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peregrino_rec18

Published by Paroberto, 2019-07-30 18:51:51

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LOUCURAS DE UM mais de 4 mil quilômetros, a pé, com mochila nas costas PEREGRINO Ângelo Stirma



Loucuras de um peregrino



Angelo Stirma Loucuras de um peregrino

© 2012 Ângelo Stirma (48) 9973-3118 [email protected] Projeto gráfico, arte e diagramação: Paulo Roberto da Silva Ficha catalográfica S861l Stirma, Angelo Loucuras de um peregrino / Angelo Stirma. – Tubarão: Gráfica e Editora Copiart, 2012. 142 p. : il., fots. 1. Peregrinos e peregrinações. 2. Santiago de Compostela (Espanha) – Descrições e viagens. 3. Santuário de Apareci- da (São Paulo/Brasil). I. Título. CDU: 910.4 ISBN 978-85-99554-66-1 Catalogação na fonte por Onélia Silva Guimarães - CRB 14/071

*O peregrino louco* O homem não é o centro da peregrinação, é o seu próprio coração que o guia na jornada. É por isso que ele se afasta de sua terra natal à espera de encontrar o local onde terra e céu se unam. Santo Agostinho



Dedicatória À memória de minha saudosa mãe, Ângela, que sempre me apoiou e amparou, motivando-me a estudar e mostrando-me o caminho do bem, uma inspiração constante em minha vida. Às minhas filhas, que são o motivo principal de minha vida, com garra e persistência, procurando dar a elas um exemplo de vida de que possam se orgulhar, e que me ajudam a ser um pouquinho melhor a cada dia. À minha grande companheira Alessandra, que sempre me apoia quando falo em fazer essas “loucuras”, dando-me incentivo e amor, e que me motivou muito a escrever este livro. A todas as pessoas do meu convívio profissional que souberam suplantar minhas ausências com dedicação. Ao saudoso Douglas, grande amigo e ótimo profissional e que foi chamado para nova missão junto a Deus; com sua dedicação e competência, soube conduzir os rumos da empresa de Santa Catarina nas minhas ausências. Aos meus amigos e companheiros de caminhada, Celso Bevilacqua, Francisco Bogoni, Elizandro dos Santos e Andrey Galli, com os quais aprendi muito, percebendo que, nas grandes

empreitadas, precisamos de grandes amigos. Ao Dr. Mauro Bonato, que me incentivou a começar a correr. Já fiz a Corrida de São Silvestre em 2011, encontro-me motivado e treinando para fazer algumas meias maratonas em 2012, e esse é mais um objetivo saudável em minha vida. A DEUS, que me proporciona saúde e condições para que eu possa continuar nessa maior caminhada, A VIDA, dando-me sabedoria para discernir os passos certos, visando a solidificar o caminho para a eternidade.

Sumário Introdução..........................................................................11 O que leva uma pessoa a peregrinar?.........................15 Motivos para peregrinar....................................................................16 Fé........................................................................................................18 Determinação ....................................................................................20 Persistência........................................................................................22 Resultado/objetivo............................................................................24 Loucura..............................................................................................26 Etapas.................................................................................................32 Diário..................................................................................................35 Os “Equipamentos”.........................................................................125 O que levar?.....................................................................................125 Considerações finais........................................................................127 Caminhos percorridos.....................................................................137



Introdução O título deste livro advém da reação das pessoas quando contamos sobre nossas caminhadas, e de um fato marcante em 2002, quando, no Caminho de Santiago de Compostela, chegamos ao Albergue de Los arcos, que já estava fechando. Às 22 horas, a hospitaleira perguntou de onde havíamos partido e quando informamos que foi de Puenta La Reina, a 46 km, espantou-se e falou: “Sois Louco”? Acredito que o PEREGRINO, na realidade, é um pouco louco, não no sentido psicológico, mas no da superação, da aventura, da fé. Por isso decidi explorar o tema neste livro. O que diferencia as pessoas que alcançam seus objetivos daquelas que ficam pelo caminho, se todos temos sonhos e alguns alcançam e outros ficam a vida toda frustrados? A resposta é: determinação e persistência. Quando, por volta de 1998, numa festa entre amigos em Cascavel (PR), na sede da empresa Perquímica – eu havia acabado de ler o livro “Diário de um Mago” do Paulo Coelho – propus fazermos o Caminho de Santiago de Compostela, estávamos pactuando em aproximadamente dez pessoas, mas quando

Loucuras de um peregrino chegou a hora, em 2002, somente sobraram o Celso e eu. O que aconteceu para que os outros desistissem? Os motivos alegados foram muitos, mas na realidade o que faltou foi DETERMINAÇÃO, porque aquilo que queremos, e com persistência, com certeza conseguimos. Na vida, em todas as situações, saúde, trabalho, família, etc., sempre planejamos muito, mas concluímos pouco. O que nos falta? Determinação em fazer, e persistência em não desistir. É por isso que as pessoas de sucesso se destacam; porque persistem em seus sonhos, enquanto outros, na primeira dificuldade desistem. Quando iniciei a peregrinar, em 2002, não tinha a menor noção da diferença que isso faria em minha vida. A partir de então, tornei-me viciado em fazer esses desafios. Em 2007 ocorreu uma das mais importantes e também a mais longa (986 km) no Caminho de Santiago de Compostela, mas pela Via de La Plata, que inicia em Sevilha (Espanha). Já completei o Caminho da Fé no Brasil, que é uma rota sinalizada por setas amarelas e composta por trechos de estradas de terra, asfalto, trilhas dentro de fazendas e trilhos de trem, compondo um percurso de cerca de 400 km, incluindo municípios do estado de São Paulo (onde termina na cidade Aparecida, na Basílica local, que constitui o templo de maior visitação pelos católicos brasileiros); e certamente o farei mais 14 algumas vezes. A minha empolgação é tanta, que já contaminei alguns colegas. O Chico em 2009 e 2010, Andrey e Elizandro em 2011. Quando voltam, com os pés cheios de bolhas, falam “nunca mais”, mas, alguns meses depois, já estão perguntando quando será a próxima. Para 2012, já temos alguns novos: Vagner, Juliano e Alessandra. Neste livro, estou relatando as etapas do caminho de Santiago de Compostela pela Via de La Plata, que é um caminho

inter-regional que liga o Golfo de Cádiz com a costa Cantábrica, Angelo Stirma unindo as comunidades de Andaluzia, Extremadura, Castilla e León, e Asturias em 2007, citando as alegrias, tristezas, dificuldades e algumas experiências que poderão contribuir para que as pessoas que desejarem tornarem-se peregrinos possam usufruir. Finalmente, ser peregrino é um estilo de vida. Longe de querer mudar o hábito das pessoas, após a primeira caminhada, nossos hábitos com a alimentação, exercício físico e saúde nunca mais serão os mesmos. Espero que sirva para que as pessoas motivem-se a tornarem-se peregrinos no sentido amplo, mas, principalmente, na fé, esperança e busca de dias melhores, adotando o hábito da caminhada e da reflexão, com reflexos intensos e importantes na saúde e longevidade. 15



O que leva uma pessoa a peregrinar? – Fé? – Determinação? – Loucura? Tentarei desenvolver esses tópicos, demonstrando minha percepção, como peregrino de mais de quatro mil quilômetros, a pé, com minha mochila nas costas, duas vezes nos caminhos de Santiago de Compostela (2002 e 2007) e cinco vezes no Caminho da Fé: em 2006, em 2008, 2009, 2010 e 2011.

Motivos para peregrinar “Nesta longa estrada da vida, vou caminhando e não posso parar, na esperança de ser campeão, e no objetivo chegar” […] de Milionário e José Rico. Esta música, adaptada, é meu lema de vida, que me acompanha desde a infância, e tem sido minha grande mestra, nas horas de dificuldades e nas horas alegres. Muitos me perguntam, por que fazer essas loucuras, por que esse vício de peregrinar? A minha resposta é que só quem sente os efeitos positivos dessas caminhadas é que pode falar. A sensação é única, indescritível, tão boa e importante que acaba se tornando quase um vício, mas um vício bom, ótimo, que só traz resultados bons, positivos em vários aspectos, espirituais, físicos, sociais e Loucuras de um peregrino culturais. Mais adiante, iremos desenvolver melhor os tópicos acima citados, e os efeitos da transformação, quase que total, e outros, ainda, como o aspecto profissional, a convivência, o conhecimento, etc. Mas, voltando à questão do “por que peregrinar”, podemos afirmar que o peregrino se distingue por mais alguns diferenciais que o fazem ir em frente, no dia a dia desses desafios, baseados 18 na fé, determinação, persistência e em um pouco de loucura. Sim, loucura, porque, pelas adversidades encontradas, muitas vezes, somos vistos como loucos, pois as pessoas que nunca realizaram esse tipo de caminhada, realmente nos veem assim, e com razão, somos doidos, porque caminhar, quinhentos, oitocentos, mil quilômetros com mochila nas costas, enfrentando chuva, sol, subidas, descidas, montanhas, cachorros, dormindo em qualquer lugar, afastados do conforto do lar, não é para qualquer ser normal.

Para entendermos melhor, vamos ver uma definição exata Angelo Stirma do que é peregrinação e como surgiu, extraída da Wikipédia: 19 Uma peregrinação (do latim per agros, isto é, pelos campos) é uma jornada realizada por um devoto de uma dada religião a um lugar considerado sagrado por essa mesma religião. O termo “peregrino” aparece em nossa língua na primeira metade do século XIII, para denominar os cristãos que viajavam a Roma ou à Terra Santa (onde atualmente se encontra o Estado de Israel e os territórios palestinos) para visitar os lugares sagrados, às vezes como castigo autoimposto com o objetivo de pagar determinados pecados e outras vezes para cumprir penas canônicas. Desses peregrinos surgiria mais tarde a ideia das Cruzadas, enviadas para “reconquistar” os lugares que os cristãos consideravam sagrados e que estavam em poder de povos de outras religiões.O ato de peregrinar e as peregrinações ocorrem desde os tempos mais remotos, mesmo nos chamados tempos primitivos em que predominavam os costumes ou ritos pagãos. Existem escritos de locais de peregrinação muitas vezes ofuscados pela própria religião cristã, como o caso da Catedral de Santiago de Compostela, que pode ter sido construída onde passaria antes uma outra rota mais antiga, a peregrinação à Finisterra (fim-da-terra), à costa Ocidental para ver o deus Sol a “morrer” no mar e que no dia seguinte ressuscitava no Oriente. As primeiras peregrinações do Cristianismo datam do início do século IV (quando o Cristianismo foi tornado religio licita), e tinham por destino a Terra Santa (a mais conhecida e a primeira a deixar um relato da peregrinação é a histânica Erétria, muito provavelmente familiar de Teodósio I, imperador romano). Mais tarde, tiveram grande surto devido à pregação de São Jerônimo. Para peregrinar, há que ter em conta que não se trata apenas do ato de caminhar (no caso da peregrinação a pé), ou executar um trajeto com um determinado número de quilômetros; é reconhecido que peregrinar carece caminhar-se motivado “por” ou “para algo”. A peregrinação tem, assim, um sentido e um valor acrescentado que é necessário descobrir a cada pessoa que a executa. <wikpedia>

Loucuras de um peregrino Como vimos no último parágrafo, cada peregrino tem seu “valor adicionado” em suas peregrinações, ou seja, os efeitos, objetivos, sensações, são às vezes parecidos, mas nunca iguais a cada peregrinação que fazemos, e essa valoração se processa de forma individual. Os resultados variam de pessoa a pessoa. Para uma conclusão mais clara sobre os efeitos e resultados de uma peregrinação, na forma de caminhadas, temos que primeiramente entender que os peregrinos, de um modo geral, aplicam no seu dia a dia das caminhadas, as seguintes qualidades: – Fé – Determinação – Persistência – Satisfação pelo objetivo alcançado. Fé A força mais potente do universo? A fé. Madre Teresa de Calcutá Nunca perca a fé na humanidade, pois ela é como um oceano. Só porque existem algumas gotas de água suja nele, não quer dizer que ele esteja sujo por completo. Mahatma Gandhi 20 Fé (do Latim fides, fidelidade, e do Grego pistia) é a firme opinião de que algo é verdade, sem qualquer tipo de prova ou critério objetivo de verificação, pela absoluta confiança que depositamos nessa ideia ou fonte de transmissão (Wikipédia, acesso em janeiro de 2012). A fé acompanha absoluta abstinência à dúvida pelo antagonismo inerente à natureza desses fenômenos psicológicos e lógica conceitual. Ou seja, é impossível duvidar e ter fé ao mesmo tempo. A expressão se relaciona semanticamente com os verbos crer, acreditar, confiar e apostar, embora estes três últimos não

necessariamente exprimam o sentimento de fé, posto que podem Angelo Stirma embutir dúvida parcial como reconhecimento de um possível engano. A relação da fé com os outros verbos consiste em nutrir 21 um sentimento de afeição, ou até mesmo amor, por uma hipótese na qual se acredita, ou confia, ou aposta ser verdade. Portanto, se uma pessoa acredita, confia, ou aposta em algo, isso não significa necessariamente que ela tenha fé. É possível nutrir um sentimento de fé em relação a uma pessoa, a um objeto inanimado, uma ideologia, um pensamento filosófico, um sistema qualquer, um conjunto de regras, um paradigma popular social e historicamente instituído, uma base de propostas ou dogmas de uma determinada religião. Tal sentimento não se sustenta em evidências, provas ou entendimento racional (ainda que este último critério seja amplamente discutido dentro da epistemologia e possa se refletir em sofismos ou falácias que o justifiquem de modo ilusório) e, portanto, alegações baseadas em fé não são reconhecidas pela comunidade científica como parâmetro legítimo de reconhecimento ou avaliação da verdade de um postulado. É geralmente associada a experiências pessoais e herança cultural, podendo ser compartilhada com outros através de relatos, principalmente – mas não exclusivamente – no contexto religioso, e usada frequentemente como justificativa para a própria crença em que se tem fé, o que caracteriza raciocínio circular. A fé se manifesta de várias maneiras e pode estar vinculada a questões emocionais, tais como reconforto em momentos de aflição desprovidos de sinais de futura melhora, relacionando-se com esperança e a motivos considerados moralmente nobres ou estritamente pessoais e egoístas. Pode estar direcionada a alguma razão específica (que a justifique) ou mesmo existir sem razão definida. E, como

Loucuras de um peregrino mencionado anteriormente, também não carece absolutamente de qualquer tipo de argumento racional. Determinação “Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida – ninguém exceto tu, só tu”. Nietzsche Determinação, coragem e autoconfiança são fatores decisivos para o sucesso. Se estivermos possuídos por uma inabalável determinação, conseguiremos superá-los. Independentemente das circunstâncias, devemos ser sempre humildes, recatados e despidos de orgulho. Dalai Lama A melhor explicação que encontrei sobre determinação, foi a do escritor Daniel C. Luz, autor dos livros Insight I e Insight II, da DVS Editora. A diferença entre as pessoas comuns e as bem-sucedidas é que as pessoas que têm sucesso não ficam perdendo tempo, discutindo suas limitações. Elas as transcendem. Recebem sua cota justa de obstáculos e continuam em frente apesar disso. Às vezes, ficam machucadas e até feridas emocionalmente, mas 22 levantam-se e recomeçam. Determinação é o poder de realizar os próprios sonhos, a força de tornar real o objetivo. Algumas pessoas parecem ser predestinadas a marcar sua passagem por este planeta. Não pense que elas são beneficiadas pelo destino, ou escolhidas por uma “conspiração astral”. Elas apenas ousam realizar. Você também pode ser assim. Quantos sonhos você deixou de realizar por não se sentir capaz? Como pode saber se você é ou não capaz, se não tentar?

Gente bem-sucedida não nasceu predestinada. Apenas Angelo Stirma ousou lutar por seus ideais. O caminho de quem tem sucesso não é ou não foi fácil. Por vezes, os obstáculos foram tantos, 23 que a vontade de desistir foi maior, vencendo a muitos que almejavam destaque. Mas, para muitos, a realização foi plena e eles marcaram sua existência. Quando você achar que é difícil prosseguir, deve lembrar- se desta história: Numa noite de outubro de 1968, um grupo de obstinados torcedores permaneceu no estádio Olímpico da Cidade do México para ver os últimos colocados da Maratona. Mais de uma hora antes, Mamo Wolde, da Etiópia, havia cruzado a linha de chegada debaixo de saudações exuberantes de todos os presentes. Mas, enquanto a multidão esperava pelos demais colocados, anoitecia e começava a esfriar. Parecia que os últimos corredores já haviam chegado ao estádio. Assim, os espectadores começaram a ir embora. Foi exatamente nesse momento que todos começaram a ouvir as sirenes dos carros que acompanhavam a prova e que chegavam aos portões do estádio naquele instante. Todos pararam para observar e viram o último corredor entrar no estádio e fazer a volta final, completando os mais de quarenta quilômetros da prova. O corredor era John Stephen Akhwari, da Tanzânia. Quando ele estava passando pela pista de atletismo, os espectadores puderam ver que sua perna estava enfaixada e sangrando. Ele havia caído e se machucado durante a prova, mas isso não o impediu de continuar. As pessoas no estádio se levantaram e o aplaudiram até ele cruzar a linha de chegada. O respeitado produtor de documentários, Bud Greenspan, observava a distância. Depois, intrigado, Bud chegou-se a Akhwari e perguntou por que ele tinha feito tamanho esforço para chegar ao final da corrida. O jovem da Tanzânia respondeu

Loucuras de um peregrino em voz baixa: “meu país não me enviou a noventa mil milhas de distância para começar a corrida. Eles me enviaram para terminá-la”. Não se abata com as dificuldades ou com o agouro de quem o desanima. Não escute aqueles que martelam ao seu ouvido que você não é capaz. Lute por seus sonhos determinadamente. Determinação foi o que John F. Kennedy personificou em 1961 quando disse que poria um homem na Lua antes do final daquela década. Determinação foi a força que levou Walt Disney a perseverar em construir seu sonho, apesar de ter que declarar falência cinco vezes. É de exemplos como esses que você pode tirar inspiração nos momentos em que acha que está prestes a desistir, abater-se ou abandonar seu sonho. Eu sei que preciso usar a determinação dos outros como inspiração quando sinto que o vértice da gravidade me puxa para baixo e as coisas parecem difíceis demais. Lembro-me de que outras pessoas já fizeram isso e eu também posso fazer. Só preciso de determinação para continuar em frente. Persistência Transportai um punhado de terra todos os dias e fareis uma 24 montanha. Confúcio O homem não teria alcançado o possível se, repetidas vezes, não tivesse tentado o impossível. Max Weber A Persistência é o melhor caminho para o êxito. Charles Chaplin Significado da palavra Persistência: Ato de persistir; constância; perseverança. Qualidade do que dura.

Em nossos projetos, sempre nos deparamos com obstáculos Angelo Stirma que poderão fazer com que busquemos força para superá-los, ou então desistimos. 25 A persistência nada mais é do que a qualidade que as pessoas têm de, mesmo com obstáculos e dificuldades, não desistirem de seus sonhos. O texto a seguir, de autoria desconhecida, esclarece de forma muito clara o tema: “A persistência é uma ideia firme e constante de algo que se pretende fazer, mesmo na presença de incômodos ou dificuldades. A persistência é uma virtude fundamental para o sucesso, pois fortalece a vontade e a atitude das pessoas. Ser persistente não é uma tarefa fácil – é normal encontrar obstáculos e querer desistir. A rotina, o desânimo e o medo das mudanças contribuem para agravar as dificuldades. A persistência é a qualidade que separa os profissionais ou estudantes de sucesso dos demais. Em tempos difíceis como o que hoje vivemos, você deve ser persistente, sempre se dedicando para fazer o máximo possível, porque o retorno será muito compensador. Mesmo que um indivíduo seja considerado comum ou sem nenhum mérito aparente, se ele for uma pessoa persistente ele terá uma excepcional vantagem sobre os outros. A persistência é uma qualidade que não chama a atenção, mas que, a longo prazo, é o diferencial dos vitoriosos”. Resultado/objetivo “Um grande sonho sem ação, não passa de ilusão.” Autor desconhecido

“O sonho representa a realização de um desejo.” Sigmund Freud “Um sonho sonhado sozinho é um sonho. Um sonho sonhado junto é realidade.” Raul Seixas “O Mundo está nas mãos daqueles que têm coragem de sonhar e correr o risco de Viver seus SONHOS.” Paulo Coelho Se tivermos um sonho e não o transformarmos em metas, e depois em realidade, nunca conseguiremos atingir os resultados. Sempre fazemos muitas promessas de mudanças, principalmente na virada de cada ano. O problema é que os dias vão passando, e não raramente, esquecemos desses sonhos, vamos deixando para depois, até que, finalmente os esquecemos. O tempo vai passando, e os objetivos vão sendo empurrados, ano após ano, com a barriga, Loucuras de um peregrino e não realizamos nada daquilo a que nos propusemos. Pense em alguém que não tenha nenhum objetivo, propósito, projeto, desejo, sonho... nada. O que essa pessoa fará? Ela nada fará, ou assistirá televisão. Se nós possuímos objetivos, então agiremos para alcançá-los, não ficando parados esperando o passar dos dias. Os sonhos devem ter os seguintes estágios, tais como uma atividade empresarial: 26 – Planejamento – Execução – Controle – Resultado. Com relação a nossa primeira peregrinação, em 2002, no caminho de Santiago de Compostela, o sonho iniciou cinco anos antes, mas fixamos a meta, o ano e o mês em que iríamos realizá- lo. Iniciamos a preparação, mas nunca, e de forma nenhuma, pensamos em desistir ou postergar. Muitos colegas que haviam

se comprometido a fazê-lo conosco foram desistindo, mas nós Angelo Stirma ficamos firmes em nosso objetivo. 27 O planejamento, em uma caminhada, já começa quando pensamos em fazer o caminho, estabelecendo o mês e o ano. Depois com a preparação, pois não adianta querer fazer uma jornada dessas se não houver preparo físico para isso. No dia a dia da caminhada, também temos que planejar aonde queremos chegar, até que local iremos, quantas horas vamos demorar, se temos condições para isso, suprimentos, etc. Também de nada adianta planejar, se não executarmos o que planejamos. Todos os dias temos que levantar cedo e executar (caminhar) o trajeto estipulado, até a próxima parada. Às vezes, a execução pode ser mais difícil, acontecem imprevistos, mas aí entram a determinação e a persistência, fazendo com que as dificuldades sejam superadas, sempre com o foco no objetivo, tanto diário quanto final. Outro aspecto importante é termos o controle da situação, conferindo se estamos indo no rumo certo, se estamos andando de acordo com o previsto, se estamos dentro do prazo planejado, se os recursos são suficientes, se as condições físicas estão satisfatórias, etc. Finalmente, o resultado, a satisfação de ter conseguido atingir a meta, de ter chegado ao objetivo é indescritível, pois, como citado anteriormente, no caso das caminhadas, só quem as realiza é que sabe o prazer da conquista, a satisfação, a paz de espírito, e o quanto isso será importante para o peregrino, tanto no aspecto espiritual, quanto no aspecto psicológico. Saber que podemos e que só depende de nós querermos alcançar nossos objetivos, isso é muito bom. Em que isso nos ajuda no aspecto profissional? Na verdade, trata-se de uma aplicação diária do aprendizado quanto às efetivas etapas de desempenho das empresas, aplicadas à

Loucuras de um peregrino administração. Na faculdade, aprendemos a teoria, mas a aplicação efetiva dar-se-á na vivência diária. Nas caminhadas, aplicamos, na prática, diariamente, parte da teoria aprendida em administração: planejamento, execução, controle, resultado. Todos os dias, temos que planejar o dia seguinte, executar o planejamento do dia anterior, manter controle sobre os recursos disponíveis, e avaliar os resultados. Podemos afirmar que depois da primeira caminhada, de oitocentos quilômetros, no caminho de Santiago de Compostela, os resultados alcançados por nossas empresas foram outros, bem melhores do que os alcançados até então. Conheço muita gente que fala sobre planos para o futuro, que tem ideias inovadoras, que tem sempre vontade de fazer tudo, mas, na prática, nada acontece. Por quê? Falham em alguma etapa dos pilares acima citados, ou no planejamento, ou na execução, ou na determinação e persistência. Quando contamos de nossas aventuras, muitas pessoas falam que têm vontade de também fazer essas peregrinações; no entanto, ficam só na vontade. O grande segredo do sucesso é passar dessa etapa, é fazer acontecer, ter atitude, buscar a realização de seus sonhos. Loucura 28 “As maiores loucuras são as mais sensatas alegrias, pois tudo o que fizermos hoje ficará na memória daqueles que um dia sonharão em ser como nós: Loucos, porém, felizes.” Kurt Cobain “Nunca existiu uma grande inteligência sem uma veia de loucura.” Aristóteles …Pois o que é loucura de Deus é mais sábio do que os homens... 1 Coríntios 1: 25

Um dos significados de loucura é: Ato de extravagância, de Angelo Stirma imprudência: fazer uma loucura, atitude que se afasta do bom senso. 29 Pensar que alguém se afaste de sua família, de sua casa, de seu trabalho, coloque uma mochila nas costas, e vá caminhar oitocentos mil quilômetros, levantando-se todos os dias com um único objetivo, o de chegar à próxima etapa, e em tantos dias chegar ao objetivo final, realmente pode conduzir a que se duvide da sanidade mental dessa pessoa. Essa é a visão de quem está de fora, não podemos censurá- la, pois somente quem é peregrino e realiza alguma “loucura” assim, sabe entender, que temos que ser realmente um pouco excêntricos para fazer isso. Todos nós, peregrinos, sabemos o quanto isso é importante para nossas vidas, o que proporcionou e ainda vai proporcionar, de mudanças positivas em muitos aspectos de nossa existência. É por isso que sempre falamos que quem faz a primeira caminhada, provavelmente fará outras. Mas, afinal de contas, o que é tão maravilhoso na peregrinação/caminhada? Com certeza, não são as bolhas nos pés, as dores intensas e quase permanentes nas pernas, os perigos dos ataques dos cães, as camas duras das pousadas, o sol e a chuva que nos massacram, os trajetos de asfalto onde, além do perigo dos carros, temos a poluição do ar, e o cansaço provocado pelo estresse do perigo de ser atropelado. O maravilhoso ocorre dentro do seu íntimo, os momentos de contemplação da natureza, das imagens maravilhosas que nunca sairão de sua cabeça, a meditação diária, as lembranças do seu passado, o projeto do seu futuro, a melhora da autoconfiança, a alteração de seus hábitos de alimentação e de exercícios físicos, e, principalmente, o fato de você saber que quando você quer você consegue. Já vi peregrinos quase se arrastando pelo caminho, mas sem desistir, e todos eles chegaram ao objetivo final. Relato

Loucuras de um peregrino o caso específico do Sr. Joaquim, um senhor de 67 anos, em que no primeiro dia, a sola dos pés era pura bolha, poderíamos apostar que não conseguiria chegar; porém, todo dia lá estava ele, chegando aos albergues, cansado, dolorido, mas feliz pela conquista. Também o caso do Chico (Francisco Bogoni), meu amigo e parente, que, na sua primeira caminhada no Caminho da Fé, nos primeiros dias teve todas as unhas do pé inflamadas, as pernas incharam, muitas bolhas; mas, como o Espanhol Joaquim, também todos os dias chegava, e, ainda, pelo caminho ia contando histórias, cantando, chegando até a fazer “um show”, na Praça de Tocos do Mogi – MG, onde ficou conhecido como parente do cantor gaúcho Teixeirinha. Em 2002, quando machuquei o joelho no primeiro dia, e pensando que, com mais trinta dias pela frente seria de desanimar e desistir, o que sempre dizia a mim mesmo era que chegaria, nem que fosse andando de quatro, chegaria. Em 2007, quando o Celso, no segundo dia, teve sérios problemas, até com algum risco mais severo, e eu, em Banhos de Montemayor, fui atacado por um cão, não nos deixamos abalar e chegamos ao objetivo final. Por isso é que podemos dizer que realmente o peregrino traz uma “loucura” dentro de si que faz com que tire forças inexplicáveis. Essa força só tem uma explicação: é Deus, atuando, mostrando que devemos procurá-lo dentro de nós mesmos, 30 que devemos confiar em nossa capacidade de superação, que devemos sempre buscar nossas próprias motivações, não ficar esperando que ele atue por nós, ou alguém iluminado venha fazer por nós aquilo que nós mesmos devemos fazer, pois nós somos donos do nosso destino, se quisermos algo, devemos ir atrás, buscar, lutar, persistir, até conseguir. O grande segredo é termos uma meta, que, embora audaciosa, seja possível. Por exemplo, numa caminhada de mil quilômetros, nos primeiros dias, se pensarmos o quanto ainda

falta, o próprio cérebro pode nos boicotar, ou seja, dizendo-nos Angelo Stirma que, se foi difícil caminhar trinta, imagina quão mais difícil será fazer mais 970. Devemos sempre pensar no quanto já fizemos. 31 “Oba, já fizemos 30!” “Já fizemos 100”, e depois da metade do caminho já podemos começar a falar “só faltam 400”. Depois de fazermos a metade, para o restante, o apóstolo Tiago (em Santiago de Compostela) e N. Sra. Aparecida (no Caminho da Fé), nos levam no colo. Isso me leva a relembrar alguns fatos de minha infância, em que minha querida mãezinha sempre me apoiava, dizendo “confia que DEUS VAI TE AJUDAR”. Quando fui estudar fora de casa, ainda com 10 anos de idade, saído do interior, muito matuto e imaturo, passei por muitos constrangimentos na escola, na cidade de Videira, mas quando estava desanimado, voltava para casa, a pé (18 km), e falava para minha mãe que não queria mais voltar. Nessa hora, entrava a psicologia que mamãe usava. Ela dizia: Meu filho, veja esses morros, cheios de pedras, como você acha que vai ter um futuro aqui? Veja seus irmãos, o quanto sofrem e não saem do lugar. Você é inteligente, tem facilidade para estudar, com certeza você terá um futuro melhor, porque eu rezo todos os dias para DEUS TE AJUDAR e te iluminar”. Eu, reanimado por mamãe, voltava na segunda de madrugada, para não perder a aula que começava às oito, saía de casa às três horas da manhã, louco de medo, porque naquele tempo se falava em assombração, em almas penadas, etc., para a minha idade o medo era grande. Onde tinha algum capão de mato eu passava correndo. Chegava a Videira e ainda dava tempo para ir à aula. Graças a Deus, realmente eu tinha muita facilidade, sempre tirava notas boas, e, na minha vida de estudante, tanto do ensino básico, médio, e depois, em duas faculdades e duas pós-graduações, não sei o que é exame, segunda época, ou coisa que o valha.

Loucuras de um peregrino Não vou entrar em detalhes sobre de onde saiu essa garra, essa força de vontade de vencer, mas, em grande parte, foi dessa época, em que nem sequer as pessoas que tinham melhores posses retribuíam ou pagavam nosso trabalho, quase escravo. Muitas vezes, passavam por mim, pessoas conhecidas de minha família, de carro, e não davam carona, aí no meu inconsciente ouvia minha mãe, dizendo que Deus ia me ajudar e eu ia vencer. Mas essa é outra história, que será oportunamente contada. Acredito que o gosto por caminhar, pela peregrinação, tenha origem nessa época, que, por pura necessidade, eu tinha que caminhar 18 km para ir visitar minha mãe, e novamente refazer os 18 km para voltar para a escola. Hoje, além de ser um Peregrino da Fé convicto, a cada ano, procuro fazer uma peregrinação, estou incentivando alguns colegas a também experimentarem essa maravilhosa sensação. Alguns, quando termina a primeira caminhada, falam “nunca mais”, mas no ano seguinte já estão perguntando quando será a próxima. Depois de um tempo, desaparecem as lembranças das dores, dos momentos ruins e ficam somente os bons, os resultados, físicos e espirituais. Relato a seguir, o diário do Caminho de Compostela, via de La Plata, saindo de Sevilha até Santiago de Compostela, onde se pode realmente constatar essa nossa loucura de que falei. 32

33 Angelo Stirma

Etapas DATA DE PARA Km 1 17.05.2007 SEVILLA GUILLENA 22,6 2 18.05.2007 GUILLENA ALMADÉN DE LA PLATA 47,2 3 19.05.2007 ALMADÉN DE LA PLATA EL REAL DE LA JARA 16,0 4 20.05.2007 EL REAL DE LA JARA FUENTE DE CANTOS 41,0 5 21.05.2007 FUENTE DE CANTOS ZAFRA 24,6 6 22.05.2007 ZAFRA TORREMEJIA 16,9 7 23.05.2007 TORREMEJIA MÉRIDA 16,4 8 24.05.2007 MÉRIDA ALCUÉSCAR 37,5 9 25.05.2007 ALCUÉSCAR CÁCERES 39,8 10 26.05.2007 CÁCERES EMBALSE DE ALCÂNTARA 33,6 11 27.05.2007 EMBALSE DE ALCÂNTARA GALISTEO 39,9 12 28.05.2007 GALISTEO ALDEANUEVA DEL CAMINO 47,9 13 29.05.2007 ALDEANUEVA DEL CAMINO BANHOS DE MONTEMAYOR 09,8 14 30.05.2007 BANHOS DE MONTEMAYOR FUENTERROBLE DE SALVATIERRA 32,6 Loucuras de um peregrino 15 31.05.2007 FUENTERROBLE DE SALVATIERRA MORILLE 32,5 16 01.06.2007 MORILLE SALAMANCA 19,3 17 02.06.2007 SALAMANCA EL CUBO DEL VINO 35,5 18 03.06.2007 EL CUBO DEL VINO ROALES DEL PAN 38,4 19 04.06.2007 ROALES DEL PAN GRANJA DE MORERUELA 34,2 20 05.06.2007 GRANJA DE MORERUELA TÁBARA 25,5 21 06.06.2007 TÁBARA OLLEROS DE TERA 36,3 22 07.06.2007 OLLEROS DE TERA PUEBLA DE SANABRIA 56,2 23 08.06.2007 PUEBLA DE SANABRIA LUBIAN 29,4 LA GUDINHA 24,8 34 24 09.06.2007 LUBIAN 25 10.06.2007 LA GUDINHA LAZA 34,7 26 11.06.2007 LAZA XUNQUEIRA DE AMBIA 32,7 27 12.06.2007 XUNQUEIRA DE AMBIA ORENSE 22,3 28 13.06.2007 ORENSE CEA 22,3 29 14.06.2007 CEA A LAXE 37,3 30 15.06.2007 A LAXE OUTEIRO 33,0 31 16.06.2007 OUTEIRO SANTIAGO DE COMPOSTELA 16,0 Total 986,2

Sevilha 35 Angelo Stirma

Loucuras de um peregrino Sevilha 36

Angelo Stirma 37 Catedral de Sevilha

Saída de Sevilha – Dúvidas e muito ânimo Loucuras de um peregrino Diário 1 – dia 17/5/2007, de Sevilla para Guillena: 22,6 km Saímos de Sevilha, bem cedo, preocupados em razão da falta de sinalização, e demoramos um pouco para encontrar 38 os primeiros sinais do caminho. Sabíamos que tínhamos que passar por Camas, e fomos perguntando, até que, bem na saída de Sevilha, antes de atravessar a ponte, apareceu um sinal do caminho, o que nos tranquilizou um pouco. Passamos por Camas e Santiponce, chegando a Guillena às treze horas. Este pueblo não tem albergue, e tivemos que nos hospedar em hostal, aliás, tem um albergue que é muito ruim, nem sequer tem camas ou colchonetes para deitar. Santiponce é uma cidade interessante, bonita e organizada, Guillena também, embora pequena. Essa etapa não apresentou dificuldades, é

até um tanto enfadonha, pois não tem subidas nem descidas S não tem árvores e quase sempre se situa ao lado da carreteira (estrada asfaltada). Alguns lugares o caminho parece infinito Angelo Stirma Peregrino não pode desistir nunca! 39

2 – dia 18/5/2007 de Guillena para Almadén de La Plata: 47,2 = 69,8 km O caminho até Castiblanco de Los Arroyos foi tranquilo, e chegamos muito cedo, são somente 17,8 km. Houve o incidente com um peregrino espanhol, de nome Pablo. No dia anterior, quando chegamos a Guilhena, fomos no albergue municipal, que era um vestiário de escola, e vimos esse senhor lá. Quando questionamos se teria lugar para ficarmos, ele só resmungou e demonstrou má vontade. Procuramos um hostal (hotel pousada) para nos hospedar. À tarde, fomos numa padaria para comer alguma coisa, e lá se encontrava o Pablo. Veio puxar conversa conosco, querendo caminhar junto no dia seguinte, chegando até a fixar um horário para se encontrar conosco, mas nós não nos manifestamos. Quando estávamos caminhando, vimos que atrás vinha um peregrino, acelerando o passo, e numa subida nos alcançou. Era o Loucuras de um peregrino Pablo, que estava esbaforido, e logo começou a falar mal, dizendo que brasileiro não tem palavra, etc., quando o Celso se irritou e meio em portunhol mandou ele para aquele lugar, dizendo que nós não tínhamos obrigação de ficar esperando por ele. Deu para perceber que ele estava sozinho e queria, talvez por medo ou segurança, caminhar conosco. Porém serviu para darmos algumas risadas pelo ocorrido, pois o diálogo travado entre o Pablo e o Celso foi muito 40 engraçado. Seguimos o caminho e o Pablo foi ficando para trás, nunca mais o vimos. Como chegamos muito cedo em Castiblanco, decidimos andar mais, aproximadamente trinta quilômetros até Almadén. Este foi o grande erro de planejamento, não nos orientamos direito e não vimos os recursos que tínhamos (comida e água), nem analisamos o trajeto, que não tem nada de recursos, como água, comida.

O calor estava intenso, em grande parte pela carreteira, o que Angelo Stirma aumenta mais ainda a dificuldade e o calor. Foi talvez a pior etapa do caminho que enfrentamos. Quando havíamos andado uns 12 41 ou 15 km, já começamos a sentir dificuldades, mas não havia o que fazer a não ser seguir em frente. O Celso começava a demonstrar um cansaço acima do normal. Quando faltavam cinco quilômetros, foi terrível, pois não tínhamos mais água nem comida e já estávamos muito debilitados, o Celso começava a preocupar, pois estava branco e suava muito, e a cada pouco, parava e deitava. Comecei a me preocupar e a pensar no que fazer, pois não havia nada ao redor. Não restava alternativa a não ser andar aos poucos, e quando, a uns três quilômetros de Almaden, diante de uma subida íngreme, a situação ficou feia. Eu não sabia o que fazer, pois deixá-lo para buscar recursos, como água, comida e socorro, não dava. Por outro lado, ficar ali e pernoitar, debilitados, sem água e comida também seria temerário. Os sintomas eram de hipoglicemia e de desidratação. Comecei a pensar no que fazer se ele desmaiasse e a alternativa que ficou mais clara foi esvaziar as mochilas, amarrar em dois paus e fazer uma maca para arrastar. Na subida, o Celso andava uns cinquenta metros e deitava, mas aos poucos fomos indo, e eu o incentivava, dizendo “vamos lá que falta pouco”. Quando chegamos, ao topo, avistamos Almadén, lá embaixo, e foi um alívio. Mesmo assim, foi difícil chegar. Quando chegamos, procuramos logo um bar para tomar alguma coisa e comer. O Celso estava com uma aparência muito debilitada, tomamos Coca-Cola e comemos um bocadilho de jamón, (sanduíche) mas não descia. Fomos ao Albergue e depois do banho voltou a preocupação, pois começou a dar câimbras nas pernas e nas mãos do Celso. Tomou Torsilax (medicamento relaxante muscular) e queria

Loucuras de um peregrino dormir, insisti para que fôssemos comer algo, aí concordou, porém não comeu quase nada, somente umas colheradas de sopa, o que, acredito, tenha ajudado, pois melhorou um pouco, daí fomos ao albergue dormir. Acordamos no dia seguinte mais dispostos e melhor. O albergue é muito bom. Celso com muitas dificuldades 42 Almaden de La Plata

3 – dia 19/5/2007 de Almadén de La Plata para El Real de La Jara: Angelo Stirma 16,0 = 85,8 Km Nesse dia, a meta é percorrermos o caminho de 16 km até Real de La Jara, visando a nos recuperar do dia anterior. Andamos devagar, e nessa parte do caminho encontramos o Pepe e o Jaime, com os quais fizemos uma janta no albergue. Nós não tínhamos canivete (não é permitido levar no avião objetos pontiagudos), e o Pepe, gentilmente nos presenteou com um. Os amigos espanhóis foram muito gentis e pudemos aprender um pouco sobre a história da Espanha. Na cidade, sábado, estava acontecendo o que eles chamam de Romeria, em que se arrumam com trajes típicos, em carros, carroças, cavalos e rumam para um local onde acampam e passam a noite e o dia em festa. É mais ou menos um grande piquenique, só que eles levam uma imagem de santo junto, por isso se chama romaria. Essa festa é tradicional naqueles pequenos lugares ao sul da Espanha. O albergue municipal é bom. 43 Carros típicos para a romaria

Loucuras de um peregrino El Real de La Jara 44 Jantar no albergue

Apoios para manter a forma 4 – dia 20/5/2007 de El Real de La Jara para Fuente de Cantos: 41,0 = Angelo Stirma 126,8 km 45 Nosso destino inicial é Monastério, a 19,6 km, e dependendo das forças e disposição, até Fuente de Cantos, a 41 km. O caminho até Monastério é normal, com pequena subida no final; chegamos muito cedo e decidimos enfrentar o trecho até Fuente de Cantos. De Monastério até Fuente, há grandes retas, com muita plantação de vinhas (parreiras), chegando a ser exaustivo e monótono. Mas a qualidade e a quantidade das plantações de vinhas impressionam, nunca tínhamos visto áreas tão grandes com essa plantação, elas se parecem às grandes lavouras de soja no Mato Grosso. O Albergue de Fuente é um antigo convento Franciscano. Na janta (cena), conhecemos uns espanhóis de Barcelona que estavam de bicicleta e alguns italianos. Jantamos muito bem, e depois o hospitaleiro fez questão de mostrar o museu, que conta

a história da região e de um pintor famoso, com uma música de fundo daquelas meio misteriosas. O fato interessante ocorreu à noite. No nosso aposento, tinha dois beliches, e como chegamos antes, o Celso e eu pegamos as camas da parte de baixo dos beliches. Os espanhóis de Barcelona, pai e filho, ficaram na parte de cima. Na janta, como de costume dos peregrinos, tomamos um bom vinho; depois da janta, o mais velho me pagou mais uma taça de vinho, enquanto conversávamos, e ele tomava café com aniz (uma bebida tipo graspa, muito popular na região). Tomou uma série, acho que uns cinco copos. De madrugada, acordei com um alvoroço, os dois espanhóis corriam pelo quarto, mexiam nas mochilas, tipo procurando alguma coisa, o pai caminhava numa perna só, tipo saci, o filho olhava pela fresta da fechadura para fora, achei que estava acontecendo algum assalto. Até que o filho passou uma lanterna Loucuras de um peregrino ao pai e ele abriu a porta e saiu correndo. Depois, o Celso me contou que de madrugada viu um vulto cair ao lado da cama dele e depois pular numa perna só. Ficou muito assustado, porque o lugar já parecia assombrado, com aquela música ao fundo, tipo de construção, convento, etc. Depois percebeu que era o espanhol que fora levantar e não lembrara que estava na parte de cima do beliche e então caiu; e deve ter se machucado, por isso estava pulando, de dor. O fato 46 contado depois é muito engraçado, pois alguma hora depois se repetiu, quando o espanhol – pai, estava apertado para ir ao banheiro. Acordamos tarde, às oito horas, e os espanhóis também. Fomos lavar o rosto e nos preparar para andar. Nessa hora, também aconteceu um fato hilário. O espanhol – pai foi ao banheiro fazer as necessidades, e os albergues em sua maioria não têm papel higiênico, o peregrino tem que levar. Quando o Celso foi escovar os dentes, o espanhol achou que era o filho,

e chamava “Luizzz, Luizzz”, achando que era o filho dele. O Celso não respondeu, daí a pouco o espanhol saiu do banheiro e foi direto para o chuveiro. Como não tinha papel higiênico, teve que tomar um banho para se lavar. Esses fatos serviram para darmos umas boas risadas durante os próximos dias. Chegando a Fuente de Cantos Angelo Stirma 47

Loucuras de um peregrino 5 – 21/5/2007 de Fuente de Cantos para Zafra: 24,6 = 151,4 km Como não havia sinalização na pequena cidade, na saída havia um funcionário do ajuntamento, recolhendo lixo, e perguntamos sobre o caminho, e ele informou o rumo errado. Caminhamos aproximadamente uma hora e estranhamos que não aparecia seta alguma, até que encontramos um carro, pedimos para parar e perguntamos sobre o caminho. Informou- nos que o caminho era totalmente o contrário do rumo que estávamos seguindo. Tivemos que voltar ao pueblo e pegar o rumo certo; ficamos p. da vida com o informante. Chegamos a Zafra às 16 horas. A cidade de Zafra é organizada e bonita. Tentamos achar um albergue, e até o encontramos, mas estava fechado e não conseguimos descobrir onde poderíamos encontrar as chaves. Depois de muito procurar, e de muito estresse, decidimos achar um hostal e nos hospedar. Fomos a um bar tentar incluir as fotos no site, mas estava infestado de fumaça de cigarro. Na Espanha, país de Primeiro Mundo, não dá para entender a falta de consciência quanto aos malefícios do fumo. A maioria fuma, e principalmente os jovens, que são muito poucos nos pueblos e cidades pequenas. 48

Bela cidade de Zafra Angelo Stirma 49 Peregrino caminha mesmo com chuva, e água não pode faltar!

Loucuras de um peregrino 6 – 22/5/2007 de Zafra para Torremejia: 36,9 = 198,3 km Saímos muito cedo, chegamos a Villafranca de Barros, e resolvemos andar até Torremejia, para, no dia seguinte, chegar mais cedo à Mérida, pois é uma das cidades mais interessantes do caminho. O caminho é bastante cansativo e monótono, com imensas retas e imensas plantações de vinhas e oliveiras. A qualidade das lavouras é espetacular, de alta tecnologia. Chegamos às 17 horas, muito cansados, ficamos no hostal, depois fomos conhecer o pueblo, que é muito pequeno. Nesse dia, tomamos o melhor vinho de todo o caminho, vinho comum, de jarra, mas de excelente qualidade, ultrapassando em sabor os vinhos caros que tomamos no Brasil. 50 Plantação de videiras. Torremejia


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