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Angola - Conto de Sonho - Vida Real

Published by mortal.santos, 2018-06-27 16:16:50

Description: Angola - Conto de Sonho - Vida Real

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195619752006 2010





CONTO DE SONHO VIDA REAL 4

Dedico este livro em primeiro lugar, aos meus pais, causadoresda minha ida para África (Angola), aos meus avós maternos, aos meus filhos, netos e restante família. Aos meus verdadeiros amigos. Finalmente ao Calelessa, a pessoa que me fez regressar a Angola 32 anos depois.



CON1T9O56D-E19S7O5N|H20O0V6ID- 2A01R0EAL 1956 - 1975 | 2006 - 2010 4 ANOS MUITO IMPORTANTES NA MINHA VIDA 1956 ano em que viajei para Angola com apenas 10 anos de idade,1975 o regresso a Portugal ano da Independência de Angola, 2006 oregresso a Angola 32 anos depois de ter regressado a Portugal, 2010o alambamento e o meu casamento em Moçambique. A actual esposa éMoçambicana, quatro épocas quatro emoções completamente diferentes. A 1.ª era ainda uma criança cheia de ilusões, tudo eranovidade, a partida de Portugal sem ter a noção do tempo e do espaçoque demorava a chegar ao destino, o Barco, a Viagem, a chegada, osolhos muito abertos sem conseguir abranger tudo o que via e sentia,começar uma vida nova, num lugar completamente diferente do sítioque tinha acabado de deixar, os amigos, a família, a escola. Finalmente a 1 de Maio de 1956, 6 horas da manhã, o PaqueteMoçambique chega a Luanda, numa manhã cinzenta e calma, motoresdesligados o navio entra calmamente nas águas da Baía, uma cortinacinzenta de cacimbo não deixa ver nada à nossa frente, somente seouvem motores de outras embarcações e apitos, vozes que avisamda sua aproximação, dentro do navio a excitação é grande, correriasde um lado para o outro,o debruçar na amuradapara ver se conse-guedescortinar algo à nos-sa frente, o monte demalas nos corredoresdo convés, enquantoo navio desliza calma-mente rumo ao Porto deLuanda, já com o Piloto 7

CONTO DE SONHO VIDA REALda Barra a bordo que veio buscar o navio à entrada da Barra, à nossaesquerda começa-se a desenhar altos Morros de terra, entre o ama-relo, vermelho e castanho, Gaivotas cruzam o navio de um lado parao outro, com os seus pios agudos e estridentes, à nossa direita umalíngua de terra comprida com Palmeiras e Coqueiros à mistura comoutra vegetação que dão à paisagem um tom radicalmente diferentedaquilo a que vínhamos habituados do Continente de onde saímosfaz hoje 11 dias, outros cheiros, outros sabores que logo comecei aaprender a saborear e aqui começou a minha passagem de portuguêspara a qualidade de Angolano, perdi totalmente a minha identidade dePortuguês em 20 anos de Angola. Foram as comidas, a Moamba, o Feijão c/Óleo de Palma, o PeixeFrito, a Música e tudo isto vivido e crescido no sambizanga e nobairro da Cuca, sentado na esteira, tive bons professores de bairropara aprender a dançar merengue e assim começou a minha primeiragrande emoção e destino de vida. Na Lixeira Sambizanga e nos campos da bola comecei a dar osprimeiros pontapés na bola, em 1962-1964 fui Júnior do ASA AtléticoSport Aviação de onde sairam grandes jogadores tais com o Diniz(famoso brinca na areia) o Inguila e tantos outros eu fiquei para trásum acidente de Mota retirou-me do Futebol. 8

1956 - 1975 | 2006 - 2010 Foi também na Lixeira (Sambizanga) que conheci a minhaprimeira esposa, casei na Igreja da sagrada família em 1966 a 11 deJunho dia do meu aniversário, tivemos dois filhos um casal a menina amais velha hoje Angolana. Sou Gráfico desde os meus 12 anos aprendi esta profissãoem Luanda na Gráfica de uns Alemães, OFFSET LDA, ainda existe,quando sai em 1975 fui continuar em Portugal esta profissão especia-lizei-me e hoje estou a colocar ao serviço de Angola tudo que sei e aformar quadros pois Angola bem precisa. 9

CONTO DE SONHO VIDA REAL Lisboa 20 de Abril de 1956 do cais de Alcântara parte o navioMoçambique rumo a Angola com carga e passageiros numa viagemprevista de 11 dias, com paragem na Madeira. Como passageiros uma centena de pessoas com rumos dife-rentes no interior de Angola, e moçambique, mulheres casadas porprocuração iam ao encontro de um homem sem o ter conhecido an-tes, a não ser por fotografia, outras casadas por procuração, essastinham namorado no Continente e só agora poderiam finalmentejuntar à pessoa com quem tinham casado visto ele não se poder ounão querer deslocar ao Continente. Mulheres casadas com ou sem filhos que finalmente se iam jun-tar aos seus maridos que tinham partido muito antes na tentativa deconseguir uma vida melhor do a que tinham no Continente. Homens que partiam também à procura de melhor vida algunsnuma completa aventura outros já com carta de chamada de amigosou familiares que já lá se encontravam e lhe arranjavam a tal carta dechamada que implicava uma grande responsabilidade para quem aarranjava que o tornava responsável por essa pessoa, a maior parteera gente humilde do interior do Território que nunca tinham visto umnavio ou mesmo o mar. 10

1956 - 1975 | 2006 - 2010 De entre todos esses passageiros minha Mãe eu e os meus doisirmãos também nos íamos juntar ao meu Pai que se encontrava emLuanda trabalhando como distribuidor de cerveja na Fábrica da Cuca. A bordo era tudo muito estranho e diferente de tudo a queestava habituado a começar nas refeições e acabar nos porõesonde dormíamos um salão enorme cheio de beliches uns em cimados outros, atravancados de cestos, garrafões de vinho, de azeite,chouriços, salpicões, presuntos, fruta e outras coisa que as pessoasqueriam levar consigo que impregnava o ambiente insuportável decheiros e odores, a par dos cheiros das suas roupas e corpos porlavar, misturado com cheiro de urina de putos que nunca tinham uti-lizado uma casa de banho na vida deles, e por isso urinavam para oprimeiro canto que encontrassem. Na primeira refeição a bordo foi um autentico desastre com aspessoas a tentar comer o que vinha para a mesa, misturando tudonuma gula desenfreada, resultado, aliado ao balanço do navio pas-sado um bocado era o pessoal todo a vomitar por todos os cantos dobarco, dia e meio depois de termos partido de Lisboa. Chegamos à Madeira, ficamos ao largo, alguns passageiros forama terra a bordo de uma lancha, os outros ficaram abordo, pequenasembarcações acercaram-se do navio com lembranças da Madeira,trabalho artesanal que vendiam, os passageiros atiravam o dinheiropara as embarcações e através de uma corda as lembranças eramentão içadas para bordo, outros pequenos miúdos, pediam que lheatirassem moedas para a água, que eles logo mergulhavam e iam embusca delas a caminho do fundo do mar em grandes mergulhos paradelírio de todos debruçados na murada do navio, assim se passaramas horas de paragem na Madeira. 11

CONTO DE SONHO VIDA REAL Dessa paragem resultou a primeira amizade feita a bordo doisirmãos que vinham bem do interior de Portugal e da minha idade umdeles o mais velho comprou um pequeno cavaquinho com cordas eumas fitas amarradas muito garridas, resultado todos queriam tocara pequena viola, tanto o aborrecemos com a insistência que ele atirouo cavaquinho pela borda fora e lá se foi a música, ouve um termo queeu aprendi com ele que nunca mais o esqueci e quando já em Portu-gal num encontro de pessoas retornadas de Angola em Coimbra nochoupalinho nos encontramos de novo ele e eu exclamamos ao mes-mo tempo “ Olha o compadre cossa à brilha”. O resto da viagem à excepção da passagem do Equador, no qualfizemos um exercício de colocar colete de salvação e ir para a nossabaleeira de salvação como se o navio estivesse a ir ao fundo com banhode água à mistura o que resultou numa grande confusão pois muitospensaram que era a sério, tudo acabou em bem, o resto dos dias foramsempre iguais até à nossa chegada a Luanda em 1 de Maio de 1956. Manhã muito cedo, a nossa ansiedade era muito grande, parasaber como iria ser a tal falada África dos pretos como se dizia emPortugal, com aproximação do navio ao cais de Luanda a cidade iatomando forma, primeiro à nossa esquerda um morro enorme e bemem cima um majestoso Forte da Barra, que defendeu no tempo dosconquistadores, a entrada da barra com os seus grandes canhões vi-rados para nós, hoje sem qualquer actividade. Em frente a cidade com os seus lindos e altos edifícios de lindascores e uma marginal que ainda hoje é o Ex-Libris da cidade, à nossadireita bem dentro da cidade plantado em cima de um brutal monte deterra a Fortaleza de São Miguel local que dava para ver a cidade e as 12

1956 - 1975 | 2006 - 2010praias da Ilha quer de dia quer de noite como miradouro e com umabeleza nunca vistas. Muito lentamente o navio lá se ia aproximando docais as pessoas iam-se tornando cada vez mais visíveis e nós na ânsiade vermos as pessoas que procurávamos íamos gritando estão ali,não ali, não está de camisa branca, até que sim lá conseguíamos verquem queríamos e aí eram os gritos os acenos as perguntas, feitas asmanobras de atracagem do navio, começaram as formalidades de de-sembarque já com as autoridades a bordo. Tudo com muita lentidão àmistura com empurrões todos a quererem ser os primeiros, finalmentechegou a nossa vez de sair e pela primeira vez pisamos solo africano. É uma sensação muito estranha de sons, cheiros e vozes e àmistura uma embriaguez que nos põe tontos e sem reacção. Os Europeus num tom de pele muito tisnado, mesmo amarelo tor-rado num contraste de vestimentas brancas e muito suados, em contrapartida os negros calmos pachorrentos transpirando muito e com osolhos muito abertos olhando as cenas de chegada dos abraços, dosbeijos, eram os bagajeiros que transportavam as nossas malas para oscarros que nos levariam enfim para os locais que cada um iria habitar. Postas as malas na carripana que nos veio buscar emprestada ameu Pai pelo Sr. Pires que nos transportaria à casa que iríamos habitarno Bairro da Cuca, a minha Mãe na cabine, e nós os três na carroçeriaque era aberta e junto com as malas, com os olhos muito abertos olhan-do numa ânsia desmedida de querer mirar tudo numa só vez, marginalfora que encanto de Avenida ladeada do lado direito por Palmeiras jun-to ao mar formando então a tal famosa Baía de Luanda, um dos muitoslocais que muito me marcaria para o resto da minha vida. 13

CONTO DE SONHO VIDA REAL Deixamos para trás a avenida e seguimos outras ruas muitopoucas com asfalto a maioria eram picadas em terra muito ver-melha levantando uma poeira que à mistura com o suor que noscomeçava a escorrer pelo corpo sujando a roupa e o corpo, e nostornava indolentes. Algumas picadas eram somente os sulcos que os carros deixa-vam ao passar, um pequeno desvio e lá ficava um enterrado isto semcontar com os grandes buracos que quando chovia formavam grandeslagos que eram a alegria de muitos negros miúdos que chafurdavamnesses lagos de uma cor avermelhada com tons de castanho, e queserviam como Piscinas. Água canalizada era um luxo para alguns, essas lagoas serviamtambém para nascer e criar milhões de mosquitos que eram uma dasmaiores pragas que cedo tivemos de começar a enfrentar, começando 14

1956 - 1975 | 2006 - 2010logo por tomar comprimidos contra o paludismo, camoquine todos osdias e resoquine todas as semanas, águas fervidas e passadas pelofiltro um bonito aparelho de louça com uma vela também em louça poronde a água teria de passar e ser então filtrada saindo através de umatorneira metálica era uma água fresca e saborosa, depois de muitasperipécias lá chegamos ao Bairro da Cuca. Nome dado pelo facto de lá existir aFábrica da Cerveja Cuca, para onde o meuPai veio trabalhar quando da sua vinda paraAngola, começando por ser distribuidor damesma cerveja pela Cidade e arredores, emais tarde chefe do fabrico da mesma. Chegados à casa que viríamos a habi-tar até 1961, a nossa excitação era enorme,começamos a correr à volta da mesma comoloucos para a conhecer, era uma casa recuada no terreno em que es-tava implantada de estilo Colonial como tantas outras, descarregadasas malas começamos logo por atacar bananas que o meu Pai tinha nadispensa da casa, um grande cacho de grandes e maduras bananas,percorridas as divisões da casa e um grande anexo que ficava na par-te de trás da casa. Nesse mesmo dia fomos entregar a carripana ao Sr. Pires queera Construtor Civil, mas na casa em que vivia que era dele e muitogrande servia também de Pensão para algumas pessoas que enquantonão organizavam vida ali estavam hospedados tal como o meu Pai, eera gerida pela Esposa. 15

CONTO DE SONHO VIDA REAL O casal tinha duas filhas, a Deolinda e a Maria, que eram sen-sivelmente da nossa idade, fomos então apresentados ao casal e ásreferidas filhas e foi aí que começou a história da minha vida quan-do encarei com uns olhos grandes expressivos e muito bonitos, eraa Maria a Mulher que viria a marcar para sempre a minha vida, tinhaeu 11 anos feitos logo em Junho de esse ano e ela 9 anos de idade,alguns passeios foram dados pelos dois casais e respectivos filhose fomos também brincando e nos enamorando lentamente até che-gar ao namoro oficial que durou até aos 18 anos, o pedido foi feitocom um cartão que tive que comprar, onde em cada canto tinhauma frase, que previa todas as situações de um pedido que não erafeito verbalmente, ao centro vinha impresso o respectivo pedido denamoro e em cada canto a respectiva resposta, o sim, o não, talvezou vou pensar, teria que ser dobrado o canto escolhido e devolvi-do, naturalmente o sim foi o escolhido e começou o nosso namoroe também os nossos tormentos, pois esse namoro não foi bem vistopelo meu Pai que o contestou e me ameaçou durante todo o tempoque ele durou, pondo mesmo grandes dúvidas na minha cabeçaacerca da honradez da minha grande paixão, chegando mesmo ainsinuar que ela era um joguete nas mãos dos hospedes da pensão,no tempo em que isto se passou e dada a minha imaturidade issotinha uma grande importância, a mulher que tanto queria não era aaquilo que pensava e tanto que acabou mesmo por conseguir comque termina-se o namoro, decorria o ano de 1961. Tudo terminado, cada um para seu lado, passado um ano volteia namorar, conheci uma garota namoramos quatro anos e casamos,foi a mãe dos meus dois filhos, casamento que durou trinta anos, 16

1956 - 1975 | 2006 - 2010gostei muito da minha esposa, mas nada como o grande amor que foio primeiro, nunca mais essa mulher saiu do meu pensamento. Não nos voltamos a ver em Angola, e não soube mais do seu pa-radeiro, em 1975 regressei a Portugal devido à descolonização, e paraminha grande alegria, casualmente encontro a irmã que me diz quea Maria também estava em Portugal, com isto tinham passado trintaanos sem nos ver-mos pedi através da irmã que ela me recebe-se oque veio a acontecer. Foi um encontro por demais emocionante, mas muita coisa tinhaacontecido nas nossas vidas, nada era como antigamente, ela tinha avida e o casamento destroçado, pois também casou, mas também nãodeu certo, teve que criar três filhos sozinha, o marido dividia a vidacom ela e uma amante, quando nos encontramos ela estava com ostrês filhos sozinha em Portugal, o marido tinha ficado em Angola coma referida amante. Com o meu Divórcio, não voltei a ter qualquer ligação com maisninguém, um dia a Maria telefona para o meu trabalho mas como euestava muito ocupado, pedi para ela ligar à noite para minha casa, elamuito naturalmente e porque não sabia do meu divórcio, pergunta e atua esposa, eu então revelei que já não era casado. A Maria no primeiro fim de semana veio ter comigo. Vivemosentão 3 meses juntos pela primeira vez e fundimos finalmente o nossogrande amor que nunca morreu, mas existe sempre um mas, a Mariatinha e tem um grande drama na sua vida, os seus três filhos todosmaiores de idade e vivendo com ela são pessoas que estão metidas nadroga, e não nos deixaram em paz. 17

CONTO DE SONHO VIDA REAL Adultos que somos conversamos e terminamos a nossa ligação,ela foi viver na cidade onde vivia e eu fiquei onde estou, falamos aotelefone sempre que podemos, a chama continua, mas a vida nem sem-pre é como nós queremos, mas uma coisa não consegue apagar esteamor que dura desde 1956. 1975 a 2.ª grande emoção, ano em que viajei de regresso a Por-tugal, devido à Descolonização e Independência de Angola, um re-gresso forçado de dor, revolta, inconformismo, não entendia porquetinha que sair, se eu tanto lutei na clandestinidade pela mesma luta delibertação e Independência daquele era e é o meu país, a minha terra.foi terrível só eu sei o que sinto e não consigo transmitir a ningém ador no meu pensamento, como fui rasgado por dentro, uma ferida queainda não sarou e só será curada com o meu regreso em definitivo ecomo angolano, que me sinto e sempre senti. A situação em 75 era pordemais perigosa e eu tinha dois filhos um com 6 e outro com 8 anos,ninguém controlava ninguém era o caos. Assisti a coisas que não vou para já revelar, tive armas aponta-das, passei fome e sede, por uma guerra civil, e eu então sacrifiqueia minha vontade de ficar, e coloquei a família em segurança, mesmoassim eu fiquei até 11 dias antes da Independência. Sózinho, e só vim para Portugal com bilhete de avião de ida evolta, quando as forças do MPLA me quiseram mobilizar para a frentede combate como angolano que me consideravam devido à minha lutaconstante ao lado deles, um dos soldados como me conhecia bem, euestava a conduzir o meu carro, mandou inverter a marcha e dissevai-te embora senão sobes no camião e vais para frente de combate, 18

1956 - 1975 | 2006 - 2010inverti a marcha com muito cuidado e fui para casa, nessa mesmanoite fui para o aeroporto e por azar o avião avariou, voltei para casade novo e sempre a ouvir rádio que era o nosso ponto de orientação,por volta das 6 da manhã um comunicado avisava os passageiro doavião, que ele partiria por volta das 12 horas. Nova correria para o aeroporto, quem controlava o aeroportoeram já forças mistas dos 3 movimentos de libertação e das forças Por-tuguesas, fui revistado por um elemento do MPLA que eu não conheciaeram dos que tinham chegado do interior do país, espalhou tudo no chãoe depois mandou que fosse eu a apanhar tudo e mandou-me embora. Com uma grande revolta dentro de mim pois não merecia taltratamento, mas como digo ele não me conhecia e lá fui eu direito aoavião completamente atordoado com tudo que me estava a acontecer,embarquei e só me senti em segurança quando o avião estava bemalto. O avião rolava na pista para levantar voo e quando começou asubir e eu comecei a ver a cidade a ficar para trás, comecei a chorarsilenciosamente de raiva e dor até chegar a Portugal. Mas prometi a mim mesmo que haveria de voltar nem que fossepor um dia e tirar a dor do meu pensamento e assim aconteceu 32anos depois de abandonar Angola. Já em Portugal um mês depois, para minha surpresa vieram-mebuscar para regressar e eu não aceitei, com a minha vida completa-mente desfeita o que é que ia fazer para Angola, já não tinha casa nãotinha a minha Indústria, não tinha carro, nem mobílias, revoltado disseNÂO e aqui estou vivendo como um angolano no exílio. 19

CONTO DE SONHO VIDA REAL A minha casa decorada como está é a minha áfrica, junto coma música que me acompanha sempre e a Moamba que todos os finsde semana a mulher Moçambicana com quem tenho uma ligação à 12anos faz, com uma filha desta ligação com 11 anos completam a minhaafricanidade e tranquilidade. Em 1996 certo dia estava em casa no meu computador quandochegaram umas visitas o Eng. Pedro Lufilak angolano pessoa dasminhas amizades e um outro Sr. também angolano que eu não conhe-cia, fomos apresentados o sr. estudava na Universidade de Aveiro,para tirar o Mestrado e de seguida o Doutoramento cujo nome é JoséDomingos Calelessa. O Eng. Pedro colocou-me uma questão se fazia um grande afavor à pessoa que era o Calelessa de fazer no computador as saí-das e as encadernações da tese da defesa do Mestrado visto queninguém quis fazer, isto era quinta feira e a defesa era na segundafeira próxima, eu disse que era muito difícil pelo tempo curto quetinha mas que poderíamos tentar, e assim fiz eu de dia o meu filho denoite, o Calelessa defendeu e ganhou o Mestrado. A partir desta data começou o meu regresso a Angola, criamosuma grande amizade, cena que se mantém até hoje, apesar da distân-cia que nos separa. Em 2001 ele regressou a Angola a convite do Governo, concorree ganha as eleições para o lugar de Reitor (Decano em Angola) da Uni-versidade Agostinho Neto em Benguela, lugar que ocupou até 2010, eufiquei em Portugal a gerir a conta bancária do Calelessa bém como a 20

1956 - 1975 | 2006 - 2010Bolsa de Estudos, para minha total surpresa o Calalessa desde quesaiu para Angoal fez um silêncio de 5 anos apesar da minha tentativade contacto, fiquei muito revoltado com tal atitude, porque não enten-dia porque razão fazia este silêncio, paguei tudo que havia para pagare encerrei a conta bancária dele. Em Maio de 2006 foi recebido em casa um telefonema deBenguela, isto era Domingo, como eu não estava em casa, durante oalmoço deram-me o recado que o Calelessa queria falar comigo, novatentativa da parte dele e eu não atendi, ele então marcou para as 19h. novo contacto e disse que era muito importante que eu atende-se,19,30 voltou a tocar o telefone e eu atendi, a primeira coisa que lheperguntei se ele ainda era vivo, ele respondeu tu não vais entender,mais tarde eu te explico a situação, agora escuta o que eu tenho parate dizer, tens na tua conta bancária 1.300 Dolares, em Agosto compraa passagem com esse dinheiro e vem para Angola e não faças maisperguntas, vou realizar o teu sonho tão querido. Sou hipertenso quase caía para o lado, tal foi a minha emoção.Comprei Bilhete fiz Passaporte, vacinas, Visto de entrada, passa-mos a partir desse dia a falar regularmente, a certa altura pergun-tei-lhe como eram as coisas em termos de dinheiro e quanto é queprecisava levar para fazer face às despesas, comer, dormir etc., elerespondeu-me trás o que quiseres para comprares algumas coisaspara levares para Portugal, porque esta deslocação é totalmentepaga por mim, não te preocupes, tem calma contigo, para chegarescá bem, não te enerves sabes que és hipertenso, e agora que já sa-bes que vens é só ficar calmo. 21

CONTO DE SONHO VIDA REAL Não dá para explicar o desatino que eu tive a partir de Maioaté Agosto, não comia nem dormia em condições, já me imaginavalá, tive que recorrer à Médica de família contando o que o que seestava a passar, ela alterou a minha medicação para um compri-mido por dia do mais forte que existia no mercado e um calmanteaté viajar para Angola, e deu-me um conselho, tente todos os diasse mentalizar de que tudo vai correr bem e viajar sem problemas,assim fiz, mas era pedir o impossível, quando chegou o dia de via-jar, não deu, passei a noite sentado na cama e logo manhã cedo jáeu estava pronto, pedi ao meu filho que me leva-se à estação decomboios em Aveiro, não quis que ninguém fosse comigo a Lisboa,apanhei o comboio das 7,00 h. o Alfa e lá fui para Lisboa, levei umMP3 e com as minhas músicas Angolanas e auscultadores nos ou-vidos, com uma ansiedade que só visto. Cheguei a Lisboa, apanhei um Táxi para o Aeroporto, malcheguei fui logo fazer o despacho das bagagens, fui para a salade embarque, as horas não passavam, os ponteiros não andavam,finalmente a primeira chamada para o voo eram 14,50 quando em-barcamos no avião das linhas de Angola (TAAG) rumo ao meu son-ho, mesmo sabendo que ainda tinha 7,00 horas as mais difíceis daminha vida. 1 hora depois do embarque finalmente o avião rolou na pistae levantou rumo aos céu azul e só quando estou com 1 hora de vooé caio na real, era verdade se o avião não cair eu chego a Luandapor volta das 22,00 horas, ouvindo música e tentando escrever, lá fuirumo a Luanda com a minha ansiedade a aumentar de volume, até 22

1956 - 1975 | 2006 - 2010que a 1 hora da chegada comecei a ficar muito tenso e tive que tomaro segundo comprimido para a tensão, comecei a rezar. Meu Deus agora que estou a pouco mais de uma hora de chegardeixa que eu concretize o meu sonho, que nada aconteça, felizmenteque tudo correu bem e ainda bem que o voo entrou pelo lado opostoao da cidade de Luanda, logo não sobrevoei a cidade e aí a minhaemoção não foi tão grande, mas a minha alegria essa por demais bemmaior, quando o avião rolava pela pista o meu coração batia tanto quetive medo que ele salta-se pela boca, encostei-me à cadeira fechei osolhos e chorei baixinho. As lágrimas rolavam como rolava o avião na pista e penseifinalmente por um dia eu estava a concretizar o meu sonho de pizarsolo Angolano 32 anos depois de sair, obrigado Meus Deus. As horas que tive que passar no Aeroporto já não tinhamimportância nenhuma, já cá estava e isso é que era importante,posto na fila para passar a Polícia de Fronteiras, nem que algocorre-se mal já eu tinha pisado solo de Angola, quando chegou aminha vez de ser vistoriado o Polícia fez muitas perguntas, mui-to embora eu tivesse tudo legal, mas como sabia que era normalesse interrogatório para conseguir (Gasosa) termo de conseguiralgum dinheiro tinha 5 Dolares preparados, quando ele se cansoude fazer mais perguntas e como eu não avançava com dinheiro,chegou perto de mim e disse então Mano o meu cafézinho. Retirei os documentos e coloquei dentro os 5 Dolares e entregueide novo, ele retirou o dinheiro e finalmente carimbou a minha entrada, 23

CONTO DE SONHO VIDA REALdando-me uma palmada nas costas disse tenha uma boa entrada emAngola mano seja bem vindo. Passei para a sala das malas e aí o reencontro com o Calelessaque me levantou em peso e em altos berros, me abraçou e disse final-mente realizo o teu sonho e o meu pelo que me fizeste à 10 anos atrás,sem ti eu não estava onde estou e seria o que sou, logo nunca vouesquecer o que me fizeste, para mim como já não tenho pai, tu és o paique eu gostaria de ter, e era sempre apresentado como tal, dizendosempre sem este homem eu não tinha conseguido o meu sonho. O Calelessa estava acompanhado de de uma Sr.ª que quandochegaram as malas o que demorou cerca de duas horas para sairem,perguntou as tuas malas são estas, sim respondi, ela então dissepegando nas malas vem atrás de mim e lá fomos, passando pela Polí-cia sem serem vistoriadas, e eu sempre à espera que eles me cham-assem e pergunta-sem onde é que voçê vai, mas nada disso aconteceuporque a Sr.ª que tinha as minhas malas era também Polícia masestava de folga e à civil. Chegados ao Parque Automóvel comecei a respirar o ar de An-gola que também conhecia, os cheiros que pairavam no ar, quandoentrei no Jipe da Universidade e me foi apresentado o Félix, motoristaparticular, chefe dos motoristas da Universidade e Guarda Costas doCalelessa e que sempre me acompanhou desde a chegada até partirpara Portugal. Saimos do parque de estacionamento e logo pedi ao Calalessaleva-me já à (Mutamba) centro de saída dos (Machimbombos) Autocar-ros das carreiras para todos os bairros da Cidade onde eu apanhavao 17 para o Bairro da Cuca onde morava. 24

1956 - 1975 | 2006 - 2010 E em seguida leva-me para a Ilha de Luanda um dos sítios par-adisíacos de Luanda, junto à Marginal de Luanda, fomos jantar naponta da Ilha eram cerca das 3 da manhã, era tal a minha emoção quemal toquei na comida, aliás foi sempre assim nos 15 dias que lá pas-sei, mal comia e mal dormia, queria rever tudo à minha volta e à noitecomo tinha levado a máquina fotográfica digital, ficava a ver tudo quetinha fotografado e assim fiz sómente 700 fotografias, cerca das 5 damanhã foram levar-me ao Hotel Forum para tentar descansar a pri-meira noite em Luanda. 15 dias depois regresso a Portugal e já em Luanda pronto paraapanhar o avião à noite, pedi ao Calelessa que me levasse ao fundo daIlha para eu me despedir da cidade numa vista nocturna linda demais. Pedi ao Calelessa e ao Félix que ficassem na viatura enquantoeu ia junto ao mar, parei junto à água e olhando para a Marginal le-vantei os olhos para o céu e exclamei: “Meu Deus, uma vez em Angola,porque razão tenho que voltar a Portugal?”. Cai de joelhos na areia e chorei convulsivamente, quando acalmeivoltei à viatura e o Félix perguntou, “o senhor está a sentir-se bem?”e o Calelessa respondeu “eu sei o que vai na alma dele”, rumamos aoaeroporto e parti para Portugal. 25

CONTO DE SONHO VIDA REAL Agosto de 2008, volto de novo a Angola 2 anos depois, agora comum projecto para trabalhar e ficar finalmente no meu país do coração,são 7,21 da manhã do dia 23, estou no Comboio Alfa a caminho de Lisboa,para apanhar o Avião das 11,45, a mesma emoção por voltar de novo. Chegados a Lisboa por volta das 8,45, fomos para o Aeroportode Táxi, feito o Chek-in, foi informado que não tinha-mos avião, fomoscolocados no Hotel Marriot, em principio até ás 23,00 h., mas novoatrazo e ficamos até ás 3,30 da manhã, quando o Autocarro nos veioapanhar, o Avião sairia ás 6,00 h de Domingo dia 24, colocados no arfoi um voo muito tranquilo. Chegamos a Luanda às 13,00 h., 2 viaturas estavam á esperae arancamos parao Lobito cerca das 15 horas e chegamos por vol-ta das 21,30 h., jantamos no Sumbe, onde em 2006 jantei no mesmoRestaurante. Chegados ao Lobito ficamos no Hotel Navegante no Lobito Ci-dade que está muito bonita e limpa, em 2 anos levou uma transfor-mação muito grande, aliás toda a Angola, está em obras, a estradaLuanda Lobito está uma pista, fizemos o percurso em 7 horas, o queem 2006 levou dois dias para o mesmo percurso. Hoje dia 2 vou viajar do Lobito para Luanda no voo das 15,00 h,e dia 5 viajo para Lisboa, um dia antes da Eleições de Angola, aquisó dá MPLA, são 14,25 estou na sala de embarque do Aeroporto daCatumbela, para sair ás 15,30 rumo a Luanda, feito o Chek-in agora ésó aguardar o voo. 26

1956 - 1975 | 2006 - 2010 Hoje dia 2 é feriado no Lobito, mas o movimento triplicou com acampanha eleitoral um trânsito infernal estamos a 4 dias das Legisla-tivas, finalmente ás 16,20 saimos no voo Sonair rumo a Luanda, foi umvoo de 35 minutos muito tranquilo, tirei algumas fotos aéreas, servi-ram uma ligeira refeição e aterramos em Luanda cerca das 17,10, saidatranquila depois de uma seca de 1,30 á espera de boleia. O Boss veio me apanhar mas estava preso no trânsito infernalque é Luanda, colocado no Hotel Mundial no Largo Serpa Pinto,coloquei as malas no Quarto e desci para jantar, um Linguado As-sado que estava uma delícia, como sobremesa ananás e um Café,voltei ao quarto e foi uma noite quase sem dormir, talvez por estarna minha cidade Luanda e sentir de novo aquela emoção própria dequem passou uma parte importante da minha vida, 5,30 da manhã jáestava a ver Televisão até ás 7,30 hora que desci para o Matabicho,2 fatias de Abacaxi 1 pão com fiambre, 1 fatia de bolo, sumo e café,aliás foi sempre assim durante a minha estadia, cerca das 10,00horas vieram-me apanhar para rumar o aeroporto 4 de Fevereiropara colocar o OK no bilhete para viajar no dia seguinte ás 22,00horas ruma a Lisboa. Dia 1 de Setembro no Lobito fui almoçar no Restaurante Nonom umRestaurante Sel-Service Comida a peso, quando levanto as tampas umdos pratos era Moamba de peixe, com feijão de Óleo de palma, escusadoserá dizer que alinhei logo no dito a farinha era de milho não gosto tantofoi uma delícia, por volta das 16 horas fui com a Nádia a nossa executivaà Restinga ela foi almoçar era Calulu de carne, voltei na alinhar a meiasc/ela, ontem saímos toda a manhã e fomos almoçar na Restinga come-mos um Linguado que atravessava o prato todo estava divinal. 27

CONTO DE SONHO VIDA REAL Dia 22 de Fevereiro de 2009, são 14,00 Horas e estou a escrev-er estas linhas dentro de um avião rumo a angola, sai eram 10,30 deLisboa e estou a 2,30 horas de chegar a Luanda finalmente estou deregresso para ficar e vou tentar a dupla nacionalidade. 13 de Agosto de 2010 outra página importante da minha vida seinicia, são 16,30 horas em Luanda, estou no Aeroporto para embarcarno Avião da LAM linhas aéreas Moçambicanas rumo a Maputo parame reunir com a esposa e filha e os enteados João e Narciso juntocom o resto da família Moçambicana e digo importante porque voucumprir com a tradição de África embora já casados e com uma filhacom 10 anos vou realizar o (LOBOLO) Moçambique (ALAMBAMENTO)em Angola é uma cerimónia do pedido da mulher com quem queremoscasar isto se deveria passar antes de casar mas como vivemos emPortugal onde a conheci e casei só agora vai ser possível resolveresta tradição, está então marcada para dia 27 de Agosto estou muitoansioso por poder passar por mais esta rica experiência como euro-peu na tradição africana uma cerimónia que eu conheço em Angolaonde vivo e já assisti, mas poder passar por isso como vou fazer, é umpasso muito importante e muito rico e poder transmitir á minha filha amesma tradição. Cheguei a Maputo ás 21 Horas Locais depois de uma viagemde cerca de 3,30 horas, sem visto de entrada o mesmo é feito nolocal da Imigração no aeroporto o que me agradou, feitas as for-malidades e recolhida a minha bagagem sai, estava á minha esperao senhor Augusto pessoa que realiza transporte de pessoas naviatura pessoal como taxista, iniciada a viagem até á residência 28

1956 - 1975 | 2006 - 2010alugada e fora da cidade cerca de 30 klm, condução á esquerdasistema Inglês o que provoca alguma confusão inicial, chegados aobairro sem estrada, mas com caminhos de terra areal o que me fazrecuar aos tempos de vida em Angola em 1956. Chegamos a casa noite fechada a uma vivenda alugada deluxo, mas muito degradada, água canalizada comprada por todos osmoradores do bairro, luz comprada na quantidade que se quer oudos meticais que tem disponíveis trazemos o recibo e introduzimosno contador os códigos que vem no mesmo e passamos de imediatoa ter mais um tempo de luz, no caso da água se um ou mais mora-dores não pagar a água ficamos todos sem água pois eles cortam oque é uma grande injustiça, coisas de África, o bairro onde estou temo nome de zimpeto que dista de carro 45 minutos da capital Maputo,bem no interior, nada de comércios a não ser barracas que vendemde tudo na rua, pão, talho, bebidas frutas, etc. A casa que vim habitar tem um grande jardim lugar para dois car-ros, uma grande sala de entrada uma grande sala de jantar 3 quartoscasa de banho uma grande cozinha onde almoçamos e jantamos, umarrumo para guardar as compras de alimentação, esta é uma das partespositivas, a negativa todas as janelas têm redes contra os mosquitos,mas pouco adianta nunca vi em toda a minha vida de África tanto mos-quito, tropeço neles, são centenas em cada divisão e temos todos quedormir com um mosquiteiro em cada cama a cobrir completamente acama, para além de baratas e ratos por toda a casa, a outra parte positi-va que me completa comparada com a minha vida na Europa onde ten-ho muita limpeza sim, muita ordem e disciplina sim, rodeado de blocos 29

CONTO DE SONHO VIDA REALde cimento sim, mas não tenho o oxigénio limpo como tenho aqui livrede escapes, cheiro a óleo um ambiente poluído como tenho na Euro-pa, um pica-pau que me acorda todos os dias batendo com o bico najanela, os sons de pássaros diversos que ás 5 da manhã fazem chegaraté mim o acordar do mato dessas aves lindas com cores incríveis, ocheiro de uma madeira queimada, de uma comida gostosa, das borbo-letas, grandes lagartos estes são as coisas que dificilmente vemos ousentimos na Europa, encontrei um povo muito bom com muita culturamuito superior a Angola onde vivo e trabalho, um pouco fechado e mui-to sofrido, uma vida muito difícil tudo muito caro para a bolsa deles,com um salário mínimo inferior a 50 Euros. Como não tem petróleo os combustíveis são caros, bem maiscaros do que em Angola, sou o único europeu a viver neste bairroo que causa grande surpresa nos habitantes, palmilho as ruas a pésempre que preciso de fazer as compras para casa em conjunto com aminha mulher moçambicana, como na rua seja fruta espigas de milhoassadas, um coco fresco bebo a água e como o interior ou outrascoisas numa liberdade que na Europa já não é possível. Moçambique tem uma gastronomia muito boa bem diferente deAngola, ou Portugal, um artesanato muito rico e bonito vendido emplena rua em locais já conhecidos por mim pois já estive cá em 1999de visita 15 dias, começam sempre por pedir um preço muito alto eacabam sempre depois de muito regateado dar dois objectos pelopreço de um, escrevo estas linhas dia 23 de Agosto a poucos diasda cerimónia do (Lobolo) vulgo pedido da mulher para casar, pedi-do que vai ser feito atrasado pois já vivemos e casamos pelo Civil 30

1956 - 1975 | 2006 - 2010mas a tradição africana manda que seja feita esta cerimónia tradi-cional que será feita dia 27 na casa do pai da esposa já falecido vouassistir pela primeira vez e como europeu será muito gratificantepara mim enriquecendo cada vez mais a minha vida já muito rica devida africana. Feita a cerimónia, no dia seguinte dia 28 de Agosto será feito ocasamento pela igreja mas ao jeito africano, já foi comprado um Boi,30 grades de refrigerantes, sacos de arroz, feijão será servido na casaque alugamos e em pleno jardim com 50 mesas para cerca de 100 pes-soas mais 2 mesas de honra grandes onde ficam os Noivos os Padrin-hos e Família um almoço festa, com grupos de dançarinos tradicionaisvestidos a rigor e que vão dançar num espaço reservado em frente damesa de honra, o resto dos convidados serão distribuídos pelo jardim,tudo decorado a rigor, começaram a chegar as panelas gigantes quevão confeccionar todos os pratos tradicionais desde o boi e tudo mais,amanhã dia 27 chega um grupo de mulheres que vão passar a noitea cozinhar para que tudo esteja pronto, quando chegar-mos da igrejacom os convidados, num desfile pela cidade de Maputo carros decora-dos e filmados, á chegada a casa um grupo de mulheres vestidas tradi-cionalmente vão nos receber com danças e cânticos de boas-vindas. Amanhã dia 27 de Agosto vai ser finalmente feito o pedido,(Lobolo) na zona da cidade da Matola, vieram em busca dos va-lores acordados, um garrafão de vinho, 1 saco de batatas, 1 sacode cebolas, 1 saco de arroz, 5 frangos, panos tradicionais, e algumdinheiro, depois do pedido feito segue um almoço com os noivos,padrinhos, e família. 31

CONTO DE SONHO VIDA REAL Dia 28 Sábado vou envergar pela segunda vez um Fato e Grava-ta, a primeira vez foi no meu 1-º casamento e agora no 2-º casamento,sei que me fica bem, mas não tenho, nem uso no meu visual. Dia 3 de Setembro, estou dentro do Avião da Lam de regressoa Angola, dentro de 4 horas estou em Luanda, regresso depois deter realizado tudo o que tinha para fazer, o Lobolo, o casamento pelaIgreja, visitar a família e rever a minha filha Kassula. Tudo corria bem até que dia 1 de Setembro estalou a revolta dopovo moçambicano em Maputo e Matola, já estava um pouco refém porvir habitar fora de Maputo num lugar ermo sem ruas asfaltadas longede tudo e sem viatura, com a revolta do povo fiquei refém em casa ecom muito receio, por mim e pela família, além disso único europeu aviver no Bairro do Zimpeto e sem nenhuma protecção, correu tudo bematé este momento, mas estou muito preocupado pela esposa e filha queficaram mais uma semana, para viajar hoje tivemos que sair de casa ás4 da manhã correndo o risco de sermos travados, nada aconteceu feliz-mente ocorreram muitos tumultos, vários mortos muitos feridos, muitossaques, bombas de combustíveis queimadas não sei como é que vãoparar estes conflitos, com tudo isto deixei para os últimos dias s com-pras e passeios e nada fiz. Dia 27 levantamos muito cedo para partir para Matola a fim derealizar o Lobolo , alugamos um chapa (vulgo Táxi) com capacidadepara 15 pessoas e fomos direitos á Matola, algumas paragens parareceber os Padrinhos, mais um casal em representação do Pai daNoiva (já falecido) chegados á casa da Madrasta da Noiva, pois o 32

1956 - 1975 | 2006 - 2010pedido teria que ser feito na casa do Pai, andei pela primeira vezno chapa, recebidos pela família, fomos encaminhados para a sala,menos eu não podia participar, entregues as coisas para o pedi-do, como os panos, o dinheiro, as bebidas e tudo o que tem que sercomeçou a cerimónia, com todos os elementos, tais como a Noivaos Padrinhos, representante do Pai a Madrasta e restante Família, amim fecharam-me num quarto, fora no quintal os preparativos para oalmoço começaram, fora no quintal em uma esteira ficaram sentadasas cinco mulheres mais velhas, de vez enquanto um elemento vinhacomunicar com elas e recolher o consentimento, este pedido duroumais de uma hora, é muito discutido até ser autorizado o casamento,chegado ao consenso um estalar de gritos e palmas é o sinal quetudo está bem e foi autorizado, a partir daí já participo e sou aceite nafamília, é uma bonita tradição africana que eu fiz questão de cumprir. Segue-se a lavagem de mãos outra tradição africana alguém trazuma bacia com água e uma toalha e todos temos que lavar s mãoscomeçando sempre pelos mais velhos regra que no servir do almoçotambém é assim, almoçamos com toda família e padrinhos, feitas asfotos e já noite dentro regressamos a casa, vieram com nós algumassenhoras que iriam em casa começar a cozinhar toda a noite, quandochegamos a casa, começaram também a chegar as 30 grades de bebi-das, as mesas e as cadeiras para 100 convidados e os ornamentostudo muito bonito. O arco para a entrada do portão de casa, logo de seguida chegouuma carrinha com o Boi e a lenha para os fogareiros, tudo organizadoe realizado por grupos de pessoas do Bairro e da Igreja, grandes pan- 33

CONTO DE SONHO VIDA REALelas e tachos tudo emprestado, os jovens da aparelhagem da música eas respectivas colunas que depois de as colocar tocaram toda a noitede sexta tudo isto é incrível, difícil de imaginar. O casamento dia 28 de Agosto estava marcado na Igreja da SéTemplo da IURD no centro de Maputo, para as 10,30 horas, logo o le-vantar foi ás 5 da manhã, banho, comer qualquer coisa e vestir, vestifato pela segunda vez na minha vida 1966 e 2010 no primeiro e no se-gundo casamento, gostei de me ver. Entretanto chegou o homem que veio filmar o casamento, comele vieram os Padrinhos e a viatura toda decorada que nos trans-portou para a cidade e Igreja , no lugar da matricula frente o nomeda Noiva, na parte traseira o nome do Noivo, chegou entretanto umgrupo de senhoras tradicionalmente vestidas e um grupo de Jovens,rapazes e raparigas, que vão fazer o cortejo, atrás dos noivos, saí-mos de casa na nossa frente a nossa filha e um pequeno rapaz comalmofadas muito bonitas para transportar as alianças, iniciada aviagem até Maputo cerca de uma hora sem contar com o engarrafa-mento, o que aconteceu. Chegamos á Igreja eram 11 horas e 45 minutos, iniciamos a en-trada a Madrinha entrou comigo até ao altar, a Igreja decorada arigor, logo de seguida entrou a noiva pelo braço do Padrinho se-guida do grupo com cânticos muito bonitos para mim tudo muitooriginal e fora do normal, entregue a noiva ao noivo, o Pastor deuinicio ao casamento, mandou-nos subir ao altar e sentar, mais osPadrinhos todos os restantes convidados ficaram na sala, feitas as 34

1956 - 1975 | 2006 - 2010leituras da Bíblia e as perguntas normais aos noivos e colocadas asalianças e feitas as assinaturas. Lugar para a dança dos noivos, logo de seguida eu com amadrinha a noiva com o padrinho, outra coisa invulgar nos casamen-tos da Igreja católica mas vulgar em África onde estas cerimónias sãode alegria e partilhada por todos com muitos aplausos e cânticos,descemos do altar e recebemos os cumprimentos dos convidados efomos rodeados de cânticos muito bonitos. Regresso a casa ainda passamos pelo jardim dos noivos parafotografias, alguma admiração nos outros noivos por verem um bran- 35

CONTO DE SONHO VIDA REALco a casar com uma africana, no almoço tudo muito bem organizadosegue o almoço, a dança e a entrega das prendas com dança, é istoáfrica bem diferente da europa. 36

1956 - 1975 | 2006 - 2010 Cresci branco de Segunda Calcinhas ou Kaluanda Cresci com os pés no mar na Cuca e no SambizangaBrinquei de pé descalso em poças de águas castanhas tive lagartas da caçanão escapei às matacanhas Comi mangas sape-sape Fruta-pinha tambarino mamão a gente roubava no quintal do velho ZindoPirolito que pega nos dentes Baleizão, Paracuca e carrinhos de rolamentos numa corrida maluca Tinha o Gelo, tinha a Biker Miramar e o Cine Colonial O Ferrovia e o MarítimoChás dançantes no Tropical 37

CONTO DE SONHO VIDA REAL O n´Gola era o rítmo O liceu uma lenda Kimuezo e Teta Lando e os Ases do Prenda Havia velhas que fumavam e velhos com ar de sábio enquanto novas músicas se insinuavam na rádio Luanda a cidade é linda é de bem querer a minha cidade é linda vou amá-la até morrer Quem estudou no salvador? Quem se lembra do Videira? e das garinas de bata branca nossas colegas de carteira? Depois havia o Kinaxixe Futebol era nos Coqueiros havia praias, um mar quenteSavanas, imensas, Imbondeiros 38

1956 - 1975 | 2006 - 2010 E havia o som do vento o cheiro da terra molhada as chuvas arrasadoras o fogo das queimadas E havia todos os avilosdo progresso e da libertação que lutaram até serem livres e independentes Cresci branco de Segunda Calcinhas ou Kaluanda Cresci com os pés no mar na Cuca e no Sambizanga Angola é linda é de bem querer de Cabinda ao Cunene vou amá-la até morrer 39





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1956 - 1975 | 2006 - 2010 45

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