pentagrama Lectorium RosicrucianumMORTE ALQUÍMICA• jung, cura e alquimia 2015 2NÚMERO• receitas alquímicas • george mead II
Edição Revista Bimestral da EscolaRozekruis Pers Internacional da Rosacruz Áurea Lectorium RosicrucianumRedação FinalPeter Huijs A revista pentagrama dirige a atenção de seus lei tores para o desenvolvimento da humanidade nestaRedação nova era que se inicia.Kees Bode, Wendelijn van den Brul, Arwen Gerrits,Hugo van Hooreweeghe, Peter Huijs, Hans Peter O pentagrama tem sido, através dos tempos, oKnevel, Frans Spakman, Anneke Stokman-Griever, símbolo do homem renascido, do novo homem. EleGerreke Uljée, Lex van den Brul é também o símbolo do Universo e de seu eterno vir-a-ser, por meio do qual o plano de Deus se maDiagramação nifesta. Entretanto, um símbolo somente tem valorStudio Ivar Hamelink quando se torna realidade. O homem que realiza o pentagrama em seu microcosmo, em seu próprioSecretaria pequeno mundo, está no caminho da transfiguração.Kees Bode, Gerreke Uljée A revista pentagrama convida o leitor a operar essa revolução espiritual em seu próprio interior.RedaçãoPentagramMaartensdijkseweg 1NL-3723 MC Bilthoven, Países Baixose-mail: [email protected]ção brasileiraPentagrama Publicaçõeswww.pentagrama.org.brAdministraçãoPentagrama PublicaçõesC.Postal 39 13.240-000 Jarinu, [email protected]ção digitalAcesso gratuitoResponsável pela Edição BrasileiraAdriana PonteCoordenação, tradução e revisãoAdriana Ponte, Emanuel Saraiva, Leonel Oliveira, RossanaCilento, Amana da Matta, Denison de Sá, José de Jesus,Marcia Moraes, Marlene Tuacek, Mercês Rocha, Neusa Solis,Rafael Albert, Ellika Trindade, Fernando Leite, FranciscaLuz, João Batista Ponte, Lino Meyer, Luis Alfredo Pinheiro,Marcílio Mendonça, Roquefelix Luz, Urs SchmidDiagramação, capa e interiorDimitri SantosLectorium RosicrucianumSede no BrasilRua Sebastião Carneiro, 215, São Paulo - SPTel. & fax: (11) [email protected] em PortugalPraça Anônio Sardinha, 3A (Penha de França) 1170-022 [email protected] tugal@rosacr uzaurea.orgA revista Pentagrama é publicada seis vezes por ano emalemão, inglês, espanhol, francês, húngaro, holandês epor tuguês.Ela é publicada apenas quatro vezes por ano em búlgaro,finlandês, grego, italiano, polonês, russo, eslovaco, suecoe tcheco.© Stichting Rozekruis PersProibida qualquer reprodução semautorização prévia por escritoISSN 1677-2253
pentagrama ano 37 2015 número 2Com certeza, para morrer, precisamos ter uma “coragem que vem Capa: Esboço do pé de uma mulher adormecidade fora”; e, para viver, necessitamos de uma “coragem que vem de e uma criança deitada, Cornelis Schut (I), 1618 -1655dentro”. Certamente, também é mais fácil morrer pelas própriasopiniões do que viver de acordo com elas. símbolos portadores da verdade 3Mas ainda não há um consenso quanto a pensar que a verdadeira morte alquímica: separar e unir,vida consiste em duas partes, pois viver significa mudar, evoluir ese transformar a cada dia. Inclusive morrer: o pagamento da vida é morrer e vir a ser 6feito com o resgate da morte. Quando penetramos a sabedoria, a cura pela transformação,ou melhor, quando nos fundimos com ela, quando a abraçamos, apaisagem sofre uma mudança de 180 graus. cura e alquimia segundoA partir desse momento de tomada de consciência, cada dia é Carl Gustav Jung 12preenchido pela grandeza da interioridade. Logo somos trespassa consolo, força, benignidade,dos por ondas de alegria, compreensão e serviçabilidade. Viver e experiências compartilhadasmorrer passam a ser como inspirar e expirar. com cuidados de pacientesE a partir desse momento, percebemos que a pressão que senti terminais 22mos existe para fazer de nós observadores mais perspicazes, mais a montanha do espírito 27fortes e mais valiosos. E, por mais incrível que isso possa parecer, as as alças de jade 30circunstâncias presentes nos oferecem a melhor oportunidade para a redescoberta da gnosis II,dar o próximo passo: então, nos dispomos a colaborar, do fundo do george stowe mead, o primeirocoração e da alma, seguindo harmoniosamente a corrente da vida. gnóstico moderno 34Era assim que os alquimistas clássicos compreendiam a vida. Era libertar-se do pensamentoassim que eles praticavam sua Arte e observavam atentamente os racional 38processos ligados à perfeição da tintura. imagens do mundo: receitasEsta edição traz a transcrição dos textos do simpósio Morte alquímicas 2, 10, 11, 20, 21, 26,Alquímica, realizado em outubro de 2014, no Centro de 43, 44Conferências de Noverosa, na Holanda. O ponto de partida foram as receitas alquímicas do livro de Thom F. Cavalli AlchemicalPsychology. Old recipes for living in a new world (PsicologiaAlquímica - velhas receitas para se viver em um mundo novo) de2002. Algumas delas estão impressas nas páginas desta revista –gravadas em ouro! 11
IMAGENS DO M U N D O A SEXTA RECEITA. Semeai vosso ouro em terra branca purificada Semear é um ato simbólico, é uma intervenção ritual na natureza terrestre com a finalidade de favorecer seu processo de reprodução. As sementes áureas espalhadas são portadoras de energia espiritual rica em possibilidades de transmutação. Semear faz parte dos arquétipos presentes em nosso imaginário e que estão profundamente ancorados em nossa consciência. Esse gestorepresenta a ação de curar que, fundamentada na correta atitude interior, traz resultados que valem ouro. Antes de qualquer coisa, é preciso purificar a terra (prima materia) onde se semeia. Esse processo de saneamento é a busca do equilíbrio, obtido quando se enxerga além do mecanismo dos incessantes desejos, pensamentos e ligações emocionais, que turvam a consciência e prendem à Terra. Semear é também um ato de oferenda, de oblação; é a crucificação do eu inferior. Aolongo do processo de calcinação, a terra negra, correspondente ao sal, torna-se branca pelo fogo do enxofre e se transforma em cinzas brancas. A cinza é da terra negra, desintegrada, refinada, tornada pura brancura. As cinzas constituem o terreno nutridor favorável à semeadura do ouro. Essas cinzas nos conduzem à transição correspondente à fase albedo na qual, mediante a ação espiritual do semeador, que é Mercúrio, a cinza branca é transmutada em ouro.2 pentagram 6/2014
símbolos portadoresda verdadeA verdade não veio nua ao mundo, mas veio em modelos e imagens. O mundo nãoreceberá a verdade de qualquer outra forma. Há um renascimento e uma imagemdo renascimento. Certamente é necessário nascer outra vez por meio da imagem.Qual delas? A ressurreição. A imagem deve levantar-se outra vez por meio daimagem. A câmara nupcial e a imagem devem entrar na verdade através da imagem:isto é a restauração. O Evangelho de Filipe, v. 55Em seu livro A linguagem secreta dos sím é o homem – esse caos de paixões, desejos, bolos, David Fontana destaca o caráter pensamentos e vontade – que está em con universal dos símbolos e da sabedoria dição de esclarecer o homem, mas é a verque eles ocultam. Eles não seriam meros dade que o esclarece...” “É muito simples,”fenômenos relacionados à cultura. Menos ex diz Von Eckartshausen, “Deus é amor, eplícitos que a linguagem em si, eles se diri amor nada é senão fazer o bem ao próximo.gem a um aspecto diferente e mais profundo A razão pode alcançar a compreensão dono homem. Esse aspecto não é nem unívoco bem quando busca os mistérios da verdadeinem superficial; ele se situa num estrato mais ra religião e se deixa inspirar por Cristo.”profundo. É por essa razão que os símbolos O olho, então, adquire maior acuidade eincitam o homem a certa autoatividade de aprende a discernir o significado das imaimportância essencial na alquimia da vida. gens que querem chamar nossa atenção sobreA Escola Espiritual possui um tesouro de o mundo. Eckartshausen prossegue: “Essaconhecimentos, uma rica biblioteca que inspiração é sinal de que nos aproximamosnão deve permanecer sem uso e empoeira do templo interior. Somente o amor religada. Ao mesmo tempo, estamos na véspera, o homem ao homem, e onde ele desaparece,se não exatamente no centro, da realização onde ele não pode ser encontrado, o homemda Sophia, a sabedoria, o pensar da alma. torna-se o carrasco do homem”. No popuOra, os símbolos podem participar do des lar livro de John Green A culpa é das estrelas,pertar da Sophia, pois figuras e símbolos um pai cuja filha é portadora de uma doençanos ajudam a nos aproximar da verdade. As mortal explica que estamos “sempre ocupagerações de pensadores esclarecidos que nos dos em alcançar nossa imortalidade”. Comprecederam, e cujos textos nos inspiram ain isso, ele quer dizer que “queremos deixar umda hoje, advertem-nos há séculos que “não rastro, uma prole, uma filosofia ou algo que símbolos portadores da verdade 3
Um semeador causa uma transformação, contribui para ela.Ele torna a colheita possíveltestemunhe que passamos por aqui, de modo representação de um semeador espalhandoque o universo não se esqueça disso – como seus grãos de ouro em terra revolvida, areanas árvores em que foi gravado: ‘fulano es da, enriquecida de cinzas brancas.teve aqui’. Mas é precisamente do universo Poderíamos ver nessas cinzas brancas oque se trata! Nós, você ou eu, não devemos homem que, tanto quanto lhe seja possível,ser conhecidos, mas sim o universo: é ele efetua um trabalho sobre si mesmo. A terque deve ser conhecido por nós”. E ele pros ra representa sua personalidade, e as cinzassegue: “Creio que o universo tem uma ligei da matéria, a antiga energia que lhe perra preferência pela consciência, e recompensa mite viver, retornar ao ponto de partida.a inteligência que sente prazer em observar Como figura alquímica, a matéria comportasua elegância”. Ao mesmo tempo, é preciso frequentemente temas inspirados na jardinotar que não cabe a nós, peças de reposição nagem. Ao longo dos bosques e campos, oda história do universo, acreditar que o uni alquimista observa a natureza na esperanverso é apenas transitório. Finalmente, tudo ça de desvendar seus segredos. É notóriono universo serve para revelar à humanidade que, desde há muito, o conhecimento queque ela é um detalhe de um grande prodígio o alquimista tenta acumular diz respeito aoe como ela pode, de forma consciente, real conhecimento superior, a uma verdadeiramente fazer parte dele. consciência. As imagens, se bem que sempreOs símbolos e imagens que nos religam a estáticas, referem-se aos processos dinâmicosessa sabedoria superior propõem, portan do ciclo da vida. O objetivo dos alquimisto, que sejamos figurantes ativos. Podemos tas sempre foi o conhecimento da natureaprender a ler, a interpretar esses símbolos za, a busca de Deus por meio da natureza.e imagens. Assim, com base em nossa ati Além disso, os rosa-cruzes clássicos tinhamtude dinâmica, é estabelecida uma liga por axiomas: primeiro, o estudo das santasção. O exemplo a seguir pode ilustrar esse escrituras; segundo, observar a obra de Deusfato: durante uma apaixonante reunião em na natureza; e terceiro, a prática do amor aoNoverosa, vários grupos estudaram um próximo para alcançar a sabedoria autêntica.tesouro de imagens provenientes do mun Voltemos à imagem do semeador espalhandodo da alquimia, dentre as quais havia a seus grãos de ouro na terra cuidadosamente4 pentagrama 2/2015
preparada. O ouro representa o aspecto mais pessoal, ou experimentação. Há muito tempoelevado que se pode alcançar, o mais precio a alquimia não encontra espaço nos laboraso. Ao mesmo tempo, esse símbolo chama a tórios, mas sim na vida cotidiana. Cavalliatenção para o fato de que, para fazer ouro, acrescenta que a tarefa consiste em velar pelaé preciso primeiro tê-lo. O semeador é o boa definição da alquimia – que, segundo elesímbolo do homem, que é o intermediário é: viver. É então que faz sentido a citação queindispensável para ascender a um desenvol destacamos, extraída do Evangelho de Filipe: “Avimento superior. Um semeador sacrifica o verdade não veio nua ao mundo, mas veio emque lhe é mais caro e, por seu gesto, provoca modelos e imagens. O mundo não receberáuma transformação, contribui para tornar a verdade de qualquer outra forma. Há uma colheita possível. Com efeito, a farinha renascimento e uma imagem do renascimené mais que o grão, do mesmo modo que o to. Certamente é necessário nascer outra vezpão assado é mais que a farinha. Quanto às por meio da imagem. Qual delas? A ressurcinzas, devido ao fato de representarem a reição. A imagem deve levantar-se outra vezextinção, elas simbolizam o homem que, em por meio da imagem. A câmara nupcial e aseu desejo ardente de se unir ao original, imagem devem entrar na verdade através daao Espírito, depois de ter atravessado a mais imagem: isto é a restauração”.profunda das crises, alcança a pureza abso Karl von Eckartshausen restabelece a relaçãoluta. O ouro é semeado na terra preparada, entre a verdade e o amor. Pelo fato de aproe a cinza representa o processo de purifica ximarmos símbolos e figuras, começamos ação que, uma vez iniciado, é irreversível. discernir. Sim: ao nos aprofundarmos, nosDe fato, a cinza já não pode produzir fogo aproximamos da verdade. Nessa verdade estánem tornar-se madeira. Assim se desenvolve oculto o amor. Digamos que, ao nos aproxia compreensão dos profundos e irreversíveis marmos do universo para conhecê-lo, estaprocessos aos quais somos ligados e, muitas e mos em busca da verdade. Isso é realmentemuitas vezes, religados. lógico porque, desse modo, não colaboramosSe vocês compreenderam bem, se observaram apenas com nossa razão, mas com nosso siso caminho da Escola desde o início, trata-se tema inteiro. Portanto, são três que atuam: ade uma situação irrevogável. As figuras per verdade, a vida, o amor. A vida deixa transmitem que a compreensão, o entendimento, parecer a verdade e nos permite conhecê-la.penetre mais profundamente. Em sua obra Nessa verdade, reencontramos o amor e comPsicologia Alquímica, Thom Cavalli explica que preendemos o que ele torna possível. Assim,a alquimia é a primeira tentativa de transfor nesse ternário, nenhum deles é superior aosmação da consciência mediante a experiência outros dois. µ símbolos portadores da verdade 5
a morte alquímica: separare unir, morrer e vir a serAlguns conceitos alquímicos são baseados prata (fase albedo) com o objetivo de ser trans em processos de transformação puramen formado em ouro (fase rubedo). Segundo Jung e te físicos. Assim, nessa ciência mais tarde Cavalli, nigredo, albedo e rubedo são três etapas dotão difamada, a tríade bem conhecida “espí processo de individuação, e seu objetivo princirito-alma-corpo” relaciona-se aos elementos pal é a integridade psíquica.materiais enxofre, mercúrio e sal. O enxofre éinflamável e volátil, o mercúrio é tanto líqui NIGREDO No decorrer da fase nigredo, na qualdo como gasoso, e o sal tanto é sólido quanto todas as aparências opacas (cobre) são desmassolúvel. Essa tríade preside praticamente todos os caradas, caímos como chumbo diretamenteprocessos de criação da vida. na força da gravidade. O alquimista realiza a dissolução a fim de reduzir tudo a uma massaA TRÍADE NO HOMEM MICROCÓSMICO No confusa, uma matéria primordial bruta e caómicrocosmo, ela se acha tanto no processo de tica, pronta para ser transmutada. Esse é umcriação quanto no de recriação. Podemos esbo estado que, no plano psicológico, correspondeçar esse processo da seguinte maneira: ao abandono da posição central do eu, que até• Primeiro: o espírito, o impulso espiritual esse momento dominava toda a vida interior: um estado no qual as forças obscuras da vida que outrora fez inflamar no microcosmo a ainda inconsciente da alma ameaçam tomar a centelha do espírito, faz que ela se reacenda direção do sistema. Somente o conhecimento (enxofre); de si mesmo permite atravessar com toda a se• Segundo: a transmutação da alma que, em gurança essa situação tão perigosa. Esse conhe resposta a um impulso espiritual, sofre uma cimento não é um saber puramente intelectual, completa mudança (mercúrio); mas sim a profunda tomada de consciência• Terceiro: consequentemente, o corpo se interior segundo a qual ainda não estamos submete, por sua vez, a uma transformação preparados para agir no mundo do inconsciente absoluta (sal). reprimido.Se formularmos o que foi dito acima em termos de psicologia alquímica, poderemos dizer ALBEDO Uma vez passada a fase nigredo, a faseque seria necessário retornarmos à inconsciência albedo fará resplandecer uma luz sobre a prima(chumbo), com base numa aparente consciência materia. Assistimos a essa aurora do espírito(cobre), para alcançarmos, em seguida, a pura somente após uma total separatio, a qual requerconsciência da alma (prata) e, daí, chegar à pura a aplicação do conselho hermético de separarconsciência espiritual (ouro). Tudo isso é assim amorosamente o que é denso do que é sutil:expresso em termos alquímicos: o chumbo (fase “separe com amor, grande discernimento enigredo) deve ser transmutado na pura alvura da6 pentagrama 2/2015
Para termos uma ideia do que é a morte alquímica, vamosmergulhar na psicologia alquímica, que um grupo de médicos doLectorium Rosicrucianum estudou intensamente durante doisanos. O ponto de partida era a obra extremamente inspiradaAlchemical Psycology – Old Recipes for Living in a New World(Psicologia Alquímica - velhas receitas para se viver em ummundo novo), de Thom Cavalli 7
Deus dorme na pedra, sonha na planta,move-se no animal e desperta no homem!sabedoria, a terra do fogo, o sutil do grosseiro, RUBEDO Essa preparação finalmente acontecedenso e sólido. Da terra, ele sobe para o céu, e durante a fase rubedo, a última da obra alquíde lá, retorna à terra, levando em si mesmo a mica, que é a do ouro avermelhado. Não é oforça do que está em cima e a força do que está ouro comum, mas sim o ouro do espírito, queembaixo”. Somente quem, de forma radical, es agora pode novamente se expressar, tomartabelece em si mesmo a distinção entre o eu e o corpo na matéria. Assim, o sangue inicialnão-eu, o finito e o infinito, pode colocar um mente vermelho escuro toma a cor do ouro.fim a toda essa confusão. O que Jung chama o Durante a fase albedo o movimento era voltadofuncionamento da anima é o desenvolvimento para o alto, numa subida da consciência–euda Sophia – ou seja, a pura atmosfera da alma para a consciência da alma. Agora é o inver(feminina) que está envolvida por sua veste de so: o espírito desce para a alma: “... retorna àluz. A alma natural, obscura, privada de luz, étransformada em uma alma consciente terra, levando em si mesmo airradiante. Do mesmo modo que a força do que está em cima eclara estrela da manhã anuncia a força do que está embaixo”.o dia, ela também anuncia Na visão da alquimia, a figua sua ascensão. Por esse mé- ra de uma criança desce até otodo, desaparecem todas as túmulo aberto, onde repousarepresentações imaginárias, de o hermafrodita, e o despertamodo que as contradições são para a nova vida. Assim, asobrepostas, transcendidas. Em alma renasce no Espírito e alinguagem simbólica, o lapisphilosophorum (a pedra filosofal)é a ferramenta indispensávelpara a preparação do ouroespiritual.8 pentagrama 2/2015
matéria bruta, enobrecida, transforma-se em Thom. F. Cavalli é umouro. Com base nesse ponto de vista, a mor terapeuta junguiano da Cate alquímica significa sempre uma nova vida. lifórnia, autor de inúmerasPelas três transformações, abre-se uma pos conferências e publicaçõessibilidade totalmente diferente da morte que sobre alquimia. Libertanpõe fim à vida natural. Essa possibilidade é do-a da poeira das estanteschamada por Paulo de “morte diária”. e de suas características um tanto ridicularizadas,MORTIFICATIO Aí está a chave não somente ele recoloca essa arte epara a individuação ou renovação psíquica de si essa ciência esquecida bemmesmo, mas, além disso, do processo espiritual no centro da vida cotide renovação da vida: a transfiguração. Por diana fazendo a seguinte pergunta: “O que significa a alquimia para nós, nos dias de hoje?” Seu livro Psicologia Alquímica - velhas receitas para se viver em um mundo novo, de 2002, traz inúmeros e sólidos significados para as pessoas que buscam discerni mento e querem aplicar em sua vida a Arte Real da vida consciente. isso, não é de se espantar que os alquimistas atribuam tanta importância ao mortificatio. Ao morrermos a cada dia, vencemos o caráter absoluto e obrigatório da morte – pelo menos a morte compreendida como um fim absolu to, vista como um caminho sem saída. Como a vida e a morte se transformaram, entramos em uma nova dimensão, em um novo campo de vida. Como conseguiremos fabricar o ouro se não estivermos preparados para nos desfa zer do cobre, de falso brilho, ou do chumbo pesado, cinzento e embaçado? Essa compreensão nos leva ao desapego, ao abandono de toda e qualquer forma esclero sada – e, assim, nos confiamos ao derradeiro processo da vida. µ 9
IMAGENS DO MUNDO A SEGUNDA RECEITA. Dilui a matéria em sua própria água. Funde o consciente e o inconsciente O rei (o ego) está no limite entre o ar (o que é consciente) e a água (o que é inconsciente). A cabeça se encontra sobre a água (o pensamento é livre); o coração está logo abaixo da superfície da água (as emoções emergem do inconsciente) e a pélvis (as tensões magnéticas que nos ligam ao passado)encontra-se mais ao fundo. Flutuando, o rei se afasta do mundo. Ele está com as palmas das mãos paraos lados (fora do mundo), os braços abrindo-se em forma de cruz (simbolizando a entrega). As pernas estão cruzadas (atitude de não abertura, fechamento). O pensar, o sentir, o querer, centrados no eu, se dissolvem na água. O consciente e o inconsciente tornam-se Um, o que gera conhecimento de si e consciência de si. Podemos fazer um paralelo entre esta imagem alquímica e o capítulo A Primeira Hora, do livro Nuctemeron, de Apolônio de Tiana, comentado por J. van Rijckenborgh.10 pentagrama 2/2015
IMAGENS DO MUNDO A TERCEIRA RECEITA. Sê vigilante, até mesmo dormindo No anfiteatro da sabedoria eterna, a imagem ilustra os diferentes níveis de existência. À esquerda, o mundo da cabala, o mundo divino; à direita, o mundo da alquimia e o mundoterrestre. Entre o celeste e o terrestre, encontra-se uma mesa de altar, sobre a qual estão quatro instrumentos musicais e diversos instrumentos de medida utilizados na prática da alquimia: é a expressão simbólica do valor da música. A música sacra consola a tristeza e afasta os espíritos malévolos; no coração repleto de alegria piedosa, o espírito divino canta seus salmos. Esta é a primeira magia divina pela qual o alquimista se interessa. Em seu laboratório, ele ora ajoelhado diante de um tabernáculo onde se encontram as seguintes inscrições: – Feliz daquele que segue os conselhos de Deus. – Não discurses sobre Deus antes de alcançares a iluminação. – Se executares teu trabalho de maneira justa, Deus sempre virá em teu auxílio.Trata-se da alquimia, mas também da cabala – uma cabala cristã que nos introduz a três domínios: o da magia, o da magia natural e o da magia sobrenatural. São os domínios do corpo, da alma e do espírito. Ao considerarmos o homem como ser espiritual, os instrumentos tomam outra dimensão. Eles se referem à fé em total harmonia com o universo; à maneira de reconhecer a si mesmo nesse universo divino; à maneira como o homem pode escolher trabalhar no cosmos natural e com base nele, a fim de que a ele se abra o mundo divino. imagens do mundo 11
a cura pelatransformação“É importante que eu não me encontre de mãos vazias no final da minha vida.”Foi assim que C. G. Jung resumiu sua busca pelas razões de viver e de morrer.Esse caminho de pesquisa conduz ao discernimento, à inspiração e podeinfluenciar quem reflete sobre a morte, a vida e a maneira de acompanhá-las.Hoje, ao invés de falar de morte, Thom F. Cavalli, psicólogo junguiano – que preferimos falar de “fim da vida”. justifica o caminho tomado por C. G. Jung. Escolhemos, assim, nos esquivar, com Devemos observar que é especialmente noum eufemismo, da dura realidade de um meio do mundo médico, mais que no daprocesso inerente à própria vida. De fato é filosofia e da religião, que o olhar sobre vidacompreensível, uma vez que nossa sociedade e morte mudou radicalmente. Para isso, ovê a morte como o termo definitivo da exis mundo médico teve de quebrar sua couraçatência, dentro de um contexto material, bio reducionista. Isso coincidiu com o apogeulógico, global e social. Ora, em sua essência, da ciência, às vésperas do século 20. Freud,a morte comporta uma renovação, no sentido como neurologista, e seus discípulos forammais amplo, multidimensional: físico, bioquí os primeiros a lançar um novo olhar sobre osmico, energético, psíquico, cósmico e even desvios psicogênicos. Eles se recusaram a vertualmente espiritual. A morte está presente as causas exclusivamente nas doenças endóem todos os níveis de vida. É um dado uni genas. Então, começaram a falar de curas,versal, ou seja, arquetípico, profundamente projeções, fixações, neuroses, mecanismos deenraizado na estrutura de toda forma de ser. defesa, regressão, relações de transferência:Esse modelo foi explicado pela primeiríssima havia nascido o pensamento energético! Umavez num ramo da psicologia arquetípica de suas leis fundamentais era a manutenção da energia. O que desaparece, aqui, diziaUMA COURAÇA QUEBRADA POR FREUD Freud, ressurge acolá, já não na consciência,O conceito de arquétipo apareceu na obra mas no inconsciente, ou vice-versa, de mododo médico e psicólogo Carl Gustav Jung. que, no final, nada jamais se perde.Portanto, primeiro devemos relatar comoele tomou consciência disso. Depois virão os O INCONSCIENTE COLETIVO Pouco temelementos utilizados mais especificamente po depois, Jung, sendo um discípulo muitopela Psicologia Alquímica - velhas receitas para crítico de Freud, desenvolveu mais profunse viver em um mundo novo, título da obra de damente essa visão energética. Ele se livrou12 pentagrama 2/2015
CURA E ALQUIMIA SEGUNDO CARL GUSTAV JUNG da teia de fundo racionalista e personalista, Metamorfose da alma e seus símbolos, traduzidoo que levou a novos conceitos: o incons posteriormente para o inglês sob o título deciente coletivo e sua estrutura arquetípica. Symbols of Transformation. Segundo Jung, osJung demonstrou que todos os processos de processos inconscientes carregam um potenmudança relativos à cura tinham sua fonte cial de renovação da vida, que é caracterizanesse campo psíquico matricial. Ele tinha do por uma primeira fase de declínio ou deboas razões para dar a seu livro (que devia morte seguida por uma fase de renascimentoselar sua ruptura com Freud) o título de e de regeneração. Parece que estava escrito a cura pela transformação 13
Surgido em fac-símile em 2010, o famoso Livro vermelho é odiário pessoal de Jung, extremamente profundo e ricamenteilustrado por ele mesmo14 pentagrama 2/2015
nas estrelas que cedo ou tarde Jung reencon de origem taoísta descreve a realização dotraria o caminho da alquimia! estado de imortalidade sob a forma da eclo são de uma flor de ouro. Essa flor só podeA FLOR ÁUREA E A CRISE EXISTENCIAL Na crescer quando a luz circula em seu interior.época em que trabalhava no citado livro – Em termos psicológicos, poderíamos dizer:entre 1911 e 1912 –, Jung fundamentou sua quando voltamos nossa atenção perseverante-nova teoria referindo-se sobretudo às re mente para nosso interior.ligiões naturais primitivas, ao pensamentoe à sabedoria dos mistérios antigos, o que, PARACELSO De fato, muito tempo antes,de qualquer modo, levou-o à conclusão de Jung já havia tomado conhecimento da alque a cura viria depois da travessia de uma quimia ocidental na obra pioneira do psicrise, de um período de transição no qual canalista vienense Herbert Silberer. Depoisas antigas estruturas simbólicas tivessem de romper com Freud, Silberer cometeusido dissolvidas, para que as novas pudes suicídio. A obra de Silberer faz jus ao título:sem ser constituídas. Para Jung, esse não era Probleme der Mystik und ihrer Symbolik (1914)apenas um conceito teórico, uma vez que (Problemas do misticismo e de sua simboele mesmo passou, pouco depois, por uma logia), sobretudo quando a tradução inglesaprofunda crise existencial. Seria por acaso acrescenta: “e das artes ocultas”. O autor seque essa crise coincidiu com a declaração da baseia numa velha história, Parábola, extraídaPrimeira Grande Guerra? Pouco depois, ele das Figuras secretas dos rosa-cruzes, livro que seentrou num estado psicótico. No momen assemelha fortemente às Núpcias alquímicas deto mais agudo de sua crise, ele conservava Christian Rosenkreuz. Jung descobriu a alquiem sua mesa de cabeceira um revólver, caso mia e foi marcado pelo resto de seus dias.o sofrimento se tornasse insuportável. Há Mencionemos também que Jung era origiaproximadamente cinco anos surgiu O livro nário dos arredores de Basileia, na Suíça,vermelho, o diário pessoal de Jung, ilustrado cidade onde Paracelso nasceu. O avô que deude próprio punho, no qual ele fala sobre essa o sobrenome a Jung – e que dizem ter sidocrise e a explica. A causa de ter parado de filho ilegítimo de Goethe – ocupara o altoescrever seu diário no final de sua vida foi cargo de reitor da universidade de Basileia.a descoberta do mundo alquímico, rico em Jung sentia uma ligação de parentesco com oimagens e figuras. Essa descoberta remonta a genial Teofrasto Paracelso que, como ele, ha1928, quando Richard Wilhem lhe confiou a via rompido radicalmente com a medicina orredação do prefácio de sua tradução do livro gânica de Galeno e que, além disso, introduO segredo da flor áurea. Esse tratado alquímico zira a visão alquímica no mundo médico. No a cura pela transformação 15
início dos anos 1940, Jung realizou uma série e outras como a mortificatio (a decomposide discursos comemorativos, que agrupou ção total), que ele menciona de bom gradosob o título de Paracelsica e que mais tarde – eram fases que poderiam dizer respeito aressurgiu com o título de Estudos alquímicos. uma transformação dos próprios alquimistas.Rapidamente seguiram-se outros livros como Com base nessa visão das coisas, Jung penePsicologia e alquimia e Psicologia da transferência, trou a opacidade de muitas descrições quesendo este último um comentário do Rosário encontramos nos velhos tratados alquímicos.dos Filósofos, no qual há uma imagem repre Ele formou uma biblioteca pessoal para anesentando um casal nu em uma banheira e ou xar suas próprias interpretações psicológitra de um hermafrodita alado saindo de sua cas – às vezes contestáveis. Seja como for, atumba – duas imagens que se tornaram muito alquimia foi, desde então, a matéria primorconhecidas devido à capa de um antigo disco dial de seu pensamento.de vinil de Leonard Cohen. A CRUZ DOS ALQUIMISTAS Podemos citar,MUDANÇA INTERIOR Jung terminou seu por exemplo: “Aceitar as oposições funestudo sobre alquimia entre 1955 e 1956, damentais próprias do homem significaem sua monumental obra de três tomos aceitar também que há na psique humanaMysterium Coniunctionis. Com a ajuda notó tendências que se contradizem”. Conformeria de sua colaboradora Marie-Louise von a alquimia revela, a oposição é quádrupla,Franz, ele esclarece todo o tratado Aurora compondo-se de quatro elementos oposConsurgens. Também nessa obra ele não ig tos entre si que formam uma cruz. “Cruz”norou os símbolos que aparecem nas Núpcias como forma e como tormento é uma expresalquímicas. Observamos em Mysterium são da realidade psíquica. É por isso que aConiunctionis uma mudança de visão quanto expressão “carregar sua cruz” é convenienteà busca da pedra filosofal. Daí em diante, como símbolo da obra do alquimista, senele considera de modo diferente a prepara do integridade e sofrimento os elementosção do elixir da vida. Já não se trata sim -chave de seu trabalho. Por essa razão oplesmente, a seu ver, de um processo de Rosarium (O rosário dos f ilósofos) terminaordem material. Jung foi um dos primeiros com uma representação do Cristo ressuscitacientistas a afirmar que essa prática exigia do, tendo por legenda: “Após meus grandescerta atitude do alquimista: estar disposto e múltiplos sofrimentos, eis-me ressuscitaa uma transformação interior. Ademais, ele do, transfigurado e purificado de todas asconsiderava que muitas operações sobre a minhas faltas” (in Psicologia da transferência,matéria primordial – a solutio, a sublimatio p. 128-129).16 pentagrama 2/2015
Um alquimista fecha muito bem seu forno, para que nenhumainfluência exterior possa perturbar o processoDe que trataria, no fim das contas, a alqui entre o consciente e o inconsciente marcadamia? Para falar de aumento ou elevação da por um processo de diferenciação (disiunctio)consciência e de cura, Jung sempre pensa seguido de um processo de integração dosem termos de transformação, da transmuta conteúdos psíquicos (coniunctio); por um disção do antigo para o novo, da passagem de tanciamento seguido de reunião; pelo destauma espiral inferior para uma superior. Para que de conteúdos psíquicos que conduzem àisso, é necessário um aporte de energia, sem integridade; pela adoção de uma atitude simo qual só obteremos petrificação, alteração, bólica em substituição à contínua projeçãocaos e declínio. Portanto, era com razão que de si mesmo para o exterior e o fato de seo alquimista evocava uma opus contra naturam identificar com todo esse processo. Jung não(obra contra a natureza), um processo con ligou a isso consequências metafísicas portrário à natureza, conforme revela Jung. No que, para ele, em alquimia, imortalidade eentanto, ele acrescenta que essa adição de eternidade são apenas símbolos de uma novaenergia deve vir do próprio alquimista, de disposição psíquica que deve levar o hosua atenção, de sua implicação no processo mem ao que ele chama individuação, a qualde transformação, da orientação de sua cons considera o equivalente moderno da transciência, da colaboração do inconsciente para formação alquímica, pois essa individuaçãoa cura. Assim, de acordo com Jung, a retorta não diz respeito unicamente à consciência,ou forno alquímico deve ser necessariamente mas também ao inconsciente. Assim comofechado para que as forças do exterior já não na alquimia, a libertação não diz respeitopossam perturbar o processo, o qual necessita somente aos crentes, mas deveria se estenderde um completo estado de introversão, o qual à realidade como um todo.é frequentemente representado por um esqueleto ou um corvo negro. MAIS ALÉM DO QUE JUNG Embora as mudan ças desejadas pela prática da alquimia envolA INDIVIDUAÇÃO SEGUNDO JUNG Seguindo vam muito mais que as mudanças referenteso tema principal da alquimia que é solve et a alguns modelos psíquicos de reação, Jungcoagula (a separação e a reunião dos opos esteve inclinado, durante longo tempo, atos, a espargiria), Jung concebeu uma relação querer reduzir tudo a mecanismos psíquicos. a cura pela transformação 17
Assim, ele frequentemente se deixa ser apa quais a dor do nascimento e a da morte sãonhado em falhas, prendendo-se a uma visão evocadas, e mesmo sentidas. O controversomuito retilínea, na qual o impacto psíquico, Wilhelm Reich fez experiências do mesmoque ele ressalta, mantém na sombra uma tipo com a aplicação do orgone – um tipotransformação mais global. de energia eletromagnética – para removerDessa forma, num bom número de pontos, bloqueios no corpo humano.suas ideias são desatualizadas. Outros se Citamos, por fim, as pesquisas impressioguiram sua obra pioneira, como por exem nantes de Ken Wilber sobre os numerososplo James Hillman, o verdadeiro fundador estados de desenvolvimento da consciência.da psicologia arquetípica, e o antropólogo Ele vê uma linha ascendente do estado deJoseph Campbell, autor de O herói de mil inconsciência até o estado de consciênciafaces. Este, diferentemente de Jung, propõe universal, que ele chama de gnosis.um tipo de supraconsciência. Stanislas Grof,no início da psicologia transpessoal, após OUTRAS INOVAÇÕES Há muitas mudanças emexperimentos com LSD, merece também curso em outros campos científicos. Por exemser mencionado. Ele fez pesquisas sobre os plo, o desenvolvimento da medicina energétiestados perinatais, chegando à perturbadora ca, as novíssimas descobertas sobre o cérebro,visão de que o início e o fim da vida são, por as inovações no pensamento conceitual com anatureza, semelhantes. Para despertar estados noção dos “campos” – tudo isso em conformitranscendentais similares a esses dois momen dade com as descobertas no domínio da físicatos-chave, Grof submeteu seus pacientes a quântica. Mas não devemos esquecer que, emtécnicas de breathing and rebirthing (respiração seu tempo, Jung já trabalhava com o físicoprofunda e situação de renascimento) nas Wolfgang Pauli, que descobriu o nêutron. Trata-se de desenvolvimentos completamente diferentes dos propostos por um meio médi co limitado, no qual a noção de imortalidade apenas é encarada como prolongamento da vida e de curas de rejuvenescimento por meio de tratamentos hormonais e outros. Elisabeth Kübler-Ross, por exemplo, com seu trabalho em cuidados paliativos, sentia-se deslocada nesse mundo médico. Inspirada pelo velho sá bio de Küssnacht, Jung em pessoa, ela explo rou domínios totalmente novos.18 pentagrama 2/2015
Eu morri mineral, tornei-me planta. Morri planta, tornei-me animal. Também morri animal, para tornar-me homem.A MORTE ALQUÍMICA Por que temerei a morte, possível que um eu atempo-Vejamos f inalmente uma vez que jamais perdi ral em seu estado pré-natalo conceito de morte e somente ganhei? se projetasse no espaço-alquímica. A esse pro -tempo para aí fazer expepósito, esclareçamos que Minha próxima etapa será riências e alcançar o conhea morte se apresentou elevar-me ao estado de anjo. cimento de si mesmo e umapela primeira vez a Jung consciência mais ampla.durante uma violenta Mesmo anjo, morrereicrise cardíaca, em 1944. para me alçar ao estado O VERDADEIRO CRITÉRIOEssa prova contribuiu que ultrapassa todo entendimento. PARA MINHA VIDApara direcionar seus tra- Rûmi Jung escreveu: “A questãobalhos posteriores. Ele decisiva para o homem é:percebeu que sua maneira de reduzir tudo à sou afetado pelo infinito ou não? Esse é opsique coletiva tinha seus limites, de modo verdadeiro critério para minha vida. (...) Euque, finalmente, deu maior importância ao poderia muito bem imaginar que vivi nosarquétipo da mente como spiritus rector (es- séculos passados e que me bati por pergunpírito guia) de suas transferências interiores. tas que não pude responder, e que, portan-Então, ele relativizou a oposição entre maté- to, tive de renascer para cumprir a tarefaria e consciência e começou a falar de “psi- que não terminei então. Imagino que, quancóide”. Isso levou ao conceito de “sincroni- do eu morrer, minhas obras me seguirão.cidade”, a simultaneidade de acontecimentos Levarei o que terminei. Portanto, é impor-sem causa aparente, mas carregada de senti- tante que eu não me encontre de mãos vado (que o fez lançar um olhar diferente so- zias no f inal da minha vida”. Responder àsbre o fenômeno dos OVNIs). À medida que próprias questões existenciais, aos grandessua morte se aproximava, Jung ref letia mais questionamentos referentes à vida e à more mais profundamente sobre o que demarca- te de modo a não deixar esta vida de mãosva a fronteira entre a vida e a morte. No fi- vazias era o que o ocupava Jung no final.nal de seu livro Memórias, sonhos e reflexões, Era exatamente disso que tratava o simpóele considera a relação entre atemporalidade sio que tinha por tema Morte Alquímica.e eternidade e a existência no espaço-tempo Hoje, enriquecidos de novas compreensões,sob a luz de um sonho que tivera depois de estamos determinados a aplicá-las em nos-sua experiência de proximidade da morte, sa vida cotidiana. Então, coloquemos essano qual vira a si mesmo como um iogue compreensão na grande vida do mundo – eem meditação. Ele considerava inteiramente façamos isso até nossa morte. µ a cura pela transformação 19
IMAGENS DO M U N D O A QUARTA RECEITA. O espírito deve estar em harmonia com a obra Esta receita trata do processo de criação que emana continuamente da alma do mundo, a anima mundi. É a força natural cósmica, pulsante, que está presente em nosso corpo, nossa psique, nossas criações e em nossa sociedade, e que aí se manifesta como força e movimento. Na natureza, são os seres naturais e elementares – os elfos, ninfas, espíritos do fogo e gnomos que vivem e trabalham nos quatro elementos: terra, água, ar e fogo. No homem, são as imaginações e inspirações que, como forças transformadoras em nosso espírito, dão impulso às realizações criativas, à ação e aos substratos materiais. Todavia, o trabalho alquímico pode ser vivificado através de uma força inspiradora mais elevada: através do Espírito “Santo” que vem da ordem intercósmica. Assim, trabalhar equivale a orar. Trabalho, nesse sentido, não é meramente “ação”, mas, sobretudo, um “estado de ser”. É o estado de ser de um “comovimento” harmônico com o impulso do Tao. É somente por meio de um consciente movimento conjunto com o Logos que se realiza a grande obra alquímica.20 pentagrama 2/2015
IMAGENS DO M U N D O A QUINTA RECEITA. O Sol e sua sombra completam a obra Sol e sombra (umbra solis) não deveriam ser considerados opostos, mas sim a expressão de uma sóenergia. Assim como masculino e feminino definem dois aspectos da consciência humana (consciência e subconsciência, hemisfério cerebral esquerdo e direito), Sol e sombra formam dois polos de um campo de desenvolvimento com a Terra: o corpo, no meio. Sol e sombra representam os dois polos necessários para que seja criado um campo de desenvolvimento, assim como um campo eletromagnético tem um polo positivo e um negativo. Masculino (ativo, criador) em relação ao feminino (passivo, gerador). Vemos aí a bipolaridade de um campo de criação. Ou seja: a partir do Um surge o Dois do qual então surge o Três – e assim se torna possível a criação. Além disso, nesta gravura o Sol e a Lua estão unidos por um anel dourado de estrelas. Esse anel astral (aster = estrela) simboliza o casamento celeste – matrimonium coeleste – entre Sol e Luna (Sol e Lua).O casamento celeste simboliza a união de espírito e alma sendo que a Lua reflete a luz solar espiritual. Podemos também relacionar esta realidade “assim como em cima, assim é embaixo” com o própriohomem. O Sol irradia o impulso espiritual, a Lua recebe-o e reflete-o formando assim uma estrutura de linhas de força – a imagem da qual a Terra se eleva como corpo. imagens do mundo 21
consolação, força, benignidadeComo lidar com a realidade da morte de alguém próximo? O Simpósio deNoverosa sobre Morte Alquímica reservou um tempo para um colóquio,para que o grupo se familiarizasse com o tema e pudesse debatê-lo combase na prática. Este artigo reporta as experiências sobre momentos detransformação mencionadas naquela ocasião.Osimpósio realizado em outubro de 2014, À luz do fim que se aproxima a pessoa visua no Centro de Conferências de Noverosa, liza o resultado decisivo: uma veste bonita, possibilitou a todos a oportunidade de, mas, infelizmente, também com manchascom base em experiências práticas, debater em feias, um buraco ou um rasgo... Nenhumadois colóquios o tema Morte Alquímica. Quatro veste fica intacta. A pessoa vê-se diante depessoas que em sua atividade profissional foram suas deficiências, seus defeitos: sua própriaou são intensamente atingidas por processos de falha, a obstinação, o comportamento derivamorte e luto foram convidadas a conduzir os co do de motivos baixos ou com objetivos infelóquios, que foram bastante concorridos. Nestes, riores... Isso é percebido principalmente noo tema foi comentado e esclarecido sob vários campo dos relacionamentos: com filhos, comaspectos: tanto a morte em si – o fim da vida – a família e nos círculos de amigos. A sombracomo também a morte durante a vida. Em ambos assim provocada pode dificultar severamenos eventos, alicerçados por quatro curtas introdu te o último período da vida. Então a perda éções, o propósito foi sempre o foco na assinatura suportada e sentida não tanto através da mortegnóstica, alquímica. que se aproxima, mas da vida...22 pentagrama 2/2015
EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS COM CUIDADOSEM PACIENTES TERMINAIS CHANCE Contudo, essa situação dramática não pode. Então, a bela veste parece dolorotraz em si uma chance de libertação, pois, samente desgastada, sem condição de repapor meio desses confrontos, uma pessoa tor ro. Essa situação pode provocar tristeza tãona-se sensível para o toque da Luz. Então, ela profunda e tal sentimento de carência que atése torna benevolente não apenas para consi mesmo no momento da morte ainda aparecego mesma, mas também para com os outros, esse sentimento em relação à própria vida:criando um espaço para o tratamento das “Eu sou assim. Foi isso que fiz da minharelações prejudicadas. Parece ser necessário vida. Não fui maior, nem mais bonito, nembem pouco para isso: não há palavras, mas melhor. Aí está o resultado final desta vida,sim um abraço; em vez de justiça há igualda desta encarnação. Tudo bem. É suficiente.de. Também há gratidão, pelo fato de o outro Ah, mas os defeitos também são meus. Asestar ali disponível para ela; não há discus manchas e desgastes contam a história da misão, censura ou crítica, mas um encontro de nha viagem através da matéria. Foi com elescoração a coração. Às vezes não há continui que aprendi, pois são uma parte da minhadade. Às vezes, o outro não quer voltar ou lição de vida”. consolação, força, benignidade 23
Através dessa última autorrendição, ela é tocada por uma força,uma graça, um auxílio amoroso que a eleva acima do sofrimentoe lhe entrega um tesouro: discernimento, aceitação e pazPERDÃO Quando a Luz perpassa essa pessoa, provocando uma lacuna interior, um vazio. Aoela consegue perdoar suas próprias deficiências observarmos vivências dolorosas, senti-las ee também as fraquezas dos outros. Então, passa passar por elas de modo intuitivo, disponibilia entender, nitidamente, que também os outros zamos a rica colheita de experiências que elastêm de crescer com todos os talentos que rece trazem em si. Todo esse processo, tão necessáberam. E que também para eles as coisas podem rio para recolher esse tesouro, podemos chamarter sido muito grandes, muito complexas. Por de “processo de transformação”. Mediante essameio dessa percepção, desaparecem a maldade, a atividade interior, acontece nessa pessoa umacrítica e o ressentimento, e a pessoa pode tratar “conversão alquímica”, uma conversão que vaios outros com benevolência e compreensão. do escuro para o claro.Além disso, pode instaurar-se a paz no coraçãoporque, finalmente, a pessoa reconhece que na ENTREGA Quando uma pessoa quer submeteraceitação e no perdão está contida a libertação -se a esse processo de transformação, quandono que diz respeito a si mesma e aos outros. está preparada para morrer emocionalmente paraCom a prática de tratar o luto e a elaboração da poder viver de novo e quando, nesse processo,perda, surgiu o interesse em verdadeiramente entrega sua vida, sua dor e a si mesma – então,permitir-se obter, querer e vivenciar aquilo que por um curto momento, fica inteiramente nuaacontece na vida: tanto o que traz alegria como e de mãos vazias. E, justamente nessa entregao que é doloroso. De acordo com os conheci absoluta, ela atrai, por um instante, um elemenmentos de Kübler-Ross, o homem existe para to vindo de fora, e que a ajuda muito em suareunir experiências e fazer uso de suas sensações luta. Pode-se dizer que, através dessa últimae emoções. Emoções são correntes de ener autorrendição, ela é tocada por uma força, umagia com as quais o homem pode assimilar suas graça, um auxílio amoroso que a eleva acima doexperiências. A profunda dor por uma perda, sofrimento e lhe entrega um tesouro: discernipor exemplo, esvai-se em um mar de lágrimas mento, aceitação e paz.derramadas causadas por ela. O que fica então éuma dor mais branda e suportável e a ocorrência TRANSFORMAÇÃO Essa comoção “anímica”de uma verdadeira transformação, a assimilação que não pode ser anulada, também pode, emde uma rica experiência de vida que contribui certo momento, dar lugar a uma profundapara o crescimento de nossa consciência. alegria. Querer que essa comoção continueA racionalização das experiências de vida, ao crescendo ou não, depende da própria pessoa.contrário, leva uma pessoa para bem longe de A chave para a transformação também se mossi mesma. Então ela coloca, por assim dizer, a tra no desprendimento do eu, na morte do eu –sua própria experiência de vida fora de sua vida, fato que também pode ocorrer durante a vida.24 pentagrama 2/2015
A esse respeito diz o axioma gnóstico: “Apren pela centelha de Luz e sua companheira, ade a morrer antes de morrer: assim, serás capaz alma. Estas frequentemente lhe proporcionam,de morrer na hora de morrer” (Jacob Boehme). em profundas crises, importantes experiênciasPor meio desse desprendimento, a pessoa de conscientização, as quais podem aclarar seutorna-se tranquila a partir do interior, criando caminho através da vida. E você? Já vivenciouum espaço para formar verdadeiramente um um momento como esse? O que poderia dizervínculo com seu ser mais profundo e também de suas experiências cármicas pessoais? Já deucom a essência do Outro. O coração abre-se, uma olhada em outra dimensão da existência?e a Luz pode brilhar no interior: assim pode Observou o campo etérico durante a transiçãoformar-se um vínculo com tudo e com todos. e na separação de consciência, a partir da esferaQuando a pessoa está assim ancorada no “cen material para a esfera etérica?tro”, ela tem contato com uma essência mais Ou como diz Pim van Lommel em seu livroprofunda. O Outro dentro dela deve tornar-se Oneidig Bewustzijn, ‘een sterfbedvisionen, een bijnamaior, e o eu deve diminuir. -doodervaring’ (Consciência infinita, uma visão no leito de morte, uma experiência de quase-morA morte alquímica, a morte em cada alento, ou, te): você já chegou a ver desfilar diante de seuscomo diz Jung, “a viagem da alma através das olhos uma síntese da vida passada?fases de transformação”, é expressa, de modo E quais seriam as consequências? Pode ser queadmirável, no pequeno poema de Toon Her se manifeste na alma um conhecimento muitomans intitulado ‘n Beetje’ (Um pouquinho): claro, visionário, intuitivo. A pessoa pode perguntar-se por que está na Terra e o que de Não se morre de uma vez. essencial deve fazer nesta vida. Mas a centelha Isso acontece aos pouquinhos de Luz e a alma não nos proporcionam apenas E de cada pouquinho que você morre o conhecimento da direção no caminho que Estranhamente se esquece. devemos seguir ou que já tomamos no final Muitas vezes nem percebe. da vida. A centelha e a alma oferecem a todos Você diz: “Estou tão cansado!” os mortais, em sua busca quase interminável: Mas, de repente, aí está... direção, consolo e força. Você chegou ao último pouquinho! É fantástico saber, como resultado desses im portantes momentos de consciência, que nãoNesse “morrer um pouquinho” em vida e no ficamos sozinhos nem abandonados. O que“morrer do fim da vida” podem ocorrer im nosso coração procura acompanha-nos de háportantes momentos de consciência, pois, em muito: o amor divino que vem buscar o quesua peregrinação e busca espiritual, o homem está perdido. µnão é deixado sozinho. Ele é acompanhado consolação, força, benignidade 25
IMAGENS DO M U N D O A PRIMEIRA RECEITA. Vai ao âmago da Terra e aperfeiçoa o que lá encontrares O caminho de iniciação de uma Escola de Mistérios frequentemente é designado como Subida ao Monte. A senda é difícil e requer nossa atenção total. Este é o primeiro estágio na gravura – calcinatio. Autoentrega e desprendimento do eu, sublimatio, levam à solutio. No estágio seguinte, amplia-se nosso autoconhecimento e encontramos a tinctura: a essência de nossa existência. As sete janelas de nossa alma são abertas, na câmara da torre as núpcias alquímicas podem realizar- se. A fênix eleva-se: o âmago da Terra – nosso antigo ser – foi dominado. Na gravura, o rochedo sobressai no mar acadêmico – a dialética. Nos quatro cantos vemos os quatro elementos: o ponto de partida dessa instrutiva viagem, a Terra. No círculo dos doze guardiães de nosso zodíaco sustentam-nos as doze constelações para sondar o estado astral de nosso microcosmo e, através da autoentrega, levar à neutralização as forças propulsoras que estão presas no carma..26 pentagrama 2/2015
a montanha do espíritoO corpo humano é depositário de um plano. Poderíamos até falar de uma missãoque consiste em encontrarmos nosso caminho rumo à nossa origem espiritual.Muitíssimo bem esboçados, aqui estão os degraus e as sucessivas possibilidadesque nos conduzem a ela.Goethe foi um grande poeta e homem pú algumas alternativas. A imagem da página 26 blico, mas também um célebre estudioso representa esse tipo de buscador, que permane dos fenômenos da natureza. ce curvado. Um homem enfaixado (um iniciaUm dia, ele disse: “A morte é um processo da do) indica a rocha. Observem a estrutura dessanatureza para fazer nascer algo novo”. imagem:Por exemplo: há plantas de dois anos de idade • o quadrado: os quatro elementos que simbolique morrem para que, logo que chegue a primavera, possam mostrar-se todas floridas e se zam o planeta onde se inicia a busca;multiplicarem. Outro exemplo: saindo do sul do • o círculo: o microcosmo, um céu estrelado;México, as borboletas monarca percorrem mais • o triângulo: símbolo do processo que se fazde cinco mil quilômetros para se encontrar commilhões de sua espécie na América do Norte. necessário.Mesmo que alguém tente desviar essas borboletas de seu destino, desviando-as centenas de SETE PROCESSOS Essas três figuras geométricasquilômetros de seu caminho, elas modificam seu aparecem tanto na alquimia quanto na Ordemitinerário para alcançar seu objetivo, mesmo que Rosa-Cruz.levem um ano inteiro, três gerações, e, então, O triângulo – aqui representado pela rocha – estálevem mais dois anos para voltar. Todas as gera solidamente enraizado na terra, rodeado peloções registram em seu sistema a ampla região do Mar Acadêmico, ou seja, a dialética. A seu lado,encontro. podem ser vistas sete figuras, que personificam os sete planetas. No alto está Hermes ou Mercúrio,ITINERÁRIO ALQUÍMICO O mesmo acontece o mensageiro dos deuses, que também é o bobocom o ser humano. Em seu corpo está registrado da corte, o bufão do rei, pois é ele quem trazseu objetivo, sua missão. Resumindo: essa missão a mudança para nos manter em constante moconsiste em encontrar seu caminho rumo à sua vimento. Não é verdade que muitas vezes penorigem espiritual. Em uma primeira fase, essa samos ter compreendido alguma coisa a nossomissão não está presente em sua consciência. Isso respeito e, logo em seguida, descobrimos que écorresponde, em alquimia, à fase nigredo, que é exatamente o contrário?o estado obscuro que impede o ser humano de No círculo, os signos zodiacais estão colocadosperceber a luz que chega até ele. em pares. Os planetas modulam os astros aosNós nos identificamos demais com nossas emo pares de acordo com o princípio yin-yang, ou seja,ções e, em seguida, com nossos pensamentos, feminino-masculino: portanto, são os planetascom nosso estado mental. À medida que conse que contribuem para essa escalada da montanhaguimos avançar um pouco mais, encontramos do espírito. A ordem das constelações dispostas no círculo também tem um significado simbólico. Os degraus esculpidos na montanha indicam os a montanha do espírito 27
Os sete degraus esculpidos na montanha do Espírito indicam os seteprocessos que conduzem ao autoconhecimento e à autolibertaçãosete processos pelos quais nossas imperfeições, tereo ser humano precisa mos mais facilidade parapassar para alcançar o aceitar as imperfeições dosautoconhecimento e a outros.autolibertação. PRUDÊNCIA EÁGUA SOBRE CAL VIVA PRECAUÇÃO O segundoO primeiro degrau é degrau é sublimatio, umcalcinatio, o processo ígneo. processo do ar. Nessa faseOs alquimistas ficavam acontece a fervura, a eva-fascinados com o fenô poração e a decantação.meno da cal viva que Essa técnica química aindapegava fogo ao entrar em é utilizada para elaborarcontato com a água. A remédios homeopáticosmetáfora é a seguinte: se que contenham metaisconseguirmos nos abrir cujo efeito é ativado.para receber a Água Viva, Esse procedimento exigeo influxo ou toque divino precauções sutis: o aqueacenderá em nós esse fogo purificador – o que cimento precisa ser feito com cuidado, em etapasnão é tão simples, pois isso provoca altos e baixos curtas. Depois da evaporação, o resfriamento vai– então poderemos nos livrar dos profundos laços se fazendo aos poucos. Se houver muito ar (hida consciência e de antigos hábitos cuja origem perventilação), podemos perder o equilíbrio, nosgeralmente é cármica. desorientar, perder o rumo. Há muitos traços queEssa tomada de consciência e autoconhecimento caracterizam tudo o que esse processo de luz faznos dá coragem para aceitar nossos defeitos, que surgir. Nossa vida está situada em um nível maisvão sendo revelados. Consequentemente, vamos elevado no qual o ser que está lutando consigomudar toda a nossa forma de considerar os acon mesmo reconhece tudo o que ele projeta, e vê otecimentos pessoais de nossa vida, e assim po que nasce dele mesmo. Esse ser começa a ter umaderemos antecipá-los melhor. E, além de aceitar visão de conjunto mais apurada e consegue se28 pentagrama 2/2015
afastar, quando necessário. Nessa fase, a crítica e reduzida a cinzas. Os processos anteriores geraos julgamentos já não são automáticos. ram, na composição das cinzas, múltiplas cama das finas. Essas cinzas fazem com que a terraFAXINA NO ESTÁBULO Desse modo, ficamos ap se torne fértil (Cf. a imagem da sexta receita).tos para subir o terceiro degrau – a fase chamada A terra assim alterada pode receber o ouro –solutio, que é um processo da água. É nessa fase o espírito divino – e prover seu brilho. Paraque se inicia a grande purificação psíquica. Na os alquimistas, esse quarto degrau era o maismitologia, ela corresponde a um dos trabalhos de importante. O homem que passa pelo processoHércules, que todos julgavam ser quase impossí até o seu “bom fim” fica totalmente aberto àvel: a limpeza dos estábulos de Áugias. O herói ligação com o Espírito. A cena da decapitaçãoconsegue solucionar esse problema desviando o de João representa, na Bíblia, a mortificatio. Ocurso de um riacho. pensamento que é somente racional precisa serNós também poderemos fazer o mesmo deixando substituído pelo pensamento que concilia caque a corrente divina limpe nosso estábulo – nos beça e coração. Em linguagem alquímica, essaso ser aural caótico. Com essa limpeza profun espiritualização é representada pela fênix, queda, os esquemas comportamentais que estavam renasce das cinzas.registrados dentro de nós desde a juventude, ouaté mesmo antes, podem se desprender de nosso UMA REALIDADE TOTALMENTE NOVA Depoiscarma. desses quatro processos terrestres, a fase albedo seA autolibertação resultante desse processo nos completa. Seguem-se três processos espirituaispermite aceitar a nós mesmos e aos outros, com que conduzem à conclusão, que é a fase rubedo.maior consciência. Pouco a pouco, o eu vai O primeiro é a distillatio, fase na qual a naturezaperdendo sua posição dominante e se torna mais terrestre é substituída pela nova alma em atividaservidor do que chefe. Quem nos vê de fora diria de. Na fase seguinte, a coagulatio, a alma adquireque mudamos um pouco, mas, lá dentro, perce uma forma mais espiritualizada. Essa realidadebemos que nossas motivações são menos baseadas completamente nova é descrita no Apocalipseno ego e estão muito mais voltadas para o que é como “e surgiu um novo céu e uma nova terra”.espiritual. Quando acontece a sétima fase, a tinctura, surge a quintessência de nossa vida. A ligação entreA DECAPITAÇÃO Por fim, há a putrefactio, que a alma e o Espírito já está completa: as núpciasé o quarto degrau, ligado ao elemento terra. A entre o rei e a rainha estão seladas. Isso pode sermortificatio também faz parte desse degrau, que observado na “câmara no alto da montanha” – anão consiste em um processo químico propria pineal. As sete janelas da alma estão abertas. Amente dito. Nesse ponto, a matéria, o ego, é Grande Obra está realizada. µ a montanha do espírito 29
as alças de jadeEm si mesmo, o homem é um processo alquímico incessante de transformação e agitação, no qual se expressa cada vez melhor o tipo depotencial que o anima. O ser humano é semelhante a uma panela, ondea vida, levada à ebulição, faz todos os ingredientes se fundirem em umalimento único, que ele pode compartilhar com todos.Oestudo da alquimia do corpo começa do interior como do exterior – às vezes, na mesma pela questão do significado da palavra hora. E isso não é válido apenas para os seres “corpo”. Em português, deriva do latim humanos, mas também para muitas organizações,corpus, que busca a ideia da palavra “inteiro”. É pois elas são corpos vivos com um “coração” queinteressante mencionar que em holandês utiliza-se cuida de seus negócios.uma palavra específica para designar um corpo O corpo pode ser tudo, menos estático: ele semorto. Essa palavra, lichaam, deriva da palavra move em um processo incessante de forças quelich (uma palavra antiga para cadáver) e (h)aam constroem e destroem, e o mantêm em movimen(derivado de “respiração” e relacionada com a to. Ele é a típica expressão de um afluir de forças,palavra francesa para a alma, âme, bem como com de um campo de força. Quando as forças envolviuma palavra antiga germânica, haam, que signifi das provenientes das três fontes que são o espírito,cava “vestir a camisa”). O corpo não é apenas uma a alma e o corpo colaboram de forma harmoniosa,forma física, é um corpo revestido, animado. Ele é o corpo é sadio.como uma taça ou como um coração. Sua qualida A literatura esotérica considera que o corpo estáde lhe é dada com base naquilo que ele contém. em bom estado de saúde quando se pode falarNo mundo inteiro, a literatura traz testemunhos de uma coerência, de uma unidade entre corpo,da localização da alma no coração. O coração é alma e espírito. Somente então se manifestama sede da alma. O corpo é um instrumento que plenamente o potencial das qualidades humanas, ocarrega uma alma dentro de si, na altura do cora objetivo e o destino. De fato, é segundo essa persção. A alma é o órgão que rege esse instrumento. pectiva que o homem vive um contínuo processoA inteligência e a sabedoria do corpo lhe foram alquímico de transformação e de movimento. Eatribuídas com base nessa informação. Animado assim ele expressa cada vez melhor o potencialpela inteligência e sabedoria que o carma às vezes espiritual que o anima. Portanto, aí está uma exirouba, o corpo segue certo percurso, que leva o gência: que a totalidade da triunidade corpo-almatempo de uma vida. Se mantivermos a comuni -espírito funcione em harmonia.cação com o coração, o corpo seguirá o caminho Nessa trindade harmoniosa o homem é umcerto. Então, poderemos dizer a respeito de nossas verdadeiro artista. A esse respeito, disse certa vezações que “são justas” – pois estão em sintonia um sábio:com a batida do coração. “Aquele que trabalha com as mãos é umA cabeça é o ponto de convergência de todos os trabalhador;fios da autorrealização. Por fim, ela é o local de Aquele que trabalha com as mãos e a cabeça é umexpressão direta do espírito. Da mesma forma, o artesão;coração é o órgão no qual se encontram e são pe No entanto, somente aquele que trabalha com assados todos os impulsos e forças provenientes tanto mãos, cabeça e coração é um artista.”30 pentagrama 2/2015
Será que vida e morte poderiam ser consideradas operations – procedimentos sagrados que trazemuma forma de arte? Se considerarmos a vida sob o consigo a cura.prisma da psicologia alquímica de Thom Cavalli, Como a alquimia é universal, vamos dar uma volveremos que é possível ao ser humano exercer a ta e fazer um passeio pela China. Aí descobrimosArte Real de viver conscientemente (Royal Art of que essa arte sublime se expressa em termos deLiving Consciously). Para desenvolver esse tipo de religião, filosofia, arte de bem viver, metalurgia,arte, é preciso haver pedras de construção adequa medicina e também em termos de arte culinária.das, destinadas a uma alquimia da vida e da morte. Assim, um processo exterior de cozimento forNesse processo, podemos distinguir três fases: nigre nece indicações a respeito de uma transformaçãodo, albedo e rubedo. Em seguida, teríamos sete práti interior. Esse cozimento acontece no interior docas ou métodos: calcinatio, solutio, coagulatio, sublima- corpo humano e pode ser representado por umtio, mortificatio (ou putrefactio), separatio e conjunctio. pote de alimento, um vaso de oferendas ou umaO significado desses métodos encontra-se mencio panela. Essas representações ilustraram a excelêncianado rapidamente nas importantes fases do proces da cultura chinesa. O recipiente de alimentos eraso de individuação que Carl Jung expôs com muita um grande vaso de bronze utilizado nas granprecisão. Cavalli os descreve em termos de sacred des festas sacrificiais imperiais da dinastia Chu. Todos os participantes dessas festas traziam seus próprios alimentos. Então, eles se reuniam e um rei-sacerdote, mestre do sacrifício, os ligava para que se tornassem um Todo. Esse vaso de oferen das não servia somente para alimentar as pessoas, mas também alimentava a unidade espiritual entre elas. Um processo como esse, de solda ou união, era considerado a essência de toda a Arte Real. De fato: até mesmo em uma panela está presente um campo de força. Nela são integrados diferen tes sabores e supõe-se que o modo de preparar possa resultar em uma nova unidade: a comida, o alimento propriamente dito. Se imaginarmos o recipiente do alimento como uma metáfora do corpo humano – o corpo do aprendiz de alquimista – poderemos captar seu significado alquímico. Assim, podemos observar o processo a seguir. Primeiro, existe uma panela as alças de jade 31
Ninguém pode e ninguém vai querer guardar somente para si esse alimento sagrado, essa santa panaceiavirada para baixo. Os velhos restos que se quei de alimento tem anéis de jade, o processo almaram em seu fundo precisam ser retirados, de tal químico de cozimento atinge sua perfeição.modo que, respeitando os princípios de higiene, o Na tradição chinesa, o jade é muito apreciado,alquimista possa encher a panela com os alimen considerado a mais preciosa das pedras. Enquantotos santos, os santos éteres. Para que o alquimista as alças de ouro dos vasos pegam o calor de seupossa manejar a vasilha em questão, essa panela conteúdo, o jade mantém sua temperatura. Porprecisa ter pés: do contrário, ficaria instável, não isso, imediatamente depois do cozimento, osseria possível mudá-la de lugar e ela perderia alimentos portadores de cura podem ser transporsua função. Mas, se acontecer de um de seus pés tados em suas vasilhas, para qualquer lugar. Nessequebrar, tudo acaba mal. O banquete festivo do sentido, o jade é idêntico à pedra filosofal mística,rei fica comprometido, sua pessoa fica toda suja. que é carregada para toda parte onde for necessáMas, por outro lado, se a panela tiver alças amare ria. Agora, poderemos dar um passo em direçãolas, anéis de ouro, então já estamos falando de um da verdadeira cura.vaso transbordante de oferendas, pois ela pode ser Segundo a lenda, os rosa-cruzes também faziamcolocada no lugar correto – ou seja, no centro do uso da panaceia universal. Isso não significa queser. Nesse caso, o processo de cozimento revela ser eles estavam fixados na cura das imperfeições oude nobre qualidade. males da personalidade, nem no desaparecimentoPorém há mais, e melhor: quando o vaso cheio de circunstâncias agravantes e negativas em relação ao corpo e à psique. Não. O objetivo deles era e continua sendo a cura alquímica do microcos mo em sua totalidade, uma vez que é ele quem dá vida ao ser humano e à personalidade! Nosso ponto de partida é que todo homem nasce com um corpo animado. Mas esse corpo não é uma pá gina em branco. Não. O homem nasce com uma “pré-história” que, em sintonia com a bagagem sanguínea e genética de seus ancestrais, influencia todo o percurso de sua vida. Podemos considerar as doenças, problemas psíquicos e deficiências cor porais como consequências de um passado cármi co. Por outro lado, as dores e sofrimentos sempre têm um efeito de purificação ou de reabsorção, nem que seja pelo desejo de acabar com eles. Quem já passou pela experiência de acompanhar32 pentagrama 2/2015
um moribundo em seu processo de morte conhece guardar somente para si esse alimento sagrado, essaesse efeito purificador da autorrendição nas pessoas santa panaceia. É precisamente isso que faz que,que se aproximam do final de suas vidas. em todas as áreas de nossa vida, sejam eliminadosVamos lembrar uma frase de Paracelso, médico inúmeros obstáculos procedentes de nossa bagacuja reputação todos conhecem, que afirma que, gem cármica. É assim que o microcosmo é total ena verdade, a doença é um processo de cura. E definitivamente regenerado.devemos entender: trata-se da cura do sistema Agora, aí está, finalmente, o ser humano verdadeimicrocósmico. Uma ideia como essa somente pode ro: um homem digno de carregar esse nome! Eleser compreendida se formos capazes de considerar é capaz de carregar essa vasilha segurando-a pelasque o corpo humano tem uma função para a alma. alças de jade. Ele é capaz de levá-la para todosHermes diz a mesma coisa. Essa ideia traz uma os lugares à sua volta, para distribuir seu preciosoindicação para uma cura verdadeira: a cura do mi alimento. De agora em diante, ele está colaborancrocosmo, e não unicamente a cura do corpo. Essa do conscientemente para a cura do mundo e docura é sustentável desde que a purificação alquími gênero humano. µca – uma panela onde a vida duradoura não deixade ferver - tenha o efeito de trazer a verdadeirarenovação da alma. Consequentemente, uma almacomo essa pode expressar, de forma inalterada eimaculada, o puro impulso do espírito, a força ea energia crística, que os rosa-cruzes veem comouma energia sempre ativa, sempre portadora decura. Essa atividade benéfica é dirigida a todos. Ocampo de força que é assim criado é de vibraçãoextremamente elevada, que consegue até mesmorestaurar o metabolismo alterado do ser humano.Essa energia que ao mesmo tempo assimilamos eirradiamos transmite sua força salvadora ao nossosangue, à nossa consciência, ao sistema nervosoe ao sistema hormonal. Sendo um instrumentoda alma, nosso corpo torna-se transparente, masé principalmente a alma que se torna clara comocristal. Precisamos deslocar nossa vasilha, essabandeja de oferenda, para que todos possam serservidos. Ninguém pode e ninguém vai querer as alças de jade 33
a redescobertada gnosis iiNo dia 6 de novembro de 2013, quando ocorreu a publicação em holandêsdo livro Ecos da Gnosis, houve uma palestra pública na livraria Pentagrama deHaarlem, Holanda, com o título: Por que George R. S. Mead pode ser chamado de “o primeiro gnóstico moderno”. Logo abaixo, segue a segunda partedessa palestra, que é um resumo da História da Gnosis.George Mead conhecia muito bem as da Igreja e dos heréticos) foi publicada por vol pesquisas realizadas antes dele. Por isso, ta de 1699-1700. aprofundou-as e elevou bastante o nível Para escrever essa História imparcial da Igreja, elede seu significado. Depois de trazer ao leitor foi obrigado a abandonar sua função de profesalguns aspectos mais profundos das pesquisas, sor universitário. Ele chegou até a afirmar queexplicaremos o porquê. a pior das calamidades na História da Igreja de Roma tinha sido sua fundação propriamenteO BERÇO DA BUSCA A busca pela Gnosis não dita, sem esquecermos seu reconhecimento pelose iniciou nem no mundo de fala inglesa, nem imperador Constantino – ora, aí está algo quealemã, nem francesa. O trabalho de pesqui teria sido melhor calar, levando-se em contasa, situado no prolongamento do pensamento que ele era doutor da Igreja!teosófico e pietista, cuja fonte de inspiraçãofoi Jacob Boehme, culminou com os filósofos A GNOSIS CRISTÃ Depois de Arnold, veioSchelling e, principalmente, Hegel. Ferdinand Christian Bauer (teólogo alemão,Esses dois pensadores idealistas deveram muito falecido em 1860) que, assim como Hegel,mais a Jacob Boehme do que em geral se admi Schelling e Hölderlin, terminou seus estudoste, mesmo que, em certos aspectos, eles não o no Tübinger Stift, seminário evangélico detenham compreendido muito bem. Tübingen.Hegel possuía amplo conhecimento de História, Por sua vez, Bauer elaborou, em 1835, uma imonde via registrado o avanço da consciência do pressionante história da cultura: Die ChristlicheAbsoluto. Isso permitiu uma concepção com Gnosis (A Gnosis cristã). Nessa obra, o autorpletamente diferente da verdade cristã revelada. chama os idealistas cristãos, como Boehme,Ou seja: a verdade não havia descido de re e até mesmo Hegel, de “herdeiros da antigapente do céu – sua vinda havia sido preparada Gnosis cristã”. O autor seguinte foi Charlese se fazia notar desde o mundo dos mistérios William King, com seu livro The Gnostics andpagãos. their Remains (Os gnósticos e seus remanescenMuito antes de Hegel, Gottfried Arnold ha tes), datado de 1864. Para ele, o gnosticismo tivia redigido uma História da Igreja que levava nha suas raízes no budismo. Também Madameem conta as concepções dissidentes e tomava Blavatsky refere-se a esse livro.o mesmo rumo de Hegel. O próprio Arnold Outro grande trabalho no âmbito dos estudosmantinha contatos pessoais com certos fila da Gnosis, que seria muito importante paradelfos – discípulos de Boehme, como John Jung, foi o livro de Georg Friedrich Creuzer,Pordage e Jeane Leade. Sua Unpartheyische Symbolik und Mythologie der antike VölkerKirchen und Ketzer Historie (História imparcial (Simbolismo e mitologia dos povos antigos),34 pentagrama 2/2015
GEORGE STOWE MEAD, O PRIMEIRO GNÓSTICO MODERNOpublicado entre 1810 e 1812, e que trazia infor Hauptprobleme der Gnosis (Problemas fundamações principalmente sobre os cultos greco mentais da Gnosis); Richard Reitzenstein,-romanos dos mistérios. conhecido pela publicação do livro Poïmandres;Precisamos admitir que, apesar de serem exce o belga Franz Cumont e o alemão Albrechtlentes historiadores da Gnosis e de tudo o que Dieterich que, juntos, estudaram Os Mistériosa ela se assemelha, não podemos chamá-los de de Mitra, uma obra na qual Mead se inspirougnósticos somente por essa razão. para seus Ecos da Gnosis. Poderíamos citar, ainda, muitos outros pesquisadores, comoLIVROS SAGRADOS DO ORIENTE Foi somente Hans Leisegang, Kurt Rudolph, mas a listano final do século 20 que a verdadeira pes seria tão longa que resolvemos parar por aqui.quisa científica tomou impulso. A partir desse Ainda uma vez teremos de dizer: são eruditos,momento, as religiões foram tratadas sob o especialistas em Gnosis, mas continua a quesângulo fenomenológico*, inclusive religiões tão – será que eles realmente conhecem bemorientais, pré-cristãs e não cristãs. os gnósticos? Foi por isso que Mead, em seuNessa época, inúmeros textos do Oriente, livro Ecos da Gnosis afirmou que não tem incomo os Vedas e os Upanishads foram tradu clinação para utilizar o método “historicizanzidos pela primeira vez e acompanhados de te” desses autores: “Apesar de o método delescomentários. Alguns nomes se destacaram: F. ser excelente, em geral o hábito dos adeptosMax Müller e sua série monumental Sacred da escola alemã (da História das Religiões)Books of the East (Livros sagrados do Oriente); é ficarem satisfeitos em detectar as caracteKarl Eugen Neumann, que foi o primeiro a rísticas das principais doutrinas e elementostraduzir do dialeto pali os textos budistas; semelhantes no interior das tradições anterioPaul Deussen, que, além de ter escrito uma res. E eles se felicitam por poderem esclarecerbiografia de Boehme, é o autor de uma su as chamadas ‘fontes’ e modelos... Obviamente,blime História Geral da Filosofia, obra na qual isso é tudo a que os defensores rigorosos datanto a filosofia ocidental como a oriental têm objetividade pura podem ter acesso”.seu devido lugar. Deussen era amigo íntimode Friedrich Nietzsche, que ousou aventu A GNOSIS DIZ RESPEITO À ALMA Já não porar-se nos mistérios dionisíacos e, além disso, demos deixar de revelar ao leitor o que realescreveu a obra-prima Assim falava Zaratustra. mente interessava a Mead e até que ponto seuTudo isso aconteceu em uma época em que se olhar era diferente dos outros autores: “Ora,estudava a História das Religiões e tentava-se a cada dia torna-se mais evidente que inúmecartografar sua origem e a relação entre elas. ras doutrinas que os pesquisadores supunhamCitemos Wilhelm Bousset e seu livro poder demonstrar derivarem de dogmatismos a redescoberta da gnosis II 35
A Gnosis diz respeito à alma e somente pode ser compreendidano campo da alma. Quanto à inteligência, ela trata de outras coisasanteriores que na verdade surgiram de forma Na Holanda, houve uma ligação direta, aindependente umas das outras, como resulta princípio entre os professores Bolland e Pietdo do desenvolvimento natural da alma e de Hendrix, que soube por Bolland a respeitoseu poder de reflexão – o que significa que sua da existência dos gnósticos – e aprendeu tãofonte é subjetiva e não objetiva”. bem que elaborou sua tese sobre Basilides; emDigamos, de passagem, que foi principalmente seguida, também houve ligação entre o profesnos círculos maçônicos que houve grande inte sor Quispel, aluno de Piet Hendrix, e Roelofresse pela cultura egípcia e também pelo antigo van den Broek, que o sucedeu. W. Otterspeermundo dos mistérios. Nesse meio, a compreen escreveu uma magnífica biografia de Bolland,são ia um pouco mais além do que no círculo que pode ser lida como um conto moderno.acadêmico e científico. Ao lê-la, sabemos que o moralista e influenteO belga Eugène Goblet d’Aviella publicou, em Bolland estava longe de ser um santo, ou um1903, o livro Eleusina, a respeito de alguns pro gnóstico, e que ele não hesitava em colocarblemas relativos aos mistérios de Elêusis. as sacrossantas tradições de pernas para o ar. Ora, essas tradições da Igreja formavam umaA ORIGEM DO EVANGELHO É TEOSÓFICA Na coluna-mestra inabalável há alguns séculos.Holanda, um especialista, B. J. van der Zuylen,publicou uma obra sintética sobre Mistérios e CONTAMINAÇÃO? Desde o luterano Adolfiniciações na antiguidade, e Karel Hendrik de Jong, von Harnack prevalecia, entre os teólogos, ada universidade de Leiden, interessou-se pelos ideia segundo a qual o gnosticismo era umamistérios antigos; além disso, ele baseou-se em heresia cristã e um perigo para a verdadeimuitos aspectos na literatura teosófica disponível ra fé. Nesses meios, os estudiosos preferiamna época. Ainda no início do século 20, surgiu falar mais a respeito do gnosticismo do que aum memorável hegeliano, o professor holandês respeito da Gnosis. Harnack afirmava que seBolland, especializado no estudo da sabedoria tratava de uma helenização excessiva do crisalexandrina e sua influência sobre a Bíblia cristã. tianismo – uma última resistência origináriaEm seu livreto O Evangelho, ele afirmou resolu do mundo antigo – que ameaçava gravementetamente que a origem do Evangelho era de or sua pureza. Essa advertência era compartidem teosófica, em relação aos mistérios órficos. lhada pelo teólogo R. Bultmann, que via o36 pentagrama 2/2015
movimento gnóstico e sua filosofia greco-he houve realmente um problema: eles foramlenista como uma contaminação da verda entregues ao Padre católico De Vaux.deira fé – e isso a partir da segunda metade Em revanche, Hans Jonas, aluno de Martindo século. Essa posição ficou cada vez mais Heidegger, conseguiu aprofundar-se melhordifícil de ser defendida quando pessoas como na herança dos gnósticos que, assim como osH. M. Schenke constataram que o pensamento existencialistas modernos, sofriam por estargnóstico havia surgido, muito provavelmente, longe de uma unidade vivida em âmbito maisna mesma época que o cristianismo, ou até amplo. H. Jonas queria chegar a uma intermesmo um pouco antes. pretação existencialista do gnosticismo. EleCom o passar do tempo, foi ficando impossível também fez uma tentativa meritória de realideixar de observar os inúmeros elementos gnós zar uma leitura “gnóstica” do existencialismo.ticos contidos até mesmo no Novo Testamento. Para sua surpresa, isso lhe trouxe uma visãoEm 1958, certo R. Wilson, em uma obra que completamente nova a respeito da “modernísjá a partir do título – O problema gnóstico – ale sima filosofia gnóstica e sua visão do mundo”.gava que essa “heresia pérfida” tentou eclipsar No entanto, ele também continuou, como seusa mensagem essencial do Evangelho, já na colegas, a estudar a Gnosis como fenômenoépoca em que foi escrito. Exegetas como ele histórico-temporal, e com certeza não podetinham a certeza de que o gnosticismo não era ria ser considerado um gnóstico. Além disso,de origem cristã, mas somente um desenvolvi essa seria a última qualificação com a qual osmento de crenças pagãs. estudiosos de Ciências da Religião desejariam ser tratados. µOPOSIÇÃO É óbvio que uma pesquisa quesaísse em busca da Gnosis de forma aberta Continuae sem preconceitos era muito difícil, pois omodo de ver do “vencedor” continuava a ser * “Fenomenológico: o que se atém ao fenômeno, ou seja, ao dadoa única diferença. E esse era ainda o caso depessoas como o holandês Van Unnik, que, imediato da experiência” (Paul Foulquié). “No fundo, a fenomecom Quispel, estudou O Evangelho da Verdade.Para os estudos dos manuscritos de Qumrân, nologia nasceu desde o momento em que, colocando a questão do ser – provisória e definitivamente – trata-se como um problema autônomo a maneira como as coisas se apresentam.” (Paul Ricoeur) a redescoberta da gnosis II 37
UM EXERCÍCIO INCOMUM DO PENSAMENTO38 pentagrama 2/2015
libertar-se dopensamento racionalO ato de pensar é um dos processos mais íntimos que ocorrem em nós. Mas seráque o mundo do pensamento corresponde verdadeiramente àquilo que somos?Será que não somos tão-somente a representação fictícia que fazemos de nossapersonalidade corpórea?Somos capazes de compreender nossa pró a está observando – mesmo que acredite estar pria linguagem, nossas concepções, nossas fazendo isso. Quando examinamos a situação metáforas; já por outro lado, tudo isso é dessa experiência imediata da vida, atingimosbem mais difícil quando se trata de outra pessoa. os limites de nosso pensar – o que abala a baseEntão, para podermos comunicar nossas metáfo da representação que fazemos do mundo. Masras comuns, tivemos de criar um consenso. Com será que isso abala nosso ser? Para determinar oo tempo, esse fenômeno tornou-se tão costumei resultado desse exame, precisamos saber quemro que permanecemos, de modo quase automá ou o quê está empreendendo essa investigação,tico, encerrados no círculo de nossos esquemas pois aquilo que em nós encontra a verdade émentais. Portanto, não é tanto o pensamento algo diferente do eu, que é prisioneiro de seuque nos impõe limites, mas sim nosso modo de mundo e de seu modo de pensar. Por mais útilpensar habitual. Para criarmos imagens, a me que seja o pensar, se sua única referência é omória e as velhas representações desenvolvidas eu, e se, portanto, ele está desligado de suano passado nos bastam. Resultado: esse modo fonte essencial, não se pode confiar em suacerebral de pensar nos mantém presos a esse noção de verdade. O mesmo é válido para omundo interno. Dentro desse mundo do pensa autoconhecimento. Por mais exato que seja, demento, com nossa consciência racional ligada ao certo ponto de vista, ele não é menos depencorpo, nos sentimos mestres e senhores da ideia, dente desse pensar restrito. Se reconhecermosde nosso corpo e da natureza que nos cerca. isso, conseguiremos fazer a justa distinção entreMas será que isso corresponde verdadeiramente o eu e seu laborioso uso do pensamento racioà realidade? Será que não somos tão somente a nal e aquilo que, em nosso interior, ultrapassarepresentação fictícia que fazemos de nossa per esse pensar. A partir desse momento, revela-sesonalidade corpórea? aquilo que é digno de ser considerado verdade. À luz do que precede, compreendemos que háEXAME Mas será que, enquanto estamos ana tempos tivemos de deslocar nossa atenção dalisando nossas vidas, podemos vivê-la direta consciência autêntica para o corpo e seu podermente, conforme ela vai acontecendo? Essa cerebral. Compreendemos que essa identificavida efervescente, em constante mudança, é ção gerou uma consciência cerebral separada,espontânea e provê todas as nossas necessida limitada – útil, sem dúvida, para as experiêndes. Contudo, seu fluxo permanece fora do cias da vida, porém não para o objetivo finalalcance da consciência racional, que tende a de nosso ser. Somente pode acontecer umamanter tudo sob controle. Quaisquer que sejam abertura quando a consciência-eu mergulhaas construções mentais que essa consciência em seu mundo. É então que nossa atenção seconserve com relação à vida, na realidade não eleva em uma consciência pura, e daí lançamos libertar-se do pensamento racional 39
Nos dias atuais, chocamo-nos cada vez mais contra os limites.Podemos observar como a religião, a arte e o pensamento científico apresentaram resultados impressionantes, semcontudo oferecer-nos qualquer resposta à questão do que seja verdadeiro. O cientista, por exemplo, está em geralorientado para um objeto, pois, em suas pesquisas, rejeita toda subjetividade. Com seu “cérebro de pesquisador”,ele se serve de uma metodologia em que as coisas são examinadas fora de seu contexto; somente um limitado número de critérios é utilizado. Em sua Philosophie des Als Ob, (Filosofia dos como e se) um livro esquecido, datado de1911, Hans Vaihinger afirma que o pensamento é incapaz de sondar a verdade: ele nada pode criar além de ficção.Prometeu – aquele que é previdente, que pensa com antecedênciaEpimeteu – Aquele que reflete depois da ação, aquele que pensa muito tardeum olhar livre para o ego e suas limitações. A com a personalidade, que lhe dá a ilusão deprimeira coisa que a atenção observa nesse mo que a personalidade tem existência própria.mento é que o pensar, tal como funciona em Quando dizemos que a razão é o pensador,geral, equivale a evitar a verdade, a fugir dela e que ela mesma é um pensamento, isso nãopor meio do ego. significa que ela seja criadora de pensamentos.Quando chegamos a esse ponto de nosso exa A ilusão é justamente esta: achar que ela podeme, dizemos que, quando muito, descobrimos pensar. De fato, a razão não para de reformularum traço da verdade, uma semiverdade. O e reorganizar os pensamentos e as interpretaaspecto positivo disso é que a resistência do ções já existentes, porém, nem por isso ela éeu a essa verdade fornece uma vivência de si autocriadora. A verdadeira fonte dos pensamesmo e de um mundo mais amplo. Ainda que mentos situa-se, em realidade, na consciência.essa situação particular aconteça no interior de Essa é a razão pela qual sempre pensamos sobreseu mundo vivencial, o pensador não é o Ser algo, mas nunca a partir desse algo. Pensaressencial. Porém, ele não pode perceber isso “sobre algo” significa que não somos esse algo,por meio do seu pensar cerebral limitativo, pelo que existe uma distância, uma dualidade. Issosimples fato de que o pensamento não pos nada mais é que rubricar e colocar a inspiraçãosui energia própria. Essa vida de pensamentos original num banco de dados existente, dandorecebe apenas uma energia limitada da pura -lhe sentido e importância no espaço e no temconsciência. po. Isso constitui inevitavelmente um fator dePortanto, a razão produz uma forma de cons retardamento e de cristalização na corrente esciência que é tão-somente um derivado da pontânea da vida. Pelo fato de ser uma funçãoconsciência pura. Poderíamos dizer que a razão da consciência voltada para a matéria grosseira,é um pensamento que pensa, porém de maneira a razão registra somente o fato de algo aconerrada, devido à identificação da consciência tecer e o modo como acontece. A razão não40 pentagrama 2/2015
pode prever como algo deve acontecer – afinal, procedente dessa misteriosa união ilumina ao modo como algo acontece pertence somente razão, que já se encontra em paz.ao domínio da consciência.O cérebro não tem condição de criar direta REALIZAÇÃO Qualificamos essa realização oumente. Para conseguir ter uma atividade mental união de “misteriosa” porque se trata de algoseparada da consciência, ele precisa retirar sua indescritível. Essa ideia pode, no máximo, serenergia do cerebelo. O fato de ter de utilizar a transmitida à pessoa que se abre para ela. Paraenergia proveniente de outro centro explica o a consciência racional, o divino é um vazio,motivo pelo qual nos sentimos tão cansados, a um nada; a razão não tem acesso a ele, enquanponto de perdermos o equilíbrio pelo simples to para a pura consciência tudo é límpido. Paraato de pensar. uma consciência limitada, que não cessa de criar imagens, todas as descrições que possamO DESAFIO DE UM CÉREBRO TRANSPARENTE ser feitas a respeito dessa ideia abstrata sempreEntretanto, o cérebro dispõe de outro poder: ele parecerão contraditórias. A razão sempre sepode ser um receptor transparente, um espe pergunta o que significa “realização do Ser”,lho, para a luz da pura consciência! Na maté já que a pura consciência é, era e sempre será.ria, pode-se falar de “um pensador anterior ao De fato, ela é por toda a eternidade. Nada,pensador”, isto é, de uma percepção direta na nem o nascimento nem a morte de uma pessoa,fonte do Universo, no livro do Espírito divino. pode atingi-la, embora ela consiga se expresO que aqui se manifesta é Manas, o Pensador. sar de maneira extremamente limitada em suaNão se trata do pensador que “pensa que pensa”. vida material. Assim, o ilimitado experimenA identificação com o eu está ausente, tanto no ta a limitação, por meio da personalidade, napensar quanto no sentir. Quando todo ruído e dualidade espaço-tempo. Concluindo: é precisoagitação da atividade mental desaparece, libe compreender que não é tanto o Ser essencialrando espaço no núcleo do coração e sua pura que tem de ser libertado – pois fundamentalconsciência, esta pode manifestar-se, silenciosa mente ele é livre de tudo – mas que ele podemente, na cabeça. A percepção dessa consciência se desenvolver e se expandir no homem quesilenciosa da alma revela a fonte, a pura sabedo se deixa transformar por esse processo. Noria do Ser. A alma e a fonte tornam-se essen decorrer do processo de transformação, a puracialmente unas nesse casamento místico. É como consciência se expressa como nova alma noum inflamar do fogo do entendimento abstrato âmago da personalidade, livre das limitações daentre o espelho virgem da consciência silenciosa consciência racional. E, quando a pessoa pare o espelho virgem do Ser incognoscível. Assim, ticipa dessa transformação, a pura consciênciacom sua inspiração, o fogo do entendimento pode se libertar dessa limitação. libertar-se do pensamento racional 41
E a razão comum? Será que não corremos o risco de perdê-la, quando o balão inflado do pensamento for furado? De modo algum, pois, muito embora não possua o poder sutil do pensamento, ela conserva uma função preciosa e continua sendo um instrumento de trabalho. O pensamento racional pode continuar funcio nando para reagir às coisas e acontecimentos. Só que ele já não é determinante e limitativo: a partir de então, ele está livre de si mesmo, porque já não nos identificamos com ele. Por isso mesmo, ele já não oculta a pura consciên cia. Ele está apaziguado e, como expressão do Ser, encontrou sua real vocação. µ42 pentagrama 2/2015
IMAGENS DO M U N D O A SÉTIMA RECEITA. A rosa doa seu mel às abelhasEsta receita alquímica é extraída de Summum Bonum (O Bem Supremo), um texto que data doséculo XVII, de Robert Fludd (1574-1637). Uma rosa com sete vezes sete pétalas floresce sobre um galho em forma de cruz. Desde os tempos mais remotos, a rosa tem sido o símbolo do amor cuja essência é “doar”, tal como o exprimem as palavras: Dat rosa mel apibus, ou, “a rosa doa seu mel às abelhas”. A rosa tem suas pétalas amplamente abertas, e as abelhas que vão e vêm retiram de seu coração o precioso néctar. Elas constroem uma rede em sua colmeia, que podemos ver àdireita da rosa, colmeias de ouro nas quais armazenam o suco melífluo. As abelhas não buscamo néctar para si próprias: elas o transformam em mel – alimento e material de construção paramuitos. O amor cresce ao se doar. À esquerda da rosa pode-se ver o inverso: a aranha que tece sua teia para envolver e vampirizar, para si própria, tudo o que se enrosca em seu fio. A rosa é o símbolo do amor mais sublime. Cristo é a rosa das rosas, que dá seu sangue e desabrocha no coração da cruz, na encruzilhada dos caminhos, onde Deus e o homem se encontram. Àsemelhança da rosa, que oferece o néctar às abelhas, Cristo oferece o sangue de seu coração a todos os homens: ele libera para todos e em todos o poder do amor. imagens do mundo 43
IMAGENS DO M U N D O A NONA RECEITA. Para produzir mercúrio, é necessário mercúrio A totalidade do cosmo pode ser reduzida, em cada átomo, a uma única respiração do divino: “tudo receber, tudo abandonar e assim, tudo renovar”. Hermes é o protetor dos ladrões e dos viajantes e, também, o mensageiro dos deuses e o deus da cura; além disso, ele é o bufão astucioso e o sábio demolidor das estruturas férreas nas quais a humanidade se encontra entravada. Mercúrio, o corretor, faz-nos tomar consciência das estratégias e modelos de sobrevivência, bem como das experiências corpóreas não desejáveis, das emoções e das enfermidades em nossa constituição física. Todas essas coisas são os ladrões e os viajantes queatraímos quando nos extraviamos no caminho, dos quais Mercúrio nos protege. Os sinais enviados por Mercúrio podem ser observados no nível mais sutil, no éter nervoso, o mais volátil dos éteres, mas também o mais sensível. Enquanto Mercúrio divino, ele nos faz difundir a mensagemdivina. Os dois aspectos de Mercúrio se unem por meio do caduceu e do fogo de Asclépio. Com sua visão relativista, no que concerne à sua pessoa, o alquimista devotado trabalha, intrépido e resoluto, com humildade: ele se alegra no silêncio interior que acalma o éter nervoso.44 pentagrama 2/2015
• Trazer luz à escuridão é um tema recorrente na alquimia. Quando se trata da luz, consciente e subconsciente se fundem e formam uma nova unidade, aberta, transparente, invulnerável. Então acha-se a pedra filosofal, o elemento de outra natureza, no microcosmo, no cosmo e no macrocosmo. Aí está o laboratório alquímico – de todas as épocas. Nele, o alquimista separa cuidadosamente o puro do impuro, o pesado do leve, e dessa maneira liberta novamente a força ativa ou operante, a quintessência. Esse é o éter de fogo, do qual os antigos falavam – o quinto elemento, o material de construção imortal do Novo Homem.
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