Café em Campinas uma estação chamada história
Apresentação Com uma agradável leitura, este livro propõe uma evento resgatou um trecho da história da cidade de contribuição para ampliar o conhecimento sobre a Campinas, e abriu as portas para a criação do centro história do café e a sua influência para o Brasil e para cultural de inclusão e integração social da a cidade de Campinas. unicamp, a ser conhecido como o cis-guanabara. A era do café trouxe a vida e o progresso a Campinas. Para 2009, estamos elaborando, em parceria com o Grandes propriedades rurais foram criadas, atividades de SESC e Instituto Jerusalém do Brasil, o projeto campi- produção e de comércio foram desenvolvidas, transfor- nas café festival que pretende valorizar toda a cadeia mando Campinas na segunda cidade mais importante produtiva com eventos nas áreas de café e ciência, café e do Estado de São Paulo, situação esta que permanece saúde, café e educação, café e lazer e café e negócios. até hoje. O esforço coletivo de inúmeras pessoas e instituições A partir do ano 1900, a Estação Guanabara de que apostaram no projeto, merecem o nosso agradeci- Campinas inicia os primeiros registros do período mento, pois sem eles não veríamos este sonho realizado. dourado do café no Brasil. Esta estação ferroviária, À Reitoria da Unicamp e aos profissionais da Pró- junto ao Instituto Agronômico de Campinas (IAC) Reitoria de Extensão, à Campinas-Decor, aos arquitetos, e o Instituto Biológico, começa a fazer da cidade, não decoradores e paisagistas, políticos da região, e vários apenas um grande centro de escoamento, mas tam- voluntários, deixo aqui registrada a nossa gratidão. bém, o primeiro centro qualificado para a pesquisa agronômica em geral, e do café em particular. Os apoiadores como o Instituto Agronômico de Campinas, Ateliê do Café, Prefeitura Municipal de Em 1990, a Unicamp consegue, por lei de como- Campinas, Cenic, Ciesp, Senac, Facamp, Puc-Campinas, dato, a concessão por 30 anos, de dois prédios, além da Câmara de Comércio Árabe-Brasileira e muitos outros gare: um dos prédios é a própria estação Guanabara; e contribuirão para tornar o Armazém do Café da Estação o outro, o armazém do café. Guanabara uma referência nacional sobre o consumo de café de qualidade, potencializando os objetivos do No mês de junho de 2008, a estação é aberta para CIS-Guanabara na inclusão e na integração social. receber o público da mostra do Campinas-Decor, res- ponsável pelo restauro da fachada externa da estação Mohamed Habib e pela reforma de diversas outras partes internas. Este Pró-Reitor de Extensão / UNICAMP 1
Sumário UMA HISTÓRIA SOBRE O CAFÉ ............... 3 O CAFÉ EM CAMPINAS ...................... 11 O CAFÉ BRASILEIRO NOS DIAS DE HOJE ..... 19 O CAFÉ E A SAÚDE ......................... 21 O CAFÉ EM VÁRIAS FORMAS ................ 23
Uma história sobre o café Segure uma xícara exalando o aroma de um bom café e estará com a história em suas mãos.
Uma lenda conta que um pastor chamado Kaldi observou que suas cabras ficavam mais espertas ao comer as folhas e frutos de um arbusto. Ele experimentou os frutos e sentiu maior vivacidade. Um monge da região, informado sobre o fato, começou a utilizar uma infusão destes frutos para resistir ao sono enquanto orava.
A planta do café é originária das terras altas da Etiópia, centro da África, onde ainda hoje faz parte da vegetação nativa. Foi a Arábia a responsável pela propagação da cul- tura do café; daí o nome da variedade mais conhecida ser “coffea arabica”. O nome “café” não é originário de Kaffa, local de origem da planta, e sim da palavra árabe qahwa. Na Arábia, a infusão do café recebeu a denominação Kahwah. Enquanto na língua turco-otomana era conhecida como Kahve, cujo significado era vinho. Por este motivo, o café tinha a alcunha “vinho da Arábia”. Entre os séculos XIV e o XVII, os árabes exerciam completo controle sobre o cultivo e a preparação da bebida. O conhecimento de seus efeitos disseminou-se e, no século XVI, o café era utilizado no Oriente, tendo sido torrado pela primeira vez na Pérsia. O café, no entanto, teve inimigos mesmo entre os árabes, que consideravam suas propriedades contrárias às leis do profeta Mohamed. Mas, a bebida venceu as resistências, e até os doutores maometanos aderiram a ela para favorecer a digestão, alegrar o espírito e afastar o sono. Em 1475, surge em Constantinopla a primeira loja de café. Por volta de 1570, foi introduzido em Veneza, Itália; mas a bebida, considerada maometana, era proibida aos cristãos e somente foi liberada após o papa Clemente VIII provar o café. Hoje, o mundo consome 125 milhões de sacas de 60 quilos por ano, o equivalente a 7,5 bilhões de quilos. Atualmente, os principais produtores de café são o Brasil, o Vietnã, a Colômbia, a Indonésia, a Etiópia, a Índia e a Guatemala. 5
LINHA DO TEMPO DO CAFÉ circa 575Lenda de Kaldi, um pastor de cabras que descobre o valor estimulante do café. O café é utilizado como alimento cru, começa a ser cultivado em grande quantidade no Iêmen. 1000circaDescobre-se a infusão de café. A fruta é mergulhada em água e fervida, e utilizada com fins medicinais. O primeiro café (coffee shop) do mundo é aberto em Constantinopla, o Kiva Han. Originalmente com fins religiosos, rapidamente tornou-se centro de jogo de xadrez, canto, dança e música. As leis vigentes em várias 1475regiões do Oriente Médio permitiam que a esposa pedisse divórcio caso o marido não fosse capaz de provê-la da cota desejada de café. 1480A bebida é preparada da mesma forma que conhecemos nos dias de hoje. O café torna-se popular na Arábia e, como o Alcorão proíbe as bebidas alco- ólicas, passa a ser bastante utilizado em cerimônias religiosas. 1511Khair Beg, governador de Meca, tenta proibir o consumo de café. O sultão, sabendo do ocorrido, decreta uma lei tornando-o uma bebida sagrada e condena o governador à morte. 1520O café é levado para Mokha, onde se inicia um grande cultivo. 1615-16A primeira importação de café para a Europa é feita pelos venezianos. Pietro Delia Valle nomeia esta maravilhosa bebida provada em suas viagens a Constantinopla de Coffea arabica. 1637O café chega a Oxford, Inglaterra. Em 1644, à França. A primeira botteghe del caffé em Veneza. Pasqua Rosée abre a primeira cafeteria em Londres, gerando 1645-52conflitos religiosos, já que algumas pessoas consideravam o café uma bebida impura. Uma cafeteria é aberta na Itália.
1660O café invade a América do Norte, levado pelos holandeses. Em Nova Amsterdã (Nova York) e Filadélfia, são abertas as primeiras cafeterias. 1683Criação da Bolsa do Café. Aberto o primeiro café de Paris, o Procope, que atualmente é um 1686restaurante onde se pode sentir a tradição das primeiras cafeterias européias. 1690Em 1699 inicia-se o plantio experimental em Java e, posterior- mente, em Sumatra; em 1706, inicia-se o plantio de mudas no jardim botânico de Amsterdã. O rei francês Luís XIV é presenteado com plantas de café pelo burgomestre de Amsterdã. Estas são colocadas 1714-15na estufa dos jardins de Versailles. Destas mudas, os franceses levam o café para as ilhas Sandwich e Bourbon. Em 1718, os holandeses levam o café para o Suriname, região nordeste da América do Sul, que se transforma em um grande centro produtor. Floriano Francesconi inaugura o Café Florian, na Piazza San Marco, em Veneza, até hoje uma tradição. Gabriel Mathieu De Clieu, capitão da marinha francesa, viaja para a 1720Martinica levando mudas de café, que se adaptam muito bem ao clima local, e dão origem a grandes plantações, ancestrais do plantio da América.
1727Primeira plantação de café em terras brasileiras. O café come- ça a ser cultivado no Pará, a partir de uma muda trazida da Guiana Francesa por Francisco de Melo Palheta. Dizem que Palheta, capitão do exército brasileiro enviado à Guiana para arbitrar uma disputa de fronteiras, teria seduzido a esposa do governador, que o presenteou com mudas e sementes de café. 1730Ingleses iniciam plantações na Jamaica, dando origem ao famo- so café Blue Mountain. A Exchange Coffee House é estabelecida na Broad Street, em Nova York. Em 1734, Johann Sebastian Bach compõe a Cantata do café. As cafeterias já haviam-se tornado um local de audição de música. 1760Mudas de Goa são trazidas para o Rio de Janeiro. O café é plantado na Gávea e na Tijuca por João Alberto Castello Branco. 1773O \"Boicote do Chá\", em Boston, torna o café a bebida oficial dos Estados Unidos. 1867Inaugurada a Estrada de Ferro Santos–Jundiaí, que unia o principal porto de exportação à região produtora de café. 1900Ludwig Roselius coloca no mercado o primeiro café sem cafeína. Santos Dumont realiza seu primeiro vôo com o 14 BIS e reforça sua 1906imagem de maior cafeicultor do mundo, conhecido como “o Rei do Café”, tendo divulgado sua marca “Santos” por toda a Europa.
1929Durante a Crise de 1929, decorrente da quebra na Bolsa, há uma desestabilização do mercado. O financiamento junto aos bancos estrangeiros é interrompido, e os preços despencam, levando o setor para uma enorme crise. 1935Francesco Illy cria a máquina automática para café expresso. 1971Começa nos Estados Unidos a popularização do café expresso e, em 1986, inicia-se a difusão de redes de cafeterias. 1990As máquinas de café expresso automáticas ganham presença no mundo todo. O consumo mundial supera a barreira de 100 milhões de sacas. Os cafés ecológicos e sustentáveis passam a ser uma exigência 1996do mercado. Uma empresa brasileira, a Daterra, recebe a primeira Certificação ISO 14001 (Environmental Management System). Certificações como o Rainforest Alliance, Utz Kapeh e Orgânico 2006constituem pré-requisitos para a produção, exigidos na comercialização em países mais avançados.
O CAFÉ E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O BRASIL Na sua peregrinação pelo mundo, o café chegou a Java e Bourbon, e depois foi introduzido no Novo Mundo por Gabriel Mathien de Clieu, oficial francês. Sua entrada no Brasil é uma história cercada de mistério e paixão, protagonizada pelo sargento-mor do exército brasileiro, Francisco de Melo Palheta. Por quase um século, o café constituiu a grande riqueza brasileira e as divisas geradas pela economia cafeeira aceleraram nosso desenvolvimento e inseriram o Brasil nas relações internacionais de comércio. Sua cultura ocupou vales e montanhas, possibilitando o surgimento de cidades por todo o interior do estado de São Paulo, sul de Minas Gerais e norte do Paraná. Ferrovias foram construídas, para permitir o escoamento da produção, substituindo o transporte animal e dinamizando o comércio inter-regional de outras importantes mercadorias. Nesta época, os fazendeiros de café tornaram-se a elite social e política, formando uma das últimas aristocracias brasileiras. Durante dez décadas, o Brasil cresceu e enriqueceu, movido pela exportação do café e pelo hábito do cafezinho, servido nas refeições. O café também interiorizou a nossa cultura, promovendo a miscigenação racial por meio da imigração, dominando partidos políticos, derrubando a Monarquia e financiando a industrialização no Sudeste do país. 10
O café em Campinas O progresso de Campinas sofreu grandes influências da economia cafeeira e, portanto, falar de café, em nossa cidade, é falar de nossa história.
O DESENVOLVIMENTO DA VILA DE SÃO CARLOS A indústria açucareira foi o primeiro grande mecanismo econômico de fixação da população e contribuiu para o desenvolvimento urbano de Campinas, que se instalou entre 1790 e 1795. O cultivo da cana-de-açúcar foi, de fato, o primeiro fator de riqueza, e a expansão da povoação foi determinada pelo caminho de escoamento do açúcar – estrada para São Paulo. DA VILA PARA A CIDADE DE CAMPINAS A transformação de Campinas de vila em cidade está ligada à entrada do café em nossa economia. As primeiras mudas surgiram na cidade trazidas como exemplares isolados e tratadas como plantas ornamentais nas propriedades rurais. Delas, não se extraía dinheiro, apenas uma bebida forte, preterida em função da erva-mate, usada tradicionalmente pelos moradores. Campinas foi a porta de entrada do café no oeste paulista e a primeira cidade a cultivá-lo racionalmente, pelo estabelecimento de cafezais com finalidade comercial. O primeiro lavrador a fazer uma pequena plantação em sua chácara foi o tenente Antônio Francisco d´Andrade que, em 1807 e 1809, trouxe o café colhido para secar na calçada, em frente a sua residência, no centro da cidade de Campinas. Mais tarde, esse cafezal foi abandonado, em vista de o tenente e seus filhos terem partido para as guerras do Sul. 12
Num segundo momento, por ocasião dos festejos do casamento do príncipe dom Pedro, em 1817, o capitão Francisco de Paula Camargo foi ao Rio de Janeiro e notou o alto preço alcançado pelo café. Por este motivo, e também por insistência do conde dos Arcos, resolveu fazer uma pequena plantação em sua propriedade, conseguindo, também, que seu parente, tenente-coronel Joaquim Aranha Barreto do Camargo, fizesse o mesmo. Alguns anos depois, Francisco Egídio de Souza Aranha, parente e genro do Tenente Coronel Joaquim Aranha B. de Camargo, restaurou o antigo cafezal e ampliou-o. Essa tentativa teve êxito e Campinas começou a exportar café. Devido aos bons resultados e por sugestão do Cirurgião-Mor Álvares Machado, que dedicava grande interesse pelo café, José de Sousa Campos e Bernardo José de Sampaio, por volta de 1835, começaram a se dedicar à cafeicultura. Devido às excelentes colheitas obtidas, seus vizinhos e outros lavradores seguiram seu exemplo, ampliando a produção. Em 1842, já se colhia bastante café em Campinas e o município começava a enriquecer e a prosperar rapidamente. Convém assinalar que, em 1899, Campinas contava com 26 milhões de cafeeiros, em um total de 278 propriedades, dando emprego a cerca de 25 mil trabalhadores. Depois da Segunda Revolução Industrial, Europa e Estados Unidos passam a consumir fortemente o café, o que gerou o incremento da produção no Brasil e, em especial, na região campineira. A curiosidade era que, após a colheita, os tratos extrapolavam as propriedades rurais e o café ainda em cereja era estendido para secagem nas ruas da cidade. O dia-a-dia da população dava-se nas roças, porém já havia sinais bem definidos de uma vida urbana, o que levou, dentre inúmeros outros fatores, à criação do município de Campinas, no ano de 1842. Em 1840, havia três ruas com trechos pavimentados: Rua Dr. Quirino, Rua Barreto Leme e Francisco Glicério (Rua do Rosário), entre os atuais largos do Rosário e da Catedral (Largo da Matriz Nova). 13
A modernidade de Campinas foi dada a partir da privilegiada condição social, política, cultural e, principal- mente, econômica da cidade. Com as melhorias urbanas e o incremento dos serviços, a cidade, antes destinada aos finais de semana, tornava-se moradia efetiva dos fazendeiros, que se transferiram com suas famílias. A sociedade local enriqueceu rapidamente. Uma demanda crescente do produto nos mercados estrangeiros fez com que os preços fossem subindo, incentivando aqueles que tinham condições de transformar seus canaviais em cafezais. No início, a lavoura cafeeira desenvolveu-se com base na grande propriedade monocultora e na utilização do trabalho escravo. Com a abolição, os fazendeiros foram obrigados a substituí-los por trabalhadores livres assalariados. Deu-se o ciclo de imigração dos europeus, que recebiam incentivo do governo para trabalhar nos campos de cultivo. A cidade, porém, deixou de ter feições coloniais. E os fazendeiros passaram a ser os “barões do café”. Campinas tornou-se a capital agrícola da província, rivalizando com a cidade de São Paulo. A assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, decorrência do movimento abolicionista e das freqüentes fugas de negros, mudou Campinas. O exército já se recusava a fazer o papel de capitão-do-mato, ou seja, capturar e devolver os escravos a seus donos, e já havia a concorrência com a mão-de-obra imigrante, barata, abundante e educada. A vinda de imigrantes italianos, espanhóis e alemães foi um novo fator de mudança cultural em Campinas. No ano de 1870, a economia cafeeira já havia se consolidado na cidade de Campinas, vindo, rapidamente, a possibilitar melhorias, não só nas fazendas, mas também nas residências e nos equipamentos urbanos. 14
Para escoar a produção cafeeira, em 1872, foram inaugurados os trilhos da Companhia Paulista de Vias Férreas. Seguiam até Jundiaí, ali se encontrando com as linhas da São Paulo Railway, articulando Campinas à cidade de São Paulo e ao Porto de Santos. No decorrer dos anos, os trilhos passaram a integrar a estruturação da economia cafeeira na região oeste do estado, dando origem a 900 quilômetros de linha tronco no sentido São Carlos, 1.200 quilômetros de ramais e a uma complexa rede de serviços distribuída entre Campinas, Rio Claro e Jundiaí. Pouco tempo depois, a Companhia Mogiana nasceu da necessidade de escoar café entre Mogi-Mirim e Campinas (e daí, pela Paulista e pela São Paulo Railway, ao Porto de Santos), formando, em pouco tempo, outra rede de escoamento que seguia para Minas Gerais através de 650 quilômetros de linha tronco (sentido Araguari-MG), 2.200 quilômetros de ramais – o que a tornou conhecida como “Cata-Café” ou “Ferrovia dos Ramais”. A cidade seguia mostrando um aparato urbano até então inédito, produzindo importantes repercussões em seu desenvolvimento, como a interligação por bondes, abertura de muitos restaurantes, hotéis, hospitais e casas de saúde, agências bancárias, casas de banho, representações consulares de países estrangeiros etc., graças à economia cafeeira. Em 1887, fundava-se o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), criado por dom Pedro II, justamente para subsidiar a evolução do processo tecnológico do café. Com o crescimento da demanda no mercado internacional, a evolução da cafeicultura não podia continuar dependendo apenas das experiências práticas dos lavradores, obtidas na lida do campo. Foi o IAC que viabilizou a expansão da cafeicultura para o oeste. 15
O período cafeeiro trouxe à cidade variados serviços e comércio para a população daquela época, dentre eles: laboratório farmacêutico, salão de barbeiros e cabeleireiros; casa de pássaros, joalheiros, costureiras, alfaiates, ferreiros, funileiros, ferradores, vendas de secos e molhados, além das instalações de hotéis e igrejas que partilhavam do cotidiano da população. Havia uma regra geral: cafeicultores, proprietários, comerciantes, advogados, médicos e outros membros da elite organizavam-se financeiramente para criar as novidades que se tornavam marcos da época, como o Colégio Culto à Ciência, a iluminação pública e o gasômetro. Era também persistente o incentivo à vinda das mais fortes novidades tecnológicas, dentre elas a mecanização da agricultura. A cidade crescia, e o desenvolvimento era efetivo. Ao final do Oitocentos, a cidade estava envolvida num grande processo de reestruturação, com base em novos conceitos urbanísticos de embelezamento e saneamento, provindos do ideário que vinha sendo aplicado, sobretudo, em cidades européias. Assim, o traçado urbano campineiro começa a se modificar, principalmente, com as intervenções feitas nos espaços públicos abertos, concomitantemente à construção de uma série de edifícios destinados a atender novos programas, modificando a paisagem urbana e imprimindo-lhe uma monumentalidade até então inexistente para a então cidade dos “barões do café”. Como parte dessa história de progresso, foi inaugurado o Mercado Municipal de Campinas, em 12 abril de 1908, projetado pelo arquiteto Ramos de Azevedo. Seu estilo obedece às arquitetura mourisca característica do mundo árabe. 16
O DECLÍNIO DO CAFÉ – A GRANDE DEPRESSÃO Do período cafeeiro, configuravam-se as estruturas e os aspectos do centro da cidade de Campinas. Porém, uma nova estrutura aos poucos se anunciava; a cidade estava num processo de transição: a cidade do café ainda prevalecia, mas a da indústria já se revelava. No Brasil, depois da Revolução de 1930 e dos abalos provocados pela grande crise econômica mundial, a “Crise de 29” – conhecida também como “A Grande Depressão” –, instalou-se uma instabilidade na economia cafeeira. A quebra da Bolsa de Nova York foi um duro golpe, pois a importação deste produto, principalmente pelos Estados Unidos, o maior comprador do café brasileiro, diminuiu muito, e os preços do café caíram bruscamente. Assim que a economia mundial se refez, o Sudeste do país voltou a crescer, desta vez com perspectivas lastradas na cafeicultura e na indústria, que assumiu parcelas maiores da economia. O café retomou sua importante posição nas exportações brasileiras e, mesmo perdendo mercado para outros países produtores, o Brasil manteve-se como principal produtor de café no mundo, sob a supervisão do Instituto Brasileiro do Café, criado em 1952. A cafeicultura nacional reorganiza-se e passa a ser praticada preferencialmente em pequenas e médias propriedades rurais do Oeste Novo paulista (Ribeirão Preto e Araraquara), e Campinas foi cedendo espaço na produção de café para outras regiões, como Franca e sul de Minas. Campinas volta a crescer, deslocando o poder dos grandes fazendeiros para uma estrutura mais industrial e comercial. Com o decorrer do tempo, o desenvolvimento imobiliário avança e as terras onde se produziam o “ouro verde” tornam-se caras para a prática da agricultura. 17
Hoje, Campinas ainda guarda um patrimônio extraordinário em termos de pesquisa sobre o café, de que são exemplos os bancos de germoplasma de plantas de café de todo o mundo, na fazenda Santa Elisa, e os estudos do Instituto Agronômico de Campinas. Da sua época áurea, ainda nos restam belas sedes das fazendas coloniais, como a Fazenda Tozan que, desde 1994, passou a integrar o roteiro turístico rural e cultural de Campinas e é, também, um patrimônio preservado resultante da trajetória do café, sendo possível conhecer desde as diferenças entre os tipos de grãos até o maquinário usado para beneficiamento, na década de 1950, passando ainda pelas etapas do cultivo do café − adentrando os segredos da história da tão importante e apreciada bebida dos áureos tempos campineiros. 18
O café brasileiro nos dias de hoje Atualmente, o Brasil mantém-se como o maior produtor de café, detendo 33% do mercado mundial.
Atualmente, o Brasil mantém-se como o maior produtor de café, detendo 33% do mercado mun- dial, e é também o segundo mercado consumidor, atrás somente dos Estados Unidos. Recentemente, o país sediou a 22ª conferência da ASIC, Associação Internacional da Ciência do Café, em Campinas, palco do maior intercâmbio mundial de troca cien- tifica sobre os avanços da cultura e das propriedades dessa planta maravilhosa. As regiões produtoras, as chamadas zonas cafe- eiras, estão concentradas no centro-sul do país. Destacam-se quatro estados produtores: Minas Gerais, São Paulo, Espírito Santo e Paraná. A região Nordeste também tem plantações na Bahia e, da região Norte, pode-se destacar Rondônia. O nordeste do estado de São Paulo, conhecido como Mogiana, e o sul de Minas sempre foram regiões res- peitadas devido à produção de um café fino; e a região de maior destaque é a do Cerrado Mineiro. Englobando dezenas de municípios do Triângulo Mineiro, esta área caracteriza-se por grãos de excelente qualidade. Com altitude acima de mil metros e produtores que utilizam técnicas modernas, o \"café do cerrado\" desenvolve predicados especiais, valo- rizados em todo o mundo. A fronteira entre Minas Gerais e São Paulo ainda é uma importante região produtora de café Arábica, assim como a região da fronteira entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais. O café Robusta é plantado no Espírito Santo e em Rondônia, sendo destinado principalmente à indústria de café solúvel. 20
O café e a saúde Há cerca de 30 anos, muitas universidades e centros de pesquisa médica, incluindo a Universidade Federal do Rio de Janeiro, desenvolvem pesquisas cujos resultados demonstram que o consumo diário de quatro xícaras de café pode combater os dois maiores males do século: a depressão e o consumo abusivo do álcool, além de contribuir para a redução e prevenção de muitas outras doenças.
O café é antiviral, antioxidante, antibacteriano e hepatoprotetor; contém uma grande quantidade de ácidos clorogênicos e cafeína, que promovem a prevenção do câncer de cólon, de próstata e até de pulmão. O consumo de café, comprovadamente, faz bem na prevenção de doenças metabólicas como diabetes, Parkinson, Alzheimer, cirrose e cálculos da vesícula biliar. Na mulher em especial, previne o câncer de cólon e a hipertensão. No cotidiano da vida, o café é um grande energético e estimulante, promovendo a vigília e a prontidão, rapidez dos reflexos, disposição para a prática de exercícios físicos, aumento da atividade intelectual; além de refrescar a memória e aumentar a capacidade de concentração. Consumido regularmente, torna-se um exce- lente anti-oxidante, combatendo os radicais livres. Contém ainda vitamina B, lipídios, aminoácidos, açúcares e uma grande variedade de minerais, como potássio e cálcio. A cafeína chega às células do corpo em menos de 20 minutos após a ingestão do café e, no cérebro, aumenta a influência do neurotransmissor dopamina. Melhora também a taxa de oxigenação do sangue. Doenças como infarto, malformação fetal, câncer de mama, aborto, úlcera gástrica ou qualquer outro tipo de câncer não estão associadas ao consumo moderado de cafeína. Porém, quando ingerida em excesso, a bebida produz desconforto, ansiedade e pode prejudicar o sono. Após as 17 horas, o consumo de café deve ser evitado pelas pessoas que demonstram dificuldades em dormir. Pó de café velho e rançado, assim como grãos defeituosos, produzem sabores e aromas muito desagradáveis e também fazem mal para a saúde. Em muitos casos, o consumidor necessita adicionar muito açúcar ou adoçante para compensar o amargor, o que pode provocar problemas estomacais. DICAS PARA SABOR E SAÚDE O café deve ser consumido em poucos dias após a torra, máximo 10 dias. Para preservar o café por mais tempo, colocar em congelador. Consumir imediatamente após sua preparação. Café expresso muda de sabor em menos de 2 minutos, assim que o creme desaparece. 22
O café em várias formas O café, que motivou traições, gerou riquezas e conquistou o mundo, pelo simples prazer que acrescenta à vida, ajuda a recontar a história do Brasil, de Campinas e da economia mundial.
Sempre lembrado na forma do cafezinho que descontrai, que anima, que ajusta o paladar, o mundo do café é muito mais rico e variado. São inúmeras as formas de apreciar essa gostosa e estimulante bebida. Há, também, requintados drinques quentes e gela- dos, receitas de bolos, sobremesas especiais, licores, balas, sorvetes, tortas, refrescos e molhos de pratos salgados, que têm no sabor do café seu mais impor- tante elemento. Recentemente, foi lançada uma cerveja escura arte- zanal de alta qualidade, a Demoiselle, da Cervejaria Colorado, feita a partir de cevada importada e aroma- tizada com café extra especial. O sucesso foi imediato, e essa cerveja já disputa o campeonato mundial de cervejas artezanais que acontece na Europa. Delicie-se com esta maravilhosa experiência que é o café.Ele faz parte da história do Brasil e de Campinas. 24
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ISBN 978-85-7694-205-4 Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários
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