Duas Mãos DireitasEpitáfio INo dia que morrerQuero ser enterrado debaixo do teu céuTu, que apesar de tudo, és a verdade das coisas inteiras. 9Apeiron Edições |
N. M. Cruz Rosa Epitáfio IIQuando eu morrerNão quero o meu nome gravado na pedra friaNão quero que me incendeiem num corredor de açoNão quero as cinzas da minha carne largadas no oceanoQuero sete palmos de terra sobre o peitoDo calor da minha terra.10 | Apeiron Edições
Duas Mãos Direitas Alentejo, ou a memória um do outroO cheiro a aço dos canosA madeira do queixo num coiceA lã gasta de abraçosA cheirar a pinheirosA água brava com o cheiro da casaOs cães perdidos no matoOs tordos no eucaliptalA tarde a cair...O verde dos olhos do meu paiSempre raiados de sangueO silêncio que ensinaA caçaA neblina e a terraSempre a terra debaixo das botasA resvalar nas trincheirasSempre perto da ternuraE cantarmos de noite o triunfo sobre os pássarosE desenharmos de noiteA cara dos outrosNum papel de uma mesaA carvão como a pólvoraE a taberna cheia de moscasE a luz escassa das vozesCom as armas caladasNum canto desarmadas 11Apeiron Edições |
N. M. Cruz RosaE o Alentejo a dormir devagar como o sangueE os cães na entrada a babarem a encostaA morrerem de sede por mais um estampidoE o mundo lá dentroAo pé do meu pai.12 | Apeiron Edições
Duas Mãos Direitas Diário De Lisboa Ou A Forma Triste De Te EscreverCheira a rio aqui perto - veis na ponte janela... por entre dois telhadosNo vidro de uma portadaDe uma casa quase sempre velha e abandonadaVe-se o lencol do rio...Deste rio que eternamente nos acompanha bito nos desarma... gua...Mas isto tu sabes de cor...Sabes os nomes das ruasDos atalhosDos becos que desaguam irremediavelmente em ti... ter do corpoNa saudade viral que me contamina...Que me envenena o sangue e as horas... tão adormecida o docemente sinistra … m morresse de amorOu chorasse os dias perdidos nimo dos cantores brio dos poetas...Estou cansado... 13Apeiron Edições |
N. M. Cruz RosaDeste meu corpo fatal e lapidar...Que sem tua presenca apodreceo gosto de te ver na ruao gosto que te gostem tantoQue perguntem por ti... tu que foste apenas minhaQ ’í sque alguma vez aqui estiveste... o sabes por dentro que vou morrendoQue vou definhandoAqui neste lugar doente o vazio...O gume da folha da navalhaQue nem os pulsos cortao vazio...o sabes ainda...que as portas se fecham ao ventoQ o sozinhas... eternamente sozinhasE que nas escadas os teus passos permanecem intactos o apagadao sabes ainda... gosta de ti.14 | Apeiron Edições
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