pentagrama Lectorium RosicrucianumUma ideia luminosaPessoas de hojeOs sete espíritos na obra de Jacob BoehmeUma reflexão sobre a mudança radical2012 4jul/agonúmero
Editor responsável Revista Bimestral da EscolaA.H. v. d. Brul Internacional da Rosacruz ÁureaLinha editorialP. Huis Lectorium RosicrucianumRedatores A revista Pentagrama dirige a atenção de seus lei-K. Bode, W. v.d. Brul, A. Gerrits, tores para o desenvolvimento da humanidade nestaH. v. Hooreweeghe, H.P. Knevel, F. nova era que se inicia.Spakman, A. Stokman-Griever, G. Uljée O pentagrama tem sido, através dos tempos, o símbolo do homem renascido, do novo homem.Redação Ele é também o símbolo do Universo e de seuPentagram eterno devir, por meio do qual o plano de DeusMaartensdijkseweg 1 se manifesta. Entretanto, um símbolo somenteNL-3723 MC Bilthoven, Países Baixos tem valor quando se torna realidade. O homeme-mail: [email protected] que realiza o pentagrama em seu microcosmo, em seu próprio pequeno mundo, está no caminho daEdição brasileira transfiguração.Pentagrama Publicações A revista Pentagrama convida o leitor a operarwww.pentagrama.org.br essa revolução espiritual em seu próprio interior.Administração, assinaturas e vendasPentagrama PublicaçõesC.Postal 39 13.240-000 Jarinu, [email protected]@pentagrama.org.brAssinatura anual: R$ 80,00Número avulso: R$ 16,00Responsável pela Edição BrasileiraM.V. Mesquita de SousaCoordenação, tradução e revisãoJ.C. de Lima,V.L. Kreher, L.M.Tuacek, U.B. Schmid, N. Soliz,J.L.F. Ornelas, L.A. Nepomuceno, M.B.P.Timóteo, A.C.Gonzales, M.M.R. Leite, J.A. dos Reis, D. Fonseca, M.D.E. deOliveira, M.R.M. Moraes, M.L.B. da Mota, R.D. Luz, F. LuzDiagramação, capa e interiorD.B. Santos NevesLectorium RosicrucianumSede no BrasilRua Sebastião Carneiro, 215, São Paulo - SPTel. & fax: (11) [email protected] em PortugalTravessa das Pedras Negras, 1, 1º, [email protected]© Stichting Rozekruis PersProibida qualquer reprodução semautorização prévia por escritoISSN 1677-2253 tijd voor leven 2
pentagrama ano 34 número 4 2012Nesta edição a revista Pentagrama começa com um Monge manique-artigo de 1929, de um dos fundadores da Rosacruz Áu ísta ou budistarea. Trazemos uma reflexão fascinante, de um período em um templomais antigo – do século xvii – de Jacob Boehme, sobre de rocha, Kucha,os sete espíritos. Uma resenha de livro de Marsílio na China.Ficino, platônico e pensador hermético-cristão, leva-nosde volta ao período da Renascença, no século xiv. E alocução de um dos fundadores dacomo se essa volta no tempo ainda não fosse suficiente, escola espiritual sobre a ressurreiçãolançamos uma luz sobre uma comunidade de obreiros uma ideia luminosa 2da antiguidade egípcia, há 3.500 anos. z.w. leeneSerá que entramos por um caminho errado? Ou será os sete espíritos na obra de jacobque viramos uma revista profissional de História? boehme e na escola espiritual daOu queremos, na verdade, demonstrar que o pensa rosacruz áureamento a respeito da Luz é universal? Será que estamos o som da nova realidade 6conseguindo transmitir com intensidade suficiente os pessoas de hoje i 13bons resultados que o divino, o incognoscível, traz em uma reflexão sobre a mudançatodas as épocas? Sentimos que a verdade sobre o Ou radical 15tro dentro de cada ser humano é atemporal? Reconhe pessoas de hoje ii 17cemos como cada recém-nascido na terra conhece esse somente a luz reflete a luz 18anseio, embora também sinta o desespero e o desejo pessoas de hoje iii 23de realizar uma mudança radical, conforme mostram uma metáfora do egito antigoas fotos da pequena série intitulada “Pessoas de hoje”? a fraternidade da verdade 24Inspiremo-nos, e não nos deixemos distrair! Descubra o décimo terceiro 30mos pensamentos sublimes. Sejamos um ser humano pessoas de hoje iv 35do presente. resenha de livro “o divino platão” como guia 36 P. 41 (interior da contracapa): Arjuna faz penitência, o que possibilita que as forças divinas se liguem com a terra a fim de elevar todas as criaturas. 1
aLOcUçãO DE UM DOS FUNDaDORES Da EScOLa ESPIRITUaL SOBRE a RESSURREIçãOuma ideia luminosaZ.W. LeeneNeste primeiro de uma série de artigos sobre os princípios do pensamentodo Lectorium Rosicrucianum, escritos por seus fundadores, Z.W. Leene(já em 1929!) discorre sobre os dois princípios existentes no homem queparecem contrapor-se de modo tão paradoxal, mas que podem ser conciliados por meio da força libertadora do Cristo latente em nós.Ofato da ressurreição é certamente um doutrina da ressurreição é uma ideia luminosa. dos pontos mais difíceis da doutrina Mediante ela, Deus não é apenas o vencedor do cristianismo antigo. Se quisermos que, em Cristo, ressuscita da morte. Ela signidedicar-nos a compreender seu sentido esoté fica, ao mesmo tempo, a vitória da consciênciarico, devemos saber que esse fato não se baseia divina sobre a natureza: e essa vitória é simnuma fé em milagres. Ela não é uma espécie bolizada por Jesus – o “primogênito dos dias”,de feitiçaria, de milagre que aconteceu um homem de homem – que ressuscita da mortedia, há muito tempo, na história da humanida da natureza por meio da concepção imaculadade. Acreditar em feitiçaria é indigno de uma de Cristo, Deus de Deus. Esse acontecimentopessoa positiva, racional, sensível e consciente. é mais do que um truque de magia de Deus!A ressurreição deve fundamentar-se sobre a ra Significa muito mais do que um milagre ocorcionalidade. O homem primitivo é uma pobre rido há dois mil anos. Esse acontecimento écriatura que acredita em milagres porque ainda racionalidade, é ordem, a ordem mais elevada.não consegue compreender nada nem está em O fato histórico não nos contenta – nós, serescondição de examinar o que quer que seja por humanos que temos de lutar na matéria destesi mesmo. O homem racional é um homem mundo.maduro, que não somente pode aprender a Os povos primitivos entendem a ressurreiçãoobservar os fatos como também a investigá apenas como a festa da ressurreição da natureza-los. É por isso que a doutrina da ressurreição viva. E, na maioria das vezes, eles a festejamse torna necessidade absoluta para ele. Para com muita alegria e descontração. A morteo homem pensador, o acontecimento em si é passou, já não existe morte! Entre os judeus aapenas a confirmação de um fato que há muito ressurreição tornou-se uma festa popular. E notempo ele conhece. Enquanto o homem primi Ocidente muitas vezes não é diferente. Porquetivo fica parado no acontecimento em si e se também aqui, geralmente, as pessoas veem nestorna um escravo, o outro abre caminho para sa festa de colheita nada mais do que o aspectoa compreensão e se torna um iluminado. A renovador da energia borbulhante que desperta2 pentagrama 4/2012
Z.W. Leene (1892–1938) pelo Professor De Hartog, procurando há 30 anos!foi a força impulsionadora juntamente com o irmão Foi também graças à suada primeira fase da Escola Jan (J. van Rijckenborgh), inspiração e força espiritualEspiritual. Era uma ele entrou em contato com que, em 1930, Catharosepessoa predestinada a dar o trabalho dos rosa-cruzes de Petri decidiu unir-se àforma a uma grande obra. na forma estabelecida obra e fortalecê-la. DessaNa primavera de 1924, por Max Heindel, nele flamejante energia inicialimbuído de sua própria encontrando a profundidade surgiu então, em 1946, ovivência cristã e estimulado e o objetivo que estava Lectorium Rosicrucianum. uma ideia luminosa 3
O verdadeiro cristianismo não define a ressurreiçãosimplesmente como “um fato”, mas sim como uma energiatudo para uma nova vida. A planta reage ace qual precisamos do cristianismo não é esse,lerando a circulação da seiva e o crescimento pois os budistas já sabiam tudo a esse respeito,das folhas, num estágio superior de consciência. e, muito antes deles, os brâmanes. O cristianisTudo se desenvolve. Ou então, trata-se de mo entende a ressurreição como uma “energia”um acontecimento solar, e essa festa é o pon – portanto, não apenas como um “fato” – ato alto, quando todos prestam atenção nos energia de um processo divino. Trata-se de umsinais do céu e reconhecem a regularidade do processo que nos toca quando Deus nos criaritmo da criação. segundo a natureza; que nos toca quando DeusÉ um tempo de amor, no qual o impulso cós nos recria; que nos toca na ressurreição, quanmico dinâmico se introduz na terra e preenche do Deus no homem triunfa sobre a natureza –tudo com nova vida. Porém, por mais que seja definitivamente!bonito e verdadeiro, esse fato é e continua sen Deus, o Criador, é crucificado na natureza hudo apenas uma ressurreição da natureza. mana que, por sua reação errada às leis divinas,A verdadeira ressurreição espiritual, ao contrá pregou-se a si mesma e a Deus na cruz. Cristorio, vai muito, muito além. O alcance da dou leva esse processo adiante à medida que, a todotrina da ressurreição é consideravelmente maior. aquele que quer e pode, é dada a força paraTrata-se de uma vitória definitiva e não apenas elevar-se dessa cruz, para libertar-se.de um acontecimento que se repete a cada ano. Quando isso é concluído no próprio ser, logoIsso realmente acontece, mas seria uma tensão ressoa o grito de júbilo: Consumatum est! – Estáinimaginável se tivéssemos de ficar presos a esse consumado! Jesus, o “primogênito dos dias”,fluxo vital que se repete incessantemente. Não, homem de homem, recebe o eternamente dia essência da festa da ressurreição é a supera vino, Deus de Deus. E, por meio dele, começão definitiva da morte natural. A morte passa. ça a luta consigo mesmo segundo a natureza,Porém, a constante necessidade de retornar em até que, finalmente, ele torna-se vencedor emuma nova encarnação faz a morte voltar tantas e Cristo, triunfando por seu intermédio. Eletantas vezes quanto o ser humano encarnar. liberta-se da matéria! Isso significa que conseNa festa da ressurreição, não se trata dessa dor guiu vencer a natureza. E, quando se liberta daque sempre está de volta. Trata-se de vencer matéria, quando vence a matéria, quando esa morte definitivamente. Do contrário, por piritualiza a natureza física do corpo grosseiro,que precisaríamos do cristianismo esotérico? ele mostra suas cinco chagas: os cinco lugaresCertamente não seria para falar de carma e de nos quais os corpos sutis superiores estão ligareencarnação, nem mesmo sobre os princípios dos à personalidade. Esse é um processo quecósmicos do amor. Afinal, muitas outras religi pode ser realizado mediante o discipulado daões já não ensinaram isso? Não, o motivo pelo escola de mistérios ocidental.4 pentagrama 4/2012
Assim como Jesus conseguiu ser o primeiro a to toma forma em nós, renascemos segundo aalcançar esse estado por meio do Cristo em si, sua imagem e nos tornamos vencedores segunassim também todo aluno da escola de misté do o Espírito. “Adão” é o ser humano decaídorios ocidental poderá consegui-lo por meio do na matéria, pregado à cruz material pelo carmaCristo nele – e isso não mediante uma morte e pela reencarnação, e seu “filho”,temporal, mas definitiva. a “vida de sua vida”, continua sua imagem.Caros amigos, caras amigas, sabemos o que Mas quem recebe Cristo é libertado da naturesignifica “Cristo em nós”? Com certeza, não za e recriado segundo a nova imagem. Isso nãose trata do conhecimento de sua doutrina, significa uma extensão do que é terreno, masnem do estudo de leis cósmicas, nem da análi sim uma libertação dele. Essa é a glória da festase de pontos difíceis na Bíblia, nem de fór da ressurreição! A alma liberta ingressa entãomulas convencionais ou esotéricas. Ninguém na liberdade perfeita – não de vez em quandoprecisa disso para receber Cristo. O Cristo em ou apenas na morte, mas por toda a eternidade.nós nos torna diferentes: ele faz irradiarmos Desligada do carma e das leis da reencarnação,bondade, verdade e justiça. Ele transforma-nos ela estará livre para sempre. Por isso, estará emem um lutador contra a nossa natureza infe condição de tornar-se uma servidora, ajudandorior. Mas não apenas isso: ele faz de nós, dia a a todos a carregar sua cruz, até que consigamdia, um vencedor. Infelizmente, muitos seres fazer isso por si mesmos.humanos buscadores ficam parados em frente Assim, vivenciamos a ressurreição dos morà porta e não têm coragem para começar essa tos não apenas como uma crença em milagresluta, mesmo quando já receberam Cristo e o ou como uma arte mágica suprassensível, masadmitiram em seu imo. Porém, sem ele não sim como uma necessidade filosófica e cienpodemos fazer nada! Mesmo que tivéssemos tífica à qual cada alma chegará um dia – sejatodo o conhecimento do mundo e dominásse qual for o nome que se dê a isso. Sem Cristo,mos toda a magia do mundo, isso de nada nos nada disso é possível. Com a ressurreição, sãoadiantaria, e permaneceríamos presos à terra, varridas as sombras da morte e superados oscom carma e reencarnação. Jamais poderíamos limites do nascimento. A ressurreição é frutofestejar nossa ressurreição. de muitas gerações, de muito sofrimento e deSem Cristo, somos como uma cópia de Adão, muitas, muitas noites de angústia, passadas emtal como é relatado no Gênesis, cap. 5. Com claro. Ela é o júbilo de nossa meta inabalável.“Adão” queremos simbolizar a humanidade que É a fonte cuja alegria preenche mundos e quedespertou para si um filho à sua imagem, ou conduzirá ao verdadeiro conhecimento geraseja, segundo a natureza. Consultemos esse tre do pelo Eterno: amplo como o céu e profundocho da Bíblia mais uma vez. Mas quando Cris como o mar µ uma ideia luminosa 5
o som da nova realidadeOs sete espíritos na obra de Jacob Boehmee na Escola Espiritual da Rosacruz ÁureaNo livro Morgenröte im Aufgang (Aurora nascente), que Jacob Boehme publicou em 1612, e que depois foi denominado simplesmente de Aurora, o autor escreve quelhe foi permitido contemplar até “o centro danatureza oculta”. Foi com os “olhos do espírito”,e não com os olhos comuns, que Boehme viucomo a força de Deus atua em toda a criaçãomediante o que ele chamou de “sete espíritos dafonte”. A cada segundo, são esses sete espíritosde Deus que, partindo da fonte única, sustentama criação, penetram-na com sua radiação e adesenvolvem. A Doutrina Universal também serefere aos sete raios do sol universal que iluminam o universo.Somente podemos tentar aproximar-nos de tãogrande mistério por meio, digamos, da nossaimaginação. Se nos esforçarmos para entendê-lo, recorrendo a todos os meios possíveis,não o conseguiremos. Trata-se muito mais deuma percepção repentina de algo que já existiahá muito tempo. Jacob Boehme escreve: “Sequiser saber ou sondar algo, então você devesimplesmente colocar-se diante disso com umprofundo anseio de compreendê-lo. Quando ofizer, descobrirá que recebeu duas coisas: compreensão e força: a compreensão que pediu e aforça para que possa fazer algo com essa novacompreensão”.Jacob Boehme ressalta o fato de que um novodiscernimento sempre está ligado a uma novaforça, principalmente ao descrever o sextoespírito da fonte. De acordo com ele, o sextoespírito da fonte faz que cada ser emita6 pentagrama 4/2012
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necessariamente um som. Esse som expressa a simplesmente coloquemo-nos diante disso. O prisomatória de tudo o que vive nesse ser. Nada é meiro, o segundo e o terceiro espíritos da fonteretido. Portanto, se há uma nova compreensão, constroem cada ser, segundo Boehme. Eles criamum novo saber, imediatamente ele é seguido a estrutura, a forma e a mobilidade. Entretanto,por um novo som, uma nova maneira de viver. ainda sem consciência, eles atuam “nas trevas”,Para nós é muito importante entender bem o conforme suas palavras. Imaginemos uma árvore.que é o sexto espírito da fonte, que Boehme O primeiro espírito cria a estrutura, o tronco.também denominou de “espírito do som”, por Boehme denomina-o “espírito acerbo, azedo ouque é nele que reside a chave para o cumpri amargo” que faz que tudo se contraia; é ele quemento de nossa missão na época que se apro faz “algo” do “nada”. O segundo espírito atua naxima e que a Escola Espiritual denomina era seiva da árvore e em toda a sua forma. Boehmede Aquário, na qual tudo será julgado pelo seu denomina-o “espírito doce, agradável”. O terceitom. Nesse contexto, pode-se ler que chegará ro tem sua origem no encontro do primeiro comum tempo em que os seres humanos irão se co o segundo. Ele faz surgir a multiplicidade e amunicar sem palavras: seus pensamentos serão mobilidade, isto é, o movimento e o farfalhar detransmitidos simplesmente através do tom. mil folhas. Esses três espíritos agem nas trevas. Os seres somente ganham vida graças ao quartoOS SETE ESPÍRITOS DA FONTE Mas como atuam espírito, o espírito do fogo.os sete espíritos da fonte, os sete raios, e espe Esse exemplo nos mostra que nem todos oscialmente o sexto, o “espírito do som”? O que espíritos agem em todas as criaturas da mesmapensar sobre isso? Façamos como Jacob Boehme: maneira. Em uma árvore, como no exemplo, o efeito do quarto espírito não é bem visível aos olhos. Todos os sete espíritos trabalham em cada criatura, mas nem todos são visíveis da mesma maneira nem mesmo concebíveis, por que a sua atividade nesta natureza é de certa maneira solidificada, congelada. O HOMEM Imaginemos um ser humano. O primeiro espírito da fonte – assim o vemos diante de nós – cria nele o esqueleto, a estru tura firme. O segundo espírito da fonte é res ponsável pelo doce, pelo agradável, pelo que flui, não tanto o sangue, mas sim as torrentes8 pentagrama 4/2012
Compreender, porém, não no sentido de captar com ointelecto, mas procurando “colocar-se diante”, comorecomenda Jacob Boehme, para receber discernimentoe força, e utilizá-los bemocultas, isto é, as correntes de éteres. CRISTÃO ROSA-CRUZ COMO PROTÓTIPOO segundo cria a forma e o encanto (a amabi Segundo o relato do sonho de Cristão Rosalidade) no homem. Pela ação do terceiro espí -Cruz, inúmeras pessoas estão presas numrito surge a multiplicidade, a mobilidade, que poço escuro em grande aflição e impotência.se manifesta no corpo do ser humano de modo Movidas pela compaixão, outras pessoas quebem diferente do que numa árvore: é mais ocul se encontram em cima, à beira do poço, jota, muito mais voltada para dentro, como, por gam uma corda, mas quase ninguém consegueexemplo, no incrível número de alvéolos no pul agarrá-la e, com sua ajuda, subir. E quandomão, nas linhas e desenhos da pele, nos cabelos alguém consegue pegar a corda, os outros seou também nas inúmeras subdivisões do esque agarram a ele e acabam puxando-o de novoleto que garantem sua (relativa) mobilidade. para baixo. Finalmente a corda é lançada pelaO quarto espírito da fonte, o espírito do fogo e sexta vez.da luz, produz vida e consciência. Ele produz o Cristão Rosa-Cruz é o protótipo do homemfogo astral da consciência, o fogo serpentino do ocidental de nossos dias que busca libertação.homem, que arde no canal da medula espinal Ele é o protótipo do ser humano que hoje ée culmina no cérebro. O resultado disso é luz, aluno da Escola Espiritual da Rosacruz Áurea.como, por exemplo, a luz dos olhos, na qual se Cristão Rosa-Cruz sobe numa pedra, o queexpressa a consciência em sua totalidade. Por significa que ele se apoia em todo o seu esforçomeio do fogo do quarto espírito da fonte, a e no seu trabalho, para o qual deu o melhor devida entra no ser humano, e ele adquire consci si em conhecimentos e habilidades. Então, graência. No entanto, o modo como ele vive é da ças a uma oscilação milagrosa da corda, “talvezalçada do quinto espírito: o espírito do calor. pela vontade de Deus”, diz Cristão Rosa-Cruz,É ele quem determina o modo como o fogo ela chega perto, ele consegue agarrá-la e é puemite calor ou como o homem irradia calor (ou xado para fora do poço.não irradia). O quinto espírito é o espírito do Somos pessoas com a assinatura de Cristãoamor, a maneira como um ser humano trans- Rosa-Cruz: queremos que a rosa do ser imortalforma fogo em calor e calor em amor. floresça, mediante a força de Cristo, na cruzO sexto espírito ou sexto raio tem um signifi de nossa personalidade. A Escola Espiritual écado especial na Escola Espiritual da Rosacruz uma escola para os seres humanos que foramÁurea. Vamos tentar compreender bem esse alçados do poço pelo sexto raio. Estamos aqui,significado, não no sentido de captar com o in e nosso lugar é aqui, porque reagimos à ativitelecto, porém procurando “colocar-se diante”, dade do sexto raio desde o mais profundo decomo recomenda Jacob Boehme, para receber nosso ser, porque temos afinidade justamentediscernimento e força, e utilizá-los bem. com esse raio. o som da nova realidade 9
Nesse sentido, o microcosmo às vezes é comparado aum sino de bronze ou à estupa budista. O repicar dessesino anuncia pura e claramente nossa missão de vida enos liga a essa tarefaO que isso significa? Na Doutrina Universal, cosmo às vezes é comparado a um sino deo sexto raio é denominado o raio da devoção bronze ou à estupa budista. O repicar desseinabalável. Somente mediante essa devoção se sino anuncia pura e claramente nossa mistorna possível o sétimo e último passo, a nova são de vida e nos liga a essa tarefa. Ou entãoatitude de vida, a magia gnóstica, a renovação podemos dizer que o sexto espírito da fontecompleta do nosso campo de vida individual e faz que tudo o que está em nós seja irradiadocoletivo. para o exterior, com força e clareza cada vezComo dissemos, Jacob Boehme refere-se ao maiores. Ao mesmo tempo, ele exige que nossexto espírito da fonte como o espírito do voltemos para o interior e reflitamos sobresom. Conforme ele explica, é como se esse o que soa e constitui nosso verdadeiro serespírito ordenasse, agitasse, condensasse e interior. Mas o que é o verdadeiro imo do serconcedesse firmeza a tudo que os espíritos an humano? Chamamos esse princípio da vidateriores criaram. Graças à sua ação, a criação humana, que tudo abarca, de Cristão Rosaemite um som. -Cruz. Cristão Rosa-Cruz é o símbolo, masUm dos efeitos do sexto espírito é a voz, a literalmente também a força do microcosmofala. Não se trata aqui da produção de pala não corrompido em nós, o símbolo do verdavras com algum sentido, mas sim da fala no deiro homem, do sublime.sentido de som. É a capacidade de tornar reconhecível o que palpita no mais profundo do O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA ESCOLA Aser, sem segredos, sem reservas e também sem atuação do sexto espírito da fonte fará quenenhuma mediação de algo ou alguém. No mostremos nosso interior – não há comoprólogo do Evangelho de João, lemos: “No evitá-lo. Por meio de nossa atitude de vida,princípio era o Verbo”. Esse é o poder do sex- sempre mostraremos o que somos e no queto espírito da fonte! Quando Deus pronunciou acreditamos. O sexto espírito praticamenteessa palavra, ele pronunciou tudo numa só nos obrigará a buscar, cada vez mais, o núcleopalavra. Então, nada restou para ser dito. Ele do verdadeiro homem em nós. Isso é válidonão retém nada de si que não tivesse expressa para cada indivíduo, mas especialmente parado nessa palavra. Com uma única palavra ele este grupo de homens, para o conjunto dosexprime todo o seu ser. Esse é o significado alunos da Escola Espiritual da Rosacruz Áuda capacidade da fala, do som. rea. Por isso, ao refletirmos sobre a atuação do sexto raio, do sexto espírito da fonte, quereNa Escola Espiritual, o som é também a ma mos, ao mesmo tempo, voltar a atenção para oneira pela qual os alunos atuam em conjunto. princípio fundamental da Escola da RosacruzNós consonamos. Nesse sentido, o micro Áurea.10 pentagrama 4/2012
Também indicamos esse princípio com o nome o amor humano, com seu calor humano, seude Cristão Rosa-Cruz. No livro O chamado da interesse, seu sentimento e sua compaixão,Fraternidade da Rosacruz, a Fama Fraternitatis, transforma-se num som real, mais alto, ao serlemos como os obreiros a serviço dessa Frater ligado ao estanho, o elemento da alma-espírito.nidade buscaram e encontraram esse princípio Então ele se torna mais firme, mais claro e cofundamental, essa força. A narração come meça a soar, conforme descreve Jacob Boehme.ça com a morte de um dos irmãos na Gallia O cobre transformou-se em bronze. No en-Narbonensis. Antes disso, contudo, ele havia tanto, o princípio de Júpiter não surge semescolhido um sucessor, que foi encarregado de mais nem menos: primeiro é preciso morrer nafazer modificações no edifício da Fraternida Gallia Narbonensis. Isso significa que o antigode, a fim de prepará-lo para um novo período. desejo pessoal dissolveu-se no país da prestabiEnquanto esse irmão, um competente arquite lidade. É preciso que ele já tenha desaparecidoto, realiza tais trabalhos, descobre uma placa completamente. O mais misterioso, contudo,de bronze oculta que estava presa à parede é o prego que segura a placa comemorativa.por um grande prego. Quando ele retira o Sobre ela, escreve J. van Rijckenborgh: “Esoprego, a fim de transferir a placa para uma tericamente, esse ponto também é chamado osala mais adequada, cai um grande pedaço sexto prego, ou a sexta corda, corda pela qualda parede, expondo uma porta secreta. Por Cristão Rosa-Cruz, de acordo com As núpciastrás dessa porta, os irmãos encontram Cristão alquímicas, é içado para fora do poço. Os outrosRosa-Cruz. À primeira vista, trata-se de uma cinco pontos devem ser identificados com asdescrição muito simples, mas ela contém toda cinco pontas do pentagrama, os cinco pontosa missão da Escola Espiritual. Uma análise do corpo-alma”.mais meticulosa revelará que a essência dosom, do sexto espírito da fonte, desempenha A LIBERTAÇÃO DO VEÍCULO ETÉRICO RENOVADOum papel decisivo nessa missão. Utilizemos agora toda a nossa imaginaçãoTudo tem início com a placa comemorativa, para entender o que é dito aqui. O princípioisto é, com aquilo que nos indica o caminho. de vida oniabarcante do microcosmo, queEssa placa é de bronze, e esse metal é uma liga denominamos Cristão Rosa-Cruz é, natural-de cobre e estanho. Cobre é o metal de Vênus, mente, uma força. Trata-se de um puro prinisto é, do tipo de amor humano. Nas palavras cípio de força. Não é uma coisa, algo, umde Jacob Boehme, esse é o material do quinto lugar; não: é força, energia. E pura energiaespírito da fonte. O cobre transforma-se em não pode manter-se num corpo material, poisbronze quando é mesclado ao estanho, que é o hoje o corpo e a consciência estão muito crismaterial de Júpiter. Isso significa que o cobre, talizados. Ao vivenciarmos nosso discipulado, o som da nova realidade 11
forma-se em nós um novo corpo, um verda estado supra-humano, o gnóstico vai maisdeiro corpo-alma. Se um ser humano, então, longe. O porquê dessa diferença não podequiser encontrar Cristão Rosa-Cruz em si ser explicado com precisão, pelo menos pormesmo, terá de “achar a placa comemorativa enquanto, apesar de termos a sensação de quee puxar o sexto prego”. Isso significa que ele o gnóstico dispõe de mais amor ao próximodeverá libertar o novo corpo-alma, soltá-lo, do que o místico. É bem certo que o gnósticodesprendê-lo da vida biológica natural. Ou, manifesta um amor ao próximo mais dinânas palavras de Jacob Boehme, terá de “fazer mico do que o amor ao próximo do místico.soar” o corpo-alma na força do sexto espírito Enfim, enquanto o místico contenta-se emda fonte. Esse tom libertador expressará tudo produzir e espargir a força de amor a serviçoo que deve ser expresso. Como num som, das forças dirigentes, o gnóstico, pelo contrátudo se tornará claro, para todos, em qual rio, quer integrar-se com as forças dirigentes,quer situação, em qualquer momento. Um quer reforçar a ordem mágica do serviço,sino, porém, não pode repicar quando é se quer orientar conscientemente as chamas degurado. Ele precisa mover-se livremente para seu amor, a fim de que elas possam ser utilitocar, emitir som. Isso está ligado a mais um zadas tão eficazmente quanto possível. Algoaspecto especial do nosso trabalho. Trata-se dentro de seu ser o leva a isso; e para podernovamente da questão: quem são essas pesso fazê-lo, ele deve e quer penetrar o mistérioas, os alunos rosa-cruzes? de sua existência, e por isso busca o conheciSão pessoas muito diferentes; encontramos na mento das coisas detrás do véu. Portanto, eleEscola Espiritual todos os tipos humanos pos deve perceber conscientemente os domíniossíveis, com os mais diversos caracteres. No invisíveis, a fim de poder descobrir a orientanto, eles têm um valor comum, situado gem das coisas e trabalhar como um cidadãoem outro nível, um nível bem mais profundo de dois mundos, a serviço de Deus para oe interno. Tal valor tem necessariamente de mundo e a humanidade”. Assim, a atuaçãoexistir, senão não estaríamos juntos nesta Es- do sexto espírito da fonte é decisiva para nóscola, senão não teríamos sido içados do poço aqui e agora. Por isso devemos continuarjustamente pela sexta corda. Esse valor co procurando sempre o único princípio de vidamum é descrito por J. van Rijckenborgh em que tudo abarca, Cristão Rosa-Cruz.seus comentários sobre a Fama Fraternitatis, É motivo de grande alegria que neste momentono contexto do achado da placa comemora uma nova geração de jovens queira adentrartiva: “Temos aqui a oportunidade de mos o edifício da Fraternidade. Esperamos que astrar a diferença essencial entre o místico e o mudanças no prédio produzidas por esse fatognóstico. Ambos constroem um corpo-alma. impulsionem todos a descobrir a placa comeAmbos, por seu comportamento, extraem a morativa de bronze, arrancar o prego e entre-essência que permite o desenvolvimento dos gar-se completamente ao som do corpo-almaéteres superiores. Quando o corpo-alma já que se libertou µatingiu sua maturidade plena, ambos possuemuma intuição aguda e estabelece-se umarelação com o mundo do espírito de vida,que é o domínio da força de Cristo […] Mas,enquanto o místico contenta-se com esse12 pentagrama 4/2012
pessoas de hoje“Imaginai que uma criança nasça dotada de alma original. Quando essa alma se ligaao corpo, ela encontra a `maldade´ que é una com a natureza dialética. agora, trata-se de saber se ao desenvolver-se, ao tornar-se mais velha e tiver de enfrentar a vida,a criança lutará contra essa maldade, que está dentro dela, ou se a aceitará incondicionalmente e se deixará conduzir ao longo das linhas de menor resistência.”J. van Rijckenborgh,A Arquignosis egípcia, t. 4, cap. 7Seis dias após o nascimento de Betka Tudu, em Purulia (Bangladesh Ocidental), membros femininos da famíliae da vizinhança juntam-se para abençoar a criança e protegê-la de más influências. Uma foto de abhijit Dey,Purulia (Índia). Betka Tudu tem agora cinco anos de idade pessoas de hoje 13
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uma reflexão sobre a mudança radicalUm aluno é alguém que busca o caminho que o levará à iluminação e à realizaçãode vida. Então, ele se examina, bem de perto. E se pergunta: para onde está voltado seu anseio: para conquistar cada vez mais conhecimento, ou para entregar-se ao “tudo ou nada”, imprevisto e desconhecido?Muitas vezes me vejo – talvez exatamente Porque a força-luz não se deixa colecionar como você – enredado num estado de e acumular: ela precisa ser transformada em ocupação mental com a filosofia. Nesses ações. Às vezes, um símbolo é suficiente paramomentos entendo-a como doutrina, e por isso descobrir tudo isso e dissolver todas essasàs vezes me pergunto: será que realmente está construções mentais. Uma simples metáfora éacontecendo dentro de mim a aspirada revolução suficiente para captar um conceito: ela pode to-interior, essa mudança radical, intransigente, que car diretamente o coração sem ser interceptadanão vai me poupar de jeito nenhum? pelo intelecto enganador.Será mesmo tudo ou nada? Ou na verdade sou A partir desse ponto de vista, a imagem dacomo uma criança que suga a força e o conhe transformação da lagarta em borboleta mecimento da filosofia mas não sabe como colocá fascina. Percebo que aí está expressa, de uma-la em prática? Será que estou do lado de fora, maneira muito bonita, uma verdade profunda:olhando tudo isso de longe, sem envolver-me? tudo o que recebemos só tem valor quando éTalvez esteja esquecendo de que há muitas utilizado corretamente. A meta da lagarta échaves que me foram oferecidas e que elas são comer a planta onde ela está. Ela não olha emmuito bonitas e interessantes, mas que são inúteis volta, não percebe nem o sol nem o horizonte.quando não consigo encontrar as portas interio Ela não tem tempo para essas bobagens! Elares para as quais elas estão predestinadas. dirige seu olhar guloso para a luz solar indiretaEntão, percebo dentro de mim e de outras pesso que está dentro da folha. Essa gula me lembraas essa característica humana de querer colecio de nossa fome insaciável por conhecimento,nar tudo, de acumular cada vez mais, de guardar verdade e sabedoria. É só pensar em todas– como a conhecida lagarta que acha que nunca aquelas páginas que estão na sua estante!está pronta e precisa receber mais, para mais tar Uma lagarta devora tudo até que dentro delade investigar, comparar, analisar e classificar. já não caiba nada. Só então é que começa umaÉ assim que nascem os paradoxos! Parece que mudança em seu comportamento: ela já nãotudo se contradiz: todo o conhecimento coletado e acumulado; as verdades que se contrapõem “a arte Real não se ensina e não pode ser estudada ouumas às outras; todas as diferentes interpretações, compreendida antecipadamente. Mas, quando entramosexpressões e conceitos. De repente, todas essas no processo da purificação pelo único caminho possível,construções mentais viraram uma selva fechada! a verdade começa a brilhar diante de nós. No mesmoNo entanto, a lagarta ainda não está satisfei momento entendemos interiormente a arte Real.”ta. Então, percebo o quanto essa característica (A Arquignosis egípcia, t. 4)humana é inútil quando se trata de sair em buscade Deus ou de tornar-se um ser divino. uma reflexão sobre a mudança radical 15
Ainda que mil chaves confiram um conhecimento enorme, interiormente permanecemos os mesmos: é que precisamos de apenas uma, a chave únicacome – agora ela entra em atividade e usa tudo o Finalmente compreendi!que a alimentou. Então, começa a fiar, tece um E no que diz respeito às folhas: a filosofia fornececasulo ao seu redor, e se recolhe. Depois, longe as chaves; mas precisamos de apenas uma. Aindade todos os olhares que vêm de fora, ela inicia que mil chaves confiram um conhecimento enor-um processo maravilhoso. me, como a lagarta que consome milhares de ve-Pouca gente entende que dentro daquele casulo zes o seu próprio peso em alimento, interiormen-acontece um intenso conflito até que uma te permanecemos os mesmos. Para o ser humano,esplêndida borboleta possa libertar-se, pois esse acúmulo de conhecimento pode fermentar,antes que um corpo totalmente novo possa ser ferver, ser perigoso até o ponto de explodir. Mas,construído, toda a forma antiga precisa ser des- para quem encontra a chave única dentro de sifeita. O sistema imunológico da lagarta resiste mesmo, nada de mau pode acontecer. Então jáviolentamente a essa estranha transmutação das não existe acúmulo de conhecimento, mas simcélulas e faz de tudo para impedir esse pro- assimilação, exatamente como o alimento que sócesso. Somente quando a lagarta desiste dessa é útil depois de digerido.batalha sem esperança a transformação das Estudar a filosofia exclusivamente como meroscélulas consegue chegar a um bom fim, sem consumidores de conhecimento faz o intelectoimpedimentos. Da lagarta nada sobra, a não ser enredar-se num labirinto de paradoxos. Liberarum vestígio sem forma. o conhecimento que está dentro de nós, issoResta somente uma célula, que carrega dentro sim, leva a uma mudança radical, a uma revolu-dela o plano de construção da borboleta: uma ção interior.única célula com base na qual será construído o Mas fique sabendo desde já que o eu vai fazer denovo organismo, um corpo completamente novo. tudo para impedir o próprio desaparecimento! µ16 pentagrama 4/2012
pessoas de hoje“O átomo do coração, a rosa da libertação, também é um microcosmo primordial compacto que está aprisionado no microcosmo atual. É um ser divino inativo,completamente latente, circundado por um sistema de forças eletromagnéticasque não são divinas.”J. van Rijckenborgh,Os mistérios gnósticos da Pistis Sophia, cap. 18“Eu estava envolvido com a questão de como alguém pode sentir-se abatido e deprimido em um mundo repletode extraordinária beleza. Era isso que eu pretendia representar em uma obra de arte. Na realidade, estamos penosamente isolados entre as paredes do ser e vemos o mundo pelos próprios olhos e não como ele é. Os contornosluminosos na natureza apontam para o mistério da criação, mas a figura tristemente inclinada para frente nãopercebe isso, de tão encerrada que está em seu espírito e em seus pensamentos.”The prision of the self (a prisão do ser) de Soda Lemondrop,The Workhouse & art Place pessoas de hoje 17
somente a luz reflete a luz“O Tao é vazio, e suas radiações e atividades são inesgotáveis.Oh! Quão profundo ele é! Ele é o Pai original de todas as coisas.Ele abranda sua acuidade, simplifica sua complexidade, moderaseu brilho ofuscante e torna-se semelhante à matéria.”Palavras do Tao Te King têm uma lingua- do que o homem ao tratar, em sua cegueira, gem própria, por meio da qual outra re- outros seres vivos apenas como objetos, ao alidade penetra imperceptivelmente em tornar-se ele mesmo seu próprio objeto, aonosso mundo. São palavras que conhecemos, praticar ações cujas consequências ele nãoque são nossas, porém não correspondem a leva em conta, ao aniquilar o mistério danosso modo de pensar corriqueiro. Falamos existência. Como podem viver as pessoas sede bom grado sobre uma linguagem dos mis não houver o mistério que propicia consolo,térios e, é disso que se trata: do mistério. coragem e esperança? Mesmo que nem semMistério não é apenas a expressão para algo pre possamos pressenti-lo, ele nos envolvedesconhecido, algo que provém de outro também no mundo visível.campo de vida. Não, o mistério equivale a Vejamos o homem, o indivíduo: abandonadoum espaço que podemos adentrar. O que por tudo e por todos, ele se inclina sobre umaencontramos nesse espaço só se revela quan cerca e olha ao longo do caminho que levado nele penetramos. Ouvir a linguagem dos para longe. Tudo a seu redor parece despemistérios equivale à experiência que se tem daçado. Subitamente ele percebe a coerênciaquando numa porta se abre uma fresta. Pri com o que se passa na natureza: tarde, noite,meiro, tem-se apenas um vislumbre de um dia seguinte; como se, a cada dia, o velhoespaço infinito, que, em grande parte, ainda mundo terminasse submergindo na noite, e,permanece oculto. Assim também podem ser em seguida, com o nascer do sol, surgisse umas palavras da sabedoria chinesa: novo mundo. Então, na alvorada, da triste“O Tao abranda sua acuidade, simplifica sua matéria da qual ele foi feito surge outra vez ocomplexidade, modera seu brilho ofuscante e dia maravilhoso…torna-se semelhante à matéria…” Depois de termos ficado muitas vezes “emO Tao não é a matéria, mas expressa-se na cima do muro”, pode, finalmente, romper o diamatéria; ele se revela, ao passo que o mistério em que nós mesmos gostaríamos de submergirpermanece. Sem esse mistério a existência hu “no outro”. Uma parte de nosso antigo eu émana seria insuportável. Sem a possibilidade substituída pelo novo eu. Conseguimos percede sentir a beleza, a eternidade no tempo, o ber seu brilho e penetrar no seu espaço. Parahomem estaria perdido. Mas, é por meio do um homem como esse o Tao já não está vazio.assombro do coração que o divino pode ser O campo de vibração do Tao, da Gnosis, ou oencontrado. campo da Fraternidade do Santo Graal, ultraConsideremos o homem: cegamente ele passa de longe em refinamento, velocidade edevasta e se apropria de tudo sobre o que possibilidades o campo de vida comum. Paraacredita ter direito. Nada é mais destrutivo o homem nascido da natureza ele permanece18 pentagrama 4/2012
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Assim como “luz” é “escuridão” quando não existe objeto noqual ela possa refletir-se, assim também consciência é inconsciência quando não consegue perceber nenhuma experiênciainvisível, não é possível apreendê-lo com o subindo cada vez mais, chegaremos às esintelecto, ele está vazio, por assim dizer. Essa feras mais distantes nas quais a gravidadevibração revela-se ao sublime princípio no lentamente deixa de existir e a escuridão docoração, à rosa, e abre a porta para o espaço do universo infinito aparece. Quem sabe lá, namistério. Suas radiações e efeitos são inesgotá escuridão, ressoa – inaudível – a sinfonia dasveis para cada um de nós, pois elas “abrandam estrelas e dos planetas em suas órbitas. Trea acuidade”; dito de modo mais simples, elas vas que se estendem sem fim! Para conseguirnão têm brilho ofuscante, mas uma luz que perceber a luz é preciso que ela seja refletida.pode ligar-se ao homem. “A luz resplandece nas trevas, e as trevas nãoNo pensamento ocidental também encontra a compreenderam”. Assim o homem está emmos, com outras palavras, a mesma noção. meio a uma realidade radiante, mas ele não aMarsílio Ficino, em suas conhecidas cartas, reconhece. Vê apenas a “escuridão que cega”.escreveu sobre isso com um sentido mais cla Assim como “luz” é “escuridão” quando nãoro. Ele disse: “Ninguém se eleva a Deus antes existe objeto no qual ela possa refletir-se, asque Deus mesmo, em certa medida, tenha sim também consciência é inconsciência quandescido até ele”. do não consegue perceber nenhuma experiênInspirado pela sabedoria hermética e por ou cia. A consciência de Deus também se tornatras fontes, Ficino empregou esse axioma em uma escuridão que cega. Ela só reluz comosuas cartas e textos como meio de transmitir consciência iluminadora quando ela própriaseus pensamentos. Assim escreve ele: “Não é consegue iluminar e experimentar algo. Quemque eu tenha me elevado, mas fui conduzido deseja elevar-se obviamente vai separar-se dasao céu. Os elementos pesados da terra não imagens inferiores que reflete em si e a seuchegam às esferas mais altas, eles são erguidos. redor e tornar-se silencioso como se tivesseOs habitantes da terra não escalam os degraus deixado tudo para trás. Tudo abaixo dele separa o céu, o Pai celeste os faz subir”. torna pequeno e sem importância. Apenas oSubir ou ser elevado para a luz só é possí anseio permanece com ele. É nesse anseio quevel quando a própria luz se inclinou até nós. aquilo que o atrai para o alto pode refletir-se.Quando decolamos num avião, olhando pela Hermes diz: “Apenas a consciência anímicajanela, vemos que tudo o que nos é familiar vê o invisível porque ela própria é invisível”.desaparece nas profundezas. A humanidade Porque: “É possível para ti ver tua consciênciainteira, com todo seu estresse, desaparece anímica, tomá-la nas mãos e contemplar addebaixo de uma branca cobertura de nuvens. mirado a imagem de Deus? Então, se até mesO mundo fica silencioso abaixo das nuvens mo isso é invisível para ti, como pode Deus,iluminadas pelo sol. Se nos imaginarmos ele mesmo, ser visível para teus olhos físicos?”20 pentagrama 4/2012
II eu. Não compreendo como algo pode existir aoO caminho para a libertação, para o alto, mesmo tempo dentro e fora de mim. O que meestende-se do nascimento natural até o nas impressiona muito, estrangeiro – ou quem quercimento anímico. Outrora, nos primórdios, que sejas – é que, sem meu Pai, eu não queroquando a alma ainda estava no mundo do viver, mas, ao mesmo tempo, tenho dúvidasestado anímico vivente, era o Espírito que se de que venha a encontrá-lo”. Deus responde:expressava no corpo por meio da alma. Se não “Minha filha, vê teu pai. Em tamanho, ele édesejar continuar na “escuridão que cega”, a menor que tudo, mas, em poder, ele excedealma que já despertou no homem precisa ago tudo. Como o menor, ele está em tudo e, comora desenvolver um novo veículo, revestir-se de o maior, ele está fora de tudo. Vê, eu estouum novo manto. Se conseguir tornar reali contigo, tanto dentro como fora”.dade esse manto, esse recurso, como reflexo Assim fica claro como é importante a visãoda consciência de Deus, ela estará novamente correta de si mesmo, a auto-observação consem condição de refletir o Espírito. A alma ciente em relação ao que nos inspira. Quempode expressar-se assim que tiver encontrado só consegue enxergar uma parte da verdadeseu Pimandro, no espaço em que são absor olha como que em um espelho embaçado.vidos pela nova vida. O coração corresponde Ou – como já foi dito – vê apenas o “lado deà alma. Quando a alma pode expressar-se no baixo do tapete”. A consciência humana, porcoração, essa consciência poderá refletir-se no si mesma, na confusão desta vida, vê apenassantuário da cabeça, o trono do Espírito. o avesso do desenho de um tecido feito porIsso é o renascimento; não o da alma, mas o dedos divinos num grande tear. A consciênque deve ser realizado por meio da própria cia imperfeita só reconhece os nós e fios doalma. É um processo de conversão, um pro lado de baixo, ao passo que o luminoso ladocesso em que a alma se desprende do mundo de cima, por ora, continua invisível. E, noda matéria; é aprender a observar as coisas entanto, ambos coexistem.de outro modo, de outra perspectiva, é outrarealidade do ser. Chamemo-la de consciência IIIanímica ou consciência superior. A respeito Consideremos mais uma vez a imagem dadesse estado prodigioso, Ficino, em suas car alma que – caso a luz tenha obtido acesso atas, apresenta Deus falando com a alma: “Por ela – pode tornar-se una com a luz. O Corpusque estás tão deprimida, minha triste alma? Hermeticum designa essa descida da luz comoEu, teu Pai, estou sempre contigo…” um vaso de mistura que é enviado para baixo.A alma: “O que não posso ver sob a inspiração Com esse vaso é enviado um mensageiro parade meu Pai! Mas, neste momento, realmen anunciar ao coração dos homens:te não percebo como isso pode ser possível. “Submergi neste vaso, ó almas que podeisPorque alguém que só existe fora de mim não fazê-lo; vós que credes e confiais que vos elepode ser meu Pai supremo. Apesar disso ele é, vareis até Ele que fez descer este vaso.”acredito eu, o criador do universo, e estou em “Por que nem todos os homens recebem oseu interior como sua filha. Por isso alguém Espírito?”, deseja saber Tat.que só está em meu interior também não pode E assim continua Hermes: “Deus quis que a liser meu ser supremo. Se ele é maior que eu e gação com o Espírito fosse alcançada por todasestá em mim, sem dúvida também é menor que as almas, mas como prêmio para a corrida”. somente a luz reflete a luz 21
Com esse mensageiro e esse vaso para água Jesus suportou tudo ocultamente,e vinho, preenchido com as forças do Es pois ele não se mostravapírito, é descrita a ação da Fraternidade do como realmente era,Santo Graal. No átomo original está oculta a mas do modo comoimagem do verdadeiro vir-a-ser humano. Os podia ser reconhecido.raios do Espírito Sétuplo que atuam sobre osantuário da cabeça criam ali Pimandro. Esses Ele se mostrava a todos os seres.sete raios formam as linhas de força para o Para os grandes ele parecia grande,novo vir-a-ser humano, o manto ou o brilho para os pequenos, pequeno.da alma no espaço do mistério, do santuá Para os anjos ele aparecia como anjo e,rio do coração. Daí resulta um novo estado para os homens, como homem.de consciência, um descobrir os mistérios, a Assim seu Verbo estava oculto para todos.Gnosis, o reconhecimento e a assimilação da Apenas uns poucos havialuz no próprio ser. Como é possível corpo que o viam e apreendiam a ideiarificar e refletir essa luz para que, assim, ela de que nele viam a si mesmos.possa ter acesso ao coração do homem? Ouçamos mais uma vez as palavras do Tao Te King Quando, na montanha, se mostroua esse respeito. Vamos sentir o espaço que se em sua magnificência aos discípulos,mantém escondido por trás das palavras e em ele não era pequeno.cuja porta se abre uma ampla fresta…: Tornara-se grande e“Por essa razão o sábio abraça o Um e, des- também fizera grandes os seus discípulosse modo, transforma-se num exemplo para o para que reconhecessem sua grandeza.mundo. Ele não deseja irradiar luz, e justamente por isso é iluminado.” Tao Te King, vers. 22 Esse é o mistério, em que cada um só vê oO Evangelho de Felipe relata isso como segue que consegue perceber, mas, por fim, todosno Mistério de Jesus: veem o Uno.” µ22 pentagrama 4/2012
pessoas de hoje“O fato de vos sentirdes, desde vossa juventude, entusiasmados por uma religiosidade evidente, ou por uma forte tendência para uma vida cheia de humanismo,ou por uma tendência artística pela beleza, ou ainda pela sede de conhecimento,ou por alguns desses aspectos ao mesmo tempo, é altamente notável e constitui,poder-se-ia dizer, uma base para uma eventual experiência totalmente nova. É otoque da força da rosa, do reino de Deus em vós. Trata-se agora de tornardesessa base interior em virtude perfeita, em virtude libertadora.”J. van Rijckenborgh, A Gnosis Chinesa, cap. 27-IIDurante a festa hindu chamada Diwali há muitas luzes. Elas simbolizam a purificação do coração e da casadas pessoas, ajudando a afastar e a manter o mal afastado. pessoas de hoje 23
UMa METÁFORa DO aNTIGO EGITO 24 pentagrama24/2/2001122
a fraternidadeda verdade“Muitos historiadores da arte e cientistas voltaram sua atenção para o Egito antigo para estabelecer uma ligação com sua cultura. Então, concluíram que muitas vezes as descobertas das artese das ciências não passam de redescobertas da sabedoria viva do antigo Egito. Com a religiãoacontece o mesmo: sem conhecer o culto egípcio antigo, não podemos compreender o surgimento, a propagação e o significado do cristianismo.” Jan van RijckenborghJan van Rijckenborgh e Catharose de Petri governava “o Egito” – o que equivalia a dizer muitas vezes compararam a Escola Espiritual “o mundo inteiro” – durante os lendários anos com um aprisco das ovelhas ou então com áureos, numa era anterior à existência da morum barco, uma arca celestial. A imagem do te, das enfermidades e demais misérias.aprisco das ovelhas tem origem na parábola do Nesse mundo, reinavam a harmonia, a prospebom pastor da Bíblia, na qual Jesus, o Senhor, ridade e a felicidade para todos. Seth, porém,traça uma profunda comparação entre os la achava que não havia desenvolvimento: faltavadrões que entram sorrateiramente no aprisco dinâmica, progresso, crescimento. Por isso,das ovelhas e aquele que procura entrar com era preciso pôr fim à fraqueza de Osíris e Ísis.o “eu” natural no reino de Deus, no campo Então, empreendeu duas tentativas de matarde vida serena e sublime do homem original. Osíris. Na primeira, usou de uma artimanha;A comparação com o barco, a arca celestial, e, na segunda, foi movido simplesmente portem raízes – ou talvez devêssemos dizer “está um ódio cego.ancorada” – em um tempo ainda mais remoto: O que Seth fez?na época dos faraós egípcios. Durante uma festa em honra a Osíris, ele apa“O Egito, terra sagrada, era um único e receu com um caixão muito bem trabalhado,grandioso mistério de iniciação”, nos ensina feito exatamente na forma e no tamanho doCatharose de Petri. Quem nascesse no Egi corpo do irmão. “Esta bela caixa é para quemto antigo, tendo observado durante toda a melhor couber nela” – estava escrito. Todosvida Maat – a força do equilíbrio, da justiça queriam deitar ali, mas quando foi a vez dee da ação correta – podia ter certeza de que, Osíris, Seth fechou a tampa, trancou-a e jogouquando fosse enterrado na margem ocidental, o caixão no Nilo.seria auxiliado em sua viagem na arca de Ísis O sarcófago foi levado pelas águas do rio. Masrumo à vida eterna, para perto de Rá, em a esperta Ísis, a cunhada de Seth, ficou sabenAmenti, porque Ísis, a deusa do amor, ama do do ocorrido e, segundo a lenda, encontrouva os homens e ressuscitara Osíris, que fora Osíris “em algum lugar perto de Biblos”.assassinado. Ela certamente se encarregaria Seth não deixou por menos. Da próximade que o corpo do falecido fosse recomposto vez daria certo! Ele cortou o corpo de Osírise que ele despertasse no campo de Amenti. em catorze pedaços e atirou-os no Nilo, emDespertar? Recompor? Como assim? O Egito diferentes lugares. E novamente foi Ísis queinteiro conhecia a lenda de Osíris, que fora o salvou, juntando as partes do corpo. Emassassinado e esquartejado por seu irmão Seth todos os lugares onde encontrou um pedaço,– um deus, uma força que pode ser comparada construiu um templo. Com a ajuda de Anúbis,a Lúcifer. Seth invejava o poder de Osíris, que ela envolveu as partes em panos, recompôs o a fraternidade da verdade 25
No corpo vital ou ka, os mortos podiam entrar em contatocom os deuses e oferecer-lhes sacrifícios. Neste caso, paraÍsis e Hórus (que traz o disco solar na cabeça)corpo e devolveu a vida a Osíris. Eis o misté vida original, e conectariam as batidas de seurio da morte e da ressurreição! Transfiguração! coração com o coração do universo, que bateE, para participar desse grande mistério de em todo ser humano e em cada vida na terra.superação da morte através da vida, os egíp Portanto, o ser humano era uma imagem docios envolviam o corpo dos seus mortos em céu, a morada dos deuses, e o Egito era apanos, para que eles despertassem novamente imagem do universo. “Assim como é em cima,para a vida, assim como Osíris despertara pelo assim também é embaixo”.amor de Ísis! E quando o coração, durante sua última via- gem, fosse pesado no salão superior de AmentiHAPI – O NILO O rio Nilo, também chama e estivesse tão leve quanto a pluma de Maat,do de Iteru ou Hapi, era, para os egípcios, ao então Ísis poderia unir novamente as partes domesmo tempo um símbolo e uma realidade. corpo físico ao corpo etérico.Ele determinava tudo o que estava relaciona Os egípcios chamavam o corpo vital ou etérido à vida. Como transbordava todos os anos, co de ka. Na Escola Espiritual também se faladeixando uma lama fértil nas margens, dizia de ka e, no vale do Ariège, em Ussat, uma das-se na Antiguidade: “O Egito é uma dádiva grutas de iniciação denomina-se Ka. Com essedo Nilo”. A vida desenrolava-se na margem corpo vital, o ka, o recém-chegado poderialeste do Nilo: ali se trabalhava e ali posterior- trabalhar no reino celestial sob o eterno brimente foram construídos os templos para os lho solar de Rá, até seu corpo vital ficar tãodeuses e os homens. Na margem ocidental, puro e transparente que Ísis pudesse convidáonde se dá o ocaso do sol, encontravam-se os -lo a seguir viagem, em sua arca, rumo atúmulos, mausoléus e pirâmides, as “casas da Amon-Rá, a consciência do Espírito eterno.eternidade”. Que filosofia fascinante! E o Egito estava reA tarefa de vida de todos os egípcios era re pleto dessa simbologia!compor, reconstruir o corpo de Osíris mediante suas partes. Como? Suas mãos fariam A FRATERNIDADE DA VERDADE Esses símbolostrabalho honrado. Seus pés iriam mantê-los eram protegidos e comunicados ao coraçãono caminho certo. Sua boca falaria a verdade, dos homens pelos verdadeiros sacerdotes deMaat. Seus olhos permitiriam que vissem em Hermes, a fraternidade de Maat, da verdatodas as coisas a luz de Ptah, o deus criador. de. Mas o Egito também era um país comoSeus ouvidos permitiriam que percebessem a o nosso, uma sociedade na qual Seth haviaverdade ao falar e ouvir, bem como a sabedo semeado as mesmas forças de inveja, cobiçaria que pensa no silêncio. Por meio da respi e desejo cego de poder que encontramos emração, eles poderiam aspirar aos perfumes da nossa sociedade.26 pentagrama 4/2012
Por esse motivo, foram confiados à Fraterni pela vida após a morte. Suas moradas terresdade da Verdade o significado e a manutenção tres eram de barro; até mesmo seus paláciosdo equilíbrio divino e, com isso, a ligação e mansões eram construídos tão somente decom o mundo divino. Hermes, que os egíp madeira e bambus. Seus túmulos, no entanto,cios chamavam de Thot, era seu símbolo. que chamavam “casas da eternidade” eramQuem encabeçava a fraternidade era o faraó, feitos das pedras mais duras e caras. As pirâque além de governante secular era também mides são de blocos de calcário e revestidas deo representante do reino da luz na terra. Por mármore.meio dele, que era, ao mesmo tempo, o “filho Os túmulos no Vale dos Reis foram esculpidosde Hórus” e o próprio Hórus (mas na terra), o em duras rochas, e os egípcios realizavam esseEgito estava ligado ao reino celestial, o verda trabalho durante todo o período de regência dedeiro lar do homem. um faraó. A partir do momento em que se ini ciava seu governo na margem oriental, a FraA PROTEÇÃO DO UNIVERSO Sempre que ternidade da Verdade trabalhava, na margempossível e necessário, a Fraternidade da Ver ocidental… no seu túmulo! Será que devemosdade vigiava a construção para a eternidade, rir disso? Afinal, um morto está morto, não éos ofícios e as artes, a escrita, as regras e a mesmo? Então, para que lhe servirá um túmuordem. Porém, ela ainda tinha outra tarefa. A lo, por mais belo que seja? Mas no antigo Egitofim de que fosse mantida corretamente a liga esse espaço não era uma tumba e sim um temção entre a supranatureza e a nossa natureza, plo, um lugar de mudança, de transformação.a fraternidade também trabalhava na margem Por isso, ele se chamava casa da eternidade; eocidental, que era a região reservada aos ha também por isso a Fraternidade de Hermes,bitantes do céu, a área onde eram enterrados que representava a atividade da grande Fraos mortos. Os egípcios tinham pouco interesse ternidade da Vida na terra, trabalhava nessepela vida terrena, mas interessavam-se muito “templo” durante a vida do faraó. a fraternidade da verdade 27
Na “Fraternidade da Verdade” se aprendia a trabalhar com as ferra- mentas dos construtores. O compasso traça a forma perfeita, o círculo. O esquadro representa a atitude de vida: correção e honestidade diante do homem e de Deus. E o fio de prumo simboliza a ação correta. À direita: trabalhadores constroem a casa da eternidade do faraó Seti IA casa da eternidade era a expressão, sob a rária era um campo no qual viviam escravosforma de pedra, das leis que regiam a criação sob condições deploráveis, obrigados a fazerna terra. Enquanto o faraó respeitasse essas leis o pesado trabalho de construir e esculpir ase esculpisse a matéria de acordo com elas, tanto tumbas subterrâneas.o seu governo como o Egito poderiam ter a Mas há pesquisadores progressistas com umacerteza de permanecerem unidos ao mundo visão mais ampla, que sabem que nada dissooriginal, unidos à era dourada de Osíris, que é verdade: os trabalhadores precisavam estarsempre está presente nesse templo. em condição de expressar a mais sublime saPróximo ao Vale dos Reis, onde se encontram bedoria, pois resguardavam os grandes segreos sepulcros de mais de sessenta faraós, havia dos dos iniciados, os segredos que os sábiosuma aldeia, um povoado de trabalhadores. faraós consideravam seu maior tesouro. UmAli viviam cientistas, arquitetos, sacerdotes, trabalho desse porte, que estava sob a superescribas, pintores e operários, completamente visão do próprio faraó, jamais seria feito sobafastados do resto da sociedade. Nenhum deles coação, porque havia o maior interesse dejamais pisou na margem oriental e ninguém que o trabalho fosse realizado da forma maisque viesse do mundo barulhento, na mar- harmoniosa e precisa possível. Somente osgem oriental, podia visitar essa comunidade melhores especialistas eram admitidos, poisapartada de dedicados obreiros. Era ali que a quem constrói a casa da eternidade é a próFraternidade da Verdade operava. Ninguém pria divindade. E, na terra, é a Fraternidadede fora podia chegar até seu povoado, e, no que ajuda a realizar o trabalho.entanto, ali não trabalhava ninguém que não Um jovem adulto que ouvisse “o chamado”tivesse buscado esse isolamento com grande podia ser admitido. Então, iniciava-se umalegria e de livre e espontânea vontade. Quem período de aprendizado muito longo, pois nãoquisesse entrar e ser admitido precisava ter devemos pensar que um obreiro pudesse traouvido “o chamado”, precisava ter certeza de balhar imediatamente na casa da eternidade,que queria consagrar a vida a Maat, à Frater onde ka, a alma vivente do faraó, iria morar!nidade. Até mesmo os que haviam nascido na Moças e mulheres eram educadas para seremaldeia mudavam-se, em certo momento, para sacerdotisas de Háthor, a deusa da beleza,o mundo, e só regressavam depois de haver da fertilidade, da vida e da cura, que residiapercebido interiormente esse chamado e ter no céu estrelado. Elas estudavam as ervas ecerteza de que sua missão era cooperar com a os remédios, a arte de curar, a “ciência dasFraternidade! serpentes”, isto é, podiam reconhecer como eOs arqueólogos modernos, com sua visão quando as pessoas haviam adoecido em conseconservadora, afirmam que essa colônia ope- quência de uma atitude de vida incorreta.28 pentagrama 4/2012
Os jovens e garotos aprendiam seu ofício até correta. Todo ato de um membro da tripulaa perfeição, e só então podiam pertencer a um ção deveria ser tão puro quanto o fio de prugrupo que participasse diretamente da obra. mo, porque o comportamento injusto jamaisEsses grupos eram chamados de “barcos”. pode levar à medida correta ou à verdadeiraHavia barcos para pedreiros e escultores em grandeza. As ferramentas ajudam a determinarpedra, pintores, estucadores etc… Ao mesmo medidas adequadas, e nenhuma ferramenta setempo, cada grupo constituía a tripulação de deixa influenciar de algum modo por motium barco. Vinte e oito pessoas integravam vações, estados de ânimo ou de humor mouma tripulação, catorze a estibordo e igual mentâneos. Elas são sempre claras, estão emnúmero a bombordo. tranquilidade e equilíbrio e jamais se desviamCatorze: aqui nos deparamos novamente com de sua meta!o número de Osíris! Em perfeita harmonia e A casa da eternidade foi construída com essessempre tendo em vista as proporções corre instrumentos, sob um bom entendimento dotas, Maat renovava esses grupos, esses barcos, que é cooperação, na época remota dos faraós.“a casa da eternidade” ou a arca celestial. E ainda hoje é assim. Também em nossa FraDurante milhares de anos, a mesma mensa- ternidade, a Escola Espiritual, na arca celestialgem foi expressa, inúmeras vezes. Por isso, que se tornou real para nós, é preciso umaem todos os túmulos se encontram os mesmos tripulação que sirva à Verdade, que conheçatextos e as mesmas ilustrações, para que os os instrumentos adequados e saiba empregáhomens na terra não se esqueçam da lingua- -los em correta orientação. Tivemos a oportugem celestial, dos sinais do céu e de sua liga nidade de contemplar de perto os construtoresção com os deuses! no exercício de sua atividade.Na Fraternidade, aprendia-se a trabalhar com Também ouvimos “o chamado” e continuas ferramentas dos construtores. No Museu de aremos a ouvi-lo de forma mais incisiva nosLuxor ainda podem ser vistos alguns instru próximos tempos! Porque agora é a hora dementos, tais como compassos, esquadros e realizar esse trabalho na própria vida.fios de prumo. Ao contemplá-los, pensamos: Vamos juntar os membros, construir o corpo“ferramentas normais”. Mas para os 28 mem de Osíris, o corpo etérico que supera o tempobros da tripulação de um barco tratava-se de e a morte. Vamos participar do trabalho nainstrumentos sagrados. atual casa da eternidade: a nossa queridaO compasso traça a forma perfeita, o círcu Escola Espiritual! µlo. O esquadro representa a atitude de vida:correção e honestidade frente ao homem e aDeus. E o fio de prumo simboliza a ação a fraternidade da verdade 29
o décimo terceiro No pensamento gnóstico é dada muita atenção ao sentido ocultodos números. Do dois vem a nova forma, que é o Filho, ou o três.A alma atravessa as sete esferas planetárias para elevar-se à oitavae nona esferas, que são divinas. E, do doze, nasce o décimo terceiro.TREZE É sexta-feira treze. No rádio ouvimos que, estatisticamente, acontecem menosacidentes do que nas outras sexta-feiras comas mesmas condições atmosféricas. Mas, porprecaução, dirigimos mais cuidadosamente ounem saímos de casa!DOZECom o número doze é totalmente diferente.Todas as sociedades e culturas o conhecem afundo ao longo da História. No Olimpo gregohavia doze deuses, conhecemos os doze trabalhos de Hércules, as doze tábuas da epopeiade Gilgamesch, existiam doze tribos em Israel,doze filhos de Jacó, as doze pedras preciosas dossumo sacerdotes, Jesus tinha doze discípulos.No cristianismo ortodoxo conhecemos asdoze noites sagradas, originárias do solstíciode inverno dos povos germânicos, no qual otempo parece parar até que seja festejado onascimento de Cristo na décima terceira noite.O Apocalipse fala de uma cidade com dozeportas e de uma árvore com doze frutos. Natávola redonda do rei Artur se assentam dozecavaleiros. O juri tem doze jurados. Existemdoze signos do zodíaco. Os contos tratam dedoze príncipes, irmãos-corvos, fadas etc. Aténo corpo humano existe o doze: os doze paresde nervos cranianos.OS NÚMEROS PRIMOSCitamos do livreto A rosa e a Cabala1: “O dozeé um assim chamado número abundante, pois ele30 pentagrama 4/2012
o décimo terceiro 31
Doze é a plenitude – tanto do positivo quanto do negativo.O treze liberta o doze de seu movimento circular e abre-lheum espaço para um movimento em espiral para o altoé divisível por 1, 2, 3, 4 e 6, e é menor que de doze homens que havia recebido a inteiraa soma de seus divisores. Números abundan sabedoria espiritual de todos os tempos. “Essestes como ele são um fenômeno raro. O doze doze fizeram fluir sua sabedoria no décimo terexprime uma plenitude: como se fosse uma ceiro, que foi Cristão Rosa-Cruz.” Assim, essacornucópia, ele abrange em si mesmo todas as nova alma despertou: nesse décimo terceiro,possibilidades que existem. Ele é um todo tão Cristão Rosa-Cruz, estava presente como umintegral que é um prelúdio para a completu novo nascimento das doze sabedorias. Hermesde, para a realização completa. Quando não Trismegisto observa que o homem natural,surge uma situação nova, só pode acontecer independentemente de seu comportamentoa recaída no velho, no conhecido. Então, esse normal, é dominado por doze vícios fundanúmero nos questiona: ele é um chamado para mentais: ignorância, dor, incontinência, desejo,a libertação, para fora do movimento circular injustiça, ganância, engano, inveja, astúcia, códo espaço-tempo. E o 13, que é um número lera, irreflexão, maldade.2 Eles se formam comprimo (pois somente é divisível por si mes base nos doze elementos do zodíaco, nas dozemo e por 1), carrega em si essa libertação e forças fundamentais desta natureza. Essas forçasconduz o doze a uma nova realidade: à unifi fundamentais tornaram-se doze “éons”, comocação do mundo com o superior. Por ser mais são chamados no evangelho Pistis Sophia. Daíprofundo, o número 13 já contém o 1 dentro podemos concluir que o homem não só estáde si mesmo. Então, ele liberta o doze de seu aprisionado no espaço e no tempo, mas tammovimento circular e abre-lhe um espaço para bém se encontra nas garras desses doze éons,um movimento em espiral para o alto.” sentindo uma dor imensurável. Basta olhar umO doze manifesta as dimensões terrenas de pouco ao nosso redor! Mas como essas forçastempo e espaço, onde a vida do homem aconte naturais viraram éons que dominam o homem?ce, onde ele passa por suas experiências, dentro Como a própria humanidade construiu essa pridas quais ele está preso. Doze é a plenitude – são e criou esses demônios?tanto do positivo quanto do negativo. A cabala Os éons são forças eletromagnéticas, e os arjudaica conhece a shoshana, a a rosa de treze contes são as concentrações desses princípios depétalas, que consiste em seis pétalas vermelhas força. Os éons são formados pela ação mental,e seis brancas, posicionadas ao redor de uma pela criação de imagens-pensamentos. Imagensdécima terceira pétala, que é incolor. -pensamentos do mesmo tipo têm a caracterísConforme está escrito no livro A Fraternidade tica de poder expandir-se infinitamente quandoMundial da Rosa-Cruz, um texto de Rudolf alimentadas por ações mentais parecidas. AssimSteiner nos diz que no século xiii, a Fraternida são criados deuses naturais, forças naturais quede da Rosa-Cruz foi formada por um colegiado dominam o homem completamente. A cabeça32 pentagrama 4/2012
reflete ininterruptamente sobre como realizar modo geral, o ser humano que não se interessaos desejos do coração. em aprofundar-se na grande questão de saberMas nem todas essas imaginações e desejos o porquê das coisas sente-se muito bem nestesão do mesmo tipo e têm a mesma vibração. mundo. Ele realmente gostaria que tudo ficassePor isso, os éons assim criados também não como está – mas sim, é claro que sem doenças esão iguais. Inúmeras nuvens de baixa vibração guerras. Nada no espaço-tempo e em si mesmocolocaram-se ao redor do mundo, formando o perturba fundamentalmente. E quando, nocamadas sucessivas, estando a de vibração mais conto A Bela Adormecida de Grimm, a décimaelevada na camada mais exterior. Agora essa terceira fada entra em cena sem ser convidada,“esfera refletora” heterogênea está obrigando o ela profetiza que a princesa deverá espetar-se emhomem a seguir seu destino. As forças e energias um fuso quando tiver quinze anos, e cair morta.dessa esfera conseguem penetrar até mesmo no Esse é o símbolo da humanidade e de cada sercorpo físico dos seres humanos. Por isso, o apri humano em quem a centelha divina ainda estásionamento da humanidade é praticamente total. adormecida. A décima terceira fada traz uma inO homem é vivido! Por essa razão, ninguém quietação inoportuna! O treze é recebido comoconsegue sair dessa situação por suas próprias uma ameaça. Ele rompe a certeza do que éforças. Para tanto, é preciso um “décimo tercei conhecido. É assim que o número treze sagrado,ro”! Esse “décimo terceiro” existe! Ele é o que o número da nova dimensão, da espiral superior,a antiga Gnosis chamou de o “Décimo Terceiro torna-se o número da infelicidade. Não quereÉon”, o campo de radiação de Cristo. É o cam mos isso… e saltamos o décimo terceiro andar!po de irradiação da natureza divina fundamental Mas quando estamos prontos, quando queremosque só tem uma meta, a saber: transformar toda livrar-nos da pressão do velho ser duodécuplo,a criação ímpia, não espiritual, e elevá-la à santi quando, com cada fibra de nosso ser, ansiamosdade e integridade, para, desse modo, transfor por um início novo em folha, baseado em ummar o mundo da matéria, com seus dois pólos novo “décimo terceiro andar”, então tudo podecontrários, no mundo transparente da unidade. acontecer! Conseguimos romper o giro da vidaEm nosso tempo, a vibração da terra está au e da morte, deixar o doze e subir na décima termentando, e cada um de nós já está reagindo ao ceira espiral, a nova espiral da vida. Trata-se detoque da luz. O Décimo Terceiro Éon oferece um processo absolutamente autônomo, por maisa cada homem a possibilidade de penetrar num que seja impossível realizá-lo sozinho.novo e mais elevado campo de vida. Em primeiro lugar, reconhecemos como esta mos sobrecarregados. Pelo menos em nossosA TRANSFORMAÇÃO sentimentos, nossa aura, nosso interior. AssimMas como o homem pode despedir-se do velho como a Pistis Sophia, atravessamos essa “ne(das doze forças que o dominam) e dirigir blina” com o auxílio de um grupo que está,-se para o novo, para o Décimo Terceiro Éon? como nós, ocupado em cavar um túnel atravésÉ claro que nenhum ser humano pode seguir desse campo coletivo “nebuloso”, para chegaresse caminho enquanto ainda se sentir satisfei até a pureza resplandecente do campo de forçato com o toque dos doze éons que regem sua de Cristo. O grupo é essencial. É um grupo devida cotidiana. É nesse ponto que se efetua a homens que estão buscando a luz, formandoinversão do “sagrado décimo terceiro” para o um novo “sistema duodécuplo” por meio do“décimo terceiro que promete desgraça”. De qual o décimo terceiro se manifesta. Esse é um o décimo terceiro 33
incrível milagre da magia gnóstica! É esse déci vigorosa, e ela entoa o cântico da perseguição.mo terceiro que evocará dentro de outros seres Depois de entoar o cântico da ruptura, a Pistishumanos a “santa inquietação”, e então, o treze Sophia se livra de modo definitivo de seus pertorna-se o número da mais elevada felicidade. seguidores.Catharose de Petri descreve em seu prefácio de A seguir, a Pistis Sophia entoa o cântico do atenOs mistérios gnósticos da Pistis Sophia: dimento da oração. E, pela primeira vez, ela vê a“Como o homem pode viver em conformi Luz das Luzes.dade com o Décimo Terceiro Éon? O can A força da fé é submetida, então, a umadidato aos mistérios gnósticos enfrenta treze prova final. A Pistis Sophia entoa o cântico damomentos de transformação anímica, durante prova de fé.os quais ele precisa lutar até o fim para al Em décimo segundo lugar, a Pistis Sophiacançar o verdadeiro renascimento da alma. vivencia a grande prova que podemos compaEssas transformações da alma, por assim dizer, rar à tentação no deserto. Ela entoa o cântico dasubstancializam-se nos treze cânticos de arre grande prova.pendimento da Pistis Sophia: Por fim, a Pistis Sophia canta o décimo terceiroNo primeiro cântico, a Pistis Sophia descobre a cântico de arrependimento, o cântico da vitória: adialética e o estado de condenação da humani alma eleva-se, reconhece o Espírito e vai ao seudade. Ela entoa o cântico da humanidade. encontro, ao seu Pimandro.No segundo cântico, a Pistis Sophia descobre Com esse embasamento o leitor pode refletir umsua própria condição natural. Ela entoa o cânti pouco sobre a sabedoria e a força divinas dasco da consciência. quais os homens preparados devem participar.Nessa base, a Pistis Sophia entoa o cântico da Sabedoria e força são os primeiros requisitoshumildade diante da única luz verdadeira. para seguir de fato o caminho da libertação daSegue-se, então, o cântico da demolição: o eu é alma e conseguir levá-lo a um bom fim.”3 µlevado à sepultura.O cântico da rendição é a fase seguinte: a Pistis Literatura:Sophia faz a entrega total de si mesma.Nessa base é entoado o cântico da confiança. Ela 1. Kleiberg, B. A rosa e a Cabala, Jarinu: Lectorium Rosicrucianum,implora pela luz com fé absoluta.No sétimo cântico de arrependimento, a Pistis 2012 (no prelo). v. 10. (Cristal)Sophia entoa o cântico da decisão. É a ascensãoou a queda. 2. Rijckenborgh, J. van. A Arquignosis egípcia, São Paulo: LectoriumEm seguida começa a perseguição. Os éonsda natureza atacam a Pistis Sophia de maneira Rosicrucianum, 1991. t. 4. 3. Rijckenborgh, J. van. Os mistérios gnósticos da Pistis Sophia, 2. ed. Jarinu: Lectorium Rosicrucianum, 2012.34 pentagrama 4/2012
pessoas de hoje“Relembramo-vos que o tempo urge para uma mudança radical e muito profundaem vossa maneira de viver.”“Os sistemas magnéticos estão perturbados […] por isso as necessidades vitaisdos homens são diferentes entre si e se contrapõem, e os homens se opõem unsaos outros numa hostilidade fundamental, biológica e, portanto, estrutural, suscitando resistências de modo involuntário. Mesmo que sejais modestos ao extremoe percorrais vosso caminho com a maior modéstia, não obstante, sois culpados demagia natural, porque sempre são criadas situações por meio das quais sois forçados a agir. Portanto, compreendei que o uso forçado ou concentrado da forçaastral, seja de que forma for, liga à terra e atua de maneira destruidora.É provável que sintais que não se pode falar de bondade em tal situação. O bemsocial e moral está sempre ligado ao mal. E como são justas as palavras de cristo:Ninguém é bom, nem um sequer.”catharose de Petri,O Verbo Vivente, cap. 38Esperança, dúvida, ameaça e poder – ou “os sistemas magnéticos” colidem durante os protestos pacíficos doMovimento Occupy. Wall Street 2012 pessoas de hoje 35
“o divino platão” como guiaGuiado pelas ideias de Platão, Marsílio Ficino considerava que o homem é capaz,por meio do desejo e da imaginação da alma (imaginatio), de ascender à divindade.No âmbito do pensamento neoplatônico, a imaginação atua como mediadora entreo material e o divino e é uma inspiração superior para a alma dedicada que se elevaacima das ideias dominantes, das crenças e atinge o êxtase.De acordo com essa visão, a alma tem claramente dois lados: um lado liga-a ao serhumano, à matéria, na qual submerge; e o outro liga-a ao desenvolvimento divino.Ficino, M. Cartas, parte IIIM arsílio Ficino (1433-1499) foi con um novo leito, um porto seguro, um novo siderado o divino tradutor, por centro espiritual. suas traduções de Platão, Plotino A visão de mundo de Ficino e seu círculo,e Hermes Trismegisto. Ele era a alma, o por ser muito inovadora, criou uma rupturaespelho, em um tempo de fortes mudanças no mundo do pensamento cristão tradiciodos conceitos, que hoje chamamos de Re nal e abriu espaço para uma nova conscinascença Italiana. Foi um período em que ência religiosa. Sua academia, em Floreno poder secular foi redistribuído, criando ça, também foi chamada de “academia daum afastamento entre o mundo cristão e o alma”.mundo árabe, culminando com a queda de Ela mostrava a própria consciência da almaConstantinopla (1453). no interior da personalidade humana, aponPoucos sabem que, nessa época, foram resga tava para sua presença neste mundo e falavatados milhares de manuscritos gregos platô sobre a busca do significado e da origem danicos do período pré-cristão e também do vida em sua plenitude. Sim: ela se posicionapensamento cristão primitivo e hermético, va em um contexto totalmente novo.e Ficino, de Florença, foi o tradutor dessas Sua academia chamava o ser humano paraobras. Cosme de Medici ofereceu a Ficino o compreender a vida e o mundo em um conestudo da língua grega; então, ele começou texto maior. Principalmente para entender otraduzindo Platão, depois passou a Hermes significado da misteriosa relação entre Deus,Trismegisto, assim que Cosme teve em mãos o cosmo e o homem. Essa era a conversao Corpus Hermeticum. O fluxo da sabedoria cotidiana de Ficino e seus amigos, incluindo mundo clássico antigo havia encontrado do escritores, escultores, pintores, filósofos36 pentagrama 4/2012
RESENHA DE LIVRO:MARSÍLIO FICINO, A VIDA DE PLATÃO E OUTRAS CARTASe arquitetos. Além de ser amigo pessoal, ele bram dele como um exemplo de alguém queera conselheiro desse grupo de cidadãos pro encarnava a verdadeira dignidade humana eeminentes e requintados, que estavam cientes a difundia. Foi assim que ele pôde ter umade ser responsáveis por uma nova sociedade. relação amigável com a sociedade europeiaDesse relacionamento, resultaram muitas daquela época. Por essa razão sua academiacartas (em latim), que foram preservadas e florentina, procurada por milhares de pessoastraduzidas. A Rozekruis Pers, responsável que buscavam a cura interior, foi consideradapelas publicações na Holanda, acaba de pu “a farmácia da alma”, e podia ser consultadablicar, em holandês, a terceira parte: A vida diariamente.de Platão e outras cartas. Essas cartas possuem Seu coração era tão leve e profundo que,um valor atemporal, pois Ficino é conhecido nele, um amigo ou inimigo poderia encomo filósofo platônico, mago hermético, contrar um lugar bem aconchegante. Marministro sacerdotal, astrólogo inspirado, sílio Ficino não é apenas um modelo paramédico milagroso de almas. Em suma, po o ser humano universal, o ser humanodemos referir-nos a ele como líder de uma do século xv, mas também um exemplorevolução no mundo espiritual. vivo para a humanidade por ter mostradoAMIGO DA JUVENTUDE Ele fazia isso como Cosme de Médici doou a Ficino a Villa Careggi, emuma missão, nada mais, nada menos. Como Florença, para aí estabelecer a sua Academiavivia o cristianismo puro, resgatava-o de umcolapso, entrando em contato com a grandesabedoria dos gregos antigos e a sabedoriaegípcia de Hermes. Além disso, ele era umamigo da juventude: com os jovens, desenvolveu seus novos métodos de ensino, queeram mais atraentes do que o sistema clássico, e que era utilizado em todas as escolasnaquela época. Como não poderia ser deoutra forma, Platão foi novamente seu guia.Também em termos sociais, ele significoumuito. Amigo de pessoas excepcionais, eracapaz de transpor abismos e sobrepor-sea qualquer mal entendido. Mas, acima detudo, todos os seus contemporâneos se lem “o divino platão” como um guia 37
Um músico. (provavelmente MarsílioFicino quando jovem). Leonardo daVinci, 1845. Óleo sobre madeira, NationalGallery, Londres carta iii Desperdiça sua sabedoria quem, no que concerne a si mesmo, não age de maneira sábia. Marsílio Ficino ao filósofo moralista sem moral: cordiais saudações Como é ridículo um alfaiate cujas roupas estão todas rasgadas! Como é inútil um médico que está sempre doente! Como é desesperador ver um músico cuja lira não está em harmonia com sua voz! O mesmo acontece com um filósofo moralista sem moral. Quem fala bonito, mas age mal, fala em vão, pois fala com as pessoas de coisas boas nas quais ele mesmo não acredita, ou pede aos deuses dons que nunca lhe serão dados.38 pentagrama 4/2012
um novo caminho para a sociedade. Era acima, esses amigos, essas personalidades,profundamente imbuído da força espiritual formavam uma grande e importante rededivina, que, como energia onipresente, vivi- que auxiliou o florescimento das artes e cificante, não tem limites de espaço ou tempo. ências e o desenvolvimento humano univer sal, e ofereceu esperança e luz espiritual nosSUA REDE DE AMIGOS Em A Vida de Platão anos da Renascença. Os lemas com os quaise outras cartas podemos ver tudo que Ficino ele intitulava suas cartas renderam uma belaassimilou de seu mestre Platão, e também coleção de aforismos. Esta Terceira Parte dascomo, aparentemente sem esforço, criou Cartas termina com uma descrição da vidacom facilidade uma aliança entre a sabe- de Ficino realizada por seu contemporâneodoria universal, a vida e seus amigos (mui- Giovanni Corsi. Nela, demonstra-se claratas vezes problemáticos). Tal como citado mente a grande obra de Ficino em favor da carta iv A cura para as doenças mundiais é a adoração a Deus, que está acima deste mundo. Marsílio Ficino a Bernardo Bembo de Veneza, valoroso cavaleiro.Porque o Pai Celestial dos homens determinou que o céu é a nossa pátria, nunca podemos estarsatisfeitos com o nosso destino enquanto permanecermos na terra, este lugar afastado de nossapátria. Então, esse destino não é apenas para pessoas normais, mas sem exceção, para toda acriação. Em nenhum outro lugar se encontra um local tranquilo senão na própria fonte; e abusca pela paz termina onde tudo teve início. Assim, caem água e terra nas profundezas, fogoe ar procuram as alturas, toupeiras e similares se enfiam nas entranhas da terra, a maioria dasoutras criaturas caminha na superfície da terra, e os peixes, que nasceram no mar, nele nadam.Assim, por um impulso natural comum, a alma do homem procura constantemente o céu,onde foi criada, e também o rei do céu, que lá se encontra. Mas, como a aspiração naturalpor Deus, que ele inseriu em nós, não pode permanecer sem realização (afinal, a Razão Suprema, que nada faz em vão, não a teria oferecido em vão) deduz-se que a alma humana éeterna, a fim de que, um dia, possa alcançar o bem eterno e divino pelo qual sua natureza essencial suspira. “o divino platão” como um guia 39
Pelo que já dissemos, segue-se que a alma nunca poderá ser saciada pelo alimento terrestre.Mesmo que nos empanturrássemos de coisas terrenas, não poderíamos desfrutar do alimentoceleste. É por isso que nos esforçamos, nesta vida, com todas as nossas forças, por ligar-nos aorei do céu. Porque, quanto menos formos contaminados pelas amargas experiências terrestres,e quanto mais formos refrigerados pela maravilhosa água celeste, mais intensamente seremos atraídos para a fonte da glória, acima do paraíso celeste.Quanto mais próximos estivermos do senhor do mundo celeste, que é Cristo, mais longeestaremos da escravidão do mundo. Assim como, em nossa pátria, nele encontramos amparomediante contemplação e manifestações de júbilo, também encontramos amparo agora, afas tados que estamos dessa pátria, em o amando e adorando com devoção.Essa é a razão pela qual não encontramos remédio que possa combater todas as doenças terrestres, a não ser o amor divino e a adoração. Isso é a pura verdade! Porque qualquer que seja adoença, se o remédio não consegue curar, ele se torna uma substância maligna e se transformanuma substância que traz desordem ao corpo, diminui a energia e aumenta o peso da doença.Todas as doenças e distúrbios do corpo são tratados com remédios deste mundo, faz-se sem dúvida o melhor, mas o esforço será em vão.Acredite em mim, é necessário um remédio superior, um remédio espiritual, completamenteestranho ao nosso mundo, para conseguir exorcizar as doenças do corpo e do mundo. Se nossacondição fosse de apenas simples doenças, qualquer médico seria bom. Mas, como nossa calamidade consiste em tudo o que constitui o mal, seu antídoto está em tudo o que constitui o bem. Nossa doença é um desejo insaciável e uma constante inquietude. Nosso médico é, portanto, a paz incomensurável e eterna. Se alguém negar que o verdadeiro remédio é a adora ção a Deus, então não há cura para sua doença, e toda e qualquer esperança por saúde se esvai. Mas, em verdade, se alguém crer no divino remédio, ficará são..”40 pentagrama 4/2012
The ‘Descent of the Ganges’ or‘Arjuna’s Penance’, portrayed instone in the 7th and 8th centuriesat the Pallava World Heritage sitein the Tamil Nadu state, India.
Porque o Pai Celestial dos homens determi-nou que o céu é a nossa pátria, nunca po-demos estar satisfeitos com o nosso destinoenquanto permanecermos na terra, um lugarlonge da nossa pátria. (...) Acredite em mim: énecessário um remédio superior, um remédioespiritual, completamente estranho ao nossomundo, para conseguir exorcizar as doençasdo corpo e do mundo. Se nossa condição fossede apenas simples doenças, qualquer médi-co seria bom. Mas, como nossa calamidadeconsiste em tudo o que constitui o mal, seuantídoto está em tudo o que constitui o bem.Nossa doença é um desejo insaciável e umaconstante inquietude.Nosso médico é, portanto, a paz incomensu-rável e eterna. Marsílio FicinoR$ 16,00
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