pentagrama Lectorium RosicrucianumPor que existe uma Rosa-Cruz modernaJ. van RijckenborghPer aspera ad fontesWouter J. HanegraaffO mundo parece uma foto superexpostaMudança como impulsoLuz da luzRobert GrossetesteA energia da luzDas trevas à luzLuz nas cores do arco-írisResenha de livro: Inclino-me diante desse amorArjo Kamer 2012 3maI/JUN número
Editor responsável Revista Bimestral da EscolaA.H. v. d. Brul Internacional da Rosacruz ÁureaLinha editorialP. Huis Lectorium RosicrucianumRedatores A revista Pentagrama dirige a atenção de seus lei-K. Bode, W. v.d. Brul, A. Gerrits, tores para o desenvolvimento da humanidade nestaH. v. Hooreweeghe, H.P. Knevel, F. nova era que se inicia.Spakman, A. Stokman-Griever, G. Uljée O pentagrama tem sido, através dos tempos, o símbolo do homem renascido, do novo homem.Redação Ele é também o símbolo do Universo e de seuPentagram eterno devir, por meio do qual o plano de DeusMaartensdijkseweg 1 se manifesta. Entretanto, um símbolo somenteNL-3723 MC Bilthoven, Países Baixos tem valor quando se torna realidade. O homeme-mail: [email protected] que realiza o pentagrama em seu microcosmo, em seu próprio pequeno mundo, está no caminho daEdição brasileira transfiguração.Pentagrama Publicações A revista Pentagrama convida o leitor a operarwww.pentagrama.org.br essa revolução espiritual em seu próprio interior.Administração, assinaturas e vendasPentagrama PublicaçõesC.Postal 39 13.240-000 Jarinu, [email protected]@pentagrama.org.brAssinatura anual: R$ 80,00Número avulso: R$ 16,00Responsável pela Edição BrasileiraM.V. Mesquita de SousaCoordenação, tradução e revisãoJ.C. de Lima,V.L. Kreher, L.M.Tuacek, U.B. Schmid, N. Soliz,J.L.F. Ornelas, L.A. Nepomuceno, M.B.P.Timóteo, M.M.R.Leite, J.A. dos Reis, D. Fonseca, M.D.E. de Oliveira, M.R.M.Moraes, M.L.B. da Mota, R.D. Luz, F. LuzDiagramação, capa e interiorD.B. Santos NevesTerceira capaH. RogelLectorium RosicrucianumSede no BrasilRua Sebastião Carneiro, 215, São Paulo - SPTel. & fax: (11) [email protected] em PortugalTravessa das Pedras Negras, 1, 1º, [email protected]© Stichting Rozekruis PersProibida qualquer reprodução semautorização prévia por escritoISSN 1677-2253
pentagrama ano 34 número 3 2012Cada edição da revista Pentagrama procura elucidar por que existe uma rosa-cruzalgumas das muitas facetas que marcam o percurso da vida moderna? 2do homem como buscador da verdade, da beleza e da luz. j. van rijckenborghO afresco de 2500 anos que ilustra esta edição tambémnos chama a atenção nesse sentido. Foi encontrado em uma a energia da luz 7sepultura em Pesto – Itália (cerca de 400 a.C.). Nele, vemos cura através de biofótonsum morto que se despede. É representado como o heróivencedor, montado em seu cavalo. Desde a antiguidade, o mundo parece uma fotoo cavalo, por ser nobre, é o símbolo da alma. Até Platão, superexposta 10em sua obra Fedro, menciona dois cavalos e um cocheiro.Os cavalos representam as forças anímicas; e o cocheiro, a luz nas cores doconsciência buscadora. Um dos cavalos é aprumado e bem arco-íris 15constituído, e ergue orgulhosamente a cabeça. Ele sabeo que significa respeito e também o que é temperança e per aspera ad fontes 18lucidez. Ele ama a verdade. Não precisa de chicote nem de os fundamentos da nossa identidadeesporas, e o juízo sadio lhe basta. O outro cavalo pratica moderna precisam ser alteradosmente não obedece a chicote e esporas, é obstinado e tende wouter j. hanegraaffà arrogância e à rebeldia. “Quando o cocheiro contemplaa face da verdade inspiradora do amor e toda sua alma é luz da luz 28estimulada por essa contemplação, e ele é preenchido por um tratado medieval sobreum anseio interior, o primeiro cavalo fica-lhe obediente e é o surgimento do nosso mundorefreado pelo autodomínio. Ele não é insubordinado como o robert grossetesteoutro cavalo, que corcoveia com violência, pondo em perigotoda a carruagem e o cocheiro.” das trevas à luz 35 do chumbo escuro ao ouroO herói da gravura domou seu cavalo desenfreado: é mes resplandecentetre de seu destino e, assim, está perfeitamente preparadopara entrar na ilha dos bem-aventurados. É a respeito do mudança como impulso 38caminho para essa ilha que a revista Pentagrama preten mudança climática no interiorde informar no ano de 2012. do homem resenha de livro inclino-me diante desse amor 46 arjo klamer 11
O ETERNO UNIVERSAL NO DIA DE HOJEpor que existe uma rosa-cruz moderna?J. van RijckenborghA Escola Espiritual, que surgiu há cerca de 88 anos, não toma como baseo método dialético habitual de seguir caminhos tradicionais ou encobriras próprias fraquezas. Aqui, trata-se de seguir a verdade única e realizar aúnica missão, ambas inalteráveis: reconduzir a humanidade decaída à pátriaoriginal e apontar-lhe o único caminho, a única verdade e a única vida, quejamais podem ser alterados.No entanto, com certeza o que se alte estamos dirigindo sua atenção para o passado, ra é a época, a forma e a proporção e, principalmente, para o navio celeste do Livro da decadência humana. A Doutrina egípcio dos mortos. Empreendemos essa tentativaUniversal vai-se ajustando, de acordo com a para fazer uma viagem através do passado e esnecessidade do momento, de acordo com o clarecer sua atualidade sob outro aspecto. E, seestado de ser físico e espiritual da humanidade. possível, tentaremos transformar qualquer pausaNão pretendemos reviver o antigo, mas sim o no curso da vida do leitor em uma verdadeirauniversal. Não pretendemos provar o método “viagem de volta”.antigo, porém provar o método universal em “O que era velho passou. Vede, eis que tudoseu sentido lógico e ético adequado para o se tornou novo”. O que se tornou novo? Obmomento. Considerando os fatos sob essa luz, servando os quadros do Livro egípcio dos mortos,podemos compreender as palavras de Cristo: reconhecemos, em todos eles, o navio celeste“O que era velho passou. Vede, eis que tudo se ou o barco solar. Em uma das imagens, vemostornou novo” (II Coríntios 5:17). E, em aparen como Osíris está para tomar lugar no barco solarte contradição: “Não penseis que vim revogar a cercado por sete raios. Em outras, o barco éLei ou os Profetas: não vim para revogar, mas apresentado com sete remadores ou sete remos.para cumprir.” (Mateus 5:17). Às vezes Ísis está sentada ao lado de Osíris, eA partir dessas palavras, podemos e devemos os sete raios formam a criança: Hórus. Quandoapreender de que modo o eterno imperecível Xisuthrus, ou Xisuthros, o Noé caldeu, é salvo,se manifesta no tempo, em concordância com o vemos como, além dele, sete divindades tomamagora. Se nossa obra espiritual não correspon lugar no navio celeste. Nas gravuras de Yaoder a essa assinatura, ela é morta. Toda movi (um herói da mitologia chinesa) reconhecemosmentação espiritual tem a tarefa de conceber o nitidamente que ele é acompanhado por maisuniversal no hoje. Provavelmente o leitor esteja sete figuras a bordo do navio. Podemos lembrarsurpreso pelo fato de que, com relação a isso, também de Manu, com os sete rishis que viajam2 pentagrama 3/2012
J. van Rijckenborgh e Catharose de Petri, fundadores da Escola Internacional da Rosacruz Áurea, descreviam e explicavam para alunos e interessados, muitas vezes com base em textos originais da Doutrina Universal, o caminho que leva à libertação da alma, do qual foram um exemplo vivoFirmemente decidido, lá vai ele no caminho que passa pela floresta encantada: aquele que segue a senda.© Suad al Attar, 1942 por que existe uma rosa-cruz moderna? 3
com ele na arca. E dirigimos a atenção ainda erguido no mais recôndito do deserto, comopara relatos semelhantes que existem nos Puranas também no Templo de Jerusalém, estão conser(do hinduísmo) e, acima de tudo, no Vendidad vados todos os atributos necessários para umapersa (que faz parte do Avesta), um dos mais verdadeira vida celeste.antigos livros sagrados. Nesse livro, Ahura No Novo Testamento há relatos sobre sete anjosMazda ordena a seu criado Yima: “Faça uma e sete trombetas. Os sete anjos tocam suas tromwara (um cercado), depois construa uma argha betas uma após a outra. E, quando o sétimo anjo(uma arca que corresponde a um veículo). Leve toca a sua, grandes vozes dizem, como se lê nopara dentro dela todos os germens vitais do Apocalipse, capítulo 11: “Os reinos do mundogênero masculino e feminino e moa a terra com vieram a ser de nosso Senhor e do seu Cristo,as próprias mãos. (...) Traga à vida todas as luzes e ele reinará para todo o sempre.” (Apocalipseincriadas!” 11:15). “E abriu-se no céu o templo de Deus, e a arca da sua aliança foi vista no seu templo” (ApoNA ARCA DE NOÉ NÃO É DIFERENTE Em seu calipse 11:19)barco solar, no qual ele escapa da maré da natu As vozes exultam: todos os aspectos de nos-reza, Noé leva todos os princípios vitais neces so cosmo planetário foram outorgados a nossosários para uma verdadeira vida divina. Tanto Senhor e a seu Cristo. E ele reinará por toda ana Arca da Aliança, que estava no tabernáculo eternidade. E o templo de Deus, que está no4 pentagrama 3/2012
Um grupo de cientistas afirma ter localizado a Arcade Noé nos flancos do Monte Ararat, com auxíliode militares e de satélites da CIA. Agora, o governoturco pretende colocar placas indicativas (a 5059mde altitude) na expectativa de atrair turistas embusca de aventuras.céu, é aberto. Em seu centro, o aluno vê a arca, mesmo construiu. Assim, ele precisa construir umo barco solar, o navio celeste que aportou. E, novo homem, um navio celeste com o qual podeem nossa consciência, fica gravado de modo rá entrar no templo de Deus. Com isso, concluíindelével: o barco solar de Osíris, retratado nas mos nossa viagem através do passado.gravuras do Livro egípcio dos mortos, é o mesmoque a arca do profeta de Patmos! E o significa OFICINA DE CONSTRUÇÃO Seja qual for odo dessas representações simbólicas também é sistema de contato com o divino e de seu dessempre o mesmo! pertar em que nos aprofundemos, veremos que aPara esclarecer melhor esse significado inalterá “viagem de retorno” que o Livro egípcio dos mortosvel, vamos considerar como exemplo o navio ce apresenta é a mesma do Apocalipse. E agora, semleste de Yima no Vendidad – o livro de Zaratustra dúvida, podemos compreender quando se diz de– capítulo 2:25. Como se sabe, Yima faz primeiro Jesus Cristo: “Do Egito chamei meu Filho”. Essasuma wara, um cercado, um local de trabalho. palavras apontam para a mensagem de salvaNessa wara, seguindo as leis da vida universal, ção que não se altera: tanto ontem como hoje,ele constrói para si uma argha, um novo veícu permanece a mesma. Elas apontam para a única elo. O homem que se encontra dentro da wara é mesma missão, o único e mesmo caminho, a únium livre-construtor: ele trabalha com um novo ca e mesma verdade, a única e mesma missão domartelo e uma nova palavra. Ele é o homem que livre-construtor. O que era velho passou. Vede,organiza para si um novo lugar de trabalho: é o eis que tudo se tornou novo!homem que se distancia resolutamente da vida Então, em que sentido devemos compreender osdialética, que entra no novo campo de vida para tempos atuais? O velho sempre se manifesta emali construir sua argha. Portanto, argha, barco nova forma, de acordo com os acontecimentossolar, navio celeste, são designações místicas para da época e as situações nas quais a onda de vidasimbolizar o homem divino que está iniciando humana tem sua missão a cumprir – e tambémsua viagem para a pátria original. de acordo com os grandes processos cósmicosPara começar essa viagem e conseguir construir de desenvolvimento. Por isso, muitos alunosuma edificação como essa, é necessário construir preparam-se para, como francomaçons, construiruma wara, delimitar um cercado. Isso significa sua wara e sua argha. A época dos valores vela-que o homem precisa distanciar-se, fundamental dos simbolicamente já passou. O aluno da Escolae estruturalmente, de sua vida habitual. Ele pre Espiritual moderna é agora colocado diante doscisa separar-se de um tipo de vida e de um meio sete aspectos de seu microcosmo, diante de seusde vida que são evidentemente falsos. Ele terá de sete campos de vida. Esses sete campos de vidamoer a terra – ou seja, o eu da natureza inferior com seus centros de consciência, esses sete rishis– e renunciar ao eu, no interior da wara que ele com seu estado de ser, devem ser regenerados. por que existe uma rosa-cruz moderna? 5
Para tanto, existe uma força e um novo toque. E “trevas”, e assim poderíamos ler o conhecidoquando falamos de um novo campo de vida, fala fragmento como: “Das trevas chamei meu Filho”.mos também de uma nova escola de consciência Essa explicação da palavra pode conter uma liçãosuperior relacionada a ele. Com o auxílio dessa significativa para qualquer buscador, pois, seescola, o ser humano sétuplo precisa construir sua antes se podia falar de trevas, quanto mais emwara. Nela, está à disposição do aluno uma filo nossos tempos!sofia abrangente, esboçada com clareza, para que Será que já houve, na História do mundo, tantaele possa orientar-se perfeitamente. Nesse novo perturbação e degeneração, e de tão grandes procaminho, pode e deve ocorrer uma separação porções? Afinal, em todos os domínios da vida, onítida entre o homem que está dentro e fora da que é anormal não está sendo levado ao extremowara: no interior e no exterior do lugar de traba em nossos dias? E é neste estado de trevas quelho. Esse fato tem consequências que podem ser todo “Filho” de Deus é chamado! Todo homemmedidas. Enquanto um dos homens fica preso à traz em si, em seu sistema microcósmico, o vervida convencional, o outro entra no navio celeste. dadeiro Filho de Deus. Porém, ele está aprisionaNeste último, ocorrerá uma mudança total. E essa do em meio à mentira e ao falso humanitarismo,mudança, para ser bem sucedida, precisa levar em atado à obscuridade e à ignorância. Agrilhoadoconta as condições espirituais, cósmicas e atmos e preso, ele é, então, chamado por Deus mesféricas de nossa época. mo. Como entender esse chamado de Deus? Um chamado de Deus não é apenas uma voz queO IMPERECÍVEL UNIVERSAL É por isso que já não toca nossa consciência e desperta nossa memóriafaz sentido estudar os métodos antigos de que as primordial: trata-se de uma força atual que atingeescolas do passado se serviram em seu tempo. O o mundo inteiro e toda a humanidade e provocaque valia há um século hoje já não tem sentido processos e desdobramentos profundos e radicais.libertador. “O que era velho passou. Vede, eis Portanto, o chamado de Deus significa que estaque tudo se tornou novo”. É por isso que falamos mos preparados para reagir de forma consciente,de uma Rosa-Cruz moderna, da nova filosofia e harmoniosa e inteligente à força divina atual. Éda nova consciência. Porém, exatamente como o por isso que refletir sobre o passado não tem oFilho, também essas atividades são “chamadas do menor sentido se esquecermos as exigências doEgito”, e isso quer dizer que elas têm origem no momento. Somente quando a expressão “DoLivro egípcio dos mortos. Elas falam e dão testemu Egito chamei meu Filho” recebe um significadonho do imutável universal em uma nova época. verdadeiro e válido também para o aqui e agora eMas “ser chamado do Egito” tem outro significa quando a nova francomaçonaria encontra obreirosdo. Convém chamar a atenção para isso. É que a diligentes é que essa força divina se torna atuantepalavra “Egito” também pode ser traduzida como no homem µ6 pentagrama 3/2012
a energia da luzCURA ATRAVÉS DE BIOFÓTONSA doença faz parte da vida. Em muitos casos, a cura é possível. Porém, também emmuitos casos, não é. Na terra, a recuperação é relativa, pois está ligada à imperfeiçãohumana e ao mundo dos opostos. O homem natural procura consolo, cura, libertação.Uma terapia com biofótons, com ondas de luz, pode proporcionar alívio. Mas somenteuma entrega completa de si mesmo à luz pode ser uma verdadeira ajuda.Sem luz não há vida. Cada célula viva FREQUÊNCIAS PROGNOSTICAM DOENÇAS A precisa de energia para exercer todas as conclusão do holandês Johan Boswinkel foi a suas funções e também para sustentar sua de que, se os corpos consistem em “frequênestrutura. As células humanas (e o corpo tem cias”, é possível medi-las, “extrair” a doende 60 a 100 bilhões delas) captam energia por ça e devolver ao corpo a luz já “reparada”.meio da luz. Os alimentos também captam Em 1983, ele construiu um instrumento paraessa energia e somente crescem porque a luz medir a radiação luminosa de um corpo eneles penetrou. Sem a energia da luz, a vida restaurá-la. Popp já havia desenvolvido umcessaria instantaneamente e a estrutura celular amplificador técnico que mostrava, em nívelmorreria. Seria o fim da vida na terra. microscópico, que as células irradiam uma luzNeste verão, a revista internacional Ode sadia, coesa, ou uma luz caótica que denunciapublicou estudos sobre a cura por meio de um quadro de doença. Mas um corpo humabiofótons. Trata-se de ondas de luz fracas no consiste em bilhões de células, que emique são irradiadas pelas células. Seria uma tem múltiplos espectros de radiação. Por isso,forma de cura no futuro? O fato é que a Boswinkel valeu-se do fato de que a tensãoMedicina moderna, apesar de utilizar a eletromagnética dos pontos de acupunturaquímica para debelar sintomas, é impotente difere da tensão da pele ao seu redor. Quandocontra muitas doenças crônicas causadas por mensurados, podem apresentar dois resultados:nosso estilo de vida contemporâneo. Nunca uma linha reta (formada pela tensão forte evamos conseguir resolver um problema no constante) ou uma hipérbole, prova de umamesmo nível no qual ele se produziu, expli tensão que indica a fraqueza desse ponto.cava Einstein.Na década de 20 do século passado, o russo Exige-se de vós uma nova atitude de vida,Alexander Gurwitch comprovou que todas atitude completamente diversa, uma vida segundo oas células do corpo humano irradiam uma Sermão da Montanha. Contudo, se iniciais o proluz extremamente fraca, à qual deu o nome cesso sem que o campo de luz seja o fator centralde biofóton. A luz também contém todas as em vosso ser, não tereis êxito nessa nova atitude deinformações necessárias para conduzir proces vida... O campo de luz quer manifestar-se para vós,sos bioquímicos muito complexos. No início e, então, pela atividade desse campo de luz, torna-seda década de 80 do século passado, o cientista possível a nova atitude de vida. Da vida segundo a féalemão Fritz Albert Popp demonstrou que para a vida segundo a força e da vida segundo a forçadistorções da luz levam a perturbações nos para a vida segundo a luz: esse é o desenvolvimentoprocessos bioquímicos, o que pode causar do da senda. É a vida que provém da luz, e não a luz queenças (lembremos da “depressão de inverno”). provém da vida. (A Gnose em sua atual manifestação, cap. III-6) a energia da luz 7
Como é que os olhos operam, afinal? Não seria muito maisimportante cuidar da orientação do nosso olhar?Boswinkel aplicou todo o método da eletroa é essencial. Depois de 30 anos de tratamentocupuntura a um arquivo de potências de Ho bem sucedido na Áustria, parece que seu recomeopatia. Registrou as informações sobre as nhecimento científico é iminente.frequências das substâncias trabalhadas dessaforma (diluídas). Essas informações de apro ENTÃO EXISTE LUZ “LIMPA”? Essa é apenas umaximadamente 500 substâncias foram arma parte da história. Porque, quando a luz que azenadas no instrumento de Boswinkel como pessoa atrai (por meio dos olhos, da pele, dos“contrafrequência”. A resultante entre frequ chacras, dos pontos de acupuntura) é converência perturbadora e contrafrequência deve tida por processos bioquímicos e logo depoisser nula: é assim que se comprova um efeito irradiada, provoca um efeito recíproco. Aterapêutico. Portanto, é decisivo saber, pri questão é: qual “luz” ela atrai? A luz artificial,meiro, o que ocasiona a perturbação no corpo. por exemplo, contém apenas parte do espectroSomente quando se sabe a causa verdadeira é e, em caso de influência duradoura, tambémque o aparelho fornece a solução. é causa de perturbação em processos bioquíBoswinkel dá um exemplo: “Na Medicina, a micos. Recentemente saiu em alguns jornais obactéria heliobacter pylori é entendida como a caso de uma investigação que comprova umacausa da úlcera gástrica. Mas, querendo tratar correlação entre profissionais da saúde em sera úlcera gástrica, tratamos a vesícula biliar e viço noturno e o câncer de mama.não a contaminação bacteriana do estômago. Portanto, existem muitas imperfeições nas cirQuando órgãos e glândulas estão extenuados, cunstâncias da vida de cada um. Será que, emo sistema imunológico já não funciona em seu nossa sociedade ocidental ainda é possível assimiponto ótimo. O resultado é que o corpo apre lar luz “limpa” por meio das células? Em outrassenta uma susceptibilidade, e as bactérias, por palavras: para que luz o homem se abre? E, porexemplo, podem aproveitar-se disso”. Até aqui, fim: será que existe mesmo “luz limpa”? Somosvemos o incrível relato a respeito da aparelha suficientemente objetivos para avaliar isso? E ogem de Boswinkel sobre o paciente, que está que nós mesmos podemos fazer a respeito? Acom eletrodos no dorso das mãos e debaixo dos propósito, somos capazes de reconhecê-la? Não épés e recebe de volta sua “própria luz” de “for verdade que, com relação a isso, só existe conma invertida”. Para tanto, o diagnóstico correto fusão e conflito por toda parte? Não é fato que8 pentagrama 3/2012
aquilo que alguém vivencia como positivo outra Moholy-Nagy. Instalaçãopessoa acha repulsivo? Então: para onde devemosdirecionar os olhos? A que luz podemos conectar tos. Uma energia luminosa superior pode, por-nos? Como é que os olhos operam, afinal? Não meio de um órgão interior, atingir nossa alma.seria muito mais importante cuidar da orientação Contudo, para isso é preciso que nos voltemosdo nosso olhar? firmemente para uma corrente de fótons deOs textos antigos também falavam a respeito da informações puras; assim, pouco a pouco nosluz. “Nele [no Verbo] havia vida, e a vida era a desligaremos das frequências sombrias do eu.luz dos homens. E a luz resplandece nas trevas, Essa informação de luz realiza outra cura, umamas as trevas não a compreenderam.” “Ou”, diz cura de outra ordem. Depois de ter conseguidoJ. van Rijckenborgh , “em outras palavras: em obter força dessa luz, a alma torna-se conscienseguida à manifestação do campo de força, vem te. É assim que ela se estabelece em um campoa manifestação do campo de luz; e a caracterís de vida próprio e emerge da morte física µtica mais importante desse campo de luz é serele também um campo de vida. Unicamentepela manifestação da luz é que o campo deforça se torna um campo de vida onde todos osalunos da Escola Espiritual gnóstica são acolhidos. O corpo magnético da Escola Espiritualtransformou-se em campo de luz, em campo devida.” Quanto a isso, também vale dizer queluz é vida. Mas qual luz, qual vida? Uma vezque, evidentemente, não temos órgãos parareceber essa luz e, portanto, não conseguimoscaptá-la, não nos é dado viver uma vida decrescente satisfação, em perfeita harmonia como divino. Desse modo, depois de cada momento feliz voltamos à realidade cotidiana.OBTER INFORMAÇÕES DE LUZ Talvez só existauma forma de abrir-se: a entrega total do eu aessa outra luz, que é um auxílio para o ser humano. A cura terrena é relativa, pois está sujeita à deficiência humana e ao mundo dos opos- a energia da luz 9
o mundo parece umafoto superexpostaSem luz não há vida. Mas o mundo dos homens parece uma foto superexposta.A informação central, nuclear, a imagem primordial, acabou ficando desfocadaporque a informação sofreu superexposição. De fato: a luz de um campo de vidapode transmitir informações relativas a ele. Mas quem se atreve a levantar o véude Ísis e ver a si mesmo?Todo ser humano precisa de luz. To Cada partícula de nosso ser é permeada pela das as criaturas dependem da luz para luz primordial, que não se deixa reconhe manter-se e crescer. Do ponto de vista cer tão facilmente. Quando a consciênciaespiritual, luz é outra palavra para vida. A luz está voltada para fora, a luz fica aprisionadapura esteve presente desde o início de toda a na matéria e não consegue manifestar-se.criação. Ela é a força conservadora e a base Assim, a composição dos átomos torna-sede todas as coisas. cada vez mais densa. Quanto mais descePara as culturas antigas (por exemplo os mos na matéria, tanto mais encarceramos aegípcios, os incas e os maias), a luz, repre luz em nossos átomos. Esse estado perdurasentada pelo sol, foi o mais elevado objeto de muito tempo até que o homem inicie suaveneração. Por essa razão, todos esses povos busca pela luz. Quando essa busca penetraconstruíram templos solares e pirâmides para suf icientemente em seu ser, o ânimo tamo sol. A esfinge de Gizé também pode ser bém muda e evoca uma mudança interior.vista como homenagem ao deus da luz. Esse Um ânimo puro, que eleva o ser em fogo eguardião de pedra – o homem espiritual que chamas, muda a estrutura atômica. Assim,se eleva do animal – dirige o olhar ansioso, o homem já pode aproximar-se do fogo dacheio de sabedoria e conhecimento, para o alma primordial.oriente: onde todos os dias o sol aparece nohorizonte. O sol simboliza a vida renascida A SENSAÇÃO BÁSICA Mas, apesar disso,que aparece a leste no horizonte. Do mesmo quantas vezes o homem busca a luz fora demodo, os sepulcros reais egípcios, na margem si mesmo? Quantas vezes ele não a encontraoeste do Nilo, onde o sol se põe, são símbolos ou é ofuscado pela luz ilusória? Entretanto,da vida passada. a verdadeira luz vibra em cada átomo do seu ser. Todos conhecemos a expressão: “O rei-A CONSCIÊNCIA VOLTADA PARA O EXTERIOR no de Deus está mais perto que mãos e pés.”A luz solar, Amon-Rá, é símbolo da energia A sensação básica de um buscador é a faltavivificadora, eterna. Ela conserva a terra, permanente de Espírito e de reconhecimentomilênio a milênio, porque carrega em si a do Espírito. Por isso, muita vezes ele enconvibração-luz da eternidade. O homem con tra-se inquieto e sem descanso, faminto, catemplativo nela pode encontrar inspiração, luz rente da união com o Espírito, sentindo umespiritual e alimento para a alma – alimento vácuo interior que precisa ser preenchido.que não se encontra na luz artificial. Somente o Espírito é a perfeição que consegueNosso corpo também é uma forma compos preencher esse vazio. Não é verdade que temosta de luz, uma energia condensada de luz. preenchido inevitavelmente esse vazio com10 pentagrama 3/2012
As múltiplasesculturas decavalos e cavaleirosde Marino Marini(1901-1980) repre-sentam todos ospossíveis estados deânimo do homem.A escultura, pre-sente nos jardins doSmithsonian Castle,em Washington DC,irradia intensa etotal devoção à vida o mundo parece uma foto superexposta 11
Para poder desvelar a imagem são necessários aprofundamento,purificação e autoconhecimentouma porção de coisas? É que o homem, devido APROFUNDAMENTO, PURIFICAÇÃO E AUTOà sua natureza, não consegue conviver com o CONHECIMENTO Quem tira o véu da imavazio. Ele se encapsulou no núcleo endureci gem morre segundo seu antigo estado de ser.do de seu ser exterior, alimentado por coisas Para poder desvelar a imagem, são necessáriosexteriores. Desse modo, separado do Espíri aprofundamento, purificação e autoconheto, é como se ele morresse ou sufocasse. Para cimento. Entre a consciência da personaliescapar desse casulo, ele precisa erguer o véu dade humana e o verdadeiro conhecimentode Ísis: o véu da ilusão e da ignorância. Assim da alma existe sempre um véu. Ele vela umaque o véu de Ísis for retirado, podem ser co verdade que é tão grande e elevada que nãomemoradas as núpcias com Osíris, o princípio pode ser compreendida pelo pequeno ego,espiritual. Da ligação de Osíris com Ísis nasce por maior que este seja. A antiga doutrina dea criança-sol: Hórus, o Cristo interior. sabedoria indiana fala de Maia, do véu queNo templo em Saís, no Egito, foi encontrado a consciência-eu interpõe entre si mesma e ao misterioso quadro de Ísis-com-véu, com verdade absoluta.a inscrição: “Eu, Isis, sou tudo o que foi, é Para o homem que vive na consciência divie será. Nenhum homem mortal jamais tirou na, a realidade está desvelada.meu véu”. Essa realidade desvelada está oculta dentroPor que Ísis está velada e por que continua do próprio homem. Quando o homem busvelada ainda para tantos? cador, faminto por solucionar o enigma da12 pentagrama 3/2012
existência, começa a sondar o reino divino Assim resplandeça a vossa luz! Essas palavrasdentro de si, tudo o que é velho desaparece soam como se fossem conhecidas. Mas o homeme a ilusão da existência separada pode dissol tende a relegá-las a um passado longínquo ao invésver-se na luz que perpassa tudo o que é vivo. de colocá-las na vida presente. “Assim resplandeça aA imagem de Ísis velada é um belo símbolo. vossa luz!” O corpo material não consegue entenderEla nos revela o segredo da alma primordial, isso. O núcleo primordial latente no coração despertaa menos que estejamos “vendo como cegos a pré-memória de nosso ideal espiritual, nossa missãoe ouvindo como surdos”. Uma consciência de vida. Assim, ficamos conscientes de que nãovoltada para a matéria não reconhecerá o conseguimos renegar nossa procedência. Ainda mais:segredo atrás do véu. O véu retira-se diante somos interpelados a comprovar isso com palavrasdo homem que anseia pela solução do enigma e atos – ou melhor, com atos e palavras. “Bemda Ísis-com-véu. Quem levanta o véu apenas -aventurados são os que ouvem a palavra de Deus e apara ver quem se encontra atrás dele, morre. guardam, e a transformam em atos.”Mas quem ergue o véu para superar a consciência-eu, encontrar-se-á frente a frente com do homem e mantém a discórdia entre cabeçao Espírito divino. e coração. Cabeça e coração apenas poderão chegar a uma união, ao desvelar de Ísis e àsEntão, chega o fim de sua individualidade núpcias com Osíris, quando a serpente daapartada dos outros seres humanos. Ele en cobiça que existe no homem, no velho fogoxerga os olhos mortos da imagem e reconhe serpentino, extinguir-se.ce dentro de si mesmo a alma primordial quevive desvelada dentro dele, esperando pela Somente então a luz – a radiação espiritualunião com Osíris, o Espírito. O véu caiu, da fonte primordial do universo – transita empois nós mesmos somos a chave para o misté um novo círculo de unidade através do sisrio da Ísis velada. tema vital. Então a serpente morde a própriaSomente a alma primordial consegue desvelar cauda. A eternidade irrompe no tempo, ou,Ísis. Afinal, Ísis é ela mesma! Assim também como os antigos diziam: o Cristo interior, oentendemos o texto na imagem: “A fruta que sol espiritual, nasce dentro de nosso coração.produzi é o sol”.A luz divina dentro do homem não conhece A luz atemporal coloca de lado os véus aso mundo da ilusão. Sentimos a dor do exces trais turvos. As trevas, e por isso as motivaso da luz artificial, da luz da cobiça, dentro ções pelas quais vivemos ou fomos vividos,do coração? A serpente da cobiça é uma cor são desmascaradas. A luz, que esteve encarrenteza que existe de fato no sistema de vida cerada, varre as trevas. Somos novamente cingidos com a veste-de-luz! µ o mundo parece uma foto superexposta 13
luz nas coresdo arco-írisA água, que capta a luz do sol, reflete um arco-íris. Sua luz sétupla évida: sete cores mágicas da construção, da libertação...D“ eus é luz”, dizemos, e os homens expe parece ser plano, mas redondo, como um tubo rimentam a luz do sol como um sinal ou uma coluna sobre a água. E, com o sol bem visível dessa afirmação. Mas somente baixo, reconhecemos uma coluna quase verticalconseguimos perceber a luz quando ela se reve composta das cores do espectro.la no espectro das cores do arco-íris. O mais incrível é que um arco-íris não é umaNuma posição elevada, por exemplo, num avião realidade física, mas sim um efeito óptico queou no pico de uma montanha, conseguimos ver se apresenta ao olho humano suscetível àso efeito óptico das cores espectrais refletidas por cores. Não conseguimos, por exemplo, aproxinuvens escuras – e até como um anel, do qual mar-nos de fato de um arco-íris. Embora nãoseríamos o centro. Mas isso evidentemente só represente uma realidade física, ele tem umacontece enquanto estamos de costas para o sol. efeito enorme e muito agradável sobre o ânimoQuando percebemos a representação de nossa humano. Muitos autores e poetas já trataramsombra no meio dessa aura colorida, na neblina, desse assunto. Desde os primórdios dos tempos,talvez pensemos que o Divino, como uma ponte o arco-íris é símbolo da esperança. No livro doou uma porta, também esteja apontando para Gênesis, cap. 9, versículos 14, 16 e 17, é dito:algo que sempre nos envolve. “E acontecerá que, quando eu trouxer nuvensCaminhamos pelos cumes ou os escalamos, sobre a terra, aparecerá o arco nas nuvens (...)talvez vagando sem rumo na neblina. E quandoa neblina de repente se abre ao sol, surge no E estará o arco nas nuvens, lado nebuloso a figura misteriosa cercada pelo e eu o verei, anel colorido. A imagem fica conosco. Ela nos para me lembrar da aliança eterna acompanha passo a passo, até que a neblina se entre Deus e toda a alma vivente (...) dissolve e enxergamos de novo, nítido, o caminho diante de nós. Essa imagem que se associou E disse Deus a Noé: a nós como um guarda na neblina parecia querer Este é o sinal da aliança indicar algo. Uma antiga designação para esse que tenho estabelecido fenômeno do halo é a palavra “nimbo” – ima entre mim e todos gem sagrada. seres vivos na terra”.UNIÃO ETERNA Quando nos encontramos na A própria luz recebida por nossos olhos não superfície da água ou próximo dela e uma é percebida conscientemente. Ela só pode extremidade do arco-íris a toca, vivenciamos ser reconhecida pelo cérebro pela refraçãooutra forma desse efeito prismático, que en prismática numa gota de água ou pelo reflexo canta o observador. Nessa situação, o arco não sobre um objeto. Parece que a luz precisa de 14 pentagrama 3/2012
© H.N.Werkman luz nas cores do arco-íris 15
Imagem da página 15: Nos contos hassídicos,compilados por Martin Buber, cavalos ecarroças têm um papel importante: elessão o veículo misterioso com o qual oprofessor se movimenta entre diferentesdimensões e também no plano físicoIlustração: H.Werkmanalgo para ser conhecida por nós: algo sobre o consciência. Ela não encontra nenhum reflequal ela possa refletir-se. A luz pode refletir-se xo direto dentro de nós simplesmente porquesobre matéria sólida. Assim, tanto a matéria, dentro de nós nada existe que possa refleti-la, ecomo também a luz se tornam perceptíveis para por isso também não a percebemos.nós. Também nós, conscientes de nós mesmos,igualmente somos constituídos por esses aspec O SEGREDO DA ARCA Mas se não conseguimostos. Contudo, quando os gnósticos falam “Deus perceber a luz divina, como devemos entenderé luz”, não estão pensando na luz solar conhe a história de Noé, para quem Deus mostroucida por nós. Eles não se dirigem à luz da nossa muito bem esse sinal? Noé é o construtor daconsciência. A luz divina possui um nível de arca – do “lugar protegido” ou “da escolavibração total e inteiramente diferente da nossa de mistérios” – que, depois de sete meses de16 pentagrama 3/2012
A luz invisível divide-se em sete cores visíveisde uma dimensão totalmente diferenteviagem – ou após sete fases (etapas) – chega ao Depois, com a cor laranja de uma nova leveza,monte sagrado Ararat, à região divina. Vemos uma nova alegria transpassa o ser, e o pranaque a arca está a caminho até que a pomba – divino começa a fluir no sistema nervoso.isto é o próprio Espírito divino (Espírito Santo)– permite reconhecer que a base sólida da nova Quando esse novo prana está integrado no ser,vida foi atingida. manifesta-se no homem um amarelo brilhante: aQuem reflete a luz divina é o homem, Noé, cor de uma nova consciência. Surge uma novana arca construída por ele para salvar e pro capacidade de pensar que deixa tomar formateger um grupo de almas a ele confiado. Ele uma realidade cada vez mais diretamente inspireflete o arco-íris porque passou pela silen rada pelo Espírito.ciosa tranquilidade. A cor verde de uma nova fé fundamentada emA luz refletida por Noé é a vida renovadora, um conhecimento progressivo do novo estadoconstruída setuplamente. Durante a construção em desenvolvimento e a graça que é experida arca, a luz branca divide-se processualmente mentada cada vez mais trazem forte esperançaem sete raios auxiliadores, sete cores mágicas baseada na verdade: o azul de uma perspectivada construção. Essa divisão espectral coloca-nos cada vez mais nítida no horizonte da vida. Ofrente aos sete degraus do processo da transfi azul também representa uma nova capacidadeguração. Assim, Noé constrói sua arca e, com a dos órgãos sensoriais.bússola da luz que o toca, percorre o caminhodurante sete meses, até chegar ao final seguro. Assim, a arca inteira – o grupo – irradia em um campo de força de cor índigo, dirigida por umaQuando, no processo da transfiguração do energia dinâmica nesse maravilhoso processogrupo que forma a arca, quando a luz invisí da gênese da alma-espírito, enquanto valoresvel se divide em sete cores visíveis, portanto etéricos supraterrenos de cor violeta comprovampraticamente num fenômeno de renascimento, a realidade da libertação.esse acontecimento já não se refere às cores quepodemos perceber, mas sim a um espectro de Esse mistério sétuplo da luz é o mistério daefeito totalmente diferente. libertação, e durante a realização das sete fases da construção da arca, o homem e o grupo sãoO NOVO ARCO-CÉU O vermelho especialmente envolvidos por um novo arco-céu, com brilhoclaro do primeiro toque suave no coração mi eterno, como um sinal vivo da ligação entre ocrocósmico derrama-se no coração da persona ser humano e Deus µlidade, no ser sanguíneo, e liga-se a ele. luz nas cores do arco-íris 17
per aspera ad fontes“Já faz muitos anos que os assuntos abordados pela Bibliotheca Philosophica Hermeticadeixaram de ser marginalizados. Pelo contrário: atualmente, eles estão exatamenteno centro, na vanguarda de um dos acontecimentos mais excitantes e inovadoresdos estudos internacionais voltados para a humanidade”. Assim argumentou WouterHanegraaff, Professor de História da Filosofia Hermética, em sua palestra de reaberturada Biblioteca, no dia 16 de dezembro de 2011.Wouter J. Hanegraaff termos como “rosa-cruz” ou “teosofia” a fenômenos marginais, sectários ou suspeitos.Uma biblioteca é uma memória. Romances policiais esotéricos, como os A existência de bibliotecas nos faz bestsellers de Dan Brown, aproveitam-se des lembrar quem fomos um dia, como ses termos, mas não os utilizam com seriecultura e sociedade. Mas elas são muito mais dade. Até mesmo o público comum não sabeque uma simples lembrança do passado: man para que serve uma biblioteca como a Biblio-ter esse passado diante do olhar nos permite theca Philosophica Hermetica. Na verdade, essasaber quem somos. Afinal, nossa identida ignorância é sintoma da perda de memóriade pessoal baseia-se na lembrança de nossa coletiva dos próprios fundamentos da nos-vida passada. Por isso, perder nossa memória sa cultura e da nossa sociedade, e isso vemequivale literalmente a perder nossa iden acontecendo desde o século XVIII. Mas essatidade. Do mesmo modo, nossa identidade percepção está em vias de ser ultrapassada,coletiva baseia-se em nossas lembranças. Elas porque há décadas os acadêmicos especianos revelam a forma como evoluímos até nos listas em ciências humanas trabalham paratornarmos quem somos e mostram o percur corrigir essa amnésia generalizada. Trata-seso que seguimos até o lugar em que nos en de uma pesquisa que vai além das fronteirascontramos. Somente assim alicerçados – isto das disciplinas mais conhecidas, e que ocorreé, com base em uma sólida compreensão da no âmbito da religião, da ciência, da filosofianossa identidade e de seus fundamentos – é e das artes, e deve ser vista em suas interque seremos capazes de tomar decisões res relações, se quisermos fazer justiça ao papelponsáveis em relação ao nosso futuro – como essencial da filosofia hermética e correntesindivíduo e como sociedade. Por tudo isso, a relacionadas à cultura ocidental.preservação de bibliotecas é uma questão deimportância cultural, social e até política. LENTA REVOLUÇÃO Os resultados fundaCom base nessa perspectiva, a Bibliotheca mentais das pesquisas ecoam lentamente naPhilosophica Hermetica tem uma característica consciência do conjunto da sociedade. Masmuito especial, da qual podemos orgulhar-nos: ela é uma coleção única e específica, Painel da entrada da exposição “Fogo Eterno” naque esclarece nosso passado – um passado Bibliotheca Philosophica Hermetica. Trata-se de uma re-que, se não fosse por ela, ainda recentemente produção extraída de uma obra de Jacob Boehme, edi-estava ameaçado de cair no esquecimento. ção de William Law. Esse diagrama colorido de DionísioMuitos têm dificuldade em entender o termo Andreas Freher (1649–1728) simboliza a relação entre“filosofia hermética” (quer dizer filosofia Deus, homem e cosmo; ou entre macrocosmo, cosmo ehermenêutica?, diziam os colegas bem-inten microcosmo – o homem é um pequeno mundocionados). A mídia, principalmente, associa18 pentagrama 3/2012
É PRECISO REVER OS FUNDAMENTOSDE NOSSA IDENTIDADE ATUAL per aspera ad fontes 19
Wouter Hanegraaff durante o diálogo de abertura para ele, a verdadeira ciência só floresceu nocom Esther Oosterwijk, diretora da BPH. século XVII, depois que essa superstição foi extirpada.quem tem consciência da evolução sabe Sarton descreve a revolução científica emque atualmente vem acontecendo uma len termos dramáticos como: “Uma luz que vemta revolução, em nível internacional. Essa crescendo e engolindo as trevas”.1 Para ele,revolução tem consequências profundas e essas “trevas” são a superstição e a magia.acaba modificando a forma como vemos as “A ciência é essencialmente progressista,“grandes narrativas”, tanto as tradicionais enquanto a magia é essencialmente conservada civilização ocidental como as atuais – e, dora”, define. “Não pode haver compromissoportanto, nossa própria identidade cultural e entre elas. Não podem caminhar juntas –social. uma vai para frente, e a outra vai para trás.”2O que vem a ser o interesse pelo hermetis Muitos ainda pensam dessa maneira, tantomo? Para dar um exemplo concreto, gostaria no mundo acadêmico como na sociedade emde começar, antes de tudo, com uma pessoa geral. Há pouco tempo, ouvi um eminentemenos evidente: George Sarton. De origem físico holandês alegar, com toda a inocênbelga, químico e historiador, muitas vezes cia, que a insanidade temporária que Isaaccitado como o “pai da história da ciência”, Newton sofreu ocorreu enquanto ele estavaem 1912 ele fundou a revista Isis. Esse pe preocupado com a alquimia. Essa insanidaderiódico é publicado até os dias atuais pela deve, contudo, ter durado muito tempo, seHistory of Science Society, e é considerado uma considerarmos que seus manuscritos sobrepublicação de referência sobre o assunto: o alquimia são mais numerosos do que seusque a Nature representa nas ciências natu textos sobre física e óptica. Ele devotou maisrais, a Isis representa no campo da história. de um milhão de palavras à alquimia.Sarton foi um representante típico da visão Sarton cometeu um erro fatal que os cienpositivista da opinião científica, e considera tistas não podem se permitir: ele julgou exva questões como astrologia, alquimia e ma cathedra, sem se aprofundar na história daquigia natural como perniciosas pseudociências: lo que ele tanto desprezava como “magia”. Ele disse explicitamente: “Um historiador da ciência não pode devotar muita atenção ao estudo da superstição e da magia, isto é, da irracionalidade […]”. A loucura do ser huma no não oferece progresso, é imutável e ili mitada, e seu estudo é uma empreitada sem20 pentagrama 3/2012
O que um acelerador de partículas significa para um físicoé o que uma biblioteca significa para a humanidadeesperança.3 Um contemporâneo de Sarton, de Newton6, apresentou seu estudo sobreo historiador americano Lynn Thorndike, os numerosos manuscritos alquímicos depensava de modo diferente: a pesquisa deve Newton em uma importante conferência.vir em primeiro lugar, e somente depois A historiadora Margaret Jacob estava entrepode vir o julgamento. Ele dedicou sua vida os presentes e lembra-se do que aconteceu:à incrível, abrangente e rigorosa pesquisa de houve suspiros audíveis, e sob a enxurraarquivos, exatamente sobre esse assunto, e da de perguntas hostis, Westfall retrucavapublicou entre 1923 e 1958 um trabalho em implacável: “Eu não escrevi estes manusoito partes.4 Concluiu que as fronteiras entre critos”, ou palavras a propósito.7 De fato,magia e ciência, pelo menos até o século quem escreveu foi Newton – um dos maioresXVIII, eram tão sutis que era simplesmente gênios da história –, mas muitos dos colegasimpossível praticar história científica sem se de Westfall tinham grandes dificuldades paraaprofundar em temas como magia, astrolo encarar esse fato, e pensavam saber maisgia e alquimia. O próprio Thorndike ainda do que esse grande homem. Felizmente, atinha um pé na mentalidade positivista, mas ciência está organizada de tal modo que, aoseu trabalho abriu as portas para uma visão longo do tempo, os argumentos e evidênciasmuito mais diferenciada e mais precisa, mos empíricas quase sempre vencem os precontrando como a história da ciência está entre ceitos. As fontes não mentem: portanto, nãolaçada com temas herméticos. só os historiadores sérios da ciência sabem agora que Newton estava de fato intensaTRADIÇÃO HERMÉTICA Não há dúvida de mente preocupado com a alquimia, comoque, dentro da disciplina da História da Ci também ficou cada vez mais claro que asência, o conflito entre Sarton e Thorndike excelentes razões que motivaram seu interespende a favor do último. Desde os anos se originavam-se do contexto científico de1960, um número cada vez maior de histo seu tempo. Dessa forma, começamos a focarriadores está estudando a tradição hermética, os aspectos mais importantes da História dainfluenciados principalmente pela pioneira Ciência – aspectos para os quais as geraçõesinglesa Frances Yates.5 Na verdade, desse anteriores estavam completamente cegas.modo foi dada uma atenção especial ao papel Nesse caso, Newton foi a sensacional pontada alquimia no trabalho de Isaac Newton. de um grande iceberg. Por exemplo: RobertNão que isso tenha ocorrido sem conflitos. Boyle, o principal pioneiro da química, noDurante os anos 1970, o grande historia decorrer de sua carreira, não se afastou dador da ciência, Richard Westfall, autor da alquimia. Ao contrário: à medida que enveimpressionante e extraordinária biografia lhecia e seu conhecimento aumentava, ele, per aspera ad fontes 21
Começamos a perceber mais claramente que as “grandesnarrativas” do estudo da história tradicional foramdemasiadamente seletivasna qualidade de cientista, ocupava-se cada fontes nessas áreas levou a uma nova comvez mais intensamente com a alquimia.8 Na preensão de como os princípios fundamenverdade, isso não corresponde à imagem que tais da ciência – e, portanto da nossa culturao caracteriza, nem a seus resultados cientí moderna e da sociedade – foram alcançados.ficos, mas esse fato confirma inegavelmente E, em terceiro lugar, que essa revolução jáas próprias fontes. A esse respeito, Newton começou algumas décadas atrás, e atuale Boyle não foram uma exceção, mas reve mente está em pleno andamento. Isso signilaram-se representantes da ciência daquela fica que os assuntos tratados pela Bibliothecaépoca: no período da revolução científica Philosophica Hermetica não se concentram eme até mesmo depois, o estudo da alquimia questões marginalizadas, como alguns penparece realmente ter sido parte integrante da sam aqui e ali. Pelo contrário, esses assuntos“ciência normal”. estão exatamente no centro, na vanguarda, com números bem interessantes, com aconESSENCIAL E ABSOLUTAMENTE NORMAL O tecimentos inovadores atualmente estudadosprocesso de desenvolvimento acontece rapi pela humanidade no âmbito internacional.damente. A revista Isis - Current Bibliography A História da Ciência é um exemplo disso:of the History of Science (Isis - Bibliografia um desenvolvimento semelhante está aconContemporânea da História da Ciência) tecendo em todas as disciplinas das ciênciaspublicou durante anos (primeiro apresentada humanas – e não é válido somente para opor Sarton), a categoria-padrão intitulada início da época moderna, mas para todos os“Pseudociência”. Mas menos de uma década períodos presentes e os que virão. Comeatrás, em 2002, os editores decidiram que çamos a perceber mais claramente que asesse tipo de publicação já não era compatível “grandes narrativas” do estudo da históriacom os avanços no conhecimento científico: tradicional foram demasiado seletivas, pora bibliografia é adaptada para incluir cate que, com base em uma ideologia predetergorias separadas apenas em “Ciências ocul minada, estabeleceu-se o que é sério e otas e Magia”, “Astrologia” e “Alquimia”, e que não é sério para fazer-se uma pesquisa.sem qualquer designação pejorativa. A partir Vamos pensar, por exemplo, no filósofo Mardesse exemplo, podemos concluir pelo me- silio Ficino – o primeiro tradutor do Corpusnos três coisas. Em primeiro lugar que, aos Hermeticum e de todos os diálogos de Platão.olhos estranhos, assuntos não científicos são O platonismo que permeia o Renascimentoconsiderados pelos especialistas temas impor Italiano, da arte e da literatura à filosofia etantes perfeitamente normais para pesquisas. à religião, é inimaginável sem seu trabalho,Em segundo lugar, que o estudo rigoroso das mas Ficino ainda aparece no estudo tradicio22 pentagrama 3/2012
nal da História da Filosofia apenas como uma em todas as áreas da “História da Filosofianota de rodapé, porque ele se desviou demais Hermética e Correntes Relacionadas” é odaquilo que um dia Descartes havia consi de uma nova imagem que está começandoderado como “verdadeira filosofia”. Somen a emergir da história e da cultura de ondete agora, há algumas décadas, Ficino e seus todos nós viemos. Isso significa que precisanumerosos simpatizantes têm sido levados a mos rever séria e inteligentemente a base dasério. Quantos historiadores da filosofia não nossa identidade atual. O que um aceleradorresistem ainda a essa tendência, e mesmo a de partículas significa para um físico é oabsorver novas e profundas concepções sobre que uma biblioteca significa para a humaa estrutura da História da Filosofia em parti nidade. Nas ciências, muitas revoluções quecular e sua relação com as disciplinas próxi fizeram mudanças no mundo originaram-semas como a Teologia e a Física! das dificuldades, consumindo paciência eO mesmo também se aplica a Giordano Bru muitas vezes um trabalho altamente técnicono, um dos primeiros defensores da visão de de pesquisadores com jalecos brancos, ocumundo de Copérnico e do universo infinito, pando-se com medidas exatas, observaçõese que em 1600 foi queimado como herege e cálculos que eram entendidos somente porem Roma, sendo hoje reconhecido como um outros especialistas. Na ciência humana nãodos pensadores mais originais de seu tempo. é diferente. Os novos conhecimentos que enComo quase todos os pensadores (maiores riquecem o mundo quase sempre se originame menores) cujos trabalhos são reunidos na do trabalho de especialistas treinados que,Bibliotheca Philosophica Hermetica, é impossível por vezes, participam cuidadosamente deencapsular Giordano Bruno nos limites de uma investigação bem detalhada das fontesuma disciplina. Somente uma inteligência escritas e do material impresso (equivalenteigualmente aberta pode compreender todas às partículas fundamentais da ciência espirias dimensões de sua obra: religiosa, filosófi tual). Portanto, o legítimo lema da Bibliothecaca, científica e até mesmo nas artes plásticas. Philosophica Hermetica é Ad Fontes (retorno às fontes). As palavras luminosas “o amor deSURPREENDER O MUNDO É possível encon Deus vive nos detalhes” pode ser plenamentetrar uma série de outros exemplos da mesma aplicada nesse campo. Por pelo menos deznatureza, não apenas em relação ao período anos, aqui na Bibliotheca Philosophica Herme-anterior (sobre o qual se concentra a Biblio- tica, estive envolvido na pesquisa sobre umtheca Philosophica Hermetica) mas também so filósofo injustamente esquecido: Lodovicobre o período que vai do séc. XIX a nossos Lazzarelli, que viveu na segunda metadedias. O efeito cumulativo de novas pesquisas do século XV. Grandes estudiosos como per aspera ad fontes 23
Wouter J. Hanegraaff é professor de Históriada Filosofia Hermética e Correntes Relacionadas daUniversidade de Amsterdã. Publicou: Religião da NovaEra e da Cultura Ocidental (1996) e Ludovico Lazzarelli(1447-1500), com R.M. Bouthoorn (2005). Ele também é editor do Dicionário da Gnosis e do EsoterismoOcidental (2005).Paul Oskar Kristeller, Daniel P. Walker e pesquisa detalhada é muitas vezes necessárioMoshe Idel “quebraram a cabeça” estudando um grande número de fontes relevantes e sio significado da obra-prima do misterioso multâneas. É preciso estudá-las em conjunto,Lazzarelli, o Crater Hermetis (a cratera de e isso só é possível em uma biblioteca comoHermes). Para os que nunca lidaram com a Bibliotheca Philosophica Hermetica, que tentaesse tipo de trabalho é difícil imaginar, mas reagrupar, num mesmo espaço, os documena chave acaba sendo revelada em poucas pa tos originais e toda a literatura especializalavras latinas. Se o abordamos com base no da que com eles se identificam. Assim, porpróprio espírito de sua argumentação, Lazza alguns anos, encontrei-me na sala de estudosrelli cita uma passagem célebre (e inúmeras dessa biblioteca, a fim de comparar os senti-vezes temida!) de Asclépio no Corpus Herme- dos atribuídos a determinados termos, comticum, que tanto havia inquietado terrivel base no maior número possível de traduçõesmente, em sua época, o pai da Igreja, Agos e edições quatrocentistas e quinhentistas dotinho. Mas Lazzarelli traz algumas mudanças Corpus Hermeticum. Trata-se de um tipo depequenas, de menor importância. Se alguém pesquisa que, literalmente, não se encontralevar a sério, no entanto, as variedades e em nenhum outro lugar no mundo, somentemotivos da pesquisa, parece que em dado aqui em Amsterdã, porque só neste lugar tomomento todas as matrizes se deslocam com das as fontes e edições diferentes estão fisicao olhar do pesquisador, e toda a natureza mente presentes. Assim é possível colocá-lasreal do trabalho de Lazarelli torna-se, en na mesa lado a lado, e andar de uma estantefim, clara como o dia.9 As implicações dessa para outra para apanhar a literatura.descoberta acabaram indo além de Lazzarelli. Isso nos obriga a uma revisão radical ÁRIDO E TEDIOSO Esse tipo de comparaçãoda imagem que temos do hermetismo renas de textos é outro exemplo do tipo de estudocentista.10 Assim, essa revisão nos conduz, técnico detalhado que algumas vezes podepor exemplo, para uma perspectiva comple parecer árido e tedioso (como o trabalho detamente nova com base em um dos escritores cientistas de jaleco ao lado do acelerador demais influentes do renascimento hermético, partículas). Na realidade, porém, ele é a baseCornélio Agripa, cuja obra e identidade re necessária para chegarmos possivelmente ametem ao Fausto de Goethe.11 Essa mudança conclusões mais impactantes. Todas as grandesem nossa concepção do hermetismo renas revoluções científicas iniciaram-se assim: comcentista tem implicações importantes, por sua alguém que está em algum lugar, em um labovez, para as questões gerais ligadas à questão ratório ou em uma biblioteca. Alguém que estádas fontes da modernidade. Para esse tipo de descobrindo detalhes pouco compreendidos,24 pentagrama 3/2012
Sala de exposições durante a reaberturacuja importância outros não viram. Finalmen Desde o início do ano passado tenho recebite, descobre que a busca por explicações leva do outro tipo de cartas e e-mails: denotama novos insights de que ele mesmo inicialmente surpresa, espanto, incompreensão. E todosnão suspeitava. É assim que a ciência progri não se cansam de falar sobre o inesperadode, conforme repetiu inúmeras vezes Robbert fechamento, que ninguém pensava ser posDijkgraaf, e é também por isso que a atual ob sível, da Bibliotheca Philosophica Hermetica, esessão com a “valorização” da pesquisa funda da consequente separação da coleção em doismental encontra-se em uma estrada sem saída: locais distintos. Os estudantes que iniciala utilidade da pesquisa muitas vezes só aparece mente viriam estudar aqui em Amsterdãmuito depois que ela foi feita. decidiram estudar em outro lugar; e os esHá muitos anos a Holanda tem despertado tudantes estrangeiros que já se encontravaminveja por causa da presença, em Amsterdã, aqui na Holanda se sentiram sem teto, parada mais completa coleção sobre História da não falar de mim e de meus colegas, e deFilosofia Hermética e Correntes Relacionadas nosso departamento.– tudo isso associado a uma cátedra e a um O ano de 2011 foi um ano desastroso, emgrupo de pesquisadores atuantes no mes que o pesadelo de uma destruição commo setor. Essa combinação não se encontra pleta e definitiva da Bibliotheca Philosophicaem nenhum outro lugar do mundo: não há Hermetica estava tão próximo de acontecersequer algo parecido. Portanto, com o passar que parecia inevitável. No entanto, isso nãodos anos, muitos especialistas encontraram aconteceu. É verdade que a Biblioteca sofreuo caminho para a leitura na Bibliotheca Philo- golpes profundamente dolorosos – refiro-mesophica Hermetica, e todos os anos eu recebo aqui à demissão de um grupo qualificado decartas de estudantes estrangeiros que relatam bibliotecários e funcionários que conhecemque a existência da Biblioteca e o programa tão bem essa coleção e a amavam tanto; àcurricular da Universidade de Amsterdã são perda de uma coleção extremamente valiosaas principais razões para virem estudar aqui. de manuscritos e incunábulos; e à separação per aspera ad fontes 25
A Bibliotheca Philosophica Hermetica é uma biblioteca particular com uma notável coleção de mais de 21.000 volumes – livrose manuscritos – que tratam de filosofia e um grande número deoriginais de grande raridade. Ela é considerada atualmente a mais importante coleção no campo da filosofia hermético-cristã e esotérica.Um terço da coleção foi comprado pelo Estado holandês e tem oestatuto de patrimônio cultural nacional. Importantes livros da coleção são: o Corpus Hermeticum, edição de 1471, e a primeira ediçãoilustrada de A divina comédia de Dante, de 1481. A biblioteca está localizada no centro de Amsterdã ao longo de um dos famosos canaisda cidade velha. O endereço é Bloemstraat 13-17, em Amsterdã.realmente incompreensível e prejudicial de A chave para o futuro reside no desenvolviobras de grande valor, estando uma parte mento e na expansão de uma Amsterdã heragora em Haia e o restante da coleção aqui mética (pode-se dizer que gosto daqui porem Amsterdã. Mas, ao contrário das expec essa conveniência). Dentro do nó central setativas de muitos, estamos aqui hoje, mais encontra uma rede dinâmica, internacionaluma vez, cercados de livros, na rua Bloem e aberta para as partes interessadas, com astraat, para comemorar a reabertura da máxima utilização de meios técnicos que teBibliotheca Philosophica Hermetica. Per aspera… mos atualmente à nossa disposição. Já se foiad fontes! Depois de tantas provações, retor o tempo das instituições isoladas, que possunamos às fontes! íam tudo em suas mãos. Uma biblioteca não é apenas um edifício onde as pessoas entramOLHANDO PARA O FUTURO Iniciei minha pela manhã pela porta da frente e permanefala dizendo que a biblioteca é como uma cem dentro sem hora para sair: uma bibliomemória em que o nosso passado coletivo teca deveria ser um lugar de encontro, umestá armazenado, mas quero encerrar com centro dinâmico, de onde linhas de cooperaum vislumbre no futuro. Como eu espero ção e intercâmbio são definidas para muitoster deixado bem claro, a Bibliotheca Philoso- lugares ao redor do mundo. Daí o novo lemaphica Hermetica é um fato único – mas não da biblioteca, “Hermeticamente aberta”, umaé, absolutamente, um fenômeno isolado. Ela escolha particularmente feliz.desempenha um papel especial dentro de um Em suma, a Bibliotheca Philosophica Hermeticaprocesso de desenvolvimento mais amplo está iniciando uma nova fase de sua existênde inovação na pesquisa acadêmica interna cia, enfrentando novos desafios. Com certezacional. Naturalmente, também encontramos não será fácil, porque a Biblioteca recebeuinúmeras fontes herméticas em muitas outras pesados golpes que precisou suportar, e muibibliotecas em todo o mundo! Que bom! tas vezes foi necessário iniciar do ponto zeroMas, em comparação com outras coleções, e reconstruir. Mas, como podemos ver naesta se caracteriza por sua localização espe abertura da exposição de hoje, o fogo concial, seu conceito coerente com a base sobre tinua ardendo e não pretende extinguir-se!a qual foi construída. E esse mesmo conceito Felizmente, a filosofia hermética tem expecoerente também é a base de uma disciplina riência com esse tipo de processo de “filona Universidade de Amsterdã. Por isso é que sofia no meio do fogo”. É que a transformaé tão óbvio haver uma estreita colaboração ção alquímica não é possível sem “as trevasentre as duas instituições em Amsterdã: 1 herméticas” (hermetic black, na fórmula demais 1 são 3! Marguerite Yourcenar): a fase mais difícil é26 pentagrama 3/2012
conhecida como o nigredo, na qual a corrente Bibliografia:é quebrada e destruída, e somente a essência 1. Sarton, G. Review of Lynn Thorndike (Retrospecto de Lynnpermanece. Então, é a partir daí que é cons Thorndike), Isis, 6:1, 1924: 83.truído algo mais bonito e bem melhor. 2. Ibid., 84. 3. Sarton, G. Introduction to the History of Science (Introdução àEm nome de meus colegas do Centro de História da Ciência), v. I, Nova Iorque: Krieger, 1975. p. 19.História da Filosofia Hermética e Correntes 4. Thorndike, L. A. History of Magic and Experimental Science (HistóriaRelacionadas da Universidade de Amsterdã, da magia e da ciência experimental), 8 vols. Nova Iorque: Columbiaem nome dos nossos estudantes e também State University Press, 1923-1958.em nome de muitos colegas ao redor do 5. Hanegraaff, W. J. Esotericism and the Academy: Rejected Knowledge inmundo que estão comprometidos com este Western Culture (Esoterismo e a Academia: conhecimento desprezadocontexto maravilhoso, quero expressar na cultura ocidental). Cambridge University Press, 2012: 322-334.a esperança fervorosa de que “as trevas 6. Westfall, R.S. Never at Rest: A Biography of Isaac Newton (Nunca em re-herméticas”, a escura fase de demolição e pouso:umabiografiadeIsaacNewton).CambridgeUniversityPress,1980.destruição, esteja realmente, completamente 7. Jacob, M. Introduction (Introdução). In: Force, J.E. & Hutton, S.e definitivamente para trás, e que o ano (eds.). Newton and Newtonianism: New Studies (Newton e Newtonismo:de 2012 seja o ano do renascimento da novos estudos). Boston/London, Kluwer: Dordrecht, 2004.Bibliotheca Philosophica Hermetica, que aparece 8. Principe, L.M. The Aspiring Adept: Robert Boyle and his Alchemical Quest.em uma nova forma µ IncludingBoyle’s“Lost”DialogueontheTransmutationofMetals(O adeptoas- pirante:RobertBoyleesuabuscaalquímica.Incluindoo“último”diálogode Boyle sobre a transmutação dos metais). Princeton University Press, 1998. 9. Hanegraaff, W.J. & Bouthoorn, R.M. Lodovico Lazzarelli (1447/1500) The Hermetic Writings and Related Documents, Medieval & Renaissance Texts & Studies (Os escritos herméticos e documentos relacionados. Textos e Estudos Medievais e Renascentistas), 2005. 10. Copenhaver, B.P. A Grand End for a Grand Narrative: Lodovico Lazzarelli, Giovanni Mercurio da Correggio and Renaissance Hermetica (Um grande fim para uma grande narrativa: Lodovico Lazzarelli, Giovanni Mercurio da Corregio e a Hermética Renascentista). Magic, Ritual & Witchcraft (Magia, ritual e feitiçaria), 4:2, 2009: 207-223. 11. Hanegraaf, W.J. Better than Magic: Cornelius Agrippa and Lazzarellian Hermetism (Melhor do que magia: Cornélio Agripa e o hermetismo lazzarelliano). Magic, Ritual & Witchcraft (Magia, ritual e feitiçaria), 4:1, 2009: 1-25. per aspera ad fontes 27
luz da luzPara Robert Grosseteste, erudito da Idade Média, o espaço hipotéticono qual Euclides representara os números, 300 anos antes de Cristo,era igual em toda parte e multidirecional. Ele afirmou que esse espaçoera válido para a expansão da luz. Sobre a luz, ele escreveu o tratado DeLuce (Sobre a Luz ou o Princípio das Coisas). É desse tratado que provêm algumas citações que constam neste artigo.N“ a minha opinião, o primeiro fenô meno físico, que alguns chamam de ‘corpo’, é a luz: afinal, devido à suanatureza, a luz expande-se em todas as direções. Assim, um ponto de luz pode transformar-se imediatamente em uma esfera de luzde qualquer dimensão, a menos que encontreum obstáculo. A propagação de um corpocomo esse é necessariamente simultâneo como aparecimento da forma corporal, emboratanto esse corpo como a matéria sejam, em si,substâncias simples desprovidas de dimensões.Um corpo de substância simples não podeintroduzir uma dimensão na matéria de propriedades idênticas às suas. A não ser que elepróprio se multiplique e imediatamente seexpanda em todas as direções e, desse modo,participe da matéria mediante sua própriaexpansão. Explica-se: a forma não pode deixara matéria, uma vez que está inseparavelmenteligada a ela, e porque a matéria não pode serdestituída de forma.Também já demonstrei que, devido à sua natureza, a luz tem a particularidade de multiplicar-se e de expandir-se em todas as direções imediatamente. O que quer que realizeessa atividade – seja a luz ou outro agente –atua por participar da luz. Consequentemente,essa atividade pertence à essência da próprialuz. Portanto, o corpo (a forma da manifestação) é a própria luz ou o agente que realiza aatividade antes mencionada, e atribui dimensões no espaço ou na matéria, pelo fato departicipar da luz e de agir mediante o poder28 pentagrama 3/2012
UM TRATADO MEDIEVAL SOBRE O SURGIMENTO DO NOSSO MUNDO luz da luz 29
Rafael Sanzio de Urbino, Estudo para a escultura de um cavalo, aprox. 1516que ela lhe confere. Porém a primeira forma -se indefinidamente, precisa estender-se alémnão pode introduzir nenhuma dimensão no es da finitude do espaço – que apenas conhecepaço ou na matéria devido à atividade de uma um número limitado de dimensões. A seguir,manifestação consecutiva. Por essa razão, a luz Grosseteste diz que, devido à infinita repronão é uma forma subsequente à corporalidade. dução de si mesma, a luz ultrapassa os limitesEla própria é a corporalidade!” da matéria até tomar, por fim, a forma de uma esfera. Em consequência disso, as partesDO INFINITO À ESFERA Grosseteste prossegue mais exteriores da matéria são mais distenafirmando que a primeira forma corporal é de didas e rarefeitas que as que se encontramessência mais elevada e sublime do que todas mais próximas do centro. Por esse motivo, oas manifestações subsequentes. Ele afirma que fenômeno que chamamos de firmamento – aa luz tem grande semelhança com a realida primeira aparição nas partes mais exteriores dade imaterial, além da matéria. Por isso, a luz esfera – é perfeito por ser constituído apenasé a primeira manifestação tangível, concre da primeira matéria, da primeira forma. Esseta. Por sua própria natureza, a luz, – que é a primeiro corpo, o firmamento, irradia sua luzprimeira manifestação na matéria primordial (lumen) a partir de cada uma de suas partes,(prima materia) – multiplica-se em sua infi em direção ao centro do universo. Como a luznitude, para todos os lados, expandindo-se (lux) é o aperfeiçoamento do primeiro corpo,em todas as direções. Como a luz multiplica- dele irradia naturalmente, ela se multiplica ao30 pentagrama 3/2012
A luz é a forma e a perfeição de todas as coisasmesmo tempo que a espiritualidade do pri suas partes externas se expandem, emborameiro corpo. Consequentemente, do primeiro não tanto quanto o fogo. E assim surge ocorpo de luz (lumen) surge a luz espiritual, ar. A partir do ar, desenvolve-se uma formaque também pode ser chamada de corpo espiritual. Assim como o fogo e o ar, tamespiritual (spirit). Quando está em movimen bém surgem a água e a terra. Porém, como ato, essa luz (lumen) não causa nenhuma cisão água tem mais força de contração do que deou separação entre as manifestações que ela expansão, assim como a terra, ela adquire aperpassa. Desse modo, dirige-se diretamente propriedade de uma massa.”do primeiro céu ao centro do universo. Isso Grosseteste prossegue: “Foi assim que surocorre pela multiplicação de si mesma e por giram as treze esferas do mundo sensorial.sua infinita propagação. Nove delas, as esferas celestes, não estãoEntão, como não existe espaço vazio, através sujeitas a mudança nem a destruição, porde incontáveis processos de desenvolvimen que são perfeitas. As outras quatro esferas,to pelos quais a primeira esfera se completa, ao contrário: estão submetidas a mudança,surge uma segunda esfera, que é perfeita e desenvolvimento e destruição, por não seremjá não tem possibilidade de estruturar-se. O perfeitas. É evidente que cada corpo maisaperfeiçoamento da segunda esfera produz-se elevado constitui a forma e a consumação daporque a luz (lumen) é recebida da primeira manifestação que surge a seguir, por causa daesfera e também pelo fato de que a luz (lux), luz (lumen) que dele emana.que era única na primeira esfera, se desdobra Assim como o número “um” contém potenna segunda esfera. cialmente todos os números que se seguem a ele, o primeiro corpo, através da multiEXPANSÃO ILIMITADA Grosseteste prossegue: plicação de sua luz, constitui cada corpo“De igual modo, através de expansão e con subsequente. A terra existe devido a todostração, são criadas várias esferas celestes, da os corpos mais elevados, porque nela estãoterceira até a nona. E, debaixo da nona esfe reunidas todas as luzes superiores. A terra é ora, que é a mais inferior, encontra-se a massa mais denso de todos os corpos. Embora nelaextremamente densa, da qual se compõem os se encontrem todas as luzes superiores, elasquatro elementos. Essa esfera, a esfera da lua, não são originárias dali por sua própria ativitambém produz luz (lumen), mas sua força dade: entretanto, a luz (lumen) de cada esferanão é suficiente para expandir ao máximo a está ativa na terra.camada mais externa dessa massa. Como esse Os corpos intermediários têm dupla relação. Suaelemento (o fogo) produz luz a partir de si relação com os corpos inferiores equivale à dopróprio, e a massa que o envolve se contrai, primeiro céu, com todas as outras coisas. Sua luz da luz 31
Robert Grosseteste (1168-1253) sacerdotes italianos remunerados bem, essa parte da óptica nos mostraera de família camponesa, mas teve para as igrejas inglesas, mas que nunca que coisas muito distantes podem pa-a oportunidade de estudar Direito, colocavam os pés na Inglaterra. recer muito próximas, e coisas grandes,Medicina, idiomas, Ciências Naturais Grosseteste estudou Geometria, que estão próximas, podem parecere Teologia em Oxford. De 1215 a Teoria da Luz e Astronomia. Traduziu muito pequenas. Além do mais, ela nos1221, ostentou o título honorífico de escritos gregos e árabes para o latim, mostra como objetos pequenos, que“Reitor da Universidade”. Em 1235, foi e escreveu comentários sobre muitos colocamos a certa distância de nós,nomeado Bispo de Lincoln, posição temas científicos, entre eles sobre as podem adquirir qualquer tamanho queque ocupou até a morte. Foi incansável obras Analytica Priora (Teoria da Lógi- desejemos. Assim, é possível ler as me-em combater o mau comportamento, ca) e a Physica (Teoria da Natureza), de nores letras que se encontrem a umaa ineficiência e o desleixo do alto clero, Aristóteles. incrível distância, ou contar grãozinhose não hesitou em despedir colaborado- No tocante à astronomia, Grosseteste de areia, sementes ou qualquer outrores, quando necessário. Achava que o formulou a tese de que a Via Láctea objeto muito pequeno”.clero deveria voltar sua atenção às pre- concentraria a luz de inumeráveis Grosseteste compreendeu que oocupações e dificuldades dos fiéis em estrelas. Realizou intensas experiências espaço abstrato, no qual Euclidessuas paróquias, além de estudar muito. com espelhos e lentes, partindo do determinou os números, era igualEm 1245, participou do Concílio de princípio de que uma teoria deveria ser em toda parte e multidirecional. EleLyon, quando condenou aberta e clara- provada por experimentos e as conclu- afirmou que o mesmo era válido paramente as irregularidades na conduta sões precisavam de verificação. a expansão da luz. Sobre a luz, eledo clero. Também foi um adversário Em seu tratado De Iride (O arco-íris) escreveu o tratado De Luce (Sobre apúblico do costume papal de nomear escreveu: “Quando se compreende Luz ou o Princípio das Coisas).relação com os corpos superiores é semelhante à periores. Por isso, são movidos pela mesmarelação da terra com todas as outras coisas. forma imaterial que move os corpos superio res. Assim, a força imaterial da inteligênciaA MULTIPLICIDADE DAS COISAS Portanto, de ou da alma, que movimenta incessantementecerto modo, cada coisa está em relação com a primeira e mais alta esfera, também mantémtodas as outras. A forma e a perfeição de to- incessantemente em movimento todas as esfedos os corpos é a luz, mas é nas esferas supe ras celestiais inferiores. Isso ocorre a partir deriores que ela é única e de natureza espiritual determinada relação. Tratando-se das esferasmais elevada, enquanto nas esferas inferiores é inferiores, elas recebem a energia motriz emcomposta e de natureza física. Além disso, os grau vibratório mais fraco. É que, quanto maiscorpos não são do mesmo tipo, embora todos baixa a esfera, menores são a pureza e a forçaeles – sejam simples ou compostos – tenham da luz primordial que a penetra.sua origem na mesma luz. Da mesma maneira, Embora os elementos participem da formanem todos os números são do mesmo tipo, in do primeiro céu, a força do movimento dodependentemente de todos eles terem surgido primeiro céu não pode movê-los sempre.de um único número, por meio de uma multi Apesar de participarem da luz primordial, elesplicação maior ou menor. não estão diretamente ao alcance da primeiTalvez essa consideração elucide a opinião dos ra força dinamizadora. É que, neles, a luz seque dizem que “todas as coisas são uma só enfraqueceu e distanciou, e, por isso, eles jápor causa da perfeição da luz, que é única”, e não possuem a pureza que tinham no primeirotambém dos que afirmam que “a pluralidade corpo. Além disso, a densidade da matéria quedas coisas surgiu, em diferentes graus, a partir contêm determina antagonismo e oposição.da multiplicação da luz”. Seja como for, muitos afirmam que a esfera doA respeito disso, Grosseteste observou: “os fogo evolui segundo um movimento giratóriocorpos inferiores são partes dos corpos su constante. Os cometas seriam a prova disso.32 pentagrama 3/2012
Dizem ainda que esse movimento influencia No primeiro corpo, que contém todos os ouaté mesmo a água dos oceanos e provoca as tros, encontra-se um grupo de quatro. Em suamarés. Entretanto, todos os pensadores sen essência, os demais corpos não ultrapassamsatos afirmam que a Terra desconhece esse o número dez. É que a unidade da forma, amovimento. dualidade da matéria, a tríade da composiçãoAs esferas posteriores à segunda esfera (vista e o aspecto quádruplo estrutural constituem oda Terra, a segunda seria a oitava) participam total de dez. Isso significa que dez é o númedo movimento da segunda esfera, uma vez que ro das esferas do mundo, uma vez que a esferaparticipam da sua forma. Tal movimento – que dos elementos, embora dividida em quatro,é constante – é realmente o correto para cada forma uma unidade, devido à sua participaçãouma delas. Como as esferas celestes são perfei na natureza terrena perecível.tas e não são atingidas nem pelo enfraqueci Dessas concepções podemos concluir quemento nem pela densificação, a luz (lux) nelas ´dez` é o número perfeito no universo. Éexistente também não tende a espalhar suas que qualquer todo perfeito contém algo quepartes (por rarefação) nem atrair partes para corresponde à forma e à unidade e algo queo centro (por densificação). É por essa razão corresponde à matéria e à dualidade. Ou seja:que as esferas celestes não conhecem os mo algo que corresponde à composição e à tríade,vimentos de subir e descer. Elas são impelidas e ainda algo que participa do todo e do quapor uma força motriz espiritual que, no plano ternário. É impossível acrescentar um quinto afísico, mantém seu movimento constante. esses quatro. Essa é razão pela qual cada todo perfeito consiste em dez.PARTE E TODO Como os elementos são im Assim fica claro que as cinco partes encontraperfeitos e estão sujeitos à queda e à ascensão, das nos números 1,2,3 e 4 são as da composisua luz interior (lumen) os afasta do centro pela ção e da harmonia, que conferem estabilidaderarefação ou os atrai para o centro pela den a cada todo. Essas cinco partes são as únicassificação. Por isso, eles estão naturalmente em que produzem a harmonia da música, do mocondição de mover-se para cima ou para baixo. vimento corporal e das leis rítmicas.” µO corpo mais elevado, que é o mais simples emais puro de todos, consiste em quatro partes: Tradução do latimforma, matéria, composição e totalidade. De Luce para o inglêsComo ele tem a forma mais simples, ele cons de Claire C. Riedltitui uma unidade. Devido à sua característica Marquette Universitydupla, a matéria é dual. Isso é correto, graças Press, Milwaukee,à sua capacidade sensorial, à sua receptividade Wisconsin, 1942a impressões e à condensação fundamental,que são características da matéria.O todo, em si, é tríplice, porque nele estãopresentes: (1) a matéria animadora, (2) a formamaterializada visível e (3) o que distingue suaestrutura, que encontramos em qualquer composição. E o que constitui o próprio todo, que estáacima e além dessas três partes: o número 4. luz da luz 33
© H.N.Werkman34 pentagrama 3/2012
das trevas à luzDO CHUMBO ESCURO AO OURO RESPLANDESCENTEDurante muito tempo pensamos que era preciso haver matéria antes depodermos falar de Espírito. Primeiro viria o inconsciente e só depois aconsciência. Ou seja: as trevas precederiam a luz. Mas, recentemente, há acrescente convicção de que ocorreu o contrário: o que havia no início era aluz. E essa convicção coincide com a tradição espiritual de muitos séculos.No princípio, antes mesmo da existência fascinados que estejamos com os fogos-fátuos do sol e da lua, havia a luz: a luz da ao nosso redor, também temos medo do poder criação, sob forma de luz-energia. No das trevas que nos rodeiam, mas que tambémfundo, isso não mudou: a luz-energia continua estão adormecidas em nós. E assim vamossempre ativa e está em toda parte. Porém, ao vivendo: como prisioneiros limitados pelo jogomesmo tempo, essa luz – seja pela razão que de sombras entre luz e trevas, ainda descofor – adquiriu materialidade e densidade para nhecendo tudo sobre a verdadeira luz divina,nossos sentidos. Passou a ser vista como maté- só tendo consciência de nossa sombria luzria densa, perceptível, como os objetos físicos própria, com a qual imaginamos ter iluminadoe os corpos isolados. Portanto, parece que nossa mente. E assim seguimos, até a hora ema luz também está encerrada em um corpo que um rápido brilho da verdadeira luz intenascido da matéria (como o do ser humano, rior consegue chegar à nossa consciência.que erroneamente o identifica como sendo elepróprio). Vistos a partir da perspectiva da luz INQUIETUDE Vimos a luz! Mas, como nosso seroriginal, esses corpos não passam de sombras, é sombrio, ela nos encanta e intranquiliza, aoformas da ilusão, da il-lux-ion, da falsa luz. mesmo tempo. De fato vimos a luz, mas não ainMas ainda existe uma luz divina em nosso da em sua plenitude. Então, ficamos face a faceimo, na origem do nosso ser. Ela é tão natural com o sombrio abismo do nosso próprio ser. Porquanto nossa contínua negação da sua existên enquanto, ainda não temos nenhuma perspectivacia no dia-a-dia. Ela é radiante e indestrutí de saída para escapar dessas trevas asfixiantes.vel, e, ao mesmo tempo, oculta e ignorada. É Por isso, logo que começamos a trilhar o camiuma luz que está presente em nós em estado nho de iluminação e libertação, contrariandolatente. Por isso, está condenada a ser uma luz todas as nossas expectativas, vem sempre umsecreta, pois não pode sair, irradiar através abatimento. Já não há nada que possa ajudarde nós. Ela é uma fonte de luz que, apesar de -nos, nesse momento, a não ser voltarmos o focoter sido lançada como semente de luz no solo do holofote da nossa própria compreensão para ada nossa alma, não pode brotar. E, isso acon situação desconcertante na qual nos encontramos:tece principalmente porque estamos voltados o combate entre luz e trevas que se trava dentropara tudo o que nos distrai da nossa natureza de nós. Algo parecido aconteceu com Dante, que,interior de luz, nos dias e noites alternados da em plena vida, se perdeu num bosque tenebroso.nossa existência. Enquanto isso, nos colocamos Ou Cristão Rosa-Cruz, cuja casinha foi forte-vaidosamente no centro das atenções, diante mente abalada por uma tempestade na vésperados holofotes que revelam a importância da da Páscoa. Ou como Saulo, que foi derrubadofama e da notoriedade. No entanto, por mais do cavalo por um raio que o deixou cego por das trevas à luz 35
vários dias, até transformar-se em Paulo. Muito herói solar, estamos condenados a ser engolidosantes disso, lá estava o herói solar Osíris, com pelo tenebroso monstro marinho Tiamat, queo qual temos em comum a luz divina. Mas ele rouba toda a nossa luz, e a descer até as protambém sentia que não estava tudo em ordem fundezas da existência, até o caos original doem seu ser. Descendente do Rei-Sol, em seu mundo inferior.reinado na Terra ele foi rei do Egito. Sob essaforma, como verdadeiro portador da luz, ele foi ESCURIDÃO Na alquimia, esse estado escabrosoo protetor do país fértil, da semente dourada é chamado de nigredo, a fase escura, l’oeuvre auque amadurece sob a luz resplandecente do noir. Não é por acaso que o metal corresponsol. Hoje, ele não representa somente a luz do dente é o escuro chumbo e o planeta domiEspírito divino, mas também a própria imagem nante é o Saturno morto. A propósito: Al-chymiados que fazem mau uso dessa luz, obcecados significa “negro”, bem como a palavra Kemet,pela autoilusão, e se banham complacentemente como o Egito foi chamado há muito tempo. Nasno “luxo” da luz. escolas de mistérios da Antiguidade, o candiMas as consequências não se fizeram esperar. dato tinha de passar três dias na mais absolutaSeria por ciúme que seu irmão Seth, o sombrio, escuridão. Somente quando alcançamos o nadir,desejou matá-lo para arrebatar-lhe o trono? em um caminho difícil de descida ou descensus,Ou seria por vingança? Afinal, Osíris havia que podemos prosseguir rumo ao ascensus, ou agerado um filho ilegítimo com a esposa de seu subida. Nesse ponto, precisamos ter obrigatoriirmão, Néftis. Seja como for, Seth atraiu Osíris amente uma paciência absoluta, pois não estapara uma armadilha. Ordenou que colocassem mos em condição de fazer nada. O importanteOsíris em um caixão selado com chumbo e que nesse momento é seguir Osíris, ficar imóvel efosse jogado nas escuras águas do Nilo. Em não resistir à descida. Para não fortalecermoscompanhia de Néftis, sua viúva Ísis percorreu ainda mais a reação contrária, temos de soltar aso país em vestes de luto – daí o nome “Ísis ne rédeas completamente. Em nosso instinto vital,gra”– até que encontrou o caixão de seu amado primeiro nos apropriamos da luz. Mas, agoramarido preso a um cedro. Mas Seth atrapalhou que as trevas nos ameaçam, não devemos pro-seu plano de salvamento cortando o corpo do ceder assim: não devemos unir-nos às sombriasirmão em catorze pedaços e espalhando-os por forças da morte. Isto é: não devemos mergulhartodo o país. em autopiedade e em sombrios pensamentos deIsso é o que nos diz o antigo mito. Ele nos desespero. Não devemos querer escapar a todoconta tudo sobre a situação, aparentemente sem custo do combate interior, mas precisamos, istosaída, à qual chegamos em nossa busca pela ilu sim, estar dispostos a vivenciá-lo plenamente. Ominação. Fala sobre como nossa luz natural foi único método para superar as trevas é aceitá-las,tragicamente encapsulada e dela ficamos sepa sem desviar o olhar, tentando ignorá-las, masrados, rodeados por forças tenebrosas e mortais, sim vivenciando tudo com serenidade e submerno “vale da sombra da morte”, lembrando uma gindo totalmente na autorrendição. Somente noimagem bíblica. Primeiro fomos confundidos final dessa noite escura, depois de termos vivenpela falsa luz da nossa obstinação. Mas, agora, ciado a descida até o inferno, é que poderemosolhamos perplexos no nosso próprio espelho te aguardar nossa iluminação.nebroso, entregues às forças vingativas da nossa Agora o herói solar, que está na barrigaprópria contranatureza sombria. Como todo do monstro, acende um fogo que traz luz36 pentagrama 3/2012
O único método para superar as trevas é aceitá-lasàs trevas. É somente no silêncio da noite, esposo, mesmo que para isso ela tenhaquando já não buscamos a luz onde ela não de passar por diversas mudanças de figura.pode ser encontrada, que poderemos lembrar Como Ísis dispõe de asas, pode perscrutar ode nossa origem e tomar consciência de que céu em todas as direções, até encontrar e reusomos portadores da luz. Apenas então pode nir todas as partes do corpo de Osíris. Comser redescoberta a luz espiritual oculta. Para o ruflar de suas asas, ela o reanima. E, assim,isso, é preciso que, ao longo da descida ao Osíris torna-se o homem-espírito renascido,inferno, sejam apagadas as velhas luzes que o iluminado do princípio, que reina sobre ausamos para iluminar artificialmente nossa região da morte. É ele quem pode conduzirvida. Mesmo que aparentemente as forças o ser humano à manhã radiante da ressurinstintivas mais sombrias se desencadeiem reição: por isso, na Alquimia é chamado deem fúria em nosso interior, pode despertar rubedo, devido à luz dourada que dele irradia.a confiança de que, por trás disso tudo, está Da reunificação de Ísis e Osíris, nasce Hórus,oculta a atividade redentora da lux ex tenebris, a quem o pai transfere o domínio desteda luz que brilha nas trevas. Na Alquimia, mundo. É ele quem vencerá o tenebroso Sethesse processo de metamorfose é chamado al- no combate final. E, mesmo que ele percabedo, numa referência à luz branca e também um olho na luta, Ísis concede-lhe novamenteao metal prata. Nós a conhecemos também a salvação: ela oferece-lhe um novo olho. Écomo a luz natalina da alma renascida. So- um olho-sol, que lhe permite perceber a luzmente agora pode ter início o processo her espiritual. É um olho onividente, sobre o qualmético de separação: o que é luz é separado não apenas recai a luz, mas que também irdo que é treva, o que é leve é separado do radia luz. Por isso, um ser humano como esseque é pesado, com amoroso discernimento. tem um espírito desperto e uma alma vivente,Durante todo esse processo, tivemos a sensa com veículos da alma-espírito: é um Hórus,ção de estarmos sós, por conta própria, por o dourado falcão-sol. Afinal, ele deixou demuito tempo. Mas esse não era o caso. Volte ser um ser ilusório, pois, como novo homem,mos um pouco à nossa história e, principal- ele verdadeiramente despertou na luz. Seumente, ao papel desempenhado por Ísis. No corpo de luz apresenta-se como um ornasentido verdadeiro da palavra, ela é a força-luz mento completo. Na Alquimia, ele é chamadoque traz a vida em si, que pode despertar no de corpo de diamante, pois, através dele a luzvamente o homem-espírito. Ela também não espiritual pode brilhar sem empecilho. Ele jáluta. Deixa Seth cometer todos os seus atos de se transfigurou após todas as transmutaçõesvingança e tentativas de assassinato, e dedica do processo alquímico: tornou-se novamentesua atenção apenas a buscar por seu saudoso a luz da luz – da luz primordial µ das trevas à luz 37
mudança como impulso“E apesar de tudo, sei que existe alguma coisa que faz sentido. Sei também que osignificado não admite brincadeiras.” Assim termina um livro intitulado “Nada”.Faz muito tempo que o homem vem zombando da Terra em que vive. Ele tambémzomba de seus conterrâneos – fazendo isso, está negando seu próprio significado.“Estamos agora diante de uma revolução completa: 180 graus! Se participarmos dorenascimento cósmico, surgirá em nós uma consciência moldada pelo Todo – bastaapenas querer reagir a esse impulso. (E nós podemos fazer isso!)”J á faz algum tempo, li um livro juvenil que ti dentro das pessoas. É claro que elas também nha o seguinte título: Nada – Nada que seja im- sentem as grandes alegrias da vida, o amor, a portante na vida. Um garoto se levanta na sala realização, o reconhecimento – às vezes até aode aula e diz: “Nada tem sentido. Isso eu já sei mesmo tempo. E então tudo isso não significafaz tempo. Por isso, não vale a pena fazer coisa nada? Será que é só um jogo, um capricho daalguma. Acabei de descobrir isso.” Ele pega seus evolução?livros, sai e não volta mais para a escola. Passaseu tempo sentado numa árvore, uma ameixeira. DESCOBERTA Podemos descobrir: existe alguÀs vezes, joga umas ameixas verdes nas crianças ma coisa que nos sustenta. Não importa o queque passam por ali. Um dia ele diz a elas: “Tudo façamos, aconteça o que acontecer, estamosdá na mesma. Porque tudo só começa para de incluídos em “alguma coisa”, fazemos parte depois acabar. Na hora que vocês nascem, já estão “alguma coisa”. O garoto da nossa história estácomeçando a morrer. E isso acontece com tudo.” sentado no galho de uma árvore. A naturezaOutro dia, ele disse: “A Terra tem 4 bilhões o sustenta, dá-lhe consolo e a possibilidade dee 600 milhões de anos, mas vocês vão chegar atirar as ameixas verdes. Porém, ela não podeno máximo até cem. A vida não vale a pena. comunicar-lhe o significado de sua existência.Tudo não passa de um jogo de faz-de-conta – e Todo mundo pode perceber como a naturezade sermos muito bons nisso.” Quando minha os apoia. O brilho de uma flor, a força de umamulher e eu compramos esse livro, a vendedora árvore, as águas de um lago, o voo dos pássarosperguntou se éramos suficientemente fortes para – tudo isso nos fortalece e eleva. Árvores, flores,lê-lo. água, a amplidão do céu, os animais, tudo issoNada tem sentido. Tudo não passa de um jogo. tem algo a ver conosco, são nossos semelhantes,Tudo só começa para terminar. São afirmações parte de nós. Eles são nossa origem, nossos commuito claras. Quem pesquisa sobre o significado panheiros, nossa existência, e nossa alimentação.das coisas tem de seguir um caminho espiritual Ao lado disso, ainda existem outras fontes que– e passar por algumas experiências. Só então a nos dão força: a crença religiosa, pensamentos devida pode dar-lhe uma resposta. Há muito so filósofos, sons de compositores, formas e coresfrimento na Terra. Inúmeras pessoas carecem do de pintores e escultores. Sempre existe algumamínimo necessário. Elas foram colocadas neste coisa anímico-espiritual que nos influencia, emundo e enfrentam pobreza, fome, crueldade nos dá ânimo para viver, e nos eleva das situae também devastações provocadas pelo homem ções que nos abatem. Percebemos que, em meioou pela natureza. E ainda devastações dentro de a tudo isso, pode existir algo que dá sentido àsi mesmas, aflições. Mesmo nos países em que nossa existência, mas não conseguimos captarreina a prosperidade, as devastações se espalham isso com facilidade, sem mais nem menos. De38 pentagrama 3/2012
A MUDANÇA CLIMÁTICA NO INTERIOR DO HOMEM mudança como impulso 39
algum modo estamos incluídos nessa esfera: -espiritual, mas as aplicamos de uma maneiraela é a nossa origem, nossa existência, mas não que não corresponde à fonte espiritual de ondepodemos percebê-la. Portanto, recebemos uma elas provêm, nem à natureza na qual vivemos.alimentação dupla: as forças da natureza e as Tudo porque os dois lados do nosso ser não estãoforças da região espiritual. É essa dualidade que em harmonia um com o outro!nos caracteriza. DANDO UMA ESPIADA NA EVOLUÇÃO A evoluIMPULSOS DA REGIÃO DO ESPÍRITO O garoto ção fez surgir o ser humano, como resultado deque está sentado na árvore está vendo somente um desenvolvimento que durou bilhões de anos.o que é perecível e transitório: o lado ilusório da Será que sua intenção era criar um ser autodessua existência. Ele tem razão de não ver nenhum trutivo que causasse danos aos reinos naturais?sentido nisso. Ele não consegue enxergar o que Um ser descontente de si mesmo, dividido? Issoexiste no reino da significação, que é o reino da é pouco provável. É possível, porém, que apenasalma-espírito, e que é a outra metade do seu ser, tenhamos chegado a uma fase do desenvolvimuito mais profunda. É que essa metade ainda mento humano que pode ser chamada de pubernão entrou plenamente em ação. É dela que vêm dade.os impulsos que nos impelem a ir em busca da Vamos pensar na nossa própria puberdade, quanbase da nossa existência. Foi um desses impulsos do muitas tendências profundas, tanto positivasque levou o menino a abandonar sua vida coti como negativas começaram a definir-se. Comodiana, normal. Só que ele não conseguiu identi são fortes as tensões que vêm junto com elas!ficar o quanto esse impulso era especial. Se fizermos uma transposição para o desenvolNos últimos 150 anos, principalmente, os cien vimento da humanidade, poderíamos dizer que,tistas fizeram muitas descobertas geniais – e de um modo geral, ainda não chegamos à idadefizeram isso influenciados por impulsos como adulta: ainda não nos encontramos. Ainda nãoesses, também. E como foi que lidamos com unimos as duas partes fundamentais do nossoessas descobertas? Construímos os mais sofistica ser. Em sua essência, essa é a causa da grandedos equipamentos tecnológicos. Nós os utiliza crise que enfrentamos em 2012. Com essa consmos muito e, muitas vezes, com o auxílio deles ciência que ainda não amadureceu, colocamospraticamos uma exploração abusiva da natureza. em risco nossa existência natural. Hegel chamouPoluímos, devastamos, contaminamos os reinos nossa consciência de uma “consciência infeliz”.naturais com radiações. Assim, destruímos aqui Mas está na hora de darmos um grande passo.lo que nos sustenta, que é a nossa existência, que Nosso lado da natureza está desenvolvido. Massomos nós mesmos. Isso reflete nossa situação. nosso lado da alma-espírito, não.Recebemos impressões do nosso lado anímico Vamos dar uma espiada nos mecanismos de40 pentagrama 3/2012
Na região do Espírito, encontramos a fonte da vida.Na região da natureza, a formação das forças vitaisdesenvolvimento da evolução e perguntar o que homem, uniram-se a herança vegetal e a anieles podem dizer-nos sobre a situação atual. Ve mal em sua essência, assumidas em uma formamos que, em determinado plano, sempre se vai mais elevada. E ainda foi acrescentada “algumaformando uma grande diversidade. O que surge coisa” originária da região espiritual. O tododestaca-se e traz, como resultado, uma grande que resultou daí era, novamente, mais do queriqueza. Antigamente, muitos elementos quími a soma de suas partes. Depois, teve início umacos surgiram com base no hidrogênio, até chegar nova diferenciação. Surgiram povos, idiomas,a certa saturação. Quando deixou de acontecer culturas, religiões, até chegarmos às incalculáalguma coisa essencialmente nova nesse nível, veis formas de individualismo do homem atual.então aconteceu um salto no processo de de Cada qual pode considerar-se como seu própriosenvolvimento: isso, em um período de tempo pequeno mundo. Mas, em nossa época já estãorelativamente curto em termos de história da surgindo novos indícios de saturação do processoevolução. Começou a delinear-se uma síntese. de desenvolvimento.Da “sopa primordial” de elementos e ácidos,surgiram os primeiros organismos unicelulares. SERÁ QUE ESTAMOS DIANTE DE UM SALTO EVOEles eram algo completamente novo. Era a pri LUTIVO? Mais uma vez é hora de uma síntese,meira vez que existiam seres que possuíam tanto que sempre significa um salto evolutivo. Mas,um mundo interior como exterior. Vemos que o para quem está nessa fase de desenvolvimentotodo, o organismo unicelular, era mais do que a esse salto se apresenta como um processo comsoma das suas partes. muitos pequenos passos. No que será que consisLogo que esse nível foi alcançado, começou uma te a síntese atual? Antigamente, as característicasdiferenciação. Surgiram os seres vivos multi da planta e do animal foram reunidas no sercelulares, e, por fim, desenvolveu-se imensa humano, formando uma unidade mais elevavariedade de plantas e animais. Em determinada da. Esse acontecimento natural foi consumafase de desenvolvimento, esse plano também do. Porém, no ser humano ainda há a sementechegou a uma saturação. Isto é: foi atingido um espiritual. Ela não foi integrada: a unidade comestado que tornou possível uma nova síntese. ela ainda não se processou. A semente aindaAssim, surgiu um ser com um órgão pensante, não brotou. É por isso que a porta para o munque se desenvolveu, transformando-se no córtex do espiritual não se abriu para a grande maioriacerebral. Entraram para a história os primeiros das pessoas. A alma-espírito faz parte de outrahominídeos, os primeiros seres humanos. Era dimensão de vida, muito diferente da natural.um ser em formação, que tinha condição de Na região do Espírito, encontramos a fonte darefletir sobre si mesmo e a evolução. Finalmente, vida; na região da natureza, a formação dasera um ser com uma consciência, um ego. No forças vitais. O natural é uma projeção múltipla mudança como impulso 41
Edgar Degas (1843-1917), Estudo de figura com cavalodas forças anímico-espirituais em um espaço aspecto da alma) fluem através de nós. Elas nãoexterior. A consciência do ser humano, seu “eu”, conhecem a morte, pois fazem parte do que nãoencontra-se bem no meio dessas duas regiões. A é manifesto, do que é incorpóreo. Quando jorparte natural surge aos nossos olhos sob forma ram realmente, elas nos transformam, elevandodensa, solidificada: uma forma sujeita à morte. nossa existência a um plano superior, e fazendo de nós novas criaturas. Podemos considerar o asUMA NOVA ESTRUTURA ÍGNEA O tempo pro pecto espiritual como um fogo purificador, renovoca dissolução, rupturas. É assim que ele age vador. Quando nos inflama, ele nos transfigura.na nossa dimensão de vida. Comprovamos que Precisamos criar condições para isso. Precisamoso espaço da nossa existência é limitado. Nos- estar dispostos a deixar o fogo agir em nós. Sóso lado natural significa efemeridade. A vida então ele poderá criar, em pleno corpo antigo,espiritual apresenta-se por meio de impulsos: uma nova estrutura, uma forma que lhe corresas “águas da vida” (como podemos chamar o ponda, que é uma forma sutil. O que queremos42 pentagrama 3/2012
Todas as forças interiores cooperampara renovar-nos, do imodizer com sutil? Possuímos estruturas energé plo de como pode surgir um corpo imortal aticas que transpassam e envolvem nosso corpo partir de um corpo antigo, natural, foi Jesusde matéria grosseira… São elas que mantêm a Cristo. “Derrubarei este templo e em três diasforma do nosso corpo físico, regulam os proces o levantarei”, assim ele esboçou simbolicamentesos orgânicos e são as forças de sustentação para esse processo. Pode-se considerar a descrição dao nosso sentir, desejar, querer e pensar. Nossa vida de Jesus como uma representação metafórivida interior e exterior transcorre em harmonia ca das etapas da metamorfose. É o crescimentocom essas energias que constituem nossos corpos progressivo do corpo espiritual no ser humanosutis e os mantêm. Apesar disso, em uma oitava terreno, cuja consumação ocorre no fenômenosuperior do desenvolvimento humano, os corpos que a Bíblia chama de ressurreição. Certo dia,sutis terão outra constituição. Então, eles criarão Jesus apresentou-se em sua nova figura, sepapossibilidades para a fusão harmoniosa do Espíri rada do velho corpo. Inicialmente os discípulosto com a natureza. não conseguiram percebê-lo sob a nova forma.Mas isso nada tem a ver com o fato de que a Ela era de um novo tipo, sutil e espiritual. Masconsciência atual e as estruturas físicas continu finalmente eles o reconheceram. É que, em seuam a desenvolver-se. Estamos novamente diante caminho espiritual, eles haviam desenvolvido osde um salto na evolução. A fonte da vida que rudimentos de novos órgãos sensoriais. O novoestá latente dentro de nós (em uns mais, em também já estava se delineando no interior dosoutros menos), irromperá, formando uma nova apóstolos.figura que deverá corresponder às suas características. Seremos renovados a partir de dentro! Todos os fundadores das grandes religiões poDentro de nós surgirá uma nova alma, que dará dem ser vistos como pioneiros: eles preparamtestemunho dessa transformação. Irá tomando o caminho para uma nova fase no desenvolviforma uma nova consciência, que não tem suas mento da humanidade que mais tarde estaráraízes no velho eu, mas que é parte da vida acessível para muitos. Todo grande mestre daoniabarcante. humanidade disse as palavras: “Sigam-me!” Em princípio, o processo que culminou comUM EXEMPLO PARA A NOVA FORMA Será que a ressurreição um dia será acessível a todos, eexiste um exemplo para a nova forma? Sempre todos poderão dar um passo nessa direção – al-há exemplos na evolução. Há dois mil anos, um guns ou muitos, e não importará a que religiãoser humano construiu a nova forma para nós, pertençam. O importante é que se processede forma exemplar. Ele o fez com perfeição. uma mudança em seu interior, que passem deMas no nosso caso só podemos falar de estágios uma vida egocêntrica para uma vida elevada, ainiciais desse processo. Quem nos deu o exem serviço de todos. mudança como impulso 43
A força propulsora da nova síntese tem sua raizno silêncio da alma-espírito, que participa datranquilidade do universoA SITUAÇÃO ATUAL Hoje, no início do terceiro também levam em si a memória da natureza, damilênio, estão entrando cada vez mais em ação Terra. Tudo o que aconteceu está ali preservado,energias que ultrapassam o espectro das ener como matriz, e pode ser acessado a partir dessagias dos nossos corpos sutis atuais. Em seu curso memória. Assim, talvez o que o Salvador vivenpelo macrocosmo, a Terra entra numa fase de ciou – como milagre – possa servir como provibração mais elevada, o que também se torna tótipo. Já podemos integrar-nos à matriz e delaperceptível em todos nós. No entanto, esse fato participar. Em outras palavras: podemos entrarem si não tem um efeito libertador. O aumento em consonância com ela! Isso é confirmado, àdo nervosismo e de doenças psíquicas aponta jus sua maneira e em sua terminologia, pelas maistamente na direção contrária. O ritmo acelerado recentes descobertas das ciências naturais.da nossa época também contribui para isso.Hoje se manifestam mais intensamente não CONSEQUÊNCIAS PARA OS REINOS NATURAISapenas as energias naturais do cosmo como Um salto como esse no processo de desenvolvitambém as forças espirituais. Nosso cosmo solar, mento do homem tem um grande efeito, umacom todo o seu sistema planetário, também é vez que somos a síntese dos mundos animalum campo espiritual de existência. Podemos e vegetal. Somos o “filho da evolução”, suaperceber que atualmente suas energias estão quintessência atual, o ápice do desenvolvimeninterferindo nos acontecimentos da Terra de for to natural, que está indissoluvelmente ligadoma corretiva, e também se desenvolvem forças à infraestrutura dos reinos animal e vegetal.autorregeneradoras para eliminar os distúrbios Estamos unidos aos seres da natureza, que nosprovocados pelos homens. A título de compara seguem no processo de desenvolvimento. Tudoção, poderíamos pensar no efeito da febre, que o que fazemos influi em tudo o que existe. Opropicia a cura do corpo (neste caso, do corpo universo aguarda o nosso avanço. Na Epístolada Terra). A humanidade está sendo tocada nos aos Romanos, capítulo 8:19, lemos: “Porque adois planos de existência: no natural e no espi ardente expectativa da criatura espera a maniritual. Tanto em um como no outro podemos festação dos filhos de Deus”. E a seguir em 8:21:perceber um aumento vibratório. Muitos mestres “Na esperança de que também a mesma criaturaespirituais do Oriente e do Ocidente previram será libertada da servidão da corrupção…” Logotais acontecimentos. Essas novas e intensas forças que a nova matriz interior conectar-nos comespirituais podem atuar em conjunto com a nossa pátria espiritual, com uma natureza maissemente espiritual no nosso imo, se nós assim elevada, todos os reinos naturais, que vêm atráspermitirmos. Elas são similares às forças do sol de nós e sofrem sob o nosso domínio, e que sãoespiritual, que estimulam a semente a crescer. acossados e explorados por nós, serão libertadosCriam novas estruturas de matéria sutil, que da escravidão em que se encontram atualmente.44 pentagrama 3/2012
Eles nos dão a base da vida e nós lhes abriremos processo. O que os caracteriza é a consciênciao portal para que continuem seu desenvolvimen da responsabilidade. No entanto, quando, emto. O ser humano é o fator condutor do processo seu caminho espiritual de mudança, o homemevolutivo. Quando ele segue em frente, possi permite que a unidade surja estruturalmente embilita que os mundos animal e vegetal também si, ele só poderá agir em harmonia com o Todo,possam dar um passo adiante rumo a algo novo porque o Todo vive nele.para eles. A ponte entre os seres vivos são seus Ele vivencia interiormente a conexão com oscorpos sutis. A planta, o animal e o homem es reinos naturais, suas vidas, e colabora paratão ligados por correntes etéricas. O homem e o oferecer impulsos renovadores a todos eles.reino animal estão ligados por correntes astrais. Ele está em consonância com tudo e sabe deE forças mentais constituem a esfera especial sua corresponsabilidade nesse processo. Asda humanidade. A região mental é um caos de criaturas dos reinos naturais são seus irmãosideias, um mar acadêmico fascinante, que não menores. Afinal, ele sabe que, por trás deles,deixa o ser humano tranquilo. neles e através deles, também estão atuandoMas a força propulsora da nova síntese tem sua grandes energias espirituais. Elas imprimem suaraiz no silêncio da alma-espírito. Esta participa marca na beleza e na genialidade das formasda tranquilidade do universo e abrange o Todo e das funções do mundo animal e vegetal. Oda criação. Quando fazemos parte do corpo cós impulso da nova síntese entre o ser humanomico de ressurreição, surge em nós uma cons natural e a vida espiritual traz impactos paraciência influenciada pelo Todo, que, plena de todo o mundo animal e vegetal. Na Doutrinaalegria, espelha Deus, o cosmo, o ser humano e Universal é dito que, então, os animais terãoos reinos naturais. Hoje, os primeiros sinais desse uma forma de consciência. Os primeiros indíciosdesenvolvimento já podem ser notados, pois em disso já podem ser observados hoje. Não se podetodo canto do mundo as pessoas estão lutando prever como será cada uma dessas manifestapor uma renovação da consciência. Es geht ums ções. O fato é que o caminho da transformação,Ganze (Trata-se do Todo) é o título de um livro que um ser humano pode decidir-se a trilhar dedo físico quântico Hans-Peter Dürr, que durante livre e espontânea vontade, representará formuitos anos foi diretor do Instituto Max Planck te impulso para a recuperação da Terra. É quede Ciências Naturais em Munique. as forças da consciência da unidade irão fluir através dela. Em seu poema Der gefesselte StromNOVAS FORMAS DE CONSCIÊNCIA PARA TODA (A torrente bloqueada), Hölderlin foi profético:A CRIAÇÃO Esses novos impulsos levam rumo “… Assim que a voz do filho de Deus se fizera um novo código de conduta. Todos os esfor ouvir, despertará novamente a alegria no seio daços em prol da ecologia são precursores desse terra…” µ mudança como impulso 45
RESENHA DE LIVROSÖREN KIERKEGAARDO QUE O AMOR FAZArjo Klamer inclino-me diante desseReciprocidade é o tipo de conceito que um economista consegue usar, até mesmo em assuntosintangíveis: você faz alguma coisa para alguém, a outra pessoa faz alguma coisa por você. Masas observações de Sören Kierkegaard sobre o verdadeiro amor, em seu livro O que o amor faz,transcendem essa forma de contabilidade moral de forma surpreendente. Por isso, o economistaArjo Klamer manifesta sua impressão assim: “É de perder a fala – caio em silêncio”.A adição e subtração dos contabilistas é algo inflexível, onde a suavidade, os sentimentos, a que distorce a imagem da realidade. To- beleza, o amor e o sagrado ficam distantes. Pa- dos são confrontados com isso quando se rece estar ainda distante a ideia da afetividade detrata de impostos ou demonstrações financeiras. uma vida familiar, uma organização inspiradora eReceitas, despesas, ativos e passivos: adicionando uma sociedade forte. Se o livro de Sören Kierke-e subtraindo, sabemos o quanto foi ganho e se gaard, O que o amor faz, for lido do ponto de vistasomos ricos ou pobres. da Ciência Econômica é de esperar-se que não seTodos esses números e resultados parecem ser consiga tirar muito proveito.substanciais e inexoráveis. Mas serão reais, de Visto com outros olhos, o assunto torna-se dife-fato? Refletem as coisas essenciais da vida? Será rente. Livros desse filósofo dinamarquês, antesque meu salário diz alguma coisa sobre a qualida- deixados de lado, fizeram-me ficar frente a frentede da minha vida familiar? O balanço reflete algo com os valores da verdade. Até então, minha vidada força inspiradora de uma organização? Será era hipócrita, experimental e medrosa, permeadaque o PIB (Produto Interno Bruto) de uma nação por uma luta intensa com questões existenciais.mostra a vitalidade da sua sociedade? Alguém já Consequentemente, vivia ponderando sobre essasconseguiu calcular a felicidade? Provavelmente, mesmas questões e, aparentemente, vivendo deessas perguntas estão totalmente fora do âmbito acordo com minhas próprias convicções.de um economista. Frequentemente se espera A luta pelo amor verdadeiro – de acordo com a convicção de que o amor transcende – em que os economistas ocupem- detrimento do que eu considerava o mais eleva- -se com o profano, do amor, como o amor pela esposa, intrigou-me com tudo o que possa enormemente. Como pode ele fazê-lo, perguntei- expressar-se através do -me, desesperado, durante a minha procura justa- dinheiro, do câmbio mente pelo amor mundano. ou quid pro quo (“toma O conceito de amor do autor é tão total que me lá, dá cá”). O mundo faz sentir pequeno. “Mas isso não tem nada a ver da economia apresenta- com a economia!”, você poderia pensar. O que -se como um mundo46 pentagrama 3/2012
amorme faz franzir minha testa de economista é a lin – o que pode ser feito de forma financeira ou deguagem usada por Kierkegaard. No capitulo 5 do outra maneira. O Deus do Antigo Testamentolivro O que o amor faz há uma citação a Roma- também estava em busca de retribuição.nos 13:8: “Que não possuas outro dever do que Até hoje ainda pagamos pelas dívidas contraíamar-vos mutuamente”. “O amor”, diz a sabedo das por Adão e Eva quando deixaram o Paraíso!ria antiga, “é um filho da riqueza e da pobreza”. Quando agimos com aparência moral não estaNinguém é tão pobre quanto o filho do amor. E mos fazendo mais do que uma espécie de condepois vem a conta, sua tese central: o amor cria tabilidade moral: portanto, é só uma questão dedívida, uma dívida infinita. Riqueza, pobreza, somar e subtrair. Não é tão difícil de reconhecerdívida: isso é linguagem de economista! Se con isso na vida cotidiana. Se alguém me ajuda, podetinuarmos a ler com maior compreensão, nota esperar um favor de volta. Isso se chama “reciremos o quanto Kierkergaard pensa em termos procidade”, e faz pensar na operação de câmbiofinanceiros. Tomemos por exemplo, essa anotação tão importante para os economistas. Há apenasdo seu diário: “Eu nasci em 1813, naquele ano fi uma diferença: essas transações são mais comnanceiro cheio de corrupção, quando havia notas plexas porque falta um meio de troca uniforme,falsas em circulação. Minha vida pode ser compa como o dinheiro. Alguém pode fazer-me umrada a esse tipo de dinheiro. Existe algo majesto enorme favor como estímulo, pode dar-me umaso em mim, que, devido ao contexto errado, não atenção sincera, ou manter comigo uma relaçãotem nenhum valor”. Meu pai jamais diria algo lucrativa, mas o “quando” e o “como” da retriassim, desgostoso como era quando se tratava de buição é que é problemático. Compensar comdinheiro. dinheiro geralmente não funciona, e pode até serExcepcional é essa fascinação pelo profano, que ofensivo. Assim, minha culpa com o outro acabanão existe no mundo do sagrado. E isso fica aumentando muito mais do que diminuindo.mais evidente quando prosseguimos a leitura. Geralmente seria melhor compensar com favores,Tomemos a Bíblia, por exemplo. Nesse texto sa como ajudar a escrever uma carta, dar empregogrado, o economista encontra consolo. Às vezes ao filho do meu benfeitor (o favor pode, portanparece que é escrita por economistas, embora to, ser dado à outra pessoa) ou com um honestose trate de uma contabilidade moral. Isso sig “obrigado”. Este último gesto é extraordinário!nifica que o lucro se apresenta de outra forma: Você recebe alguma coisa importante, e talvezpor exemplo, na forma de graça e bênção. Os cara, e a única coisa que precisa dar de volta é:pecados são anotados ao lado dos prejuízos. Se “obrigado”. Essa palavra conta como pagamentoprejudiquei alguém, então tenho uma dívida da dívida.para com essa pessoa, e estou com saldo negati Essas relações nada mais são do que restaurar ovo. Essa pessoa pode pedir para ser reembolsada equilíbrio entre o lucro e prejuízo, entre crédito e inclino-me diante desse amor 47
Arjo Klamer é professor da faculdade de economia ajudar os devedores do que castigá-los. A con cultural da Universidade Erasmus e tentou descrever sequência foi um grande sentimento de culpa da em seu livro In Hemelsnaam (Em nome do céu), Ten parte dos alemães. Por isso os alemães se dispuse Have, 2006, o aspecto aleatório da economia. ram a sacrificar o marco alemão – mas isso ainda O texto aqui apresentado é o da palestra dada na apre não foi suficiente. A dívida parece interminável! sentação da nova tradução do livro de Sören Kierkega Com isso, chego à observação intrigante que ard Wat de Liefde doet (O que o amor faz), traduzido Kierkegaard faz sobre o amor. Tal como já citei, por Lineke Buijs e Andries Visser, editora Damon, e que segundo ele, o amor cria uma dívida infinita para apareceu também no jornal Trouw de 1.º de dezembro quem ama. “Isso não faz sentido”, pensei eu a de 2007. princípio, assim como todos com quem conversei e que concordaram comigo. Quem ama oferecedébito. Porém, e essa é uma diferença crucial em seu amor para os outros. Por receber esse amorrelação à troca econômica, saldar a dívida não é ficam os outros em dívida. É assim que nós calcualgo que se faça com moeda, mas com grandezas lamos, não é? Não. De acordo com Kierkegaard,impalpáveis, como gestos e palavras. Minha mu é precisamente o contrário. Ele tem uma maneiralher e eu gastamos enorme quantidade de dinhei complexa de escrever, mas, depois de ler algumasro e tempo (especialmente ela) para educar nossos vezes, percebi o que ele quis dizer: amor quefilhos, e ficamos satisfeitos se eles continuarem a causa dívida não pode ser amor verdadeiro.olhar-nos nos olhos, a lavar a louça, e esperamos Esse amor verdadeiro não pode ser pago. Quemque mais tarde nos façam uma visita agradável. dá amor não empobrece, e portanto não tem deNão espero realmente que eles se ocupem de nós receber nada em troca. Pelo contrário! De acorum dia em troca dos cuidados que lhes dispen do com Kierkegaard, dar amor só faz a dívidasamos, pois isso não tem cabimento e seria muita ficar cada vez infinitamente maior. Como isso éexigência. Hoje, os filhos que se ocupam dos pais possível? Bem, assim esclarece o grande pensador,passam a encará-los rapidamente como uma carga o amor é um presente, um presente de Deus, pore se esquecem totalmente da atenção de que an assim dizer. Quem tem amor é imensuravelmentetes se beneficiaram. rico. Assim, está infinitamente endividado paraHouve um tempo em que isso foi diferente. com Deus.Aparentemente, o equilíbrio desviou-se mais Eu fico em silêncio. Como pessoa, esse amor mepara o lado deles. De qualquer maneira, rela parece impossível – não conheço ninguém quecionamento é uma questão de dar e receber. viva nesse amor – e o contabilista que vive dentroA arte está em discernir quando dar e receber de mim nada sabe sobre isso.estão em equilíbrio. Por mais calculistas que possamos ser na reciEm um contexto mais amplo, isso também se procidade moral da vida cotidiana, no final dasaplica. Os alemães, mais do que os japoneses, contas, o verdadeiro amor é um ato incalculável.pensam na Segunda Guerra Mundial como uma Então, humildemente, inclino-me diante dessegrande dívida que ainda não foi saldada. Depois amor, que Kierkegaard descreve de modo tãoda Primeira Guerra Mundial, os franceses qui convincente µseram retribuição em dinheiro, carvão e usinassiderúrgicas. Os contabilistas calcularam o quantodisso tudo era necessário para compensar a perdade vida e de capital econômico dos franceses. Osalemães acharam injusto esse acerto, e por issovieram as represálias. O resultado foi a tragédia da Segunda Guerra Mundial. Depois dessaguerra, os americanos concluíram que era melhor48 pentagrama 3/2012
Search