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LIVRO Singulares plurais

Published by fabriciogpacheco, 2020-09-10 16:23:45

Description: LIVRO Singulares plurais

Keywords: Mulheres negras,Homenagem,Livro escolar

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Organização: Fabrício Pacheco Singulares plurais. Histórias únicas mudando o coletivo. Vários autores (alunos e equipe do Colégio Estadual Moacyr Padilha). Setembro 2020 3

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APRESENTAÇÃO A ideia deste livro surgiu em uma reunião com os alunos (das turmas EMP 2001, EMP 2002 e EMP 3001). Nesta ocasião discutimos como contribuir com o evento idealizado pela coordenadora Lúcia Joviano. Decidimos produzir um livro para divulgarmos histórias singulares que ajudam a construir o nosso coletivo. O evento citado comemorou o dia da mulher negra latino-americana e caribenha. No nosso e-book, os autores (alunos e equipe) selecionaram em suas realidades mulheres negras que transformaram suas histórias. Construímos perfis destas mulheres, a fim de apresentá-las ao leitor. Os textos foram moldados no afeto, para pontuar com gratidão pessoas que mudaram as nossas vidas. 5

VÂNIA PAULA FERREIRA Vânia Paula Ferreira, professora de Artes do Colégio Estadual Moacyr Padilha, é uma mulher muito inspiradora para nossa comunidade. Desde muito jovem já participativa na paróquia de Santa Luzia e estudou no mesmo colégio onde hoje leciona. Uma mulher extremamente espiritualizada, habilidosa, criativa, dinâmica, comunicativa, alegre e generosa é esta nossa colega. 6

Muito antes de formar-se no curso de Artes e trabalhar como professora, Vânia já compartilhava seus inúmeros dons ensinando crianças e jovens a tocar violão e a cantar. Ajudou a fundar o ministério de música Grupo Católico Estrela da Manhã, onde hoje é coordenadora. Participa ativamente na paróquia de Santa Luzia, além de ministra de música, ainda é ministra da palavra e da eucaristia. Esta artista nos impressiona pela sua versatilidade. Lembro-me de vê-la produzindo pinturas sacras, murais, ensaiando apresentações musicais, teatrais e de dança. Ela nos presenteia com belíssimos trabalhos tanto no colégio como em toda a comunidade trirriense. Orgulho-me de poder tê-la como colega de trabalho. Ela é, sem dúvidas, um exemplo para mim, para suas alunas e para todas as mulheres que tem o privilégio de conviver com ela. Autora da homenagem Giliza Bonfim da Silva Professora de Inglês do Colégio Estadual Moacyr Padilha e do Instituto de Educação Professor Joel Monnerat 7

MARCELA SOARES MACHADO CARDOZO Mãe de gêmeos, esposa, professora de ciências e biologia, formada pelo CEDERJ/UFRJ, mestrando em ensino de biologia, criada pela avó, moradora de Levy Gasparian, ex-diretora adjunta do CEMP, essa é a Marcela. Não conheço muito a história da Marcela antes de ser minha professora, mas tenho certeza que ela sempre foi guerreira, doce, alegre e inspiradora. Homenageá-la é um prazer, pois ela é uma grande inspiração não só para mim, mas para muitas pessoas do “Vocacional”. Andei perguntando e a professora Lucia Joviano se lembra dela por ser doce, correta, alegre, o professor Amadeu por ser uma ótima 8

profissional, a professora Graça por ser uma mulher forte e comprometida com os alunos, à aluna Taciany se lembra dela por ela nos ensinar o valor à escola e ao dos trabalhos dos outros, depois de nos pedir para limpar a sala, a aluna Anna Clara a vê como uma pessoa simples, super doce e inteligente. Mas eu me recordo dela como alguém que me estimulou a gostar e ciências, alguém que influenciou na minha escolha de profissão, alguém que não me deixou desistir, alguém que apoiou aos alunos na criação de um grupo de estudos quando a maioria das pessoas não queira que ele existisse e também alguém que levava doce para os alunos rs. Por tudo que ela representa para nós alunos, sendo uma grande referência, nós a apelidamos de pretérito, por ser mais que perfeita (a galera de português vai entender). A M. Cardozo é uma mulher negra, que não deixou se abater com o preconceito com as lutas, pelo contrário ela seguiu em frente atrás dos seus sonhos e ainda vai fazer muito mais, pode guardar isso. A maneira que ela consegue atingir e inspirar o todo, o plural é tão singular e por isso ela merece estar nesse livro. Ela não desiste, sempre passa confiança, fé e calma. Encanta por onde passa. Essa homenagem não é só minha, mas te todos que te cercam no CEMP e na sua vida dela também, porque quem é o que ela é não consegue ser diferente em outros lugares, por onde ela passar, com certeza, muitas pessoas ela vai iluminar. Autor da homenagem Bruno Rodrigues Dos Santos Turma: EMP_3001 9

HILANA CABRAL RIBEIRO WALD Hilana é professora de Língua Portuguesa e Literatura, trabalha no estado há 25 anos. No Moacyr Padilha, trabalha desde 1999. É possível ver na sua história muitos episódios de sucesso, muitos alunos com a história mudada, muitas pessoas, que assim como eu, se lembram dos trabalhos pedidos, ou das orientações gentis e assertivas que mudavam a maneira de entender uma regra. Lembro-me de um trabalho em 10

que precisávamos fotografar placas com erros gramaticais. Na rua, com câmeras analógicas, eu e meu grupo estudávamos sem nos darmos conta. Hoje como professor eu entendo como é difícil engajar um adolescente, e também entendo a força do trabalho dela. Há entre os conhecidos muitas palavras de afeto, porque é essa a sintaxe que ela cultiva. A dedicação e a presença pontuam com delicadeza o respeito e a admiração. Como se precisasse. O carisma chega antes do bom dia, justifica o interesse dos alunos de agora e os aplausos dos alunos de ontem. Quando voltei ao colégio, no início deste ano, agora como professor, Hilana me chamou num canto e compartilhou as estratégias que usou para lecionar a disciplina que agora estaria em minha responsabilidade. Sem que eu me desse conta, ensinava-me mais uma lição. Dedica-se a formar. Opera juntos aos colegas uma máquina que sofre com o descaso público. Sua singularidade já flexionou em muitos sujeitos a gramática dos sonhos. Por isso, e por muitas outras histórias que certamente estão gravadas nas pessoas que convivem com ela, Hilana tem seu lugar nas páginas deste livro e nas páginas de muitas vidas. Autor da homenagem Fabrício Gonçalves Pacheco Professor de Estudos Orientados 11

MARIA ROSA MARTINS SOARES Uma mulher singular Matriarca de uma família grande, Não só fazia o que estava ao seu alcance Mas também o que não estava Poderia até faltar dinheiro, Mas amparo e carinho a quem precisasse nunca esteve em falta O amor era tanto 12

Que nem sequer pensávamos que pudesse acabar E de fato nunca acabou, Maria partiu e deixou plantada em nós uma roseira E nós a levamos para onde for. Hoje, alguns anos após sua partida, eu como neta, conheço por amor tudo o que eu aprendi com ela. Como tantas outras mulheres, abriu mão de várias coisas na vida pelo bem estar dos filhos, e nada mais a deixava tão realizada. Maria Rosa deixou em nós a receita para da compreensão e do amor mais sincero que existe, e nós o percebemos nas mulheres que conhecemos, nas que somos, nas que nos criamos e nas que ainda vamos nos tornar. Autora da homenagem Anna Clara Fernandes Silva Turma: EMP_3001 13

ELVIRA DA SILVA Não é tarefa fácil escolher uma mulher negra que mudou minha vida. Porque foram muitas, foram tantas, que eu poderia citar aqui, só para início de conversa, minha tia que me cuidava com amor todo o tempo em que meus pais trabalhavam fora, ou a minha professora da alfabetização que se tornou inesquecível por abrir um novo mundo pra mim com afinco e delicadeza, assim como minha professora de literatura, que me ensinou a amar os livros e como as histórias que eles contam podem transformar a gente. 14

Eu poderia citar outras tantas mulheres da comunidade onde eu cresci, que tomavam a frente de pastorais, novenas, e outras tantas ações que nos envolviam e nos davam um verdadeiro senso de solidariedade. Eu poderia citar as mulheres que conheci em muitos dos quilombos que visitei durante a faculdade - presidentas de associação de moradores, mães de santo, donas de casa, arrimos de família, lavradoras da terra e da alma. Eu poderia falar da minha avó também, que se separou do meu avô quando isso ainda nem era algo corriqueiro como nos dias de hoje. Porém, quero voltar um pouco mais e falar da minha bisavó, pela força ancestral que envolve essa relação e porque de fato, minha bisa mudou minha vida. Ela era dessas mulheres que nós imaginamos serem forjadas em aço e flor, mas paremos com as idealizações por aqui, por debaixo da pele escura minha Bisa era uma mulher negra e ponto. Mas ela mesma não se esquecia da pele escura, como mogno lustrado, e nos contava histórias “Do tempo do cativeiro” como ela dizia. Até onde sei minha bisavó e seus pais eram “livres”, mas ela cresceu em uma fazenda num período relativamente muito recente a abolição, se levarmos em conta que ela falava do início do século passado. Portanto, o peso dessa vivencia obviamente estava nela, como até hoje está em todos os homens e mulheres que tem a pele como a dela. Mas não eram só histórias tristes que ela contava. Com uma oralidade riquíssima, que só depois, já na universidade eu descobri se tratar de um traço 15

importante da cultura africana, minha Bisa nos divertia através da contação de histórias, tanto fantásticas, com dragões e fantasmas, ou “causos” do dia-dia, como por exemplo, era para ela lavar roupa no rio e pegar lenha na mata. Minha Bisa também possuía uma espiritualidade ímpar, quando eu e meu irmão éramos pequenos, ela nos benzia contra “quebrante, vento virado, espinhela caída” e toda sorte de adversidades. Mas houve um episódio em que fiquei realmente doente: eu estava internada com pneumonia, minha Bisa chegou ao hospital quando o horário de vistas já tinha acabado. Sem poder entrar ela fez apenas uma oração na capela do hospital. No dia seguinte, quando minha mãe chegou ao hospital, eu contei pra ela que minha bisavó esteve lá. No entanto, nos duas não havíamos nos encontrado, nem eu, nem minha mãe sabíamos se quer que ela estivera no hospital. O fato é que eu fiquei curada e sou grata à minha bisavó, por isso e por tantas outras coisas. Minha Bisa era uma pessoa muito simples, vivia descalça na beira do fogão de lenha, me chamava de meu amor, e sinto saudades da sua doçura até hoje. Eu gostava de pensar que éramos parecidas, ainda que não fosse à aparência. Mas teve um dia em que ela cortou meu coração, foi quando percebi que éramos um tanto diferentes. Eu estava na rua brincando com os coleguinhas, quando minha Bisa passou cheia de sacolas pesadas vindo da venda, eu corri na sua direção pra ajudar. Minha Bisa disse, quase que em tom de segredo, “Não fica perto dessa preta feia não, seus colegas estão ali (vendo).”, eu insisti e segui com ela, 16

mas até hoje pensar nisso me faz chorar. Minha Bisa era diferente de mim, tudo que ela sofreu por ter a pele de escura, eu nunca vou conseguir nem mensurar, mas esse episódio me fez ter alguma ideia, e isso já foi suficiente pra me doer uma vida inteira. Minha Bisa era linda, sua pele tão preta contrastava com os cabelos de nuvem debaixo do lenço, magra, olhos de jabuticaba madura, linda. Seu abraço era o melhor do mundo, seu café, seu olhar, e até suas palavras eram cheias de dulçor. Também descobri que aquele jeitinho de falar, parecido com os das pessoas que conheci nos quilombos, era mais um traço de sua ancestralidade. Quando comecei a namorar, uma das primeiras pessoas da família a quem eu apresentei o meu atual marido foi a minha Bisa, e hoje eu a apresento a você que leu este relato singelo até o final. Ela não está mais fisicamente aqui, mas certamente está presente em cada gesto de afeto, na minha espiritualidade, no meu modo de ver a vida. Bom, cara leitora e caro leitor, essa é Elvira, (ou Orvira, Orvirinha) minha Bisa, minhas raízes, uma mulher daquelas que parecem ser forjadas em aço e flor, mas que na verdade são de carne, osso e pele. Autora da homenagem Ágata Liz Mazine Cardozo Professora de Geografia 17

SANDRA ASSIS DE OLIVEIRA ROSA O mundo, em 30/10/1986, recebeu de presente essa mulher que veio com tanta garra que a fez vencer inúmeros obstáculos. Sempre muito focada e decidida a estudar, ela superou tudo que tentou impedi-la de continuar a jornada. Não só seu caminho nos estudos, mas também seu caminho na profissão proporcionam a nós que convivemos com ela o prazer de estar ao lado da motivação e do entusiasmo propriamente ditos. Entusiasmo que ela leva sempre para os alunos. Mesmo 18

não tendo na escola pública condições ideais de trabalho, ela faz o melhor que ela pode com as condições que ela tem. Enfrentou preconceitos por ser negra no tempo da faculdade e não se deixou derrotar. Persistiu, lutou, perseverou e sem nunca ter recebido nenhum favorzinho, ela venceu e se formou. Passou em concursos e escolheu quais assumir. Estabeleceu-se profissionalmente ainda muito nova porque esse sempre foi o seu foco. Planejou-se e conquistou sua casa própria também em idade muito jovem. Nada foi fácil para Sandra. Ao contrário, já tentaram é dificultar tudo para ela. Mas ela tem força, tem energia e mesmo nas fases de sofrimentos, ela nunca nem pensou em desistir porque sempre soube que ia dar conta de tudo e deu. Sofreu desrespeito e assédio, mas isso também não a derrotou. Ela não foi indiferente a isso, isso a abalou, isso a balançou, mas ela não caiu. Hoje como professora de matemática, Sandra faz um trabalho lindo motivando os alunos a também traçarem um bom caminho para eles. Desde 2008, Sandra procura sempre ensinar com o coração e imprime nas suas aulas uma grande vontade de fazer diferença positiva no mundo. Vontade essa que é naturalmente transmitida para os alunos. Sandra é um exemplo de mulher que tem garra. Sandra é um exemplo de mulher negra que não deixa de fazer porque é difícil. Ela faz apesar de ser difícil. Ela não deixa de fazer porque tem medo. Ela faz 19

mesmo tendo medo. Isso é que é ter coragem: fazer mesmo tendo forças contrárias torcendo pra dar errado. Admirada por muitos alunos, amada por muitos colegas de profissão, Sandra é um presente para todos nós e todos os dias em suas aulas, ela planta sementes de entusiasmo, sementes de esperança e passa uma mensagem para os alunos de que eles são muito capazes e de que ela acredita muito no potencial deles. E é por tudo isso que ela é extremamente importante na comunidade escolar. Dona de uma história gloriosa, Sandra é uma vitoriosa. Sandra é um exemplo de pessoa que tira leite de pedra. Precisamos de mais gente assim. Autora da homenagem Maria das Graças Julião Professora de Inglês 20

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ELZA DE OLIVEIRA SANTOS No dia 5/11/1944, Maria da Gloria Cerqueira de Oliveira e João Oliveira tiveram sua primeira filha, minha avó Elza de Oliveiro Santos entre 10 irmãos. Quando era bem nova, seu pai lhe ensinou a tocar acordeão e sempre iam para o baile juntos dançar, mas depois de um tempo tudo mudou. Ela acordava às cinco horas da manha para fazer o almoço para ele trabalhar. Nessa época, ela tinha 12 anos. Elza tinha que ascender 22

o fogão a lenha e, assim que esquentava, saiam lacraias, mas ela não podia gritar, porque seu pai poderia lhe bater. Às vezes, ela corria para casa de sua avó para se esconder, porque ela se colocava na frente dele para que ele não chegasse nela. Sua mãe a levava na escola, quando era bem pequena. Com seus 14 anos foi o seu irmão mais velho que a levava à escola. Quando começou a fazer o curso de costura, ela passou a ir sozinha, mas ela nunca poderia chegar tarde a casa, porque ela apanhava por causa disso. Sua infância foi bem difícil, ela apanhava muito e sem motivo algum, muitas das vezes até de chicote. Com 15 anos, enquanto cursava o 4º ano, ela começou a namorar João Benedito dos Santos, nisso seu pai lhe tirou da escola. Quatro anos depois, ela se casou, morava em um quartinho na casa da sua mãe. Com 20 anos teve seu primeiro filho e seu pai lhe deu uma casa, quanto ela teve seu segundo filho. Ao todo, ela teve quatro filhos: Ismael, Ismailda, Isméria e Izabel. Nessa época, seu pai, João Oliveira, decidiu sair de casa deixando todos em uma situação financeira muito precária. Esse período na vida dessa família foi muito difícil, nesse tempo também, eles perderam um irmão e foi um momento difícil para todos. Para sustentar sua família, Elza começou a trabalhar como lavadeira de roupa, seu marido estava desempregado. Nessa época, passaram grandes dificuldades. Nesse tempo, deixavam de fazer diversas coisas, porque não tinham condições. Depois, seu marido conseguiu um emprego como carteiro e Elza começou a trabalhar como costureira em uma fábrica e essa foi a primeira vez que ela trabalhou de carteira 23

assinada. Mais tarde, isso a ajudou na aposentadoria. Um marco muito importante na vida dela foi quando ela entrou para a Igreja Adventista do Sétimo Dia, quando a igreja que ela frequentava anteriormente fechou. Os senhores chamados Manoel Seixas e Valdir Neves lhe deram estudo bíblico e isso lhe deu uma grande sensação de segurança, foi nesse momento que ela saiu do aperto da vida. A igreja lhe proporcionou cestas básicas que a ajudou muito. Uma das suas melhores lembranças foi quando ela foi batizada. Também aqui começou umas das suas maiores dificuldades, o seu marido não gostava que ela fosse à igreja e isso durou anos de lutas e desavenças. Até seus filhos se tornarem adultos, grandes dificuldades e batalhas foram travadas nesse período. Ela viu os seus três filhos se casarem e atualmente está viúva, ela já tem cinco netos, tem a sua própria casa e está muito bem vendo que todo o esforço que ela passou para cuidar de seus filhos valeu à pena. Seu filho Ismael se tornou técnico em acabamento, sua filha Ismailda é servente de limpeza, sua filha do meio, Isméria, é costureira e sua última filha, Izabel, é professora e atualmente está fazendo faculdade de pedagogia. Em meio a tantas dificuldades, ela nunca pensou em desistir. Sempre deu o seu melhor para poder ver os seus filhos tendo as oportunidades que ela não pode ter. Uma mulher batalhadora que passou por diversas dificuldades, travou grandes lutas. Um exemplo para mim de superação e fé, uma mãe, uma avó, uma grande mulher negra e forte. 24

“Pessoas vencedoras não são aquelas que não falham, são aquelas que não desistem.” Autora da homenagem Michelle dos Santos Medeiros Turma EMP 2002 25

MARIA DE PAULA FELICIDADE Eu não cheguei a conhecer ela, mas a história que a minha mãe me contou sobre ela, me chamou atenção. Ela era uma mulher negra, tinha quato irmãos e era a única menina na família. A infância foi tão difícil, aos seus 12 anos, teve que ver o seu pai batendo na sua mãe por causa de bebidas e drogas, todo santo dia. Aos 20 anos ela estava grávida, e o seu \"namorado\", junto com a mãe dele, queriam abortar esse bebê pelo fato deles não estarem prontos para ter uma família. Maria não queria abortar de jeito nenhum, e falou que iria criar o filho sozinho. Ela arrumou um bico no posto de gasolina, mas não durou muito. Ela então resolveu ser manicure. Ela andava muito pra chegar até a casa das clientes. Tudo isso pra ganhar pouco. Enquanto ela trabalhava, ela deixava o seu filho com a sua mãe, que cuidava dele como se fosse filho dela. Mimando ele, digamos assim. Teve uma vez que ela, com muita dor no coração, deixou o seu filho na casa da sua mãe de 2 a 3 anos, porque ela não tinha 26

condições financeiras pra sustentar ela e a criança. Voltando um pouco, sabe por que ela deixou o filho com a mãe? Porque a primeira tentativa foi deixar com o pai, a criança chorava muito e o pai queria dormir, já bêbado, junto com a sua mãe (a avó por parte de pai do garoto). Ele botou o filho pra fora, e, por ironia do destino, nesse mesmo tempo, o avô por parte mãe passou na rua e viu o seu neto pro lado de fora naquele frio. Pegou o garoto, reconheceu que era o seu neto e o levou pra sua casa, para cuidar dele. A mãe foi descobrir onde ele estava depois de alguns dias de procura. E foi assim que ela resolveu deixar o filho na casa de sua mãe, passando dois longos anos, naquela luta, e passando fome às vezes. Maria achou outro cara que lhe ajudou a criar o seu 1° filho. Ela também teve um filho com esse cara, mas eles já tinham o que precisavam para ter uma família. O pai do 1° filho também arrumou outra e teve um filho com ela. Por mais que a história seja um pouco triste, tem um final tranqüilo. E os nomes dos garotos? Bem... eu também não sei, aí vai dá criatividade de cada um, sintam-se livres para dar nomes a eles durante a leitura. Autor da homenagem Yuri de Paula Felicidade Menezes Turma: EMP 2002 27

MARIA APARECIDA RODRIGUES DOS SANTOS (NININHA) Nininha, como é carinhosamente chamada, é uma grande mãe, esposa, amiga... Enfim ela é uma grande mulher que, dentre muitas outras qualidades, é guerreira. A típica mãe brasileira que se vira em mil para ajudar sua família, sempre tentando dar o melhor aos seus filhos, mesmo não ganhando muito. Dotada de uma grande sabedoria e de muita fé em Deus, ela sempre marca os lugares por onde passa. A irmã mais nova que dá conselhos aos mais velhos. A criança que cuidava de seus sobrinhos. A mulher negra de vários 28

dons, como cozinhar, pintar, organizar, entre outros, que não se deixa abater por pouco e que enfrente a grande luta que é a vida. Ela é merecedora de toda homenagem, porque além e seus atributos citados acima, Maria faz a diferença, é proativa e um exemplo para muitas pessoas. Suas qualidades a fazem uma grande líder mesmo sem ocupar um grande cargo de liderança, e isso não a retrai, pelo contrário, ela toma a frente e incentiva as pessoas em sua volta. Ela não é perfeita, pois ninguém é, mas o mais importante é que ela reconhece isso, uma atitude de quem está disposta a ser melhor todos os dias. Forte, líder nata, artista, lutadora... Essas são, geralmente, uma das características das grandes mulheres negras do mundo, características de figuras de grande representatividade pelo globo terrestre e essas são as características de Maria Aparecida Rodrigues Dos Santos, uma mãe, irmã, esposa, tia, amiga, cunhada que não foge à luta e que nos ensina muito sobre mudar “o mundo em sua volta”. Autor da homenagem Bruno Rodrigues dos Santos Turma: EMP_3001 29

LEANDRA JACINTO PEREIRA Divide comigo a nem sempre fácil tarefa de coordenar e orientar o processo de ensino aprendizagem no Colégio Estadual Moacyr Padilha. Neste trabalho, acolher deve ser a principal característica de quem o faz, e neste sentido Leandra com seu coração de mãe nos abraça e a alguns chama até de filho. É por isso que antes de todos os seus títulos e atribuições direi que ela é mãe de Gabriela Pereira, hoje uma jovem universitária, mas que na primeira infância a levou a achar seu objeto de estudo 30

do Mestrado, cujo título da dissertação fora Educação Infantil: um espaço/tempo para práticas anti-racistas. Aluna egressa do CEMP, se desdobra para estabelecer parcerias e fazer campanhas que beneficiem os[as] estudantes, e essas extrapolam e muito o pedagógico. Nesse sentido, marca sua presença também em ações na comunidade a participar não só no universo da cultura acadêmica, como também na cultura local, como é o caso de sua atuação no Grêmio Recreativo Escola de Samba Bom das Bocas. Faz trabalhos sociais e voluntários e também gosta de meditar, além de se poder verificar em seu currículo muitos cursos, orientações de monografias e participação em congressos. Leandra possui graduação em PEDAGOGIA pela UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA (1997) e MESTRADO EM EDUCAÇÃO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (2008); Especialização em METODOLOGIA DO ENSINO SUPERIOR 2000, pela FUND. EDUC. DOM ANDRE ARCOVERDE. Já está com sua defesa de Doutoramento marcada para novembro, quando fará jus a mais esse título. Atualmente é Tutora do Centro de Educação a Distância do Estado de Rio de Janeiro, Orientadora Educacional e Inspetora Escolar pela SEEDUC/RJ. Tem experiência em docência, atuando principalmente nos seguintes temas: formação de professores, alfabetização, letramento, docência, pesquisa científica e relações raciais. 31

Não posso deixar de destacar aqui sua célebre perspectiva de que “uma mulher deve ajudar a levantar a outra”, sabedoria que imagino ter adquirido em nossa empreitada feminina, como guerreiras contra toda sorte de dificuldades e preconceitos em uma sociedade falocêntrica e etnocêntrica. Eis um pequeno fragmento das “muitas Leandras” cujas faces em muito extrapolam os limites deste texto. Autora da homenagem Lúcia Helena da Silva Joviano Coordenadora 32

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LAÍS NEVES Conheci a professora Laís Neves na quinta série em 1981 no C.E Moacyr Padilha, foi minha professora de Educação Artística. Lembro-me de que suas aulas quebravam muito a rigidez com que estávamos acostumados nas aulas de outras disciplinas, eram aulas com trabalhos manuais, como pintura, desenho e confecção de peças de artesanatos. Além dos trabalhos estimulantes, sua postura em relação ao aluno era bem espontânea, carinhosa e humana. Na verdade, Laís era professora de Matemática, mas aceitou trabalhar 34

Educação Artística, não só por ter formação em Matemática e ter estudado Desenho, mas porque gostava de arte e para que não ficássemos sem professor nesta disciplina. Vale muito dizer que ela desempenhou brilhantemente esse papel. Eu aprendi vários trabalhos com ela e me aprimorei em muitos. Hoje, faço pintura em tela e desenho e muito dessa habilidade devo aos estímulos dessa professora. Naquele tempo em que a situação financeira era muito difícil, Laís comprava os materiais para que os alunos fizessem trabalhos. Lembro-me dela caminhando para a sala com aquela bolsa imensa com tintas pincéis e outros materiais. Era uma figura adorável. Um detalhe interessante lembrado por sua sobrinha é do piano alemão que Laís tinha em seu apartamento e que até hoje, mesmo depois de seu falecimento, encontra-se neste apartamento onde vivem seu filho Luciano, sua nora Cristiane e seus netos. Um pouco, do muito que ela foi, merece ser conhecido. Laís Neves, filha do maquinista Antônio Neves e da dona de casa Felizarda Neves, foi uma mulher negra, de origem humilde, nascida em Três Rios, criada na Várzea do Otorino. Em seu tempo, estudar era muito difícil, principalmente para uma mulher em sua condição: de origem pobre e negra. Laís venceu obstáculos, foi a única na sua família que cursou uma faculdade, licenciou-se em Matemática pela Severino Sombra em Vassouras – RJ e lecionou na rede pública estadual do Rio de Janeiro e no colégio Cenecista São João Batista em Três Rios. Quando jovem, a bicicleta era seu meio de transporte e um num acidente perdeu um dos pés, mas isso não a impediu de 35

continuar sua luta. Todos que a conheceram ou que conviveram com ela sempre a descrevem da mesma forma: dona de um coração imenso. Laís Neves é tia da nossa Coordenadora Pedagógica Leandra Jacinto Pereira. Leandra é uma das que apontam para a bondade da professora Laís, uma tia que sempre amparou seus sobrinhos como se fossem filhos e quem muito ajudou Leandra. Segundo a sobrinha, uma das responsáveis por ela ter prosseguido nos estudos e ter ingressado através de concurso na rede pública estadual. Também a professora Edyr Coutinho, amiga, vizinha e colega de trabalho de Laís, reforça o imenso coração que Laís tinha e sua postura carinhosa com os amigos, vizinhos, alunos e parentes. Edyr nos informou que ela e Laís Neves fizeram parte do grupo de professores que inaugurou o C.E. Moacyr Padilha em 1974. Elas trabalharam nesse estabelecimento por vários anos e nele se aposentaram. Além do Moacyr Padilha, Laís trabalhou em outras escolas da rede pública estadual e na rede cenecista de ensino, no colégio São João Batista em Levy Gasparian. Infelizmente, Laís não se encontra mais entre nós, partiu em outubro de 2015, mas ficou, evidentemente, na memória daqueles que tiveram o privilégio de conhecê-la e conviver com ela. Autor da homenagem Amadeu da Silva Guedes Professor e Agente de leitura 36

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AGRADECIMENTOS Este trabalho é fruto de um empenho coletivo. Agradeço cada um dos autores que aceitaram o convite de dividir histórias. (Giliza, Bruno, Anna Clara, Michelle, Yuri, Ágata, Maria das Graças, Lúcia Helena e Amadeu). Agradeço também a todas as mulheres que ocuparam as páginas deste livro. Que este livro celebre com afeto a presença de cada uma, tanto na história, quanto na memória. 38

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