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zita 26-02-2020 - online

Published by impotol.geral, 2020-02-28 13:01:09

Description: zita 26-02-2020 - online

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Lágrimas Zita Santiago Pelo meu rosto Lágrimas rolam Nada mais vejo Só lágrimas me consolam Tudo acabou Porque havia de ser assim Se o fogo desse amor Ainda arde dentro de mim Separação Palavra horrível Venenosa, mesmo cruel Que me tortura o coração Não me deixes só por favor Não te vás assim sem mim Pois vai contigo esta dor De chorar lágrimas sem fim Escuta É pra ti este poema Vê como te grita Minha alma torturada Eu contigo serei tudo Sem ti não serei nada Vê estas lágrimas Que se disfarçam Em um sorriso constante Mas brotarão de meus olhos Se me deixares um instante Se sofres repara bem Se te vais bem podes crer Se choro lágrimas assim Não és só tu a sofrer. 49

Zita Santiago Levantei cedo Madrugada... Levantei cedo O orvalho que adormecera Sobre a natureza, rebrilhava Desdobrando as cores aí filtradas Pelo sol nascente E os silêncios Ainda se propagavam No jeito de quem tem A doce sonolência Ainda dos olhos, pendente. Nos resquícios das sombras Do luar que na distância Vai perdendo o brilho, Vejo de ti o recorte Nas nuvens que vão deslizando Nesse céu anil No embalo do vento norte Procuro afastar o pensamento De tudo o que me faz recordar Os dias em que o beijo Era a prioridade As carícias a reciprocidade E, teu olhar fundeava No mar do meu Atracando neste porto Que era o único ponto assinalado No mapa da tua vida E te ouço, Para lá de todas as palavras Que bordam a maciez, No tecido áspero do quotidiano Me abraço no teu abraço 50

Que não sinto Zita Santiago E me pergunto, a mim, Porque me minto E me pergunto, a mim, Porque não aceito Que jamais serei o vulto Que olharás em teu leito Vou desviver mais um dia Que de todo não percebo Madrugada...Não devia... Mesmo assim.... Levantei cedo... 51

Zita Santiago Mãe Uma música longínqua Tocada pelos anjos Vem em louvor de ti Toca ela no seu fervor Enchendo a terra de bem Todo o carinho e amor Que tem a palavra Mãe. Uma luz ténue se aproxima É a manhã que chega enfim E os anjos no seu cantar Pronunciam o teu nome Pelo universo sem fim! 52

Mar, amor amar Zita Santiago Meu coração bate no peito Tal como as ondas do mar Com um ritmo tão perfeito Retirando assim, dele o jeito Desse tão ancestral pulsar Bate doido coração, bate Não sei, nem te posso serenar Das marés sempre a rebate Nesse profundo verde e mate Cor da esperança em muito amar Corre louco coração, corre Sobre esse oceano infinito Já que este amor nunca morre Mesmo que tanta lágrima jorre E apenas sonhar me permito Coração perdido e sem norte Sem ter mapa para ancorar Bate, quase encontra a morte Mas sulca todo esse mar forte Para te ter... para te encontrar! 53

Zita Santiago Magnífico momento O ciclo volta a fechar-se Em mais um final de Verão E pelas veredas se estende Multicolor tepete de folhas Que ondulantes, caindo vão Dançando ao sabor do vento Sem queixume, sem lamento Sucumbindo ao seu destino. E nas pedras das calçadas Se vêm pousar cansadas Umas, castanho dourado Ocres e vermelho sangue Ou de verde, envelhecido Outras de tom alaranjado E outras bem amarelas Me fico ali a olhar para elas Nesse festival colorido Do seu esvoaçante dançar Me encanto de tanta beleza, Que nos concede a narureza E meus olhos vem deleitar Umas inteiras, outras cortadas Outras meio amarrotadas Todas elas tão resignadas Cumprindo a triste sina sua Enfeitando todas as estradas Enfeitando cada rua Cada uma de seu tamanho De invulgares e belos recortes E de tão diversas texturas Emprestando odor à aragem E embora já sem vida 54

Dão vida a toda a paisagem. Zita Santiago Assim, nasceu o Outono Ora alegre ora tristonho. E as folhas se irão perdendo No nada e apenas ser pó E morrer no esquecimento Assim o Verão se fechou... ...Mas magnífico é momento!!!... 55

Zita Santiago Mar de nós O Mar..sempre o Mar! Mar de fado Mar de poesias Mar de lentas agonias Mar de perfumes diversos Que se vêm perder Em meus versos... Mar de ternuras Mar de alegrias Mar de eternas fantasias A encher nossos sentidos... Mar de feitiços perdidos Mar de afetos desejados Por ti, por mim e por nós Mar de solidões lado a lado Mar de vivências tão sós Espalhadas no Mar salgado Mar de desesperos Mar de desterros E muito mais Mar ainda !!! Mar de Lágrimas... Mar de dor Mar de sorrisos.... Mar de beijos.. Mar de Amor... Mar de ventania infinda Tanto Mar nos meus E nos teus olhos... Mar de tormentas E tantos escolhos... Tanto mar a separar E outro tanto a unir... 56

Mar de esperanças... Zita Santiago Mar de saudades Mar de lembranças... Tanto mar por descobrir!!! Mar de sonhos a navegar... Mar de anseios... Mar de desejos De loucuras a flutuar Mar sereno, Mar Revolto Nunca mudo... E o Mar que sempre vi Será sempre O Mar de tudo O Mar de mim e de ti. 57

Zita Santiago Melodia Quem não viu o doce brilho Que há na ternura do olhar De uns olhos que muito amam A outros que querem amar As duas mãos que se unem Na mesma forma de querer Essas mãos que se procuram Sem um nem outro saber Cantando a mesma melodia No refrão do mesmo amor Vivendo na mesma alegria São duas almas que se entendem Dois lábios que se desejam Dois corações que se prendem. 58

Menino poeta Zita Santiago Menino poeta De olhos de ágata De tez perfumada Viva e morena Espalha sorrisos Que em feixes desata Confia e estende A mãozinha pequena Impérvia criança De fulvos cabelos Sedosos e longos Que o vento afaga Doce visão dos sonhos Mais belos Envolta em mistério Que jamais acaba… Rosto pueril De suave candura Onde trígones puseram A sua ternura Serás para o mundo -Quem sabe- Profeta-? Mas em meus versos Onde há eutimia Serás para mim A minha poesia Serás para mim O menino Poeta! 59

Zita Santiago Meu querer Indelével e mórbida A placidez da tarde Indiferente à poesia Que seu seio embala Quero cantá-la Quero que ela guarde Meus versos Rubros matizes de opala Quero olhar teus olhos Límpidos lagos Onde se espelham, os meus Quando me fitas Alienismo ingente Sem nenhuns embargos Canto amor que em silêncio Me gritas Quero glorificar a terra Piedosa pousada Em que minha alma Irá repousar cansada Quando meu corpo Se reduzir a pó E enquanto desta vida Me não for Eu quero amar-te Quero cantar o amor, Quero cantar-te a ti, Deus de mim só… 60

Meu viver Zita Santiago Eis-me de rastos Pelo mundo Dos desventurados Sem carinho Eis o abismo Frio e profundo De que é feito Todo o meu caminho Vou ao encontro Não sei de quê Procurando em vão O que desejo. Ando perdida Assim à mercê Tentando visar O que não vejo Eis estes meus passos Lentos E os meus ouvidos Atentos A sons que cantam tristezas Mas quem sou eu Para impedir Os lábios dos outros De sorrir Enquanto eu vivo Incertezas? 61

Zita Santiago Minha verdade Recordei, ainda que só para recordar Meus quiméricos sonhos juvenis Minhas loucas fantasias, e, lembrar Além anos de juventude feliz Recordei, instantes da minha alegria Quando infantilmente imaginava Dois, três traços de poesia E em voz bem alta os declamava! Entrei assim no quarto Da saudade Vendo ante meus olhos A verdade Que eu pensei longínqua… Esquecida. E um frouxo sorriso De amargura Me entreabre a boca Que murmura: Passou o tempo… São leis da vida! 62

Na certeza Zita Santiago Sinto meu corpo se incendiar Toda vez que teu lindo olhar Me despia e perturbava o sentir Teu amor me perfumava a pele Neste desejo que me impele De me entregar sem mentir Esta envolvência me serena Chega-me de longe e amena A música murmurante do mar Que me traz de ti a mensagem Suspensa na doce aragem Que sempre fiquei a esperar E mesmo te sentindo ausente Sinto que estás sempre presente No eco das palavras que digo Sinto que também me desejas E sinto quando me beijas Na certeza que estás comigo Na certeza que me desejas... Na certeza que sempre me beijas... Mesmo que a meu lado não estejas... ..Estás em mim e eu contigo! 63

Zita Santiago Natal É Natal Festa de luz e de amor Quadra simples e singela Com seus hinos de louvor No universo cintilam estrelas Cantam anjos em festival Abrem-se as portas do céu Cantemos, pois, que é Natal Não haja maldade na terra Não brigues com teu irmão É Natal em todo o mundo Seja-o em teu coração Crianças venham, escutai Vinde todas até mim Cantai comigo, cantai Vinde cantar sempre assim No céu já brilham estrelas Cantam vozes de crianças Há tréguas Paz na terra Renascem no mundo as esperanças. 64

Ninguém Zita Santiago Andando ecoam meus passos Sem destino rumo ao além Levo na alma a dor No corpo todo o cansaço As pessoas me olham Com desdém! Ferida, assim padecendo Cabelos em desalinho Olhar fixo no vácuo Eis-me aqui …Não sou ninguém! Não sei sequer onde vou Donde vim, também não sei. Dos meus olhos já vermelhos Caem pérolas de cristal Que me humedecem as faces E rolam caindo a meus pés. Atrás duma, outra já vem Jamais terei rumo certo Jamais saberei quem sou Porque sempre, sempre Serei… ninguém! 65

Zita Santiago Noite fria Na noite estrelada e fria Fixou seus olhos no nada Gravou seus passos na neve O seu andar o guiava Vi que seu rosto escaldava Ao contato da brisa leve Não sei o tempo que passou Por longas horas caminhou E triste semblante levava Vi que seu corpo era um trapo Debaixo dum velho farrapo Mas sua alma cantava Aquela noite era linda Queria até que fosse infinda Para que fosse feliz um instante Aquela noite sem igual Aquela noite de Natal Que sempre vira distante Mas eis o seu Natal que chegava E mais uma estrela brilhava Quando o dia amanheceu É que naquele sono leve Ali mesmo sobre a neve Para sempre adormeceu… 66

Noite Zita Santiago Noite silenciosa, que guardas, Lindos segredos no manto teu Noite bela, noite calma. Noite de um sonho meu Guardas de mim tudo, Porque tudo te contei, Tudo o que ambicionava, Tudo quanto imaginei. Só tu sabias, Todos os meus desejos E conhecias todo o meu fado Por não ter os seus beijos, Nem tê-lo a meu lado! Foste tu, oh noite Que por mim velaste, Quando ao negro pecado, Me arremessaste Viste as minhas lágrimas Pelo meu rosto correr, Calaste as minhas mágoas, Viste-me sofrer! Desesperada supliquei-te Que me devolvesses minha alegria E, nesse desespero, Desejei que se fizesse dia. Porém tu, implacável continuaste Bela, mas fria. Noite coroada Pela coroa brilhante Da serena Lua Noite! Dos fracos, amante Serei sempre tua! 67

Zita Santiago Nós dois Voam tranquilas as aves E o teu caminhar é lento… Vejo-te, tu não me vês E o teu olhar está atento… Vejo essas mãos intranquilas Tremendo na mais funda dor Vejo-te, tu não me vês Mas buscas o meu amor… Teus cabelos revoltados À fúria do vento que ri Vejo-te, tu não me vês E eu vou atrás de ti… Vi teu sorriso esvair-se Em lágrimas se transformar Vejo-te, tu não me vês Mas tens desejo de amar… Vou-te seguindo sempre Olhando as tranquilas aves Vejo-te tu não me vês Por isso tu não sabes: -Não sabes que o meu caminhar É tão lento como o teu E, ver-te sem que me vejas É triste sofrimento meu. Não sabes que as minhas mãos São tão brancas como nuas E ver-te, sem que me vejas Tremem de amor como as tuas. Não sabes que os meus cabelos Revoltos ao vento também Ver-te, sem que me vejas É andar só sem ninguém. 68

Não sabes, que não és só tu Zita Santiago Que choras e não sorris Pois ver-te sem que me vejas Não foi isso que Deus quis… Olhemos, ambos as aves Do céu estático imenso… Olhando assim os dois Viveremos então depois Um maior amor, mais intenso! 69

Zita Santiago Nosso mundo Tu, Não sabes. Eu, Não sei. Talvez , sonhaste. Talvez, Sonhei. Quando paraste, Parei Também. Ambos Olhámos, Um mundo Além… Demos a mão Sorriste, Falei. Tu, não sabes. Eu, Não sei. Talvez Sonhaste, Talvez, Sonhei. 70

Nunca Zita Santiago Nunca deixe morrer A criança que tem dentro A vida é só um momento A vida, passa a correr Deixe seus sonhos voar Dê-lhes toda a liberdade Não têm preço de verdade E fazem a vida avançar O sonho permite ver Até onde o desejo alcança Alimentando a esperança De um dia poder vencer. Em nosso ser sacrossanto Essa criança a brincar Irá pôr em qualquer canto Onde a mente quiser estar Tem a vontade intrínseca Do sonho fazer crescer Cuide a criança que brinca E nunca a deixe morrer... 71

Zita Santiago O último dia na terra Crepúsculo… Já Lucina acorda estremunhada Há no seu olhar vidrado Cintilações de prata Há pássaros vermelhos Passando em revoada Já luz no espaço, venenosa A espada ingrata! Já vejo féretros tábidos E risos de ossos Já ouço os gemidos Merencórios da cicuta Há corpos sem ventre Agonizando em fossos, Mais do que morte alívio São morte bruta. E o cheiro adusto, pútrido Que dali exala Rasga as entranhas E fere a pele mimosa Da única vida fugaz Que a noite embala. A última chama vem Vem flavescer piedosa O nada que era o tudo E tudo enfim abala! As trevas desceram À terra revoltosa… 72

Anseio Zita Santiago Abram portas e janelas Pelos cerros despertem rosas Sacuda o vento a lágrima Que a noite se descora Pelas estradas Sorriam zíngaras mimosas Transforme-se o espinho Em lírica flor, nesta hora Abram-se os livros De saudosas laudas amarelentas Sedas azuis de Primavera Que o mar tem a alma A desfazer-se em ondas lentas Trazendo frescor Às mais ardentes vestes de quimera Deixa que o cendal do tempo Te envolva, eu leio Que o sol ao nascer Transporta em seu seio Danças veladas Verdes de esperança, viva melodia Que venham musas Ornadas de oiro que em estrelas se desata Colocar o florido estema Em teus cabelos de prata Meu amigo, meu amor vê… É teu este dia! 73

Zita Santiago Ontem Ontem a tarde descia… Odor a glicínias Era a passagem do novilúnio Obliterada E a lauta fotosfera De luculentas mãos ígneas Adormecia coberta de ténue Armur cendrada. No meu regaço Jaziam tétricas violetas Colhidas entre glaucos Jardins ancestrais Tempo das sombras versáteis Quase pretas A perpetuar o perfil célebre Dos imortais. Ontem… Era o tempo dos ardentes beijos Do último adeus Da paixão e dos desejos Envoltos em chamas A esbrasear os sentidos… E o embuçado Zéfiro ímpio De face triste Converteu chorando As últimas notas de Liszt Num florão de sonhos lúbricos Estremecidos. 74

Pó Zita Santiago Vim das estrelas e sina traçada De encontrar almas sem nada Ocas, vazias e tão carentes Que me tolhem o caminho São tão falhas de carinho Até de si, tão indigentes Me sugam toda a energia Me roubando minha alegria E me cersizando o sorriso Causam dor, me dão quebranto Que se adivinhassem o quanto Marcam minha alma dorida Calariam suas bocas Não andariam tão loucas Me querendo roubar a vida. Pela luz que não possuem Na minha se prostituem Me forçando à escuridão Sem piedade e sem moral Mas não me podem fazer mal, Deus moldou, meu coração. Também me deu este querer E hercúlea força para saber Quando devo ficar só... Tudo em mim, vai serenar Sempre se irá preservar E essas almas... serão ... pó! 75

Zita Santiago Promete Me roubaram o brilho dos olhos E a doce alegria, a meu coração Me tiraram tantos dias aos dias Levaram o que tinha de melhor Furtaram meu refúgio de ilusão Da luz que me habitava a alma E que iluminava o meu ser... Roubaram até a razão Da minha razão de viver Roubaram do sol seu calor Que já não me aquece mais E o ar que respiro, rarefeito Percorre minhas entranhas E se congela em meu peito. Vem Zéfiro e se veste de mim E me deixa desnudado o corpo Mas anjos serafins e querubins, Deixam cair penas ao de leve Para cobrir a pele de meu frio Mais frio que a própria neve. E se a brisa nevoeirenta Da madrugada te trouxer Leva em teus lábios meu beijo gelado Que levará tempo a aquecer Mas se antes, minha vida se for E se precoce, meu espírito evolar, Promete... Promete não deixares teu amor roubar E que não esquecerás de me amar! 76

Porquê? Zita Santiago O homem pôs a cidade na terra E acordou estrelas na cidade Onde em noites plácidas As crianças extasiam… As crianças, trazem a Primavera No rosto e ninguém olha… O homem pôs a cidade na terra E não soube olhar a sua obra . As crianças enterram os pés na lama E os seus olhos são estrelas Que ofuscam as estrelas Que o homem pôs na cidade Elas olham e sabem ver… O homem semeia a luz E colhe as trevas. O homem não sabe ver Com olhos de criança Come cinza E bebe lava incandescente Que regurgita no seu ser. As crianças adormeceram E o seu sono eleva-se À translúcida noosfera… Há corpos destroçados Decompondo-se Há farrapos estendidos Pelas esquinas E pela primeira vez, Eu vi o homem chorar! 77

Zita Santiago Princesa Nunca te vi meu amor Apenas te sonho Nas meigas, ternas palavras ... Que nunca me escreves E mesmo assim te atreves Deixar minha garganta presa... Nunca te vi meu amor Apenas te sinto Na forma doce do pensamento... No sentido que apenas imagino Num dialecto que não domino Quando me chamavas Princesa ! Nunca te vi meu amor Só te adivinho No lento brotar de desejo... A palpitar em mim noite dentro A permanecer naquele momento No profundo meditar de quem reza... Nunca te vi meu amor Só te ensaio No verde mar, prateada espuma... Dedos de areia quando percorrias Em mim, nas horas daqueles dias Quando me chamavas Princesa !.. 78

Penso em ti Zita Santiago A noite chega Trazendo a saudade apertando o peito. Tão quieta, tão calada, Se ajustando em mim tão apertada Envolvendo de sombras os lençóis Do meu leito A chuva desce Em compasso de gotas certas Lavando a poeira seca espalhada pelo chão Semeia salpicos de melancolia, desolação Esvaziando cúmulos e nimbos pelas ruas Desertas Cerro os cílios, todo meu corpo estremece E em minha alma sedenta de amor Se solta o soluço, se instala a dor E no coração se desenha uma prece A pedir o beijo que quase não senti A suplicar o abraço que não vivi Meu amor, meu amor... ...... Penso em ti! 79

Zita Santiago Que importa Que importa que passe na rua Que importa eu ir onde vou Que importa morrer morte crua Se teu olhar me não olhou Viver à espera do que não vem É coisa que melhor não seria Conseguir-se o que se não tem Nem suplicando se conseguia Que importa ver-te passar Que importa sozinha te amar Que importa ter o amor à porta Se sempre longe estarás E jamais algum dia amarás E sendo assim…que importa? 80

Quem és tu? Zita Santiago És o luar espreitando… Noite escura Enlaçando minha alma De ninguém Tépido perfume das rosas Na frescura Dum meigo sorriso Sonhado por alguém És sonho efémero Vestido de estrelas Corcéis de luz, Castelos de ilusão E eu quero pegar-lhes Chegar a elas E fico aqui quieta Colada ao chão És meu andar de silêncio Pelos caminhos Ave do céu em busca De outros ninhos Fruto de árvore Vermelha romã. És ribeiro cálido Em carícias esparsas Sol em fogo Entrando pelas vidraças A beijar-me o rosto Pela manhã... 81

Zita Santiago Quero o tu e o eu Quero cada pedaço teu para guardar Num canto meu! Quero cada momento teu a prender O pensamento meu Quero um beijo teu para morder O lábio meu Quero o carinho teu para desfazer O sofrimento meu Quero o abraço teu para dar calor Ao frio meu Quero cada olhar teu para apagar O choro meu Quero o desejo teu para suprir O anseio meu Quero todo o amor teu para conforto Do sonho meu Quero entregar tudo o que é meu Para ter tudo que é teu... ... Quero apenas o tu e o eu! 82

Quo Vadis Zita Santiago Onde vais? Caminhas nas trevas e finges sonhar As mãos molhadas Contorcidas da dor insana Que de teu peito arrancas E no meu, certeira Se vem cravar Como estilhaços de porcelana. Veste-se a noite de veludo E em seu retiro Teu corpo frágil sucumbe Vazio, exausto Sinistro, duro cutelo Onde me firo E que ao partir, me ofereceste Em holocausto. Deixaste a fantasia errante Da incerteza E nos meus olhos A espada adunca da tristeza Que venha a morte Fria, imensa, taciturna! Que a brisa surja terna, lenta E eu já não sei Se teus fogosos lábios Que eu nunca beijei Virão um dia ardentes Abrasar a minha urna! 83

Zita Santiago Recém-nascido Vens do azul dos tempos Das noites ensombradas Cheirando a urze Da floresta vens… Nada conservas Que se entregue ao frio Nada do arquétipo De onde vens… Vens de ocupar o nada Da terra dos silêncios Dos musgos niquelados Da transfigurada coisa Que é a de ser poema És a loucura Da razão do ser … E as horas Que nunca tiveste Apertam o cinto Do teu berço. Tens já os séculos A pesarem-te nos olhos E antes de sofrer Já soluças. Vens do seio das estrelas E dos anos Sem estações nem dias… Vestido de névoa E mornas orvalhadas. Sulcaste a cortina Do abismo E o manto em que dormias Floresceu. 84

Foi longa a viagem Zita Santiago O cerne da magia E o ritmo do destino Em tons de ternura Vela por ti. Cumpre, que esse rosto Que ainda é sonho Quebre a solidão Das fronteiras por descobrir. Vens dos braços das nuvens Cheirando a maresia, Deslumbrante de luz, Das trevas do pensamento Que não desfias, Entre mil segredos Que guardas E não revelas. És corpo frágil Ingénuo e tímido A flor do luar Prateando a terra. E ao nascer Indefeso vate Quem diria… Mudou todo o minuto Numa só hora, Mudou o mundo inteiro Num só dia! 85

Zita Santiago Pensamento O meu pensamento É uma constante poesia É o descortinar Das coisas por descobrir. Com ele vejo o ar translúcido E o bailado do invisível. O que é verde Posso chamar-lhe amarelo E ninguém sabe. Posso andar por cima das nuvens Que ninguém vê. Posso gritar às montanhas, Falar com os pássaros, Que ninguém ouve. E, só porque ninguém ouve nem vê, Ninguém sabe o que penso. Porque não me desloco Estou sempre no mesmo sítio E ninguém pode saber o que há Para além do meu pensamento. 86

Obra Deus Zita Santiago Nuvens gaivotas mansas Cruzando com asas brancas O azul pacífico dos céus Farrapos que entre os ventos Escondem meigas, doces lamentos Nas carícias dos dedos seus… Nuvens gaivotas mansas Castelos de doces esperanças Dos puros sonhos juvenis. Só queria saber os segredos Que entre sussurros e medos O vento lhes conta feliz. Nuvens que vão correndo De vez em quando aparecendo Toldando os caminhos meus… E essas gaivotas mansas Essas gaivotas tão brancas São vasta obra de Deus. 87

Zita Santiago Recorte Estio calmo suspiro exangue Cigarras de cantos triviais Papoilas gotas de sangue Na pele morena dos trigais Ternura embalada nas ondas Do vento bríseo matutino Estio das tardes das mondas De sol escaldante purpurino. Campos sonolentos sequiosos Lentidão na hora sempre igual Fulgor dos dias luminosos Do estio ameno em Portugal. 88

Revolução 74 Zita Santiago Quando eu nasci, meu País De tanto sol, tanto mar Estava doente infeliz E tinha a alma a sangrar. Um dia acordou Abril Com tanto perfume em flor E sob um céu tinto de anil Deu-se a batalha do amor… O sangue rubro que eu vi A derramar-se pelo chão Era dos cravos cor de rubi Na boca de cada canhão. Não esqueçamos um instante Esta revolução sem par Que o mundo todo se levante Quando Portugal passar! 89

Zita Santiago Saudade Saudade, loucura de anseio em brasa De pensar que se vê Em não se vendo É temer morrer de estar vivendo É viver da esperança Que a dor enlaça… Riso habitando o pranto Vazio mudo Fronteira sem cor Flébil amargura Desejo que é só quimera Ternura De roubar ao nada O motivo de ser tudo. Templo de chama flamejante Abnegada Do muito que se quer Não pedindo nada É ter por bem, o mal, Que desespera… Andar onde vagueia O pensamento Ter alegria Onde só há sofrimento Tortura que não mata… -Dilacera- 90

Tua imagem Zita Santiago Ver-te, É ver o sol que ao raiar Entre brisas E frescores matinais É sensação quebrar A monotonia Destes dias sempre iguais Dias tristes, sem sentido Se não vens Envolver-me em teus Braços amorosos É magia é condão O que tu tens Em tornar-me estes dias Radiosos Ainda és tu A quem procuro Quando a noite De turbante escuro Te leva para longe pra longe Para além… E é tão triste Abrir os braços À espera de ternos abraços E sentir Que aqui não está ninguém!... 91

Zita Santiago Sedução Em mim, teus silêncios fazem eco E espero na vigília, da noite calada Em perfeito compasso no tempo Na minha quietude tão desusada Ouvindo o sussurrar doce do vento. Abraço meu corpo a recordar o teu O deslizar de dedos na minha nudez E teu suave beijo sobre meus seios Fecho meus olhos, em clara lucidez E deixo que seduzas meus devaneios. Torrentes douradas pintam os céus Brotam perfumes de todas as flores Desses recantos do meu jardim E o amanhã cheio de esplendores Te surpreenderá colado em mim. Tuas palavras, melódicas irão voar Como canções dos ninhos das aves, Entrando de manso em meus ouvidos Seduzirás meu eu e, com verdades Seduzirás todos os meus sentidos! 92

Velho doido Zita Santiago Louco mundo Velho alucinado De corrupção, de volúpia Construído És máquina, és robot Articulado És veneno que a golos Foi bebido. Decorrem como jatos As tuas horas Volatiliza-se o minuto Decadente E são anos e são séculos Que devoras Na frieza desesperada De Demente. E a vida agita-se Tumultuosa Não é mais que vulgar Nebulosa Insondável, fria Condensada. Sou tua velha doida E concebida De tal maneira, dentro da tua vida Que por mais que seja, Nunca serei nada!… 93

Zita Santiago Ser esquecido Quando nosso ser É esquecido É como Se tivesse Morrido! E não há Solidão maior Que ser banido De um coração... Seja voluntário Ou não... Dói como Se a carne Rasgasse Como se a mente Bloqueasse E a loucura Se instalasse. ... Oprime o peito, Não se respira Direito. Não há norte Nem há sul O céu jamais Será azul E o vento Não sopra doce Trás o som Como se fosse Um lobo Ao longe A uivar 94

Não há aves Zita Santiago A voar Nem nunca Se ouvem Cantar O corpo Não tem calor É gelado Como a dor Que corta A respiração... Ao ser banido de um coração, É ser esquecido. E, ser esquecido... ... É como Se tivessemos morrido! 95

Zita Santiago Silêncio Silêncio Calem-se as fontes Que cesse o bramido do mar Que pelas encostas dos montes Os ventos não ousem falar Que seja tristeza a alegria Que todo o meu ser despreza Noite se faça o claro dia Que em meu coração Tanto pesa E que esse silêncio encerre Um outro silêncio Que fere O mais recôndito em mim. Que eu guarde assim Já vencida Silêncios duma outra Vida Dum outro silêncio Sem fim… 96

Palhaço Zita Santiago Palhaço que ris Que saltas que danças Que iluminas o rosto De tantas crianças De cara pintada Sorriso cansado É essa a tua vida É esse o teu fado Se alguém reparou Com certeza viu Que esse teu rosto Nem sempre sorriu. Chorou um dia Talvez por amor Talvez por desgosto De ódio ou de dor. Dizer que chorou? Chorou sim! O palhaço é homem O homem é vida E a vida é assim! 97

Zita Santiago Sombras A ti Que vives da minha vida Que me ouves no meu silêncio Que vives Da esperança, do amor Não me sigas. Eu sou temporal Sou aurora Sou a fúria do vento Inconstante. Sou ave doutro país Sou tudo Menos o que querias que eu fosse. A ti Eu peço, Segue a tua vida sem mim Mas não chores. Há tanta coisa que não disseste E que eu sabia Era o amor… Tu não sabias, eu sim. Por isso te digo Que guardes os teus sonhos, A tua juventude E não me olhes com esse olhar Que me perturba Leva contigo essa aguarela De cores púrpura Emaranhado de luz Que é esse teu coração Como é ardente Este desejo 98


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