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Revista Montepio 33

Published by Plot Content - SA, 2020-03-18 13:49:46

Description: Revista Montepio 33

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Diretor Virgílio Boavista Lima Inverno'20 // #33 Trimestral €1 VIRGÍLIO LIMA O GESTOR TRANQUILO Olhos nos olhos com o novo presidente da AMM



6 Glocal 40 SUMÁRIOINVERNO2020 Luz ao fundo  Perfil Montepio #33 do túnel Capicua 62 OS NOSSOS VALORES Desporto AS NOSSAS EXPERIÊNCIAS 13 Sociedade Ginástica mental 55 Lazer O digital pode salvar as cidades do interior? 44 Portugal pela lente Finanças dos fotógrafos 20 Tecnologia pessoais Vai mudar de 60 Livros Podemos confiar emprego? nos nossos olhos? O dinheiro As lendas não é tudo do senhor Cleto 24 Entrevista 66 Associados J osé de Guimarães Uma viagem ao 27 Alimentação mundo das Artes E se fôssemos todos A NOSSA vegetarianos? ASSOCIAÇÃO 32 Sociedade 68 Saúde Muda que muda Como o passado prevê o futuro 37 Residências 70 Notícias Envelhecer no centro da cidade Mutualismo 71 Associado Carlos Figueiral Azevedo 72 Associado Miguel Santos 8 A MINHA ECONOMIA Entrevista Virgílio Lima 48 Finanças pessoais Já lhe compensa comprar um veículo elétrico? 51 Poupança 7 formas de potenciar o seu IRS I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

04 NESTAEDIÇÃO Montepio Daniel de Castro Ruivo Associação Mutualista Empreendedor #33 série iii No verão de 2008, João Coração, o alter ego de Daniel INVERNO 2020 de Castro Ruivo, compôs 30 músicas para dois álbuns propriedade aclamados pela crítica e fãs. Poucos meses depois, Montepio Geral – Associação Mutualista porém, deixou a música e Rua do Ouro, 219-241 começou uma carreira de 1100-062 Lisboa sucesso a fundar startups. Tel. 213 249 540 Conheça as histórias de quem, NIPC: 500 766 681 como Daniel, mudou de vida sem olhar para trás. diretor Capicua Envelhecer no Virgílio Boavista Lima Música centro da cidade diretor-adjunto Residências Rita Pinho Branco Ana Matos Fernandes Montepio nasceu no Porto mas coordenação o seu talento não tem Com a abertura fronteiras nacionais da residência de Direção de Comunicação, ou internacionais. No dia em que Entrecampos, a Associação Mutualista Marketing e Canais Madrepérola chegou aos fãs, a revista reforça o seu papel social na criação de Montepio foi conhecer melhor a rapper soluções para a população idosa. Saiba editor e sede de redação feminista que colocou uma geração de como a nova unidade vai revolucionar jovens a cantar músicas bem escritas, os serviços de saúde para os seniores na Plot - Content Agency inteligentes e com uma melodia que capital portuguesa e quais os planos do Av. Conselheiro Fernando de Sousa, dificilmente nos sai dos ouvidos. grupo para os próximos anos. 19, 6.º, 1070-072 Lisboa Tel. 213 804 010 Participe na próximaedição desta revista diretor de projeto Cultura Economia Lazer João Calado TECNOLOGIAA maior HABITAÇÃO POUPANÇA2020 será revolução na indústria da É a pergunta de muitas um ano generoso em diretor editorial música dos últimos 40 anos, famílias portuguesas: pontes e fins de semana a tecnologia MIDI 2.0, será quando descerá o preço prolongados. Conheça as Nuno Alexandre Silva lançada este ano. Saiba das casas? Saiba épocas do ano ideais para o que mudará na música os fatores que determinam conhecer Portugal com a editor chefe que ouvimos mas também a resposta e como pode sua família e os melhores no modo como os artistas preparar-se para esse parceiros Montepio para Carlos Martinho passarão a criá-la. momento. poupar em cada viagem. editora executiva Aceite o desafio, participe Inverno'20 // #33 Trimestral €1 A capa na próxima edição Sara Batista e envie-nos as suas VIRGÍLIO LIMA Numa tarde fria de inverno, Virgílio Lima sugestões e comentários recebeu a revista Montepio para uma diretora de arte para revistamontepio@ O GESTOR TRANQUILO entrevista em que não ficou nada por montepio.pt ou, se preferir, dizer. Uma conversa olhos nos olhos com Inês Reis para Revista Montepio, Olhos nos olhos com o novo presidente da AMM o novo presidente da Associação Direção de Comunicação, Mutualista Montepio, o gestor tranquilo. design Marketing e Canais Rua do Carmo, 42, 9.°, Pedro Dias, Sónia Garcia 1200 - 094 Lisboa produção e arte final Ana Miranda, Pedro Pinguinha colaborações Adriano Moreira, Alexandra Pereira, Alexandre Braz, Ana Catarina André, Francisco Moita Flores, João Valente, Mafalda Aguilar, Rafael Afonso (texto), Artur, Bruno Barata, Matilde Cunha (fotografia), Vera Mota (ilustração) publicidade Ramimo Mayet (969 135 032) Tel. 211 963 729 | Fax 211 963 729 impressão LiderGraf Sustainable Printing Rua do Galhano, 15 (E N 13), Árvore 4480-089 Vila do Conde Revista trimestral Depósito Legal nº 5673/84 Publicação periódica registada sob o nº 120133 tiragem 437 800 exemplares O MGAM é alheio ao conteúdo da publicidade externa. A sua exatidão e/ou veracidade é da responsabilidade exclusiva dos anunciantes e empresas publicitárias. Diretor Virgílio Boavista Lima estatuto editorial Certificado PEFC A Revista Montepio é a publicação que faz a ligação entre o Montepio Geral - Associação Mutualista e os seus Este produto tem associados. Conheça o seu estatuto editorial em montepio.org/vantagens-montepio/publicacoes/revista-montepio/ origem em florestas com gestão florestal sustentável e fontes controladas www.pefc.org PEFC/13-31-011 montepio I N V E R N O 2 0 2 0

EDITORIAL 05 Um laptop e uma cabana Borge Trongmo viveu mais de 20 anos em gran- cionada pelo digital constitui uma oportunidade para des cidades europeias, mas é a partir de Ser- os autarcas de vilas e cidades que, desde o século xix, per- pa que hoje trabalha para todo o mundo. dem população. Não há soluções perfeitas, mas a possibili- O cidadão norueguês só precisa de um com- dade de transferir alguma da riqueza das cidades grandes putador e uma ligação de banda larga para se juntar dia- para as zonas rurais poderá dar início a um círculo virtuo- riamente aos colegas da multinacional norte-americana so para regiões como Trás-os-Montes, Beiras ou Alentejo. Microsoft, muitos deles espalhados pelo país. Ao abdicar Qualquer cenário que o futuro nos reserve, uma coisa de trabalhar na sede da empresa, em Lisboa, Borge tem é certa: a dimensão nacional da Associação Mutualista mais tempo para relaxar numa esplanada soalheira da Montepio garante que estamos e estaremos sempre cidade alentejana ou para brincar com o filho na aldeia ao seu lado. de Vales Mortos, onde reside. Somos uma Associação que se estende de norte a sul, Histórias de vida como a de Borge, que lhe contamos no litoral e interior, e levamos soluções de proteção e pou- interior desta edição, serão cada vez mais frequentes. pança, saúde e habitação a todo o território. Conhece- A transformação digital afeta praticamente todas as pro- mos Portugal de lés-a-lés, as suas gentes e tradições. fissões e já existem inúmeras ferramentas online que per- É esta visão heterogénea do país que nos diferencia mitem aos cidadãos trabalharem a partir de qualquer e que tem contribuído para que, no ano em que comple- lado. E se muitos o fazem a partir de casa, nos centros ou tamos 180 anos, nos mantenhamos tão relevantes nu- subúrbios da cidade grande, outros optam por regressar ma sociedade complexa e em permanente mutação. às origens ou trocar o rebuliço cosmopolita pela calma Neste mundo digital e tantas vezes solitário, são valores e pacatez da vida de aldeia. como os do mutualismo que nos prendem às raízes. Ao Na era das megacidades, a liberdade laboral propor- que de mais genuíno e altruísta existe em nós. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

06 GLOCAL Luz ao fundo do O mundo digital mudou as nossas vidas para melhor. Democratizou a informação, aproximou- -nos de outras culturas e reduziu, de um modo muito significativo, as fronteiras do saber. Existe, porém, uma contrapartida. TúnAvertigemdainformação constante, acessível em várias plataformas e de Maior igualdade de género fontes duvidosas, enviesa o nosso olhar crítico, ponderado e pensado sobre o que se passa no mundo. E se esta nova realidade pinta um globo mais cinzento, os factos dizem o contrário. Na verdade, nunca foi tão bom viver no planeta Terra. Existe menos pobreza, fome, mortalidade e trabalho O número de infantil. A esperança pessoas com eletricidade média de vida é elevada e aumentou 71,9% entre 1990 e há cada vez mais pessoas Portugal ainda se encontra 2016, para os a viverem em regimes abaixo da média da União 6,5 mil milhões de cidadãos no democráticos. Nem tudo Europeia no que toca mundo. são rosas, mas conheça à igualdade de género mas, alguns dos factos que de acordo com o Instituto comprovam o milagre Europeu para a Igualdade de silencioso do progresso Género, a diferença diminuiu entre 2005 e 2019. Neste período, o país melhorou humano: em Portugal e em todos os domínios no resto do mundo. analisados, sobretudo no número de mulheres que ascenderam ao poder político, económico e social. 71,9% Á 66,4% gua e eletricidade Entre 1990 e 2016, o número de pessoas com Ter água e luz em casa já não é um luxo dos países acesso a uma fonte de desenvolvidos. Perto de água potável aumentou 90% da população mundial 66,4%, para os 6,69 mil já tem acesso a estas comodidades, segundo milhões de cidadãos. dados do Banco Mundial. Trata-se de 90% da população mundial. montepio I N V E R N O 2 0 2 0

nel 86Vacinaçã o % R Em 2018, a cobertura global edução da terceira dose da vacina DTP (difteria, tétano e tosse convulsa) chegou a 86% das crianças do globo. Em 1980, esta percentagem encontrava-se nos 20%. Por outro lado, doenças como a poliomielite estão quase erradicadas e outras, como o sarampo, recuaram as da mortalidade taxas de mortalidade em 80% infantil entre 2000 e 2017. Ou seja, salvaram 21,1 milhões de crianças em quase 20 anos. 86,25% L96,9% 4,DSaberler,escreverecontar Em Portugal, a taxa emocracia é essencial para uma vida de mortalidade melhor, mas nem todos têm infantil (crianças com possibilidade de frequentar menos de um ano que morrem por cada 1a escola ou aceder a projetos1 000 nados-vivos) decresceu dos 88,8% (1961) para os 2,7% (2017). Trata-se de uma descida de 96,9%. Globalmente, o número total de mortes de crianças também decresceu: dos 8,8 milhões (em 1990) para os 4,1 milhões (2017). iteracia mil milhões de literacia. Ainda assim, quase nove em cada dez cidadãos com mais de 15 anos Em 1988, o número de países com têm literacia (86,26%). Uma regimes democráticos superou, percentagem muito relevante pela primeira vez, as ditaduras, de e que aumentou 226% nos acordo com o projeto de pesquisa 3T8,1% F 31%últimos100anos. Our World in Data. Em 2015, 4,1 mil milhões de pessoas já viviam em democracia, contra 1,71 mil milhões em ditadura. As restantes? Vivem em países com diferentes estados de transição política. rabalho infantil ome Uma em cada dez crianças do Entre 2000 e 2019, a fome no globo trabalham. São 152 milhões de crianças que, todos os dias, mundo diminuiu quase um fazem trabalhos de homens e terço, segundo o Global Hunger mulheres. Um número elevado mas Index. Ainda assim, os eventos que, ainda assim, tem diminuído climáticos extremos, a violência, todos os anos – em 2000, por a guerra e o abrandamento exemplo, o trabalho infantil económico continuam abrangia 246 milhões de crianças, a deixar 821 milhões de pessoas mais 38,1% que atualmente. em subnutrição no planeta.

Virgílio Boavista Lima Presidente da Associação Mutualista Montepio Na AMM todos temos a mesma voz Quarenta anos após chegar ao Grupo Montepio, Virgílio Lima responde ao desafio mais exigente: a presidência da Associação Mutualista Montepio. Conheça a sua visão e prioridades para o projeto associativo e de que modo as colocará em prática. Texto CARLOS MARTINHO | fotografia BRUNO BARATA

Os nossos valores A 09 Entrevista Os nossos N ovasmodalidadesmutualis- Os últimos anos foram sinónimo de valores tas com ligação a soluções inovação nas soluções disponibi- de saúde e de apoio aos ido- lizadas aos associados Montepio, sos, projetos de habitação nomeadamente nas áreas da saúde. que complementem a oferta pública O que nos reservam os próximos anos e privada e a eleição da Assembleia de nestas áreas? Representantes são alguns dos desafios Com o Cartão Montepio Saúde utilizá- que se colocam à equipa liderada por mos a capacidade que 600 mil associa- Virgílio Lima. dos representam junto dos prestadores Na sua primeira grande entrevista, de saúde para conseguirmos condições o presidente da AMM fala ainda dos de- vantajosas. Houve uma adesão imediata safios do novo código mutualista, da re- ao cartão. São poupanças de milhões de lação com o novo supervisor e do que os euros que os associados têm obtido jun- associados Montepio podem esperar: to de diferentes prestadores de saúde de conhecimento, dedicação e prudência. qualidade. Há uma capacidade negocial Assumiu, em dezembro, a presidência que decorre da nossa dimensão. Cabe- da Associação Mutualista Montepio -nos aproveitar este potencial e é o que (AMM). Que prioridades tem para os temos feito. Temos a possibilidade de, próximos anos? à semelhança do que outras associa- Somos uma organização de pessoas ções fazem no mundo, desenvolver mo- que se reúnem, elegem os seus corpos dalidades internas de saúde, no sentido sociais, criam os seus produtos e res- de, com esta capacidade que temos em pondem às suas necessidades. Esta diferentes domínios, termos modalida- natureza vem de longa data e assume des próprias também na saúde. É isso um papel fundamental na coesão so- que estamos a procurar preparar. cial. No futuro teremos uma Associação Há alguma data prevista para o lança- que complementará a intervenção na mento destas modalidades? área da previdência complementar e Sim, mas estamos a realizar estudos no apoio às necessidades das pessoas profundos para garantir, em longo pra- em diferentes domínios da qualidade de zo, a resposta às necessidades das pes- vida, com projetos relevantes na saúde soas. É algo que tem uma mecânica e habitação. Mas também no apoio aos diferente dos seguros, porque nas as- idosos, área na qual já temos equipa- sociações mutualistas não há capital. mentos sociais mas que podemos ligar Em relação à habitação, há domínios às modalidades mutualistas. Queremos com grandes carências. Para estes seg- que as pessoas, durante a vida ativa, se mentos devemos encontrar soluções preparem para as necessidades futuras. que permitam ter uma resposta que São projetos que estão a ser preparados complemente a oferta disponibiliza- e que, numa linha de continuidade que da pelas entidades públicas e privadas. vem desde a origem, a instituição pro- Quantos novos associados vieram atra- curará desenvolver. vés do Montepio Saúde? Vivemos num mundo em mudança. Como o cartão é gratuito e para tê-lo bas- O próprio ritmo da sociedade está ta uma quota associativa, que é baixíssi- a criar novas necessidades. ma, as pessoas aderem naturalmente. Vivemos num tempo em que a constan- Mas como há diferentes fontes de ob- te é a mudança. Mas há aspetos estrutu- tenção de associados e todos utilizam rais que têm uma longevidade grande. o cartão, não temos o número exato dos Este alargamento da oferta é uma linha que aderiram por via desse benefício. de continuidade. Num futuro próximo Quais os principais desafios que identi- teremos novidades. fica na relação com o novo supervisor, I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 10 Entrevista a ASF (Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões)? Pela nossa dimensão e pelo quadro fi- nanceiro que atingimos, a supervisão de uma autoridade neste domínio é, por nós, muito bem recebida e desejada, no sentido de certificar a nossa resposta em termos financeiros, comportamen- tais e prudenciais, para que também o Associado tenha, por esta via, uma ga- rantia de que esta supervisão é exercida. Isso é desejável e natural. Existe um pe- ríodo de transição longo, para adaptação da nossa especificidade a um quadro referencial, mas não vamos adaptar- -nos aos seguros nem transformar-nos numa entidade seguradora. A própria lei tem em atenção este pormenor. A lei diz que a supervisão deve ter por modelo a dos seguros, mas fazendo as necessárias adaptações e em estrita ob- servância das especificidades destas entidades. São entidades que não têm capital e são organizações de pessoas, que colocam as suas poupanças num projeto comum, gerido coletivamen- te e que, não visando o lucro, conse- guem condições de prestação de ser- viço mais adequadas aos associados. A supervisão tem que atender a esta di- ferente natureza e especificidade, obri- gando a que haja equilíbrios técnicos entre as expectativas criadas junto dos associados para a resolução dos seus problemas e os ativos que respondem por estas expectativas. É este equilíbrio técnico que tem de ser sempre conse- guido. A forma, em termos de modelos de solvência, é algo que tem de ser muito adaptado a estas entidades. Já se sabe o que mudará com a mudan- ça de supervisor? Já havia um escrutínio. Por imposi- ção própria, e também por validação da tutela, apresentávamos as contas, os balanços técnicos, aderimos a mo- dos de contabilização atuais e normas contabilísticas, com todo o rigor que montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Q Apoiar os estes implicam. Criámos a nossa pró- ções para um novo órgão mutualista, 11 associados em pria auditoria interna, temos auditores a Assembleia de Representantes. diferentes domínios externos e revisores oficiais de contas, Qual o papel deste novo órgão? da vida, com maior um conselho fiscal e o escrutínio dos O novo código mutualista veio tra- ênfase na saúde associados, via Assembleia Geral (AG), zer este desenvolvimento há muito e na habitação, com informação periódica sobre todas desejado, porque dá maior demo- são os grandes estas matérias. Mas ter uma autoridade craticidade a uma entidade com es- objetivos de Virgílio de supervisão que também escrutina, ta dimensão. É impossível fazer uma Lima na presidência observa e valida, aumenta os níveis de assembleia geral direta com 600 mil da Associação acompanhamento, o que só pode ser associados. Independentemente das Mutualista Montepio benéfico para os associados. Valoriza poupanças e modalidades de cada a própria instituição. Há mais uma cer- um, todos temos a mesma voz e so- tificação qualificada por uma autorida- mos solidários. Uma Assembleia de de independente, isenta e autó­noma. Representantes, se eleita com critérios Os corpos sociais internos ou a gestão corretos de escolha e de representa- dos associados, que sempre funciona- ção efetiva da base de associados, ga- ram, continuam a ser muito importan- rante uma democraticidade que não tes, fundamentais, mas passam a ter é possível nem seria gerível numa AG esta supervisão independente. de milhares de pessoas. E fá-lo atra- 2020 é um ano muito importante pa- vés de representantes qualificados e ra a Associação Mutualista por várias que acompanham a realidade em per- razões, mas é também o ano das elei- manência. A democracia direta é fun- O ribatejano tranquilo que está sempre a aprender Virgílio Lima 66 anos, presidente da Associação Mutualista Montepio N asceu há 66 anos, organização e métodos de patrimónios, à Caixa e a proximidade.” Fã de numa freguesia e fui subindo para agente Económica de Cabo Verde, José Saramago e Miguel do concelho de funcional, orgânico ao fundo de capital Torga, Virgílio Lima gosta Tomar, mas cedo veio e finalmente analista de risco BEI, ao Conselho de jogar golfe e de passar para Lisboa. “Era onde de sistemas, que era Geral e de Supervisão tempo com a família havia empregos naquela a carreira possível neste do Banco, ao Conselho e amigos. Para trás, por altura. Saí de Tomar com domínio”, recorda. Geral da Associação, aos razões de saúde, ficaram o curso comercial e tenho Em Lisboa, Virgílio Lima seguros e, em 2016, ao os anos em que praticou trabalhado e estudado continuou a estudar Conselho de Administração vários desportos, em desde então”, recorda e licenciou-se em Gestão da Associação Mutualista particular futebol. Virgílio Lima. no Instituto Superior de Montepio. “Este tipo de Culto e estudioso, O Grupo Montepio foi Economia e Gestão (ISEG). processo vai preparando ponderado e de registo o seu quinto emprego Concluída a licenciatura, as pessoas, mas estamos calmo, Virgílio Lima tem em Lisboa, mas desde foi convidado para gerente todos os dias a aprender como lema a busca do que entrou, há 40 anos, do balcão de Sintra. Dois e temos de fazê-lo, rigor e das respostas não mais saiu. A sua anos e meio volvidos porque a realidade mais adequadas a cada longevidade no Grupo foi novamente convidado a isso nos obriga”, afirma. situação. “Isso é o ideal, ganha uma relevância para uma nova função, A necessidade de estar é algo que se persegue. maior pela diversidade a de diretor de marketing. atualizado com as novas Errar também é uma de funções que acumulou “Depois fui rodando: realidades profissionais forma de aprendizagem, ao longo dos anos e cuja diretor de planeamento, levou-o de volta ao ISEG, mas às vezes é preferível extensão não é possível diretor comercial... estive onde fez um MBA e um fazer bem à primeira e ter reproduzir nestas linhas. em quase todas as áreas”, mestrado, e segue-o o trabalho de preparação “Comecei por trabalhar continua. nos livros que lê e no que isso exige. Temos o na área de controlo. O amplo conhecimento do doutoramento que dever de tentar tratar Um ano depois concorri Grupo Montepio levou-o frequenta. “É fundamental todas as questões para agente de ainda à gestão de fundos, manter o contacto com rigor”, conclui. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 12 Entrevista damental, mas com esta dimensão não O novo Código R Aos 66 anos, é exequível e precisamos de ter meca- desenvolve e após quatro nismos de representação. O código mu- o mutualismo. como administrador tualista veio dar-nos isto. Também na da AMM, Virgílio Lima Este novo órgão alterará o modo como criação de assume o seu grande os associados vivem a sua Associação modalidades desafio: a presidência e se sentem representados nela? se anteveem da maior associação Desde que haja informação disponível simplificações mutualista do País junto destes representantes, os assun- tos sejam discutidos e aprofundados decorrem do código. Depois há outras Há um conjunto de benefícios que nos e haja transparência na relação com alterações, desde logo a avaliação de compete aproveitar e gerir. os associados e na informação regular, competências dos órgãos sociais. Na- O que seria um mandato perfeito pa- pensamos que só pode melhorar. É um turalmente, um código tem sempre as- ra si? mecanismo muito útil e que vai trazer petos que devem ser afinados. Os pró- O que permita à Associação Mutualis- uma tranquilidade ao Associado, por- prios períodos de transição e de maior ta responder às necessidades de hoje que sabe que tem representantes mais conhecimento e ligação a estas realida- e preparar, simultaneamente, a Asso- preparados, mais informados, que dis- des vão induzir afinações por parte do ciação de amanhã. E que os associa- cutem com profundidade as matérias legislador e do supervisor, com o obje- dos sintam que as suas expectativas e do seu interesse. Julgamos que é um tivo de ajustamento a esta natureza di- os motivos que os levaram a ligarem- passo muito positivo e que será assim ferente. São as questões essenciais que -se à Associação foram satisfeitos e ple- lido pelos associados. o código nos traz. Há outros domínios namente realizados. Isso seria perfeito, Já há data para as eleições? que vêm simplificar a revisão de regu- porque garante futuro, satisfação, per- Temos um regulamento eleitoral a lamentos internos, dos estatutos, a cria- manência, a transmissão a terceiros ser preparado e os estatutos deverão ção de modalidades e as respostas que dessa satisfação e, portanto, uma atra- ser aprovados pela tutela em breve. a Associação pode criar para as diferen- tividade das nossas soluções de respos- No seguimento, será preparado o re- tes necessidades dos seus associados. ta às necessidades sociais. É esta a nossa gulamento eleitoral. Foi eleita uma razão de ser. comissão para o efeito, composta pelas pessoas que também estive- ram ligadas à elaboração dos esta- tutos que foram aprovados, por isso é algo que deveremos fazer no decurso de 2020, tão cedo quanto possível. De que forma a AMM poderá reinven- tar-se para todos os desafios do novo código mutualista sem perder a rele- vância, pertinência e democraticidade que lhe são características? O novo código moderniza e desenvolve o mutualismo. A Assembleia de Repre- sentantes e a supervisão são questões maiores que promovem ajustamentos no sentido da prudência e dos compor- tamentos corretos, a benefício da de- mocraticidade e dos associados. Estas são duas alterações fundamentais que montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Os nossos valores A 13 Sociedade O pode salvar as cidades do interior? Em 2018, mais de 40% da população portuguesa vivia nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, uma tendência que continuará a aumentar. Para trás fica o Portugal rural, com as suas cidades e aldeias envelhecidas, onde prolifera o desemprego e o abandono das infraestruturas. Poderão a tecnologia, a inclusão digital e o teletrabalho inverter este ciclo de êxodo rural, construindo novas sociedades sustentáveis de norte a sul do interior do país? Texto CARLOS MARTINHO | fotografia A RT U R, M AT I L D E C U N H A I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 14 Sociedade E ramseisempontoquan- “O interior estava muito ligado aos P As exportações do entrei no táxi que recursos endógenos. Mas não chega, de Bragança me levaria do Brigantia não é suficientemente disruptivo para superaram, pelo Ecopark, o edifício do reverter o despovoamento. É preci- segundo ano parque tecnológico de so trazer conhecimento e inovação, consecutivo, a Bragança, ao centro da cidade. “Vai e assistimos agora a uma vontade média nacional. apanhar o trânsito da hora de ponta”, da interação do digital com todas as Em breve, a câmara brincou a taxista. Cinco minutos de- áreas: agroalimentar, turismo ou saú- local criará um pois estávamos a parar junto à Praça de”, explica Isabel Ferreira, secretária centro de negócios da Sé, no coração de Bragança. Uma de Estado da Valorização do Interior. digital para reforçar viagem tranquila e apenas possível, A governante conhece bem as poten- estes números naquele final de tarde chuvoso, numa cialidades das cidades do interior: foi cidade do interior português. “Bra- vice-presidente do Instituto Politéc- gança tem o melhor de dois mundos”, nico de Bragança (IPB), diretora do confirma o presidente da autarquia, Centro de Investigação de Montanha Hernâni Dias. “Sendo uma cidade de e continua a residir na cidade trans- média dimensão, não se vê confron- montana, onde nasceu. Fundado em tada com os problemas que afetam 1983, o IPB foi uma das várias escolas cada vez mais as grandes urbes.” de ensino politécnico que surgiram em Portugal no pós-25 de Abril. Hoje, Os números corroboram, em parte, a instituição é uma das locomotivas a atratividade da cidade. Dos 31 con- que contribui para o sucesso da cida- celhos que fazem parte da região de de no contexto do interior português. Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Dos pouco mais de 30 mil habitantes Real foi o único que ganhou habi- do concelho, nove mil são estudantes. tantes entre 1981 e 2018. Bragança foi Muitos acabam por ficar na cidade o que menos perdeu: 1 934 pessoas, após o curso, fundando empresas e para um total de 33 586 habitantes em criando postos de trabalho. No Bri- 2018. Alguns concelhos, como Car- gantia Park estão sedeadas 36 em- razeda de Ansiães, Vimioso, Vinhais presas que empregam 200 pessoas. e Montalegre, perderam metade da Destas, 80% estudaram no IPB e ape- população. nas metade são naturais do distrito de Bragança. “O Brigantia Park possui, no Estes números encontram parale- seu seio, um cluster de empresas de lo no resto do país: as cidades do in- TI que desenvolvem o projeto Smart terior perdem população a um ritmo Bragança, focado em três fileiras de avassalador e muitas aldeias ficam ao abandono. “Bragança tem o melhor de dois mundos. Sendo uma cidade de média dimensão, não se vê confrontada com os problemas que afetam cada vez mais as grandes urbes” Hernâni Dias Presidente da Câmara Municipal de Bragança montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Que aldeias deveremos abandonar? 15 Inverter a desertificação França e Itália sucedem- +10 000 2040 do interior passa por fazer -se os exemplos de pessoas/ano escolhas. Algumas delas pequenas localidades 60% difíceis, como abandonar entregues à natureza 2020 aldeias: “Há muitas que e à desertificação. DA POPULAÇÃO são inviáveis”, argumenta “As pessoas foram Sem novos imigrantes, portuguesa vive a 25 Eduardo Castro. embora porque querem Portugal perderá 50 quiómetros da costa “É doloroso e delicado um nível de vida decente. mil habitantes por ano para os autarcas, mas Durante muito tempo, até 2040. As vilas por vezes temos de ter a imigração foi a razão e cidades do interior, políticas destas: manter do esvaziamento. Agora sobretudo junto às zonas algumas aldeias e gerir é a ordem natural das de fronteira, precisam o declínio de outras que coisas”, continua Eduardo de pelo menos 10 mil sabemos que não têm Castro, que deixa pessoas por ano, nas volta a dar.” a receita de sucesso próximas duas décadas, O abandono das aldeias, para as aldeias bem- para estancar o declínio que se multiplicará -sucedidas: turismo, da população. nos próximos anos em atividades económicas Portugal, não é um ligadas aos produtos fenómeno isolado. locais e a possibilidade de Em países como Espanha, permitirem o teletrabalho.

A Os nossos valores sa de um conjunto interligado de me- “Estamos sempre didas para inverter um processo que disponíveis para 16 Sociedade tem muitos anos”, continua o profes- investir, com a sor, que já fez as contas. Portugal pre- ajuda de privados, para que as cisa de 50 mil imigrantes por ano, até pessoas venham intervenção: smart tech, smart eco 2040, para manter a sua população. morar para Serpa. E daqui trabalhem e smart auto”, revela Hernâni Dias. E se, destes, 10 mil não forem para o para o mundo”, No total, o parque representa 2,5 mi- interior, haverá concelhos fronteiri- frisa o autarca lhões de euros em riqueza para a eco- ços que, em 2040, terão metade das Tomé Pires nomia local. Números que ajudaram pessoas que em 2010. as exportações de Bragança a aumen- Em Serpa, Tomé Pires não aceita tarem, pelo segundo ano consecutivo, este cenário. Mas recusa, também, acima da média nacional – 12,25%, ou considerar a sua cidade como interior. seja, mais 73,48 milhões de euros face “Estamos a uma hora da praia. Tendo ao ano anterior. em conta as dimensões do país, nem Com a sustentabilidade económi- devia haver a distinção entre interior ca vem também a social, que procura e litoral”, refere. O presidente da Câ- na qualidade de vida a resposta para mara de Serpa acredita que todos os os desafios das famílias. Muitas des- autarcas investem “pelo menos 20 tas histórias têm um ponto em co- minutos diários” a perceberem como mum: a tecnologia. “Há pessoas que podem inverter a desertificação, mas, alteraram o rumo das suas vidas e vie- apesar de o digital poder “fazer com ram radicar-se em Bragança porque que mais pessoas possam vir morar” as novas tecnologias permitem-lhes para o seu concelho, nenhuma solu- trabalharem, a partir daqui, para o ção individual resolve o problema. resto do país ou do mundo”, justifica “Podemos ter, de um dia para o ou- Hernâni Dias. tro, mais 100, 200, 500 pessoas. Mas O êxodo rural português começou tem de haver um acompanhamento no século xix e desde então que os su- dos serviços públicos para dar res- cessivos governos tentam combatê- posta”, justifica. Se não há soluções -lo. Sem sucesso. “Um jovem com 18 individuais, existe um rastilho que é ou 20 anos quer ter horizontes mais fundamental para o desenvolvimen- largos, andar por outros sítios. É natu- to do interior: os empregos. “É preci- ral. O importante é que, ainda jovem, so rentabilizar os recursos de Serpa: queira voltar”, justifica Eduardo Cas- agricultura, agrotransformação, pa- tro, professor associado do Departa- trimónio e turismo”, afirma. É aqui mento de Ciências Sociais, Políticas que o digital pode entrar. “Estamos e do Território e vice-reitor da Univer- sempre disponíveis para fazer alguns sidade de Aveiro. investimentos, com a ajuda de pri- Na última década, três novos vados, para que as pessoas venham argumentos entraram neste debate: morar para Serpa. E daqui trabalhem a expansão da banda larga, a entrada para o mundo”, completa. no mercado de trabalho de uma nova geração nativa digital, que responde a Um portátil e banda larga uma economia focada na tecnologia, Nunca foi tão fácil trabalhar a partir e a explosão do mercado da habitação de uma aldeia, vila ou cidade do inte- nas principais cidades portuguesas. rior. Desde que começou a trabalhar “Existem casos, alguns muito inte- como freelancer que Gonçalo Durães, ressantes, de pessoas que trocaram o designer de 38 anos, passa várias tem- Porto e Lisboa pelo interior. Mas não poradas fora de Lisboa, cidade onde são tendências”, revela Eduardo Cas- sempre residiu. “Tive vontade de ex- tro. “O digital pode ajudar, mas sozi- plorar o facto de não ter um local e nho não chega. A desertificação do um horário de trabalho fixo”, afirma. interior é um problema grave e preci- Na primeira experiência, que durou montepio I N V E R N O 2 0 2 0

três meses, Gonçalo trabalhou a par- do ano em Lisboa e metade no Minho para trabalhar a partir do interior por- 17 tir da aldeia de Penedo, na serra de ou noutro sítio qualquer”, revela. A op- tuguês. “Nos últimos dez anos, o apa- Sintra. Seguiram-se Berlim (Alema- ção pelo Alto Minho tem raízes fami- recimento de softwares colaborativos nha), Açores e Friestas, no Alto Minho. liares. Neto de um minhoto de Gandra, de desenvolvimento e gestão de proje- É a esta aldeia de 500 habitantes que Valença do Minho, Gonçalo habituou- tos veio facilitar o processo”, confessa. regressa regularmente e para a qual -se a passar férias no norte do país. Desvantagens, Gonçalo só vê uma: a tem planos mais sérios. “A integração é fácil. As pessoas são impossibilidade de ter reuniões pre- simpáticas e interessadas.” Para o de- senciais. “Mas é algo que se resolve “Quero passar mais tempo em signer, basta um portátil e banda larga facilmente com o Skype.” Friestas. Gostava de passar metade Nem todas as profissões permitem o trabalho remoto, mas à medida que a evolução tecnológica transforma quilómetros em centímetros de dis- tância há cada vez mais profissionais, mas também empresas, a valoriza- rem-no. É o caso da Microsoft Portu- gal, empresa que, na sede do Parque das Nações, em Lisboa, tem um rácio de um lugar para 2,7 colaboradores. “Mas nunca nos falta sítio para sen- tar”, graceja Teresa Virgínia, respon- sável pela área de Modern Workplace da multinacional norte-americana. No edifício, não há lugares marcados. E todos os colaboradores têm portá- teis e telemóveis para trabalharem em qualquer local. “Temos todas as condições para fazer trabalho remoto. É um tema que tem de ser falado com a equipa e o manager”, esclarece a res- Q Tomé Pires, presidente da câmara de Serpa, vê na inovação digital uma aliada do combate à desertificação

A Os nossos valores ponsável que, durante a entrevista te- podem ser aproveitados pelos autar- lefónica com a revista Montepio, pas- cas do interior do país. “O digital veio 18 Sociedade seava por sua casa. Não são apenas reduzir as distâncias físicas”, corro- Além de os colaboradores a ganharem com bora Hernâni Dias. O que pode atra- o trabalho remoto. Além de garanti- palhar, então, o regresso de muitos garantirem uma rem uma maior retenção de talentos, trabalhadores qualificados ao interior maior retenção de o aumento do teletrabalho permite às do país? A ausência de banda larga. talentos, o aumento empresas reduzirem os custos com os escritórios. “Há uma poupança, Um país a duas velocidades do trabalho sim. Não é o argumento principal para Lançado em 2018, o Programa Nacio- remoto permite apostarmos no trabalho remoto, mas nal para a Coesão Territorial agrega um efeito colateral positivo para as 160 medidas para desenvolver o in- às empresas contas da empresa”, garante Teresa terior. Uma delas, promovida pela reduzirem os Virgínia. E a Microsoft não é a única Autoridade Nacional de Comunica- a abrir as portas a esta nova realida- ções (ANACOM), garantia a cobertura custos com de laboral. De acordo com a respon- de banda larga em mil freguesias do escritórios sável, o Microsoft Teams, solução da interior português até final de 2019. empresa para o trabalho colaborativo, A primeira fase, relativa a 480 fregue- triplicou o número de utilizadores em sias, foi cumprida na íntegra pelos 2019. São números como estes que, a três operadores do mercado: MEO, juntar aos preços proibitivos da habi- NOS e Vodafone. A segunda, que afe- tação em Lisboa, Porto ou até Braga, tará mais 588 freguesias, encontra-se Um norueguês em Serpa Borge Trongmo Foi neste último que tem 52 anos e vive conheceu a esposa, há quase quatro portuguesa de Serpa. em Vales Mortos, Em 2016, quando a 20 quilómetros o filho de ambos de Serpa. Todos os nasceu, despediram- dias, este cidadão -se da Microsoft e norueguês faz o mudaram-se para a breve percurso até cidade alentejana. à cidade alentejana “Sabia que a certa com o filho. altura teria de voltar Deixa-o na creche a trabalhar. Estava e começa mais um preparado para dia de trabalho fazê-lo em Lisboa na multinacional ou mudar-me para Microsoft. “Cresci no fora”, explica Borge. norte da Noruega, Não foi preciso. uma área com Na primavera de pouca população e 2019, contactou a sempre quis voltar antiga empregadora a ter a natureza à e percebeu que a minha porta. E não possibilidade de temos isso na grande trabalho remoto já cidade”, explica o era uma realidade. consultor. Borge Uma vez que a fibra chegou à Microsoft ainda não chega a em 1995 e trabalhou Vales Mortos, alugou para a tecnológica um escritório em em três países: Serpa e é de lá que Suécia, Áustria trabalha para todo e Reino Unido. o mundo. montepio I N V E R N O 2 0 2 0

em fase de validação. Ainda assim, par- parceiros locais e internacionais na 19 te do interior português continua sem criação do Digital Innovation Hub, rede. “A ANACOM reconhece que conti- um centro de negócios focado no di- P&R nuam a existir localidades com níveis gital e que permitará reforçar a com- de cobertura móvel reduzidos, com petitividade estratégica da região. Na Isabel Ferreira prejuízos para as populações”, explica Europa, exemplos de sucesso idênti- Secretária de Estado da Valorização fonte do regulador das comunicações. cos não faltam. Em Skibbereen, uma do Interior Por vezes, realça a ANACOM, existem cidade com 2 500 pessoas no sul da “zonas de sombra” no interior de ca- Irlanda, a criação de um hub, ou cen- “Quando se fala do da freguesia que “poderão refletir-se tro de negócios digitais, revolucionou interior, a questão da numa perda de qualidade do serviço a comunidade. Com a ajuda de um banda larga é logo início prestado ou na impossibilidade total parceiro privado, o Ludgate Digital de conversa” de utilização”. Ou seja, o facto de se Hub criou 75 empregos e 21 novos tratarem de zonas menos povoadas e negócios desde 2016, num total de O digital é um projetos e exigirem elevados investimentos, com 2,81 milhões de euros em receitas. fator novo na replicá-los. retorno difícil, faz com que sejam “me- Um quarto deste valor ficou na re- estratégia de A banda larga é nos interessantes para os operadores gião em impostos diretos. E neste valorização extraordinariamente do ponto de vista comercial”. verão, um segundo hub digital será do interior. importante para construído na cidade irlandesa. O ob- Concorda? o interior e estou A inviabilidade económica de uma jetivo é gerar 54 novos empregos di- em crer que será boa rede de banda larga faz parte do retos e 38 indiretos e contribuir com Sim. O digital uma medida muito círculo vicioso com que são confron- 4,2 milhões de euros por ano para a é essencial e importante para os tados os autarcas do interior: a falta de economia local. importante para próximos tempos. empregos obriga as pessoas a migra- aumentar a Temos trabalhado rem para as áreas metropolitanas de Em Serpa, Tomé Pires veria eficiência dos com a Secretaria Lisboa e do Porto. E sem pessoas não uma ideia idêntica com bons olhos. processos e ligar de Estado para a há empresas, serviços ou comércio. “Estamos disponíveis para falarmos áreas como a Transição Digital e, em soluções para aumentarmos a saúde, turismo e quando se fala do “Só com inovação conseguimos ti- atratividade do concelho e analisar indústria. Quando interior, a questão rar o potencial socioeconómico que uma proposta destas, se houver um visitamos os centros da banda larga existe nos recursos endógenos. E parceiro que queira investir.” E o pro- mais tecnológicos é logo início criar riqueza com eles”, explica Isa- fessor Eduardo Castro dá o exemplo do Algarve vemos de conversa. bel Ferreira. Também estes recursos da tecnológica francesa Altran, que a preocupação da Aceitaria o convite devem ser valorizados pelo digital. empregou mais de 400 engenheiros interação do digital para a Secretaria “A questão da banda larga, do teletra- no Fundão, como fundamental pa- com o turismo, de Estado da balho e deslocalização dos serviços ra estancar o declínio populacional em Bragança e Vila Valorização públicos está diagnosticada no plano da região após a falência da indústria Real com o setor do Interior se de valorização do interior”, continua a têxtil. agroalimentar, no tivesse de sair de governante. Em cima da mesa está ain- Alto Tâmega com Bragança? da o incentivo ao teletrabalho na fun- Em Skibbereen, como em Ser- a questão da água, ção pública, uma medida que poderá pa, Bragança e Fundão, não há filas e no Alentejo com Aceitei o convite ajudar a quebrar parte deste círculo de trânsito, almoços apressados ou a saúde. sem ter qualquer vicioso. Projetos como o Serpa Wire- rendas exageradas. E quando está em Mas o digital, garantia de que less, que leva Internet sem fios gratuita Friestas, no Alto Minho, Gonçalo Du- por si só, não a Secretaria de a vários locais da cidade e aldeias do rães garante que a sua qualidade de convence as Estado ficaria concelho alentejano, ajudam a com- vida aumenta “exponencialmente”. pessoas a viverem em Bragança. bater a exclusão digital e a encurtar as “Não há trânsito nem problemas para no interior. Do ponto de vista distâncias entre o mundo rural e a tec- estacionar. O nível de stress é muito simbólico é muito nologia. E são a prova de que, num país menor e o tempo rende mais, não há É importante importante estar a duas velocidades, muitos autarcas do pressa para nada”, garante. Por isso, aumentar a em Bragança, como interior continuam a lutar pelos seus regressar às rotinas da cidade é cada qualidade de vida poderia estar em concelhos. “Vamos aproveitar a trans- vez mais difícil. “O ritmo é completa- das pessoas, o qualquer localidade formação digital para potenciar a cap- mente diferente e voltar requer uma acesso aos serviços, do interior. tação de investimento e de talentos”, grande capacidade de ajuste. Tudo o internamento ou Mas Bragança é a confessa Hernâni Dias. A autarquia é mais intenso: as luzes, o barulho, cuidados médicos capital de distrito transmontana está a trabalhar com o trânsito e as pessoas”, conclui. à distância. E há mais longe de exemplos destes em Lisboa, por isso fica todo o país. Temos bem aqui. de olhar para estes

A Os nossos valores 01 20 Tecnologia Podemos confiar nos 01110nossos 01 Os deepfakes, vídeos falsos 0 nos quais as pessoas dizem coisas que, na realidade, nunca proferiram, estão a ganhar terreno. Os culpados? Algoritmos complexos que adulteram imagens e sons de uma maneira tão perfeita que já não distinguimos a realidade da ficção. Como podemos resistir a este jogo de espelhos dos tempos modernos? Texto JOÃO VALENTE montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Os nossos valores A 21 Tecnologia “G ood evening, áudio através de sistemas de Inteli- Em 2018, um my fellow Ame- gência Artificial, de maneira a vermos algoritmo analisou ricans.” É des- e ouvirmos pessoas a dizerem coi- cada trejeito da te modo que sas que, na verdade, nunca disseram. boca, textura Richard Ni- Como este mecanismo se autocorrige da pele e voz de e está sempre a aprender, o resultado xon, presidente dos Estados Unidos entre 1969 e 1974, começa um dos Obama e colocou-odeepfakes mais partilhados dos últi- a dizer coisasmos meses. Este discurso, escrito em inimagináveis1969 para a eventualidade de a tripu- final é tão preciso que as imagens ou sons criados parecem reais. E se, em vez de nos alertar para o problema, a equipa do MIT res- tecnológica. Juntou um conjunto de tecnologias que já existia, mas que é cada vez mais perfeito e indetetá- vel”, explica Bruno Golias, diretor da produtora de vídeo Buggin Media. O produtor dá o exemplo do vídeo em que o ator e cineasta Jordan Peel ? coloca Barack Obama a dizer coisas inimagináveis para um presidente norte-americano, incluindo frases ofensivas e calão. “Especialistas ali- mentaram um algoritmo com horas de filmagens de Obama. Este algoritmo 0 analisoucadatrejeitodaboca,textu- ra da pele, sons produzidos e, na pos- se de toda esta informação, reduziu 01lação da Apolo 11 não conseguir re- ponsável pela recriação de Nixon o desvio-padrão, ou seja, o erro, ao gressar da lua, nunca foi proferido nos quisesse enganar usando polí- pelo então presidente norte-ame- ticos e imagens de agora? “Há um 01menor possível”, explica o produtor. ricano. No entanto, uma equipa do medo real de que as próximas elei- Há outros exemplos menos preo- MIT (Massachusetts Institute of ções para a presidência dos Esta- cupantes. Peter Cushing deu corpo Technology) quis mostrar o poder dos dos Unidos sejam ensombradas à personagem Grand Moff Tark no deepfakes e montou o cenário per- por um episódio deste tipo”, expli- filme Rogue One, da saga Star Wars. feito, partilhando-o pelas várias re- ca Manuel Lopes Rocha, partner da O filme é de 2016 e Cushing morreu des sociais. No vídeo de 47 segundos, PLMJ e especialista nestas matérias. em 1994. Com recurso a técnicas de criado através de técnicas compu- animação gráfica e a autorização tacionais avançadas, Richard Nixon Novas técnicas, velhos problemas da família, os produtores fizeram- discursa a partir da Sala Oval. No ví- Não foi preciso chegar a 2020 para -no regressar ao ecrã. “De um modo deo, tudo é perfeito: a baixa qualida- que a alteração de imagens ou sons legal”, sublinha Manuel Lopes Rocha. de da transmissão, típica da década fosse utilizada para atingir certos de 1960, o som, a voz e os tiques de meios (ver caixa). No entanto, o aper- 10“O deepfake, por si só, não é um cri- Nixon. feiçoamento da tecnologia torna esta O termo deepfake designa a ma- manipulação mais perigosa que nun- me. O seu uso malévolo é que é”, re- nipulação de ficheiros de vídeo e de ca. “O deepfake não é uma novidade força. Segundo João Simas, service de- signer que, na sua vida profissional, analisa e antecipa a utilização que as pessoas fazem da Internet, esta ameaça não é maior do que outras que a era da informação trouxe. “Fa- lo da desvalorização da privacidade, I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 22 Tecnologia a ausência de critérios analíticos PLMJ. Qual a solução possível? In- R Vinte e cinco anos após para selecionar informação e a ex- vestir na identificação prévia de dee- a sua morte, e com a ajuda posição simultânea e permanente a pfakes, ainda que esta seja uma tarefa da tecnologia deepfake, notícias, publicidade ou burlas”, con- difícil. “Quantas pessoas distinguem o ex-presidente Richard fessa. O problema é que os bancos de uma imagem 4K de uma imagem 2K? Nixon voltou aos ecrãs dados de sons e imagens cresceram Os deepfakes são feitos com um das televisões com uma exponencialmente e têm milhares grau de precisão altíssimo. Hoje, declaração que nunca de milhões de pormenores. Ao mes- estes vídeos ainda são estáticos. Só proferiu em vida mo tempo, a Inteligência Artificial vemos caras a falarem. Os cenários que permite esta manipulação es- são homogéneos e sem movimento. tucional, mesmo quando estas se as- tá cada vez mais precisa e potente. O corpo não mexe e os planos são semelham ao resto do jornal. “Como Maria João Silva, designer emigra- apertados. Mas a capacidade de pro- consumidores, devemos ser exigen- da em Inglaterra há uma dezena de duzir realidades falsas será cada vez tes com a informação. Perguntar o co- anos, acredita que os deepfakes são maior”, argumenta Bruno Golias. mo e o porquê. Isso foi-me estimulado os mexericos dos tempos modernos. desde pequena e acredito que muita Há quem defenda que as redes so- gente foi assim educada. Por isso não “Estamos numa época pop-up ciais devem avisar que determina- compreendo a dormência e a falta de em que não há interesse em obter do vídeo é deepfake. De certo modo, apetite pelo saber em que a socieda- uma informação completa. E mas- uma atitude similar à imprensa que de caiu. Não compreendo, mas acho caramos esse desinteresse com a assinala páginas de publicidade insti- preocupante”, frisa Maria João Silva. desculpa de que não temos tempo. Para João Simas, os deepfakes serão Tudo é assimilado sem questionar”, eficazes para quem não tenha capa- refere. Um deepfake pode ajudar a cidade crítica e analítica, seja crédu- definir o vencedor de uma eleição lo e dependente de canais de vídeo. ou a quebrar o elo de confiança en- “Ter consciência crítica é útil perante tre o público e uma figura pública. quem nos quer deliberadamente en- “Os danos são sempre imediatos e ganar, mas também para quem nos brutais”, afirma Manuel Lopes Rocha. quer ajudar. Melhoramos a resposta Mesmo que, a posteriori, os vídeos que procuramos mas, principalmente, sejam retirados do espaço online, as perguntas que fazemos”, conclui o o que é quase impossível, e os culpa- service designer. “Os heróis dos nossos dos condenados. “Dificilmente essa dias são pessoas de carne e osso”, diria decisão será tomada com a rapidez Richard Nixon caso a Apolo 11 não con- necessária”, salienta o partner da seguisse regressar à Terra. Estaria lon- ge de sonhar que a sua morte física não O maior deepfake do século xx evitaria que alguns conjuntos biná- rios de códigos o fizessem regressar Manipular a informação que se tratava de uma modo como este enganou aos ecrãs. nunca saiu de moda e não obra de ficção, muitos o público. Na sequência é preciso uma montanha ouvintes falharam esta do episódio, a FCC, de inovação tecnológica explicação. O facto de a entidade que regula as para descobrir o maior narração ser interrompida comunicações nos Estados deepfake dos últimos por boletins noticiosos Unidos, adotou a Lei 100 anos. No dia sobre a invasão, assim contra as Brincadeiras, 30 de outubro de 1938, como os efeitos sonoros que proíbe as emissoras Orson Welles simulou reais, confundiu muitas de transmitirem qualquer uma invasão alienígena pessoas. De tal modo que, conteúdo que possa inspirada no romance nas semanas seguintes, enganar o público e as A Guerra dos Mundos, de vários jornais e figuras várias autoridades norte- H. G. Wells. Apesar de a públicas insurgiram-se -americanas de saúde emissão afirmar, no início, contra Orson Welles e o e segurança. montepio I N V E R N O 2 0 2 0

AComo é que o deepfake nos pode afetar Os nossos valores 23 e o que pode ser feito para o combater? Tecnologia “É fundamental Inês Coré garantir que Advogada na PLMJ as novas gerações não estagnam “O deepfake já é utilizado para praticar intelectualmente” crimes” “OS DEEPFAKES são “A palavra deepfake resulta pode implicar a violação de direitos, prejudiciais numa da junção de outras nomeadamente do direito à imagem. extensão que ainda não duas expressões: deep Noutras circunstâncias, pode conseguimos precisar, mas que é flagrantemente learning, que corresponde a um tipo mesmo envolver a prática de ilícitos evidente. Se há determinada premissa que de Inteligência Artificial, e fake, criminais. E já há exemplos reais. é apenas aceite, sem que a questionemos, a produção de conteúdo Recentemente, uma empresa inglesa temos um problema. E pode tornar-se numa falso que caracteriza esta tecnologia. foi objeto de uma burla através de arma de arremesso contra alvos predeterminados. Juntamente com as fake news, um telefonema que imitou a voz do A solução, como na maioria dos problemas o deepfake tem contribuído para CEO da empresa-mãe com recurso a sociais, passa pela educação e estímulo do o fenómeno da desinformação tecnologia deepfake de manipulação pensamento inquisitivo. Temos de saber encontrar criando, também, problemas do de voz. um fio condutor entre a informação recebida ponto de vista legal. Ainda que a Tudo isto mostra como os deepfakes e a sua fonte. Se não encontrarmos este criação de vídeos com recurso a podem afetar-nos no dia a dia. fio condutor há que desconfiar. É preciso tecnologia deepfake não seja um No entanto, a solução será sempre saber a diferença entre um facto e teoria, crime previsto como tal na lei, esta encontrarmos um conjunto de um facto e uma estória, um facto e uma lenda. já é utilizada para praticar crimes. soluções técnicas, políticas e legais Por vezes, podem parecer a mesma coisa, A utilização da imagem e voz de e de sensibilização pública que mas quase sempre não o são. E, sobretudo, alguém, sem o seu consentimento, anulam o seu carácter nocivo.” é fundamental garantir que as novas gerações “Não sabemos quem escreve a peça” não estagnam intelectualmente e se José Adelino “Quando o mundo era a preto uma simples transição para satisfazem a repetir Maltez e branco e todos os crentes, a democracia. Agora, não. slogans pré-fabricados. Professor ou contra-crentes, sabiam Depois das fakenews que É preciso habituarmo-nos catedrático situar, nas notícias, fizeram o Trump e o Bolsonaro, a pensar. Sempre.” do ISCSP o bem e o mal, isto é, o amigo desconfiamos que há ocultos – Universidade e o inimigo, vivíamos felizes, autores de uma história que Maria João Silva de Lisboa sabendo explicar o futuro às chegou a nova encruzilhada. Designer criancinhas dos consumidores Com deepfakes que manipulam mediáticos. Já sabíamos que o próprio boneco em que cada o poder era um cenário e até um finge ser cidadão de uma que a democracia se assumia multidão solitária. Ainda haverá como uma teatrocracia, com mais cenografia, mas não muitos pontos marcando o sabemos quem escreve a peça. ritmo. Já então havia uma Apenas temos uma certeza: personalização do poder não é a interpretação da em meia dúzia de atores que história que faz o homem, representavam uma peça, mas o homem que faz a dita filosofia da história, história. Mesmo sem saber fosse uma revolução ou que história vai fazendo.” I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 24 Entrevista José de Guimarães Artista Plástico Se a arte não ajudar a curar o mundo não tem grande importância Fascinado por culturas exóticas, José de Guimarães viu nas diferentes realidades do globo a inspiração para uma vida e obra que, aos 80 anos, está mais pertinente e atual que nunca. No seu trabalho, os vestígios dessas viagens coabitam com a constante procura pela transculturalidade e alteridade. José de Guimarães vive para a arte ou será a arte que vive em si? Texto SARA BATISTA | fotografia BRUNO BARATA A arte de José de Guimarães pa- boa. O que foi muito importante, por- rece não ter fim. Com 80 anos que não tinha bases artísticas e acabei e mais de 60 de carreira, o ar- por ir parar à Sociedade Corporativa de tista plástico continua ávido de ideias Gravadores Portugueses. e projetos. Saiba o que o faz continuar Já havia a vontade de fazer da arte a a criar, mas também as euforias e la- sua vida? mentos de uma vida rica em experiên- Durante os sete anos do curso de Enge- cias artísticas. nharia Civil comecei a pintar e a dar os primeiros passos nas artes. Depois fui Nasceu em 1939, em Guimarães. Como para África e aí o meu interesse para as é que, nessa época, um artista cresce artes foi radical. Despertar para a cul- fora de Lisboa? tura africana permitiu apropriar-me de Sempre me interessei com o que via à uma série de meios de expressão que volta. Em criança, um dos meus inte- os africanos utilizavam. resses era mexer na terra para encon- Foi nessa altura que se deu o fascínio trar algum artefacto, mas também a pelas formas? arte sacra do Museu Alberto Sampaio. À medida que fui conhecendo novos Fiz o 5.º ano em Guimarães, fui estudar mundos fui construindo outros alfabe- para Braga no 6.º ano e depois para Lis- tos: são símbolos meus mas que nas- montepio I N V E R N O 2 0 2 0

ceram a partir de elementos da cultura africana e que passei a introduzir na pintura. Acaba por haver uma tentativa de osmose. Embora continue a ser eu- ropeu, tenho usado outra cultura para ajudar na compreensão desta relação. Acha que o compreendem? As pessoas que conhecem o meu tra- balho começam a perceber, hoje, que algo de fora entrou na minha obra. É possível que sejam os ocidentais, e não os africanos, a quererem com- preendê-lo. No entanto, nunca se sa- be se o objetivo é alcançado. Isto, no fundo, é ir inventando coisas para ver se se acerta. Qual a importância do espaço no pro- cesso criativo? Um atelier é uma oficina onde vamos pondo em prática as ideias que vão sur- gindo. As ideias surgem nos momen- tos mais inesperados e é importante podermos registá-las. Depois tenho que as aprofundar e ver se são fazíveis. É importante ter um atelier onde se re- solvem os problemas técnicos mas, depois de um certo desenvolvimento profissional, as coisas conseguem rea- lizar-se independentemente do local. No entanto, há um aspeto curioso: durante muitos anos tive um peque- no atelier, na Baixa, e quando mudei para este, que é muito mais espaçoso, Viagem aos mundos de José José de Guimarães Respondendo à sempre se mostrou uma curiosidade, José pessoa curiosa. Primeiro, tem seguido de perto pela cidade que o viu fenómenos como a nascer (Guimarães), questão dos migrantes onde descobriu o fascínio e dos naufrágios no pela arqueologia e a Mediterrâneo, e até arte sacra. Depois, pelo a guerra do Iraque. mundo que o rodeava. Esta reflexão pode Nos seus 80 anos de vida, ver-se na exposição viajou muito. Do Ocidente “Volta ao Mundo”, na ao Oriente, passando Biblioteca Nacional de por África e América Portugal, em Lisboa. Latina, descobriu formas Uma retrospetiva da e linguagens, das quais sua obra gráfica, numa se apropriou para, numa seleção de gravuras tentativa contínua, produzidas desde os anos e nunca esgotada, 60 até ao final de 2018. compreender esta Uma viagem aos vários relação transcultural. mundos de José. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 26 Entrevista as obras também ganharam uma di- Uma obra de arte Então pode dizer-se que a arte coman- mensão muito grande. cumpre a sua da a sua vida? O que move a sua inspiração? missão quando sai Sim, não tenha dúvida. Eu vivo para Sempre observei o mundo que me ro- e passa a ser vista a arte e a arte envolve-me. deava e ainda hoje o faço. Ao longo de pelo público. Já destruiu alguma peça? mais de 60 anos de trabalho tenho se- O artista tem de Não. Há peças que demoram mais tem- guido fenómenos como a questão dos a deixar sair po a acabar – tenho algumas que es- migrantes e dos naufrágios no Mediter- tão encostadas à parede há muito tem- râneo ou a guerra do Iraque. Vou enri- sição do olhar de quem quer. po. Mas, normalmente, chego ao fim. quecendo o meu repertório com o que Acha que devia haver mais? As peças são feitas em determinada acho importante fazer notar. Sim. Antigamente, a lei dos edifícios época, momento, vamos evoluindo e o Esse é o propósito da arte? públicos dizia que uma percentagem que se faz hoje não é aquilo que se fez Se a arte não ajudar a curar o mundo do valor da obra, creio que 2%, devia há 10 anos. Não renego aquilo que fiz. não tem grande importância, é uma ser destinada à arte. Isso ou acabou ou As obras devem estar nos museus ou coisa frívola. Temas não me faltam... não é cumprido. Se não tivesse havido em casa das pessoas? claro que as viagens fazem sempre essa quebra tínhamos hoje, em Lisboa Isso é muito aleatório. Mas há uma coi- com que me debruce sobre a cultura e noutras cidades do país, obras de arte sa curiosa: as obras de arte têm vida da zona onde vou, como é o caso do Mé- pública realizadas por artistas. Era uma própria, um dia aparecem. E isso tem- xico ou, mais recentemente, da Ásia. coisa muito importante. -me acontecido: às vezes quero mos- Vou gerindo o meu projeto artístico Nuno Faria, diretor artístico do Cen- trar determinada obra e não sei quem envolvendo-me com outras culturas. tro Internacional das Artes José de é o proprietário e um dia ela aparece Como explica o facto de ter mais Guimarães, disse que a sua obra re- numa exposição, num leilão... as obras sucesso lá fora do que em Portugal? sulta numa procura pela “transcul- de arte têm uma vida própria, as pes- Quando comecei uma carreira artística turalidade”. Revê-se nestas palavras? soas não as destroem. com uma certa profundidade lembro- É mais alteridade que transcultura- Tem alguma obra que nunca venderá? -me de ter perguntado ao Manuel de lidade. Sou bastante ávido das cul- É possível. Há conjuntos de obras que Brito, da Galeria 111, como fazia para a turas exóticas, que são importantes gostava de ter. Por outro lado, acho que minha obra ser conhecida. E ele disse: e alimentam o meu ato criativo. uma obra de arte cumpre a sua mis- “Só tem uma hipótese – é sair! Se não Alguma vez sentiu vontade de parar são quando sai e passa a ser vista pe- sai, aqui morre em pouco tempo.” No de pintar? lo público e, portanto, o artista tem de fundo, foi esse grande ensinamento Nunca tive esse vazio. Pelo contrário, a deixar sair. que fez com que, desde muito cedo, ti- continuo com uma série de projetos vesse conseguido levar a obra para fora. e ideias. Falta-me é tempo. Acontecendo isso, alguma vez ponde- rou não voltar a Portugal? Estas coisas são sempre muito aleató- rias. Há 25 anos instalei-me em Paris, mas andava sempre lá e cá. Realizou- -se esse processo de exportar a obra, mas mantendo uma base em Lisboa. Tem néons na estação de Metro de Carnide. Qual a importância da arte pública? É uma maneira bastante democrática de o público ter acesso a obras que nor- malmente estão em museus. Durante uns breves segundos as pessoas pas- sam numa zona com arte. É importante que as obras públicas estejam à dispo- montepio I N V E R N O 2 0 2 0

E se fôssemos Os nossos valores A 27 todos vegetarianos? Alimentação Há cada vez mais vegetarianos no Planeta. Em Portugal, o número de pessoas que não come carne ou peixe aumentou quatro vezes entre 2007 e 2017, para os atuais 120 mil vegetarianos. No futuro, o aumento do vegetarianismo obrigará ao ajustamento da produção global de alimentos e ao redobramento dos cuidados a ter nas dietas alimentares. Até onde chegará esta nova tendência e como alterará o cenário económico e social em Portugal? Texto ANA CATARINA ANDRÉ fotografia ARTUR N o início era uma ques- máticas. “Comecei a participar nas tão de saúde. Em 2015, greves pelo clima e envolvi-me na quando Daniela Fer- organização de algumas manifesta- reira descobriu ser ções”, continua Daniela, que pertence intolerante à lactose ao movimento ambientalista Climate e ter sensibilidade ao glúten, deixou Save Portugal. de ingerir leite e derivados, pão e bola- chas. Também pôs de parte o fiambre e a carne e, aos poucos, foi diminuin- do o consumo de peixe. “Lembro-me que o atum e os ovos foram as últimas coisas que retirei da minha alimenta- ção, antes de me ter tornado vegan, em 2017”, conta a jovem de 26 anos. À medida que mudava a dieta para os hortícolas, leguminosas e frutas, Daniela ficou mais desperta para a necessidade urgente de preservar o Planeta e combater as alterações cli- I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 28 Alimentação Em Portugal, 1,2% da população não consome carne ou peixe. No total, 120 mil pessoas seguem uma dieta sem produtos de origem animal A jovem da Nazaré não está sozinha. Entre 2007 e 2017, o número de vege- tarianos quadruplicou em Portugal. Hoje, 1,2% da população portuguesa não consome carne ou peixe, segun- do um estudo da consultora AC Niel- sen para o Centro Vegetariano – Asso- ciação Ambiental para a Promoção do Vegetarianismo. São 120 mil pessoas a seguirem uma dieta alimentar ba- seada em frutas, hortícolas ou legu- minosas. Ainda estamos longe de assumir estes números como uma revolução alimentar, mas existem sinais sóli- dos que a nossa alimentação está a mudar. Basta, por exemplo, percor- rer os supermercados portugueses. A cadeia Auchan afirma que, nos úl- timos dois anos, a procura por pro- dutos vegetarianos aumentou 20%. E o Continente, uma das duas maiores cadeias de supermercados do país, estima que 25% das vendas da área Bio&Saudável se destinam ao públi- co vegetariano. Qualquer que seja o argumento em questão, desde a preocupação com uma vida saudável à consciência e vontade de contribuir para um pla- neta mais sustentável, é provável que o número de vegetarianos suba nos próximos anos. Mas o que represen- tará a redução do consumo de carne e peixe para o ambiente, a economia e a coesão social? “É imperativo desenvolver um conjunto de instrumentos que nos montepio I N V E R N O 2 0 2 0

AOs nossos valores 29 Alimentação QReconhecidas pelas propriedades nutricionais, as algas ganham terreno na alimentação mundial Do National “Nos próximos 50 anos a pesca Geographic para selvagem desaparecerá. Haverá a nossa mesa uma aceitação generalizada das espécies de aquacultura” A inclusão de insetos e algas na alimentação mundial é inevitável. Paula Dias Segundo Paula Dias, professora Professora do Mestrado em Alimentação da Faculdade do Mestrado em Alimentação de Letras da Universidade de Coimbra da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, nos permita fazer uma transição para A fragilidade ambiental do setor ali- próximos anos recorreremos um sistema alimentar mais saudável mentar estende-se a outras fases da a novos alimentos. As algas, e sustentável”, sublinha Francisco cadeia. “O transporte dos alimentos cada vez mais em voga pelas Sarmento, responsável pela delega- implica, em muitos casos, uma rede suas propriedades nutricionais, ção da FAO (Organização para a Ali- continuada de frio e, consequente- e os insetos, que são “ricos em mentação e Agricultura) em Portugal. mente, um aumento das emissões”, proteínas”, estão na linha da frente. continua o especialista. Por outro la- O modo como trazemos alimentos O setor agrícola global, e em parti- do, quando colocamos restos de co- para a nossa mesa também irá cular o sistema de produção de carne mida no lixo, muitos destes “vão pa- alterar-se. “Nos próximos 50 anos e de produtos lácteos, é responsável rar a lixeiras não controladas, onde a pesca selvagem desaparecerá, por um quinto das emissões de dió- acabam por criar bolsas de metano, uma vez que é altamente lesiva xido de carbono e gases equivalentes entrando em combustão”. É urgente, para o ambiente. Haverá uma (20%). De acordo com os dados com- portanto, redefinir escolhas. “Deve- aceitação generalizada das pilados pela Associação Portuguesa mos preferir o que é biológico, local e espécies de aquacultura”, de Nutrição, entre os produtos mais sazonal”, afirma Pedro Martins Bara- considera. Isto não significa, poluentes estão a carne e seus deriva- ta, que é CEO da GET2C, empresa que porém, que retiremos produtos dos (12,4%) e os lacticínios (5,1%). A lis- atua na área das alterações climáti- da nossa cadeia alimentar. “Uma ta dos alimentos com maior impacto, cas, energia e mercados de carbono. vez introduzidos, os alimentos porém, é encabeçada pelo chocolate. não desaparecem. Podem é Segue-se a vaca, o porco e o queijo. O problema extravasa o domínio extinguir-se. O atum selvagem, ambiental. “A agricultura intensiva por exemplo, está a desaparecer “Existe um elevado gasto de ener- que hoje utilizamos dá origem a ali- e pode ser um desses casos. Ou gia e de água associados à agricul- mentos ricos em calorias, mas pobres até mudar de estatuto, como tura intensiva, assim como o uso de do ponto de vista nutricional, muitos aconteceu com a castanha, que compostos químicos que desgastam dos quais associados a doenças co- era uma alternativa para os mais e contaminam os solos. E inquinam mo a hipertensão, a diabetes tipo 2 pobres que não podiam comer pão os lençóis de água, os mares e ocea- e alguns cancros”, garante Francis- de trigo e que hoje é um produto nos,” acrescenta Pedro Martins Bara- co Sarmento. Quando, em 2050, o nobre.” As diferenças de consumo ta, especialista em avaliação e política Planeta albergar 9,7 mil milhões de alimentar entre as classes mais ambiental. ricas e as mais pobres, mas também entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, manter-se-ão, prevê a investigadora. “No mundo desenvolvido, o consumo de carne tenderá a diminuir por uma questão ambiental, mas haverá uma elite que recorrerá a superalimentos, como o abacate ou a quinoa, ainda que tenham uma pegada ecológica elevada”, conclui Paula Dias. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 30 Alimentação habitantes – mais 2 mil milhões que “Devemos preferir o que hoje – teremos necessidade de pro- é biológico, local e sazonal” duzir mais alimentos. Ainda assim, Francisco Sarmento olha com cuida- Pedro Martins Barata do para as projeções mais extremas. CEO da GET2C “Muitas partem de premissas que não sabemos se irão realizar-se. Basta, juntam-se também consequências gurará o sistema agrícola português. por exemplo, que consideremos que para a saúde – o consumo excessivo “Acentuar-se-ão as tendências, já ob- um chinês terá o mesmo padrão de de carne está associado a doenças servadas, de perda de competitivi- consumo que um alemão.” Até por- cardiovasculares e oncológicas. dade da produção pecuária intensi- que, conclui o responsável da FAO, va de pequena e média escala e da hoje produzimos “uma quantidade No meio dos extremos, está a vir- produção de cereais destinados à de alimentos duas vezes superior às tude. Pedro Graça, diretor da Facul- alimentação animal”, antevê Lívia necessidades existentes”. A redução dade de Ciências da Nutrição e Ali- Madureira, investigadora da Univer- do desperdício alimentar, uma das mentação, da Universidade do Porto, sidade de Trás-os-Montes e Alto Dou- batalhas mais recentes dos governos diz que é preciso regressar à tradição ro. “É expectável que se acentuem e empresas da área da distribuição alimentar mediterrânica. “Não creio as tendências de reconversão, em alimentar, contribuirá também para que tenhamos de deixar de comer particular no caso de Portugal, para um sistema mais saudável. carne. Temos é de reduzir a quanti- culturas vegetais, como hortícolas dade. Uma pequena porção por sema- e frutas, olival e vinha”, diz. Haverá “A cada segundo desperdiçamos o na – quatro a cinco refeições de carne ainda “uma aposta crescente nas se- equivalente a seis camiões de lixo de ou peixe – é suficiente”, diz o antigo mentes (chia, goji), nos frutos (frutos comida”, diz Maria do Rosário Palha, diretor do Programa Nacional para a vermelhos e abacate) e nas legumi- responsável pela Food Initiative, um Promoção da Alimentação Saudável. nosas (soja para consumo humano projeto da Fundação Ellen MacArthur. “É preciso também considerar que e grão-de-bico). Será no equilíbrio do consumo per ca- o impacto das diferentes espécies é pita, e não na produção exacerbada de distinto. O gado bovino tem uma pe- Menos consumo de carne, mais alimentos, que está a chave para um gada ecológica superior ao frango ou cereais, hortícolas e frutas. Se o fu- sistema mais sustentável. Para todos: ao peru.” turo trará uma alimentação que nos economia, ambiente e qualidade de faz regressar ao padrão existente no vida dos cidadãos. A redução anunciada do consumo tempo dos nossos antepassados, o de carne, aliada ao boom da carne que aconteceria, então, se fôssemos Carne: um inimigo a abater? desenvolvida em laboratório, reconfi- Em janeiro, a Universidade de Coim- bra deixou de vender carne de vaca nas cantinas para estudantes. Objeti- vo? Diminuir a maior fonte de CO2 que existe na produção de carne, segundo o reitor da instituição, Amílcar Falcão. É no consumo de carne, aliás, que está grande parte do debate da indústria alimentar. Motivos não faltam. Por um lado, a indústria agropecuária es- gota recursos escassos, como a água e o solo. Por outro, obriga a elevadas emissões de gases com efeito de es- tufa, uma vez que o sistema digestivo das vacas, ovelhas e porcos é respon- sável pela produção de metano em grande quantidade. A estes efeitos montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Q Jamie Oliver é A 31 um dos chefs que mais influencia as tendências alimentares S A dieta vegan exige conhecimentos nutricionais específicos Os chefs Se toda a população vel”. “Os alimentos de origem animal influenciam o que fosse vegetariana contêm mais nutrientes por caloria comemos? haveriam vantagens do que muitos alimentos de origem a nível ambiental vegetal. Os casos de desnutrição pro- Nos últimos anos, os redes sociais, de e uma menor vavelmente aumentariam, pelo que chefs tornaram-se dicas, receitas e até mortalidade por o vegetarianismo à escala global po- figuras públicas. planos alimentares doenças crónicas deria gerar uma crise de saúde pú- Nomes como José sem qualquer blica, especialmente nos países em Avillez, Henrique Sá fundamentação todos vegetarianos? “Alguns estudos desenvolvimento”, frisa. Uma crise Pessoa, Justa Nobre científica. “É muito simularam um cenário em que to- que teria como rastilho a desinfor- e Ljubomir Stanisic, comum ver uma dos nos tornaríamos vegetarianos e mação relativa às dietas celebrizadas em Portugal, pessoa eliminar efetivamente, a nível ambiental, tra- pela ausência de produtos de origem e os britânicos determinados ria vantagens. Observaríamos uma animal. “A dieta vegan exige conhe- Jamie Oliver e alimentos da sua redução significativa na emissão de cimentos nutricionais específicos Gordon Ramsey, à alimentação, como gases com efeito de estufa e um au- e, como qualquer outro padrão ali- escala global, são o leite, mento dos terrenos agrícolas que po- mentar, se for mal planeado pode ser presença ativa na os seus derivados deriam ser usados para refloresta- inadequado e prejudicial à saúde”, televisões e redes e os produtos ção”, relata a nutricionista Mariana conclui a especialista. sociais, tornando-se com glúten, ou a Linan Pinto. verdadeiras estrelas inclusão de outros, Foi precisamente para ter a certe- do entretenimento. como o óleo de Outros benefícios? Uma menor za de que estava a fazer escolhas cor- Mas será que coco e o abacate. mortalidade associada a algumas retas que Daniela Ferreira procurou as suas receitas São decisões não doenças crónicas. Mas há um con- um médico, nos primeiros tempos. influenciarão o fundamentadas e traponto económico que é difícil de “Tirei algumas dúvidas. Fiz várias que comemos? com base nas redes ultrapassar. “Teríamos um grave pro- análises e exames e, de forma gené- “As pessoas que sociais”, considera blema a nível económico, com a re- rica, estava bem”, diz. Ainda assim, veem programas a nutricionista dução drástica de postos de trabalho e durante algum tempo, tomou vita- de gastronomia Mariana que lidam com o setor animal e, as- mina B12 por precaução. Tudo para com chefs famosos Linan Pinto. sim, um aumento da pobreza.” ter a certeza de que a dieta vegetaria- não experimentam Quer alterar a na estava, de facto, a contribuir para os seus pratos na sua alimentação? A especialista, que é assistente que se tornasse mais saudável. Um cozinha. É uma Segundo a convidada na Faculdade de Medici- exemplo, também, para os milhares moda que, como nutricionista, na da Universidade de Lisboa, consi- de portugueses que, nos próximos todas, terá um fim”, deve procurar dera mesmo que a generalização do anos, abraçarão este estilo de vida. afirma Paula Dias, profissionais vegetarianismo seria “pouco exequí- que acrescenta de saúde que muitos destes especializados e profissionais que, caso a caso, cometem erros contribuam para a de preparação do saúde e bem-estar prato e combinação dos pacientes. de sabores. O seu corpo, mas Mais problemática também a sua é a partilha, no saúde futura, Instagram e outras agradecer-lhe-ão. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 32 Sociedade Muda que muda Um músico empreendedor, um engenheiro escritor, uma jornalista empresária e uma família viajante explicam como se muda de vida de um dia para o outro. Texto SARA BATISTA, CARLOS MARTINHO fotografia ARTUR montepio I N V E R N O 2 0 2 0

A segunda vida de João 33 Coração Daniel de Castro Ruivo “Ainda penso “P odes bateria ou baixo; muitas vezes, tratar- continua a criar ao e com alguma -me por ritmo alucinante que tu?” Daniel de Castro o levou a compor 30 mágoa, na Ruivo é cofundador da músicas em mês e decisão de não startup portuguesa meio, entre agosto e Altar.io e dono de um setembro de 2008; estar a fazer tom de voz melódico e monta projetos música” e colocado. O mesmo com a diligência que usou, com o alter com que, em 2008, ego João Coração, pegou em dezenas para lançar dois de instrumentos, álbuns de originais colocou-os numa casa entre dezembro de em frente ao mar, em 2008 e junho Sesimbra, e convidou de 2009: Nº 1 Sessão amigos para gravar de Cezimbra e Muda um disco em dois que Muda. dias. Foi assim que O título do segundo nasceu, por exemplo, álbum seria profético. o álbum Nº 1 Sessão de Apesar das críticas Cezimbra. positivas, dos Na Altar, Daniel ajuda artigos nos jornais instituições bancárias e dos concertos internacionais esgotados, João a tirarem partido Coração hibernou da tecnologia para na última década e decidirem aprovações Daniel virou-se para de crédito à habitação o empreendedorismo: ou avaliarem os fundou sete empresas, riscos de crédito para a última das quais, negócios retalhistas. a Altar.io, de dimensão A nova vida, porém, internacional. não o afastou “Depois de Muda que completamente da Muda fiz uma série música. Continua a de concertos, mas compor – “músicas, cheguei a um ponto não canções” –, fala em que queria ter uma do próximo disco família. Vi o percurso como se já fosse de muitos músicos uma realidade – em Portugal e percebi “vou gravá-lo mais que, salvo raríssimas polido” – e elogia o exceções, vivem com trabalho dos amigos muito pouco dinheiro. que se mantiveram Ou fazem dinheiro na indústria hipotecando a sua discográfica: Luís alma, criando música Severo, Manuel Fúria, que não respeita a Samuel Úria, Tiago sua verdade, mas que Guillul, Jorge Cruz, dá dinheiro. Estava a B Fachada ou Filipe correr bem, mas sabia Sambado. que não ia ser sempre “Ainda penso muitas assim”, comenta. vezes, e com alguma No mundo mágoa, na decisão empresarial, Daniel de não estar a fazer aplicou a receita música. É a coisa que com que tomou a mais gosto de fazer música portuguesa de na vida”, desabafa. assalto: aprendeu a Quando regressar, programar sozinho da João Coração terá mesma maneira que duas novas ouvintes. se tornou autodidata Será que vão gostar em guitarra, piano, da música do pai?

A Os nossos valores O engenheiro escritor 34 Sociedade João Ricardo Pedro “Passei o ensino João Ricardo foi ganhando forma. secundário Pedro tinha 36 Depois de escrever sem ler um anos e uma mais de 1 000 páginas, livro” carreira na área da chegou a hora da engenharia quando, verdade: passou montepio I N V E R N O 2 0 2 0 em 2009, foi despedido. três meses a limar Estávamos no pico da as arestas de O Teu crise e João, licenciado Rosto Será o Último, em Engenharia o romance que, Eletrotécnica pelo a 18 de outubro de Instituto Superior 2011, ganharia Técnico, com dois o Prémio Leya. filhos e uma “vida O livro, que foi absolutamente vulgar”, altamente elogiado sentiu o impacto do pela crítica, já vendeu desconhecido. mais de 40 mil “Foi o primeiro grande exemplares. Para trás baque na minha vida”, ficava a engenharia, confessa. mas só na prática. No primeiro dia de “Quando estou a desemprego, João foi escrever sinto o meu levar os filhos à escola espírito de engenheiro e, quando regressou a funcionar, aquela a casa, ligou o sensação de que aquilo computador e começou é uma máquina que a escrever. “Tinha tem de funcionar”, trabalhado tantos anos recorda. a levantar-me cedo, Tal como a escrita, a sair às sete e tal, também a literatura e de repente tinha chegou tarde à sua tempo”, recorda. vida. “Passei o ensino Nas primeiras semanas, secundário todo sem o engenheiro dedicou- ler um livro. Fi-lo, pela -se à arte das palavras. primeira vez, aos Descreveu os vizinhos 17 anos”, confessa. e o quotidiano do Assim que começou, bairro, descobrindo, não mais parou. Fã de aos poucos, o prazer José Cardoso Pires e no ato da escrita. Após Ernest Hemingway, os primeiros exercícios João Ricardo Pedro de escolher e juntar as tornou-se um leitor palavras certas para ávido e presença cada frase, elevou a habitual nas livrarias fasquia. de Lisboa. “Há um momento “A minha relação em que se começa a com a literatura era desenhar, na minha meramente como leitor. cabeça, uma primeira Dava-me prazer imagem do livro que e isso chegava-me.” queria escrever. Em março de 2016, A partir daí foi o autor publicou Um avassalador. Postal de Detroit, Os personagens livro que o torna, apareceram na minha definitivamente, refém vida e foi muito claro do leitor. como iria escrever O terceiro livro chegará o livro, os recursos talvez em 2020. Assim técnicos que já me a inspiração e o sentia capaz de amadurecimento da utilizar”, explica. história idealizada Aos poucos, o livro o permitam.

35 “Ninguém Uma família muito moderna queria André Carvalho e Carolina Quina acreditar. Os nossos C arolina foi a maiores na Ásia e Oceânia. Leonor, a filha mais velha, não familiares impulsionadora da Uma espécie de teste ao projeto perder o ritmo dos estudos. mudança, mas André que andavam a conceber – uma Entre histórias engraçadas – e amigos não se fez difícil – afinal, há agência de viagens à medida, como a vez em que André Maria, pensavam muito tempo que planeava esta a que chamaram Blue Olive. o filho mais novo, partiu a que era uma aventura. Estávamos em 2017 “O mercado das agências de cabeça e teve que ser suturado brincadeira” quando a família Quina Carvalho viagens em Portugal estava sem anestesia –, algumas largou tudo para viajar: vendeu estagnado e eu sempre quis ter aventuras e desventuras, o carro e a casa e despediu-se uma proposta diferente”, explica a viagem mudou a família. dos empregos estáveis na Media André Carvalho. De repente, Desde os filhos que, segundo Capital, um dos principais grupos a viagem começava a fazer Carolina, “cresceram com uma de media em Portugal. sentido. Em dois dias, André mentalidade mais aberta, são “Ninguém queria acreditar. traçou todo o percurso que iriam mais desapegados e menos Os nossos familiares e amigos fazer ao longo de oito meses preocupados”, aos pais, que pensavam que era uma – Tailândia, Austrália, Tasmânia, passaram a ter mais tempo de brincadeira ou um pedido de Nova Zelândia, Indonésia (Bali qualidade em família e em casal. aumento”, recorda Carolina e Lombok), Vietname, Hong Kong, Hoje, André e Carolina continuam Quina. Mas não era. Macau, China e Japão. focados na Blue Olive, que está Há três anos, o casal e os três Além do entusiasmo de uma a crescer e a testar novos projetos. filhos, que então tinham 8, 5 e 1 nova aventura, na bagagem Mas a vontade de viajar não ano, fizeram as malas e partiram levaram também um kit de desaparece: “Estamos sempre para uma viagem de oito meses medicina, a pensar na saúde a pensar na próxima viagem.” pelo mundo, com estadias dos miúdos, e alguns livros para a Qual será o destino seguinte? I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 36 Sociedade Das palavras aos fatos Milena Melo “Apercebi- A vida de Milena Valendo-se do know- a YAY, que numa produção têxtil.” Foi -me que os Melo, a luso- -how de pesquisa fase inicial produziu um encontro feliz: responsáveis -brasileira de de tendências, que apenas acessórios – tornaram-se sócias de marcas 40 anos que é dona aprimorou enquanto lenços, suspensórios, e lançaram-se em de grande da marca de moda jornalista, fundou gorros e chapéus. feiras internacionais dimensão não para rapazes YAY, já uma consultora “Foi um sucesso e de moda. Com uma conheciam deu muitas voltas. que ajudava os esgotámos o stock.” aposta num design os negócios Neta de portugueses, empreendedores a Mas nem tudo foi disruptivo e ilustrações disruptivos ” Milena conheceu encontrarem ideias fácil. “Eu e a minha com duplo sentido, Portugal aos 15 anos, de negócio. “Durante sócia encontrámos a YAY começou a “obrigada” pela mãe. uma entrevista algumas barreiras.” ganhar prémios – na “Portugal tocou-me apercebi-me que Primeiro com as CIFF (Dinamarca) porque fazia parte os responsáveis limitações de tecidos, recebeu a distinção de da minha história”, de marcas de porque a produção peça mais bonita da recorda. Apaixonou-se grande dimensão era reduzida, e feira e na Pitti Bimbo por Coimbra, cidade não conheciam os mais tarde com os (Itália) foi escolhida onde se licenciaria negócios disruptivos atrasos das fábricas. para vestir o desenho em Jornalismo e onde que apareciam no Quando foi obrigada animado Topo Gigio. conheceu o marido, mercado.” Até que pela terceira vez a Prémios que enchem mas quando chegou chegou a sua vez. mudar de fábrica, e Milena de orgulho e a altura de estagiar “Quando fiquei sentindo-se esgotada, a mantêm afastada foi para Lisboa, grávida percebi que a empreendedora do jornalismo. Um “onde havia mais comprar roupa para decidiu fazer uma olhar atento, porém, oportunidades”. meninos era um pausa no projeto. percebe que há aqui Foi aí que começou o problema”, recorda. “Até que recebi um uma osmose: “De caminho no jornalismo Estavam reunidos e-mail de uma cliente alguma maneira, o económico, mas os ingredientes para de Vizela cuja família texto entra sempre na por pouco tempo. nascer uma marca, estava ligada à roupa das coleções.” montepio I N V E R N O 2 0 2 0

AOs nossos valores 37 Residências Montepio Envelhecer no centro da cidade Saiba como a Residência Montepio Entrecampos vai revolucionar os serviços de saúde para os seniores na capital portuguesa e quais os planos da marca do Grupo Montepio para a próxima década. Texto CARLOS MARTINHO fotografia BRUNO BARATA Os números são claros. Portu- gal, a exem- plo de toda a Europa oci- dental, está a viver mais. Em 2016, 21% da população por- tuguesa tinha mais de 65 anos, segundo o relatório The Aging Report. No entanto, até 2070, a população com 65 ou mais anos aumentará 27% e será três vezes superior aos jovens. Nesse ano, de acordo com a projeção da Comissão Europeia, a esperança média de vida em Portugal atingi- rá os 88,2 anos. É também a pensar nesta nova era da lon- gevidade que a Residências Montepio abriu, no final de 2019, uma nova unidade pa- ra seniores em Entrecampos, bem no coração da cidade de Lisboa. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 38 Residências Montepio Residência “Queremos dar resposta a uma neces- A localização da Montepio sidade premente na oferta de camas residência de Entrecampos para a rede de cuidados integrados, Entrecampos, bem indo ao encontro do que procuram as no centro da cidade, Quartos famílias, a comunidade e a cidade de promove a inclusão 104 (72 duplos Lisboa”, explica Idália Serrão, admi- e 32 individuais) nistradora da Associação Mutualista metro e autocarro, nascerá uma no- Lotação total Montepio e presidente da Residên- va área de escritórios, comércio e 176 utentes cias Montepio - Serviços de Saúde. serviços, mas também apartamen- Colaboradores Moderna, funcional e preparada para tos e espaços verdes. Sendo uma das todos os perfis de mobilidade, a nova primeiras infraestruturas desta no- 100 residência vem também “reafirmar a va centralidade, a Residência Mon- Área total de construção oferta, num segmento premium, das tepio Entrecampos lança o mote pa- respostas residenciais para os mais ra a transformação arquitetónica da 13 000 m2 velhos”. É esta atenção ao detalhe que área. “O edifício é ímpar e reúne um Serviços exclusivos explica que cerca de 100 profissionais conjunto de soluções do melhor es- Cuidados médicos diários, estejam permanentemente à disposi- tado da arte em vários domínios”, ex- cuidados permanentes ção dos utentes (ver caixa). plica o diretor da nova unidade, Mário Requeijo. Dividido por duas torres, de enfermagem, “Quando trabalhamos com pes- que funcionam de modo indepen- apoio psicológico soas para as quais a mobilidade e o dente e com princípios de estada dis- especializado, terapias bem-estar são determinantes, todo tintos, a residência “ambiciona ser a de reabilitação e ocupação o esforço que empregamos no refor- referência específica do seu setor”, integradas e centradas ço e no desenvolvimento de terapias apostando na tecnologia para que a complementares pode fazer a dife- no utente rença. Esta realidade é exigente, do Áreas comuns ponto de vista de gestão, mas traz-nos Ginásio, refeitório, reconhecimento por parte das tutelas salas de lazer, espaços e das famílias. E deixa-nos mais satis- de ar livre e de passeio feitos com o serviço que prestamos”, adaptados e ajardinados, argumenta Idália Serrão. bancadas de jardim próprias para terapias Uma nova centralidade ocupacionais Numa cidade marcada pela acen- tuada transformação, Entrecampos Os números será o bairro que mais mudará nos da Residências próximos anos. Nesta zona, que dis- põe de bons acessos de comboio, Montepio Locais das residências Montepio Parque das Nações, Entrecampos e Parede (Grande Lisboa), Porto e Vila Nova de Gaia (Zona Norte), Coimbra (Zona Centro) e Montijo (Zona Sul) Próxima abertura Albergaria-a-Velha (2020) Nível médio de ocupação 93% Volume de negócios 21,6 milhões de euros (+4,9% que no ano anterior) Fonte: Relatório e Contas da Associação Mutualista Montepio (2018) montepio I N V E R N O 2 0 2 0

39 são. Territórios para todos, seja qual P&R for a idade”, avança Idália Serrão. “experiência do utilizador seja a me- A localização da nova residência de Idália Serrão lhor e a mais confortável possível”. Entrecampos, bem no centro da cida- Administradora da Associação Mutualista A torre A, de estada privada com be- de, é também uma mensagem de in- Montepio nefícios para os associados Montepio, clusão que a AMM deixa à capital por- é uma estrutura residencial para se- tuguesa. “Vamos ao encontro niores e conta com 92 lugares. A torre das recomendações dos B destina-se aos cuidados continua- “Existe um direito universal à ci- nossos associados” dos, integra a sub-região de saúde de dade que tem de ser cumprido, por Lisboa e Vale do Tejo, da Rede Nacio- todos, quando é definido o acesso ao Que novidades muitas variáveis. nal de Cuidados Continuados Integra- espaço público, ao edificado, aos ser- estão previstas Existem instrumentos dos (RNCCI), e conta com 84 lugares de viços que cumprem funções sociais. para a Residências de planeamento internamento, todos de carácter tran- É uma responsabilidade individual, Montepio? dos quais devemos sitório e com tipologias distintas: Con- enquanto utilizadores, planeadores, socorrer-nos: valescença, Média Duração e Reabili- executores, mas também uma res- Estamos a iniciar a Carta Social, onde tação, e Longa Duração e Manutenção. ponsabilidade coletiva das institui- a operação de podemos avaliar as ções, públicas e privadas, da econo- Albergaria-a- taxas de cobertura Não são apenas as infraestruturas mia social”, continua Idália Serrão. -Velha, com mais e de utilização das que se destacam. A experiência acu- Um quarto com vista que respeita os de 100 camas, que respostas sociais, mulada de vários anos, e em várias valores do mutualismo e responde aumenta a oferta a pertinência ou residências Montepio, garante “soli- às necessidades dos associados nos nas diferentes prioridade social dez” à nova unidade Entrecampos. vários momentos da sua vida. “A As- tipologias da de desenvolver “Vamos continuar, em Entrecampos, sociação Mutualista Montepio está a Rede de Cuidados determinada o caminho do reconhecimento da fazer o seu caminho e a dar o seu con- Continuados valência num qualidade e até da acreditação inter- tributo. Por isso encontramo-nos a de- Integrados (RNCCI) território, ao que nacional. O interface digital e o alarga- senvolver novos modelos residenciais da zona Centro e juntamos uma mento da oferta de cuidados de saúde e de apoio para os mais idosos, que ainda as respostas prospeção dos e de reabilitação em ambulatório são possam também, e cada vez mais, ir residenciais. Estas imóveis e dos algumas das novidades”, continua ao encontro das necessidades dos as- últimas estão a ser terrenos que são o diretor da Residência Montepio sociados”, continua a responsável. desenvolvidas numa propriedade do Entrecampos. perspetiva menos Grupo. Neste Na nova residência de Entrecam- onerosa e que vai aspecto não Envelhecer com qualidade de vida pos, as duas torres ligam-se, no últi- ao encontro de poderemos retirar Lisboa está a mudar. À medida que a mo piso, por um passadiço metálico recomendações dos do processo de profunda transformação arquitetó- em vidro que oferece uma panorâ- nossos associados. decisão o facto de nica da cidade a torna mais cosmo- mica ímpar do centro de Lisboa. Um Continuamos a o preço por m2 da polita, novos desafios surgem para espaço que permite a todos os uten- trabalhar com base aquisição do terreno os cidadãos mais vulneráveis. “As ci- tes acompanhar, de modo privilegia- na missão e valores ser determinante dades devem ser territórios de inclu- do, o avanço de uma cidade vibrante e da Associação para o cálculo das aberta a todos. Uma cidade dos novos, Mutualista Montepio. mensalidades. que nos trazem ambição e futuro, mas É um trabalho Há ainda fatores sobretudo dos mais velhos, que guar- inacabado, que como a criação de dam as suas memórias do passado e queremos continuar, emprego em áreas transmitem os valores e conhecimen- criando respostas mais deprimidas, to às novas gerações. sociais para a nomeadamente para população idosa, jovens licenciados que abarquem e desempregados o setor privado, de longa duração. a RNCCI e o setor Estas e outras solidário. variáveis estão Como são muito presentes escolhidos nos objetivos que os locais das estamos a redefinir próximas para as residências residências? Montepio. É um processo complexo e com I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores 40 Perfil Capicua A palavra ao poder Capicua é Ana Matos Fernandes. Nascida no Porto, tem no sotaque nortenho a garra de uma geração. Feminista e politizada desde que se lembra de ser gente, provou que o hip-hop pode ser da cor que quisermos. Porque o que importa é a palavra, o talento. Tal como ouvimos em Madrepérola, o seu mais recente trabalho. Texto SARA BATISTA | fotografia BRUNO BARATA maquilhagem NICOLE LOURENÇO Pode não ser preciso re- cuar aos primórdios do rap para conhecermos Capicua. Mas a sua his- tória não ficaria com- pleta se não falássemos do graffiti, da descoberta do hip-hop e do Comix, o bar no Porto que era espaço de cul- to para uma comunidade que não se revia na cultura mainstream. Influenciada pelos pais a ouvir os cantautores de Abril, Ana Matos Fer- nandes (ou Capicua) percebeu des- de logo que a palavra não era apenas um objeto estético, mas um veículo para uma mensagem. Ainda longe de saber que o futuro passaria por montepio I N V E R N O 2 0 2 0

Os nossos valores A 41 Perfil Reconheci aqui, descobriu no graffiti o cami- do a minha identidade.” Enquan- no hip-hop a nho para algo maior. “Senti neces- to evoluía num “clube de rapazes”, primazia da sidade de conhecer pessoas da cul- mostrava ao mundo que o rap tam- tura hip-hop e comecei a frequentar bém se podia fazer no feminino e fo- palavra e a o Comix, onde tive o primeiro con- ra dos cânones. “O rap do Porto era capacidade de tacto com o rap.” Embora o género muito introspetivo, bastante filosó- espalhar uma musical não lhe fosse totalmente fico e um pouco conservador, não desconhecido – já ouvia General D havia refrões cantados”, relembra. mensagem e Da Weasel – estava longe do circuito Numa evolução paralela, em que já underground da Invicta. Mas tudo não se sabe quem influenciou o quê, mudou quando, por influência de a verdade é que hoje o hip-hop vive Dealema e Mind da Gap, percebeu um momento de grande diversida- que era possível fazer música com de, uma pulverização de estilos que a sua linguagem, o seu sotaque. “Re- começa a atrair um público cada vez conheci no hip-hop a primazia da mais variado. palavra e a capacidade de espalhar uma mensagem.” Um estranho dentro de casa Embora o início de carreira não te- Apoiada por Mundo Segundo, nha sido fácil – “é preciso provar duas membro dos Dealema e conside- vezes que se está ali pelo talento” – rado o impulsionador da segunda ser outsider teve as suas vantagens. geração do rap portuense, gravou “Houve fases difíceis, faltou-me sem- a primeira música. “Fui procuran- pre uma referência feminina, mas ao mesmo tempo esse exotismo deu-me Mini Bio mais visibilidade.” Em 2012, provou-o com Capicua, o primeiro álbum a so- Nome: Ana Matos Fernandes lo. “A missão que tinha já a cumpri, que era provar que era possível.” Idade: 38 anos Politizada e feminista desde que se O primeiro CD e o mais lembra de ser gente, serviu-se do mi- recente: O primeiro foi o crofone para falar sobre as suas cau- Mudam-se os tempos, Mudam- sas. E aprendeu com as suas referên- -se as vontades, de José Mário cias musicais – Sérgio Godinho, Zeca Branco, oferecido pelo pai. Afonso, Chico Buarque –, que sempre O último foi o Ok, Ok, Ok, associaram a palavra à música como do Gilberto Gil. veículo de mensagem. “Acredito na música como uma força transforma- Um músico que não te cansas dora.” Capicua fá-lo com uma facilida- de ouvir: Caetano Veloso de natural, como se de uma brincadei- ra de crianças se tratasse. “Tenho uma Uma música para ouvir relação lúdica com as palavras desde em repeat: Depende dos dias, miúda. O meu pai gosta muito de tro- mas talvez a Masterblaster, cadilhos e de dizer palavras ao contrá- do Stevie Wonder, faz-me rio.” Rima, lengalenga, aliteração, me- sempre sorrir. táfora. Não há figura de estilo que lhe escape. Uma música para adormecer o teu filho: Essa é fácil. Qualquer coisa do Vinícius de Moraes Um livro: Cem anos de Solidão, do Gabriel García Márquez I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

A Os nossos valores Um jeito alegre de ser triste tilhado, mas igualmente feminino e Na mesma lógica intervencionis- aquático. É uma continuação e uma 42 Perfil ta, a Capicua seguiu-se Sereia Lou- abertura ao mundo.” Com a vontade ca (2014), Medusa (2015) e o mais re- de fazer um disco “mais solar, dan- 10 álbuns cente Madrepérola (2020), que en- çável e com mais canções”, Capicua para conhecer cerra “uma trilogia aquática não quis incluir novos instrumentos e Capicua intencional”, nas palavras da pró- colaborações. “As músicas vão-me pria. “De facto, tenho escrito muito pedindo pessoas.” Por isso, se numa Syzygy (EP) – 2006 sobre as mulheres e esse universo música “doce e romântica”, Planetá- Capicua, M7, Maria misterioso ligado à água.” Embora rio, temos a Mallu Magalhães, nou- e D-One siga a linha do segundo disco a so- tra “mais feminista e com atitude lo, em Madrepérola sentimos que a aguerrida”, Madrepérola, temos a ra- Mau Feitio (EP) – 2007 sereia saiu à rua para dançar com o pper brasileira Karol Conka. Capicua, Auge e D-one mundo. “É uma fase da vida diferen- te, um disco mais aberto, mais par- Embora o método de composi- Capicua goes Preemo ção seja tradicional, no que ao hip- (Mixtape vol. 1) – 2008 [Madrepérola] é -hop diz respeito, a MC do Porto quis um disco mais experimentar na sua própria escrita Capicua (LP) – 2012 “uma forma mais descomprometi- aberto, mais da, menos cerebral e filtrada”. Esco- Capicua goes West partilhado, mas lheu, por isso, esse “jeito alegre de (Mixtape Vol. 2) – 2013 ser triste”, numa clara inspiração ao igualmente Brasil, que conquistou com o projeto Sereia Louca (LP) – 2014 feminino Língua Franca (2017), com Rael, Emi- cida e Valete. Medusa – 2015 e aquático Apesar de ser um “disco feliz”, Mão Verde nem que seja por ter coincidido com (livro-disco para a primeira gravidez de Capicua, as crianças) – 2016 suas músicas continuam a tocar no Capicua e que é incómodo, sejam os efeitos da Pedro Geraldes gentrificação (Circunvalação) ou o lado menos romântico de se ser ar- Língua Franca tista (Passiflora). Porque, explica, – 2017 “vivemos num mercado que tritura Capicua, Emicida, a novidade com uma rapidez e dis- Rael e Valete plicência que é incompatível com a nossa entrega”. Um desassossego Madrepérola que faz questionar a própria razão, – 2020 e que está bem explícito na rima “Não confundam o bom gosto com a falta de público e aproveitem es- te disco porque pode ser o último!” Tão certo como a força motivado- ra que é a necessidade de tocar as pessoas com a sua escrita é que “o futuro é sempre muito misterioso”. Esperemos, então, que Capicua siga como os seus ídolos. E que continue a compor, com “energia e genialida- de”, como Gilberto Gil ou Chico Buar- que fazem aos 70.

ADRIANO MOREIRA Os nossos valores A 43 A paz e as novas Crónica fronteiras sociais e constitucionais, causando A debilitação visível da capacidade da Utopia uma anarquia em que são desmedidas esperançosa da ONU, definida depois da as violações dos direitos humanos, a começar pelo direito à vida. guerra de 1939-45, teve o seu primeiro aviso Para a União Europeia, que a leste quando a multiplicação dos conflitos armados, tem as dificuldades dos projetos de expansão da Rússia, a sul a tragédia e da perigosidade dos avanços técnicos, das migrações, isto implica assumir permitiu o ataque eficaz do fraco contra o forte a importância do Mar Atlântico, que especialmente interessa a Portugal, (Torres Gémeas). pelo passado e pelo presente em que a língua portuguesa liga antigos domí- A evoluçãodessetrajetosemabússoladeumarevisãodo nios da soberania do país. A União, que conceito estratégico da Utopia, proposta pelos ociden- se mostra severa em relação ao Brexit tais ao mundo, continuou, e a semântica dos analistas do Reino Unido, tem no recente ativis- da política adotou a designação de “turbilhão” para as mo do Presidente Macron a demons- tentativas de organizar solidariedades, à margem da tração de que os desafios europeus experiência histórica, e renovando a leitura da história, sem a certe- são crescentes. Sobretudo, talvez, pela za de chegar a um acordo de futuro antes do futuro ter acontecido. necessidade de proceder, se possível, Nesse “turbilhão”, podem já reconhecer-se sinais que tendem para à revista articulação com a futura es- se agigantar. Em primeiro lugar, no que respeita às potências que trutura do governo alemão, no qual vai foram responsáveis pela experiência de ocidentalização do mun- diminuindo a autoridade, e inevitavel- do, o corte visível das amarras do atlantismo, resultante da política mente o legado, da senhora Merkel. irracional dos EUA. É a NATO, a sua articulação com a segurança eu- Para Portugal, o tema do Mar conti- ropeia, tornada mais desafiante pelas consequências não avaliadas nua desafiante, num mundo onde a oficialmente, mas antevistas, pelos comentadores e pela opinião pú- competição naval desafia os equilí- blica, que ainda se mantém atenta e não afetada pelo tédio. Depois, brios internacionais: a China avan- a desordem crescente na América Latina, essa criação dos Estados ça no sentido de recuperar as águas que, seguindo as monarquias peninsulares de Portugal e Espanha, que deixou de navegar antes da nossa são uma parcela do Ocidente em que se multiplicaram as crises epopeia, mas as competições são evi- dentes no Mediterrâneo oriental e no Ártico, pondo em crise a interpretação da convenção da ONU sobre o Direi- to do Mar. A hierarquia das potências é reformulada à margem da que foi consagrada no Conselho de Seguran- ça, tudo a exigir uma atenta “ecologia dos espaços marítimos” (Françoise Gaill) que podem ser submetidos a no- vas fronteiras esquecidas. Trata-se de um bem fundamental: a “terra casa comum dos homens”. A experiência do multilateralismo, que se seguiu à queda do Muro de Berlim, aconselha a repor o projeto da ONU, equilibran- do, pela intervenção das instituições internacionais, a ação das grandes po- tências. Porque o projeto do “nunca mais” da ONU, em relação à guerra, continua em suspenso. I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

B A minha economia 44 Finanças pessoais Vai mudar de emprego? O dinheiro não é tudo Foi convidado para um novo desafio profissional? A minha Conheça os principais aspetos financeiros economia e extrafinanceiros a ter em conta para tomar uma decisão consciente e informada. É que, apesar de importante, há mais a ter em conta que o salário. Texto ALEXANDRE BRA Z I ilustração VERA MOTA 1. Quanto vai ganhar? dio de refeição? Que outros subsídios ganha ou perde com a mudança? Qual Este é um dos primeiros pontos a co- o impacto da nova oferta em termos nhecer sobre o novo emprego. E mes- fiscais? Irá trabalhar mais ou menos mo que o dinheiro não seja tudo, a si- horas? Esta última pergunta é espe- tuação salarial tem bastante impacto cialmente relevante quando estiver a no bem-estar geral de todos. Tanto que ponderar os valores em cima da mesa. este é o maior motivo para mudar, se- Isto porque ganhar 1 600 euros para tra- gundo os profissionais do setor: “A ra- balhar 35 horas por semana é distinto zão principal para mudar de emprego de ganhar 1 800 euros para trabalhar 45 são as questões financeiras associadas horas – neste último exemplo estará a à proposta de trabalho”, explica Marta ganhar mais ao fim do mês, mas me- Ferreira, HR Senior Consultant na Kelly nos por hora trabalhada. Compensará? Services, empresa de gestão de recur- sos humanos que é responsável por 2. Qual o impacto na mais de 500 mil recrutamentos, por ano, em todo o mundo. sua carreira? Na análise às condições que lhe pro- põem comece por olhar para as diversas Além do impacto na situação financei- componentes que constituem o recibo ra imediata, uma mudança de empre- de vencimento. Qual o peso do venci- go pode significar uma renovação de mento base no salário total? Quanto é perspetivas a médio e a longo prazo, que a nova empresa oferece de subsí- em particular se pretende mudar por- que se sente estagnado ou com falta de montepio I N V E R N O 2 0 2 0

motivação. A exemplo da remunera- são de carreira. Se mudar se traduzir MONTEPIO PROTEÇÃO VIDA 45 ção futura, também o projeto que lhe numa ligeira redução salarial e esse é proposto tem “impacto substancial for o preço para ser mais feliz no tra- Mudar de emprego pode implicar na tomada de decisão”, diz a especia- balho, porque não? Até pode dar-se o a perda de benefícios laborais, como lista da Kelly Services. “Deve ser sem- caso de estar a dar um passo atrás pa- o seguro de vida. Existem alternativas. pre analisado, inicialmente, se o projeto ra dar dois em frente. O Montepio Proteção Vida é uma faz de facto sentido para a sua evolução modalidade mutualista que cobre profissional”, especifica Marta Ferreira. 3. Quaisosbenefícios o risco de vida e que permite, ainda, Quais as suas expectativas em termos transformar a totalidade do capital de progressão e evolução de carreira indiretos? na constituição de uma renda para os próximos anos? Há maior ou vitalícia. Com três planos diferentes, menor possibilidade de lá chegar no Além do vencimento e de outras ru- esta modalidade permite manter a novo emprego? Tem mais espaço pa- bricas diretamente ligadas ao salário estabilidade da sua família ou de ra crescer na oportunidade que surge líquido, há outros aspetos financei- outros beneficiários, em caso de ou no sítio onde está? E, existindo opor- ros que podem influenciar as suas infortúnios, e garantir um futuro sem tunidade de crescer em ambas, qual a contas e devem ser analisados. Para “ses” para as pessoas de quem mais tradução salarial do crescimento em perceber o real impacto da mudan- gosta. cada uma delas? ça deve considerar “a liquidez anual Se a mudança significar “começar do bem como benefícios financeiros e O QUE PRECISA DE SABER zero” noutra área há que estar cons- sociais, nomeadamente cheques cre- ciente de que a progressão pode ser che e cheques-viagem, flexibilidade • P ara associados entre os 14 mais lenta. Mas nem tudo se resume horária e a possibilidade de traba- e os 65 anos a questões financeiras ou de progres- lhar a partir de casa”, garante Marta Ferreira. • Possibilidade de desistência em qualquer altura, sem perda da totalidade das contribuições entregues • Mínimo de capital subscrito: 1 500€ Digitalize este QR Code com o seu telemóvel I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

B A minha economia P Se o novo emprego implicar deslocações 46 mais demoradas, avalie o impacto Finanças pessoais dessas alterações na sua carteira Se a proposta que lhe apresentam pre- seguros de vida. Cada vez mais deixa vir um salário igual ou pouco melhor de oferecer-se carro e estacionamento em relação ao que tem hoje mas incluir como contributo remuneratório para uma viatura, combustível, subsídio de a função”, revela Marta Ferreira. transportes, telemóvel, seguro de saú- Deixar de pagar do próprio bolso um de, ginásio ou apoios à natalidade, pode seguro de saúde ou ter acesso a um revelar-se mais generosa do que apa- seguro mais abrangente e com melho- rentava. Mas devemos também estar res coberturas, com possibilidade de conscientes de que as nossas expec- poder alargá-lo à família, é um aspeto tativas de benefícios podem não ba- que deve ser considerado ao aceitar ou ter certo com a prática, algo para que recusar uma nova oferta de emprego. a especialista da Kelly Services cha- A questão da mobilidade deverá tam- ma a atenção. bém estar em cima da mesa. Se o novo “Tendo em conta que 90% do tecido emprego implicar deslocações mais empresarial português é constituído demoradas e dispendiosas, perceba por PME, que acabam por não ter uma qual o impacto desta alteração na sua liquidez financeira muito elevada, os be- carteira, mas também no seu dia a dia. nefícios mais oferecidos pelas empre- Está disposto a levantar-se mais cedo, sas, e que têm sido contínuos ao longo e alterar as rotinas, por uma remunera- dos anos, são os seguros de saúde e os ção ligeiramente maior no final do mês? Quero mudar de emprego. E agora? Em muitos casos, a “Depois de definir Marta Ferreira, HR P Além do vencimento, vontade de mudar de claramente o rumo Senior Consultant devem ser analisados emprego surge antes que quer seguir, é da Kelly Services. outros aspectos de uma proposta importante fazer Ou seja, mais do financeiros, como a formal por parte do uma análise do que começar a flexibilidade de horários futuro empregador. mercado e das “disparar” currículos e a possibilidade de Como deve atuar oportunidades e contactos, procure trabalhar em casa então? Tome a existentes. Deve de um modo iniciativa. Comece candidatar-se cirúrgico e concorra por perceber o rumo exclusivamente às apenas a funções que quer seguir, ofertas em que o seu para as quais como está o mercado perfil se enquadre a sua experiência e desenvolva ou e, em paralelo, e competências aprimore a sua desenvolver o seu encaixam que nem rede de contactos. networking”, explica uma luva. Ou quase. montepio I N V E R N O 2 0 2 0

PUB 4. Vai mudar de área? mente, com um bom ambiente, on- de aprende e lhe dão a oportunidade Pense no futuro de mostrar o seu potencial pode ser a médio prazo mais decisivo na motivação, a mé- dio e longo prazo, que o vencimento. Se em cima da mesa tem uma propos- ta para uma função similar, mas num 5. Qual a reputação setor distinto, deve igualmente ter em conta as especificidades da nova área da sua futura empresa? e o grau de exposição desta ao ciclo eco- nómico. Trata-se de um setor mais ou Nunca foi tão fácil conhecer a menos estável? Qual a posição da em- saúde financeira de uma empresa. presa face à concorrência e qual a esta- Plataformas digitais como o Racius bilidade da própria empresa e das suas permitem conhecer, em pormenor, contas? Trata-se de uma mudança para informações sobre um milhão de uma área mais resiliente? Qual o nível empresas. Volume de negócios, de investimento da empresa? Vai ter resultados e rácios de gestão, ações acesso a todas as ferramentas de que em tribunal e insolvência ou dados precisa? Tudo são fatores a ponderar. mais estruturais: tudo é analisado Olhe, também, para as suas próprias minuciosamente. Por outro lado, questões. A proposta enquadra-se bem sites como o Linkedin ajudam-no nos restantes aspetos da sua vida além a conhecer o perfil dos seus futuros do profissional? Ficará mais fácil ou di- colegas e a saber, através de uma fícil conciliar o trabalho com a família, longa rede de networking digital, os filhos, os amigos? A sua qualidade com quem partilha contactos. de vida irá previsivelmente melhorar Se seguir estas ligações, em ou piorar? Vai encontrar nesta oportu- poucos minutos pode falar com nidade um novo alento ou corre o risco futuros colegas e perceber, com de estagnar? exatidão, o estado financeiro de Lembre-se de que está a tomar uma uma empresa, o seu ambiente de decisão que será para alguns anos, logo trabalho e perspetivas de futuro. nunca feche a análise apenas à compo- Hoje não há desculpas para tomar nente financeira e aos benefícios. Estar uma decisão profissional da qual num projeto onde se enquadra perfeita- se irá arrepender em poucos dias. Basta tomar um pouco de cuidado e fazer as perguntas certas.

B A minha economia 48 Finanças pessoais Já lhe compensa comprar um veículo elétrico? A expansão dos veículos elétricos é inevitável. E ainda que estes representem apenas 3% do parque automóvel português, o número de carros eléctricos tem duplicado por ano. Saiba, neste artigo, se lhe compensa comprar um veículo elétrico em 2020. Texto ALEXANDRE BRA Z montepio I N V E R N O 2 0 2 0

BA minha economia 49 Finanças pessoais Há mais de uma década “Tudo depende do perfil de utilização”, A manutenção que se sabe que os auto- refere Hélder Pedro que, ainda assim, dos elétricos móveis com motor a ga- não garante que os preços dos elétri- tem um custo solina e a gasóleo têm os cos continuem a descer. “Será difícil 75% mais dias contados. Mas se os veículos elé- prever a sua evolução. Não depende baixo que as tricos são cada vez mais comuns nas apenas da generalização da produção revisões nossas estradas, apenas representam em série, mas também da evolução dos automóveis 3% do parque automóvel português, do custo das baterias e da respetiva tradicionais de acordo com a Associação Automó- matéria-prima”, sublinha. vel de Portugal (ACAP). “Esta quota de De acordo com as contas de Teresa mercado tem vindo a duplicar a cada Com as poupanças associadas aos Ponce de Leão, presidente da Asso- ano que passa. Portugal é o terceiro carros elétricos dependentes do tipo de ciação Portuguesa do Veículo Elétrico país da Europa com maior penetração utilização que se dá aos veículos, para (APVE), a manutenção dos elétricos de veículos elétricos”, realça Hélder que tipo de condutores já se justificará tem um custo 75% mais baixo que as Pedro, secretário-geral da ACAP. a aquisição de um elétrico em 2020? revisões dos automóveis tradicionais. Do ponto de vista do consumidor, Ponto prévio: a comparação entre Contudo, não há bela sem senão. a viragem inevitável para a mobilidade elétricos e veículos tradicionais não “O único custo de maior são as bate- elétrica tem como principal resistên- se extingue no custo de aquisição e rias, que são caras e podem ter de ser cia o preço dos veículos. As previsões de utilização por quilómetro. Nesta substituídas ao fim de uns anos”, real- apontam para que estes continuem a equação entram também os custos ça Henrique Sanchez. As baterias são o descer, à medida que os fabricantes de manutenção, que são radicalmen- calcanhar de Aquiles dos elétricos: são vão encontrando alternativas ao lítio te mais baixos para os veículos elétri- caras, precisam de substituição ao fim e intensificarem as cadeias de valor. cos. E é fácil perceber porquê: se um de pouco mais de 180 mil quilómetros, Mas, para muitos condutores, já faz carro com motor a gasolina ou gasó- têm uma autonomia reduzida e exigem sentido adquirirem um veículo elé- leo tem perto de 2 000 peças móveis, mais tempo de recarga do que o exigi- trico em 2020. “Cada caso é um caso. os elétricos contam com cerca de 20. do para atestar um carro. Mas é gra- Quanto maior for a necessidade de uti- “As manutenções são muito mais ba- ças a estas que os elétricos oferecem lização do veículo elétrico, mais van- ratas, pois o carro elétrico, como tem um preço por quilómetro mais barato. tajoso será o racional financeiro, pe- apenas 1% das peças de um carro com los menores custos de abastecimen- motor de combustão interna, não ne- Quanto mais andar, melhor to e manutenção”, salienta Francisco cessita de sistemas de arrefecimento, Quando analisamos as diferenças en- Ferreira, presidente da Associação filtros, óleos ou velas, entre outros”, tre veículos elétricos e tradicionais no Zero. Uma visão que também recebe diz Henrique Sanchez, presidente da campo dos consumos, os elétricos o acolhimento da ACAP. Associação de Utilizadores de Veícu- saem a ganhar. Segundo Teresa Pon- los Elétricos (UVE). Qual a poupança? ce de Leão, os consumos aos 100 km Número de peças dos automóveis alimentados por ener- por veículo As baterias são caras, gia elétrica “representam, em média, precisam de substituição ao metade dos custos de combustível”. 20 fim de pouco mais de Henrique Sanchez corrobora esta te- Elétrico 180 000km se. “O custo de percorrer 100 km é de 12€ num carro a gasolina, 9€ num a gasóleo 2 000 e entre 2€ e 6€ para um elétrico.” Nos elétricos, os carregamentos rápidos são Gasolina/gasóleo mais caros que os carregamentos feitos em casa, com tarifa bi-horária. Ainda as- sim, qualquer um dos custos é inferior ao preço da gasolina e do gasóleo por cada 100 km. A isto há ainda que juntar I N V E R N O 2 0 2 0 montepio

50 Vai comprar um outros benefícios. O carro elétrico está carro diariamente, e em particular se veículo elétrico? isento de Imposto Sobre Veículos (ISV) os custos de estacionamento forem Conheça os prós e Imposto Único de Circulação (IUC). relevantes, a vantagem dos automó- e contras Por outro lado, em muitas cidades do veis elétricos “é evidente”. país (Lisboa, Oeiras, Funchal, Loures, + C ustos de manutenção Guimarães ou Vila Nova de Gaia, entre Henrique Sanchez vai mais longe outras) o veículo elétrico está isento de e vê vantagens em todos os cenários 25% inferiores aos de um pagamento, ou tem grandes descontos, de utilização. “Se contabilizarmos o carro tradicional no estacionamento. Também nas por- custo total de utilização, já compen- tagens da ponte Vasco da Gama e 25 de sa adquirir um carro elétrico. Mesmo + C onsumos entre 50 a 80% Abril existem descontos, com o Viacard, sem levarmos em conta os aspetos assim como nas viagens de ferry-boat ambientais”, diz o presidente da UVE. mais baratos que os dos entre Portimão e o Funchal. carros a gasolina Se o gancho da sustentabilidade não A cereja no topo do bolo está guardada deve ser esquecido, nem sempre o que + A poios estatais até 3 000 para o fim. Em 2020, quem adquirir um parece verde é. Segundo Francisco Fer- carro elétrico beneficia de um incenti- reira, os utilizadores esporádicos devem euros (particulares) vo governamental no valor de 3 000€. ter em conta os custos ambientais da e 2 250 euros (empresas) construção de um veículo elétrico, que em 2020 Mas há outras vantagens para quem ainda são maiores que os dos automó- aposta no elétrico e circula, em média, veis a combustão interna. “Para quem + Isenção de ISV e IUC. mais de 100 km por dia. “Atendendo ao utilize pouco o automóvel, o peso am- diferencial de custos de energia entre biental da construção de qualquer carro Em algumas cidades, o eletricidade e combustíveis fósseis, o será sempre significativo, mas natural- pagamento de portagens aumento das distâncias percorridas mente ainda mais nos veículos elétri- e estacionamento tem eleva, por si só, a competitividade dos cos.” Por isso, e se o recurso a transpor- descontos ou é gratuito automóveis elétricos”, refere Teresa tes públicos, bicicletas ou caminhada Ponce de Leão. está fora de hipótese, nada como evitar + Condução mais suave o impacto ambiental da construção de No caso dos condutores esporádi- um novo veículo optando por uma via- e melhor performance cos, prossegue, “existem diferentes tura já existente. “Desta forma continua fatores que terão de ser ponderados a dar-se utilização a veículos que já es- + Menor poluição sonora e que podem decidir qual das opções tão construídos”, conclui o presidente é a mais benéfica financeiramente”. da Associação Zero. e redução das emissões Ainda assim, a responsável assegu- de CO2 ra que, no caso de alguém que usa o - Preço de aquisição mais S O custo do carregamento dos caro carros elétricos - A utonomias reduzidas face é inferior ao preço à capacidade de um tanque da gasolina e do de combustível gasóleo - Carregamentos mais demorados que o ato de atestar um automóvel - R ede de carregamentos rápidos pouco difundida fora das grandes cidades - Emissões associados ao fabrico dos carros elétricos são maiores que as dos carros tradicionais - S e a eletricidade para abastecer o carro vier de uma central a carvão, então estará a poluir mais do que com um carro a gasolina montepio I N V E R N O 2 0 2 0


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