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eurobike_magazine#21

Published by eduardo, 2020-12-31 19:55:50

Description: eurobike_magazine#21

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No alto, à esquerda: Miguel, Lia Mara e Franciely De Antoni; à direita: Cristina Puccinelli Zugno e Lucas Scapin. 51 | Eurobike magazine No centro, à direita: Carlos Quadros, Cristina Rocha, Juraci Dagostini, Adão Bellagamba Neto, José Alfredo Duartes e Everton De Boni Santos

EMOÇÃO SMacaaonpdtioinqeduioreairnaa Por Eduardo Rocha | Fotos André Hawle 52 | Eurobike magazine

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EMOÇÃO 54 | Eurobike magazine Ansiedade de criança não é fácil de administrar. Passamos a semana inteira ouvindo o João perguntar a que horas sairíamos para Monte Verde. Finalmente chegou a hora. Após organizar tudo e todos no Defender, pegamos a estrada. Duas horas e inúmeras curvas depois, chegamos à simpática Monte Verde. Fomos direto ao Hotel Saint Michel, onde fomos recebidos pela Renata Calil, responsável pela organização. Deixamos a bagagem e fomos à cidade tomar um chocolate quente com as crianças e esticar as pernas. Encontramos Ale- xandre, Adriana, Alexia e Enzo, que acabavam de chegar. Voltamos ao hotel e logo encontramos Moré e Cátia, e fomos todos prosear no salão de jogos enquanto aguardávamos os outros participantes e a equipe Eurobike. Nem percebemos o tempo passar e já estavam todos lá, se re- encontrando, esperando o jantar e uma boa noite de sono para deixar todos “tinindo” para o passeio do dia seguinte. Foi muito bom ver que o Adventure Trip está encorpando. Além dos muitos assíduos, vários rostos novos se juntaram a nós para passear, conhecer novas paisagens e, sobretudo, curtir seus Land Rover.

Manhã cedo, friozinho gostoso, mas com sol de rachar mamona. 55 | Eurobike magazine Tomamos um farto café da manhã e nos dirigimos ao briefing com a Renata, que nos apresentou os guias locais e falou sobre o roteiro do dia. Acertamos a frequência dos rádios e assumimos nossas posições. Fiquei na metade exata do comboio para fazer a “pon- te” entre o carro que puxa o comboio e o último, o “limpa-trilha”. Num comboio de mais de 24 Land Rover e com estradas que serpenteiam as montanhas, não é raro as extremidades ficarem sem comunicação em alguns momentos. Passei o rádio para a Patricia fazer as vezes de repetidora. Repetidora mesmo, pois todos os alertas passados pelo carro da frente eram sistemati- camente repetidos para que o carro limpa-trilha soubesse o que

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EMOÇÃO 58 | Eurobike magazine vinha pela frente. Assim, o grupo se mantém organizado e com distância segura entre cada um. Vamos embora. Tem muita es- trada e café com broa na primeira parada. A mãe das araucárias da região Pegamos uma estradinha sinuosa, ainda próximo à cidade, e adentramos a mata para conhecer uma enorme araucária de trinta metros de altura e cerca de quatrocentos anos, que parece um gigante, com sua copa acima de todas as outras árvores. Seu tronco é tão grosso e rugoso que permitia às crianças subir com alguma facilidade. A estradinha vai ficando cada vez mais bucólica e, não fosse pela presença constante das araucárias, poderíamos imaginar estar em algum lugar na Europa. Chegamos então à simpática São Mateus para esticar as per- nas e comer a famosa broa de fubá assada na folha de bana- neira, da Padaria Santos, acompanhada de um cafezinho de coador de pano ou uma Turbaína. Isso mesmo, Turbaína, fabri- cada desde os anos 1930 em Jundiaí. São as delícias do interior do Brasil, que vão ficando difíceis de se encontrar nos grandes centros. À primeira vista, a broa parece algo muito rústico, e é. Mas de con- sistência e sabor inigualáveis. Acho que é a melhor que já comi.

Bem, temos estradas a percorrer. Subimos nos Lands e Ranges acomodou bem toda a “frota”. Cheiro de fogão a lenha no ar. e partimos para mais um trecho. Sinal de almoço pronto. O Jalapão não é aqui, mas quase Depois de um legítimo almoço “da roça”, com direito a torresmo Voltamos à terra, e ao pó. e suco de banana com limão (surpreendente), fomos passear à beira do rio e ver as árvores cobertas de barba-de-bode. A A longa estiagem, em boa parte do Brasil, secou a terra, trans- fazenda secular é um cartão-postal. Muito bonita mesmo. formando esse final de inverno no mais poeirento da história, acredito eu. A tarde começa a cair. É hora de retornar ao hotel para a nossa happy hour. A fina poeira levantada por cada carro formava uma “parede” que prejudicava muito a visibilidade de um carro ao outro. To- Aproveitamos bem esse momento de confraternização para fa- dos dirigindo com muito cuidado e concentração, mantendo dis- lar sobre viagens e Land Rover, especular sobre as novidades tâncias seguras. O rádio em silêncio. De repente, um ruído de que estão por vir, falar sobre modelos do passado, recomendar estática do radio e surge uma voz: “isso aqui está parecendo o destinos, combinar passeios, contar “causos”, enfim, conversar Jalapão”. sobre o que gostamos. E parecia mesmo. Isso deu uma dose a mais de emoção e ser- Logo, Juliana e Renata anunciam os sorteios. Todos aguardan- 59 | Eurobike magazine viu para todos exercitarem a paciência, já que pressa não com- do ansiosos a surpresa do dia. A Aurora Eco, em parceria com a bina com este tipo de estrada. Renata Calil Eventos e Viagens, sorteou entre os presentes uma viagem para a Patagônia. Quem ganhou foi a sortuda Sandra Paramos em Gonçalves, para reunir o comboio e apreciar a vista Albano de Oliveira. Foi anunciado também o Adventure Trip Pa- das montanhas, do alto da cidade, e partimos rumo à Fazenda tagônia, evento extra que acontece em 2013, o primeiro fora do Esperança para almoçar, descansar e andar um pouco à pé. Brasil. Uma viagem de sonho: paisagens de tirar o fôlego, descida de rio em botes de rafting, almoço no campo e muito off road com Mais um pouco de estrada e chegamos. O imenso gramado Land Rover.

EMOÇÃO É bom levar muitos cartões de memoria para a câmera fotográ- No alto, à direita: a animada happy hour promovida pela Eurobike fica… Acima, à esquerda: Tatiana Biasetton e Juliana Ribeiro sorteiam os brindes da Por volta das 9h da noite fomos todos jantar no Fritz, uma cer- Eurobike. À direita: Renata Calil, Sandra Albano de Oliveira e Patrick Mohr-Bell vejaria artesanal da cidade. Lotamos a varanda, aconchegante da Aurora Eco graças aos aquecedores, pois o friozinho deu as caras à noite. Aproveitamos para visitar a produção de cerveja. Jantar, boa conversa e cerveja deliciosa, mas é hora de dormir. As crianças já estão pedindo uma cama quentinha. 60 | Eurobike magazine No dia seguinte, após o café, cada um para um lado. Uns foram à Casa dos beija-flores e esquilos, um santuário de aves e ani- mais, e em seguida ao Chapéu do bispo, um morro de onde se aprecia a vista. Outros preferiram fazer passeios de quadriciclo e descer as enormes tirolesas.

Após uma manhã cheia de diversão, voltamos ao hotel para os 61 | Eurobike magazine test drives e almoço, que encerrou esta sexta edição do Euro- bike Adventure Trip. Aproveitei para conversar um pouco com Guilherme Passa- lacqua e Alexandre Gaeta, da Eurobike. Segundo Guilherme, o evento superou as expectativas e chegou à sua maturidade: “A união de clientes aficionados pela marca Land Rover, num evento de lazer onde eles podem explorar melhor seus veículos e trocar experiências com outros clientes e com nossos profis- sionais, é fundamental para que possamos conhecê-los melhor, entender seus anseios e, portanto, atendê-los melhor”. “Estabe- lecer um relacionamento de amizade com nossos clientes e seus familiares é muito importante. Neste mercado premium, te- mos que tratar cada cliente de forma diferenciada, mais próxima. Não há mais espaço para tratamentos frívolos ou impessoais”, emenda Gaeta.

EMOÇÃO 62 | Eurobike magazine Este acabou, mas já, já teremos outro Adventure Trip para reen- contrar os companheiros em mais uma viagem de aventura. Só resta saber qual será nosso destino. Até lá. O Eurobike Adventure Trip é uma realização da Eurobike Land Rover, com apoio de AD Seguros, Alfa Financeira e Aurora Eco.

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Descobrir um novo saborPRAZER 65 | Eurobike magazine

PRAZER UTAH 66 | Eurobike magazine Os brasileiros invadiram os Estados Unidos e estão por todos os lugares. Todos? Bem, quase. Há lugares onde é raro cruzar com brasileiros e onde se vê relativamente pouca gente nos meses de inverno no hemisfério norte. O sul do estado de Utah, com seus diversos parques nacionais, é um desses lugares Por Marcelo Lima de Freitas

O esqui é um esporte muito apreciado em países que nevam, Foi o que fizemos, minha família e uma família amiga. Depois de 67 | Eurobike magazine e para quem mora em terras tropicais, o encanto e a beleza esquiarmos por cinco dias em Beaver Creek, no estado do Colo- proporcionados pela neve tornam a atividade ainda mais inte- rado, saímos em dois carros na direção oposta a que a maioria ressante. Para quem quer variar, é possível complementar uma das pessoas toma para retornar das estações de esqui. Pega- viagem de esqui com outro tipo de programa, bastante diferente mos a I-70 no sentido oeste, a caminho de Utah, para visitar e, para muitos, ainda mais bonito que o espetáculo criado pela seus parques nacionais. neve nas montanhas.

PRAZER O começo da viagem já é de uma beleza enorme. O trecho entre Beaver Creek (ou Vail) e Gleenwood Springs (87 quilômetros, aproximadamente uma hora de viagem), que fica no entronca- mento com a CO-82, fazendo a ligação com Snowmass e As- pen, corre ao longo do rio Colorado em um vale cercado por enormes paredes de pedra. Essa descrição fica mais evidente e interessante no Glenwood Canyon, pois o espaço entre as pare- des de pedra fica tão estreito que a estrada, com duas pistas em cada sentido, foi construída com uma pista sobre a outra em alguns trechos. O restante do cânion é tomado pelo próprio rio e por uma estrada de ferro que corre no exíguo espaço entre o rio e o paredão. Glenwood Springs conta com uma estrutura de comércio bas- tante razoável, sendo seu maior atrativo o conjunto de piscinas alimentadas por uma fonte termal. A neve fica de fora e dentro da piscina a água é bem quente. Vale incluir no programa um mergulho. 68 | Eurobike magazine O trecho seguinte apresenta tráfego mais leve e segue até As duas famílias (família Sortino à esquerda e família Freitas à direita), Grand Junction, localizada a 140 quilômetros (uma hora e meia) numa parada próxima à divisa entre os estados do Colorado e Utah de Glenwood Springs e já próximo da divisa com o estado de Utah. Como já se foram duas horas e meia de viagem, e como o restante da estrada é bastante deserta, essa é uma boa cidade para uma parada e almoço. Daí em diante tivemos mais um percurso de 340 quilômetros (três horas e quarenta minutos) até Teasdale, no estado de Utah,

onde passamos a noite. Para se chegar a Teasdale é necessário tante bonita na chegada, mas pouco pudemos ver, pelo tardar 69 | Eurobike magazine seguir pela I-70 até a UT-24, que é uma estrada vicinal e pouco da hora. Uma sugestão é começar a viagem cedo e não perder movimentada, onde nos surpreendemos com um rebanho de muito tempo no caminho. No nosso caso, meia hora a menos cervos que pastavam ao lado da estrada. teria feito enorme diferença. Como o percurso total do dia foi de quase seiscentos quilôme- Aqui a viagem começa a ficar ainda mais interessante. De tros e mais de seis horas (incluindo o almoço), chegamos a acordo com o censo de 2010, a população de Teasdale é de Teasdale ao anoitecer, o que foi uma pena. A estrada é bas- 191 habitantes. Não é mais que uma rua curta, com poucas ca-

PRAZER Os pais de Charlene também passaram algumas horas conos- co. O pai, cirurgião plástico de San Diego, visitou a região no passado e acabou adquirindo terras. Para poder visitar o lugar com facilidade, tirou brevê e comprou um pequeno avião, que passou a usar em suas viagens. No dia seguinte, saímos para ver os bisões que são criados na fazenda onde está instalado o hotel. São animais grandes e fortes, além de imprevisíveis. Fomos rapidamente alertados para não fazermos movimentos bruscos e não nos aproximar- mos muito dos animais. 70 | Eurobike magazine sas, e mesmo assim não encontrávamos o hotel. O GPS não Fomos em direção ao primeiro dos dois parques nacionais que ajudou muito, pois não mostrava detalhes da região. Paramos visitaríamos: Bryce Canyon. A estrada que tomamos, UT-12, é ao lado de uma casa e nossos “meninos” (homens de mais de conhecida como Scenic Byway 12. São 188 quilômetros de lin- 18 anos) bateram na porta para pedir informação. O dono da das e variadas paisagens, que percorremos sem muita pressa casa apareceu, inicialmente com ar de suspeita, e acabou nos gastando aproximadamente três horas e meia, incluindo uma informando que o hotel The Lodge at Red River Ranch não fi- rápida parada na cidade de Escalante, onde almoçamos. Es- cava muito distante, porém fora da cidade. Encontramos uma calante também é pequena, sem grandes opções. Almoçamos “log cabin” (típica casa americana feita de toras de árvores) de num Subway de posto de gasolina. três andares e tipicamente decorada com motivos “western”. Como estávamos na baixa estação, não havia ninguém hospe- Nos instalamos no hotel Best Western em Bryce Canyon (não dado nos quinze quartos disponíveis. No hotel havia uma fun- há muita alternativa) e fomos visitar o parque, onde passamos cionária solitária, imersa em silêncio numa construção relativa- a tarde. O parque tem 145 km2 e a estrada acompanha a borda mente grande e isolada, que quase morreu de susto quando do cânion. Um bom passeio que dura por volta de quatro horas, entramos. Ocupamos quatro quartos, jantamos e passamos com paradas, é ir até o Rainbow Point (29 quilômetros) e voltar algum tempo conversando com a gerente e filha do dono do parando nos pontos de observação. Várias descrições são pos- hotel, Charlene. síveis, mas nenhuma será totalmente adequada. Floresta de pedras ou caverna sem teto? Nem categorizar como cânion é muito correto, apesar do nome. O ideal é olhar as imagens e ter uma ideia do que é, pois nem as imagens conseguem des- crever exatamente o que só se pode perceber estando lá, em sua borda e olhando para a paisagem abaixo ou, melhor ainda, numa das trilhas entre as rochas.

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PRAZER 72 | Eurobike magazine No dia seguinte prosseguimos na UT-12 em direção a Zion. Havíamos percorrido poucos quilômetros e encontramos um tú- nel escavado na pedra, fazendo com a estrada uma paisagem única. Em seguida, percebemos nitidamente uma mudança na coloração da paisagem, como se alguém tivesse traçado uma linha divisória, deixando as pedras vermelhas para trás. Da UT- -12 passamos para a US-89 e depois UT-9, chegando ao parque após 185 quilômetros percorridos, em três horas.

Na entrada de Zion a estrada passa de preta a vermelha, combi- 73 | Eurobike magazine nando com o resto da paisagem, que já voltara a ter essa colora- ção. Essa estrada corta o parque e faz um ziguezague descen- dente proporcionando vistas maravilhosas. Se já tínhamos visto paredes de pedras enormes, agora são maiores ainda. No per- curso há outro túnel totalmente escavado na rocha, construído em 1930, com 1760 metros de comprimento. Logo após cruzar o parque chegamos ao hotel Desert Pearl, muito aconchegante,

PRAZER no estilo norte-americano de motel. Nos fundos de nosso quarto Informações: havia um gramado e um riacho, com vista para uma montanha enorme. Bryce Canyon: Área: 145km2 Inicialmente pretendíamos passar duas noites em Zion, mas http://www.nps.gov/brca como a previsão do tempo para o segundo dia era de chuva, ficamos apenas uma noite. Assim, sobrara apenas uma tarde na Zion: cidade. Entramos no parque novamente e seguimos com o carro Área: 602km2 até o final da Zion Park Boulevard, uma variante da estrada pela Mais de 190 quilômetros de trilhas para caminhadas qual chegamos. Novamente vimos cervos e perus selvagens. www.nps.gov/zion Fizemos uma caminhada não muito longa até as Emerald Pools. 74 | Eurobike magazine Diferentemente de Bryce Canyon, Zion proporciona maior vari- edade de paisagens e caminhadas. O parque conta com trilhas bem curtas e relativamente fáceis, como a que fizemos, mas há algumas de mais de 22 quilômetros e que requerem um bom preparo físico. Como gostamos muito e vimos pouco do parque, deixamos uma nova visita a Zion agendada para o futuro, com mais tempo disponível e preparados para andar muito. No dia seguinte, de manhã, saímos em direção a Las Vegas com seus cassinos e hotéis enormes, cheios de gente. O contraste nos fez pensar onde é que está a civilização.

PORSCHE DESIGN TOWER Sunny Isles, Flórida. Um dos lançamentos mais comentados e esperados da Flórida está esperando por você. Imagine estacionar seu carro dentro de um luxuoso apartamento com piscina privativa, através de um elevador state-of-the-art em um edifício de conceito inédito no mundo. E tudo isso à beira do mar em Sunny Isles na Flórida, em um empreendimento com colaboração entre o desenvolvedor alemão Porsche Design Group e o incorporador Gil Dezer, um dos ícones do mercado imobiliário norte-americano. Parceria Mais informações:75 | Eurobike magazine Consultoria para investimentos em imóveis nos Estados Unidos 11 3045 9846 Vendas diretas com o incorporador. 10 anos de experiência em vendas de imóveis nos Estados Unidos. www.lellomiami.com.br

PRAZER SAPPORI DI MONTAGNA Viagem gastronômica cheia de surpresas entre Garibaldi e Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha Por Ana Augusta Rocha | Fotos Marcelo Curia 76 | Eurobike magazine

Na hora de nascer aquele menino deu trabalho. Era um bebê 77 | Eurobike magazine grande e veio ao mundo invertido, mostrando primeiramente os pés. Diante disso o pai não teve dúvidas: “Vai se chamar Al- temir e vai jogar futebol”. Altemir era um zagueiro famoso nos anos 1960 e que vestia a camisa do Grêmio. O piá (é assim que chamam menino novo na região Sul) estava nascendo na região rural de Bento Gonçalves, em plena Serra Gaúcha, onde o campo afetivo naturalmente se divide — ou é Grêmio, ou é Internacional. Apaixonados por futebol são todos. Pois então... O pai, vendo aqueles pezinhos com pressa, não teve como não se lembrar de futebol e com palavras seguras determinar o rumo da história: a partir dali o menino só pensaria em futebol mesmo. E acabou por seguir carreira de jogador, pri- meiro nos times da região, depois no Fluminense do Rio e, por fim, até em um time no Japão. Mas eis que — jogada do destino — o rapaz solitário e em ci- dades estranhas se pôs a cozinhar para lembrar os sabores de casa. Foi por obra e arte desse passatempo que Altemir pendu- rou as chuteiras e tornou-se o Pessali, como é conhecido hoje: dono de dois restaurantes, autor de uma culinária que interpreta as origens italianas, que pulsam muito forte por ali, e único chef brasileiro (que temos notícia) a servir o funghi porcini fresco e colhido por ele nas serras. Sim, agora chegamos ao ponto! Esta é uma matéria sobre gastronomia! Regada a belas paisagens, magníficos vinhos, origem italiana declarada e simpatia desla- vada. Exatamente como o chef Pessali. Dica para nossos leitores: saindo de Porto Alegre, de carro, em direção à serra, primeiro tome cuidado, dezenas de “pardais” pelo caminho (assim são chamados os sensores de velocidade na região) tentarão refrear seu entusiasmo. Tudo bem! Vale a pena reduzir a velocidade e olhar a paisagem. No início a estra- da mostrará uma ocupação típica alemã (os primeiros cinquenta quilômetros), para logo em seguida ganhar altitude e dar lugar a incríveis escarpas de onde se atiram cachoeiras e se penduram araucárias. Nas alturas: este é o início dos domínios da Itália brasileira. Dizem as lendas sobre a imigração no Sul do Brasil que os alemães que chegaram primeiro procuraram as terras baixas e próximas aos rios, e para os italianos que vieram posterior- mente ofereceram as montanhas íngremese escarpadas. Por isso, note bem: assim que começar a subida os sobrenomes germânicos darão lugar aos italianíssimos e a melodia das pala- vras mudará radicalmente. Benvenuti! E por incrível que pareça até hoje (quase 150 anos se passaram desde o início da imi- gração) você poderá gastar seu repertório de italiano com muita gente pelas ruas nessa melódica experiência que envolverá o parlare, o sappore, e o innamorare. Quanto mais você conhecer a região, maior será o efeito.

PRAZER 78 | Eurobike magazine Mas voltemos ao nosso chef (esta é uma matéria sobre gastro- mo, a união das famílias e a mesa sempre farta no Brasil. Uma nomia, porca miséria!), que estava esperando por nós à porta grande recompensa para quem deixara para trás um país onde de uma incrível casa centenária, de arquitetura típica italiana, grassava a falta de recursos e de comida. “Por isso eu acho com um sorriso no alto de seus 1,90m. (Zagueiro? Devia ter sido importante, vital mesmo, celebrar o Brasil e praticar uma cozi- goleiro, penso baixinho.) A casa fica em Garibaldi e é o endereço nha de raiz onde não se busca propriamente a sofisticação (que de seu primeiro restaurante, que traz o nome do avô, Primo Ca- pode cair no superficialismo), mas sim privilegiar a riqueza de sa- millo. “Desde guri cozinhava para tentar conquistar as amigas bores. Pratos aromáticos, de identidade italiana, que eu chamo, da minha irmã mais velha”, ele brinca. Conquistou a bela Clege sem medo de errar, de uma culinária sincera. Não há confusão quando estava com uns 25 anos, e seguem juntos até hoje, os de sabores, não há sobreposição de atenções, mas sim o prazer dois à frente dos restaurantes onde, invariavelmente, se é rece- dos melhores ingredientes, assim como se preconiza na Itália e bido com calor humano e sabor italiano. foi seguido pelos meus antepassados nas terras do Brasil. Pois imagine: nas agruras do desbravamento, a força para continuar “Qui (ele mostra a paisagem da estrada), era una regionevuota/ il lavoro/o trabalho, vinha da esperança da família, da reza forte Aqui era uma região vazia. Non ceranientequi/não tinha nada. e do alimento buon. A comida sustentou o desbravamento das Solo legni e sassi/somente pedras e árvores.” Ele conta sobre terras selvagens que seriam chamadas posteriormente de colô- os primeiros tempos da imigração, a partir de 1875 e mais forte- nias”, explica. “Quando eu era pequeno, com uns 5, 6 anos, le- mente depois de 1890, quando a regra era o trabalho duríssi- vava para meu pai ao meio dia, dentro da portula (a cesta feita

de palha de milho, trançada pelas mulheres e crianças) o que quilômetros de distância uma da outra) o cogumelo chamado de 79 | Eurobike magazine chamávamos de lacolazzione, que era a refeição para quem lactaris delicious, um funghi grande e suculento que começou a não parava de trabalhar, enrolada num guardanapo xadrez onde render bons pratos no Primo Camillo. “Até uns dois anos atrás havia uma porção generosa de polenta, pedaços de queijo e tínhamos somente ele no cardápio. O funghi porcini era tam- salame. E il pane e il vino fatto in casa”, complementa. “Esse bém utilizado nas receitas mas vinha desidratado e importado orgulho pelas origens, a certeza do sabor especial naquilo que da Itália”, conta. “Mas um dia eu estava andando em uma mata produzimos, me faz praticar essa culinária de raiz.” de pinheiros, um ambiente onde não procurava normalmente, quando vi, resplandecentes, um grupo de cogumelos rosados e O interesse pelos cogumelos, hoje tão presentes em suas recei- grandes que nunca havia reparado antes. Levei para uma espe- tas, se deu quando Pessali encontrou nos campos ao redor de cialista em Garibaldi que disse espantada: mas são porcini!!! Mal Garibaldi e de Bento Gonçalves (as cidades estão a apenas dez pude acreditar”, conta ele.

PRAZER Hoje em dia, depois das chuvas que fazem nascer os cogume- los, podemos encontrar pelos pinheirais o chef Pessali de olhos atentos. Se a coleta for farta de dia, a noite o restaurante terá os troféus, expostos em bandejas logo na entrada: incríveis e perfumados porcini frescos que poderão enriquecer as pastas, risotos ou polentas, conforme a vontade do cliente. A beleza dos porcini e seu aroma desafia como iguaria até mesmo os tartuffos que se colhem em outubro na Europa — uma das sofisticações máximas da culinária italiana. 80 | Eurobike magazine No Primo Camillo, em Garibaldi, durante o almoço e o jantar, e “Esse orgulho pelas origens, a certeza do sabor es- no Mamma Gemma, no Vale dos Vinhedos de Bento Gonçalves pecial naquilo que produzimos, me faz praticar essa (a segunda casa de Pessali), você poderá experimentar essa culinária de raiz.” receita encantadoramente farta e saborosa, que de tão antiga é contemporânea: il piacere da mangiare. Comida deliciosa as- sinada por Pessali, que hoje joga um bolão... com as caçarolas. Capisce?

Para acompanhar, vinhos com alma: ALMAÚNICA 81 | Eurobike magazine Márcio Brandeli, amigo de Pessalli, também se lembra do guar- danapo xadrez envolvendo a polenta e il fromaggio. E se lembra do cheiro da colazzione, aroma também da sua infância. O de- talhe a mais, que seguia nas cestas de sua casa para o almoço no campo, acabou ganhando fama na forma do vinho da família, o Don Laurindo, premiado e apreciado. “Meu pai criou a marca Don Laurindo, ganhou reconhecimento, mas eu queria ir além, num voo próprio. Por isso, depois dos estudos de enologia percorri as melhores vinícolas do mundo e as pesquisei a fundo — arte e processos — para chegar a um jeito próprio de fazer meus tintos e espumantes.” O conceito, se- gundo Márcio, que é sócio de sua irmã gêmea Magda Brandeli e trabalha com pouquíssimas pessoas produzindo somente 40 mil garrafas por ano, é o apuro e o rigor dos métodos tradicionais. “O conceito Almaúnica é o dos vinhos feitos com alma, onde cada garrafa traz um prazer único. Investimos pesado em tecno- logia, trabalhando com a melhor infraestrutura que uma vinícola pode ter. Mas ao mesmo tempo soubemos trazer para nosso dia a dia a sofisticação e o apuro dos métodos tradicionais. O vinho é como uma criança, não se pode deixar passar nenhum de seus momentos. E quanto mais atentos aos detalhes, ao ti- ming correto de cada etapa, mais belamente ele irá responder. O deus do vinho mora nos detalhes”, completa. “O maior custo em uma vinícola são os barris de carvalho, es- senciais para a maturação dos tintos. Hoje em dia a maioria das

PRAZER 82 | Eurobike magazine casas produtoras trabalha seus vinhos em barris de inox, onde Dica da jornalista colocam pedaços de carvalho. Quando o vinho é muito madei- A região entre Bento Gonçalves e Garibaldi é sempre linda de rizado, é porque essa foi a técnica assumida. Quando o vinho é se visitar com suas montanhas, casas de pedra e jeito italiano. muito frutificado, é por que não conviveu com madeira nenhu- De dezembro a fevereiro tudo fica verde e é incrível ver a colhei- ma.” Os vinhos da Almaúnica passam exclusivamente por barri- ta da uva e até mesmo participar dela! Já por volta dos meses cas de carvalho, que não apenas aportam suas notas amadeira- frios, os parreirais estarão secos e acinzentados, mas o frio trará das, mas também estabilizam a cor e o aroma com sofisticação. ares de Europa e convidará à degustação dos vinhos. Somar turismo e negócios pode ser um convite irresistível: anualmente Os vinhos Almaúnica são jovens pois a vinícola tem apenas acontecem feiras internacionais do ramo moveleiro em Bento quatro anos, mas começam a disparar nos testes feitos às ce- Gonçalves, vale a pena pesquisar as datas pois são eventos gas, como os que deram 93 pontos em 100 para seu syrah em grandiosos. Anote os nomes: Casa Brasil e Movelsul. 2010 e 2011 no principal evento de avaliação da qualidade dos vinhos nacionais. “O syrah Almaúnica, assim como o cabernet Trattoria Primo Camilo sauvignon, o merlot e o malbec são surpreendentes por sua Av. Rio Branco, 1080 qualidade, eu garanto”, desafia. Garibaldi, RS Tel.: (54) 3462-3333 A Almaúnica é a única do Vale do Vinhedos a plantar a uva shi- De segunda a sábado à noite; domingo apenas almoço. raz, a mesma que na região do Rhône, na França, produz os [email protected] famosos Châteauneuf-du-Pape. “Consegui as mudas de origem francesa e plantei 6300 delas em apenas 1,5 hectares. Nosso Vinícola Almaúnica syrah é precioso”, avisa. RS 444 km 17,35 Vale dos Vinhedos, Bento Gonçalves, RS Segundo Márcio, o vinho é fruto do especialista e suas decisões Tel.: (54) 3459-1384 com relação ao plantio e ao processo de vinificação. E, é claro, Horário de atendimento: de segunda a sexta-feira, visitas e traz o sabor da paixão com que é feito. “Sem paixão não há degustação das 8 às 12h e das 13h30 às 17h30. um bom vinho”, completa. Para que quem o beba possa se en- Sábados, domingos e feriados das 10 às 12h e das 13h30 tregar ao momento. Paixão e entrega: a garantia de momentos às 17h30. inesquecíveis.

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Desmanchar-se na paisagemDEVANEIO 87 | Eurobike magazine

DEVANEIO 88 | Eurobike magazine Camas de areia Lagoa das Gaivotas: Santo Amaro do Maranhão, lar das dunas solitárias, cenário do filme Casa de Areia

Dunas de até 40 metros de altura a praias selvagens para os amantes da bailar entre coloridas lagoas de água vela; camarões, caranguejos, moque- quente; o maior delta das Américas, cas e arroz de cuxá; tiquira e guaraná com suas revoadas de guarás acima Jesus. Sob a regência do sol e dos dos manguezais; os tambores, o boi ventos, com vocês, um roteiro pelo e o azulejo do centro histórico de São que há de melhor (e pior) nas areias Luís e Alcântara; vilarejos perdidos escaldantes do desértico litoral norte no tempo dos Lençóis Maranhenses; brasileiro Por Eduardo Petta | Fotos Carol da Riva 89 | Eurobike magazine

DEVANEIO 90 | Eurobike magazine Areia nas retinas De outubro a abril só há praticamente areia nas morrarias. E vento. A levar, de grão em grão, uma duna pra cá, outra pra lá, esculpindo desenhos, cavando, enterrando qualquer coisa que fique no caminho: ossadas de jegue, de bode, de boi. Seres que ousam andar pelo deserto — e que não é gente. A gente anda também. Sob o sol escaldante vai ao mar buscar peixe, camarão e depois volta pros vilarejos onde as lagoas perenes garantem a água boa de beber, de banhar, onde cresce um caju, uma manga, um coqueiro, uma sombra pro povo montar casa, roça, acender fogão a lenha, criar as crianças que correm sem fron- teira nem porteira — porque nessa terra de areia não há muito o que possuir. Tudo é transitório. Como as lagoas que começam a se encher de água quentinha e cristalina, de cores maravilho- sas: azul-turquesa, verde-esmeralda. Muita dessas lagoas tem nome: Azul, Bonita. E são protegidas pelo Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. Lençóis?! Foi o que enxergaram os téc- nicos da Petrobrás na década de 1970, quando ficavam voando de avião, a procurar petróleo. As máquinas deles já foram en- golidas pela areia há tempos. Nesse trecho do Maranhão é as- sim: o mar lá longe no vai e volta das enormes marés e as areias tomando conta da costa, da gente, dos poros. Mas tudo começa em São Luís, onde ainda não é sertão. Tudo começa em São Luís Antes de partir para as areias dos Lençóis, São Luís. Hospe- dado numa pousadinha do centro da cidade fundada pelos fran- ceses em 1615 e logo tomada pelos portugueses em 1618, finco pé na história. Subir, descer ladeira, correr o mercado da Praia Grande, tomar tiquira, guaraná Jesus, sentir o cheiro da terra. Quanto azulejo no casario tombado pela UNESCO em 1997! Subir, descer, entrar: ruas, vielas, becos, fontes, sobrados. Presente ou passado? Pausa. Sol, calor, praia de São Marcos. Fome: caranguejada à vinagrete na Base da Lenoca olhando o mar? Ou o Maracangalha e seus pastéis com geleia de pimenta quente? Pôr-do-sol, hotel, banho, rua. Trilogia de museus. A Casa do Maranhão e tudo sobre a festa do boi. Um dia passo junho inteiro aqui. A Casa da Festa do Divino. Prometo voltar em agosto. E Casa de Nhozinho, capítulos da labuta maranhenses: a pesca, a terra, a arte. E saio de lá com vontade de entrar nas “brincadeiras”, como aqui chamam as festas populares. A noite me acalma. Centro histórico, rua do Giz: mesinhas nas calça- das, som ao vivo. Casa das Tulhas: dança-se o tambor de mina, a umbigada, a saia rodada, agora o tambor de crioula muda o chamado dos atabaques — tudo na rua. E hoje é dia de festa,

Tiquira, azulejos, brincaderias, o reggae, casarões, barzinhos. boemia, rua Portugal, reggae, pra dançar agarradinho ao som A noite em São Luís é uma festa! das radiolas. “Se cobrir vira circo, se cercar vira hospício”, me diz Mahal, DJ da casa Roots. Ele solta a agulha e sussurra ao microfone, “DJ Mahal. É só pedrada”. “Pedra é música boa”, se- 91 | Eurobike magazine greda. Estou na Jamaica brasileira. “Quero vê tu rebolando, que- ro vê tu rebolar” — canta o filho da ilha, Zeca Baleiro. Para mim e para você ele diz. “São Luís é pedra. É pedra de responsa.” A viagem ainda nem começou.

DEVANEIO 92 | Eurobike magazine Alcântara, a Paraty que o tempo engoliu Rica no passado, esquecida por séculos, Alcântara é ovelha negra, filha incompreendida. “As pessoas de fora vêm pra cá tudo torto. Pegam a balsa em São Luís (na Praia Grande) e atravessam a baía de São Marcos na hora errada das marés (e que marés) com um sol de rachar. Ao desembarcarem, não aguentam subir nossas ladeiras, enjoam na volta e depois de- sancam a falar cobras e lagartos”, diz dona Izildinha, doceira da região. Alcântara é a Paraty não restaurada, Goa perdida no Atlântico, Alcântara é totalmente demais. Já fui errado. Hoje vou certo. Primeira balsa: sete da matina, mar lisinho, travessia feliz. Ao chegar, economizo as pernas, vou na mordomia da charrete até o topo, no centro velho. Agora sim, posso girar pelas igrejas, ver o pelourinho, ruínas e ir descendo — pra baixo todo santo ajuda. No caminho, pit stop na casa da Izildinha pra comer doce de espécie — doce a base de coco que os moradores prepara- vam para receber a ilustre visita de D. Pedro II. O rei não veio. Que importa: o docinho entrou para a história, que Alcântara, por sorte ou azar, conseguiu preservar. Finalmente os Lençóis: Santo Amaro do Maranhão e o se- gredo do Andrucha Vamos aos Lençóis. Duzentos quilômetros até Sangue (de carro ou ônibus). Agora uma Toyota de linha. Duas horas sacolejan- do. Certo! Certinho mesmo fez o Andrucha Waddington e sua gangue quando vieram pra cá. Curtiram dois meses de filma- gens entre banhos na idílica Lagoa das Gaivotas e nas Emen- dadas e depois, na montagem de Casa de areia, só colocaram

À esquerda: esquecida no tempo, Alcântara é um mergulho no passado colonial do Brasil. 93 | Eurobike magazine À direita: final do dia em meio às dunas das Américas, em Santo Amaro do Maranhão

DEVANEIO imagens de tempestades de vento na cara das Fernandas e do Seu Jorge. Mandou bem o Andrucha. “Colocou todo mundo pra correr”, ri o guia José, da Pousada Água Doce. O acesso não é moleza. Mesmo que você seja um mega jipeiro vai precisar de um guia para pilotar por duas horas os 36 quilômetros de lagoas, alagados e buracos até chegar ao vilarejo. O que vem depois é o segredo do Andrucha. Ruas de areias fofas ligam dunas enormes, rios transparentes e lagos de todas as cores e tamanhos. Barcos à vela navegam de um lado a outro e condu- zem o viajante a cenários onde dificilmente haverá outro turista para dividir o olhar. Quer mais selvagem? Peça ao José da Água Doce para guiá-lo a pé numa viagem de três dias acampando pelo caminho em oásis e cruzando todo o Parque Nacional até o seu outro extremo, a poética Atins — nossa próxima parada. 94 | Eurobike magazine Barreirinhas: palha de buriti, lagoa Bonita e lagoa Azul Rios, lagoas e o mar. A pesca e os pescadores. Vida farta de água no deserto Não fui com o José caminhando para Atins. Estou fora de forma. brasileiro dos Lençóis Maranhenses Penitência, via-sacra: jipe sacolejando, mordidas de pernilon- gos em Sangue, viação Cisne Branco, uma hora de busão e Barreirinhas, centro nevrálgico dos Lençóis. Conheci Barrei- rinhas na década de 1990. Fui pelos ares desde São Luís, inesquecíveis 45 minutos sobrevoando os Lençóis. Na época, o caminho por terra era uma torturante maratona de dez horas.

Veio o asfalto, o progresso, a cidade explodiu. Tantos carros. 95 | Eurobike magazine Mas vá lá, vamos adoçar esse olhar. Como ficou simpático esse píer de onde saem os barcos pelo rio Preguiças. Gostei muito dos peixes do Carlão, das redondas da Nômade, do forró. Que poético as crianças jogando bola e aquele pôr-do-sol nas du- nas. Ah, não posso me esquecer de recomendar a compra de artesanato de buriti. Nem dos passeios: lagoa Bonita e lagoa Azul. Tá bom que tem que esperar na fila pra cruzar a balsa do Preguiças. Mas fique olhando os meninos brincar na água que passa rápido. Em ambas só vá no passeio do pôr-do-sol, mais fresquinho e com luzes mais bonitas. Mas eu não passaria, e não passarei, mais que uma tarde em Barreirinhas de novo. Meu capitão, ali naquele barco ancorado no rio Preguiças, já está chamando. Até breve. Rio Preguiças, Mandacaru e Caburé Passeios por rios costumam ser monótonos. Não no Preguiças. Pelo menos não no trecho de quase quarenta quilômetros que separam Barreirinhas da foz, em Atins. As empresas vendem lanchas rápidas. Escolha as vagarosas e comande o tempo. O ecossistema muda sempre: depois dos buritis logo aparece um mangue com árvores enormes, depois, dunas, algumas delas com ranchos prontos para atender turistas com água.

DEVANEIO A maior parte dos passeios passa voando por tudo, despeja você na pacata Mandacaru por quinze minutos — quase não dá tempo de subir os 150 degraus do farol — e logo te levam à Caburé, no quiosque onde se paga pelo passeio. O piloteiro faz aquela cara de feliz e você desce em Caburé, grande muvuca de restaurantes e pousadas que só não são engolidos pelas areias porque são varridos diariamente. O lugar até é bonito: entre o mar bravio e o Preguiças. Mas o rio está cheio de óleo, barulho de geradores e mosquitos. A maior parte dos passeios volta da- qui. E se esquecem de Atins. Prosseguimos viagem. 96 | Eurobike magazine Atins: para repartir o peixe e o olhar Acima: crianças apostam corrida em Atins, na foz do majestoso rio Preguiças; e Atins, foz do Preguiças. Rio que encontra o mar não uma, mas o sorriso doce de Magnólia, a princesa do camarão. duas vezes. Vilarejo de areia com casinhas de pescadores. Crianças por todos os lados. Apostam corrida na praia, pulam, À direita: Um salto para as águas turquesas e mornas da lagoa Tropical em brincam. A pequena Romilda recolhe conchinhas da areia para Atins engrossar o caldo do jantar. Um barco pesqueiro encosta. Sal- ta uma canoa. Vendem-se os peixes, enchem-se os isopores de gelo. As crianças arrodeiam com baldes. Os pescadores os completam com peixes sem valor. Uma tradição local. “Quem tem menos, leva mais”, diz Chico Barbeiro, o primeiro pescador a receber forasteiros na casa de sua mulher, a tia Rita. “Aqui você fica em casa”, diz Chico Barbeiro. Mas ficamos a dez minu- tos do Chico, no Rancho dos Lençóis, a pousada do Buna, “para quem quer conforto e privacidade”, como ele diz. Em Atins, o passeio nas dunas pode ser a pé ou à cavalo e dura um dia inteiro. Leva-se quase uma hora andando até o camarão das cunhadas Magnólia e Luzia. Mas o Buna nos deixou lá rapidi- nho. Encomendamos o camarão e partimos. O menino Miro nos leva pelas areias. Em dez minutos, é como se estivéssemos no

Sahara. Mas o sobe e desce é logo recompensado. Ali está a nólia sorri. O molho que separou a amizade das duas cunhadas 97 | Eurobike magazine lagoa do Mário, de águas escuras; um pouco adiante, a Tropical, continua a fazer a alegria dos forasteiros. de águas turquesas. “Esse é o Poço do Riacho”, aponta Miro. Seguimos suas águas. De repente... Não pode ser, Miro. “É a Rio Novo, terra dos temperos e caprichos de Dona Mazé cachoeira do Bonzinho”, diz. Esfrego os olhos. Cachoeira? “De Rio Novo. A placa avisa. Uma ponte, outra placa: Paulino Neves. água quentinha? Espere aqui pelo camarão.” Miro sorri. “É o novo nome, mas ninguém gostou”, explica Cacá, o guia mais famoso dos Pequenos Lençóis Maranhenses, que contra- Canto do Atins: duelo de faroeste pelo melhor camarão do tamos para fazer a travessia desde Barreirinhas (pequena eco- mundo nomia de quatrocentos quilômetros, o que duraria a volta pelo Canto do Atins. Nos próximos cem quilômetros de costa na asfalto – que um 4×4 faz em 32 quilômetros pela inacabada MA- direção oeste do Brasil, não haverá mais onde comer. Acabo 402). O rio Novo é verde, estreito e transparente. de degustar o melhor camarão da minha vida. “Eu não posso contar o segredo. É receita de mamãe.” António, o marido, dis- Passeamos nele de lancha. Trinta quilômetros acima, sua foz: o farça; Magnólia, a esposa-cozinheira, sorri. Lá fora o vento so- mar e as areias comem o mangue todos os dias. Não há pegadas pra suave e os olhos não sabem para que lado olhar. “Deita na na praia. Rio abaixo, meia hora, a nascente: lagoa Encantada, rede pra descansar do almoço”, sugere Magnólia. “Aceita uma a receber riachos de todos os lados, ligar vilas e famílias pelos tiquira?” A rede de palha de buriti acolhe o meu corpo. A tiquira caminhos líquidos. Pouca gente dorme em Rio Novo. Aqui cru- sintoniza meu olhar na direção do mar. O mar alcança a areia zam de passagem rumo à Tutoia, ao delta, ou aos Lençóis. Mas e, ao girar do pescoço, a areia domina o lar e todo o avistar poucos perdem a chance de provar o tempero da dona Mazé, do mundo de Magnólia e António, o universo mágico de dunas a rainha da galinha a cabidela, do arroz de cuxá e do feijão de enormes entremeadas por lagoas coloridas. Lá fora, tudo é im- corda: “O meu cardápio é único. Eu escolho do que estiver mais permanência. Cá dentro, descansa em paz o “melhor camarão fresco. E quem não reservar, não almoça”, diz Mazé. Ela parece de minha vida”. “Ele é grelhadinho na brasa baixa, depois de fi- bravinha, mas dez minutos a prosear debaixo da mangueira e car marinando quinze minutos”, conta Magnólia. Eu sei que é ali dá pra ver a risada brotar, o cafezinho chegar, o céu de estrela no molho marinado que está o segredo da Magnólia. E também pintar e a vontade de nunca mais ir embora desse lugar. Mas o da Luzia, a pop star das reportagens de turismo. “O molho era amanhã tem o delta, o maior das Américas. de mamãe, então é nosso”, diz António, irmão da Luzia. Mag-

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Parnaíba, a rainha do delta e dos caranguejos Seis horas depois, primeira parada: ilha do Caju. O que é isso? 99 | Eurobike magazine Asfalto prontinho de Rio Novo até Tutoia. Meia horinha, rapidi- Uma ilha gigante para uma pequena pousada. Ecoturismo de nho. Tutoia, a última praia do Maranhão. E agora você quem ecossistemas: cavalgadas e caminhadas. Ninguém para con- sabe. Tomar a chalana Cidade Tutoia e cruzar até Parnaíba pe- versar. Só os pássaros guarás ou as sucuris. Segunda parada: los meandros do delta numa viagem antropológica de oito horas, ilha das Canárias? Olá senhor Jerry? “Estou tecendo rede para ou seguir viagem numa estrada “esburacada pouca é bobagem” pescar. Entra, quer um cafezinho?” Na vilinha da Canária moram por quase trezentos quilômetros até o mesmo destino. Infe- pouco mais de cem famílias que vivem do que o delta lhes dá. lizmente, vamos de rodas. Foi duro. Até que chegamos a Par- Tem gente, crianças e também revoada de pássaros guará. O naíba, segunda cidade do Piauí, 150 mil almas, importante nos pouso é simples, mas a hospitabilidade é farta. tempos das charqueadas no final do século 18. Sobrou pouca coisa pra ver dos áureos tempos. Mas dá uma foto bonita do Quanto menor, mais gostosinho fica. Piauí: o menor litoral alto da Ponte das Barcas. Engana bem. Ali embaixo, no casario, do Brasil estão as agências que vendem o passeio pelo delta. Partiremos Ainda não acabou. De Parnaíba vamos a Luis Correia. São só amanhã. Hoje ainda dá tempo de conhecer o artesanato de car- dezoito quilômetros. E aí estamos no conjunto de balneários que naúba na Ilha Grande de Santa Isabel e assistir o show de kite não citarei, com outras belas praias mais afastadas maravilho- surf ao despedir do sol na Pedra do Sal. Ao anoitecer, vamos sas, como Macapá e Coqueiros, terra da moqueca do Dedé, a aos caranguejos, direto do mangue do delta, mais fresco impos- melhor do Piauí, servida em panelas de ferro fumegantes. Final- sível. Martelinho nas mãos, uma grotesca festa de Babette tem mente, Cajueiro da Praia, o novo paraíso dos kitesurfistas, com início. Se lambuzar-se com caranguejo for pecado vou queimar seus ventos suaves e constantes. Ali estacionamos em Barra feliz no mármore do inferno. Grande, vilarejo calmo e perdido, com areias junto ao rio e barzi- nhos com petiscos e frutos do mar sob a sombra das carnaúbas, Navegando pelo maior delta das Américas coqueiros e um vistoso cajual. Praia que marca o fim do menor Manhã cedinho, Porto dos Tatus. Chalana de pescador. Embar- litoral brasileiro (são apenas 66 quilômetros). É pouco, mas que camos. Vamos sós com o piloteiro Bal. Ao lado, saem outras bar- devagar, sem pressa, no ritmo sossegado de seus pescadores, cas, maiores, de vinte, quarenta, até sessenta lugares. Samba vai ganhando espaço no imaginário de quem ainda sonha com e farofa garantidos. Partimos. Mangue, dunas, praias selvagens, praias paradisíacas de areias desertas e com muito sol e calor pescadores. Matas, campos, alagados, mangues, dunas, pes- o ano inteiro. Quer mais? Retorne ao começo do roteiro, limpe a cadores. Um emaranhado de 2700 quilômetros quadrados, com areia e boa viagem. mais de setenta ilhas e incontáveis igarapés passa no horizonte.

DEVANEIO 100 | Eurobike magazine Parnaíba vista da Ponte das Barcas ao cair da noite. Ponto de partida para desvendar o mundo selvagem do maior delta das Américas


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