pentagrama Lectorium Rosicrucianum Água Viva A criação segundo os Hopis A ponte de fogo e água em direção à luz Laila e Majnun O filho do fogo Fogo, água, amor Levantemos âncora2009 1fevereiroNÚMERO
Editor responsável Revista Bimestral da EscolaA. H. v. d. Brul Internacional da Rosacruz ÁureaRedação finalP. Huis Lectorium RosicrucianumImagens A revista Pentagrama propõe-se a atrair a atenção deI. W. v. d. Brul, G. P. Olsthoom seus leitores para a nova era que já se iniciou para o desenvolvimento da humanidade.Design O pentagrama tem sido, através dos tempos, o símboloCapa: Dick Letema do homem renascido, do novo homem. Ele é tambémInterior: Ivar Hamelink o símbolo do Universo e de seu eterno devir, por meio do qual o plano de Deus se manifesta. Entretan-Redação to, um símbolo somente tem valor quando se tornaC. Bode, A. Gerrits, H. P. Knevel, G. P. Olsthom, realidade.O homem que realiza o pentagrama em seuA. Stokman-Griever, G. Uljée, I. W. v. d. Brul microcosmo, em seu próprio pequeno mundo, está no caminho da transfiguração.Secretaria A revista Pentagrama convida o leitor a operar essaC. Bode, G. Uljée revolução espiritual em seu próprio interior.Endereço da RedaçãoPentagramMaartensdijkseweg I,NL – 3723 MC Bilthoven, [email protected]ção BrasileiraEditora Lectorium RosicrucianumAdministração, assinaturas e vendasTel: (011) 4016-1817Fax: (011) 4016-5638www.editoralrc.com.brResponsável pela Edição BrasileiraM. D. Eddé de OliveiraRevisão finalM. R. de Matos MoraesTradutores e revisoresS. Cachemaille, M. C. Zanon Costa, I. Duriaux,J. Jesus, M. Pedroza, A. Sader, M. S. Sader,Y. Sanderse, U. Shmit, M.V. Mesquita de Sousa,R. Dias de Luz, F. M. da Silva LuzDiagramação, capa e interiorD. B. Santos NevesLectorium RosicrucianumSede no BrasilRua Sebastião Carneiro, 215, São Paulo, [email protected] em PortugalTravessa das Pedras Negras, 1, 1º, [email protected]© Stichting Rozekruis PersProibida qualquer reprodução semautorização prévia por escritoISSN 1677-2253
p e n t a g r a m a Ano 31 número 1 2009A terra e os homens formam uma unidade. Se a terra muda, os Sumáriohomens mudam no mesmo tempo, e esses movimentos exercemgrande influência em sua consciência. As tensões e o estresse água vivaaumentam, e é preciso manter o equilíbrio interior. o remédio universal 2O homem está em verdadeiro equilíbrio quando céu e terra nele a portadora silenciosa de toda vida 6se encontram. Quem ouve a voz interior vê o exterior em justa histórias de amor da terra e do céurelação e enfrenta a tempestade como uma casa edificada sobre Laila e Majnun 10a rocha. a ponte de fogo e águaMas quem ouve a voz? E quem crê nela se a ouve? Como ela em direção à luz 16parece vaga e irreal! Podemos reagir com nossa consciência atual? o filho do fogo 22Entretanto, o caminho existe. Há o caminho de preparação e o fogo, água, amor 26caminho de realização. São as duas vias da luz, sempre oferecidas a arte do ceramistaà humanidade para que ela busque a libertação. Encontramos a despertar do espírito eentrada quando nos aproximamos dela de coração aberto e com metamorfose da alma 32grande desejo. E uma vez a caminho, ouviremos a voz que, cada a criação segundo os Hopis 38vez mais clara, nos fará compreender o que nos diz interiormente levantemos âncora 46o céu. Capa: Os quatro elementos, fogo, água, terra e ar, estão em conflito mútuo até o momento em que o sol espiritual se eleva e lhes confere uma clara e pura harmonia. tijd voor leven 1
água vivaNestes tempos de grandes problemas políticos, profissionais, sociais, pessoais,tanto internos quanto externos, a humanidade se encontra diante de valores eexigências muito especiais. Cada vez mais as pessoas atingem seus limites, elasestão “exaustas” física e psiquicamente. Onde e como remediar isso?Em todos os domínios da vida, as velhas de fogo” sem precedentes, o período da mudan- estruturas desmoronam; sentimo-nos ça fundamental e do julgamento decisivo. perturbados, dilacerados. Tanto no pla-no do corpo quanto no da alma, procuramos AQUÁRIO E URANO Urano rege o signo denos curar, sair do impasse. Certas pessoas, em Aquário. Urano é o princípio da intuição, datodas as culturas e em todos os continentes do renovação e do intelecto. Urano é também omundo, empregam métodos de cura e remédios amor. Ele é a consciência e o saber para os quaisvariados, e então fazem misturas destinadas ao nenhuma explicação é necessária. Urano signi-corpo, à alma e ao espírito... e prometem: “Vo- fica ao mesmo tempo individualidade e von-cês se tornarão novos homens”! tade pessoais, mas também consciência social, unidade, liberdade, ajuda e cuidado afetuoso, eA BOA ÁGUA, UM REMÉDIO PARA TODOS? também desejo e vontade de encontrar um novoDizemos que a água, em todas as suas formas, ideal muito particular.exerce ação excelente e fundamental sobre a Por um lado, Urano nos impulsiona em dire-saúde. Porém, a própria água se tornou doente, ção a extremos perigos, e, por outro lado, eme é preciso purificá-la por diversos métodos, direção a oportunidades excepcionais de nostanto antigos quanto novos. Cremos na ação libertarmos da existência ligada a esta nature-benigna da “fonte de toda vida” e usamos muito za. Então, o perigo é que dentro do campo dea “boa” água que se tornou vivente, a “água tensão de nossa procura, nossa consciência sejaviva”, como um remédio capaz de nos mudar. “queimada”. As possibilidades libertadoras pas-E, depressa, devemos reconhecer cada vez mais: sam pelo renascimento do novo homem, que,não estamos de modo algum curados nem nos após um processo de cura, de santificação, tem otornamos novos homens! Mas começamos a re- poder de se voltar em direção ao campo de vidaconhecer que os problemas de nossas vidas têm original, a natureza divina. E é para realizar esseoutro aspecto. grande retorno que Aquário derrama sua “águaHá alguns decênios, a era de Aquário teve iní- viva” sobre a humanidade.cio. E é com velocidade crescente que ela enviapara o mundo e a humanidade seus raios inter- A “ÁGUA VIVA” Alguns terapeutas afirmam quecósmicos muito especiais. A ação purificadora todas as doenças do corpo físico são decorrentesdas vibrações que a acompanham faz ruir as ve- de falta de água: os processos vitais não são pos-lhas estruturas. E como todos os homens inalam síveis sem todas as funções da água. Pois bem,o mesmo ar, ninguém pode se omitir desse fogo poderíamos também dizer que a humanidadeconsumidor. O mundo entrou em um “período sofre de falta de uma água existencial, da “água2 pentagrama 1/2009
o remédio universalviva”, do remédio verdadeiramente universal.O que significa a água viva para os rosacruzese para os gnósticos de todos os tempos? Paraeles, é a matéria de construção da manifesta-ção divina, o oceano da substância original, ocampo-mãe que nos transmuta e nos tornafilhos de Deus.A água viva é a força gnóstica pura, aforça de luz da eternidade, chama-da “remédio universal” desde aorigem dos tempos.“Nunca mais terão fome,nunca mais terão sede;nem sol nem caloralgum cairá sobreeles. Porque oCordeiro queestá no meiodo trono osapascentará, água viva 3
e lhes servirá de guia para as fontes das águas de ser onde agem cinco fluidos, de acordo comda vida; e Deus limpará de seus olhos toda a o caminho da Gnose quíntupla. Cada etapa dolágrima.”(Apocalipse 7, 16-17) sistema quíntuplo de santificação comporta uma purificação, o que significa que a mudança deO REMÉDIO UNIVERSAL Entretanto, como a um dos cinco fluidos da alma a cada etapa ageágua viva, a força de luz gnóstica, exerce sua para tornar possível a etapa seguinte. Os cincoação benigna sobre o ser fundamentalmente fluidos, as cinco etapas e as cinco ações – comdoente mas que busca por santificação? Tudo o sangue como fundamento – caracterizam ocomeça pela purificação e pelo silêncio do cora- caminho da transmutação e transfiguração:ção, pois o coração é, para a Gnose, a porta de 1. O fluido sanguíneo: a compreensão da natu-passagem no sistema vital humano. Na calmae no silêncio do coração, a luz pode descer, e reza de nosso campo de vida, e a idéia de seré com ela e por meio dela que o coração tem a chamado a retornar à ordem divina.possibilidade de se purificar. Como radiação da 2. O fluido hormonal: a verdadeira santificação.luz, a água viva é recebida pelo corpo etérico, 3. O fluido do fogo serpentino: a oferenda dao corpo vital do ser humano. A água viva está personalidade, do “eu”, para alcançar a santi-em correspondência com o éter vital. Servimo- ficação.nos da luz gnóstica para a renovação de nossa 4. O fluido nervoso: sob a orientação do átomo-vida, e isso ocorre por meio do corpo etérico. A centelha-do-espírito, surge espontaneamenterenovação da vida significa a renovação da alma, a nova atitude de vida, os novos atos, taisquer dizer: o (re)nascimento e crescimento da como os prescritos no Sermão da Montanha.“nova” alma acontecem após longo processo de 5. O fluido da consciência, realizador do cami-transmutação alquímica por meio do Espírito nho: despertar e ressurreição no campo de– o princípio do fogo. A alma é intermediária vida original.entre a água e o Espírito. “Jesus respondeu, edisse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que Esse quíntuplo fluido da alma – a Estrela de Be-aquele que não nascer de novo, não pode ver o lém – a água viva – derrama profusamente suareino de Deus.” ( João 3,3) graça sobre todos. Devemos apenas estar prontos para nos abrir, para nos dispor a estar receptivos.O SISTEMA QUÍNTUPLO DA SANTIFICAÇÃO A CAMINHO E OBJETIVO DA SANTIFICAÇÃOalma humana tem cinco aspectos, cinco estados Podemos dizer também que o “método” da4 pentagrama 1/2009
santificação consiste em “saber – ousar – querer transformação da água em vinho nas bodas de– agir”, o que é a própria prática da nova atitude Caná, as curas nas fontes de Betesda e Siloé, ede vida. naturalmente o batismo da água, que precedeSaber qual ajuda recebemos e porquê, para que o batismo do fogo. O ritual do batismo pelaela serve e aonde nos leva. água, seja por aspersão, seja por imersão, existeOusar enfrentar as conseqüências inelutáveis e em todas as religiões. A fonte nos templos daconcluir o caminho com um profundo desejo, e Rosacruz é também o símbolo da água viva quetambém com fé e toda confiança. renova tudo sem cessar. Ela estimula o aluno aQuerer que nosso ser inteiro mantenha uma não somente continuar o caminho da alma, masatenção permanente, orientada para a santidade também a se ligar à força da alma e se colocar,desejada – a santificação. assim, em condição de praticar esse trabalho deAgir de maneira que o ser testemunhe um fato. O mundo inteiro encontra-se em dese-novo comportamento reconhecível, que a vida quilíbrio cada vez maior. A conseqüência é opermaneça em harmonia com o raio da luz da esforço de toda manifestação para descobrir aGnose e que a alma cresça. lei espiritual e natural que leva à harmonia, para compreender e agarrar as forças espirituais eSÍMBOLO, REMINISCÊNCIA, EXORTAÇÃO naturais corretivas. Isso implica em ruptura, masDesde os primórdios os homens conheciam o intensifica também a intervenção salvadora dacaminho de retorno à casa de seu Pai. Eles de- Gnose, sustentada pela atividade de Aquário. Háterminavam o sentido de sua existência terrestre uma coesão e dependência entre todas as coisas.e sua própria missão aqui embaixo com o auxí- Todas fazem parte umas das outras: é a ligaçãolio de símbolos. Um desses antigos símbolos é o total de todas, a unidade de todas. Elas formamGraal, uma taça ou cratera, onde a água viva, a o Um. A quem vê e compreende sua impiedadeforça da luz gnóstica, transforma o ser humano fundamental, sua natureza não divina, são dadasde modo alquímico, fazendo-o passar do estado em profusão a capacidade e a força da verdadei-de “nascido da matéria” ao estado de “homem ra cura, da santificação. Aquário derrama sobrede luz” possuidor de uma alma e de um espírito nós, em profusão, seu cântaro pleno de águavivente nos domínios da origem. viva. A criação inteira espera suspirando que osNa Bíblia, encontramos numerosas indicações homens, por fim, se voltem para a água viva, osobre a simbologia da água viva como força remédio universal, a fim de que surjam as flamasde luz, força de Cristo, remédio universal: a da luz aprisionadas na matéria µ água viva 5
a sustentadora silenciosaLao Tsé disse que “a maior das virtudes é parecida com a água. A virtude da água é ser semconflito e ser útil a todos os seres. O comportamento justo é semelhante à água. A água estáem toda parte e permanece em todos os lugares. Ela também está nos lugares desprezadospelos homens”.Aágua de nosso mundo reflete todas as facetas fará parte dela. É por isso que os éons – grandes da existência humana.Tranqüila e silen- concentrações de forças invisíveis – transmutam essa ciosa, ela anuncia inexoravelmente o curso pura substância original diminuindo sua freqüênciaque toma a humanidade. De modo absolutamente vibratória para torná-la assimilável pelas forças hori-neutro, ela recolhe todas as informações e as distri- zontais da vida natural.bui no universo inteiro. A água é o maior agente dedecomposição de toda a terra. Sem água, as subs- SEDE DA ALMA Uma sede verdadeira, a sensaçãotâncias não se misturam umas com as outras e estão de uma necessidade interior, habita os seres huma-impossibilitadas de seguir seu ciclo. nos desde o início dos tempos. Ela é onipresente eQuando o homem contemporâneo fala da água está sempre ligada a uma grande nostalgia de nossaviva ele enfoca a pureza da água terrena, tanto no verdadeira pátria, nossa pátria de origem.aspecto grosseiro quanto no aspecto sutil desse ele- Vivemos no início da era de Aquário: as novasmento. Os fornecedores de água utilizam slogans tais condições atmosféricas influenciam cada vez mais acomo “água é vida” ou “água fresca natural”,“água humanidade. O aguadeiro de Aquário derrama seuvivificante”, etc. A necessidade de “bem-estar” de cântaro cheio de água. Urano brande a espada paranossa sociedade de consumo se mostra tão grande marcar a hora da compreensão clara. Mas as grandesquanto a necessidade dos pobres deste mundo por forças auxiliadoras da desmaterialização no caminhoágua para sobreviver. A água fresca das nascentes da transmutação geralmente são mal compreendidas.ou a água mineral cintilante trará de volta a vida De onde vem isso?pura.Vários dispositivos de purificação de água sãooferecidos para a remoção de substâncias nocivas e TOMADO ENTRE DOIS PÓLOS A molécula da água,mesmo para a reprogramação dos padrões vibrató- H2O em Química, é composta de dois átomos derios.Trata-se aqui também da purificação espiritual. hidrogênio e um de oxigênio. Como portadora deCientistas como Viktor Schauberger desenvolveram informações, ela está incessantemente em movimen-técnicas de “turbulência” para que a água conserve to e se associa com outras tão depressa quanto sepor longo tempo sua “vitalidade”. dissocia. Essa molécula é dipolar (os centros de suasA água realmente “viva”, a pura força de luz gnós- cargas elétricas positivas e negativas não coincidem)tica, no entanto, jamais terá sua fonte no mundo e reage imediatamente a estímulos elétricos. Asdialético. Ela jorra exclusivamente dos domínios moléculas da água interligam-se por meio de pontesdo Espírito Santo. Essa substância divina original, a de hidrogênio estruturadas, que oscilam com uma“matéria mágica”, está presente em todos os lugares, freqüência característica.aqui e agora, mesmo nos lugares “desprezados pelo Todas as substâncias que constituem nosso planetahomem”, diz Lao Tsé. Mesmo que essa substância vibram entre dois pólos. Nada nesta natureza é fixoastral original mantenha o mundo natural, ele não ou permanece imóvel.Tudo no universo possui seu6 pentagrama 1/2009
de toda vida a sustentadora silenciosa de toda vida 7
Uma parábola de Buda responderam: “Não, Senhor, é ocasião maravilhosa é ofertada àilustra a necessidade de uma fé absolutamente impossível e ela não humanidade e a cada microcosmo,profunda. Quando Buda encontra pode estar ao mesmo tempo num e isso em nosso mundo. Mesmoseus discípulos na borda de um lago lugar e em todos os lagos do mun- sendo um mundo decaído, ele é,ele diz esta parábola: “Imaginai, ó do”. Buda responde: “É improvável, no entanto, um lugar de graça ondemonges, que uma tartaruga cega no entanto, não é impossível. Como existe uma única possibilidade deque carrega um jugo de madeira também é improvável que nasça encontrar o caminho de retorno.ponha-se a nadar em todos os um ser humano com todos os seus O reino de Deus é a única fonte delagos do mundo. A cada cem anos membros e sentidos e também com tudo o que existe. No momentoessa tartaruga cega emerge uma a faculdade de entender a palavra em que a pureza da nova alma sevez só para respirar. Acreditais que da verdade”. reflete na fonte original, a água vivaessa tartaruga poderá libertar sua Podemos encontrar nesta pará- dessa fonte tem a possibilidade decabeça de seu jugo?” Os monges bola uma grande consolação. Uma se refletir sobre todo o universo.próprio comprimento de onda. Os materiais mais inteligentemente essas possibilidades. Evidentemen-duros também vibram. A madeira e o concreto te o tempo dá uma reviravolta; e não está passandovibram continuamente, cada um em sua freqüência mais e mais rápido? Quanto tempo ainda nos restaespecífica. O próprio corpo humano é constituí- para seguir o chamado do átomo original de nossodo em média de 70% de água; órgãos importantes coração?e mesmo nosso sangue contêm 90%.Verificamosainda que 70% da superfície da terra são cober- DEPOIMENTOS SOBRE A ÁGUA TERRESTREtos por água. Concluímos, então, que nós mesmos O pesquisador japonês Masuro Emoto conseguiuvibramos, que somos seres inteiramente vibrantes! capturar o estado da água da atmosfera tirando fotosTomando consciência desse fato, compreendemos de cristais de água. Ele demonstrou também que aaté que ponto dependemos de tudo o que evolui e água responde a palavras, imagens e sons musicais ese movimenta neste mundo. mesmo a sentimentos. Suas fotos mostram gotas deMas essa verificação por si só não é suficiente para água congeladas que, iluminadas do alto e examina-nos libertar de nossa aspiração interior: com base das no microscópio, tornam os cristais visíveis.nesse desejo, devemos colocar mãos à obra.“Quan- Esses resultados apresentam grande precisão: os maisdo a força-luz é inalada sem ser empregada”, como belos cristais de tipo hexagonal formam-se com asescreveu J. van Rijckenborgh em O remédio universal, palavras “amor”,“reconhecimento” e durante cele-“surgem grandes perigos no que se refere a um refor- brações religiosas. Ao se enunciar as palavras “im-ço do estado de ser dialético e suas conseqüências”. becil” ou “louco” nenhuma cristalização aconteceu,Quem compreende que tudo está estreitamente mas o resultado é uma imagem de devastação. Osligado neste mundo entende que, à medida que age sentimentos podem agir sobre a estrutura da água eou não, assume grande responsabilidade diante da mesmo desencadear um processo de transformação,existência humana inteira. o que foi demonstrado em uma experiência emA era de Aquário é um tempo de violentas mudan- julho de 1999. O dr. Emoto organizou uma reuniãoças, onde teremos a oportunidade de romper com com 350 pessoas em volta do lago Biwaki, que é otudo o que nos aprisiona, tanto exterior quanto maior do Japão.interiormente. Então, tomemos a evidente decisão O grupo realizou uma cerimônia destinada a pu-de nos consagrar às ações daí decorrentes. Aquário rificar o lago recitando a “Grande Conjuração”.rompe e nos faz dar uma reviravolta. Utilizemos De fato, água tornou-se visivelmente mais pura,8 pentagrama 1/2009
e o crescimento das algas foi interrompido. Após dialética, permanece completamente intata. Pioranos de experimentação, o dr. Emoto demonstrou ainda: segundo as leis fundamentais da dialética, ao seguinte: se a corrente de água escoa harmonio- maldade coletiva da humanidade e os sofrimentos asamente, a própria água se purifica; se afluentes e ela ligados são estimulados e fortalecidos na mesmarios escoam de maneira natural, a água é bela. Se seu proporção em que a luta humanista comum con-curso é interrompido por um dique ou uma barra- tra a enfermidade se desenvolve. O terrível estadogem, deve-se esperar muitas vezes pela morte estru- doentio da humanidade é com isso ainda piorado!tural das águas. Ocorre o mesmo com a circulação Dez anos, porém, de uma atitude de vida modifica-do sangue: se ela é bloqueada, a morte corporal da total e fundamentalmente fariam a aflição sumircomeça no local do bloqueio. Segundo as descober- como uma rajada de vento!”tas do dr. Emoto, estar em harmonia com a natureza Somente em águas calmas o lótus desenvolve todaé “fluir” em harmonia com o mundo. Os bloqueios sua força para se erguer, emergir até a superfície dadeste mundo reprimem a corrente natural da água. água e crescer para se tornar uma flor esplêndida µ“Devemos cumprir uma missão.Temos o dever dedevolver à água sua pureza e criar um mundo onde Fontes:é bom viver. Assim, cada pessoa neste mundo deverá Rijckenborgh, J. v. A Gnosis chinesa.possuir um coração puro e belo.” Essa citação nada Jarinu: Editora Rosacruz, 2006.mais é que o chamado gnóstico à purificação do Rijckenborgh, J. v. O remédio universal,coração! Mas como alcançá-lo? 2ª ed. Jarinu: Editora Rosacruz, 2003.Como sentir o que circula em nosso interior? Uni- Rijckenborgh, J. v. O advento docamente pelo autoconhecimento! Isso pode come- novo homem. São Paulo: Lectoriumçar por uma revolução interior: nada fazer, não agir Rosicrucianum, 1988.conforme o estado do momento. Mas a bondade Emoto, M. As mensagens da água. Sãosomente não bastará. Sem uma clara visão do nosso Paulo: Ísis, 2004.papel e da coesão de forças que dirigem a nature-za – e as sociedades – as teorias do dr. Emoto e as“conjurações” se transformarão em seu contrário. J.van Rijckenborgh escreveu, em O advento do novohomem: “Grande onda humanista se movimenta.Grande bondade arde em milhões. A causa funda-mental, a essência de toda a doença, nossa existência a sustentadora silenciosa de toda vida 9
histórias de amorda terra e do céu10 pentagrama 1/2009
A maioria das histórias de amor que fazem parte das tradições universais não termina bem. Mais preci-samente: o amor entre dois apaixonados não se realiza completamente por diferentes razões. Romeu eJulieta, Fausto e Margarida, Orfeu e Eurídice,Tristão e Isolda são exemplos típicos, bem como a históriaoriental de Laila e Majnun. Por que essas histórias, há séculos, retornam sob formas de contos, filmes,balés? Por que nunca têm um final feliz? Quais são as características particulares que todas comparti-lham no mundo das idéias?L aila e MAJNUN A história de Laila (nome lamenta-se e chora incessantemente; numa fria que evoca olhos e cabelos negros como a noite de outono, ela sai secretamente, sussurrando, noite – leil significa noite em árabe) e Maj- os olhos fixados na porta: “Majnun”. Laila morre enun, que o poeta persa Nizami escreveu em 1188, Majnun, mortalmente infeliz, joga-se sobre o seurelata esse mesmo assunto intrigante. A história é re- túmulo e morre também. Seu corpo descansa sobresumidamente a seguinte: o jovem beduíno Majnun o túmulo onde jaz Laila e é apenas no dia do ani-é apaixonado por Laila que compartilha esse amor. versário da morte dela que sua família e seus amigosO pai de Laila opõe-se a esse casamento e força-a a reconhecem-no e enterram-no ao lado de Laila. Atécasar com outro. Majnun, desesperado, afasta-se de que nada reste de seus corpos, eles são guardadossua família, de sua tribo, da sua pátria. Sofrendo e pelos animais selvagens que acompanhavam Majnunsolitário, ele vagueia no deserto rochoso.“Os olhos no deserto e velavam por ele. Os dois apaixonadosdas gazelas recordam-lhe sua bem-amada perdida. são unidos pela eternidade. Separados na terra, elesNinguém pode ajudá-lo, aliviá-lo. Ele nada sabe e então se tornam um.de nada fala senão de Laila.” Sua profunda tristezatorna-o louco, daí o nome Majnun Laila, louco por A RELIGIÃO DO AMOR Laila e Majnun não podemLaila em árabe. se ver, mas como os poemas de Majnun são conhe-Todos os esforços para lhe devolver um pouco cidos em todo o país, Laila está a par de sua tristeza.de bom senso, para trazê-lo de volta à sua tribo, Uma única vez, graças a um amigo, eles conseguemfalham.Todas as tentativas de convencê-lo de que o se ver. Eles não correm o risco de ser incomo-seu amor é insensato continuam a ser vãs. Seu pai dados, mas permanecem a certa distância um doenvia-o em peregrinação a Meca para pedir a Deus outro. “Envolta em seu véu e escondida na sombraque o livre de seu sofrimento, mas sem sucesso. da noite, Laila corre para o jardim. Sua alma voa àPara agradar seu pai, Majnun faz esta oração:“Tu, frente. Por fim, ela avista Majnun. Ela pára antes deque derramas sobre nós o amor, eu te imploro uma alcançar a palmeira contra a qual ele se apóia. Seusúnica coisa: eleve-me no amor de modo que eu e joelhos tremem e os seus pés parecem cravar-se nominha bem-amada provemos a felicidade mesmo solo. Dez passos separam-na ainda do seu bem-que eu deva morrer”. amado. Um círculo mágico cerca-o, ele, que nãoEle exprime sua dor em versos contundentes. Mui- pode cruzá-lo. Ela volta-se para o velho ao seu ladotos o procuram para ouvi-lo improvisar e cantar e diz:“Homem sábio, não posso ir mais adiante.Veja,seus maravilhosos poemas e encantar-se com sua estou agora como sobre carvões ardentes. Se meflauta. Após a morte do seu cônjuge, Laila, que aproximasse mais perto do fogo, consumir-me-ia.continuara fiel ao amor de Majnun, deixa-se levar, Aproximando-nos, corremos o risco de naufragar; na religião daqueles que se amam, isso é um erro…”Pássaros e Enamorados © Arquivos de Werner Forman Laila mostra, assim, que ela é uma apaixonada que histórias de amor da terra e do céu 11
“Entretanto, aquilo que é aqui uma unidade deve aparecer sob a forma da dualidade...”sabe obedecer “à religião do amor”. Que quer dizer Majnun merece o nome respeitável de filósofoisso? do amor”.Laila sabe que na terra seu desejo nunca será Majnun não é apenas “o rei do amor”, mas,satisfeito completamente. “Nossa aproxima- solitário no deserto, é também o rei dos animais.ção significa nossa perda.” O amor que a une a Ele e Laila vão, mais que outros, herdar o paraí-Majnun não pode ser preenchido unicamente so perdido bem como os animais sobre os quaispela união de seus corpos. Qualquer tentativa reina Majnun. “Surpreendemo-nos grandementedesse tipo é contrária “à religião do amor”. Esse que Majnun nunca foi ameaçado pelos animaistermo de religar (religio em latim quer dizer cujo campo de caça é a estepe e o deserto”.ligação) significa que Laila está consciente de Gradualmente os animais habituam-se a ele eque seu desejo de amor refere-se ao seu desejo são atraídos por ele. Eles o sentem de longe ede alcançar o absoluto da origem. E a religião chegam voando, correndo, galopando, rastejan-do amor é, em verdade, a realização da promessa do, e os círculos que fazem em redor dele ficamdos bem-amados: dever unir-se para sempre ao cada vez menores. Há animais de todas as espé-amor original. cies e tamanhos. E, oh milagre, não se devoram uns aos outros, perdem o medo um dos outros,MAJNUN, O FILÓSOFO DO AMOR Se conside- e terminam por ter confiança uns nos outros.rarmos que o amor de Majnun é uma paixão Parecem mesmo ter esquecido sua voracidade ehumana, então julgamo-lo excessivo, desmedido. adquirido entre si maior familiaridade… Con-Se considerarmos que é o símbolo de um desejo seqüentemente, Majnun tornou-se seu rei, dasuperior, então ele é realmente amor. Da mes- mesma maneira que Salomão… O lobo já nãoma maneira que o Tao Te King afirma: “Não ter devora “o cordeiro, o leão já não ataca os bur-fé suficiente é não ter fé” podemos dizer: “Um ros selvagens, a leoa aleita jovens gazelas órfãs,amor que não é eterno é apenas um brinque- o chacal superou sua discórdia ancestral com ado para o prazer dos sentidos e passa como a lebre…”.juventude. É apenas ilusão e quimera: não é E, no entanto, aquele que é apenas um deveamor. O tempo passa, mas não o amor. Porque aparecer como dois neste mundo…o incêndio onde ele queima é a eternidade que No jardim, Laila pediu ao amigo que proporcio-não tem nem início nem fim. Nesse sentido, nou esse encontro, o único de todos esses anos,12 pentagrama 1/2009
que solicitasse a Majnun que escrevesse algunsversos para ela:“Aqui, o que não é senão um parece dois,que não podem se unir para fazer senão um.Nenhum caminho une perfeitamente dois corpos;somente uma alma pode se fundir em outra alma.Meu coração é eterno porque te ama a morte está onde tu não estás.Se estás perto de mim, sou inteiro,porque tu és minha parte da vida eterna...”No poema para Laila lemos que a dualidade é acaracterística de nossa vida. Na terra, aqui embaixo,a unidade original do homem e da mulher já nãoexiste, ela já não é possível e se transformou emdualidade… Contudo, há o desejo pela unidadeoriginal. A vida na terra é determinada pela buscada unidade com nossa outra “metade”, irrealizávelpelo ser humano. Porque “Somente uma alma podese fundir em outra alma”.No entanto, diz Majnun, há algo que cura essesofrimento. É o coração apaixonado, embora eleseja apenas a roupagem que esconde a história deamor eterno. É isso que torna a história de Lailae Majnun uma história de amor especial. Porqueé uma história baseada na alma e no espírito. SeMajnun escreve “a morte está onde tu não estás”,não quer dizer que ele, Majnun, morrerá se estiversem sua amada. Ele lembra que a vida pode ser realquando tocada pelo Espírito. Se o Espírito não estápresente, então “a morte está onde tu (o Espírito)não estás”.E o verso “Se estás perto de mim, sou inteiro, histórias de amor da terra e do céu 13
“Quem pode curar-me? Tornei-me um faz parte da vida eterna. Essa lembrança da eterni-exilado. Onde estão minha família e dade está em nós como uma tristeza permanente,minha casa? latente, e no caso mais favorável, é o estímulo queNão há nenhum caminho que me leve e nos impele à procura de sua causa e ao caminhonenhum caminho que leve ao meu amor. de cura. As maneiras de aliviar esse sofrimento sãoO meu nome e a minha reputação estão muito diferentes. Uma delas é a busca pelo amorperdidos como o vidro que se quebra ao humano ideal.cair sobre a rocha. O tambor que me Compreendemos, por conseguinte, por que astransmitia boas notícias está destruído e histórias de amor que não têm um final feliza única coisa que meus ouvidos enten- tocam-nos tanto. Ainda que se escreva sobre a uniãodem é o duro golpe da separação. humana “normal”, o fracasso toca nossa alma muitoAndo a procura do meu amor como um profundamente. Reconhecemos nesse amor infelizescravo. Ela acaricia minha alma. a impossibilidade do amor ideal entre o homem eSe mandar me embriagar, faço-o. a mulher. Sabemos que é impossível, mas queremosSe me pedir que fique louco, ficarei.” continuamente tentar outra vez. E como nosso desejo pelo amor imutável perma-Nizami. Laila e Majnun. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2002. nece insaciado, encontramos por toda parte histó- rias de amor que terminam bem. Isso nos consolaporque tu és minha parte da vida eterna” sublinha durante algumas horas. Entretanto, nossa fomeo que foi dito anteriormente: o princípio do amor não é saciada. As histórias de amor que terminameterno e imutável é descrito também sob o aspecto bem podem ter um valor literário tão sutil comoda rosa-do-coração ou a flor-de-lótus que floresce. os romances de Jane Austen* ou as histórias deEles amam uma parte da vida eterna ou, na lingua- amor triviais. Essas duas formas de literatura podemgem da Rosacruz, uma centelha da luz eterna, uma aliviar temporariamente o desejo pelo amor perfei-pequena parte da eternidade que levamos em nós. to, o qual não é, no entanto, possível neste mundo. A força de atração de todas as novelas da televisãoUMA HISTÓRIA DE AMOR QUE ACABA MAL? A vem daí.impossibilidade do amor ideal nas condições da Podemos ainda aprender algo mais da história dedualidade sublinha a separação dos sexos. Majnun Laila e Majnun. É a história da alma e do Espíri-mostra claramente em seu poema que a lembrança to que não podem nem exprimir-se nem unir-seda unidade original persiste. O princípio do amor nesta natureza. É por isso que Laila diz: “Se me aproximo do fogo, serei inteiramente consumida”. Laila percebe que, do modo como ela é, não pode aproximar-se do fogo. Para isso, a alma natural deve14 pentagrama 1/2009
transformar-se. O Espírito não pode encontrar Deus. E tornar-me o que ele é: um clarão no clarão,senão uma alma preparada para ele. uma palavra na palavra, um Deus em Deus” µTRANSFORMAÇÃO DA ALMA HUMANA O homeme a mulher têm de se preparar para tarefas variadas,e eles também estão equipados de forma diferente.É necessário que esse caminho leve da dualidade àunidade. Poder-se-ia dizer que esse caminho deveconduzir para fora da polaridade, o que levaria auma verdadeira transformação, a uma transfiguração.“Se eu me aproximar demais do fogo, serei consumidapor inteiro”O estímulo que causa o movimento e a transfor- * Jane Austen (16 de dezembro demação faz superar a polaridade ou separação, que éo resultado da queda. São justamente as mudanças 1775 - 28 de julho de 1817) foi umaque se repetem, a alternância de felicidade e desgra- escritora inglesa proeminente, con-ça, vida e morte, que desperta o desejo de transcen- siderada por alguns como a segundader a separação. figura mais importante da literatura inglesa depois de Shakespeare. SeusO BOM FIM No plano humano, o fogo e a água romances mais conhecidos no Bra-são opostos. O Espírito e a alma natural não po- sil são Sense and Sensibility (Razãodem unir-se uma vez que não há evolução da alma e Sensibilidade) (1811) e Pride andnatural, a fim de que ela possa aproximar-se do fogo Prejudice (Orgulho e preconceito)sem ser consumida. (1813), que foram transformadosAngelus Silesius fala assim do objetivo a alcançar: a em filme.formação da unidade com base na dualidade:“Se quero encontrar o último fim e o primeiro co- Fonte:meço então devo estabelecer Deus em mim e eu em Nizami. Laila e Majnun. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 2002. Silesius,A. O peregrino querubínico. São Paulo: Paulus, 1996. histórias de amor da terra e do céu 15
R omano está na frente do mar e olha o horizonte longínquo no ponto onde o céu e o mar confundem-se. Há uma semana ele faz isso todas as noites. Hoje está ventando, e as ondas estão es- pumosas. A apreensão interna que co- nhece desde a infância aumentou nessa última semana e continua para ele uma companheira presente, em especial quando grandes mudanças preparam-se. Esta noite é muito diferente. Sente-se olhado, observado. Sua atenção é chamada continuamente por um senhor que olha o mar e está sentado não muito distante dele. De repente, sente que seus pen- samentos juntam-se aos dele. Tem consciência de que seus pensamentos parecem voar ao vento num desejo infinito por liberdade. Então, tudo fica calmo e silencioso ao seu redor. Seus pensa- mentos desaparecem no horizonte e perdem-se no nada. UMA DANÇA CÓSMICA Romano já não sabe quanto tempo ficou ali sentado e acorda de seus pensamentos de sobressalto quando o velho encontra-se de repente ao seu lado. “Como as ondas, esta noite, estão bonitas! Venho freqüen- temente sentar-me aqui e pergunto-me de onde elas vêm.” O velho senta-se ao lado dele e con- templa o mar. Essa reflexão inesperada faz nascer nele um afluxo de imagens; como se portas do seu passado, ainda fechadas há alguns segundos,16 pentagrama 1/2009
a ponte de fogo eágua em direção à luzA história do velho e do mar, das forças originais,dos éons e da luz insondávelse abrissem de sopetão. Ele submerge em lem- o horizonte. Romano senta-se e olha na mesmabranças. Logo vagueiam em seu cérebro certas direção. Seus pensamentos se entrelaçam outra veznoções científicas. Ondas agitam-se. Ele reconhe- de maneira estranha e perdem-se no horizonte.ce os movimentos que sobem e descem das ondas Ele observa o mar e o movimento das ondas espu-da sua própria vida. No momento seguinte ele mantes. Ele olha o sol aproximar-se do horizonte.se encontra no cosmo e percebe o movimento De repente, abre-se para ele o panorama da véspe-ondulatório de cada átomo. Grupos de átomos ra. Ele vê o espetáculo das forças da natureza, commovem-se ao mesmo ritmo. Ele aproxima-se do a dança das formas em constante mutação, cujoponto onde as forças cósmicas subjacentes a toda tema é a matéria. É como se elas criassem espaçosa criação cósmica se separam. É lá que se dividem para a manifestação das formas. A transformaçãoas duas forças originais, que ele vê sob a forma de das formas ocorre sem cessar enquanto o tempoágua e fogo. O fogo põe em movimento perpétuo passa.a substância atômica e não cessa de criar novas O tempo está excepcionalmente bom hoje. Aformas. A água é a substância disponível para as estreita linha do horizonte é claramente visível.novas formas que afluem. À medida que Romano Lentamente, ela alarga-se. Há uma estreita li-segue o movimento, o fogo e a água separam-se, nha que cerca e contorna todas as forças dessee o movimento ondulatório alivia-se comple- espetáculo. É a linha divisória entre o início datamente. Eles não sabem quanto tempo perma- energia sutil, acima do horizonte, e a energianeceram um perto do outro sem sequer trocar mais grosseira, abaixo, uma separação entre o céuuma única palavra. Então o velho diz: “Chegou e a terra. Romano sente-se transportado para oa hora”. Lança um olhar para Romano e vai-se. horizonte e ligado a luminosas linhas de força que,Perdido em seus pensamentos, Romano volta pra como faixas brilhantes, o conectam às energiascasa. No dia seguinte, organiza-se para terminar que aparecem acima e abaixo do horizonte. Eleo mais depressa possível suas atividades e volta percebe que centenas dessas faixas envolvem-nomais uma vez à praia. O velho está lá, como era de numa roda que gira continuamente num sentidoesperar. Romano lança-lhe um olhar questiona- ou no outro, no espaço e no tempo. Ele vê comodor. Aquilo que experimentara na véspera não o essas faixas mantêm-no e dirigem-no durante suadeixou, como uma música de fundo que ressoa o vida. Elas terminam em doze grandes concen-dia todo. O “mar” de impressões, visões e imagens trações de energia que, em espirais, se juntam nado passado provoca mais e mais novas lembranças. forma de uma imensa roda giratória. Ele relembraSó agora é que ele percebe as profundas rugas no todos os homens que observou durante o dia,rosto do velho. Cada uma delas conta sua própria vendo-os como marionetes, pendurados nessashistória. Seus olhos contemplam tranquilamente faixas. O cenário altera-se. Aparece então uma a ponte de fogo e água em direção à luz 17
Havia ainda uma questãoenorme entidade que dirige essa concentração de entanto, Romano sente que todos os outros seresdoze energias. Essa potência, composta de fogo e estão sob seu domínio.água, é a violenta força elementar que preenche ocosmo inteiro. Ela mistura essas energias para criar, O regente volta-se para Romano e abre os olhos,de maneira sempre diferente, inúmeras formas nas que são como duas grandes rodas de fogo. Nodoze concentrações de energia. Sem cessar ela mesmo instante Romano sente o fogo em todoenvia uma corrente de pensamentos revestidos de o seu ser. Ele se sente queimar. Ele tenta desviarfogo e extrai novas possibilidades para a água. Sur- sua atenção para outra coisa, mas está fascinado egem formas complexas que vivem mais ou menos preso. Romano sente as possibilidades ilimitadasmuito tempo.Tudo se move através do espaço e que estão ligadas a essa entidade, cujo poder e cujado tempo. Romano começa a se perguntar o que liberdade o fascinam. Cada fibra de seu ser dese-confere a essa entidade o poder de governar. Ela é ja apenas ligar-se com esse poder. “Sou o senhorcomposta da energia do mundo que governa e, no teu Deus, não há outros deuses além de mim.”18 pentagrama 1/2009
que ocupava seu pensamento: “quem é esse velho que, toda noite, lhe faz companhia?”Essa potência, “o príncipe deste mundo”, lança percebida na noite anterior teme o desejo queesse chamado de maneira incessante, e todos a ela emergiu em seu coração.obedecem porque tudo vem dela. E então ele corre o mais depressa possível para a praia. Não há vento, e o mar está plano como umDOIS FOGOS Ao voltar para casa, sua apreensão espelho. Ele nota que o velho já está sentado lá, enão cessa. Nesse meio tempo, o velho partiu. Logo isso alivia-o. Dirige-se direto até ele. Cumprimen-as imagens daquela noite começam a se apagar tam-se e trocam algumas palavras sem interesse.progressivamente. Ele retorna a seu mundo sem Em dado momento, o velho vira-se e olha o mar.perder o contato com a experiência que teve. Romano, sentado perto dele, é preenchido porHá ainda outra pergunta que gira em seu espí- um sentimento pleno de grande certeza.rito: quem é esse velho que, toda noite, lhe faz Cada imagem que pousa na superfície da águacompanhia, vem sentar-se perto dele e não diz reflete-se sem alteração. Parece que a atmosferauma palavra durante toda a noite? Ele fica ainda perfeitamente tranqüila, pura e neutra da águamuito tempo acordado olhando o céu noturno transmite-se para dentro dele. A imagem da noitepela janela do sótão. Ele aguarda ansiosamente a anterior aparece-lhe outra vez.Todas as linhaspróxima noite para voltar à praia. Durante todo energéticas reúnem-se agora no potente “prín-o dia tem a impressão de que se impõem a ele os cipe deste mundo”. Ele plaina acima da água, esentimentos e experiências vividas; chama isso de dele emana uma corrente mental incessante que“luta entre luz e trevas”: é a expressão que melhor influencia a água, um mar de possibilidades ilimi-ilustra esses acontecimentos. Incessantemente gira tadas e de trevas infinitas.em sua cabeça a frase:“Sou o senhor teu Deus,não há outros deuses além de mim”. Parece que Romano concentra-se na paz silenciosa que o ha-um sombrio abismo se abriu diante dele. Sempre bita interiormente, e, naquele momento, reconhe-que corre o risco de cair nesse abismo, Roma- ce uma nova forma, uma forma constituída uni-no sente que uma segunda força, uma profunda camente de luz, uma luz indescritível que evocaaspiração, protege-o de entregar-se a essa potente nele harmonia e paz. Não há espaço que não sejaatração. Um desejo arde em seu coração, mais for- penetrado por essa luz. Mas o potente “príncipete que todas as forças deste mundo. Ele torna-se deste mundo” não a vê, embora ela o envolva econsciente de que, nas trevas, a força do abismo e penetre. Então, Romano tem certeza de que o sera força do que se intitula “príncipe deste mundo” de luz sustenta-o como uma mãe e dá-lhe a forçaprovêm da mesma fonte, enquanto a luz em seu para manter-se acima de tudo o que pertence acoração é algo completamente diferente. Ele tem este mundo. O ser de luz parece lançar um véu demesmo a impressão de que a poderosa entidade sombra sobre “o príncipe deste mundo”. Embora a ponte de fogo e água em direção à luz 19
a sombra seja sutil, isso o enraivece e gera tumul- assiste tudo que acontece a seu redor como umto em sua criação. Sem cessar ele fita Romano, filme projetado sobre uma tela. De seu coraçãoque sente que o fogo desses olhos é apenas uma emana uma paz indescritível. Ele sente que jádeformação, uma alteração do fogo verdadeiro não terá nada a fazer nesse filme. É como se fosseque anima o ser de luz. Romano observa a ação eliminado.direta da luz, o desejo que queima em seu coração Essa luz é mais imensa e mais potente que todasalivia-o. Ele está consciente do conflito que se das quais se tornou consciente. É um mundo semdesenvolve em seu interior. Essas duas forças con- conflito, angústia, obscuridade, que está presentetinuam em luta. Uma quer dominá-lo, enquanto a por toda parte, mas que ninguém percebe. Esseluz original espera o momento em que sua força ser luminoso é o Deus dos deuses, mais potentevai ligar-se totalmente a ele. que todas as potências, e absolutamente invisível no meio de todo o visível. Romano é toma-MAIS POTENTE QUE TODOS OS DEUSES em do por uma vertigem. Ele deve assimilar todasseu primeiro dia livre após todos esses aconteci- as impressões sem se perder no inimaginávelmentos, Romano decide ir ao parque. É um dos “nada”. Voltando a si mesmo, vê inscrever-se noprimeiros dias ensolarados da primavera, e está espaço ainda uma pergunta: “Há uma porta quecheio de gente. Ele não presta realmente atenção liga o inimaginável ao imaginável?”às pessoas porque está ainda influenciado pelas O ser que o toca em seu interior mais profun-impressões anteriores. O ser de luz contatou-o do perturba o mundo. Romano sempre haviainteriormente de forma completamente diferente acreditado que a criação tivesse acontecido comoe nova. Ele não pode acreditar que esse ser lumi- descreve a Bíblia no Livro do Gênesis, e quenoso aja sobre o todo sem que o percebamos. Ele começara com o Espírito plainando sobre a su-percebe as ondas luminosas e também inúmeras perfície das águas. Agora reconhece com alegriapessoas que parecem não ser de modo algum que há uma criação inimaginável, sempre nova,perturbadas por elas. Tem a impressão de ter se sempre criadora, que sempre existiu e trabalhoutornado alguém a quem foi confiado algo extra- e que abarca a criação de acordo com o Gênesis.ordinário. É como se ele tivesse o conhecimento Ele toma consciência do que é inimaginável edo mundo inteiro e, no entanto, nenhuma das pode perceber, por uma janela, outro mundo.pessoas que o conhecem percebe o que o preen- Ora, onde há uma janela, deve haver uma porta,che. Ele volta seu pensamento para o ser de luz. e onde há uma porta, deve haver um caminho.Seu ambiente altera-se então diretamente. Ele Então, ao refletir, dirige-se para a praia.20 pentagrama 1/2009
A ÁGUA LUMINOSA Ele sente-se libertado de muito distante dele ou se atravessa diretamenteum grande peso vendo o velho sentado nas du- o seu corpo. A porta encontra-se no horizontenas. Hoje, ele quer falar-lhe. Senta-se perto dele ou em seu coração?e espera que ele se volte. Então, diz-lhe: “Pelas Mais uma vez sua visão altera-se. Ele está noexperiências destes últimos dias, sinto como se horizonte. Ele atravessa o portal e chega a umestivesse em um cinema. Olhando a tela, vejo espaço desconhecido com muitas portas. Noum filme do qual já não participo. Quando centro, coberta por uma elevada cúpula, estáme viro, vejo apenas escuridão e uma pequena uma fonte. Na verdade, esse espaço deveria serlente de onde tudo parece sair. Estou sentado sombrio, não há nada para iluminá-lo. A úni-num vazio inimaginável, onde nada avança nem ca luz que ele vê não tem um ponto focal, masrecua. Estou num cinema e percebo-me cercado tudo lá é feito de luz. A luz mais forte provémpor algo intangível”. da fonte que está ao meio. Os jatos de águaO velho assente como se o compreendesse: parecem ser feitos de água luminosa. Ele sente“Essa situação é chamada o fim do mundo. No que a água luminosa enriquece-o interiormentemomento em que você vê isso claramente, sabe e atua em sua cabeça.que aí está um novo começo. Todas as pesso- Ele anda ao redor da fonte, que se transforma aas, neste mundo, andam sobre uma esfera, mas cada passo. Num lugar, ele vê um jato de águauma esfera não tem nem início nem fim. Você que surge do meio, em seguida se torna dois,chegou ao ponto no qual vê a esfera da parte três, sete, e sete vezes sete, e sete vezes sete infi-externa”. “Posso facilmente imaginar o que nitamente. Ele dá várias voltas ao redor da fontevocê está me dizendo! Porque faço precisamente para impregnar-se cada vez mais do espetáculoa ligação entre o imaginável e o inimaginável; vivo e sempre diferente dos jatos de água.o poderoso ‘príncipe deste mundo’ também está Enfim, ele aproxima-se da fonte e percor-em condição de fazê-la? Por que eu posso fazê- re com os olhos a bandeja que recebe a água.la?” “Romano, você pode fazê-la porque é um Atrás dele, o glorioso portal pelo qual já nãohomem.” O velho vira-se outra vez para o ho- será necessário passar e tudo que está unido arizonte, e Romano compreende que a conversa seu passado se perdem nas profundidades daacabou. Romano olha também o mar e procura luz. Seu primeiro pensamento atinge a calmaa fina linha que separa o céu e a terra. Naquele superfície da água, forma uma onda, e comoinstante, forma-se no horizonte uma porta, um resultado surge a forma de um ser. Seu primeiroportal. Ele não pode dizer se o horizonte está pensamento vive µ a ponte de fogo e água em direção à luz 21
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filho do fogoO homem possui no coração um princípio ígneo, assinatura indelével de seuestado divino de outrora. Como “Filho do Fogo”, o homem original estavaligado ao Espírito. Até hoje permanece nele uma lembrança de sua relaçãocom o fogo.Ofogo sempre exerceu grande fascinação A DESCOBERTA DO FOGO A história da humani- sobre o homem. Não há criança ou adul- dade, no nosso mundo conhecido, está estreitamente to que, diante do espetáculo de um fogo ligada à natureza do fogo. Há aproximadamente umcrepitante, não se deixe levar pelo devaneio ou milhão e meio de anos os primeiros homens apren-pela meditação; e assim que as labaredas devoram a deram a fazer fogo e a servir-se dele, o que inau-madeira, realizando seu trabalho destruidor, que as gurou um novo período da civilização. O fogo deufagulhas volteiam para lá e para cá e um duro pe- ao homem poder sobre a natureza. Ele o utilizavadaço de madeira parece aniquilar-se, o espectador para afastar animais selvagens, cozinhar suas refei-é testemunha de um processo irreversível. O que ções e ter à sua disposição luz e calor. Mais tardeaté agora lhe havia parecido ser bem real, sólido ele aprendeu a abusar do fogo para subjugar outrose robusto desaparece sob a forma de um clarão homens – inventando todo tipo de armas de fogoluminoso e de um forte calor. O amontoado de para destruir e causar morte. Ele acabou por apren-cinzas que resta perdeu todas as características da der a liberar o fogo atômico confinado na matériamadeira. para ganhar mais energia e também para destruirO fogo mudou a natureza própria da lenha. Ele e causar mortes. O fogo atômico é a energia ígneareduziu a substância orgânica a pura energia, mais íntima da matéria – no sentido espiritual, é oseparando a matéria da substância etérica, o que fogo que jorra das trevas, o fogo infernal da nature-estava vivo do morto, o alterável do inalterável. O za mortal.que morreu ficou em cinzas, e o calor transmutouo restante em um estado completamente diferente O FOGO MÁGICO O fogo, desde a aurora dos tem-que nós sequer podemos imaginar. Não podemos pos, tem também um significado mágico. Um mitoencontrar o que constituía a essência da madeira grego conta como o titã Prometeu deu aos homensna atmosfera. Onde ela está? Nós já não a encon- o dom do fogo. Ele o roubou de Zeus, o pai dostramos. deuses, que ficou tão irritado por ter perdido umÉ isso o que nos fascina no fogo: ele nos mostra bem tão valioso que acorrentou Prometeu ao topocomo a matéria se transforma em energia. Ele nos de uma montanha, e todo dia uma águia vinhadá a imagem daquilo que deve acontecer conosco: devorar-lhe o fígado. Mas Prometeu é imortal. Elenosso estado momentâneo deve ser absorvido por é também um símbolo do fogo do pensamento.uma realidade totalmente diferente, onde, de fato, Não era somente na Grécia que circulavam lendasnossa personalidade terrestre inteira desaparece por sobre o fogo e a veneração com que os homens ocompleto. O fogo opera uma mudança de estado cercavam. O fogo aparecia sempre ligado ao mundodefinitivo, que os herméticos designam por “trans- divino, motivo pelo qual as lendas tratavam às vezesfiguração”. É por isso que se diz: “Deus é um fogo de um roubo do fogo pelo homem, às vezes de umdevorador”. dom outorgado ao homem. filho do fogo 23
Nos antigos textos dos Vedas, o fogo elétrico é chamado“pavaka” ou “o purificador”O fogo era guardado e protegido em determinado “inteiramente fogo e chama” quando amamos; e selugar. Mais tarde, ele foi aceso nos templos e era nos “inflamamos de cólera” podemos assim alimen-mantido pelos sacerdotes. Oferendas eram feitas ao tar “o fogo do ódio”. No plano astral, no domíniofogo, que eram queimadas, pois acreditava-se que dos sentimentos, um fogo poderoso chameja arden-os deuses eram alimentados pela fumaça que subia. temente no sangue, o que torna as coisas cada vezAinda hoje há rituais em que se acendem velas e se mais difíceis, porque freqüentemente é impossívelqueimam essências aromáticas para fazer penetrar impedir que ele nos impulsione a propósitos e gestosna atmosfera energias que, de outra forma, ficariam impensados que podem causar ferimentos canden-escondidas pelo véu da matéria grosseira. O fogo tes em outros. O fogo das paixões inflama o sangue,purifica a atmosfera, e mediante seu calor, eleva sua “cozinha-o” literalmente, e sucumbimos a ele, esgo-vibração, tornando-a mais receptiva. tados.Todos esses fogos consomem nossa força vitalPara Hermes Trismegisto, o fogo é “o mais rápi- até esgotar nossas reservas de energia. Então a almado de todos os elementos”. De fato, hoje sabemos natural, o princípio astral de nossa natureza comum,pela teoria mecânica do calor que uma elevação da deixa o corpo e se volatiliza com o correr do tempo.temperatura de uma substância causa o aumentoda velocidade média de agitação de suas moléculas. O FOGO DOMINADOR Uma coisa é certa: o serVocê já viu uma miragem num dia de verão muito humano não é mestre desses fogos; ao contrário,quente? Trata-se também de uma ação do fogo sobre são os fogos materiais e astrais que o dominam ea atmosfera, cujas vibrações se aceleram devido à o pressionam. Um fogo ardente habita tambémtemperatura elevada. nos átomos. Os cientistas atômicos encarregam-se sempre de tornar o fogo atômico “utilizável”, e isso àO FOGO NO CORPO FÍSICO Ao estudarmos o fogo custa de inumeráveis problemas que, por sua vez, sãoexterior, tornamo-nos cada vez mais conscientes de insolúveis.A energia radioativa liberada pela fissãoque nossa existência está condicionada pelo fogo. O atômica e a vida são, no final, inconciliáveis.calor do sangue, os processos metabólicos e a própriavida dependem de sua atividade. É o fogo da matéria O FOGO ELÉTRICO O pensamento do homemque mantém nosso corpo vivo no mundo material também está fundamentado em processos de natu-até o momento em que a morte apaga a flama. Ele reza ígnea. No cérebro há inúmeras vias e neurôniosqueima na coluna vertebral do homem material sob ligados por sinapses entre os quais se descarregama forma do “fogo serpentino” e dos centros de ener- impulsos elétricos. O pensamento, do ponto de vistagia chamados chacras. material, é um processo elétrico, e a eletricidade é uma forma de fogo. Uma única faísca elétrica é sufi-O FOGO ASTRAL A própria vida de sentimentos ciente para desencadear um processo de combustão.é comparável a um processo de combustão. Somos E todos já puderam observar uma tempestade em24 pentagrama 1/2009
que enormes forças elétricas se descarregam entre o crianças da carne. Nesta vida, o nascimento divinocéu e a terra, cargas capazes de por fogo em árvores triunfante em nós só dura o tempo de um lampejo,e casas. Nos textos antigos dos Vedas, o fogo elétrico motivo pelo qual nosso conhecimento é fragmen-é chamado “Pavaka” ou “purificador”. tado, ao passo que em Deus o lampejo é sempreA eletricidade é a forma mais elevada do fogo na permanente, imutável e eterno”.natureza. É também uma representação do fogo do Esse princípio de fogo que aparece por lampejos eEspírito de Deus, que o homem não saberia supor- reside no coração exige de nós uma mudança pro-tar nem mesmo por uma fração de segundo. O que funda. Ele quer que entreguemos nosso ser mortalaconteceria se um ser humano tivesse que defrontar- para podermos atrair o ser imortal; quer que dirija-se com o Espírito de Deus? Ele seria consumido mos nossa vida para a luz do Espírito, que não estácomo em um clarão. em sua casa no mundo material e quer voltar para o mundo da imortalidade. Ele deseja que toda nossaO FOGO DO ESPÍRITO NO HOMEM Entretanto, o atenção seja dedicada à luz que emana do mundo dosistema humano dispõe de um meio para receber e Espírito para nos atrair.reter o fogo do Espírito, pois existem muitos tiposde fogo que não têm nenhuma relação com o fogo O FOGO DE CRISTO Esse desejo – o desejo peloda natureza mortal. Por que os seres humanos são Espírito – é a forma mais elevada de ardente aspira-fascinados pelo fogo desde tempos imemoriais? Por ção que podemos experimentar nesta vida. Se ofe-que eles o adoram e tentam penetrar seu mistério? E recemos espaço a esse ardente desejo, aparece entãopor que, por outro lado, o fogo infernal da matéria a forma da nova alma, a alma imortal, cuja qualidadeatormenta-os tão fortemente que eles estão mer- assemelha-se à do fogo do sol. Esse fogo confere luzgulhados na paixão, no ódio e na violência? Porque e vida a tudo que vive. Ele é a encarnação do amorem sua essência o núcleo íntimo do ser humano é universal, também chamado Cristo, o espírito solar.um princípio do fogo que não se origina do mundomortal. O fogo espiritual de outra e mais elevada A ÚLTIMA METAMORFOSE A alma nova, cujaforma de existência está escondido no íntimo de própria essência é o amor, é enfim reconhecida pornosso ser, que é, por fim, a força que nunca nos deixa seu “noivo alquímico”, o Espírito do ser original.descansar neste mundo. O homem divino original é Seu fogo elétrico liga-se à alma, como um lampejo,um “filho do fogo”. pelo fogo serpentino da coluna vertebral, para umaJacob Boehme compara a um lampejo o fogo do última metamorfose - a transfiguração definitiva,Espírito em seu livro Aurora nascente:“Agora, observe irreversível. Essa última metamorfose não deixabem: quando o lampejo nasce no centro, o nasci- cinza alguma. É dito que o túmulo de cada grandemento divino está em plena realização. Em Deus é iniciado foi encontrado vazio, ou que eles desapare-sempre e eternamente assim, mas não em nós, pobres ceram de maneira inexplicável µ filho do fogo 25
fogo, água, amorAtualmente, os astrofísicos observam no universo a existência de temperaturasextremas: calores elevados ao lado de frios inimagináveis. O elemento fogo écentrífugo, o frio é centrípeto. Pelo fogo, o universo está em expansão, pelo frioele está em contração. O frio provoca a petrificação, a cristalização. São as duasforças gêmeas que atuam em nosso campo de vida.OAMOR Viver significa pensar, sentir, A doutrina universal explica que o sistema huma- desejar, querer, esperar, alegrar-se, sofrer, no é composto de quatro corpos diferentemente experimentar dor. A vida resume-se a polarizados: dois desses corpos são emissores, irra-buscar o amor e a experimentá-lo. O amor é a diadores, e dois são receptivos. Para os dois sexos,força que cria uma ligação entre dois seres, uma positivo quer dizer dinamizador, criativo e fecun-relação entre um homem e uma mulher. Mas ele é do; e negativo quer dizer receptivo e revelador.também muito mais do que isso. É a força superiorà fé e à esperança. É uma energia universal e divina A POLARIZAÇÃO DA MULHER Onde se situa, naque faz a ligação entre dois pólos opostos, reúne- mulher, a polaridade positiva, irradiadora e criati-os e impulsiona-os. O amor é a força central à va? Em quê ela representa o pólo negativo, recep-qual todos os seres são religados individualmente e tor e realizador? A polarização negativa concernepela qual são tocados e guiados durante a vida. Ele a seu corpo físico, como mostra o fato de ela dar àestimula a vida física dos seres e os leva a entrar luz uma criança. Encontra-se também em seu cor-em relação com um nível superior do ser. Essa po astral, que a dota de grande receptividade aosforça vai do mais baixo até o mais alto. Ela inicia sentimentos, impulsos sensoriais e influências as-no corpo do homem e, através da alma, conduz ao trais, enquanto o homem é mais calmo e adminis-espírito e à união com Deus. trador no vasto domínio dos sentimentos humanos. A mulher pode emitir potentes impulsos mentaisA VIDA ENTRE QUENTE E FRIO A vida terrestre que são recebidos e levados à realização pelo ho-resulta de dois centros de força: positivo, quente, mem. O corpo etérico (ou corpo vital) femininofogoso de um lado; negativo, frio, aquoso do outro. tem uma polarização positiva, ele é, portanto, dina-Observamos um campo de tensão entre os dois mizador e energizador. A mulher exerce influênciapólos, entre o feminino, receptor, e o masculino, na esfera vital, ela estrutura o espaço, cria a energiacriador. A vida é experimentada nessa dinâmica. da qual se beneficiam as pessoas à sua volta.De um lado, a energia criadora manifesta-se pelaação; de outro, a receptividade gera a inspiração A POLARIZAÇÃO DO HOMEM O que é irradiadorà calma e à contemplação. A vida situa-se numa no homem ? Em quê ele é receptivo e realizador?linha horizontal e traz a cada extremidade uma Seu corpo físico está polarizado positivamente: eledas duas forças. Isso significa uma ligação material cria, atesta e emite; ele é dinâmico e produz força.com a terra por meio do corpo físico. Fisicamen- Seu corpo astral (ou corpo de desejos) tem tam-te, somos divididos em raças e separados em dois bém uma polarização positiva. Ele emite com maissexos. Mas em nós acontecem processos onde os facilidade os desejos e sentimentos do que é capazdois aspectos, o positivo e o negativo, estão ativos. de recebê-los. Seu corpo etérico está polarizado26 pentagrama 1/2009
fogo, água, amor 27
Como são unidos os dois sexos? Cada entre os dois pólos, em todos os níveisnegativamente do mesmo modo que sua mente,aberta às influências e apta a captar idéias.A COMBINAÇÃO Nesse jogo de forças opostas, campo de vida material. Criação e recepção, novemos a correspondência entre os dois sexos. plano de vida físico, são o reflexo do processoSua influência recíproca funciona sobretudo no que se efetua no corpo, na alma e no espíri-plano atmosférico. Cada um está submetido a to. Esses três níveis de manifestação devemessas correlações, a essas ligações, individual e sustentar-se mútua e conscientemente. Corpo,coletivamente. Dar e receber. Tudo está ligado alma e espírito conhecem, cada um, sua própriaa tudo. Um intercâmbio intenso das energias manifestação, apesar de uma estreita ligaçãoentre os dois pólos acontece em todos os ní- e de trocas intensas entre si. Eles não existemveis; uma poderosa concentração de forças emforma de esfera. Esse conjunto, no entanto, nãoé perfeito: ele é como um globo em equilíbrioinstável girando sobre seu eixo ora para a es-querda, ora para a direita, pois falta-lhe a forçade coesão, o fio que retém as pequenas esferascomo as pérolas de um colar. Mesmo se um ho-mem decide, após madura reflexão, experimen-tar uma relação, ele irá sempre sofrer uma falta.Uma inquietação interior, um desequilíbrio,lança a suspeita de que ele continua à procurade uma ligação harmoniosa entre os dois pólos,nos diferentes níveis. A grande força de coe-são é o amor universal que segue o gigantescoplano da criação: essa energia dinâmica, criati-va, latente, começa a se manifestar no coração,o centro de todo o ser, e o processo se iniciapela experiência pessoal física de ser homem oumulher.A CORRENTE DE ENERGIA VERTICAL O iníciodesse contato ocorre no corpo e no tempo do28 pentagrama 1/2009
um sente as “afinidades”, há uma intensa troca de energiauns sem os outros. Podemos representar uma mesmo tempo o receptáculo da força ígnea e alinha de oscilação na qual acontece recepção e matriz do corpo. A personalidade, que é partecriação, dar e receber. Outro sentido do mo- do corpo, utiliza essa energia em colaboraçãovimento torna-se perceptível na ligação com o contínua e permanente.plano terrestre; ele se orienta em direção a algo Espíritocompletamente diferente. No plano superior, Espírito criador – fogoo Espírito é o princípio de fogo que transfere Alma receptiva – águaà alma aberta sua energia criativa. A alma é ao Corpo receptivo – água Corpo criador – fogo Ação A CRUZ E O NASCIMENTO Esses dois movi- mentos formam uma cruz: a haste horizontal do movimento do mundo é cruzada pela haste vertical provinda da energia espiritual. A haste vertical é a efusão do poder Espírito Santo, um poder que se derrama como uma revelação nos níveis de corpo, alma e espírito. Uma pergunta surge: o que faz o homem dessa força? Temos consciência dela, e, se temos, como reagimos a ela? Estamos prontos a erguer a cruz? Nosso ser corresponde à haste horizon- tal; a corrente de amor universal é simbolizada pela haste vertical da cruz. Desenvolvemos uma receptividade à energia elevadíssima que chega até nós? Por não reagirmos a ela, acabamos não nos tornando uma coluna vivente e possuímos somente um resquício de energia sem faculda- de regeneradora. Estamos mergulhados num sono de morte; tocados, é claro, mas inertes. Sem uma consciência receptiva e sem espaço de criação, somos sementes enterradas, com todas as informações do crescimento da planta, mas fogo, água, amor 29
privadas de água e luz, fechadas dentro de umacasca dura. E nada acontece. Quando orienta-mos nossa consciência para a cruz, sua energiatorna-se disponível para nós. Segue-se um atocriador. Mas se, mesmo aí, nada acontece, éporque há uma barreira provocando um super-resfriamento ou um superaquecimento.Surge outra pergunta: o que pode fazer nossapersonalidade? Na nossa forma física, homem emulher, conduzimos esses processos individual-mente. Quer sejamos de um sexo ou de outro, denossa relação com a alma, e por meio dela com oEspírito, nossa personalidade se torna “receptiva”.Nada criamos por nós mesmos. Como pesquisado-res, abandonamos conscientemente nossa fixaçãona forma corporal externa e nos colocamos embusca do princípio supremo do qual recebemos otoque, o qual implica uma missão. O pesquisadordeve transformá-lo no plano físico e exprimi-loem ato tangível. Senão, o contato enfraquece. Oato requerido é sempre o serviço a outros sereshumanos, é fazer algo por seus semelhantes comsabedoria. É apenas mediante a sabedoria que serealiza no tempo o plano da criação, a ação dohomem-alma consciente. Sabemos que o corpoe o tempo têm suas leis próprias; no plano hori-zontal existe a morte, enquanto no plano verticalhá a vida eterna. E quando a alma e o espírito sejuntam e se fundem em nova unidade, o homem-alma-espírito nasce e se engaja na via vertical.O RETORNO Assim como exposto no Gêne-sis, os querubins guardam a entrada do paraí-
Existe um mundo sem conflitos, sem angústia, sem trevas.Ele deve estar presente em todo lugar...so. Adão (o espírito) e Eva (a alma) já não são Fonte: admitidos nesse jardim. A forma que nos resta Rijckenborgh, J. v. A arquignosisdeles, o ser humano, não pode retornar ao egípcia, v.2. São Paulo: Lecto-estado paradisíaco, da mesma forma que não rium Rosicrucianum, 1986.podemos viver numa atmosfera diferente danossa. Juntos, Adão e Eva representam os seres fogo, água, amor 31humanos originais, não submetidos à divisãodos dois pólos, o bem e o mal, o dia e a noiteetc. A fim de encontrar esse estado original,é preciso que nossa alma e sobretudo nossoespírito encontrem outra vez o caminho de suaverdadeira evolução de acordo com sua ori-gem, passando por seu estado presente e pro-jetando seu estado futuro: Cristo, aquele quetem conhecimento do Pai de todas as coisas;Cristo, a nova atmosfera em nós, a ação doamor de Deus em nós. Precisamos reconhecerque Deus age em nós mediante seu amor e nosdá o poder de seguir o caminho de retorno aele. É então que o calor ardente do nosso “eu”egocêntrico cede, e Cristo, o doce fogo acalen-tador da alma, a luz da consolação, se faz sentirem torno de nós: é assim que verdadeiramentese “serve” ao próximo. A força receptiva e aforça criativa uniram-se. Em nós, a força dofogo fez nascer essa nova unidade, “o filho deDeus”. E a criança divina acha abertas as portasda cidade, assim como está escrito no final doApocalipse de João: “E as suas portas não sefecharão de dia, porque ali não haverá noite. Emostrou-me o rio puro da água da vida, clarocomo cristal, que procedia do trono de Deus edo Cordeiro” µ
a artedo ceramista32 pentagrama 1/2009
DESPERTAR DO ESPÍRITO E METAMORFOSE DA ALMAO nascimento da nova alma é um segredo vital, Durante experimentos alquímicos os pes-especialmente entre os alquimistas. Nos sécu- quisadores observaram que mudanças dalos oitavo e nono conhecia-se ainda o significa- matéria eram devidas ao fogo e coinci-do secreto da Alquimia. A ciência da transfor- diam com mudanças essenciais. Observando omação interior era praticada de acordo com as funcionamento do fogo eles obtiveram muitoleis da Alquimia pelos buscadores, que viviam conhecimento sobre as mudanças que ocorriamem retiros. Nos manuscritos antigos a Alquimia em si mesmos. A aplicação desse conhecimentoé comparada muito freqüentemente com os também pode ser observada na refinada arte datextos dos Evangelhos. Alguns deles atestam cerâmica: um pote pode apresentar, medianteque os relatos dos Evangelhos referem-se à reações químicas durante a queima, lindas cores,transformação interior e não a um relato his- que, de modo alquímico, podem ser comparadastórico. E é precisamente isso que os mitos dos às fases de transformação interna.Evangelhos atestam! As histórias dos Evangelhos apresentam três aspectos: 1. o nascimento de João Batista e sua vida 2. o nascimento de Jesus e sua vida 3. o nascimento de Cristo, sua vida, e sua paixão. João batiza pela água. Ele é o último dos profetas e anuncia a vinda “daquele de quem não é digno de desatar as sandálias”. “João” é um termo que significa “água”. Jesus é batizado por João no Jordão. Em seguida o Espírito desce sobre Jesus sob a forma de uma pomba e batiza-o pelo fogo: nesse momento Cristo se liga ao homem Jesus. Os apóstolos são batizados pelo fogo no dia de Pentecostes e adquirem o poder “de falar em línguas”. Cristo é aquele que é batizado pelo óleo, ou pelo fogo. A arte do ceramista começa pela escolha de uma argila pura. Em seguida, ele mistura a argila com água para umedecê-la e torná-la maleável. Da a arte do ceramista 33
porção de barro molhado colocada sobre a base por diversos caminhos. A argila da personalida-giratória ele forma um vaso. O vaso de argila de gradualmente é afastada do seu solo terres-é o símbolo do homem natural, como a Bíblia tre. O ceramista escolheu-a e extraiu-a do solomostra abundantemente. A terra do vaso pode com cuidado. Em seguida, vem o momento emconter ouro: o vaso então será dedicado a um que a argila é misturada com água e torna-seuso sagrado. Os vasos sagrados são cozidos de úmida. Esse momento representa o primeiromaneira especial, e as sete cores irradiadas pelo contato com um ensinamento espiritual. Mui-ouro e metais nobres aparecem em sua superfí- to na vida do buscador é posto de cabeça paracie. Os vasos sagrados são então postos em honra baixo, todos os valores são perturbados. Surgemde Deus no templo. Deus é comparado aqui com relações completamente novas com as coisas eum ceramista. O ceramista não conhece o resul- as pessoas, uma experiência da qual ele se re-tado da ação alquímica do fogo, mas, como bom cordará por toda a vida. O buscador que acei-artesão, de antemão sabe como o vaso que fabri- ta essa reviravolta e que ainda não está muitoca será utilizado. A argila dos vasos destinados a cristalizado redescobre uma nova juventude, umhonrar Deus é escolhida com cuidado e pode-se novo entusiasmo, um novo objetivo na vida. EleDe nossa relação com a alma e por meio dela com oEspírito nossa personalidade se torna “receptiva”. Nadacriamos por nós mesmosdizer que um buscador que se aproxima de uma empreende um caminho espiritual, na prática daescola espiritual não é um ser comum, mas uma doutrina: a argila tornada maleável é posta sobrepersonalidade “escolhida com cuidado”. a base giratória. Essa doutrina, em todo caso, emana sempre deUm caminho apresenta-se a quem procura algo um raio da luz universal. Ela pode chegar direta-além do que oferece o mundo comum. Ele já mente dos grandes iniciados da luz, como Jesus,não se satisfaz com o que lhe dizem, com as Krishna, Buda, ou de um homem que procla-cores comuns do mundo, com os divertimentos mou essa doutrina e já formou uma fraternidade.comuns, mas está em busca de “algo mais”. Ele A base giratória é colocada em movimento, aé o que chamamos de um “buscador”. Através argila é preparada e transformada pelos dedos dode muitas experiências, o buscador é conduzido ceramista. Pouco a pouco o homem se torna um34 pentagrama 1/2009
Os sete raios mediante os quais a com o caminho, com toda sua devoção, com a féalma desperta trabalha no mundo são: que torna tudo possível e tudo transforma. Não dizemos que “a fé pode transpor montanhas”?1 O anseio geral, a busca Pois essa é a fase da descoberta, de integrar um esotérica ou pessoal; grupo, a fase da devoção. É a fase do homem- João. João é o homem nascido desta natureza,2 a fé na doutrina; mas que decide percorrer o caminho da grande libertação e aceitar sinceramente todas as con-3 a prática da doutrina; seqüências. Dele emana uma grande força. Pela purificação, ele liga-se outra vez à natureza fun-4 a organização da vida; damental e, em seguida, compartilha com outros essa força. Nada funciona melhor e impele mais5 o caos, a montanha onde à ação do que ver alguém fazer o que diz e viver a forma morre; o que ensina. Contudo, o batismo pela água, o batismo de6 a escolha decisiva; João, tem uma limitação. É o limite do estado humano, da argila da qual fomos feitos.7 a magia gnóstica O estado de fé da personalidade natural podealuno. Ele toma o ensinamento como modelo e também abrir a porta a ilusões... e desilusões.esforça-se por adequar sua vida à doutrina. É o Acreditamos ter sido tocados pela luz, pelobatismo pela água, a iniciação pela água, por- sublime, mas os fundamentos do nosso ser nãoque o buscador reage de maneira passiva. Assim mudaram. Diante de uma situação crítica, os ve-pode-se ver um ocidental comum tornar-se um lhos instintos retornam, é-nos impossível mantermonge Zen ou um jovem coreano seguir os nosso comportamento elevado.ensinamentos de Victor Hugo, ou a doutrina Fracassamos perante os instintos terrenos, o de-de uma Fraternidade dos Andes da América do sejo de segurança, a cólera, a inveja, o desejo deSul ser posta em prática em uma cidade grande posse etc., e atingimos o limite do estado natu-como Paris ou Amsterdã. ral. O candidato passa por períodos de exaltação e de profunda depressão. Num momento, flutuaO candidato à iniciação nesse estado é maleável; nas nuvens, no momento seguinte está repletoele está conectado com o poder da eternidade, o de remorso e culpa. O motivo é que a persona-átrio do templo de iniciação, que torna tudo isso lidade nascida da natureza, a argila extraída dapossível. Uma preparação é necessária para que a terra, mesmo que tenha qualidades inegáveis,argila possa suportar a etapa seguinte do cami-nho. O buscador compromete-se resolutamente a arte do ceramista 35
deve ainda passar pelo fogo para ter sua nature- personalidade “de argila” do homem comum.za alterada. Depois de algum tempo, o próprio Mas logo que o homem-João realiza sua missão,candidato passa a pedir uma nova luz, uma nova ele desaparece e torna-se uno com o homem-compreensão, a purificação de seu ser. João Jesus.purifica sua consciência, seu corpo de desejos, ecoloca-os em harmonia com a natureza divina. Jesus aceita seu caminho de cruz para purificar o carma na pessoa do homem-João e transformarAo mesmo tempo Jesus põe-se em movimento, e inteiramente sua personalidade.não poderia ser diferente, pois em determinado O divino integra-se na natureza, e a chama divi-momento ele encontra João. Mas este encontro na transforma completamente a argila da perso-ocorre de maneira completamente inesperada. nalidade.Ao mesmo tempo que o candidato chama a luz E isso é colocar o vaso de argila no fogo.e é transformado por ela, a luz submete-se a ele Uma vibração de outra natureza intervém con-A flama incendeia-se e queima, o fogo ativa-se até omomento em que o vaso de argila começa a tornar-severmelho e a brilhar com uma irradiante luz brancae pede para ser transformada por ele. Não é João cretamente na vida.que é batizado por Jesus, mas Jesus que mergu- Uma auto-iniciação, não mediante um ritual,lha inteiramente na água para ser batizado por mas mediante o desejo de cada momento: “CriaJoão. em mim um coração puro, ó Senhor!”Por que? João, o homem mais perfeito desta natureza, di-Todas as Fraternidades gnósticas declaram que minui para que Jesus, que se tornou um com ele,Jesus Cristo era apenas uma imagem, e que a sua cresça. A alma passa pela primeira vez pelo fogo.morte na cruz é, portanto, impossível. Com isso, Ela descobre que é sua própria visão estreita que aelas querem dizer que Jesus Cristo não era um impede de avançar. A chama arde e se eleva, o fogoser nascido da natureza e que não possuia uma é poderosamente ativado, até que o vaso de argila36 pentagrama 1/2009
Os rosacruzes e o fogo é devolvida aos elementos naturais. Entretanto, ela guarda o vestígio da sua passagem pelo fogo, É por isso que quando lemos nos livros sagrados que mediante o qual a personalidade poderá ser puri- Deus é o fogo vivente, isso não significa que o fogo é ficada em uma nova oportunidade. idêntico a Deus, mas que Deus, o Logos, se manifes- Somente quando a consciência natural aceita ta no fogo. Ele se manifesta pelo fogo, assim com em já não ocupar o primeiro lugar, quando a alma e pelos outros elementos. entrega-se nas mãos de Deus, a voz da nova consciência principia a falar. É a grande meta- Se, ontem ou hoje, o adorador do fogo se aproxima morfose da alma. de um fogo sagrado, ele não é um pagão, mas alguém que dá prova de certo conhecimento da ciência Além da voz da doutrina, a voz da alma torna-se divina. imediatamente audível. Uma consciência lumi- nosa transpassa de luz tudo de que se aproxima. Quando um rosacruz se aproxima do fogo secreto, A fase alquímica desenrola-se. como Moisés da sarça ardente divina, ele descobre Não podemos falar dela com detalhes, pois ela o fundamento da línguagem sagrada e se junta aos é diferente para cada um. Mas podemos dizer filósofos do fogo, porque aprendeu do Espírito Santo que o forno é fechado gradualmente, e todo o onde se colocar e para onde ir. oxigênio que ele contém é queimado. A tempe- ratura aumenta. O processo de oxidação provo- O que aconteceu com Moisés? Ele se aproximou da ca mudanças, e as cores aparecem no vaso pela sarça ardente, a força etérica divina que havia des- transformação dos sais metálicos da argila. cido. E se prostrando assim diante dela, face a face, O vaso veste-se de cores vivas. Fala-se “da veste suas irresoluções e seu medo foram suprimidos. de luz da alma” ou “a alma que tece seu manto áureo”. Não havia ele no princípio se esquivado do chamado superior que o havia tocado? Ele devia conduzir o De homem-Jesus, o candidato torna-se Cristo. A rebanho que lhe havia sido confiado para fora do radiação fundamental branca divide-se, e as sete mundo dialético, para a terra prometida; e então, cores radiantes do arco-íris brilham. O candi- após muita reflexão, ele terminou por completar sua dato então é chamado de “mestre da pedra”. O grande tarefa. Ele se tornou “a nuvem que precede o vaso está pronto para ser retirado do forno, e Senhor” [...] pode-se dizer ao candidato, ao aluno de uma Escola Espiritual: “Permanece junto ao vaso para O fogo sagrado se eleva da substancia etérica que tornar suas cores perceptíveis” µ não é desta natureza, ele não se consome, ao con- trário, ele leva aquele que o percebe interiormente a sua ressurreição na nova vida da luz. Catharose de Petri, Os rosacruzes e o fogo, em Nieuw Religieuze Oriëntering (Nova orientação religiosa), maio de 1948.se torna vermelho e, em seguida, irradia uma bri-lhante luz branca.A consciência comum não pode manter-se nessebraseiro, e o momento da escolha decisiva apro-xima-se: permanecer no fogo e mudar, abando-nando completamente o eu, ou recusar o fogo.A argila dos que recusam seu destino no fogo a arte do ceramista 37
A criação segundoos HopisOs Hopis representam o que resta de certo povo nativo que vivia no estado doNovo México e no nordeste do Arizona.Trata-se do grupo mais ocidental dosíndios pueblos. Seu mito da criação trata do aniquilamento e retorno eternais,que durarão até que os homens-formigas compreendam, por eles mesmos, o queo criador previu para eles. Os Hopis denominam o espaço infinito, de onde tudoprovém, de Tokpela.Tokpela – O PRIMEIRO MUNDO Não despertou e indagou quem ela era e porque se havia nem princípio, nem fim, nem encontrava ali. Sotuknang respondeu: tempo, nem forma, nem vida. Somente “Olha ao redor de ti. Eis a terra que criamos. Elaum “nada” imenso que, no espírito de Taiowa, possui forma e massa, orientação e tempo, iníciopossuía princípio e fim, tempo, forma e vida. e fim. Mas ainda não há vida. Não se vê movi-No interior, se é que se pode falar do “interior” mento feliz. Não se ouve barulho feliz. O que éde um nada, o criador original, Taiowa, iniciou a vida sem movimento nem ruído? Por isso foi-seu trabalho. Os Hopis denominam o primeiro te concedido o poder de nos ajudar a criar essade todos os mundos “Tokpela”, espaço infinito. vida. Recebeste o conhecimento, a sabedoria e oEle, o infinito, imaginou o finito e a vida. Ele amor para que abençoes todos os seres que cria-queria manifestá-la e criou primeiro Sotuknang, rás. Esta é a razão de te encontrares aqui.”e disse-lhe: “És a primeira força e criei-te como A mulher, então, misturou um pouco de terrapessoa e instrumento para realizar meu plano com saliva, formou duas criaturas e as envolveuque é manifestar a vida no espaço infinito. Sou com o manto branco da sabedoria, enquantoteu tio, és meu sobrinho. Vai agora e forma os entoava o Hino da Criação. Os gêmeos des-cosmos para que eles cooperem harmoniosamen- pertaram e perguntaram quem eram e por quete segundo meu plano.” se encontravam ali. A mulher os chamou deSotuknang agiu como lhe fora ordenado e Pöqanghoya e Palöngawhoya. Eles receberam aretirou do espaço infinito o que estava destina- tarefa de manter o mundo equilibrado quando ado a tornar-se matéria, forma, e o ordenou em vida fosse enviada sobre a terra. Pöqanghoya deunove reinos universais: um para Taiowa, um a volta ao mundo e, com suas mãos, amassou apara si próprio, e sete universos para a vida por terra para que ela se densificasse. Palöngawhoyavir. Com o consentimento de Taiowa, Sotuk- deu a volta ao mundo e fez nascer o barulhonang criou a água e, em seguida, o ar e o vento. ouvido na terra inteira. Essa é a origem do eco,Taiowa disse então: “Mas teu trabalho ainda não pois todos os sons são reflexos do criador. Tendoestá terminado. Agora deves criar a vida e o seu cumprido suas tarefas, Pöqanghoya foi enviadomovimento, e assim terminar completamente as ao pólo norte do eixo da terra e Palöngawhoyaquatro partes, Tuwaqachi, do meu plano univer- ao pólo sul, onde receberam juntos a ordem desal.” fazer girar o mundo da justa maneira. Pöqan-Assim, Sotuknang pôs-se a fazer o que, no uni- ghoya recebeu, além disso, o poder de manter deverso, estava destinado a tornar-se o primeiro maneira estável a densificação da terra. Por suamundo, Tokpela. E criou aquela que permanece- vez, Palöngawhoya recebeu o poder de man-ria sobre esta terra para tornar-se sua colabora- ter o ar num movimento tranqüilo. E recebeudora. Chamada Kokyangwuti, a mulher aranha também a ordem de fazer ressoar, pelos centros38 pentagrama 1/2009
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O hino da criação vibratórios da terra, seu chamado para incitar ao bem ou para enviar advertências. A sombria luz púrpura eleva-se ao norte, Para os Hopis, o corpo da terra e o do homem A luz amarela eleva-se ao leste têm uma estrutura similar. É por isso que re- E nascemos plantas da terra conhecem que há centros vibratórios ao longo Para receber uma longa vida de felicidade do eixo da terra e também ao longo do eixo do Chamamo-nos donzelas borboletas. homem. Estes correspondem aos chacras, ainda que apenas cinco sejam reconhecidos: o chacra Homem e mulher, juntos, coronário e os chacras frontal, laríngeo, cardíaco orientam para leste sua oração, e umbilical (ou do plexo solar). Inclinam-se com respeito ao sol do Criador Em seguida, da terra a mulher criou árvores, O som dos sinos preenche o ar arbustos, flores, todas as plantas portadoras de A alegria ressoa pela terra inteira sementes e frutos, com os quais ela revestiu o Humildemente peço a meu pai, mundo. Da mesma maneira, ela criou todas as O perfeito,Taiowa, nosso pai, espécies de pássaros e de animais, envolveu- O perfeito que criou a vida tão bela, as com seu manto branco e entoou o Hino da Que nos mostre a luz dourada, Criação. Que nos dê a luz perfeita. Sotuknang ficou feliz ao ver a beleza de tudo aquilo - a terra, as plantas, os pássaros, os ani- O perfeito revelou-nos seu plano, mais e a força ativa através de cada um deles. Atribui-nos um longo lapso de tempo. Pleno de alegria, disse a Taiowa: “Vem ver como Criou os cantos que alegram a vida. é nosso mundo agora!” - “É magnífico”, disse No caminho da felicidade, Taiowa, “ele agora está pronto para receber a nós, donzelas borboletas, vida humana, o último passo para tornar o meu Realizemos seus desejos plano completo.” cumprimentando nosso pai, o sol. A CRIAÇÃO DA HUMANIDADE A mulher to- Os cantos refletem a alegria do Criador mou a terra composta de quatro cores: amarelo, Da terra, nós os repetimos vermelho, branco e preto. Ela teceu quatro seres até diante de seu trono. humanos à imagem de Sotuknang, o homem. E quando surge a luz dourada, Depois, teceu quatro seres humanos à sua ima- O eco muito feliz os repete e repete, gem, a mulher. Soa e ressoa para os tempos próximos. Esses seres humanos seguiram uma evolução comparável ao nascer do sol, que se inicia pela40 pentagrama 1/2009
“Com isso, eu vos dei esse mundo para que nelevivais e sejais felizes”sombria cor púrpura da primeira de todas as e a faculdade de reprodução, para que possamauroras. Quando a mulher, após ter cantado o gozar de suas vidas e render graças ao Criador”.Hino da Criação sobre as formas por ela modela- Sotuknang concedeu a palavra aos homens,das, retirou o manto branco que as recobria, elas cada qual uma cor de uma língua específica devieram à vida. A cor púrpura transformou-se em acordo com as suas diferenças. Ofereceu-lhes aluz amarela. sabedoria e a faculdade de reproduzir-se e deNesse momento o homem ainda se encontrava multiplicar-se. E disse-lhes então: “Dei-vos estecercado de bruma, e o sopro da vida penetrou-o mundo para viverdes e serdes felizes. Há, con-através de um ponto tenro situado no alto de seu tudo, uma coisa que vos peço: o respeito con-crânio. A bruma desapareceu quando o sol se tínuo a vosso Criador, a sabedoria, a harmonia,ergueu no horizonte e endureceu o ponto tenro bem como o respeito ao amor do vosso Cria-do crânio. E o homem completamente formado dor. Crescei e jamais esqueçais disso enquantoviu o orgulho no rosto do seu inventor. “Eis o viverdes. ” Os homens povoaram, então, a terra,sol”, disse a mulher, “Vós encontrais vosso Pai, o e viveram em paz com ela, com seus semelhantesCriador, pela primeira vez. Deveis sempre guar- e com os animais. Mas após certo tempo, algunsdar na memória as três fases da vossa criação. O se esqueceram de honrar seu criador de acordotempo das três luzes: a sombria cor púrpura, o com o mandamento da mulher. Cada vez maisamarelo e a vermelha revelação do mistério, o eles se serviram do seu centro vibratório vitalsopro da vida e o calor do amor. Isso faz parte unicamente para atingir objetivos terrestres edo plano da criação como o Hino da Criação esqueceram que seu primeiro objetivo é realizarque vos foi cantado.” o plano do Criador. Até então, tinham vividoOs primeiros homens do primeiro mundo não em paz com os animais, mas estes se afastaram elhe respondiam, porque não sabiam falar. Como tornaram-se “selvagens”. Finalmente os homensa mulher recebera seu poder de Sotuknang, ela o chegaram ao ponto de bater-se mutuamente.convocou graças ao eco Palöngawhoya. Restou apenas um pequeno grupo que se recor-Num piscar de olhos, ao som de um vento pode- dava do mandamento da origem.roso, apareceu-lhes Sotuknang. “Aqui estou. Por Taiowa tomou a decisão de destruir o primeiroque necessitais de mim de maneira tão urgente?” mundo, exceção feita ao grupo que permanece-A mulher explicou: ra fiel às suas leis. A estes, Sotuknang ordenou“Conforme me ordenastes, criei os primeiros que se deixassem guiar pelo chacra do crânio.homens. Estão bem modelados, têm a boa cor, “Graças à sabedoria interna, podereis localizarpossuem vida e movimento. Mas não sabem e seguir durante o dia uma nuvem, e à noite,falar. É precisamente isso que lhes falta. Por isso uma estrela. Não porteis nada convosco; vossaquero dar-lhes a palavra e também a sabedoria viagem terminará quando a nuvem e a estrela a criação segundo os hopis 41
e rir-se-á dos que ainda cantam o Hino da Criaçãocessarem de mover-se.” Por toda parte no mun- nang diz-lhes: “Entrai agora no formigueirodo, alguns homens abandonaram então seu lar e kiva (lugar onde vivem os Hopis) onde estareiscomeçaram a seguir a nuvem e a estrela. Muitas seguros quando vier a destruição do mundo.pessoas interrogaram-lhes por que, mas quando Enquanto estiverdes aqui, quero que aprendaisfalaram-lhes da nuvem e da estrela, não acre- com os homens formigas: eles são trabalhado-ditaram, porque nada viam. Pessoas vindas dos res, no verão recolhem alimento para o inverno.quatro cantos do mundo reúnem-se num lugar Permanecem frescos quando faz calor e quentesdeterminado. Quando todos haviam chegado, quando faz frio. Vivem em paz entre si. Obede-Sotuknang apareceu e os conduziu a uma colina cem ao plano da criação.”dentro da qual viviam os homens formigas. Para O fogo dos vulcões aniquilou o mundo, e assimentrar, escavaram um buraco no topo, e Sotuk- terminou o primeiro mundo.42 pentagrama 1/2009
Tokpa – O SEGUNDO MUNDO A superfície HOPI É A ABREVIAÇÃO DO NOME DESTE POVO,da terra levou muito tempo para resfriar-se. Hopituh Sinom, ou “os homens de Hopi”. AntigamenteEnquanto isso, os homens viviam felizes sob a o Hopis também eram conhecidos pelo nome de Moquiterra apesar da escassez dos alimentos. Foi então ou Moki. Os Hopis falam um dialeto da família dasque Sotuknang criou o segundo mundo, intei- línguas Uto-Astecas.ramente diferente do primeiro. Lá onde houveraágua, havia agora terra, e onde houvera terra, Dos cerca de 18.000 Hopis que ainda existem, a maiorhavia agora água. Uma vez mais Sotuknang parte vive no meio da reserva dos Navajos, divididosdeu ao homem a missão de viver de acordo em onze aldeias autônomas. Vivem em habitações cons-com o plano do Criador. Outra vez os homens truídas em terraços, características do Pueblos. Existempovoaram este mundo, e outra vez tudo termi- diferentes traduções da palavra Hopi, como: “Homensnou mal. Eles viviam separados dos animais e que vivem da justa maneira” ou “os pacíficos” ou aindaocupavam-se somente de seus próprios interes- os homens “bons, bem-aventurados e sábios”.ses. Construíram casas, fabricaram instrumentose passaram a fazer trocas e comércio. E foi aí O pacifismo significa também a aceitação quase semque as dificuldades começaram. Tudo o que os luta do destino. Eles esperavam o regresso de seu irmãohomens necessitavam encontrava-se no segun- branco perdido, Pahana, assim como os Mayas espe-do mundo e, no entanto, eles nunca estavam ravam o Deus branco barbudo, Kukulcan, e como ossatisfeitos. Cada vez mais os Hinos de Louvor ao Toltecas e os Astecas esperavam Quetzalcoatl.Criador transformaram-se em hinos de louvora suas próprias possessões; afastaram-se da suamissão, e logo começaram a zombar dos quecontinuavam a cantar o Hino da Criação. Umasegunda vez, Taiowa, o criador original, e o seusobrinho decidiram destruir o mundo, e outravez deram abrigo aos que não tinham se des-viado de sua missão junto aos homens formigas.Mais uma vez os gêmeos Pöqanghoya e Palön-gawhoya não puderam realizar sua tarefa demanter o mundo em equilíbrio. O mundo pôs-se a girar a uma velocidade louca fazendo que asmontanhas caíssem no mar e maremotos se aba-tessem sobre a terra. Resultado: a terra resfriou-se fortemente e cobriu-se inteiramente de gelo. a criação segundo os hopis 43
A narrativa da criação dos HopisEsta narrativa da criação é notável e compreende duaspartes. A primeira descreve a criação do primeiro mun-do original e a criação do primeiro homem.A segunda parte descreve as recriações sucessivas domundo, porque os deuses tiveram de destruí-lo váriasvezes porque o homem falhava em sua missão e esque-cia de honrar seu Criador. De acordo com a tradiçãoHopi, o mundo foi destruído três vezes, e o homematual vive no quarto mundo.Durante esse tempo, o grupo dos sobreviventesvivia em paz com os homens formigas.Kuskurza – O TERCEIRO MUNDO Após um vivido com os animais; no segundo, tinhamlongo período, os gêmeos receberam a ordem de aprendido ofícios, a fazer comércio e a construirretomar sua tarefa nos pólos da terra. A terra re- aldeias. Neste terceiro mundo, edificaram gran-encontrou seu equilíbrio, lentamente aqueceu- des cidades, desenvolveram completamente a in-se e Sotuknang começou a terceira criação da dústria. Aprenderam até a fazer armas e escudosvida sobre terra. Quando a terra estava prepa- voadores com os quais atacar outras cidades. Suarada, ele retornou ao formigueiro e pediu aos criatividade foi empregada para destruir. Sotuk-homens que saíssem. Ele disse então: “Salvei-vospara que possais repovoar a terra. Mas recordaia todo instante as duas coisas que vou dizer:primeiro, deveis render reverência a mim, vossocriador, respeitar-me e respeitar a vós mesmos.Segundo, de todos os cimos das montanhasfazei ressoar incessantemente cantos de louvor.Quando eu já não ouvir cantos de louvor, sabe-rei que vós outra vez sucumbistes ao mal”.Os homens repovoaram outra vez a terra e con-tinuaram a evoluir. No primeiro mundo tinham44 pentagrama 1/2009
uma grande viagem. Quando a chuva cessou, construiu jangadas de junco para que os homens salvos pudessem partir em direção do nascer do sol. Na rota, foram colocadas à sua disposição ilhas, onde puderam semear e colher antes de prosseguir. TUWAQACHI – O QUARTO MUNDO Enfim eles chegaram a um grande país com eleva- das montanhas onde Sotuknang apareceu-lhes outra vez e lhes disse: “Olhai na direção de onde viestes, vede as ilhas de onde vivestes. São vestígios da vossa viagem, os cimos das eleva- das montanhas do terceiro mundo que destruí. Olhai”. Enquanto os homens olhavam, uma a uma as ilhas desapareciam na água. Sotuk- nang prosseguiu: “Vêde, até apaguei os vossos vestígios, as pedras que havia deixado à vossa disposição. Antes de partir, digo ainda isto: o nome do quarto mundo é Tuwaqachi, o mundo completo. Descobrireis vós mesmos o porquê. Este mundo não é tão fácil e bonito quanto os precedentes. Há altura e profundidade, calor e frio, beleza e aridez. Aquilo que escolherdes determinará se, desta vez, executareis o plano do Criador.” µnang, de acordo com a mulher, decidiu dar fim Fontes:uma vez mais a este mundo, salvando ao mesmo Waters, F. Book of the Hopi.tempo os que tivessem continuado a louvá-lo. Penguin Books, 1977.A destruição ocorreu pela água. Dilúvios inun- De Soeten, D. Hopi, la porte dudaram a terra inteira. Para poder salvar certos passé et du futur. Ankh Hermes.homens, a mulher os colocou dentro de longoscaules de bambu com alimento suficiente para a criação segundo os hopis 45
levantemos âncora+++ Do diário de bordo do comandante +++ Anotado e transmitido para osnavios que vagueiam no oceano da vida: chamado a todos os comandantes quenavegam interiormente, em honra do espírito da tradição marítima +++ Esperamosque nossos navios se cruzem um dia no brilho da nova aurora +++ Ad honoremJesu ++++++ Diário de bordo pessoal do comandante, 7º ano, 40º dia, 09h00 +++ Retorno ao ponto departida +++ Novas ordens do almirantado +++ Última anotação como comandante +++46 pentagrama 1/2009
Alonga viagem terminou: a boreste, avista-se o porto de chegada. Entrada no porto no início da tarde.Tempo claro; apesar do mar agitado, avançamos bem. Algo imprevisto: embarcou um ofi- cial que, entregando uma notificação pessoal para o oficial-de-serviço, confirmou minhas suspei-tas mais secretas. Conforme as ordens do almirantado, um novo comandante assumirá o comando donavio logo após a chegada. Eu serei rebaixado a imediato, e a tripulação, remanejada. Receberemos umanova missão.Duvidei que esta última viagem sob meu comando ficasse sem conseqüências: secretamente espereipor isso. Na verdade, quase recebi a mensagem com alívio, apesar da minha ambição e da minha crençanuma carreira marítima. Foi como desvencilhar-me de uma vergonha, de uma falta inexplicável e, aomesmo tempo, recuperar a honra e a responsabilidade.Sob meu comando ocorreram três naufrágios, doenças contagiosas entre a tripulação, roubo e desviode carga, assim como alterações arbitrárias de direção durante diferentes viagens.Também houve mor-tes – não só em decorrência de conflitos violentos em regiões remotas como devido a uma avaliaçãototalmente errada da situação. Muitos membros fiéis e honrados da tripulação já não estão a bordo, elamentamos por isso.Esses dramas, o desfecho de todas as nossas missões e os consideráveis danos ao navio sem dúvidapuseram fim à paciência do almirantado. Não deve passar em branco que entre a tripulação existiamvozes que ainda hoje não acreditam na existência de um almirantado. As mudanças arbitrárias de dire-ção e as missões pessoais fizeram que duvidassem fortemente de que haveriam instruções vindas deum alto comando.E, acontecimento após acontecimento, isso parecia se confirmar: o horizonte a perder de vista, o marassustador e impiedoso, os abismos de tirar o fôlego com criaturas bizarras e perigosas, a indisciplinadesenfreada a bordo e provisões cada vez piores, sem contar o descontentamento crescente dos ma-rinheiros de ter de confiar no comandante unicamente porque ele estava a bordo e decidia qual rumoseguir.A situação beirava o motim: freqüentemente a ponte-de-comando era ocupada por membros irritadosda tripulação que escarneciam de cada ordem. Só o caos que se seguia e os riscos de naufragar faziamos rebeldes sentir, pouco a pouco, que vale mais um comandante ruim que nenhum comandante.Tudo isso aumentou a nossa surpresa ao receber a bordo um oficial enviado pelo almirantado. Paramim, era um verdadeiro milagre, especialmente porque ele passara despercebido e deixara o navio logoapós a entrega das novas ordens, o que foi seguido por um momento de calma, de entendimento e deharmonia entre a tripulação contrária a todas as ordens anteriores.Embora não fosse mais o comandante, eu jamais duvidara da existência de um almirantado; sempre mesenti chamado a agir livremente e me parecia que minhas decisões estavam de acordo com a vontadesuperior.Mas existia ainda outro indício, algo tão grande e inegável que, até então, eu tentara ocultar à tripula-ção: o navio escondia algo. Na primeira viagem, notamos que, com o decorrer do tempo, surgiam novasqualidades e possibilidades referentes à construção dele, especialmente em situações de urgência ouquando era preciso vencer algum perigo. Com surpresa percebemos, por exemplo, que nosso naviosempre estava bem orientado sem que tivéssemos de nos guiar por uma terra conhecida próxima. levantemos âncora 47
Devido a novas funções como veículo marítimo ou aéreo, precisávamos, a todo momento, ajustar tantosuas dimensões como sua forma. Até mesmo eu, como comandante, ainda desconheço o comprimento,a largura, a altura, o conteúdo e o número exato de andares do navio.Lembro-me, com estremecimento e pesar, como penetramos em um de seus conveses inferiores. Meuprimeiro-oficial naquele tempo e eu, por pura curiosidade e impelidos por um ardente desejo de busca,forçamos uma escotilha fechada até então. Atrás dela encontrava-se um número incalculável de cabinese compartimentos habitados por toda espécie de seres, que ademais, nos pareceram bem conhecidos.Não que já os tivéssemos encontrado, mas sua irradiação e qualidades específicas exerciam enormeforça de atração. Apenas com grande esforço conseguimos nos esquivar dessa magia e lacrar outra veza escotilha. Juramos jamais forçar a entrada nessas regiões do navio.No porto, antes da partida, quando a tripulação se preparava para instalar novos aparelhos para me-lhorar a navegação e as manobras, houve outro acontecimento estranho. Estávamos tão deslumbradoscom as novas tecnologias e com as ferramentas modernas, que olhamos quase com desprezo para ostradicionais instrumentos de bordo. O timoneiro ficara encantado com as novidades. Nosso entusias-mo alcançou o auge quando nos foi proposto utilizar somente esses novos instrumentos para nossanavegação.As conseqüências foram desastrosas, e o naufrágio no mar Mentalis foi registrado no diário de bordocomo o pior acontecimento jamais vivido neste navio. Os instrumentos tinham indicado uma direçãocompletamente errada; toda a referência estelar desaparecera. Só descobrimos esse fato após o reparodas avarias.Depois disso, parecia que nosso navio estava pronto para fazer viagens muito diferentes das quepoderíamos supor. Por isso, não causou surpresa quando descobrimos, atrás do painel de controle,instrumentos e aparelhos completamente desconhecidos, muito bem integrados no navio, mas que nãoapareciam no plano de construção nem no manual.Devido à experiência no convés inferior, paulatinamente crescia em nós certo respeito e também aconvicção de que nada compreendíamos de tudo isso.Não posso negar que, com a nomeação de um novo comandante, esses acontecimentos voltam àminha lembrança e se tornam coerentes. Qual será nossa nova missão? Para onde o novo comandantenos conduzirá?Retornamos ao porto da onde partimos para nossa missão. Fiz o navio virar completamente antesde ordenar “desligar as máquinas” e “lançar âncora”. Em sinal de que recomeçaremos tudo e a fim decompreender a próxima missão, toda a tripulação foi reunida no convés principal.Despedimo-nos de alguns velhos e bons amigos da antiga tripulação e saudamos os que chegaram, masdevemos compreender que essa mudança, após tão longa viagem, não ocorre sem dificuldades.Para fortalecer o moral de todos, avisei que o discurso à tripulação e a transferência oficial do coman-do ao novo comandante ocorrerá ao meio dia. Que Deus esteja conosco! µ48 pentagrama 1/2009
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