criando a marca especial do porco. Fumeiro de Montalegre. O presunto, a alheira, a chouriça de carne, o salpicão, a sangueira, e o chouriço de abóbora são hoje os produtos Orlando Alves, Presidente da Câmara local, começa por de eleição da região e que assumem o papel de destaque na Feira do explicar que “estamos perante um concelho essencialmente Fumeiro e Presunto de Montalegre” – diz o edil. “Hoje, em termos rural onde o sector agropecuário continua a ser uma forma de vida e de sustento de muitas famílias. Associado a este sector, económicos, é um sector extremamente importante tendo em conta os está naturalmente a produção de fumeiro, uma actividade que se revela de grande importância, a nível económico, para números envolvidos, a riqueza criada e a importância que têm para o desenvolvimento de outras actividades económicas, nomeadamente a restauração, hotelaria e outros serviços turísticos”», considera. muitos agregados familiares. Apesar de se tratar deum sector Orlando Alves explica ainda, que a comercialização do fumeiro de que requer muito trabalho e onde a rentabilidade nem sempre Montalegre consiste, “sobretudo na venda directa ao consumidor é imediata, ainda há muitos agricultores a aproveitar os recursos endógenos existentes e a apostar na produção desta final, no entanto, a venda a intermediários, designadamente para a maravilha, única no país - destaca, realçando que valor gera mais valor e os produtos quando são de qualidade acabam por restauração e comércio está já a ser explorada pelos produtores com planos mais ambiciosos de crescimento”. ser reconhecimentos e alvo de muita procura. É por isso que o fumeiro de Montalegre é já hoje uma marca reconhecida em todo o país”. Para o autarca, “este é um dos grandes desafios do concelho – salienta” propondo-se por isso o executivo, “apoiar e incentivar a população, nomeadamente os mais jovens, a apostar também neste sector”. O responsável salienta não ter a menor dúvida, que o “factor diferenciador é a forma como o fumeiro e os enchidos no concelho são produzidos, onde práticas seculares que passaram de geração em geração fazem a diferença. Práticas que não se alcançam apenas através da forma como são feitos, mas também com os antecedentes, designadamente o modo como os animais são criados e alimentados.

86 ESTATUTO EDITORIAL A revista A BARROSANA, tem como objectivo principal, promover e divulgar o concelho de Montalegre, o seu património, a sua língua, as características e valores da sua cultura, bem como valorizar as obras, os homens e mulheres da região e toda a área geográfica onde se insere. a) São ainda seus objectivos: 1- INFORMAR, garantindo a todos os cidadãos o direito à informação através da independência e pluralismo, de modo a defender os valores, as causas e os interesses do concelho onde se insere; 2 – FORMAR, no sentido de contribuir para a elevação do nível cultural dos seus leitores, tendo em conta a história da região, as as suas riquezas naturais, a tradição e todo um património cultural de séculos; 3 – DISTRAIR, sendo ao mesmo tempo lúdica e de recriação, tendo em conta a diversidade do público, idades, interesses, ocupações e espaços. b) São seus princípios: 1 – Assegurar a independência, o rigor e a objectividade da informação face aos poderes públicos; 2 – A revista define-se como autónoma e independente, sem finalidades lucrativas e acima dos interesses económicos; 3 – A Barrosâna compromete-se assim, a assegurar o respeito pelo rigor e pluralismo informativo, pelos princípios da ética, deontologia e boa fé; c) São seus fins: 1 – Alargar a sua implantação à divulgação de questões de natureza politica e modos de expressão de índole local e nacional; 2 – Preservar e divulgar os valores característicos das culturas da região barrosã; 3 – Difundir informações com particular interesse para o âmbito geográfico da sua incidência; 4 – E incentivar as relações de solidariedade, convívio e boa vizinhança entre os destinatários localizados na sua área de implantação e das comunidades barrosãs espalhadas pelo mundo. O Fundador



BARROSO, PATRIMÓNIO AGRICOLA MUNDIAL SIGA-NOS AQUI: A BARROSANA.PT


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