Important Announcement
PubHTML5 Scheduled Server Maintenance on (GMT) Sunday, June 26th, 2:00 am - 8:00 am.
PubHTML5 site will be inoperative during the times indicated!

Home Explore Revista Coração, Vasos e Tórax N.º 3 - Dezembro 2020

Revista Coração, Vasos e Tórax N.º 3 - Dezembro 2020

Published by Miligrama - Comunicação em Saúde, 2021-01-13 16:27:32

Description: A terceira edição da Revista Coração, Vasos e Tórax já está em distribuição

Keywords: Saúde

Search

Read the Text Version

Revista do Departamento 3n.º Coração, Vasos e Tórax do Centro Hospitalar Dezembro 2020 Diretora: Sílvia Malheiro Universitário Lisboa Central e Revista Quadrimestral PVP 5,01 euros COVID-19: Umaàrsesapdovsetrasipdraodnetsadeiáardiaasptada “Parparetecrismátrvoêassmevseopzseadsçoemupamaiorarm”aucnovdiod-19, SacnentatrMo daretaretfeemrênncoiavo n“edAcáeUsrseinsdpiadodasetdsaedidmoeseSddíoinaectnaotpàeses” Teresa Garcia, coordenadora Hipertensão Pulmonar do Adulto Catarina de Oliveira e Helena Fonseca, do Grupo Local do PPCIRA e Tromboendarterectomia Pulmonar cardiopneumologistas 1

EDITORIAL José Fragata Diretor do Departamento Coração, Vasos e Tórax “A MESMA DEDICAÇÃO E QUALIDADE. AINDA MAIS RESILIÊNCIA” Vai já no seu terceiro número a quotidiano profissional e social quais sem alternativa clínica Revista da Área Coração, Vasos de cada um de nós. noutros locais. Assim tem sido e, e Tórax do Hospital de Santa Desde o primeiro momento, talvez por isso, a repercussão Marta, CHULC. Como diretor tentámos que o hospital, com da pandemia sobre a atividade deste enorme departamento pouco mais de uma centena de clínica tenha sido tão reduzida médico-cirúrgico, que engloba camas, fosse verdadeiramente até ao momento no Hospital clínicas cardiovasculares e “não covid”, sendo que os de Santa Marta, com uma toraco-pulmonares, é para eventuais doentes covid-19 são queda geral de 10 por cento mim um gosto enorme escrever tratados noutra instituição nas consultas, 15 por cento este editorial neste período de do CHULC. nas cirurgias, e um impacto no grave crise pandémica que Isto para mantermos ativa e número de doentes saídos de atravessamos, crise esta que tem pronta a capacidade de tratar menos 12 por cento, mas com e terá impactos marcados no doentes não covid, muitos dos a atividade de transplantação 3

e EDITORIAL pouco mais baixa do que a tem vindo a desenvolver a sua na gestão de casos suspeitos ou do ano anterior, com mais de atividade médica e cirúrgica confirmados que nos têm surgido. trinta transplantes pulmonares regular, abrindo recentemente Tem sido um modelo esta nossa realizados! Sempre com a mesma uma consulta de HTP – TEP colaboração com o PPCIRA dedicação, sempre com a mesma devotada, e mantendo reuniões e a Dra. Teresa Garcia tem qualidade, só que agora, ainda médico-cirúrgicas com a maioria protagonizado, com a descrição com mais resiliência. dos centros de hipertensão que todos lhe reconhecemos, Quero deixar aqui uma pulmonar no país, para receber este papel que tem sido mensagem de felicitações doentes que têm continuado verdadeiramente determinante. e o meu mais profundo a tratar. A experiência inicial Aliás, esta crise, como tantas reconhecimento a TODOS na foi recentemente publicada vezes acontece durante as crises, Área Coração, Vasos e Tórax na Revista Portuguesa de tem constituído uma oportunidade que têm sido heróis nesta crise, Cardiologia. Queria agradecer para que TODO o hospital – oferecendo diariamente a sua a todos os que têm confiado no Conselho de Administração competência e dedicação desenvolvimento desta atividade, local, administradores, médicos, para, mesmo com risco próprio apoiando-a e, nomeadamente, enfermeiros, técnicos, assistentes e em condições, por vezes, referenciando-nos doentes. e pessoal auxiliar – tenha inimagináveis, continuarem a Neste número figura um artigo estreitado colaborações em torno cuidar dos doentes “não covid” sobre o centro recentemente de estratégias bem pensadas do foro cardíaco, pulmonar criado e uma entrevista a um dos e aceites, de modo a continuar e vascular. doentes, recentemente operado. uma laboração “quase normal” Esta edição tem a participação A Cirurgia Cardíaca tem também e, sobretudo, muito segura. de especialidades ou setores estado a dar altas mais precoces Só quando listamos tudo o clínicos da Área: a Cirurgia a doentes selecionados, que que temos vindo a fazer, Vascular, com um artigo médico, ficam a ser monitorizados no particularmente num momento que revê a isquémia crónica domicílio e seguidos diariamente de tanta provação e de tamanha dos membros inferiores, e um pela Enfermagem do serviço, incerteza, nos damos conta outro de Enfermagem, onde utilizando para tal o equipamento da dimensão e do resultado se descreve o papel destes IoT (Internet of Things). Este é do esforço de cada um, e de profissionais no tratamento um modelo que temos vindo a todos, para que esta área e endovascular dos aneurismas desenvolver com a Universidade os seus serviços, continuem a abdominais; a Cardiologia, com NOVA e o seu Laboratório marcar o panorama da Medicina um artigo sobre a nova unidade Colaborativo para o Valor em Cardiovascular em Lisboa, bem de síncope instalada no Serviço Saúde, que permitirá seguir como no país. de Cardiologia e uma entrevista os doentes pós-operatórios no Tem sido este um grato privilégio a uma doente aí tratada; a domicílio, dando altas muito mais liderar a Área do Coração, Vasos Cardiologia Pediátrica, com precoces, mantendo a segurança e Tórax, e é uma enorme alegria um importante artigo sobre e a confiança acrescidas ver que, apesar de todas as a prevenção cardiovascular, dos doentes. contrariedades (e não têm sido este com interesse para a Os blocos operatórios e o só as da pandemia), continuamos especialidade, mas também para laboratório de Hemodinâmica o trabalho, em quantidade e a saúde pública. A Cirurgia são igualmente representados por qualidade, rumo a um futuro que Cardíaca, a Cardiologia entrevistas aos seus profissionais. só poderá ser melhor. e a Pneumologia estão Finalmente, chamamos a atenção A todos o meu profundo representadas num trabalho, para a importante entrevista reconhecimento e, já agora, os que reflete outras atividades dada pela responsável do melhores votos para a quadra inovadoras entre nós: o centro PPCIRA no hospital, Dra. Teresa natalícia! de referência de hipertensão Garcia, a quem agradecemos pulmonar no adulto e o centro a participação neste número, de tromboendarterectomia mas muito mais a sua dedicação pulmonar que - tal como o centro e competência na preparação de referência de transplantação das medidas de contingência pulmonar - é único no país e covid-19 no hospital, bem como 4

e “Para termos espaço para a covid-19, precisávamos de 06 N.º 3 - Dezembro 2020 S U M Á R I O um mundo três vezes maior” Teresa Garcia, coordenadora do Grupo Local do Programa 11 de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos do Hospital de Santa Marta 13 Unidade de Cirurgia Cardíaca inicia Projeto de 18 Monitorização à Distância Projeto permite seguir os doentes, a partir de casa, durante 20 o primeiro mês, pós-cirurgia cardíaca 30 Santa Marta tem novo centro de referência 33 Hipertensão Pulmonar do Adulto e Tromboendarterectomia Pulmonar 36 “Sinto-me bem e sei que vou voltar a ter uma vida normal” 39 Serhyi Nitsenko, doente submetido a tromboendarterectomia pulmonar Covid-19: Uma resposta pronta e adaptada às adversidades diárias Reportagem Departamento Coração, Vasos e Tórax “A Unidade de Síncope dá resposta imediata às necessidades dos doentes” Catarina de Oliveira e Helena Fonseca, cardiopneumologistas Isquémia Crónica dos Membros Inferiores Ricardo Correia e Nelson Camacho, Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular “A nossa intervenção vai ter reflexos na incidência da doença cardiovascular do adulto” Consulta de Prevenção Cardiovascular do Serviço de Cardiologia Pediátrica Abordagem endovascular do aneurisma da aorta abdominal em rotura – a nossa realidade de enfermagem Paula Pinheiro, enfermeira gestora; Rosa Miranda, enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação; Jorge Fernandes, enfermeiro especialista em Enfermagem de Reabilitação; Lourença Prada, enfermeira especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica FICHA TÉCNICA: Revista Coração, Vasos e Tórax | Diretora: Sílvia Malheiro ([email protected]) | Redação: Publicação Catarina Cardeta ([email protected]), Cláudia Sampaio ([email protected]), Sílvia Malheiro | Fotografia: Jorge Correia Luís | Paginação e design: Isa Silva | A Revista Coração, Vasos e Tórax é uma publicação da Miligrama Comunicação em Saúde, Unipessoal, Lda. ([email protected]) de periodicidade quadrimestral, dirigida a profissionais de saúde, isenta de registo na ERC, ao abrigo do Decreto Regulamentar 8/99, de 9/06, artigo 12, n.º 1ª. | Tiragem: 3.000 exemplares | | Preço de Venda ao Público: 5,01 euros | Depósito Legal: 462354/19 | Impressão e acabamento: Sprod - Produção Digital Lda. 5

E N T R E V I S TA e “Disponibilidade” e “resiliência” são as palavras que marcaram os últimos meses de Teresa Garcia, em que, no combate à covid-19, conheceu mais a fundo os sentimentos de incerteza e de medo do desconhecido, mas também de vontade de o enfrentar e vencer. Teresa Garcia, coordenadora do Grupo Local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos do Hospital de Santa Marta “PARA TERMOS ESPAÇO PARA A COVID-19, PRECISÁVAMOS DE UM MUNDO TRÊS VEZES MAIOR” Apesar do cansaço e da Considera que o país tem criativos, a ter ideias e, ao dificuldade, Teresa Garcia respondido muito bem. Porém, mesmo tempo, a uma atualização considera que o trabalho dada esta época de gripe constante, relativamente ao que desenvolveu, enquanto sazonal, teme que o aumento de desenvolvimento da doença. coordenadora do Grupo Local internamentos por covid-19 nos Mas não só. É também muito do PPCIRA, em tempo de faça sentir mais as fragilidades ambicioso pelo volume de pandemia, foi acima de tudo do Serviço Nacional de Saúde, trabalho que subitamente “ambicioso e gratificante”. sobretudo no que respeita à acresceu, para todos os membros Faz um balanço muito positivo da falta de camas, mas também de do Programa. Realmente, é uma atuação de todos os envolvidos recursos humanos. situação inédita. no plano de contingência e RCVT - Como é ser Honestamente, pertencer ao na atividade assistencial aos coordenadora do PPCIRA PPCIRA é muito gratificante. doentes, assim como dos em tempo de covid-19? Neste hospital, a confiança resultados obtidos. Contudo, Teresa Garcia (TG) - É bastante depositada nos membros do sente-se apreensiva em relação ambicioso. Obriga-nos a ser grupo foi extraordinária. No aos próximos meses. entanto, apesar de ter sido 6

muito ambicioso em termos do considero que se conseguiu, aqui medo inicial se dissipasse e para nosso trabalho, é também muito em Santa Marta, e até mesmo a que os profissionais ganhassem cansativo e difícil. nível nacional, “fazer das tripas confiança, ao perceberem que RCVT - Estava pessoal e coração” e dar resposta ao que era estavam acompanhados. Tudo profissionalmente preparada necessário. correu bem e quando existiram para enfrentar uma RCVT - Como foi o processo sobressaltos, porque nem tudo é pandemia? de construção do plano de linear, resolveram-se sem grandes TG - Inicialmente, ninguém está contingência? demoras ou problemas de maior. preparado! No contexto, considero TG - Em Santa Marta, o processo RCVT - Quais foram que respondemos de acordo foi feito com uma interligação muito as principais medidas com o que era esperado, com grande entre os vários elementos: implementadas? a interligação dos vários pares o PPCIRA - ou seja, comigo, na TG – As principais medidas envolvidos. qualidade de coordenadora, e começaram a ser verificadas e No início, o mais difícil foi a gestão com a enfermeira Fernanda Santos, discutidas após o confinamento. das emoções, porque as dúvidas enquanto membro deste grupo No princípio, quando em março eram muitas, tanto a nível científico, de trabalho -; todos os diretores se “encerrou todo o país”, Santa como pessoal, e, na prática, é de serviço; e o Conselho de Marta também fechou, mas óbvio que isso influencia. Contudo, Administração. nunca totalmente. após o primeiro embate, tudo Sem dúvida, foram elementos fulcrais Este hospital tem áreas de correu bem. para que o plano de contingência desenvolvimento únicas, que não Ou seja, ninguém está preparado, funcionasse. Tudo se passou numa podiam deixar de funcionar. Os mas respondemos como devíamos, base de competência muito grande doentes precisavam de continuar a o que significa que estávamos e de confiança partilhada. Fizemos ser tratados e houve uma constante inconscientemente capacitados várias reuniões diárias, fomos muitas preocupação, por parte de todos para a enfrentar e para responder vezes ao terreno ver os locais, para os diretores e profissionais das da melhor forma possível ao que perceber o que tinha de ser mudado, diversas áreas, para que tudo nos surgiu, porque, obviamente, a e tudo foi partilhado com os diretores continuasse a funcionar. resposta nunca é ótima. de serviço e com os coordenadores Portanto, a atividade cirúrgica RCVT - Podemos dizer que o das áreas. Acredito que foi devido reduziu, mas não parou e foi desconhecido foi o principal a esta interação que o plano de imperativo criar medidas logo desafio? contingência funcionou tão bem. desde o início. As primeiras TG - Sem dúvida! O desconhecido Além disso, também “antecipámos passaram pela formação dos e o facto de, rapidamente, vermos situações”, ou seja, fizemos uma profissionais, quer na utilização a descoberto as fragilidades previsão de possíveis problemas dos equipamentos individuais, que existiam. Este desconhecido e decidimos o que fazer, caso quer na forma de atuar e nos expôs muitas fragilidades. acontecessem. Foi tudo feito em cuidados a ter, para evitar, ao Algumas já conhecidas e que conjunto com os diretores de máximo, que um doente positivo foram exacerbadas, outras que serviço, alertando, posteriormente, pudesse contagiar alguém. não se sabiam e que nos o Conselho de Administração, que Diria que a primeira medida foi obrigaram a repensar o sistema proporcionou todas as medidas a formação no local de trabalho. em vários elementos. necessárias. Fomos aos serviços explicar aos RCVT - A que fragilidades se Outra mais-valia foi a partilha profissionais o que tinha de ser refere? esquemática de informação com feito e como deveriam proceder TG - A fragilidade física é todos os profissionais, através do caso tivessem dúvidas. muito manifesta, ou seja, temos PPCIRA. Criámos vários elos que, A medida seguinte foi a criação dificuldades de espaço físico, no fundo, já existiam dentro dos de espaços para os doentes logísticas e de número de recursos serviços, mas com o networking estarem de quarentena ou em humanos. de hoje, foi mais fácil alertar para isolamento ao serem testados, O desconhecido mostrou muitas pequenas medidas e reforçá-las, em cada serviço. Ainda no dessas fragilidades ou aumentou-as junto dos elementos que estão início da pandemia, adotámos a e aquilo que já não estava bem, diariamente no terreno – médicos medida de testar os doentes, em ficou pior. Mas, apesar disso, e enfermeiros. articulação com o laboratório. A partilha de informação foi Para esse efeito, montámos, em constante e contribuiu para que o cada serviço, um local para 7

e realização rápida de testes. médica. Portanto, tínhamos de aconteceu exatamente neste tempo No bloco, em conjunto com os as retomar e vamos ter de as de pandemia. colegas da Anestesiologia, que aumentar. Esse é outro grande É uma construção contínua, muito foram fundamentais para que desafio! baseada no que a ciência mostra, tudo funcionasse, implementámos RCVT - O circuito dos mas sobretudo na experiência medidas de controlo de infeção profissionais também foi diária. Temos de o atualizar, de e de minimização de contágio, alterado? o modificar e de o colocar em como por exemplo, no que TG - O circuito dos profissionais prática. respeita ao tempo de espera para não foi muito alterado, sobretudo RCVT - O que mais se recorda intubação da via aérea. incentivámos a que façam destes últimos meses? Havia pouca informação sobre percursos muito estratificados, TG - Recordo a incerteza e as este tipo de procedimentos, a apenas para os seus serviços. Ou dúvidas que todos sentimos… A nível nacional. Aproveitámos seja, por exemplo, quem faz o seu disponibilidade constante e que o que a ciência já nos dizia trabalho na área das consultas, ainda se mantém. Recordo o de outros casos nacionais e fica no edifício das consultas. trabalho. Trabalho, trabalho… internacionais Quem está no internamento, entra Há duas palavras que nos e, de forma rápida, por outra porta. marcaram, durante estes meses, implementámos medidas estritas No entanto, fizemos uma alteração e que nos vão continuar a marcar para as várias técnicas. muito importante para o controlo neste tempo de pandemia: Após o confinamento, da entrada e saída de pessoas: “disponibilidade” e “resiliência”. preparámos todo o edifício de fechámos, desde o início da Disponibilidade para, a cada ambulatório para a chegada dos pandemia, uma das portas de momento, tirar dúvidas e procurar doentes da consulta. Criámos acesso aos claustros, que estava soluções para um novo problema, equipas que ficaram, no local, aberta a todo o hospital. Esta porque todos os dias vão surgindo. a medir a temperatura; demos alteração melhorou muito os Resiliência, porque esta doença formação aos profissionais; circuitos dos profissionais e das obriga-nos a ter muita capacidade afastámos as visitas do edifício, pessoas que têm de vir ao hospital de superação e muita paciência, para termos as áreas de espera e permitiu-nos controlar as entradas até para não nos esquecermos que adequadas; e intervimos junto do e os circuitos dos doentes. os outros doentes também existem, laboratório, que, inicialmente, foi Logo desde o início da pandemia, que é algo que, atualmente, me o nosso principal problema. restringimos as visitas, até por preocupa muito. Até à data, não era preciso indicação da Direção-Geral da Damos muito valor à covid-19 e marcação para as análises, Saúde, mas porque fazia todo o tem de ser dado, porque o receio bastava que as pessoas sentido. Ou seja, as visitas não da população é enorme, mas, se dirigissem ao hospital e estão proibidas, estão restritas. como eu costumo dizer em tom trouxessem o pedido do médico. Contactamos os familiares dos de brincadeira, já devíamos ter Era uma facilidade. Porém, neste doentes internados para agendar começado a “matar o vírus”. Eu momento, não é possível, por os horários das visitas. Assim, sei que não vai desaparecer e ser difícil controlar o número de todos os doentes podem ver os que vamos ter de viver com ele, entradas no hospital. Em conjunto seus entes queridos, embora não mas há outro mundo para além do com o laboratório e com o todos os dias. coronavírus e outras pessoas que departamento de informática, RCVT - Este plano de têm de ser tratadas. desenvolvemos uma forma contingência está em RCVT – Os profissionais de de fazer o agendamento das constante construção/ saúde também têm medos? análises, controlando a afluência /atualização? TG – Claro! Até porque tivemos de pessoas. TG - Sem sombra de dúvida! colegas/amigos à porta da morte, A teleconsulta foi exacerbada Esta construção é muito porque contraíram infeção por ao máximo. Os utentes não baseada naquilo que vamos coronavírus. Eu tive mais do perderam o acompanhamento experienciando. Só daqui a que um. que tinham, mas é evidente que, alguns anos é que a ciência vai Ninguém pode dizer que não tem com determinados doentes, por conseguir descrever o que é que medo. Mas, temos de saber geri-lo, mais que falemos ao telefone, é impossível fazer uma consulta 8

E N T R E V I S TA ultrapassá-lo e racionalizá-lo. foi preciso fazer um grande concordo. Vai ser impossível. Atualmente, sabemos muito mais controlo logístico do material e Vamos ter de conviver com o do que em março. Portanto, essa foi uma das grandes etapas vírus, de ter todos os cuidados esse medo pode ser muito mais que tivemos de ultrapassar do essenciais e de interiorizar que é racionalizado e aproveitado para ponto de vista da contingência. assim que temos de viver e que, fazer outras coisas. Obviamente, contámos com agora, é que vai ser a “doer”! É um medo que difere de a colaboração de outros RCVT – Porquê agora? pessoa para pessoa e até entre profissionais de saúde. Os TG – É agora que vão voltar especialidades, porque nem todas enfermeiros, nomeadamente a surgir as fragilidades que já tiveram este embate tão difícil. o Grupo da Qualidade, existiam. Antes da covid-19, Algumas ficaram resguardadas. rapidamente nos ajudaram a sempre que chegávamos a esta Mas os médicos de Medicina ter um controlo logístico do altura do ano, de gripe sazonal, Interna, de Infecciologia, de material… Como na tropa! todos ouvíamos nas notícias Medicina Geral e Familiar, Para não haver falta de material, que havia falta de camas para de Medicina Intensiva, de não podia haver abuso, internamento, sobretudo na Anestesiologia e todos os que sobretudo na fase inicial, em que minha área, a Medicina Interna. estão na urgência tiveram de as encomendas já estavam feitas, Sempre houve dificuldade em racionalizar muito rapidamente mas o material ainda não tinha dar alta hospitalar aos doentes o medo. Não se pode dizer que chegado. Foi preciso fazer um idosos sem apoio social, e em não temos medo, somos todos controlo apertado. conseguir que a Rede Nacional humanos! RCVT – Os números estão de Cuidados Continuados RCVT – Tiveram tudo o que a aumentar. Como é que Integrados recebesse os doentes. precisavam? perspetiva os próximos Se multiplicarmos tudo isto TG - Posso dizer que nunca meses? por um espaço físico que não faltaram equipamentos de TG - Muito difíceis! Como diz o temos, para mantermos os proteção individual, mas não Primeiro Ministro, António Costa, doentes distanciados enquanto vou dourar a pílula! No início da vai ser muito difícil convencer esperam por estes resultados, pandemia, tivemos momentos em as pessoas que têm de ficar percebemos que agora é que, apesar de nada ter faltado, novamente em casa, e eu que o desafio vai começar… 9

e Sinceramente, acredito que se percebamos que, se o número Seguramente, os profissionais de avizinham tempos muito difíceis. de casos aumentar, é o que vai saúde vão fazer o seu melhor, No início da pandemia, os países acontecer. não tenho qualquer dúvida. vizinhos mostraram-nos números Estou certa de que as Porém, temos de compreender assustadores, que não atingimos e necessidades de Cuidados que estamos há 8 meses nesta que espero que nunca venhamos a Intensivos vão crescer e que, situação e que, apesar de ter atingir. Os nossos profissionais de mesmo que não se chegue a havido um período de férias, as saúde fizeram um trabalho muito números exorbitantes, vamos pessoas estão exaustas. importante, mas, nessa altura, sentir as fragilidades que já O uso do equipamento abriram-se portas e, por exemplo, tínhamos anteriormente, o que vai de proteção individual é a Rede Nacional de Cuidados dificultar muito. absolutamente insuportável, a Continuados Integrados conseguiu Para termos espaço para a partir de determinado tempo de receber rapidamente os doentes. covid-19, precisávamos de ter utilização. Precisávamos de ter Mas, agora, voltámos a funcionar um mundo três vezes maior, mas tido mais descanso e de ter mais como anteriormente e esse modelo, o mundo continua do mesmo recursos para enfrentarmos da que tinha muitas fragilidades, não tamanho! melhor forma o que aí vem. vai ser exequível quando houver RCVT – Então, não estamos Não vou dizer que não estamos acumulação de doentes. preparados para enfrentar preparados, nem tenho dúvida É por tudo isto que penso que a nova vaga? de que vamos todos dar o nosso só agora é que as dificuldades TG – As nossas autoridades melhor, em todas as áreas. vão surgir. Não estou a antecipar superiores e entidades dizem No entanto, tenho algumas que os internamentos vão crescer que estamos preparados. reservas em saber como vai ser a desalmadamente, embora todos resposta, na prática. Teresa Garcia, coordenadora do PPCIRA “Sempre me interessei pela área da Microbiologia Clínica” Teresa Garcia é assistente hospitalar graduada de Medicina Interna, no Hospital de Santa Marta/CHULC e coordenadora do Grupo de Coordenação Local do PPCIRA da mesma entidade hospitalar. Sempre teve a Medicina Interna como primeira opção. Porém, desde os tempos de faculdade que também se interessou muito pela área da Microbiologia Clínica e da Bacteriologia, pelo que foi com “grande naturalidade” que passou a fazer parte de um dos grupos PPCIRA, aquando da formação dos mesmos. “Fiz o mestrado na área da Microbiologia Clínica, sempre dei aulas nesta área e, quando terminei a especialidade, rapidamente me liguei à questão do controlo da infeção”, conta. Gosta, sobretudo, da área de controlo de resistência aos antibióticos e de poder melhorar comportamentos, no que respeita, por exemplo, à prescrição correta destes medicamentos. “Gosto de contactar com as outras especialidades e de orientar neste sentido.” Teresa Garcia tirou a sua licenciatura na Faculdade de Medicina de Lisboa e fez o internato de Medicina Interna no Hospital dos Capuchos. Posteriormente, esteve sete anos no Hospital Pulido Valente, no serviço e na equipa de António Sousa Guerreiro. Mais tarde, com a evolução da sua carreira enquanto médica e docente veio, com a Faculdade Nova de Lisboa, para o CHULC, onde se encontra há 11 anos. 10

UNIDADE DE CIRURGIA CARDÍACA INICIA PROJETO DE MONITORIZAÇÃO À DISTÂNCIA O novo Projeto de Monitorização à Distância permite seguir os doentes no primeiro mês, pós-cirurgia cardíaca, a partir da sua casa. O objetivo é evitar os possíveis riscos da hospitalização e reduzir os custos da mesma. A Unidade de Cirurgia Cardíaca e se sentem acompanhados; a José Fragata iniciou, há cerca de um ano, outra é podermos dar altas mais o Projeto de Monitorização à precoces, minimizando os riscos do Distância. A iniciativa resulta de internamento, para os doentes, e os uma parceria entre o Hospital de custos que lhes estão associados, Santa Marta e o Value for Health para o Serviço Nacional de Saúde.” CoLAB, um laboratório colaborativo De acordo com o cirurgião criado no âmbito da Fundação cardiotorácico, todos os doentes para a Ciência e Tecnologia e da submetidos a cirurgia cardíaca, que Agência Nacional de Inovação. saibam usar um smartphone, estão O objetivo é dar alta aos doentes elegíveis para serem monitorizados submetidos a cirurgia cardíaca, em casa. “Talvez as pessoas mais com a máxima segurança. idosas e que vivem sozinhas tenham “Atualmente, a aposta está nos dificuldades, mas os doentes são cuidados de proximidade, de selecionados nesse sentido.” preferência e se possível, em Este programa permite dar alta casa. O ideal é darmos alta aos aos doentes por volta do quinto ou doentes, assim que possível, do sexto dia pós-cirurgia. Nessa mas com garantias de que estão altura, é-lhes entregue um kit de em segurança e que se sentem monitorização para que sejam confortáveis com o facto de seguidos no hospital, a partir voltarem a casa”, afirma José de casa, praticamente como se Fragata, diretor do Departamento estivessem na enfermaria. Coração, Vasos e Tórax e do Tal como explica José Fragata, Serviço de Cirurgia Cardiotorácica. através deste kit de monitorização “Este projeto tem, sobretudo, os profissionais fazem o seguimento duas vantagens: uma delas é da frequência cardíaca, da pressão aumentar a confiança dos doentes arterial e do peso. Fazem, ainda, após a alta, uma vez que sabem uma visualização diária da ferida que estão a ser monitorizados operatória e do número de passos. 11

e Os doentes são contactados Value for Health CoLAB sempre que existe alguma alteração ou quando é necessário validar O Value for Health CoLAB é uma associação privada sem fins lucrativos alguma informação enviada. cuja missão é medir o valor em saúde. A equipa reúne competências Após fazerem a análise diária multidisciplinares das áreas de Ciência dos Dados, Saúde Digital e Literacia dos gráficos, se necessário, os em Saúde, para modelar caminhos em Saúde, ao longo de todo o ciclo de enfermeiros pedem ao doente que cuidados. se dirija ao hospital. O mesmo se O Value for Health CoLAB tem como parceiros fundadores a Universidade passa no que respeita à sutura. Se Nova de Lisboa, a CUF, a Vodafone Portugal e a Fraunhofer Portugal. Em for detetada alguma anomalia, novembro de 2018, recebeu o título de “Laboratório Colaborativo” pela se necessário, os doentes são Fundação Portuguesa para a Ciência e Tecnologia. encaminhados para o centro de saúde, hospital ou para a Consulta aceitam muito bem o programa. Ana Sofia Gualdino de Cirurgia deste centro. Cada caso Quando não querem, é porque é um caso. têm dificuldade em perceber como “As reações dos doentes têm sido enviar os dados, mas, normalmente, muito boas, sentem-se mais seguros. têm um familiar que lhes dá esse A alta hospitalar é um momento de apoio”, conta. grande clivagem. A pessoa tem o Ana Sofia Gualdino menciona apoio dos profissionais de saúde que a monitorização à distância no hospital e quando vai para casa permite aos profissionais de saúde sente-se desprotegida”, conclui ter acesso aos dados diários do José Fragata. doente e atuar precocemente, caso Uma mais-valia para doentes se verifiquem alterações em algum e profissionais dos parâmetros avaliados como Ana Sofia Gualdino é uma tensão arterial, frequência cardíaca, das enfermeiras que faz a ocorrência de palpitações, edemas, monitorização à distância dos dor, cansaço entre outros. doentes de cirurgia cardíaca. “Já foi preciso ajustar a medicação Segundo conta, “o programa está de alguns doentes, antecipámo-nos a correr bem e é uma mais-valia, à consulta do primeiro mês. Porém, tanto para os doentes, como para não tivemos nenhuma ocorrência os profissionais”, que têm acesso a grave, nem houve alterações todos os dados de que necessitam da ferida cirúrgica. Os doentes para fazer o seu trabalho. têm algumas dúvidas, mas como À data desta entrevista, o programa podemos ver a cicatriz através tinha, na sua totalidade, 29 doentes da imagem, tranquilizamo-los e incluídos, dos quais cinco estavam dizemos que está tudo normal”, ainda em seguimento ativo. termina Ana Sofia Gualdino. Tal como conta, aquando da alta, Os doentes são, habitualmente, os profissionais de saúde e os monitorizados durante um mês, da equipa da telemonitorização até à data da primeira consulta confirmam se o doente reúne as do pós-operatório. condições para entrar no programa. Se assim for, perguntam ao doente 12 se quer ser monitorizado à distância e, além dos habituais ensinos, explicam-lhe como tudo funciona. “Normalmente, os doentes

Hipertensão Pulmonar do Adulto e Tromboendarterectomia Pulmonar SANTA MARTA TEM NOVO CENTRO DE REFERÊNCIA O Hospital de Santa Marta voltou a ter um Centro de Referência de Hipertensão Pulmonar do Adulto. Desta vez, e de forma única no país, foi também constituído o Centro de Tratamento de Tromboendarterectomia Pulmonar. A nível nacional, esta intervenção cirúrgica é realizada apenas neste hospital. Uma mais-valia para os doentes, que não precisam de se deslocar para o estrangeiro; e para o país, no que diz respeito a custos. O CHULC tem um novo centro José Fragata de referência, nas áreas da Hipertensão Pulmonar no Adulto e da Tromboendarterectomia Pulmonar. “Esta certificação foi obtida por concurso de habilitação, que ponderou a casuística, a qualidade dos resultados e a infraestrutura existente no Hospital de Santa Marta”, afirma José Fragata, coordenador do novo centro. E acrescenta que esta é uma forma de “reconhecimento da enorme capacidade instalada” neste espaço do Departamento Coração, Vasos e Tórax. Este novo centro distingue-se, sobretudo, pela possibilidade de tratamento cirúrgico dos doentes com tromboembolismo pulmonar crónico, uma vez que, a nível nacional, é o único onde se realiza tromboendarterectomia pulmonar. “Esta cirurgia está agora disponível em Portugal, o que é muito importante, pois os doentes têm a 13

e possibilidade de ser tratados no Vasos e Tórax já possui dois Atualmente, com cerca de seu país, com condições técnicas centros de referência nas áreas de um ano, o novo centro de e resultados semelhantes, mas Hipertensão Pulmonar Pediátrica referência já segue um total sem o peso da deslocação para o e do Transplante Pulmonar, o que de 55 doentes, entre os quais Reino Unido, França ou Espanha”, permite oferecer aos doentes um alguns com tromboembolismo salienta José Fragata, também, leque de terapêuticas necessárias crónico, uns já foram submetidos a diretor do Departamento Coração, à sua condição. tromboendarterectomia pulmonar Vasos e Tórax. O centro de referência e outros estão em lista de espera Estima-se que, anualmente, cerca O Centro de Referência de para a cirurgia. de 30 doentes com doença Hipertensão Pulmonar do Adulto e O centro de referência reúne pulmonar tromboembólica crónica tromboendarterectomia Pulmonar todas as valências necessárias, tenham de se deslocar para o do CHULC é constituído por sendo garantido aos doentes estrangeiro para serem submetidos médicos das várias áreas da um acompanhamento de a esta intervenção cirúrgica, que Cardiologia, da Pneumologia elevada qualidade, realizado agora é realizada no Hospital de e da Cirurgia Cardíaca e tem por profissionais de saúde com Santa Marta. Obviamente, trata-se como objetivo seguir e tratar estes diferenciação específica nas de uma situação que causa um doentes, reduzindo ao máximo diferentes áreas. enorme transtorno e que agrava as consequências da doença e Ana Galrinho, responsável a despesa a nível nacional, aumentando o seu bem-estar físico pela área da Cardiologia deste com importantes custos e psicológico. novo centro, explica que ao económicos para o país. ser encaminhado para Santa O Departamento Coração, Marta, o doente com suspeita de hipertensão pulmonar vai ser Ana Galrinho submetido a uma série de exames, com o objetivo de confirmar o diagnóstico e de caracterizar o seu tipo de hipertensão pulmonar. Tudo isto é, sobretudo, feito pela Cardiologia, tendo, obviamente, o apoio da Pneumologia ou de outra especialidade sempre que necessário. As consultas são efetuadas por Ana Galrinho e João Reis, interno da especialidade com interesse nesta área; os exames de diagnóstico são realizados por cardiologistas das áreas da Hemodinâmica, onde são realizados os cateterismos ou as arteriografias pulmonares; e da Imagem, para os ecocardiogramas. Consoante o diagnóstico, o doente pode: ser seguido em consulta, onde fará uma terapêutica dirigida; ser submetido a angioplastia pulmonar, feita pelos cardiologistas de intervenção do Serviço; encaminhado para cirurgia cardíaca para realização de 14

tromboendarterectomia pulmonar poderá ser necessário voltar a Alexandra Borba ou de transplante pulmonar; fazer uma avaliação subsequente. estar bem durante o dia, mas ter ou ser seguido em consulta “Além da Cardiologia e da hipoxemia à noite.” de Pneumologia, em caso da Cirurgia Cardíaca, quando é Alexandra Borba faz, ainda, hipertensão pulmonar tipo III. preciso excluir uma doença de referência ao trabalho da equipa “A Consulta de Hipertensão base que esteja na origem da de Cuidados Paliativos do Pulmonar vai ser realizada com o hipertensão pulmonar, conto CHULC, para onde encaminha acompanhamento da Enfermagem, também com o apoio dos colegas muitos dos seus doentes. “Têm que fará os ensinos ao doente e das doenças autoimunes”, refere a uma equipa multidisciplinar, com uma abordagem aos estilos de pneumologista. especialistas em dor, internistas, vida saudáveis e ao que o doente O seguimento dado pela pneumologistas, psicólogos, pode ou não fazer na sua vida Pneumologia aos doentes do nutricionistas, enfermeiros, entre diária”, refere Ana Galrinho. grupo III é, de acordo com outros. Abordam o doente de uma Além disso, foi também criada uma Alexandra Borba, o “habitual para forma holística e ajudam muito linha telefónica, para a qual os a doença respiratória crónica”. na melhoria da sua qualidade de doentes podem ligar, caso tenham Os doentes são observados vida”, indica. alguma dúvida ou ocorrência. presencialmente, a cada três meses E acrescenta: “Não nos podemos A intervenção ou sempre que necessário, e fazem focar só em dar anos de vida da Pneumologia um estudo funcional respiratório aos doentes, com as terapêuticas A interligação entre as três duas a três vezes por ano, disponíveis; temos também de especialidades que constituem dependendo do caso. lhes dar qualidade de vida e esta este centro de referência é “Também temos forma de equipa centra-se, sobretudo, fundamental, pelo que os seus monitorizar oximetrias, em casa, no controlo dos sintomas e em profissionais estão em constante durante a noite, uma vez que, dar-lhes o apoio que necessitam. contacto, de forma a discutir, poderá dar-se o caso de o doente Por vezes, basta uma palavra de sempre que necessário, cada um carinho, um telefonema…” dos doentes. Do lado da Pneumologia, Alexandra Borba explica que a sua especialidade tem, também, “um papel essencial” na avaliação inicial dos doentes, uma vez que nos vários grupos desta patologia, existe hipertensão pulmonar associada à doença respiratória crónica. “É importante excluir estes doentes, porque os tratamentos são distintos, consoante o grupo de hipertensão”, observa Alexandra Borba, responsável pela área da Pneumologia deste novo centro, acrescentando que a Pneumologia acompanha, essencialmente, os doentes com hipertensão pulmonar do grupo III, que são secundários à doença respiratória crónica. Alexandra Borba refere também que no caso dos doentes do grupo I (hipertensão pulmonar primária), para além da avaliação inicial, 15

e Tromboendarterectomia Inicialmente, é necessário fazer sido “ótimos”. “O principal Pulmonar uma série de investigações problema destes doentes está na O Hospital de Santa Marta é o por diversos métodos, para adaptação pós-operatória do único centro a nível nacional, onde estabelecer o diagnóstico e as pulmão, quando zonas que não se efetua tromboendarterectomia condições do doente para uma recebiam sangue passam a ser pulmonar, pelas mãos dos hipotética cirurgia e, a partir daí, vascularizadas. Há uma série cirurgiões cardiotorácicos José o doente é discutido em reunião de alterações complexas a nível Fragata e Helena Telles Antunes, multidisciplinar, com a Cardiologia pulmonar, que podem ser graves, coordenadora operacional desta e a Pneumologia, para decidirmos e o doente pode precisar de apoio área do novo centro de referência. se é ou não candidato a cirurgia”, ventilatório ou passar por períodos A cirurgiã começou por dizer afirma Helena Telles Antunes. de hipóxia.” que a indicação para esta E continua: “Existem variados Contudo, estes profissionais seguem cirurgia é a hipertensão pulmonar aspetos que devemos ter em “uma política de vigilância muito tromboembólica crónica. Cumprido conta, não apenas no sentido agressiva”. “O facto de termos este requisito, “não há critérios da necessidade e do benefício um protocolo consistente tem-nos absolutos de recusa”, sendo que, esperado da cirurgia e do permitido melhorar francamente apenas, uma pequena minoria não risco cirúrgico, mas também a o curso pós-operatório dos poderá ser submetida a cirurgia. adequação da pessoa para ser ou doentes na Unidade de “É um processo complexo. não operada.” Cuidados Intensivos.” Até à data, os resultados têm Tal como refere, o tempo de adaptação varia consoante o Helena Telles Antunes doente. No entanto, Helena Telles Antunes faz questão de “discutir longamente estes problemas” com os doentes no pré-operatório, uma vez que precisam de perceber tudo, de modo a estarem preparados para enfrentar os desafios. Os resultados têm sido ótimos. Helena Telles Antunes não deixa de lamentar as duas mortes, em doentes com complicações respiratórias muito complexas, mas salienta: “Até à data, todos os doentes recuperaram a sua independência, estando perfeitamente funcionais e fazendo a sua vida normal. Incluindo dois doentes que estão em programa de angioplastia com balão, em colaboração com a Cardiologia, e um doente que está a fazer fármacos vasodilatadores, todos os outros deixaram de fazer os vasodilatadores e de depender de oxigénio.” Após a alta, os doentes são seguidos “para a vida” em consulta de seguimento de Cirurgia Cardíaca, a cada ano ou sempre que se justifique, e também na 16

Consulta de Hipertensão Pulmonar, de Referência de Hipertensão até, já tinham realizado alguns “uma consulta colaborativa com as Pulmonar Pediátrica e de casos de cirurgia do embolismo outras especialidades” do centro. Adultos, mas que, por decisão pulmonar crónico, “com excelentes Para terminar, Helena governamental, foi-lhe retirado, resultados”. Telles Antunes refere que o tendo ficado apenas com o Centro “Foi um investimento tão grande tromboembolismo pulmonar agudo de Referência de Cardiopatias e deixámos de ter doentes! Além é uma situação relativamente Congénitas do Adulto. disso, deixámos de poder seguir comum em Portugal, mas ainda “Nunca percebi o que aconteceu, alguns adultos com cardiopatias pouco manejada e seguida de mas penso que se repôs a congénitas e hipertensão forma pouco agressiva, razão pela justiça”, afirma a pneumologista pulmonar, que acompanhávamos qual deixa um alerta aos clínicos: Alexandra Borba, que já desde que nasceram, e os doentes “É essencial que seja feito um pertencia ao primeiro grupo da que nos eram referenciados seguimento dos doentes com hipertensão pulmonar, tendo pelas consultas de Reumatologia tromboembolismo pulmonar trabalhado com a cardiologista e de Doenças Autoimunes do agudo, porque cerca de Ana Agapito, a sua primeira CHULC foram encaminhados 10 por cento desenvolve responsável e uma “expert” no para outros centros, todos eles tromboembolismo pulmonar tratamento destes doentes. sobrecarregados”, afirma crónico. É importante que a E continua: “Tínhamos a terceira Ana Galrinho. doença seja atempadamente maior casuística do país, tínhamos, A cardiologista recorda que diagnosticada e tratada, para que e continuamos a ter, das maiores a consulta chegou a ter cerca os doentes tenham muito menos consultas de cardiopatias de 180 doentes. Porém, muitos limitações funcionais e uma vida congénitas da Península Ibérica, tiveram de passar a ser seguidos menos complicada. Além disso, apresentávamos muitos trabalhos em outras instituições, tendo o vamos poupar muito ao Serviço em congressos de Cardiologia e de Santa Marta ficado com poucos Nacional de Saúde e ao Pneumologia e os nossos doentes doentes, entre os quais 22 com país em geral.” sempre foram muito bem tratados.” cardiopatia congénita. Santa Marta já teve um Ana Galrinho, a cardiologista “Desde que voltámos a ser centro Centro de Referência de que está a dar continuidade ao de referência, já temos uma média Hipertensão Pulmonar “excelente trabalho” desenvolvido de 30 novos doentes. Ainda não Ana Galrinho e Alexandra Borba por Ana Agapito, que, entretanto, recebemos de volta os doentes das recordam que o Hospital de se reformou, mostra ser da cardiopatias congénitas que, nesta Santa Marta já teve um Centro mesma opinião. E acrescenta que fase de ausência, passaram a ser foram “o primeiro centro a fazer seguidos pelos colegas ligados a angioplastia pulmonar” e que, esta patologia”, termina. Hipertensão pulmonar, uma doença com impacto A hipertensão pulmonar é uma consequência de várias patologias, e divide-se em cinco grupos: hipertensão arterial pulmonar, hipertensão pulmonar causada por doença do coração esquerdo, hipertensão pulmonar causada por doença pulmonar e/ou hipóxia, tromboembolismo pulmonar crónico e hipertensão pulmonar com mecanismos multifatoriais não esclarecidos. Falar da sua incidência em geral não é fácil, uma vez que é variável consoante a patologia de base. Quando não tratada, esta doença tinha um prognóstico muito negativo e uma esperança média de vida baixa, sendo que, no doente do tipo I, a média era de aproximadamente três anos. O cansaço e a falta de ar (dispneia) são os sintomas mais frequentes da hipertensão pulmonar. Porém, alguns doentes têm também tonturas, perda de conhecimento, sentimento de fraqueza, entre outros, que reduzem drasticamente a qualidade de vida dos doentes, tendo um impacto muito negativo na sua vida. Normalmente, trata-se de doentes jovens, com muitas limitações e grande peso para a sociedade e para as suas famílias. 17

e Serhyi Nitsenko, doente submetido a tromboendarterectomia pulmonar “SINTO-ME BEM E SEI QUE VOU VOLTAR A TER UMA VIDA NORMAL” Otimista e esperançoso num futuro melhor, com mais saúde. Era este o espírito de Serhyi Nitsenko, ainda deitado numa das camas da Unidade de Cuidados Intensivos de Cirurgia Cardíaca, mas a poucas horas de se mudar para a enfermaria. Tinha sido submetido a Agora, ainda que a poucos entrevista, Serhyi Nitsenko ainda tromboendarterectomia pulmonar, dias da tromboendarterectomia não se tinha levantado da cama: há cerca de uma semana, pulmonar a que foi submetido, “Quando começar a andar é encontrava-se ainda “entre fios”, sente-se bem e não consegue, que posso ter mesmo a certeza. mas mostrou-se muito bem- sequer, voltar a imaginar a vida Vou hoje para a enfermaria, vou disposto e cheio de vontade da mesma forma. “Agora é sempre experimentar andar… e dançar! de conversar. “Sinto-me bem a melhorar”, afirma. Se não conseguir, falo com e a culpa é desta senhora”, Tal como conta, há cinco anos a Dr.ª Helena.” diz, com sentido de humor, que se sentia muito limitado. A Só pode “falar bem” do enquanto aponta para a cirurgiã vida já não era a mesma. “Tinha acompanhamento que lhe tem cardiotorácica Helena Telles muita falta de ar, muito cansaço, sido dado no Hospital de Santa Antunes, que se encontrava andava 20 metros e precisava Marta, lamenta apenas que, por relativamente perto. de me sentar. Até mesmo parado conta da pandemia covid-19, lhe É de origem ucraniana, tem 67 estava cansado e, por vezes, nem tenham adiado a cirurgia, que anos, mas vive em Portugal há 20. conseguia falar”, lembra estava agendada para junho. “Já sou português”, salienta Serhyi Serhyi Nitsenko. “Estou rodeado de bons médicos Nitsenko. Trabalhou na construção O pós-operatório “não tem sido e pessoas muito humanas. Estão civil, mas já está reformado. difícil” e Serhyi Nitsenko já nem atentos a tudo o que preciso e Teve uma embolia pulmonar, há precisa de oxigénio para respirar. dão-me muita atenção”, conta. cerca de cinco anos, aquando de “Sinto-me melhor, estou a falar E termina: “Os últimos anos não uma cirurgia à coluna e, desde e não estou cansado, nem tenho têm sido fáceis. Não gostei, mas então, a sua vida nunca mais falta de ar! Já sinto a diferença, sei que a partir de agora tudo vai foi a mesma, até porque, pelo antes sentia muita falta de ar e melhorar. Vou voltar para casa meio, teve um enfarte agudo do dor nos pulmões”, exclama com e, a pouco e pouco, vou voltar a miocárdio. “Não tem sido contentamento. caminhar e a fazer a minha fácil”, recorda. A realidade é que aquando desta vida normal.” 18

COVID-19: Ue MA RESPOSTA PRONTA E ADAPTADA ÀS ADVERSIDADES DIÁRIAS A descoberta da existência do novo Coronavírus Tórax esteve à conversa com alguns dos profissionais e o início da pandemia em Portugal foram difíceis dos blocos operatórios de Cirurgia Cardiotorácica para todos. Trabalhar no medo do desconhecido e de Cirurgia Vascular e do Laboratório de e na incerteza entre o certo e o errado não é fácil, Hemodinâmica do Serviço de Cardiologia, para sobretudo, quando é preciso agir prontamente, perceber o ambiente vivido pelos seus profissionais. adaptar equipamentos de proteção individual, Pelo caminho encontrou e conversou, também, protocolos de atuação, técnicas e tudo o que for com os diretores dos serviços de Cardiologia e de necessário para proteger os doentes e os profissionais Pneumologia, Rui Cruz Ferreira e João Cardoso. A de saúde, não só a nível físico, mas também forma de estar, de ver e de percecionar a situação psicológico. varia entre os profissionais, mas uma coisa é certa, A equipa de reportagem da Revista Coração, Vasos e todos têm estado a postos para enfrentar o desafio. 2200

21

e NOS BLOCOS Conceição Alves desconhecido é temido.” A cada Cristina Gaspar Ramos, dia, foram-se adaptando à nova coordenadora do polo de Conceição Alves, enfermeira realidade, mas nunca deixando de Anestesiologia coordenadora dos blocos acompanhar as notícias de Itália e “A ATUAÇÃO DOS de Espanha. PROFISSIONAIS DE SAÚDE “A ANSIEDADE PROVOCADA “Estávamos assustados! Como TEM SIDO MUITO POSITIVA” PELO DESCONHECIDO FOI O coordenadora e colega, tentei Cristina Gaspar Ramos, MAIS COMPLICADO” manter a calma e ir ao encontro coordenadora do polo de do que me pediam, para que se Anestesiologia do Hospital de Conceição Alves, enfermeira e sentissem protegidos, mas não foi Santa Marta, considera que coordenadora de ambos os blocos fácil”, recorda Conceição Alves. as “experiências terríveis e operatórios, recebeu-nos com um Não havia informação. A incerteza extraordinariamente assustadoras” sorriso no rosto, mas recordando era total, mas, de acordo com o que vividas nos outros países que o início da pandemia não foi conta, com o passar dos meses, foram- contribuíram para que fôssemos fácil e que o “cansaço foi muito”. se adaptando e ajustando a toda a mais cuidadosos. Deu-nos a noção Talvez não apenas pelo excesso nova informação que ia surgindo. da importância do confinamento de trabalho, mas pela questão Foram feitos muitos fluxogramas e e de respeitar as regras de higiene psicológica que se impôs. “O que ajustados muitos aspetos, sobretudo e respiratórias, assim como o custou foi a adaptação e toda a no que respeita à fase da anestesia distanciamento social. ansiedade provocada pelo medo em bloco, de forma a proteger “Por um lado, se as notícias dos do desconhecido. Atualmente, é os médicos e os enfermeiros de outros países nos assustaram, por mais fácil. Já nos habituámos.” anestesia, que estão mais expostos. “Não sabíamos exatamente Mas obviamente, todos os Cristina Gaspar Ramos o que aí vinha e tudo o que é profissionais de saúde e os doentes. “Foram tempos de muita dúvida e inquietação, porém apesar de todos os receios, o balanço é muito positivo”, observa a enfermeira, não deixando de salientar o papel do aprovisionamento e das compras, “que fizeram um trabalho incansável”. “Ainda não acordei bem para a vida”, exclama a enfermeira, que apesar de satisfeita com a atuação de todos os profissionais, durante a primeira vaga da covid-19, mostra- se preocupada com o futuro: “Vejo tudo com alguma admiração. Como é que vamos viver assim para o resto das nossas vidas? Não me estou a referir ao trabalho, porque temos tudo alinhado, mas à nossa vida em sociedade. Espero que, rapidamente, tenhamos uma vacina eficaz, segura e acessível a todos.” 22

outro tiveram este efeito positivo”, preparados para a possibilidade organigramas de fluxos de trabalho afirma, considerando que, em de terem de operar um doente e de acompanhamento de projetos; termos profissionais, as primeiras covid positivo, num universo que, e, ainda, desempenhos pessoais três semanas foram as mais teoricamente, é covid free. “Temos e das equipas, à medida em que stressantes e agitadas. todos os kits de proteção preparados foram emanadas diretrizes da área e “Não havia informação, íamos para o caso de não haver tempo de do Conselho de Administração. ajustando tudo à nossa realidade, saber o resultado do teste.” “Uma das linhas que fiz questão sobretudo no que respeita aos A anestesiologista considera que os de manter, com a maior agilidade, anestesiologistas e aos enfermeiros primeiros meses de pandemia foram foi a capacidade de comunicação de anestesia, que estão em maior de muita aprendizagem, de revisão e de articulação com todos os risco de contaminação.” de procedimentos e conceitos e polos hospitalares e com todos O balanço que faz em relação à de troca de experiências entre os os cardiopneumologistas”, refere atuação de todos os profissionais vários hospitais. Paulo Franco. de saúde “é muito positivo”. Porém, lamenta pelos doentes que O trabalho foi organizado de forma “Estivemos sempre em contacto, deveriam ter recorrido aos serviços a manterem equipas de retaguarda por exemplo através do de saúde e que, por receio, não o e cobertura da atividade assistencial. WhatsApp, numa troca constante fizeram. “Esta é uma questão que Além disso, foram executadas tarefas de informação; e fizemos uma não podemos esquecer!” que se centraram nas alterações e série de protocolos, em conjunto “A nível mundial, o futuro adivinha- nas regras de funcionamento da com os enfermeiros do bloco, se complicado, sobretudo, devido à atividade técnica, uma vez que que fomos experimentando para crise económica que atravessamos houve necessidade de aplicar regras percebermos o que era mais e que, claramente, vai acentuar-se, de proteção individual e ajuste dos funcional”, afirma. E acrescenta com repercussões para a área da protocolos técnicos de atuação. que a experiência que ganharam saúde”, conclui. “É difícil ver o fim da atual com o passar dos dias lhes pandemia. Ninguém sabe quanto permitiu ir ajustando as práticas. Paulo Franco, coordenador tempo vai durar ou quantas Cristina Gaspar Ramos lembra da Cardiopneumologia pessoas mais vão ser afetadas. que, a certa altura, o Serviço de O mais claro é que, quando Anestesiologia, ficou com menos “A FORMA DE ATUAÇÃO cinco especialistas, ou seja, DOS TSDT VAI MUDAR PARA Paulo Franco passaram de 15 para 10 médicos, SEMPRE” por situações de baixa ou de quarentena. Uma situação que “Flexibilidade e serenidade” foram, se fez sentir, mas que não de acordo com Paulo Franco, parou a equipa. coordenador da Cardiopneumologia, Segundo a anestesiologista, não as palavras-chave para a foram as técnicas anestésicas organização do trabalho dos técnicos que sofreram alterações, mas sim perfusionistas no bloco operatório. a forma como os profissionais Teria sido tudo mais complicado se se protegem para as executar, assim não fosse. sobretudo nos procedimentos Quanto aos Técnicos de Diagnóstico em que há manejo das vias e Terapêutica de Cardiopneumologia aéreas. Neste sentido, foram do CHULC, tal como recorda, no implementadas medidas no que início, houve a necessidade de uma respeita aos profissionais em sala, nova “caixa de ferramentas” para aquando do processo anestésico, a liderança do trabalho e para aos tempos de espera para entrar o controlo do trabalho remoto. A e sair, entre outros aspetos. principal preocupação foi, segundo Quanto ao bloco da Cirurgia conta, organizar uma “enorme” Vascular, Cristina Gaspar Ramos remodelação de resposta aos postos menciona que estão também de trabalho; instituir fundamentos, 23

e Arminda Basílio sentir, a limpeza do chão e de mas recorda que, naquele todas as superfícies é feita com momento, sentiu sobretudo “ terminar, a forma de atuação dos mais frequência e com diferentes muito calor”! técnicos superiores de diagnóstico concentrações de desinfetantes. “Não sei se foi por se tratar de e terapêutica terá mudado para “Sempre tivemos muito cuidado uma sala com pressão negativa, sempre”, observa Paulo Franco. com a limpeza, mas agora é tudo se pelos equipamentos de E termina: “Com consideração redobrado”, salienta. proteção individual ou se, pura e planeamento do CHULC, os A assistente operacional assume e simplesmente, pelo stress do cardiopneumologistas iniciaram que, ao início sentiu “receio”, não só momento”, observa. a retoma das suas atividades e no que respeita à situação vivida no Não falou com o doente. Não sentem-se preparados para estar local de trabalho, onde a incerteza teve contacto. Aliás, tal como as na frente da inversão da curva da e a necessidade de fazer o melhor normas indicam, permaneceu fora diminuição da produtividade.” pela proteção dos profissionais da sala, até que o anestesista e dos doentes imperavam, mas e o enfermeiro de anestesia Arminda Basílio, assistente também pela sua família. “Não terminassem o seu trabalho. operacional sabia o que nos esperava.” “Correu tudo bem e isso é o que No entanto, apesar das dúvidas e mais importa”, acrescenta. “SEMPRE TIVEMOS MUITO das dificuldades, tudo correu da Joana Coimbra afirma que CUIDADO COM A LIMPEZA, forma esperada: a melhor. “Somos em termos de logística mudou MAS AGORA É TUDO mesmo uma equipa. Muito unidos. muita coisa desde o início da REDOBRADO ” Trabalhamos juntos há anos e, pandemia. Contudo, em termos também, conseguimos fazer com de trabalho, “a Cirurgia Vascular, Arminda Basílio trabalha há 26 que as duas colegas mais novas do Santa Marta, continua a anos no bloco operatório da se sentissem bem. Estamos cá para operar muito, porque recebe Cirurgia Cardiotorácica, como colaborar e nos apoiar”, conta. doentes muito urgentes”. assistente operacional. Porém, tudo mudou muito nos últimos meses. Joana Coimbra, enfermeira Joana Coimbra O acréscimo de trabalho fez-se do bloco de Cirurgia Vascular, sobre a operação a um doente covid-19 “PENSEI QUE AQUELE ERA O MEU DEVER E QUE TINHA DE O CUMPRIR” Enfermeira do bloco da Cirurgia Vascular, Joana Coimbra foi ao Hospital de Curry Cabral, com dois médicos do seu serviço, instrumentar uma angioplastia a um doente covid-19 positivo, com uma isquémia do membro inferior. “Estava receosa, mas sempre soube gerir muito bem as minhas emoções, por isso não me senti muito nervosa. Pensei que aquele era o meu dever e que tinha de o cumprir.” Afirma não ter muito para contar acerca da cirurgia, 24

“ Cursos e-Learning TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO ORAL NO SETOR DA SAÚDE + x 6 HORAS 3 MÓDULOS € 20 EUROS x + Saiba tudo sobre nós em ” ww25w.miligrama.com.pt

e LABORATÓRIO DE HEMODINÂMICA Duarte Cacela, coordenador do antes de dar entrada um doente o alongamento das listas de Laboratório de Hemodinâmica não covid-19, que teve de espera, quer da intervenção intervencionar. coronária, quer da estrutural, “ADAPTÁMO-NOS MUITO BEM Fazendo referência aos últimos uma vez que adiámos todos E NÃO TIVEMOS GRANDES meses de pandemia, Duarte os procedimentos eletivos. A DISRUPÇÕES” Cacela mostrou sentir-se seguro intervenção estrutural ficou e sem medos. “Adaptámo-nos limitada aos casos mais urgentes.” No que confere ao Laboratório de muito bem e não tivemos grandes O cardiologista de intervenção Hemodinâmica, o ambiente vivido é disrupções a nível dos doentes lamenta, ainda, o facto de, por de tranquilidade. Duarte Cacela, seu e das patologias que tratámos”, conta da pandemia, as pessoas coordenador, falou com a equipa menciona. terem recorrido muito menos de reportagem da Revista Coração, Mas observa: “Obviamente, esta aos serviços de saúde, mesmo Vasos e Tórax, imediatamente situação teve como consequência em casos urgentes, o que veio a 26

Duarte Cacela pessoa é covid negativo, todos os “Provavelmente, a pandemia doentes que entram no laboratório vem sugar todos os recursos e originar “complicações que há são tratados como se um doente poderá trazer o argumento de muitos anos não eram vistas”. com SARS-CoV-2 se tratasse. que não há dinheiro. Vamos Na sala de hemodinâmica, os atravessar um período complexo Hemodinâmica: “um dos profissionais estão devidamente em termos de progressão de locais mais seguros” equipados e, depois da técnicas. Isto é válido para todas as intervenção, o doente permanece especialidades e não apenas para Portugal teve uma lição que numa sala destinada para o efeito, a Cardiologia.” Espanha e Itália não tiveram. Os à qual se chama “covidário”, O Laboratório de Hemodinâmica exemplos destes dois países, entre até que se saiba que é negativo. do Serviço de Cardiologia de outros, permitiu-nos, segundo “Com o tempo, o resultado do CHULC tem cerca de 40 anos e é Duarte Cacela, ter informações teste vai tornar-se mais célere, coordenado por Duarte Cacela, diárias sobre o que acontecia tendendo a normalizar todos estes há três anos, uma experiência que, “lá fora” e prepararmo-nos procedimentos”, acredita de acordo com o próprio, “está a antecipadamente para este novo Duarte Cacela. correr muito bem”. desafio que teríamos mesmo de Nem mesmo no início da pandemia, No entanto, Duarte Cacela não enfrentar. Duarte Cacela se sentiu stressado pode deixar de referir que “há um Foram criados circuitos dentro do ou com medo pela possibilidade fator limitante”. “A expansão da hospital e do próprio laboratório. de estar a intervencionar um intervenção estrutural – envolvendo Nunca lhes faltou equipamento doente com covid-19. “Fazemos procedimentos mais morosos – torna de proteção individual, nem de via coronária há 20 ou 30 anos imprescindível a disponibilização de outra natureza, e o coordenador e já passámos pela grande mais uma sala de hemodinâmica, do Laboratório de Hemodinâmica pandemia do VIH”, sublinha. Para sem a qual o tempo de espera afirma: “Dentro do meu ambiente o cardiologista de intervenção, dos procedimentos coronários de trabalho, o Laboratório de esta situação torna-se disruptiva, não emergentes sofrerá um atraso Hemodinâmica é o local onde me sobretudo, pela logística, do vestir exponencial.” sinto mais seguro”. e do despir e pelo material de Tal como descreve, a menos que proteção individual que tem de Rui Cruz Ferreira, diretor do se saiba antecipadamente que a utilizar durante os procedimentos. Serviço de Cardiologia Nada mais. “CORREU TUDO MUITO BEM O Laboratório DESDE O INÍCIO” Segundo Duarte Cacela, em 2019, O diretor do Serviço de os profissionais do laboratório Cardiologia aproveitou a presença fizeram 1380 angioplastias, da equipa de reportagem para cerca de 3 mil cateterismos de fazer uma avaliação deste tempo diagnóstico e 240 procedimentos de pandemia. “Correu tudo muito de intervenção estrutural. “De bem desde o início. Tivemos muita acordo com os dados nacionais, a relação e apoio dos profissionais redução durante os meses de março do serviço, assim como do PPCIRA, e maio foi entre 30 e 40 por cento, da Qualidade e da Administração, mas a 30 de outubro a redução que vieram até nós para perceber relativamente ao período homólogo o que se passava no terreno e no nosso laboratório era apenas quais eram as principais de 14 por cento, contabilizando-se necessidades”, menciona. nessa altura 930 angioplastias”. Segundo um balanço relativo Questionado quanto ao futuro, ao primeiro semestre de 2020, o coordenador do laboratório, Rui Cruz Ferreira refere que o mostra alguns receios: Serviço de Cardiologia realizou, 27

e Rui Cruz Ferreira sobretudo enfermeiros, por baixas Hospital de Santa Marta. Apenas relacionadas com o confinamento. as pessoas com maior grau até ao mês de junho, 84 por Apesar de toda esta situação, tem de gravidade são consultadas cento da produção de 2019. sido ainda possível manter “alguma presencialmente, optando-se, “A hemodinâmica foi sempre atividade de investigação”. na maior parte dos casos, pela preservada e em termos de Até, realizaram um conjunto teleconsulta. angioplastia finalizámos o semestre de webinares, no final do mês Os profissionais do Serviço com 87 por cento da produção de junho, que versou sobre as de Pneumologia encontram-se de 2019, tendo adiado alguns temáticas da inovação e das novas muito limitados no que respeita procedimentos eletivos, reduzindo tecnologias, que estão a incorporar à realização de exames de as marcações”, indica. na atividade do serviço. diagnóstico, porque, na sua O diretor do serviço salienta ainda maioria, há risco de contágio, que conseguiram remarcar todos João Cardoso, diretor do por serem geradores de os pedidos de primeira consulta até Serviço de Pneumologia aerossóis. “Fazemos os exames ao final do mês de junho, pelo que, imprescindíveis, após o doente ser à data desta entrevista, não tinha “A PNEUMOLOGIA FOI considerado não covid.” primeiras consultas em atraso. “Este FORTEMENTE ATACADA NA No internamento, a logística não é um aspeto muito importante, que SUA PRÁTICA DIÁRIA” é mais fácil, pois é necessário nos causa muita satisfação.” manter os doentes afastados. Além disto, o cardiologista indica João Cardoso, diretor do Serviço “A articulação de toda a que foi, também, possível dar de Pneumologia, refere que, em logística tem sido complicada, resposta a situações “complexas” termos respiratórios, existe um pré mas a equipa é fantástica relacionadas com a diminuição e um pós-covid e que a atividade e tem conseguido manter o de recursos humanos. Têm menos assistencial da Pneumologia acompanhamento dos doentes, cinco médicos do que no ano foi gravemente perturbada. “É de forma presencial ou à passado, além de uma redução preciso excluir a presença da distância”, termina João Cardoso. de cerca de 20 por cento covid-19, para se poder tratar dos profissionais do serviço, um doente respiratório neste João Cardoso serviço.” Caso contrário, a pessoa é encaminhada para o Hospital de Curry Cabral. “A Pneumologia foi fortemente atacada na sua prática diária, tanto no ambulatório, como na consulta, no internamento e nas urgências. Temos muitas limitações no tratamento dos doentes respiratórios por oxigénio ou por ventilação; nos exames invasivos; nos exames de adaptação respiratória, entre outras”, indica. E acrescenta que estão, também, muito limitados em número de exames, uma vez que as salas têm de ser desinfetadas e arejadas entre cada doente. Passou a haver uma seleção criteriosa dos doentes vistos em consulta de Pneumologia, no 28

e Catarina de Oliveira e Helena Fonseca, cardiopneumologistas “A UNIDADE DE SÍNCOPE DÁ RESPOSTA IMEDIATA ÀS NECESSIDADES DOS DOENTES” Com base nas mais recentes orientações nacionais e internacionais, foi criada, recentemente, a Unidade de Síncope do Serviço de Cardiologia do CHULC. O que se pretende é dar resposta imediata às necessidades destes doentes, melhorando a sua qualidade de vida, tanto em termos físicos, como psicológicos. Mário Oliveira e Sérgio Laranjo, cardiologistas, Catarina de Oliveira e Helena Fonseca, técnicas de Cardiopneumologia A síncope manifesta-se como associado à síncope seja baixo, encontra inserida a US, sob a um episódio de perda transitória a probabilidade de recorrência coordenação dos cardiologistas de consciência decorrente de e associação a traumatismos é Sérgio Laranjo e Ana Lousinha. hipoperfusão cerebral, de início elevada, sobretudo no caso dos “A equipa é constituída por súbito, de curta duração e de idosos. “Ainda que a síncope ocorra cinco cardiologistas e três recuperação espontânea. de forma intermitente, trata-se de cardiopneumologistas, que “Existem vários tipos de síncope uma situação limitante para os pretendem tornar o espaço “numa e muitas estratégias terapêuticas doentes, com grande impacto na unidade de referência”. para o seu tratamento, e sua qualidade de vida”, salientam. “A US é multidisciplinar e está a Unidade de Síncope estritamente dedicada à síncope. (US) tem como missão dar Espaço estritamente Todos os profissionais são resposta a todas”, afirmam as dedicado à síncope especializados nesta área, tanto cardiopneumologistas Catarina a equipa técnica, como a equipa de Oliveira e Helena Fonseca, O estudo e o tratamento médica e, brevemente, vamos referindo que este tipo de eventos da síncope têm evoluído ter a colaboração de outras coloca também em causa o bem- significativamente nos últimos especialidades médicas com estar psicológico do doente. anos. A US do CHULC é, de relevância no estudo de alguns E explicam: “Quando recorrente, acordo com Catarina de Oliveira tipos de síncope”, afirma a síncope reduz a autonomia do e Helena Fonseca, a primeira Helena Fonseca. doente no que respeita às suas unidade criada com base nas mais De acordo com as atividades diárias, limitando-o na recentes orientações nacionais e cardiopneumologistas, a vida quotidiana. Muitos acabam internacionais. investigação diagnóstica da por ter depressão, queixas de dor e O cardiologista Mário Oliveira é síncope, o seu seguimento e desconforto inexplicado”. o responsável do Departamento tratamento são vertentes das quais Segundo as cardiopneumologistas, de Arritmologia, Pacing e a equipa técnica é parte integrante embora o risco de morte Eletrofisiologia, em que se e assume especial relevo. 30

Helena Fonseca US, cada doente é discutido e cardioinibitórias com assistolia”, que analisado pela equipa, que utiliza exigem decisões rápidas. Por essa “Criámos um protocolo uma estratégia de investigação razão, estão sempre dois elementos de estratificação de risco, diagnóstica direcionada. “Trata- da equipa técnica na sala e um principalmente para a síncope -se de um exame provocativo, elemento médico à chamada. vasovagal, baseado na anamnese considerado de última linha, dos eventos sincopais, nos relatos feito com o objetivo de despistar Tilt Training: uma terapêutica de testemunhas, nos fatores a síncope vasovagal. É preciso com resultados visíveis precipitantes e nos de risco excluir uma série de outras cardiovascular, na história clínica, patologias antes de avançarmos Feito o diagnóstico, o doente é nos scores de risco e, ainda, em para a realização deste teste de referenciado para uma consulta ou outros meios complementares inclinação”, esclarece Helena tratamento específicos ou para outra de diagnóstico anteriormente Fonseca. especialidade médica. As consultas realizados”, indica A realização do exame pressupõe de síncope e de arritmologia, Catarina de Oliveira. a indução do desmaio, por via assim como alguns tratamentos, o Helena Fonseca acrescenta que, passiva e/ou farmacológica, ensino ao doente e o follow up são além disso, dão também “apoio dependendo do protocolo a realizados na unidade. educacional” no que respeita aplicar, para que se possa Uma das estratégias terapêuticas à síncope e que esta vertente é perceber o que acontece no para a síncope vasovagal “fulcral” para a prevenção das organismo do doente. é o Tilt Training (treino de recorrências de eventos, assim “Não se trata de um exame ortostatismo), realizado pelas como para a melhoria geral da agradável, uma vez que o seu end cardiopneumologistas, que qualidade de vida dos doentes. point é a reprodução dos sintomas consiste em sessões sucessivas e da síncope. O doente com uma de stress ortostático, até o doente Tilt Test (teste de inclinação boa triagem clínica vai, muito conseguir estar 30 minutos em em mesa basculante) e a provavelmente, ter uma síncope, pé, sem queixas e sem alterações síncope vasovagal mas em ambiente controlado e significativas dos parâmetros vitais. totalmente monitorizado”, afirma “Reeducamos o organismo Antes da realização do Tilt Test, Catarina de Oliveira. exame diagnóstico realizado na Quando questionadas acerca Catarina de Oliveira da dificuldade da realização deste exame e das possíveis situações de stress pelas quais já passaram, ambas respondem com entusiasmo: “Causa alguma ansiedade, mas a parte desafiante do Tilt Test é, exatamente, a reprodução dos sintomas e dos eventos dos doentes. Confirmado o diagnóstico de síncope vasovagal, pode fazer- -se a diferença no tratamento e no seguimento destes doentes.” Durante o exame, a equipa tem de estar preparada para reagir a qualquer eventualidade pois, por vezes, pode haver surpresas. Todos os doentes são diferentes e, obviamente, as suas reações ao Tilt Test também, sobretudo em situações de “respostas 31

e à posição ortostática, mais doentes. E damos. Mesmo com a tentar reproduzir ao máximo as concretamente aumentando a pandemia estamos a conseguir condições da unidade, em casa eficácia do reflexo baroreceptor na e espero que, no futuro, sejamos dos doentes. Estamos a solicitar adaptação cardiovascular que é ainda melhores”, afirma alguns dispositivos que nos vão exigida em ortostatismo, de forma Catarina de Oliveira. permitir monitorizar parâmetros, a evitar novos desmaios. É uma “Com o início da pandemia, tais como a frequência cardíaca e terapêutica eficaz, com resultados alguns dos projetos que a pressão arterial em tempo real, bastante visíveis”, explica Helena estávamos a desenvolver ficaram assim como a aguardar o acesso Fonseca. Acrescentando, ser em standby, como o Fast Track à plataforma de telessaúde aplicado um protocolo específico com o Serviço de Urgência do CHULC, através da qual e feita uma série de três sessões e a avaliação da disfunção pretendemos fazer a vigilância de treino por semana, durante três autonómica”, refere dos doentes durante as sessões semanas, podendo ser extensível Helena Fonseca. do tratamento.” a uma segunda série, após No entanto, tendo em conta o A plataforma de telessaúde vai reavaliação médica. momento que estamos a viver, a permitir a realização de outros equipa da US está a implementar projetos, já pensados para a Em melhoria contínua outros projetos, tal como o “Home área da promoção da saúde em Self Monitoring - Tilt Training”, doentes com síncope recorrente, “Como US temos de conseguir que vai permitir a realização do como a realização de sessões dar resposta imediata aos nossos Tilt Training remotamente: “Vamos educacionais de prevenção. Tilt Training: a luz ao fundo do túnel Ludovina Costa tem 74 anos de idade e tem síncopes desde adolescente. Dos episódios mais graves, recorda quando partiu a cabeça. “Só me dei conta quando vi que tinha uma mancha de sangue no chão”, lembra. Apesar dos desmaios serem uma constante na sua vida, já sabia como os controlar. “Conheço os sinais do meu corpo. Quando percebia que estava a começar a ter uma quebra de tensão, já sabia o que fazer: sentava-me para não cair”. Aprendeu a lidar com a doença e nunca deixou que esta limitasse a sua vida: “Sempre fiz tudo normalmente. Ir às compras, ao ginásio…” Contudo, o ritmo cardíaco a que o coração batia era, tal como refere, “assustador”. “Numa consulta com o meu cardiologista, a pulsação atingiu os 200 batimentos em segundos”. O médico encaminhou Ludovina Costa para o Hospital de Santa Marta, onde foi “muito bem acolhida”. “A receção foi sempre muito boa. Fizeram-me alguns exames e depois indicaram que o Tilt Training seria a solução”, recorda. Iniciou o tratamento em janeiro e terminou-o em meados de fevereiro, deste ano. Até à data desta entrevista, a antiga professora de matemática, não voltou a ter quebras de tensão e os desmaios não voltaram a fazer parte da sua rotina. A terapêutica revelou-se “um verdadeiro milagre”. “Nunca mais desmaiei”, salienta. Tal como explica, trata-se de um tratamento completamente indolor. “Deitamo-nos numa mesa basculante, colocam-nos cintos de contenção no tronco e nas pernas e, depois, inclinam-nos até ficarmos praticamente em pé. Basicamente, é reeducar do organismo de forma a evitar novos desmaios.” Para terminar, Ludovina agradece aos profissionais de saúde com um sorriso na voz: “Foram todos muito simpáticos.” 32

ISQUÉMIA CRÓNICA DOS MEMBROS OPINIÃO INFERIORES A doença arterial periférica afeta mais de 200 milhões de pessoas globalmente. Associa-se ao envelhecimento da população e consequente aumento dos fatores de risco cardiovasculares. A doença arterial periférica manifesta-se clinicamente sob a forma de isquémia crónica de membro inferior. Esta constitui um problema de saúde global com elevado impacto económico e social determinado pelas suas consequências. A doença arterial periférica afeta Ricardo Correia Nelson Camacho mais de 200 milhões de pessoas Interno de Formação Assistente Hospitalar globalmente. Associa-se ao Específica de Angiologia envelhecimento da população e Cirurgia Vascular de Angiologia e consequente aumento dos e Cirurgia Vascular fatores de risco cardiovasculares. A doença arterial periférica Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular manifesta-se clinicamente sob a Hospital de Santa Marta, CHULC forma de isquémia crónica de membro inferior. Esta constitui um vasculares do nosso Serviço intermitente limitante em 22%. problema de saúde global com revascularizaram de forma primária A gravidade do quadro clínico elevado impacto económico e um total de 217 membros inferiores. inicial determina que uma social determinado pelas suas 80% eram do sexo masculino e considerável proporção de doentes consequências. 20% do sexo feminino. A média de seja admitida pelo serviço de O Serviço de Angiologia e idades era de 67,8 anos. urgência. Isto requer uma adequada Cirurgia Vascular do Hospital de Os fatores de risco capacidade de resposta de Santa Marta orgulha-se de ser cardiovasculares mais prevalentes internamento e intervenção cirúrgica, uma referência, entre os pares, no na população revascularizada que o Serviço tem conseguido tratamento da isquémia crónica eram: tabagismo (60%), HTA manter ao longo dos últimos anos, de membro inferior. O elevado (80%), dislipidemia (49%), DM apesar das restruturações que tem volume de doentes referenciados (60%), doença renal crónica sofrido. A mediana de dias de para este Serviço associado (21%, com 12% em programa de internamento até à intervenção a uma especialização técnica hemodiálise). 39% tinha doença vascular foi de três dias. diferenciada do seu corpo arterial coronária e 17% doença Tal como noutras áreas cirúrgicas, clínico determinam uma extensa cerebrovascular documentada. a cirurgia minimamente invasiva experiência nas múltiplas técnicas O motivo da cirurgia de tem-se imposto como determinante vasculares disponíveis atualmente revascularização foi isquémia na opção terapêutica. A clássica para o tratamento desta patologia. crónica com compromisso da cirurgia aberta ou convencional tem De 1 de janeiro de 2018 a 31 de viabilidade do membro em vindo a ser substituída pela cirurgia dezembro de 2018, os cirurgiões 78% dos casos e claudicação endovascular, realizada de forma 33

e percutânea, sem incisão cirúrgica, a cirurgia endovascular, 21% a crónica de membro inferior com menos perdas sanguíneas e cirurgia aberta ou convencional apresentam doença aterosclerótica alterações hemodinâmicas, com e 10% a cirurgia híbrida multissegmentar, pelo que é períodos de internamento mais (endovascular associada a necessário no mesmo tempo curtos e regresso mais rápido a uma convencional). operatório revascularizar lesões vida ativa. Uma grande proporção dos anatómicas em múltiplos setores 69% dos membros foi submetido doentes tratados com isquémia anatómicos. Tabela 1 Tabela 2 O tipo de dispositivo utilizado na Cirurgia convencional Cirurgia endovascular angioplastia foi: realizada realizada Cirurgia convencional realizada N Cirurgia endovascular realizada N Tabela 3 Bypass ou interposição aorto-femoral 17 CERAB*/kissing stent 8 Tipo de dispositivo Bypass femoro-femoral 6 Angioplastia ilíaca 30 endovascular utilizado Endarterectomia femoral 25 Angioplastia femoral 80 Bypass femoro-popliteu supragenicular 16 Angioplastia popliteia 57 Bypass femoro-popliteu infragenicular 7 Angioplastias distais 94 Dispositivo endovascular N POBA (plain old balloon angioplasty) 164 Bypass femoro-distal 2 DCB (drug-coated balloon) 43 Bypass poplíteo-distal 1 TOTAL 269 Stent descoberto 57 Bypass axilo-femoral 1 Stent coberto 5 TOTAL 75 O conduto ou patch utilizado nas cirurgias *CERAB: covered endovascular aotic acima foi prótese em 61 casos (Dacron em 54, bifurcation reconstruction PTFE em 7), veia em 13 casos e composto com veia e prótese de PTFE em 1 caso. A isquémia de membros inferiores é A taxa de reintervenção vascular na estado médico global. uma patologia que envolve tratamento população analisada foi de 15% a 1 A isquémia crónica anuncia simultâneo em várias frentes, além da mês, 22% a 1 ano e 26% a 2 anos. aterosclerose vascular revascularização cirúrgica: A taxa de amputação major foi disseminada, pelo que os doentes 1. Intervenção de desbridamento ou de 6% a 1 mês, 14% a 1 ano e com isquémia crónica têm alto 17% a 2 anos (Gráfico 1). Estas risco de morte cardiovascular. Na limpeza cirúrgica taxas são bastante inferiores às população estudada, a sobrevida 2. Antibioterapia taxas de amputação nos doentes foi de 95% a 1 mês, 83% a 1 ano 3. Cuidados de penso com isquémia crónica que não e 73% a 2 anos (Gráfico 2). 4. Fisioterapia de reabilitação são submetidos a cirurgia de A manutenção da capacidade 5. Otimização de status clínico global revascularização (<1%/ano de deambulação e a melhoria Por conseguinte, a isquémia crónica nos doentes com claudicação da qualidade de vida destes requer cuidados de internamento intermitente e ~25% a 1 ano nos doentes após salvage do membro frequentemente prolongados. Na doentes com compromisso de é exuberante. O nosso Serviço é amostra apresentada, o período viabilidade do membro). reconhecido por ser um que trata mediano de internamento foi 15 dias. Em alguns membros que foram mais e melhor esta patologia no A eficácia da cirurgia de submetidos a reintervenção país. Cada membro que deixa revascularização de membro inferior vascular ou a cirurgia de de requerer cuidados de penso é determinada pelo número de amputação major, ocorreu ou que evita a amputação é uma doentes que tem de realizar outro trombose ou restenose da cirurgia vitória para todos elementos procedimento de revascularização de revascularização realizada; do corpo clínico do Serviço de no mesmo membro (taxa de em outros o quadro clínico Angiologia e Cirurgia Vascular reintervenção vascular) e pelos progrediu apesar da cirurgia do Hospital de Santa Marta e um membros que são submetidos a de revascularização se manter incentivo para a continuação da cirurgia de amputação acima funcionante, por agravamento da prestação dos melhores cuidados do nível do tornozelo (taxa de infeção, neuropatia ou aos nossos doentes. amputação major). 34

e Consulta de Prevenção Cardiovascular do Serviço de Cardiologia Pediátrica “A NOSSA INTERVENÇÃO VAI TER REFLEXOS NA INCIDÊNCIA DA DOENÇA CARDIOVASCULAR DO ADULTO” Conceição Trigo Com cerca de 12 anos, a Consulta de Prevenção Cardiovascular realizada no Serviço de Cardiologia Pediátrica do CHULC tem vindo a adaptar-se, ao longo dos tempos, de forma a responder às atuais necessidades. De acordo com os cardiologistas pediátricos desta consulta, o objetivo é reduzir a incidência de eventos cardiovasculares no adulto, tal como sua a mortalidade e morbilidade associada. A doença cardiovascular é a também significativamente maior risco cardiovascular conhecido, principal causa de morte em do que nos adultos, podendo quer estes se relacionem com Portugal, e, em grande parte, atingir os 40 a 50 anos, em vez doenças coexistentes, quer com é atribuível à aterosclerose. dos 10 a 20 anos nos adultos”, as consequências de hábitos Algumas crianças são portadoras afirma a cardiologista pediátrica de vida incorretos - obesidade, de doenças e/ou de fatores Conceição Trigo, justificando, sedentarismo, entre outros”, explica. de risco que aceleram este assim, a criação e a realização Assim sendo, esta consulta processo e, consequentemente, da Consulta de Prevenção destina-se a crianças com aumentam o risco de eventos Cardiovascular do Serviço de problemas identificados, cardiovasculares precoces. Cardiologia Pediátrica do CHULC, como sejam fatores de risco Uma criança com um desses da qual é responsável. cardiovasculares conhecidos, fatores de risco vai estar exposta Tal como conta, a Consulta doenças inflamatórias crónicas, ao mesmo durante a maior de Prevenção Cardiovascular doença de Kawasaki, doenças parte da sua vida, tornando- não é recente. Iniciou o seu renais crónicas; hipertensão se necessário e vital intervir funcionamento há cerca de 12 arterial; diabetes e outras doenças de forma preventiva, para anos, contudo tem vindo a ser endócrinas; dislipidemias; e reduzir a incidência de eventos reformulada e adaptada às síndrome metabólica. cardiovasculares futuros, bem necessidades que têm surgido aos como a mortalidade e morbilidade longo dos anos, tendo adotado A consulta do Serviço de associada. recentemente a atual designação. Cardiologia Pediátrica “Os ganhos em saúde com a “O que se pretende desde o prevenção cardiovascular em início é responder à necessidade Interno do 5.º ano de formação idade pediátrica são maiores crescente de promoção de específica de Cardiologia do que em idade adulta, uma medidas preventivas em crianças Pediátrica, Guilherme Lourenço vez que o horizonte temporal é e adolescentes, com fatores de tem particular interesse nesta 36

área e é, por essa razão, um identificação dos hábitos com o programa de Reabilitação dos médicos que faz a Consulta dietéticos da criança e da Cardíaca do Serviço e com de Prevenção Cardiovascular, família, dos hábitos tabágicos a Faculdade de Motricidade juntamente com Conceição das crianças e dos pais e da Humana, de forma a estabelecer Trigo. Tal como explica esta quantificação da atividade física programas individualizados é uma consulta referenciada, desenvolvida diariamente, a nível de exercício físico para cada sendo as crianças enviadas de escolar e pós-escolar. criança, com objetivos tanto outras consultas médicas, como Para que seja completa, terapêuticos, como preventivos, Pediatria, Nefrologia Pediátrica e esta avaliação inclui ainda e para a promoção de estilos de Endocrinologia Pediátrica. a realização de estudos vida saudáveis.” “Com a crescente divulgação laboratoriais e exames A consulta tem uma periodicidade desta problemática é nosso complementares de diagnóstico semanal, na qual são observadas propósito desenvolver ações de que permitem aos profissionais oito crianças, sobretudo formação junto da comunidade obter dados mais precisos adolescentes, e respetivas famílias. de forma a tornarmos mais acerca da saúde do sistema Conceição Trigo intervém: dinâmica a nossa relação com cardiovascular. “Não podemos deixar de a Medicina Geral e Familiar”, “A consulta é pluridisciplinar referir a colaboração do nosso refere o jovem médico. envolvendo, além do centro no Estudo Português de E conta que, durante a consulta, cardiologista pediátrico, Hipercolesterolemia Familiar, é feita a avaliação correta do enfermeiro, nutricionista, que nos tem permitido identificar risco de uma criança desenvolver psicólogo e assistente social, em e orientar doentes com esta aterosclerose prematura, função das necessidades”, refere alteração genética e metabólica.” através da colheita de uma Guilherme Lourenço. “Os benefícios da nossa história familiar meticulosa, E continua: “A curto prazo está abordagem são de difícil particularmente dirigida à planeada a colaboração estreita avaliação ou quantificação, sendo uma intervenção precoce Guilherme Lourenço com impacto na vida adulta. No entanto, acreditamos que a longo prazo esta intervenção irá ter os seus reflexos na incidência da doença cardiovascular do adulto e esse é o nosso grande objetivo”, desenvolve. Prevenção cardiovascular na infância devia ser frequente Questionada quanto à realização deste tipo de abordagem nos mais pequenos, a responsável da Consulta de Prevenção Cardiovascular afirma que deveria ser feita com mais frequência. “A verdade é que não é assim tão raro encontrar crianças com fatores de risco cardiovascular. Por exemplo, a obesidade e a síndrome metabólica são muito frequentes na população portuguesa, e também em crianças, fruto de estilos 37

e de vida pouco saudáveis”, cardiovasculares num horizonte idade têm pais com idade observa Conceição Trigo, próximo, há alguma tendência inferior a 40 anos, ou seja, fazendo referência a números para desvalorizar a existência poderão ainda, não ter sofrido esclarecedores relativamente dos fatores de risco. Por isso, qualquer evento cardiovascular, à temática. torna-se necessário investir mesmo se portadores de Os dados do COSI (Childhood na prevenção primordial para hipercolesterolemia familiar. Além Obesity Surveillance Initiative reduzir a incidência de fatores disso, visto que o tratamento só é for Europe) mostram que cerca de risco, identificar e tratar iniciado a partir dos 8-10 anos, de 30 por cento das crianças precocemente estados como a não nos parece existir benefício portuguesas entre os 6 e os 8 anos obesidade infantil e a hipertensão em fazer o rastreio nesta têm excesso de peso, incluindo 1,8 arterial”, afirma. idade”, indica Conceição Trigo. – 4,1 por cento com obesidade E indica que é frequente ver Acrescentando que, algumas grave. “Se ignorarmos este doentes com o Boletim de Saúde sociedades internacionais, problema estas crianças atingirão Infantil e Juvenil com a curva de preconizam a realização de um a vida adulta com um risco percentis do peso e da altura rastreio universal antes do início cardiovascular elevado”, observa. preenchidos, mas não a do da puberdade, aos 9-11 anos. A hipertensão arterial também não índice de massa corporal, “o que “Apesar de ainda ser é rara, sendo a sua prevalência, pode atrasar o diagnóstico de controverso, parece-nos em idade pediátrica, de cerca excesso de peso”. defensável, tendo por base de 3,5 por cento nas séries Por outro lado, segundo a dados recentes que demonstram internacionais. E, por outro lado, cardiologista pediátrica, a uma enorme redução de eventos de acordo com Conceição Trigo, pressão arterial deve ser cardiovasculares em indivíduos existem ainda as doenças não avaliada, anualmente, a com hipercolesterolemia familiar, relacionadas com estilos de vida todas as crianças a partir quando tratados desde a idade inadequados, que conferem um dos 3 anos ou até antes, em pediátrica.” maior risco, como por exemplo a situações específicas, como A especialista frisa, também, a hipercolesterolemia familiar. por exemplo nas que nasceram necessidade de se fazer uma “Qualquer criança que tenha prematuramente. avaliação global de risco a um fator de risco cardiovascular “Para isso, é necessário que a crianças com doenças graves, deve ter uma avaliação global técnica seja efetuada de forma que conferem aumento do risco para excluir ou identificar adequada, nomeadamente com cardiovascular, como por exemplo, fatores adicionais, tratá-los, e, a utilização de braçadeiras de a doença renal crónica, a simultaneamente, promover um tamanho adequado, o que não é diabetes, as doenças inflamatórias estilo de vida saudável”, salienta. frequente acontecer nas consultas crónicas, a infeção por VIH e os de Medicina Geral e Familiar. É sobreviventes de cancro. Consciencialização da essencial fazer a medicação com Trabalhamos com a Pediatria do comunidade médica a criança calma e comparar com Hospital de Dona Estefânia e de os valores tabulados. Isto é um outros hospitais referenciadores, Conceição Trigo acredita procedimento demorado e nem os colegas estão habitualmente que ainda é necessário sempre é fácil”, refere. muito atentos a esta questão e consciencializar, não só a A médica diz ainda que, em trabalhamos de forma integrada população em geral, mas também relação às dislipidemias, o para dar os melhores cuidados a a comunidade médica para a Programa Nacional de Saúde estes doentes”, salienta. importância da prevenção das Infantil e Juvenil recomenda rastrear E termina: “Não nos podemos doenças cardiovasculares em aos 2 e aos 4 anos, as crianças esquecer dos doentes mais raros, idade pediátrica. com história familiar de eventos que têm alterações das artérias “Se considerarmos que cardiovasculares em idade jovem. coronárias, seja por doença de as crianças têm um risco “No entanto, devemos ter em Kawasaki ou cirurgia cardíaca absoluto baixo de eventos mente que crianças com essa com reimplantação coronária.” 38

Paula Pinheiro, enfermeira gestora; Rosa Miranda, enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação; Jorge Fernandes, enfermeiro especialista em Enfermagem de Reabilitação; Lourença Prada, enfermeira especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica ABORDAGEM ENDOVASCULAR DO ANEURISMA DA AORTA ABDOMINAL EM ROTURA – A NOSSA REALIDADE DE ENFERMAGEM O Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC), em 2004, foi o primeiro Serviço, em Portugal, a tratar o doente com Aneurisma da Aorta Abdominal em Rotura (AAAr) por via endovascular (Endovascular aortic aneurysm repair-EVAR). Os procedimentos e cuidados de enfermagem prestados Em Portugal, a prevalência de AAA é de 2,2% na a este doente evoluíram e acompanharam o aumento população com mais de 60 anos, sendo 3,94% nos do número de doentes tratados por EVAR, baseados homens com mais de 65 anos. Esta prevalência é no conhecimento científico e experiência adquiridas comparável à verificada na população europeia. ao longo de 16 anos. A equipa de enfermagem (Fernandes e Fernandes & Sousa, 2016). Cerca de 75% procurou analisar os cuidados prestados ao doente em dos AAA são assintomáticos. situação de AAAr, à luz dos princípios preconizados Atualmente, o AAAr continua a ser uma patologia pela pesquisa bibliográfica efetuada, num Estudo potencialmente fatal, com uma taxa de mortalidade retrospetivo de todos os casos de AAAr, submetidos a global é superior a 80% (Gonçalves, 2009). Contudo, tratamento por EVAR, admitidos no SACV. Conclusão: a evidência mais recente sugere uma transição Correta avaliação e cuidados pré e pós-operatórios epidemiológica, com a incidência e mortalidade destes doentes; Vigilância e monitorização contínua a decrescerem, motivada pela diminuição da por parte da equipa de enfermagem; os Cuidados exposição aos fatores de risco como a redução do de enfermagem prestados vão de encontro aos consumo tabágico, único fator de risco modificável recomendados por algumas referências internacionais provadamente associado ao desenvolvimento, (Society for Vascular Nursing -SVN; European Society progressão e rotura eventual do Aneurisma da Aorta for Vascular Surgery -ESVS; National Institute for Health Abdominal (AAA) (Saúde, 2017). Igualmente, a maior and Care Excellence-NICE). utilização de fármacos cardioprotetores (estatinas), o aumento da disponibilidade de meios de diagnóstico Introdução (Saúde, 2017) poderá ter levado a uma maior referenciação de doentes com AAA com consequente Diferentes tipos de mecanismos patológicos podem reparação eletiva e, à melhoria das modalidades de afetar a aorta. Frequentemente a parede da aorta é tratamento (tratamento endovascular). afetada pela progressiva degeneração da elastina e Comparativamente ao tratamento convencional a colagénio da camada média. Esta degeneração poderá literatura aponta para uma diminuição da mortalidade ser mais frequente na aorta infrarrenal, traduzindo-se e morbilidade aos 30 dias (Gonçalves, 2009) com num aumento da rigidez da parede arterial, resultando o tratamento endovascular e, estima que 95% dos desta forma em doença aneurismática e gradual doentes estão aptos nos seus autocuidados após a alta. dilatação. Considera-se aneurisma quando há um O tratamento endovascular do AAA tem substituído aumento no normal diâmetro da aorta – superior progressivamente o tratamento por cirurgia aberta/ a 30mm ou a 1,5x o diâmetro do vaso “saudável” /convencional. Em paralelo o número de mortes por imediatamente adjacente (Gonçalves, 2009). AAA, íntegro ou roto, diminuiu significativamente. 39

e Sempre que possível o EVAR é o tratamento de eleição Sendo uma situação particularmente stressante, a para AAAr. preparação pré-operatória do doente com AAAr, O Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular realizou o incide especialmente na estabilização hemodinâmica, seu primeiro EVAR num doente com AAA em rotura no controlo da dor e ansiedade, prevenção e controlo ano de 2004, aplicando este procedimento cada vez de complicações e despiste de potenciais riscos. mais frequentemente e num maior número de doentes No que concerne à avaliação inicial do doente, ao longo dos anos. esta deve garantir os dados que podem minimizar o O Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do risco cirúrgico, designadamente as alergias, regime CHULC - Hospital de Santa Marta foi o serviço medicamentoso, patologia cardíaca, respiratória e renal inaugural desta especialidade no país. Foi fundado (Tinkham M. R., 2009). em 1973 e desde então tem desempenhado uma Os cuidados pós-operatórios devem ter como objetivos atividade assistencial, formativa e científica importante a estabilização hemodinâmica, com uma vigilância e inovadora. É constituído por uma enfermaria de 26 e controlo de tensão arterial e monitorização dos camas, 1 Unidade de Cuidados Intermédios Vasculares parâmetros vitais (Maldonado, 2014), controlo da dor e (UCIV) e 1 Unidade de Dor Vascular (UDV), tendo vigilância de perdas sanguíneas, a avaliação de sinais de ainda Urgência (Urgência Referenciada–desde 1999 e, compromisso neuro-circulatório dos membros inferiores integra a Urgência Polivalente do CHULC). e a monitorização do débito urinário, por possível lesão A área assistencial do SACV é abrangente (parte de nos vasos renais e/ou lesão por injeção de contraste Lisboa e da sua Área Metropolitana, Médio Tejo, administrado no intraoperatório (Tinkham M. R., 2013). Ribatejo, Alentejo e apoio à urgência do Hospital Outro dos cuidados a destacar é a prevenção de Garcia d’Orta), pelo que o fluxo de doentes com AAA complicações seja no local de acesso – hematoma, é significativamente elevado, quer sintomáticos, quer formação de fístula arteriovenosa e infeção – sejam em situação de rotura, sendo o EVAR o procedimento hematoma retroperitoneal, pseudoaneurisma ou de eleição. oclusão arterial (Rich, 2016). O Percurso do doente com AAAr – a nossa realidade O percurso do doente com AAAr no SACV estrutura-se da seguinte forma: PFiegrcuurraso1do doente com AAAr no SACV O percurso pré-operatório do doente com AAAr comporta 3 fases: pré- hospitalar com o contacto telefónico; admissão do doente na Urgência Cirurgia Vascular e encaminhamento para a UCIV (Figura 2): FFaigseuPrraé2-operatória do doente com AAAr 40

Em cada fase, os diversos procedimentos são efetuados A nossa prática no cuidar destes doentes procura por toda uma equipa constituída por cirurgiões sempre prevenir e/ou minimizar eventuais de urgência, equipa de enfermagem e assistentes complicações decorrentes da cirurgia, bem como operacionais. otimizar as condições para o restabelecimento Após o procedimento cirúrgico o doente, mediante o precoce dos autocuidados do doente. estado clínico poderá ser transferido para a Unidade de Na UCIV/UDV os principais cuidados de Cuidados Intensivos, a UCIV ou UDV. enfermagem instituídos são (Figura 3): Resultados do Estudo Figura 3 Cuidados de Enfermagem prestados ao Num Estudo retrospetivo de todos os casos de AAAr, doente submetido a EVAR submetidos a tratamento por EVAR, admitidos no SACV, no período de 01/01/2017 a 30/09/2018, a equipa de Intervenções de Enfermagem, Atitudes enfermagem procurou analisar os cuidados prestados ao Terapêuticas/Vigilância. doente em situação de AAAr, à luz dos princípios preconizados Para o presente estudo foram considerados 32 pela pesquisa bibliográfica efetuada. Esta análise baseou- casos com o diagnóstico de AAA em rotura (19 -se nos registos efetuados no aplicativo informático SClinico, casos, 59,4%) ou sintomático (13 casos, 40,6%) identificando-se Focos de Atenção de Enfermagem, e submetidos a cirurgia de urgência por técnica endovascular. Dos 32 doentes, 29 foram admitidos diretamente na UCIV (90,6%) e 3 na UDV (9,4%). Os cuidados pré-operatórios prestados pela equipa de enfermagem vão ao encontro do que é descrito na bibliografia consultada (Figura 2). Após o procedimento cirúrgico 61% dos doentes permaneceram na UCIV, conforme gráfico 1. Da análise dos dados obtidos contabilizaram-se 39 Focos/Diagnósticos de Enfermagem, DGrisátfriicboui1ção dos doentes por Unidade Pós-EVAR 41

e destacando-se com igual percentagem os Diagnósticos de Enfermagem Auto Cuidado Higiene, Perfusão dos Tecidos e Úlcera de Pressão (96,9%), surgindo em seguida Infeção (93,8%), Ferida Cirúrgica (90,6%), Queda (90,6%) Hemorragia (62,5%), Dor (56,3%), Posicionar-se (53,1%) e Hematoma (25%), cuidados que surgem como fundamentais na pesquisa bibliográfica. Gráfico 2 Percentagem de Diagnósticos de Enfermagem (n=39) Em relação às Intervenções de Enfermagem há a referir As Intervenções de Enfermagem Executar e Gerir um total de 356 intervenções diferentes distribuídas com mais expressão vão também ao encontro do pelas categorias: ATENDER, EXECUTAR, GERIR, preconizado. O Gráfico 4 mostra os dados relativos à INFORMAR e MONITORIZAR/ VIGIAR (Tabela 1): Intervenção de Enfermagem Executar. Na Intervenção de Enfermagem Gerir identificaram-se em maior número “otimizar cateter” (venoso periférico e central, arterial), “Medidas de segurança”, “Oxigenoterapia”. TInatberevlaen1ções de Enfermagem por Tipo IGnrtáerfivceonç4ão de Enfermagem Executar (nt=165) A Intervenção de Enfermagem Monitorizar e Vigiar, Na Intervenção de Enfermagem Assistir evidenciam-se revelou-se com a maior percentagem, evidenciando-se os autocuidados alimentar-se, higiene, uso de sanitário, que os cuidados prestados no período pós-operatório posicionar-se e mobilizar-se (Gráfico 5): vão ao encontro dos preconizados (Gráfico 3): PGerrácfeinctoag3em de Intervenção de Enfermagem Gráfico 5 Monitorizar e Vigiar (nt=524) Intervenção de Enfermagem Assistir (nt=70) 42

Nos registos de enfermagem identificaram-se 26 Atitudes Referências Bibliográficas Terapêuticas, sendo que o Balanço Hídrico e os Parâmetros Vitais foram sinalizados nos 32 doentes. A tabela 2 enumera • Alves, G. R. (Junho de 2011). Tratamento endovascular do aneurisma da as Atitudes Terapêuticas com maior percentagem. aorta abdominal em contexto de urgência-experiência do Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do Hospital de Santa Marta. Angiologia e Tabela 2 Cirurgia Vascular| Volume 7 | Número 2 |, pp. 80-85. Atitudes Terapêuticas em percentagem • Bruni, K. R. (2002). The role of the vascular nurse in centers of excellence. Conclusão JOURNAL OF VASCULAR NURSING, Vol. XX No. 1, 2-5. Comparando os dados obtidos com a bibliografia • Bryant, C. (2002). Abdominal Aortic Aneurysm Repair: A Look at the First consultada pode-se retirar as seguintes conclusões: 24 Hours. Journal of PeriAnesthesia Nursing, 164-169. Experiência significativa da equipa multidisciplinar no • Castro-Ferreira, R. et al. (2015). Dez anos de tratamento de aneurismas cuidar do doente com AAAr submetido a EVAR ; da aorta abdominal - exclusão endovascular vs. cirurgia aberta nas Multidisciplinaridade no cuidar, com enfoque na diferentes regiões portuguesas. Congresso Nacional SPACV (pp. 51-60). Coimbra: Elsevier. comunicação e no trabalho em equipa; Cuidados de enfermagem prestados são os • Chaikof, E. L. (2011). The Society for Vascular Surgery practice guidelines on the care of patients with an abdominal aortic aneurysm. Journal of preconizados pelas referências internacionais (SNV, Vascular Surgery Volume 67, Number 1, 2-78. ESVS, NICE) fundamentados na: Correta avaliação e preparação pré-operatória do • Chen, T. (2014). Endovascular repair of thoracic aortic pathologies: Postoperative nursing implications. Journal of Vascular Nursing, Volume doente com AAAr; 32, Issue 2, 63-69. Cuidados pós-operatórios evidenciam uma boa • Cronenwett JL, J. K. (2014). Rutheford´s vascular surgery (8th ed. ed.). prática; Philadelphia: Elsevier. Vigilância e monitorização contínua do doente com • Fernandes e Fernandes, J., & Sousa, P. (2016). Cirurgia vascular em AAAr por parte da equipa de enfermagem. Portugal: conhecer para melhorar. Lisboa: Escola Nacional de Saúde A maioria da bibliografia é direcionada para os Pública da Universidade NOVA de Lisboa em parceria com a Faculdade de Medicina. cuidados de enfermagem ao doente submetido a cirurgia aberta em detrimento da técnica por EVAR; • Gonçalves, F. (2009). “Aneurismas da Aorta Abdominal”. Em E. Corpo A maioria das Guidelines são direcionadas aos Clínico do Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do H. Sta. Marta- cuidados do doente submetido a cirurgia da aorta CHLC, Manual de Angiologia e Cirurgia Vascular (pp. 65-74). Lisboa. torácica por técnica endovascular; Desenvolvimento de competências especificas • Harky, G.-C. C. (2018). Ruptured abdominal aortic. Interventional- baseadas na formação e na prática - Skills, Behaviors, Cardiology, pp. 55-63. Knowledge - (SVN, 2003). • Ielapi, N. e. (2020). Vascular Nursing and Vascular Surgery. Obtido de Annals of Vascular Surgery: https://doi.org/10.1016/j. avsg.2020.05.038 • Maldonado, Y. ( September de 2014). Optimal Perioperative Medical Management of the Vascular Surgery Patient. Anesthesiology Clinics 32, pp. 615-637. • Nursing, E. C. (s.d.). Abdominal Arterial Disease Circulating the Facts About Peripheral Vascular Disease. Obtido de svnnet: http://www.svnnet. org/ • Pettersson, M. (2010). The drama of being diagnosed with an aortic and undergoing surgery for two different procedures: Open repair and endovascular techniques. JOURNAL OF VASCULAR NURSING, Vol. XXVIII No. 1, 2-10. • Rich, K. (2016). Vascular Access Complications in Percutaneous Endovascular Procedures. 2016 SVN National Conference, (p. 63). • Robbins, D. A. ( 2010). Current modalities for abdominal aortic aneurysm repair: Implications for nurses. Journal of Vascular Nursing, Volume 28, Issue 4, 136-146. • Saúde, R. P. (2017). “Rede Referenciação Hospitalar ANGIOLOGIA E CIRURGIA VASCULAR”. Lisboa. • Silva TTM da, C. I. (2018). ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM A VÍTIMA DE RUPTURA DE ANEURISMA AÓRTICO. Obtido de Rev enferm UFPE on line: https://doi.org/10.5205/1981-8963-v12i5a231270p1480- 1485-2018 • Sirydakis, M. (25 de maio de 2020). ANEURISMA DE AORTA ABDOMINAL, IMPLICAÇÕES NA PRÁTICA CLÍNICA DO ENFERMEIRO INTENSIVISTA. Obtido de Cuidados Críticos - Webnode: http://files. enfermeiros-intensivistas.webnode.pt/200000346-0628e0743 • Soat, M. (07 de 2009). myamericannurse.com/aortic-aneurysm-causes- clues-and-treatment-options/. Obtido de myamericannurse: https:// www.myamericannurse.com/ • SVN. (2003). Vascular nursing scope of practice. Journal of vascular Nursing, pp. 106-109. • Thompson, J. (2009). Endovascular Leaks: Perioperative Nursing Implications. AORN JOURNAL, VOL 89, NO 5, 839-850. • Tinkham, M. R. (2009). The Endovascular Approach to Abdominal Aortic Aneurysm Repair . AORN JOURNAL, 289-302. • Tinkham, M. R. (05 de 2013). www.ORNurseJournal.com. (L. W. Wilkins, Ed.) Obtido em 2020, de ORNurseJournal.com: https://nursing. ceconnection.com/ovidfiles/01271211-201305000-00009.pdf • Tyrrell, A. (SEPTEMBER de 1999). Abdominal Aortic Aneurysm: Diagnosis, Treatment, and Implications for Advanced Practice Nursing. JOURNAL OF THE AMERICAN ACADEMY OF NURSE PRACTITIONERS, 397-402. 43

e 44


Like this book? You can publish your book online for free in a few minutes!
Create your own flipbook