SUMÁRIO 3 A DIGNIDADE HUMANA E A CONSTITUIÇÃO COSMOPOLITA 14 COMO SOLUÇÃO. 26 36 WHATSAPP COMO MEIO DE PROVA: A QUEBRA DO SIGILO E A COLISÃO COM O DIREITO À PRIVACIDADE NA SOCIEDADE DA 48 INFORMAÇÃO. 55 69 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO. 80 90 REFLEXOS DO ACORDO DE PARIS NAS POLÍTICAS PÚBLICAS 101 SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO BRASIL. 109 ANÁLISE INTRÍNSECA E EXTRÍNSECA DO AGRAVO DE INSTRU- MENTO Nº 0034576-58.2016.8.19.000. REFLEXOS PROCESSUAL E EMPRESARIAL. O PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE DO JUIZ NO JULGAMENTO CONSTITUCIONAL DO PROCESSO PENAL. DIREITOS FUNDAMENTAS E LEI DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS. A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA A PARTIR DE CONDENAÇÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA. O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL E OS EFEITOS DA PENHORA- BILIDADE SOBRE A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. MUDANÇAS DO REGIME CIVIL DAS INCAPACIDADES PELO ESTA- TUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: CURATELA. O ESTADO E O CÁRCERE: ANÁLISE DA APLICABILIDADE DO ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL.
A DIGNIDADE HUMANA EM CRISE E A CONSTITUIÇÃO COSMOPOLITA COMO SOLUÇÃO HUMAN DIGNITY IN CRISIS AND COSMOPOLITE CONSTITUTION AS A SOLUTION Elismar Rodrigues dos Santos 1 Carolina Merida 2 RESUMO ABSTRACT A dignidade humana, consagrada como princípio so- Human dignity, consolidated as a supreme principle berano e fundamento da República Federativa do Bra- and foundation of the Federative Republic of Brazil, un- sil, nos termos do inciso III, do art. 1º, da Constituição der the terms of item III, article 1, of the Federal Consti- Federal de 1988, veda a submissão de qualquer indiví- tution of 1988, banned the submission of any individual duo a tratamento desumano ou degradante, ao mesmo to inhuman or degrading treatment, while, in the other tempo em que impõe sejam os direitos consagrados hand, impose the rights established in the constitutio- no texto constitucional interpretados em consonância nal text interpreted in harmony with such provision. com tal disposição. Logo, deve-se entender que o direi- Therefore, the right to life implies dignity itself, result to à vida implica no direito à vida com dignidade, o que of the modern view of man. Human dignity must be the decorre da visão moderna do homem. Esta impõe que parameter for the process of creation and application a dignidade humana deve servir de parâmetro para a of law, once the State is responsible for the protection elaboração das leis e também para a sua aplicação, já of dignity across the board. However, dignity is in crisis. que ao Estado compete tutelar a dignidade em todos Then, we will respond, through qualitative, descriptive os seus aspectos. Contudo, a dignidade está em crise. and bibliographical research, whether the institution of Nesse contexto, buscou-se aferir, por meio de pesqui- a Cosmopolitan Constitution in an increasingly globa- sa qualitativa, descritiva e bibliográfica, se a adoção de lized and integrated world can be considered as an al- uma Constituição Cosmopolita, em um mundo cada ternative to the crisis of human dignity. A holistic view vez mais globalizado e integrado, pode se apresentar of man, resulting from a Cosmopolitan Constitution, como alternativa à crise da dignidade humana. Cons- can overcome the crisis of dignity, redefining values or tatou-se que uma visão global do homem, decorrente reinforcing human dignity as a supreme value in any de uma Constituição Cosmopolita, é capaz de superar nation. questões relativas à crise da dignidade, seja pela rede- finição de valores, seja por reforçar a dignidade huma- KEYWORDS: Human dignity. Crisis. Cosmopolitanism. na enquanto valor supremo em todo e qualquer país. 1 INTRODUÇÃO PALAVRAS-CHAVE: Dignidade humana. Crise. Cosmo- politismo. A dignidade humana, consagrada como princípio e 1Bacharel em Direito pela Universidade de Rio Verde/GO – UniRV – Experiência em Licitações e Contratos Administrativos – Superintendente de Compras Governamentais e Suprimentos da Prefeitura Municipal de Rio Verde/GO – Pesquisador – Sócio fundador do escritório Leão, Rodrigues & Giacomini Ad- vogados Associados – Advogado OAB/GO: 59.943. 2Doutoranda em Direito Público na UNISINOS, Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela PUC/GO, Professora Adjunta da Facul- dade de Direito da Universidade de Rio Verde e Procuradora do Município de Rio Verde, Goiás. 3REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA fundamento da República Federativa do Brasil, a teor a ideia de que existem pessoas mais dignas e outras do que dispõe o art. 1º, inciso III, da Constituição Fede- menos dignas, ou seja, uma modulação na dignidade ral de 1988, é valor inerente ao indivíduo e intrínseco a humana. todo ser humano, dada a sua fundamentalidade. Não obstante, inúmeras são as situações coti- Já Cícero, importante filósofo italiano que viveu no dianas que evidenciam violação à dignidade humana, século 100 a.C., propôs a desvinculação da noção de e levam a questionar uma verdadeira crise deste im- dignidade da posição ou classe social, já que esta seria portante valor. São situações corriqueiras, como as uma qualidade que distinguiria o homem das demais vivenciadas pelos presos, ante os problemas do sis- criaturas, como se extrai da lição de Sarlet (2006, p. tema prisional, ou mesmo pelos inúmeros refugiados 30), para quem “todos os seres humanos são dotados no mundo, que se veem compelidos a abandonar seus da mesma dignidade, noção esta que se encontra, por lares em busca de melhores condições de vida. sua vez, intimamente ligada à noção da liberdade pes- Ademais, não se pode pensar, na atualidade, soal de cada indivíduo”. em um Estado que somente assegure direitos no âm- bito das suas fronteiras. Logo, ganha relevo, nesse ce- Na evolução da humanidade, em especial no que nário, a ideia de uma Constituição Cosmopolita como tange a construção da ideia de “dignidade humana”, alternativa à crise da dignidade humana. importa destacar a inspiração cristã. Isso se deve por- É nesse contexto que se situa o presente es- que filósofos como Tomás de Aquino, proclamado dou- tudo, que tem por objetivo analisar a problemática da tor e Santo pela Igreja Católica, se dedicou à análise da dignidade humana em crise e a possibilidade de ser temática de forma especial. Para São Tomás de Aquino, esta solucionada com a adoção de uma Constituição a dignidade remete à ideia fundamental de que o ho- Cosmopolita. mem, enquanto imagem e semelhança de Deus, em- Destarte, adota-se como método de aborda- bora possua autodeterminação e seja livre, deve ter a gem o qualitativo e, como método de procedimento sua dignidade respeitada (SARLET, 2006, p. 31). Logo, o descritivo, pautando-se o estudo no levantamento as contribuições de São Tomás de Aquino são essen- bibliográfico e documental, pois se busca na doutrina, ciais para a consolidação da dignidade humana. artigos, periódicos, dentre outras fontes, elementos para a compreensão do tema. Moraes (2006, p. 115), atribui Kant a rediscussão da moralidade em novas diretrizes, no que ele chamou 2 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PRINCÍPIO DA de imperativo categórico. E o autor enfatiza, também, DIGNIDADE HUMANA que na sociedade existem duas formas de valor: o pre- ço e a dignidade. Ressalta que enquanto o preço pos- As origens do princípio da dignidade humana não sui um valor externo e almeja interesses particulares, a encontram, dentre os estudiosos do Direito, um con- dignidade possui um valor interno e moral, e é de inte- senso, sendo várias as teorias para explicar o surgi- resse de todos. mento do princípio em análise. De acordo com Sarlet (2006, p. 29-30), a dignidade humana remete ao pen- Moraes (2006, p. 115-116) também pontua que tra- samento cristão, que contribuiu para a sua elaboração tando o ser humano como um fim em si mesmo, e não e desenvolvimento, já que tanto o Antigo como o Novo como um meio, seguindo as perspectivas filosóficas de Testamento trazem referências de que o ser humano Kant, “o valor moral se encontra infinitamente acima foi criado à imagem e semelhança de Deus e, por isso, do valor de mercadoria, porque, ao contrário deste, o homem teria valor próprio e intrínseco, não podendo não admite ser substituído por equivalente”. ser tratado como um objeto ou instrumento. De acordo com Santos (2009, p. 29), três são as Santos (2009, p. 19) bem lembra que na Antiguida- concepções relativas à dignidade humana, a saber: o de, em virtude do pensamento grego no aspecto filo- individualismo, o transpersonalismo e o personalis- sófico e político, o homem era visto como “um animal mo, “e cada uma destas compreensões traz em si uma político ou social, como em Aristóteles, cujo ser era a multiplicidade de posicionamentos” (SANTOS, 2009, p. cidadania, o fato de pertencer ao Estado”. Nesse con- 29). O individualismo, na concepção do autor, é forma texto a dignidade humana estaria atrelada à posição que cada homem relaciona e cuida dos seus interesses social que o indivíduo ocupava dentro da sociedade, e dos interesses da coletividade. Trata-se, portanto, como preleciona Sarlet (2006, p. 30), já que prevalecia da livre iniciativa de cada ser humano que resultará na máxima vantagem para a sociedade (SANTOS, 2009, p. 30). Não obstante, o Estado Liberal deve interferir o mí- nimo possível na vida do indivíduo e “[...] assim, inter- 4REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA pretar-se-á a lei com o fim de salvaguardar a autono- autodeterminação (TAVARES 2006, p. 498) mia do indivíduo, preservando-o das interferências do Poder Público. Ademais, num conflito indivíduo versus Desta feita, seja do ponto de vista filosófico ou ju- Estado, privilegia-se aquele” (SANTOS, 2009, p. 30). rídico, os autores se pautam, de forma mais ou menos ampla, nos pensamentos de Kant sobre a dignidade hu- Reale (1998, p. 277), por sua vez, pontua: mana. Logo, é um valor intrínseco e pertencente a todo indivíduo e, como tal, deve ser respeitado por todos. [...] realizaria, mediante automático equilíbrio dos egoísmos, o bem social ou o bem comum. Em que pese a importância da dignidade humana, Daí a tese de que o Estado deve ter uma somente após a Segunda Guerra Mundial é que este função primordial e essencial, que se esgotaria princípio foi reconhecido, de forma expressa, pela maio- praticamente na tutela jurídica das liberdades ria das nações, e isto só aconteceu quando tal princípio individuais. Cada homem, podendo realizar foi consagrado na Declaração Universal da Organização plenamente seu bem, daí resultaria, como das Nações Unidas (ONU) de 1948. consequência inevitável, a felicidade comum. É a tese do individualismo social ou do No ordenamento jurídico brasileiro não foi diferente, tanto que até o advento da Constituição da República individualismo jurídico. de 1988 inexistia qualquer manifestação do referido princípio das Constituições, principalmente as que vie- Santos (2009, p. 31) ainda ressalta que no trans- ram a lume nos períodos em que imperaram os gover- personalismo o que se vê é o contrário disso. É na nos autoritários. realização do bem coletivo que são resguardados os interesses individuais. Logo, inexistindo uma relação Portanto, é possível afirmar que o princípio da dig- harmônica entre o bem de todos e o bem do indivíduo, nidade humana clama, para a sua consagração, por um prevalece os valores coletivos. Desta forma, a dignida- Estado no qual não impere arbitrariedades, pois este de humana realiza-se para todos. É, pois, a partir desta não se coaduna, por exemplo, com monarquias auto- corrente que surgem as correntes marxistas ou cole- ritárias, ou mesmo com momentos históricos em que tivas, sendo mais conhecida a obra de Karl Marx, que houve regimes ditatoriais. conduziu à obra “O Capital”. Sarlet (2006, p. 61) preconiza que o constituinte dei- Já Reale (1998, p. 277) defende que no transperso- xou bem clara a sua intenção de “outorgar aos princí- nalismo não se pode falar em moral individual, exceto pios fundamentais a qualidade de normas embasadoras quando relacionado ao aspecto da moral social “e que, e informativas de toda ordem constitucional, inclusive na realidade, devem preponderar sempre os valores (e especialmente) das normas definidoras de direitos e coletivos, só adquirindo autenticidade e plenitude a garantias fundamentais”, e isto foi denominado núcleo existência humana quando a serviço do bem social”. essencial da nossa Constituição. Na contramão das duas teorias supracitadas, surge Desta feita, apesar de tolhida a importância do indi- uma terceira, denominada de personalismo. Para San- víduo ao longo de vários períodos de um Estado autori- tos (2009, p. 32) não há como afirmar o predomínio do tário, após a proclamação da República no Brasil, mor- indivíduo ou predomínio coletivo antes de ser anali- mente na década de 1930, e novamente na década de sado cada caso de acordo com as suas circunstâncias 1960, não se pode negar que o movimento que ganhou peculiares. força na década de 1980 conduziu ao reconhecimento da importância do indivíduo para o Estado. Na defesa de um posicionamento concreto, no que tange a conceituação do princípio em comento, Ta- Vale lembrar, ainda, que a dignidade humana, vares (2006, p. 498) ensina que a dignidade deve ser na Constituição Federal de 1988, se encontra consagra- compreendida em duas dimensões, uma negativa e da dentre os fundamentos da República Federativa do outra positiva. E, sobre estas, afirma: Brasil, no inciso III, do art. 1°, como princípio fundamen- tal. Segundo Espíndola (1999, p. 52), o termo princípio [A dignidade humana consiste não apenas na possui diversas acepções diferentes, por caminhar por garantia negativa de que a pessoa não será alvo diversos campos do saber humano: Filosofia, Teologia, de ofensas ou humilhações, mas também agrega Sociologia, Política, Física, Direito, entre outros. Cada a afirmação positiva do pleno desenvolvimento área do saber definirá princípio de acordo com a apli- da personalidade de cada indivíduo. O pleno cação que lhe sirva para estruturar determinado pensa- desenvolvimento da personalidade pressupõe, mento. por sua vez, de um lado, o reconhecimento da total autodisponibilidade, sem interferências Reale (1998, p. 299-300) assevera que o legislador ou impedimentos externos, das possíveis reconheceu que o sistema de leis não é suficiente para atuações próprias de cada homem; de outro, a atender todo o campo de experiência humana, restando 5REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA muitas situações que são impossíveis de serem previs- arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, tas. Além do mais, os princípios podem preencher essas na de sua família, em seu domicílio ou em sua lacunas deixadas pela lei, por força de sua função inte- correspondência, nem de ofensas ilegais à sua gradora de todo o sistema jurídico. honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais No que tange o princípio da dignidade humana, o ofensas. constituinte estabeleceu como princípio fundamental a ser seguido pela sociedade brasileira, ficando o Estado E por fim, Sarlet (2006, p. 71), objetivando demons- obrigado a exercer sua promoção através dos meios de trar o enquadramento da dignidade humana como concretização desse princípio que se fazem mediante princípio constitucional fundamental, e que tal conota- o reconhecimento, proteção e promoção dos direitos ção constitucional não reduz a amplitude e magnitude fundamentais, visando estabelecer uma vida digna para da dignidade humana, afirma que o reconhecimento todos. da condição de norma da dignidade humana, assumin- do seu papel de princípio constitucional fundamental, Enquanto princípio fundamental, Silva (2009, p. 104), não afasta “o seu papel fundamental geral para toda conceitua a dignidade humana assim: a ordem jurídica (e não apenas para esta), mas, pelo contrário, outorga a este valor uma maior pretensão [...] valor supremo que atrai o conteúdo de todos de eficácia e efetividade.” os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. Concebido como referência Apesar de sua importância no âmbito do direito in- constitucional unificadora de todos os direitos terno e também internacional, o que se percebe, atu- fundamentais [observam Gomes Canotilho e almente, é que a dignidade da pessoa se encontra em Vital Moreira], o conceito de dignidade humana crise, e várias são as situações que a evidenciam, como obriga a uma densidade valorativa que tenha se passa a analisar no próximo item. em conta o seu amplo sentido normativo- constitucional e não uma qualquer ideia 3 A DIGNIDADE HUMANA EM CRISE apriorística do homem, não podendo reduzir- se o sentido da dignidade humana à defesa dos Em que pese a sua relevância, a dignidade huma- direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a na enquanto princípio se encontra em crise. Várias são nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para as situações em que o princípio é mitigado, tolhido, constituir ‘teoria do núcleo da personalidade’ obstando a sua consagração. Sem a pretensão de se individual, ignorando-a quando se trate de esgotar a análise das hipóteses em que a dignidade é garantir as bases da existência humana. Daí mitigada, no âmbito interno pode-se citar o problema decorre que a ordem econômica há de ter por do sistema carcerário. A superlotação, a inobservância fim assegurar a todos existência digna (art. 170), das assistências asseguradas ao preso, a não ressocia- a ordem social visará a realização da justiça lização, dentre outros fatores, evidenciam claramente social (art. 193), a educação, o desenvolvimento que a dignidade humana resta comprometida na atua- da pessoa e seu preparo para o exercício da lidade, mormente quanto aos apenados. cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores Segundo Barbiéri (2019), dados divulgados pelo do conteúdo normativo eficaz da dignidade Conselho Nacional de Justiça apontam que o Brasil conta com mais de 812 mil presos, sendo que destes, humana. 41,5% são presos provisórios, ou seja, não possuem uma sentença penal condenatória transitada em julga- Vê-se, portanto, a amplitude do conceito em co- do. mento, não mais limitado, como em seu nascedouro, ou restrito a apenas uma linha de pensamento. É a dig- Barbiéri (2019) ressalta, ainda, que em 2016 o Brasil nidade humana, enquanto princípio fundamental, co- contava com 726,7 mil presos. Se comparados os da- rolário do Estado dos daquele ano com 2018, percebe-se claramente um grande aumento do número de presos no país, sendo a Cumpre-se ainda ressaltar que o direito à igualdade terceira maior população carcerária do mundo, já que também se encontra previsto no artigo 11 da Conven- apresenta, nos últimos anos, um crescimento de 8,3% ção Americana dos Direitos Humanos – Pacto de San ao ano. Logo, estima-se que em 2025 o Brasil contará José da Costa Rica: com 1,5 milhão de presos. Artigo 11 – Proteção da honra e da dignidade: 1. Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências 6REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Nada obstante, o número de vagas ainda é muito com grande controle da economia, de aspectos sociais inferior. Segundo Martines (2019), o Brasil conta com e meios de comunicação, com governo autoritário e uma taxa de superlotação carcerária de 166%, ou seja, PIB baseado na produção de petróleo. enquanto o número de vagas existentes é de 437.912 pessoas, no ano de 2017, a população carcerária era de A crise do petróleo, a posterior inflação, escassez 729.949 presos, segundo último levantamento divul- de alimentos e consequente perda do poder aquisitivo gado pelo Departamento Penitenciário Nacional. da população formam a justificativa para a migração dos venezuelanos, com elementos típicos do instituto Embora seja uma realidade em todo o país, Marti- da migração econômica, outros fatores, porém, devem nes (2019) afirma que na região Norte o problema da ser levados em conta, como a grave violação dos di- superlotação se agrava, chegando a taxa de 200% no reitos humanos dos cidadãos venezuelanos, violações ano de 2018, enquanto a região Sul apresenta a menor estas praticadas por, ou a mando do atual Presidente taxa, contando com 130%. Nicolás Maduro, a exemplo da violência que é usada contra os que se manifestam no sentido oposto ao go- Não bastasse isso, a integridade dos presos é tam- verno. Ademais é notória sua associação com milícias bém outro problema do sistema penitenciário bra- esquerdistas e grupos armados, ocasionando centenas sileiro, e que evidencia a crise da dignidade humana. de mortes e evidente ofensa ao direito de manifesta- Observa Martines (2019) que apenas em 2018, 1.424 ção e protesto. presos foram mortos nos estabelecimentos prisionais do país e 23.518 fugas foram registradas. Em meio a Outro aspecto reside na violação da ordem demo- esse cenário, não há como negar o problema da crise crática quando houve o fechamento do parlamento da dignidade humana no país, sendo o sistema carce- pela Suprema Corte do país a pedido do presidente, a rário aqui apresentado como um exemplo do proble- comprovação que há violação da ordem democrática ma. vem até mesmo com pronunciamento do MERCOSUL, através da suspensão da Venezuela do bloco, que se No âmbito internacional, basta acompanhar os manifestou no sentido de que na Venezuela se instau- meios de comunicação para verificar a situação de rou uma ditadura, que viola o espírito do Tratado de inúmeros refugiados, provenientes de diversos países Assunção e a Cláusula Democrática estabelecida no e cuja migração também se pauta em fatores diversos, Protocolo de Ushuaia de 1998. como religião, política, economia. Na América Latina, por exemplo, tem-se a situação dos venezuelanos, que Os diversos fundamentos provocam dúvida acerca sem acesso à comida, a medicação, a vida com a mí- de qual Instituto melhor se aplica à situação, as auto- nima dignidade, percorrem quilômetros em busca de ridades não tomam posição efetiva e os próprios indi- melhores condições de vida. víduos que se deslocam às vezes não sabem como se denominar, e isso fará com que os pedidos de refúgio Desde janeiro de 2015, trinta mil venezuelanos já aumentem, sendo ele instituto mais completo quando se deslocaram para o Brasil. Na fronteira entre os dois da tutela de pessoas em posição migratória desfavo- países, como na cidade de Pacaraima, o cenário é de rável. desemprego, prostituição, aumento da criminalidade e miséria de imigrantes em busca de oportunidades. Ve- Com a taxa de inflação na casa dos 800% ao ano e nezuelanos sozinhos ou com famílias inteiras cruzam recuo do PIB em 19% em 2016 (EXAME, 2017) sem saí- as fronteiras para fugir da fome, da violência, a fim de da, milhares de venezuelanos, que a Polícia Federal cal- receber tratamento de saúde. Encontram refúgio em cula em 5.787 requerimentos de Refúgio, 3500 a mais acampamentos improvisados nas ruas, ginásios que que 2016, decidiram largar o pouco que tinham, para são usados como abrigos. Um drama humanitário que a maioria o destino escolhido foi o Brasil, a fronteira atinge vítimas inocentes em um momento desfavorá- entre os dois países vive hoje um dos maiores êxodos vel para a economia brasileira, que sofre com uma crise migratórios da história recente da América do Sul, em com corte de verbas e repasses federais aos municí- Roraima, na pequena cidade de Pacaraima, de apenas pios, inviabilizando a otimização dos serviços públicos seis mil habitantes, vive as consequências da chegada (EXAME, 2017). milhares de venezuelanos, no posto de fiscalização to- dos os dias filas para cadastramentos dos imigrantes, Os momentos de tensão política, conquistas e opo- e dentre estes, estão indígenas da etnia Warao (G1, sições sempre foram latentes em território venezue- 2017), que viajam dias a pé para chegar até Roraima, lano, e em ocasião mais recente, a crise tem origens nenhum desses indígenas têm qualificação profissio- no mandato do presidente anterior. O ex-presidente nal e os poucos venezuelanos vindos da capital e ou- Hugo Chávez sempre adotou posição de esquerda, 7REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA tras cidades grandes que tem alguma qualificação não Sudão do Sul (2,3 milhões) e Mianmar (1,1 milhões) encontram emprego do lado brasileiro, sobrevivem de (G1, 2019). esmolas e doações (ESTADO DE SÃO PAULO, 2017), muitos já chegam doentes com tuberculose, malária, O problema na Síria é decorrente de uma guerra ci- desnutrição, leishmaniose, segundo levantamento do vil que assola aquele país desde o ano de 2011 e que governo de Roraima já foram realizados cinquenta mil conduziu à saída de um grande número de pessoas, atendimentos a venezuelanos, uma realidade que so- principalmente pelo Mediterrâneo e pela Europa. Não brecarrega ainda mais os hospitais (JORNAL PUC RIO, obstante, muitos países se recusam a receber os refu- 2017). giados. A falta de remédios e comida obrigam-nos a atra- Dentre os países mais acolhedores de refugiados vessar a fronteira e fazer compras. Em Pacaraima, o nos últimos anos, principalmente os sírios, segundo a bolívar, moeda venezuelana, circula paralelo ao real, ACNUR, tem-se a Turquia, que recebeu mais de 3,7 mi- há uma quantidade muito grande de notas pois com a lhões, seguido pelo Paquistão (1,4 milhões) e Uganda desvalorização do bolívar uma nota de cem bolívares (1,2 milhões) (G1, 2019). Juntos estes três países rece- vale apenas quinze centavos de euro ou 53 centavos bem mais de 6,3 milhões de pessoas. de real (EL PAÍS, p. 2018). Aqui cumpre esclarecer que nem todos aqueles que O número de furtos e roubos aumentou, são hoje são considerados deslocados pela ONU são refugiados, praticados em sua maioria por venezuelanos e houve pois há um grande número que deixa sua região de ori- até a modificação de comportamento do comércio e gem, mas continua dentro do seu país. Contudo, isso da população de Pacaraima, o aumento dos crimes fez não ocorre em muitos casos, como o problema dos ve- com que parte dos moradores da cidade passassem a nezuelanos, acima apresentado. hostilizar os imigrantes, ocorrendo inclusive agressões (EXTRA, 2018). Dados da ACNUR evidenciam que dos mais de 70 milhões de pessoas deslocadas pelo mundo no ano de Percebe-se que a crise econômico-financeira é que 2018, 41,3% são deslocados internos, ou seja, conti- corroborou para o grande número de migrantes vene- nuam dentro do seu país; 25,9% são refugiados; e, ain- zuelanos no Brasil, haja vista a impossibilidade de vida da, 3,5% solicitam refúgio, mas não obtiveram respos- com dignidade naquele país em meio, repita-se, à crise ta (G1, 2019). inclusive política. A situação é alarmante. Apenas nos últimos dez Notícias mais recentes apontam que mais de 3,4 mi- anos, o número de refugiados em todo o mundo cres- lhões de venezuelanos deixaram o país, dos quase 2,7 ceu mais de 50%. Destes, 57% são provenientes da Sí- milhões se encontram em outras nações da América ria, Afeganistão e Sudão do Sul (ACNUR, 2019). Latina. Em apenas quatro anos, estima-se que em me- ados de 2019 o número de venezuelanos tenha alcan- Destarte, em meio a esse cenário a crise da digni- çado 4 milhões, segundo estimativa da ACNUR. Atual- dade é evidente, seja pelo grande número de pessoas mente, os venezuelanos são um dos maiores grupos que se veem forçadas a abandonar sua região de ori- populacionais deslocados de seu país (VEJA, 2019). gem por diversos fatores, seja porque há uma grande resistência dos países em receber os refugiados, e con- O problema, contudo, não é restrito à América La- tribuir para uma melhor qualidade de vida. Desta feita, tina. Mais de 26 milhões de pessoas em todo o mundo a busca de meios para resgatar a dignidade ganha re- são consideradas refugiadas pelos padrões da ACNUR, levo, como se passa a expor. e um total de quase 71 milhões de pessoas forçadas a deixar suas regiões de origem por diversos motivos, a 4 TEORIA COSMOPOLITA E A CONSTITUIÇÃO COSMO- exemplo de guerras, perseguições, violência, violação POLITA COMO RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA aos direitos humanos, dentre outros fatores. E a Síria, junto à Venezuela, são atualmente os países que mais Vive-se hoje em uma sociedade globalizada, in- preocupam a Organização das Nações Unidas (G1, terligada, cosmopolita. As alterações globais e a pró- 2019). pria globalização têm levado à superação de antigos paradigmas e, em consequência disso, à necessidade A Síria, segundo dados da ACNUR, no ano de 2018 de afirmação de novas reconstruções. Nesse sentido, contava com 6,7 milhões de refugiados espalhados por é imprescindível a ressaltar a importância de uma ci- todo o mundo. Logo, os sírios constituem a maior co- dadania cosmopolita, preocupada com a tolerância, munidade de refugiados pelo mundo pelo quinto ano respeito e dignidade humana, ideais esses comprome- consecutivo, seguindo pelo Afeganistão (2,7 milhões), tidos com a universalidade na efetivação e na extensão 8REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA de direitos humanos a toda a comunidade internacio- Nodari (2014, p. 88) observa que Kant vislumbra nal (NASCIMENTO, 2009). no direito cosmopolita o “germe de uma Constituição Cosmopolita sob a qual todos podem conviver sob leis O cosmopolitismo parte da ideia de que todos os públicas como condição e um processo de convivência seres humanos, independentemente de sua filiação cosmopolita”, levando a perceber que o cosmopolitis- política, pertencem (ou ao menos podem pertencer) mo e o pacifismo “[...] andam juntos e nessa perspec- a uma única comunidade, e que esta comunidade ne- tiva a arte de pensar o cosmopolitismo é uma espécie cessita ser cultivada. Este pensamento invoca o dever de arte de superar em si o egoísmo dos próprios indi- de ajudar o semelhante, de serem todos “cidadãos do víduos e dos próprios Estados” (NODARI, 2014, p. 88). mundo” (LIMA, 2011). Segundo Higino Neto (2011), Na sua obra, “A Paz Perpétua”, Kant et al. (2004, p. 40) assim define o cosmopolitismo: A Constituição Cosmopolita busca ser um instrumento de diálogo e concretização Todos os homens que podem exercer um sobre normativa global porque além dos direitos o outro influências recíprocas devem pertencer humanos e fundamentais por realizar na maior a uma constituição civil qualquer. Mas toda parte do planeta, vivemos coletivamente no constituição jurídica, no tocante às pessoas que Século XXI sob os efeitos da sociedade de nela se encontram, é estabelecida [...] conforme risco (catástrofes ambientais, tecnologias que o direito cosmopolítico (Weltbürgerrecht), na ameaçam a saúde humana, energia nuclear, medida que homens e estados, estando numa desemprego, crises econômicas, ausência de relação externa de influência recíproca, são laços afetivos estáveis, indefinição de identidade considerados cidadãos de um Estado universal pessoal), riscos que não são apenas efeitos humano (iuscosmopolitan). colaterais, mas produzidos sistemicamente, conforme nos adverte Ulrich Beck, o que exige o Cabe destacar que cosmopolitismo não é suprana- esforço de todos para enfrentar esses problemas cional, nem corresponde a um “super Estado”. Segun- que afetam a toda a humanidade. do Guimarães (2008, p. 574), o cosmopolitismo “é uma perspectiva moral cujos componentes básicos são a Acrescenta Nodari (2014, p. 88) que a Constituição imparcialidade, a universalidade, o individualismo e o Cosmopolita, nesse contexto, não é e não pode ser vis- igualitarismo”. Logo, a ideia que se extrai desta Teoria ta como uma ideia quimérica ou caminho utópico, mas é de que cada indivíduo afetado por arranjos institu- sim necessária para o Direito Internacional, mormente cionais deve receber especial atenção, o que remete à quanto à ligação especial que este ramo detém com a percepção de Kant da moralidade, pois na medida em hospitalidade, transcendendo as posições dos Estados que os seres humanos são racionais, devem ser consi- e nações na busca da instituição de uma comunidade derados de forma igualitária pelas instituições. universal. Sobre o cosmopolitismo jurídico, Cittadino e Dutra Boechat (2012, p. 263), por sua vez, ressalta que a (2013, p. 148) ressaltam a preocupação em se propor- Constituição Cosmopolita ganha evidência principal- cionar inclusão por meio da Teoria Cosmopolita, sendo mente quando se trata do direito de hospitalidade, ou uma evolução de toda a ideia que outrora se teve do seja, “a autorização para os recém-chegados estran- cosmopolitismo, em uma visão mais filosófica. geiros e a abertura para manterem um intercâmbio com os antigos habitantes sejam respeitados”, o que Diante de tais considerações, resta evidente que somente é possível a partir da interação que as partes os defensores do cosmopolitismo argumentam que a podem ter, de forma harmônica e pacífica. sociedade justa não deve ser governada em nome do bem comum, mas sim representada por uma estrutu- Para Kant, um direito cosmopolita seria aquele pre- ra de direitos, deveres e liberdades que possibilitem ocupado com pessoas que compartilham o mundo aos indivíduos perseguir livremente suas doutrinas do umas com as outras, visando um ambiente harmônico, bem, seja de forma individual, seja de forma associada. independentemente de origens ou patamares sociais Logo, é universal, pois busca o respeito incondicional dos envolvidos (LIMA, 2011). à pessoa humana, como um fim em si mesmo, o que ressalta, consequentemente, a ideia de que a visão dos Souza (2016, p. 162) observa, ainda, que a Consti- direitos humanos deve ser ampliada com vistas a as- tuição Cosmopolita se pauta em alguns princípios ju- segurar ao indivíduo universal e abstrato a sua digni- rídicos que tornam possíveis afastar a ideia de que se dade. trata de algo utópico, inalcançável, como o consenso procedimental democrático e a imparcialidade. Logo, 9REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA é o consenso democrático e a imparcialidade que per- reconhecimento do direito”, e a segunda, não “menos mitem e levam o indivíduo a pensar numa Constituição radical”, “produzida na segunda metade do século XIX, Cosmopolita e, por conseguinte, na ideia de hospitali- com a subordinação das leis às Constituições rígidas, dade universal, imprescindível para que se concretize a hierarquicamente superiores” (MARTINS NETO; THO- paz entre os Estados e entre os cidadãos. MASELLI, 2016). E a cooperação internacional pelos diversos meios Uma nova onda de reconstrução político-jurídica foi existentes é imprescindível para uma mudança no pa- evidenciada, com a “radical afirmação da democracia norama mundial, levando a humanidade à equiparação e dos direitos humanos, no que se convencionou de- dos níveis de desenvolvimento dos povos mundiais. signar de Estado Democrático de Direito, aqui chama- A comunidade cosmopolita depende, portanto, desta do de Estado Constitucional de Direito” (CRISTÓVAM, ampliação, dessa nova forma de se pensar em um Es- 2014, p. 76). tado além-fronteiras. Destarte, não há como negar que toda mudança Em meio a esse cenário, o “interesse nacional”, en- pela qual passou a noção de soberania se coaduna com quanto produto de uma concepção de soberania em o reconhecimento de que a ideia de uma Constituição sua concepção tradicional, para a instituição de uma Cosmopolita pode contribuir para sanar o problema da Constituição Cosmopolita, clama o reconhecimento crise da dignidade, pois não mais se concebe um Esta- de que houve, ao longo dos tempos, uma evolução do do absoluto, que deixe de atentar para as necessidades próprio conceito de “soberania”, hoje atrelada à noção individuais, mormente quanto à efetiva consagração de responsabilidade. da dignidade humana e o seu respeito enquanto valor intrínseco ao indivíduo. Para Thomas Hobbes (apud MARTINS NETO; THO- MASELLI, 2016), a soberania ilimitada decorre da pró- 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS pria lógica com que concebido o Estado. “Não se reco- nhece a eficácia, em favor dos indivíduos, de direitos Buscou-se compreender, ao longo do presente anteriores à instituição do poder político, entendidos estudo, a problemática da dignidade humana, quando como limites de conteúdo postos ao legislador consti- se percebeu que apesar da sua relevância, diversas são tuído”. O autor, inclusive, sequer admite a oponibilida- as situações que afrontam a dignidade humana e le- de do direito à vida, quando confrontado com o inte- vam a reconhecer a existência de uma crise na atuali- resse do soberano. Hobbes “aceita o direito do súdito a dade. não se conformar com a pena de morte, podendo legi- Concebida como valor intrínseco e inerente a timamente resistir, mas ainda assim podendo legitima- cada indivíduo, a dignidade humana deve atuar para mente ser morto em cumprimento da condenação”. obstar práticas arbitrárias e abusivas, por parte dos Estados e também dos particulares, ao mesmo tempo Porém, em um Estado de Direito, cidadão passa a que deve fomentar a valorização dos direitos huma- determinar seu destino político e assume “a titularida- nos. Quando não alcança tais finalidades, compromete de da res publica não apenas na condição de partícipe a sua própria essência. determinante da vontade coletiva, mas também perse- Uma situação, em especial, revela a atual cri- verando seus comandos de liberdade individual” (PEL- se da dignidade humana. Trata-se dos refugiados em LEGRINO, 1997, p. 180). todo o mundo, que se deslocam de seus lugares de ori- gem no afã de encontrar melhores condições de vida. O interesse público, nesse contexto, teve como fina- E os fatores são os mais diversos, desde a intolerância lidade a salvaguarda das liberdades individuais, antes religiosa à crise econômica. Basta acompanhar os te- sobrepujadas pelo modelo absolutista. Sua percepção, lejornais para ver o problema dos migrantes venezue- portanto, estava “estreitamente vinculada com os di- lanos, que buscam mínimas condições de vida, já que reitos fundamentais de matriz liberal, que neste perí- lhes faltam, em seu país de origem, acesso à comida, a odo eram vistos como proteções individuais dos par- medicação, ao mínimo existencial. ticulares contra as arbitrariedades da administração” O Direito Cosmopolita ganha, nesse cenário, (GABARDO, 2009, p. 34). Logo, a concepção de sobe- relevo, principalmente por preconizar a existência de rania também muda, e deixa de ser aquela ilimitada, já uma cidadania universal e a necessidade de adoção de que há fins a serem alcançados pelos Estados. direitos, a nível além-fronteiras, para assegurar a dig- nidade humana. Assim sendo, são passíveis de se afirmar, nesse contexto, duas mudanças de paradigma: a primeira ocorrida com “o nascimento do Estado Moderno e com a afirmação do princípio de legalidade como norma de 10REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA A proposta, como visto, é inspirada nas con- pelo fortalecimento da noção de dignidade humana. cepções de Kant e vários outros filósofos que propõem, Destarte, em meio a um mundo cada vez mais sem a eliminação dos Estados, ainda que se mitigue globalizado, a instituição de normas gerais, universais, a autonomia e soberania destes, atingir um “Estado em uma Constituição Cosmopolita, se apresenta como mundial”, fortalecendo as propostas de organismos desafio, mas que se afigura, em meio aos graves pro- como a Organização das Nações Unidas. Logo, a Cons- blemas de violação dos direitos humanos, como uma tituição Cosmopolita seria responsável pela garantia solução de problemas vivenciados em diversos países dos direitos humanos, pela manutenção da paz, pela e que não ficam restritos à sua origem. Reforçar a dig- promoção do bem-estar coletivo e, por conseguinte, nidade humana enquanto valor supremo é medida que REFERÊNCIAS ACNUR – Agência da Onu para Refugiados. 5 dados sobre refugiados que você precisa saber, 09 abr. 2019. Disponível em: <https://www.acnur.org/portugues/2019/04/09/5-dados-sobre-refugiados-que-voce-pre- cisa-conhecer/>. Acesso em: 20 nov. 2019. BARBIÉRI, Luiz Felipe. CNJ registra pelo menos 812 mil presos no país. 41,5% não tem condenação. G1, polí- tica, 17 jul. 2019. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/07/17/cnj-registra-pelo-menos- -812-mil-presos-no-pais-415percent-nao-tem-condenacao.ghtml>. Acesso em: 20 nov. 2019. BOECHAT, Lorena Pereira Oliveira. Rigor nas fronteiras externas da União Europeia contra estrangeiros (refugia- dos): negação dos direitos humanos? Congresso Internacional Direitos Humanos: emancipação e ruptura, Caxias do Sul-RS, p. 256-266, 30 e 31 ago. 2012. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/constituicao/Constitui%E7ao_Compilado.htm. Acesso em: 22 out. 2019. CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. O conceito de interesse público no Estado constitucional de direito: o novo regime jurídico administrativo e seus princípios constitucionais estruturantes. 2014. 379 f. Tese (Doutorado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014. DUTRA, Deo Campos; CITTADINO, Gisele Guimarães. Cosmopolitismo jurídico: pretensões e posições na interse- ção entre filosofia política e direito. Revista Direitos Fundamentais & Democracia, v. 13, n. 13, p. 145-159, 2013. EL PAÍS. Maduro vai à China em busca de alívio para a crise venezuelana. 2018. Disponível em: <https://brasil. elpais.com/brasil/2015/01/05/internacional/142041 9522_496900.html>. Acesso em: 08 out. 2019. ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dog- mática constitucionalmente adequada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. ESTADO de São Paulo. Venezuela: migração inclui classe média. 2017. Disponível em: <https://www.pressreader. com/brazil/o-estado-de-s-paulo/20170612/281539405 937488>. Acesso em: 12 out. 2019. EXAME. A crise dos refugiados venezuelanos. 2017. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/brasil/a-crise- -dos-refugiados-venezuelanos/> Acesso em: 12 out. 2019. EXTRA. Imigração de venezuelanos leva o caos a Roraima. 2018. Disponível em: <https://extra.globo.com/noti- cias/brasil/imigracao-de-venezuelanos-leva-caos-roraima-20419511.html>.Acesso em: 12 out. 2019. G1. Veja as denúncias de tortura contra manifestantes na Venezuela. 2017. Disponível em: <http://g1.globo. 11REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
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WHATSAPP COMO MEIO DE PROVA: A QUEBRA DO SIGILO E A COLISÃO COM O DIREITO À PRIVACIDADE NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO WHATSAPP AS PROOF: THE BREACH OF CONFIDENTIALITY AND THE COLLISION WITH THE RIGHT OF PRIVACY IN THE INFORMATION SOCIETY Keucy Peraro Araújo 1 Celany Queiroz Andrade 2 RESUMO not yet been regulated, or made positive by law. In this CCom o advento do avanço tecnológico e das mídias context, protection to the right of privacy has become sociais surgem novas formas de prova que ainda não more and more complex, as technological advances foram regulamentadas, ou positivadas pelo direito. materialize in social life. So, a question emerged: can Neste contexto a proteção ao direito à privacidade conversations via WhatsApp, which had their confi- vem se tornando cada vez mais complexa, à medida dentiality broken, be used as lawful evidence in crimi- que os avanços tecnológicos se concretizam na vida nal investigations, or do they violate people’s right to em sociedade. Questionou-se então: as conversas via privacy? The purpose of the article was to investigate WhatsApp que tiveram seu sigilo quebrado, podem ser the breach of WhatsApp confidentiality for use as evi- utilizadas como provas lícitas na investigação criminal, dence and the collision with the right to privacy in the ou elas ferem o direito à privacidade das pessoas? O information society. The bibliographic research and objetivo do artigo foi investigar a quebra do sigilo do the deductive method were used. The conclusion was WhatsApp para utilização como meio de prova e a coli- that with the encryption currently used by WhatsApp, são com o direito à privacidade na sociedade da infor- there is an impossibility of breaking its confidentiality, mação. Valeu-se da pesquisa bibliográfica e do método however, if changes could be made and if there is a dedutivo. Concluiu-se que, com a criptografia utilizada possibility of breaking its confidentiality, the conversa- atualmente pelo WhatsApp, existe uma impossibilida- tions obtained can be used as a lawful means eviden- de da quebra de seu sigilo, no entanto, caso sejam rea- ce, since that the imposed specific law were respected. lizadas mudanças e haja uma possibilidade de realizar a quebra de seu sigilo, as conversas obtidas podem ser KEYWORDS: Breach of Confidentiality. WhatsApp. Pri- utilizadas como meio lícito de provas desde que sejam vacy. Information Society. Telephone Interception Law. respeitadas as imposições da lei específica. 1 INTRODUÇÃO PALAVRAS-CHAVE: Quebra de Sigilo. WhatsApp. Pri- vacidade. Sociedade da Informação. Lei de Intercepta- O direito à privacidade é de suma importância na ção Telefônica. sociedade contemporânea e por isso deve ser estuda- do e analisado com dedicação, sendo definida sua ori- ABSTRACT gem histórica, sua previsão legal e suas características. With the advent of technological advances and social Porém este direito não é absoluto e deve ceder em de- media, new forms of evidence have emerged that have terminadas situações para que não haja injustiça. 1Graduanda em Direito pela UniRV – Universidade de Rio Verde, Campus Rio Verde, GO. 2Orientadora, Mestre em Direito Público pela Universidade do Estado de Minas Gerais, UFMG. 14REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Deste modo, o problema do presente artigo orbitou ciedade (CANCELIER, 2017). em torno das conversas tidas via WhatsApp, que tive- Diante das transformações socioeconômicas pro- ram seu sigilo quebrado, poderem ser utilizadas como meios de provas lícitos na investigação criminal, ou se porcionadas pela revolução industrial, a privacidade, elas ferem o direito à privacidade dos indivíduos. depois de ter sido exaltada pelos burgueses, adquiriu ainda mais força, visto que se passou a alterar não ape- Neste sentido, a pesquisa se justificou em razão nas o local onde se vive, mas também, o local de tra- da importância do direito à privacidade, assegurado balho, o qual fora distanciado da moradia do indivíduo constitucionalmente, e sua flexibilização na socieda- (RODOTÀ, 2008). de da informação em face do direito à informação e da necessidade de novas formas que viabilizem a prova Segundo Cancelier (2017), surge da preocupação nos processos investigativo e criminal. com a vida privada e a intimidade dessa sociedade, a necessidade de se tutelar esta novidade em constru- Ademais, este trabalho teve como principal obje- ção que é o, hoje em dia chamado, direito à privacida- tivo, investigar a quebra do sigilo do WhatsApp para de, que, já no século XIX, começou a ter seus primeiros utilização como meio de prova e a colisão com o direi- traços. to à privacidade na sociedade da informação. Além de apresentar os objetivos específicos de estudar o direi- Apesar de todas as manifestações de um esboço do to à privacidade, verificar a necessidade social das in- direito à privacidade, este é construção recente como terceptações telefônicas nas investigações criminais, e figura jurídica autônoma, tendo seu marco inicial, ge- pesquisar a efetividade da quebra do sigilo do What- ralmente reconhecido, na obra de Warren e Brandeis. sApp na definição da autoria de inquéritos. Contudo, por mais que o conceito de privacidade não seja completamente atual, é de grande importância o Por fim, para realizar a pesquisa utilizou-se de uma impulso que foi dado por Warren e Brandeis, o que ser- metodologia amparada em pesquisa teórica de base viu para dar valor e fez com que se chamasse a aten- qualitativa, de cunho descritivo, empregando-se a re- ção para esse direito que estava surgindo, de forma visão bibliográfica, bem como análise jurisprudencial, autônoma e protagonista (CANCELIER, 2017). além de se aplicar do método dedutivo. Ainda segundo Cancelier (2017), no artigo desen- 2 O DIREITO À PRIVACIDADE volvido por Warren e Brandeis, em 1890, ocorre um distanciamento da matriz do direito de propriedade, Antes de se adentrar na definição do que é o direi- inicialmente utilizada para proteger os aspectos da to à privacidade, é necessário fazer uma análise histó- vida privada, havendo uma aproximação da intenção rica da sua evolução, até se chegar aos dias de hoje, de tutela da personalidade humana, diante disso, fo- onde o referido direito se apresenta nos moldes que ram apresentados os aspectos, funções e limites deste se conhece. Ressalta-se que, antigamente, não havia novo direito. sequer uma distinção entre privado e público, o que só teve início na antiguidade clássica, onde existiam a pó- Após estes marcos iniciais do direito à privacidade, lis, comum aos cidadãos livres e o oikos, restritivo ao ele expandiu rapidamente suas fronteiras, alcançando indivíduo. (HABERMAS, 2014). outros sujeitos, compreendendo diferentes objetos e, principalmente, se tornando presente em lugares an- Após a antiguidade clássica, agora na Idade Média, tes incompatíveis com ele (CANCELIER, 2017). Tanto outro avanço em direção à definição de privacidade no Brasil, como em outras partes do mundo, passaram ocorre. Não existe, ainda, uma individualidade como a surgir institutos legais com o objetivo de proteger o nos dias de hoje, mas já se percebe uma maior neces- direito à privacidade. sidade de isolamento social. Conforme afirma Doneda (2006), poder viver com privacidade se tornou um há- No direito internacional é possível encontrar dispo- bito entre os nobres daquela época. sições acerca deste direito em um dos principais docu- mentos que tratam sobre Direitos Humanos: a Decla- Com o fim da sociedade feudal e o afloramento dos ração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), a qual burgueses, houve uma potencialização de seu fascínio traz, em seu artigo XII, o seguinte enunciado: pela individualidade. Com isso, a mudança de percep- ção de público e privado passa a se manifestar como Artigo XII uma forma de expressão da personalidade. Passa-se, Ninguém será sujeito à interferência em sua então, a se buscar a proteção de um lugar só seu, que vida privada, em sua família, em seu lar ou em possibilite a diferenciação do indivíduo diante da so- sua correspondência, nem ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou 15REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA ataques. (ONU, 1948. n.p.) estipula, em seu artigo 5º, inciso X, que Apesar de a DUDH ter sido adotada e proclamada Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem em 1948, a mesma não possuía caráter vinculante, distinção de qualquer natureza, garantindo-se desta forma, ela não obrigava os estados membros da aos brasileiros e aos estrangeiros residentes Organização das Nações Unidas (ONU) a seguir o que no País a inviolabilidade do direito à vida, estava disposto em seus artigos. à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: Diante desta situação, na tentativa de dar aos di- reitos humanos uma conotação vinculante, em 16 de [...] dezembro de 1966, foi adotado, pela XXI Sessão da As- sembleia-Geral das Nações Unidas, o Pacto Internacio- X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, nal sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP). a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou No Brasil, o referido pacto entrou em vigor em 1992, moral decorrente de sua violação; (BRASIL, após sua aprovação pelo Congresso Nacional em 1991. 1988, n.p.). Seu artigo 17 trouxe um texto semelhante ao que fora apresentado pela DUDH: Além da previsão existente na Constituição Federal de 1988, o Código Civil de 2002 também traz, em seus Artigo 17 artigos 20 e 21, definições acerca do direito à privaci- dade: 1. Ninguém poderá ser objetivo de ingerências arbitrárias ou ilegais em sua vida privada, Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias em sua família, em seu domicílio ou em sua à administração da justiça ou à manutenção correspondência, nem de ofensas ilegais às suas da ordem pública, a divulgação de escritos, honra e reputação. a transmissão de palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de 2. Toda pessoa terá direito à proteção da lei uma pessoa poderão ser proibidas, a seu contra essas ingerências ou ofensas. (BRASIL, requerimento e sem prejuízo da indenização 1992, n.p.) que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama, ou a respeitabilidade, ou se se destinarem Logo após a promulgação do PIDCP, no ano de a fins comerciais. 1969, desta vez, no âmbito da Organização dos Esta- dos Americanos (OEA), foi firmada a Convenção Ame- Parágrafo único. Em se tratando de morto ou ricana de Direitos Humanos (CADH), popularmente co- de ausente, são partes legítimas para requerer nhecida como Pacto de San José da Costa Rica que, em essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os artigo 11, apresentou a proteção da honra e da digni- descendentes. dade: Art. 21. A vida privada da pessoa natural Artigo 11. Proteção da honra e da dignidade. é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias 1. Toda pessoa tem direito ao respeito de sua para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta honra e ao reconhecimento de sua dignidade. norma. (BRASIL, 2002, n.p.). 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências Diante desta exposição é possível perceber quanto arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, o direito à privacidade está presente, tanto em nosso na de sua família, em seu domínio ou em sua ordenamento interno, quanto em tratados internacio- correspondência, nem de ofensas ilegais à sua nais que versam sobre direitos humanos que passaram honra ou reputação. a compor o ordenamento jurídico pátrio. Faz necessá- rio, agora, destrinchar este direito, definindo, explican- 3. Toda pessoa tem direito à proteção da do e exemplificando os direitos que o compõe, quais lei contra tais ingerências ou tais ofensas. sejam o direito à intimidade, o direito à vida privada, o (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, direito à honra e o direito à imagem. 1969, n.p.) O primeiro direito aqui abordado será o direito à in- Antes da entrada em vigor do PIDCP em nosso or- timidade. Houve um tempo, em que a expressão “direi- denamento jurídico, o direito à privacidade já possuía to à intimidade” era tratada como sinônimo do “direito previsão legal em nossa Carta Magna de 1988, a qual à privacidade” (Tavares, 2018). 16REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Ao se falar deste direito podemos entender a intimi- de agir, ou seja, o modo de viver de cada pessoa, seja dade como uma esfera mais profunda da privacidade, em público ou perante o público. aquela que é destinado a uma quantidade limitada de pessoas e também a locais reservados. Tal como nos Ressalta-se que Queiroz (2006, n.p.), possui um en- afirma Bernardes e Ferreira (2015b, p. 44): tendimento semelhante ao de Tavares (2018), afirman- do o que se segue: Essa esfera engloba tanto os ambientes Da inteligência da norma constitucional, infere- reservados em que se desenvolvem os atos da se que a vida privada se distingue da vida vida privada (domicílio, escritório profissional íntima, ou seja, aquilo que a pessoa pensa, sente e até computadores, tablets e smat fones) e deseja se refere à sua intimidade. Já os seus quando aquelas informações e dados sensíveis hábitos (modo de viver, de se comportar), seu compartilhados somente por círculo bastante relacionamento e, igualmente, aquilo que o restrito de pessoas, tais como empregados sujeito possui, têm pertinência com a sua vida do ambiente domiciliar (âmbito do sigilo privada. domiciliar), amigos próximos (âmbito do sigilo de amizade), familiares (âmbito do sigilo Já Bernardes e Ferreira (2015b, p. 81) traz uma ideia familiar) e profissionais específicos (âmbito diferente com relação à vida privada, a caracterizando do sigilo profissional em sentido amplo) – v.g., como uma esfera muito íntima da vida do indivíduo, médicos, psicólogos, advogados, contadores, chegando a defini-la como a esfera do segredo: padres. Segundo Tavares (2018), a intimidade diz respeito O direito à vida privada se refere àquela àquilo que é próprio da pessoa, é o modo como o in- parte mais destacada da intimidade, que é divíduo é e como ele age, quando está em locais mais já mencionada esfera do segredo. Mas tem a reservados ou de total exclusão de terceiros. Tavares ver, ainda, com a ampla liberdade assegurada (2018, n.p.) também nos traz a ideia de a intimidade à pessoa para desenvolver sua vida interior, ser uma esfera da privacidade, no entanto, ele afirma bem como o direito de estar só e o direito de que aquela é bem mais mitigada do que na opinião tra- não ser importunado. Nessa última acepção, zido por Bernardes e Ferreira (2015b): o direito à vida privada envolve a liberdade de autodeterminação da pessoa, incluindo suas Assim, a intimidade seria a camada ou esfera íntimas motivações pessoais, tanto as que mais reservada, cujo acesso é de vedação total impulsionam atos eminentemente privados ou muito restrito, geralmente para familiares. quanto aquelas relacionadas a outros direitos Já a vida privada estará representada por uma fundamentais importantes, tais como a liberdade camada protetiva menor, embora existente. de escolha profissional, a liberdade de aderir ou Muitos podem ter acesso, mas isso não significa não a um culto religioso, de associar-se, além do a possibilidade de divulgação irrestrita, massiva, direito de invocar escusas de consciência. ou a desnecessidade de autorização. Encerradas as discussões acerca do direito à vida Por fim, com relação à intimidade, vale citar o que privada, passa-se, agora, a se tecer comentários com nos apresenta Oliveira Júnior (2018, n.p.): relação ao direito à honra, o qual, juntamente com di- reito à imagem não se incluem por completo no direito A intimidade, na concepção jurídica, trata-se à privacidade (TAVARES, 2018). de um campo discreto frequentado unicamente pelo interessado. É o espaço em que vai Para Marques (2010, n.p.), “Honra, proveniente do encontrar consigo mesmo, sem qualquer acesso latim honor, indica a própria dignidade de uma pessoa, à curiosidade privada. Neste reino pode desfilar que vive com honestidade e probidade, pautando seu tudo que é mais precioso para a pessoa, desde modo de vida nos ditames da moral”. a sua crença religiosa até os segredos mais recônditos, sem qualquer risco de invasões De acordo com Tavares (2018), a honra constitui-se arbitrárias e, principalmente, de se chegar ao do conjunto de atributos que individualizam a pessoa, conhecimento público porque não há qualquer o que a faz ser respeitada pela sociedade, o bom nome registro materializado. e a identidade pessoal que a diferencia no meio social. Ele ainda acrescenta que o indivíduo tem o direito de Segundo Tavares (2018), não é uma tarefa fácil dife- proteger sua honra pessoal, a qual é fundamental para renciar a vida privada da intimidade. Mas ele relata que o seu bom convívio em sociedade. Assim, tudo aquilo se pode considerar a vida privada como o modo de ser, que depõe conta o cidadão, mas que faz parte de sua intimidade, não pode ser desafogadamente divulgado 17REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA ou revelado por quem conseguiu estas informações. CAS NAS INVESTIGAÇÕES CRIMINAIS. Muitas vezes, ao analisar as doutrinas, se depara Finalizada a explicação acerca do direito à priva- com uma união do direito à honra com o direito à ima- cidade, devem-se abordar, agora, as interceptações gem, mas para uma melhor compreensão, devem-se telefônicas e sua importância nas investigações crimi- separar ambos e se aprofundar na definição de ima- nais. Iniciar-se-á com a definição do que é a intercep- gem, por se tratar de um termo complexo e, até mes- tação telefônica. Á princípio, citar-se-á, o que define mo, sem uma definição uniforme. Nucci (2016, n.p.): Segundo Tavares (2018, n.p.), “a imagem é a apre- Em sentido estrito, interceptar algo significaria sentação, por desenho, impressão ou obra, de figura, interromper, cortar ou impedir. Logo, pessoa, ou coisa.”. Loureiro (2005, p. 58) nos traz o que interceptação de comunicações telefônicas o direito considera como imagem, acrescentando, ain- fornece a impressão equívoca de constituir a da, que ela está além da mera reprodução visual: interrupção da conversa mantida entre duas ou mais pessoas. Na realidade, o que se quer A ideia de imagem, para o direito, pressupõe dizer com o referido termo, em sentido amplo, figura humana. Não se refere somente à sua é imiscuir-se ou intrometer-se em comunicação reprodução visual, mas também à imagem alheia. Portanto, interceptação tem o significado sonora da fonografia e da radiodifusão, às de interferência, com o fito de colheita de partes do corpo (boca, nariz, olhos etc., desde que suficientes à identificação do indivíduo), aos informes. (grifo do autor). gestos e expressões dinâmicas da personalidade. De acordo com Santos (2012, n.p.), “a intercepta- Dentro dos direitos da personalidade, o direito à ção telefônica consiste em tomar conhecimento de imagem alcançou posição de destaque, devido ao ad- uma comunicação entre os interlocutores, sem que mirável progresso das comunicações e à importância eles tenham conhecimento de tal ato. É realizada por que a imagem alcançou no contexto publicitário. Con- um terceiro que não participa da conversa (ou comu- siderando o desenvolvimento tecnológico, a captação nicação)”. e a difusão da imagem na sociedade contemporânea causou uma considerável exposição da imagem, espe- Levando em consideração as definições expostas, cialmente de pessoas que adquiriam sucesso em suas pode-se estabelecer que a interceptação telefônica atividades, em consequência, à imagem foi associado consiste na captação de uma conversa, por pessoa um valor econômico significativo (AZEVEDO, 2001). alheia a ela. Estas interceptações, em sua maioria, pos- suem o escopo de produzir provas para um determina- Deve-se, por fim, se atentar ao que é expresso por do caso e, por isso, devem ser realizadas em conformi- Tavares (2018, n.p.): dade com a Constituição Federal. Prevalece o direito à imagem inclusive em Vale ressaltar que não se deve confundir intercep- face dos modernos meios de comunicação tação telefônica com escuta telefônica, gravação clan- em massa. Assim, o direito pode ser oposto a destina ou quebra de sigilo telefônico, pois se tratam jornais, revistas, rádios, televisão e internet. Não de institutos completamente distintos, assim como se trata de menosprezar ou ignorar o direito à afirma o Superior Tribunal de Justiça (2017, n.p.): comunicação social, mas apenas de estabelecer limites ao uso da imagem [...]. Interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação clandestina não se confundem. Na Deste modo, pode-se perceber que o direito à pri- interceptação telefônica nenhum dos dois vacidade é bem mais antigo do que se imagina e sofreu interlocutores sabem que a conversa está sendo várias evoluções para alcançar os moldes que o conhe- gravada por um terceiro. Na escuta, um dos cemos nos dias atuais. No ordenamento brasileiro, este dois interlocutores sabe que eles estão sendo direito ganhou destaque em nossa Carta Magna, que o gravados por um terceiro. Na gravação, um definiu como direito fundamental e o dividiu em quatro dos interlocutores é quem grava a conversa. outros direitos de suma importância para a sociedade Tanto a interceptação telefônica como a escuta contemporânea. precisam, necessariamente, de autorização judicial para que sejam consideradas provas 3A IMPORTÂNCIA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNI- lícitas, já a gravação telefônica pode ser feita sem a autorização do juiz. Também é importante diferenciar interceptação telefônica de quebra de sigilo telefônico. Na primeira, quem intercepta tem acesso ao teor 18REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA da conversa, já na quebra do sigilo, a única Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e informação a que se tem acesso é o registro de multa. ligações efetuadas e recebidas. Nossa Carta Magna apresenta, em seu artigo 5º, in- Parágrafo único. Incorre na mesma pena a ciso XII, o direito de inviolabilidade do sigilo, trazendo, autoridade judicial que determina a execução inclusive, uma exceção a este direito: de conduta prevista no caput deste artigo com objetivo não autorizado em lei. (BRASIL, 1996, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem n.p.). distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes Vale ressaltar que, recentemente, algumas altera- no País a inviolabilidade do direito à vida, ções foram feitas na Lei de Interceptações Telefônicas, à liberdade, à igualdade, à segurança e à uma delas está presente no próprio artigo 10, acima ci- propriedade, nos termos seguintes: tado, o qual não apresentava, em seu texto anterior, a previsão quanto a escuta ambiental em seu caput,bem [...] como, não possuía um parágrafo único, ambas modifi- cações trazidas pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anti- XII – é inviolável o sigilo da correspondência e crime). das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, Após a realização da definição e diferenciação da por ordem judicial, nas hipóteses e na forma interceptação telefônica, apresentada sua previsão que a lei estabelecer para fins de investigação legal, deve-se analisar os requisitos para a realização criminal ou instrução processual penal. (BRASIL, desta ação, os quais, conforme Castro (2015), podem 1988, n.p.). ser extraídos do artigo 2º, da Lei nº 9.296/1996, sendo eles: indícios razoáveis de autoria ou participação em Com a análise do mencionado artigo da Constitui- infração penal; imprescindibilidade da medida; o fato ção Federal de 1988, percebe-se que o mesmo faz re- investigado deve constituir crime punido com reclu- ferência a uma norma específica para regulamentar as são. interceptações telefônicas, a qual foi instituída em 24 de julho de 1996, sendo ela a Lei nº 9.296, popular- No entanto, Santos e Calaça (2018, p. 65-66) apre- mente conhecida como Lei de Interceptações Telefô- senta uma interpretação um pouco diferente da Lei de nicas. Interceptação Telefônica, elencando 04 (quatro) requi- sitos para a sua aplicação, os quais são: competência Segundo Santos e Calaça (2018), a referida lei se para autorização e competência material; competên- ocupa de determinar disposições que deverão ser cia para requisição; imprescindibilidade da intercep- observadas para a autorização de procedimentos de tação para apuração da infração, e fundamentação da interceptação telefônicas quando da realização de in- decisão. O autor define os presentes requisitos da se- vestigação criminal ou instrução processual penal, o guinte forma: que sempre irá depender de ordem judicial, constituin- do crime a sua realização sem a autorização do juiz: a) COMPETÊNCIA PARA AUTORIZAÇÃO E COMPETÊNCIA MATÉRIAL: Sumariamente, Art. 1º A interceptação de comunicações precisamos salientar que já no artigo 1º da lei em telefônicas, de qualquer natureza, para prova tela, o legislador limita sua aplicação a produção em investigação criminal e em instrução de provas em investigações criminais e nas processual penal, observará o disposto nesta Lei instruções processuais penais. E dependerá de e dependerá de ordem do juiz competente da ordem do juiz a qual compete a ação principal, ação principal, sob segredo de justiça. sob segredo de justiça. Aplicando-se também à interceptação do fluxo de comunicações em Parágrafo único. O disposto nesta Lei aplica-se sistemas de informática e telemática. à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática. b) COMPETÊNCIA PARA REQUISIÇÃO: O artigo 3º da lei 9.296/96, dita que o mesmo juiz que Art. 10. Constitui crime realizar interceptação deve autorizar a interceptação telefônica, de comunicações telefônicas, de informática também pode requerê-la de ofício. Nos casos ou telemática, promover escuta ambiental ou de requerimento, a autoridade policial será quebrar segredo da Justiça, sem autorização competente em âmbito de investigação criminal, judicial ou com objetivos não autorizados em lei: e o Ministério Público tanto em investigação 19REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA criminal como na instrução processual penal. dencial, mas trouxe mudanças consideráveis ao Có- digo de Processo Penal quando abordada na Lei nº c) IMPRESCIBILIDADE DA INTERCEPTAÇÃO PARA 11.690/2008. APURAÇÃO DA INFRAÇÃO: O pedido deverá conter a demonstração de que a interceptação é A referida lei trouxe várias modificações, dentre recurso necessário para a apuração da infração elas, a presente no artigo 157, caput e §1º, do CPP: penal, indicando os meios a serem empregados conforme dispõe o artigo 4º da lei 9.296/96. Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser Via de regra o pedido deverá ser escrito, cabe desentranhadas do processo, as provas ilícitas, exceção podendo o juiz admitir pedido verbal, assim entendidas as obtidas em violação a desde que presentes os pressupostos que normas constitucionais ou legais. autorizem, estando a concessão condicionada § 1º São também inadmissíveis as provas á reduzir a termo o pedido verbal, assim dispõe derivadas das ilícitas, salvo quando não o parágrafo primeiro da lei 9.296/96. Tendo o evidenciado o nexo de causalidade entre umas juiz competente o prazo máximo de 24 (vinte e e outras, ou quando as derivadas puderem quatro) horas para decidir sobre o pedido, nos ser obtidas por uma fonte independente das termos do parágrafo segundo da lei em tela. primeiras. (BRASIL, 1941,n.p.) d) FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO: O artigo De acordo com Gonçallo (2014, n.p.) um exemplo 5º traz sob pena de nulidade, que a decisão clássico da aplicação da teoria da árvore dos frutos judicial que defere a interceptação deverá ser envenenados “é a apreensão de drogas em veículo fundamentada, indicar a forma de execução da abordado por policiais (ação lícita), cuja informação foi diligência, por prazo de quinze dias, renovável obtida através de interceptação telefônica sem autori- por tempo igual comprova da indispensabilidade zação judicial (ação ilícita) ou através de outras provas do meio de prova. (sic) ilícitas, como a tortura ou da violação de correspon- dência”. Salienta-se que Sobreira (2011) possui um posicio- namento distinto dos demais autores apresentados, Diante disto, ressalta-se a importância da realiza- mas que parece uni-los, visto que afirma que, para que ção da interceptação telefônica nos moldes estabele- a ordem jurídica para realização de interceptação tele- cidos na lei específica, para que não sejam tidas como fônica seja válida, faz-se necessário que sejam respei- ilícitas as provas por ela produzidas. tadas as exigências trazidas nos artigos 1º ao 5º da lei em estudo. Ante o exposto, destaca-se a relevância da inter- ceptação telefônica para o ordenamento jurídico bra- O autor acrescenta ainda que é incontestável que sileiro. Nas palavras de Santos e Calaça (2018, p. 67): nas ordens encaminhadas às empresas de telefonia “É um avanço como meio de obtenção de prova dentro não é obrigatório informar todos os requisitos presen- do processo penal brasileiro na busca pela elucidação tes na lei, porém, alguns são imprescindíveis, sendo da existência ou não de fato criminoso”. eles: a competência e jurisdição do juiz que irá emanar a ordem, o prazo não superior a 15 (quinze) dias para A relevância da interceptação telefônica é enalte- realização da interceptação, e a informação do número cida por Bongiolo (2017, n.p.), ao se falar dos crimes de telefone do investigado que será interceptado. envolvendo organizações criminosas: Desta forma é possível compreender que não existe A interceptação da comunicação telefônica é um um consenso com relação aos requisitos para a realiza- importante método de investigação, não só no ção de interceptação telefônica, no entanto, pode-se Brasil, como em vários outros países do mundo. dizer que devem ser seguidas as exigências apresen- Para enfrentar a criminalidade organizada é tadas nos artigos 1º ao 5º da Lei nº 9.296/1996, para considerada um meio investigativo inigualável, que a interceptação seja admitida e não sofra pena de capaz de mapear a sua existência e traçar os nulidade. seus contornos. Ao se falar de interceptação telefônica, um assunto Por fim, vale destacar o que é apresentado por Nas- que constantemente vem à tona é a teoria da árvore cimento (2010), o qual ressalta a importância da inter- dos frutos envenenados, também conhecida como te- ceptação telefônica a definindo como um dos meios oria da prova ilícita por derivação, a qual foi inspirada mais eficazes para a produção de provas, com desta- no direito estadunidense (fruits of poisonous tree). A que para os crimes que não deixam vestígios materiais. referida teoria já possuía reconhecimento jurispru- Assim, resta evidenciado que a interceptação tele- 20REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA fônica é um meio probatório de suma importância e re- e o método empregado foi a criptografia de ponta-a- levância para a investigação criminal, sendo necessário -ponta que não permite que terceiros tenham acesso que seu procedimento seja realizado conforme as de- ao conteúdo das mensagens ou ligações realizadas por terminações da Lei nº 9.296/1996 para que não sejam meio do aplicativo. O site oficial do WhatsApp (n.p.) ex- produzidas provas ilícitas, prejudicando, desta forma, plica este sistema de segurança da seguinte forma: o andamento de processos. A criptografia de ponta-a-ponta do WhatsApp 4 A EFETIVIDADE DA QUEBRA DO SIGILO DO WHAT- está disponível quando você e as pessoas com SAPP NA FORMAÇÃO DA OPINIO DELICT as quais você conversa utilizam nosso aplicativo. Muitos aplicativos criptografam mensagens Caminhando para o fim das discussões, após de- entre você e eles próprios, já a criptografia de finir e destrinchar o direito à privacidade e depois de ponta-a-ponta do WhatsApp assegura que analisar a importância das interceptações telefônicas, somente você e a pessoa com a qual você está passar-se-á ao ponto principal de estudo: o WhatsApp se comunicando podem ler o que é enviado e e seu sigilo. ninguém mais, nem mesmo o WhatsApp. Isto porque mensagens são criptografadas com Para aqueles que desconhecem, o WhatsApp é um um cadeado único, onde somente você e o aplicativo de mensagens instantâneas, de texto e de destinatário possuem uma chave especial para voz, e ligações, de voz e de vídeo, com suporte para abrir e ler a mensagem. E para uma proteção smartphones com sistemas Android, iOS Windows ainda maior, cada mensagem que você enviar Phone e Nokia. O site Olhar Digital (n.p) acrescenta possui um cadeado e uma chave. Tudo isso que: acontece automaticamente: não é necessário ativar configurações ou estabelecer conversas secretas especiais para garantir a segurança de suas mensagens.] O WhatsApp é um aplicativo de troca de De acordo com Teixeira; Sabo, P. e Sabo, I (2017, p. mensagens e comunicação em áudio e vídeo pela 618), “Criptografia ponto-a-ponto é um termo dado internet, disponível para smartphones Android, para descrever que mesmo que a mensagem passe iOS, Windows Phone, Nokia e computadores por um terceiro ou gerenciador , ela só é decifrada no Mac e Windows. O Programa tem mais de 1,5 receptor, ao passo que os gerenciadores da troca de bilhão de usuários ativos mensais espalhados mensagens não possuem acesso às chaves para deci- por mais de 180 países. (sic). frá-las.” (sic) Segundo o site Significados (n.p), “Whatsapp é um É indiscutível que o WhatsApp, ao utilizar esta crip- software para smartphones utilizado para troca de tografia, está impedindo que toda e qualquer pessoa mensagens de texto instantaneamente, além de víde- que não seja o interlocutor da conversa tenha acesso os, fotos e áudios através de uma conexão a internet.” ao que foi dito, por ligação ou mensagem de texto, di- (sic – grifo no original). ficultando, inclusive, a ação da polícia na realização de investigações criminais. Além disso, Teixeira; Sabo, P. e Vale destacar ainda que Baracho, Argolo Junior Sabo, I (2017, p. 624) afirma o seguinte: e Bezerra Diniz (2017) afirma que o WhatsApp é um aplicativo para a realização de trocas de mensagens, O uso da criptografia ponto-a-ponto é uma sejam elas textos, imagens ou áudios. Os autores excelente iniciativa nesse sentido, pois assegura, acrescentam, inclusive, que o referido software possui ao menos em tese, que a empresa não terá outras funcionalidades, como criar grupos e realizar acesso ao conteúdo compartilhado entre os chamadas, inclusive de vídeo. usuários, únicos detentores do conjunto das chaves para decifrar a mensagem. A ideia é Ademais, cabe ressaltar o que é exposto no site aplaudida sob o ponto de vista da criatividade oficial do WhatsApp (n.p.): “O WhatsApp surgiu como empresarial, visto que se interpretando os arts. uma alternativa ao sistema de SMS e agora possibilita o 19 e 20 do Marco Civil da Internet, ao lado da envio e recebimento de diversos arquivos de mídia: fo- não retenção de mensagens pelo servidor do tos, vídeos, documentos e localização, além de textos WhatsApp, depreende-se que a empresa sequer e chamadas de voz.” disponibiliza o conteúdo gera¬do por terceiros. Além disso, a criptografia ponto-a-ponto gerada Diante de tantas pessoas utilizando o aplicativo e instantaneamente quando da criação e envio do considerando a quantidade de informações compar- texto pelo usuário faz com que a mensagem seja tilhadas, o WhatsApp precisou encontrar uma forma impossível de ser acessada desde o seu início. de preservar o direito à privacidade de seus usuários, 21REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Logo, o conteúdo já nasce indisponível para o considerando que, em certos casos, ocorrendo um cri- WhatsApp. (sic). me, não se pode fazer uma investigação efetiva sem o acesso a conversas realizadas por meio do aplicativo. Dessa forma, segundo Baracho, Argolo Junior e Be- Assim como afirma Baracho, Argolo Junior e Bezerra zerra Diniz (2017), se poderia utilizar o argumento que Diniz (2017, p. 112): seria impossível quebrar o sigilo das comunicações de dados do WhatsApp. No entanto, os autores acrescen- Com efeito, o mecanismo de segurança utilizado tam que este argumento não deve prosperar, visto que pelo WhatsApp, que foi criado de modo a existe a possibilidade de modificar o mecanismo de se- impossibilitar até mesmo o Poder Judiciário de gurança do aplicativo, de forma que seja possível obter ter acesso ao conteúdo das comunicações, viola as chaves privadas dos usuários através de determina- a Constituição Federal e a jurisprudência da ção judicial e sob sigilo, assim como preleciona a lei de Suprema Corte deste país, por tornar o direito interceptação telefônica. à privacidade absoluto, permitindo que o seu mecanismo de segurança seja utilizado para É de fundamental importância a discussão acerca encobertar práticas delituosas. da utilização do WhatsApp para obtenção de provas para a formação da Opinio Delict e muito já se discu- Segundo Bernardes e Ferreira (2015a), em virtude te a respeito do assunto. Pereira (2018) apresenta um da relatividade com que se caracterizam, os direitos argumento significativo ao afirmar que a Polícia Judi- fundamentais não acarretam posições de vantagens ciária, que é incumbida constitucionalmente do poder nem proteção jurídica definitivas a seus titulares, não investigatório, não pode simplesmente fechar os olhos sendo, portanto, um direito superior ao outro. Os auto- e não utilizar os frutos da evolução tecnológica, ten- res acrescentam que, desta forma, os direitos funda- do em vista que os autores dos delitos os utilizam, ou mentais estão sujeitos a restrições, que impedem se- estaria criando um espaço imune ao controlo estatal, rem absolutos. Vale destacar ainda o que afirma Dutra onde crimes graves se multiplicariam. (2017, n.p.): Vale destacar que no mesmo sentido em que as in- “[...] uma das característica dos direitos vestigações policiais não devem deixar de analisar os e garantias fundamentais é o seu caráter novos meios de comunicação, não se deve também não absoluto (caráter relativo), uma vez violar o Estado Democrático de Direito e tentar, a todo que encontram limites nos demais direitos custo, obter informações, como, por exemplo, apreen- constitucionalmente consagrados, bem como dendo o aparelho de telefone celular do suposto autor são limitados pela intervenção legislativa de um crime e extraindo as conversas por ele realiza- ordinária, nos casos expressamente autorizados das. pela própria Constituição (princípio da reserva legal). Além disso, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Ordinário em Habeas Corpus: RHC 51531 RO Segundo Bernardes e Ferreira (2015a), em virtude 3014/0232367-7, no qual decidiu pela ilicitude da de- da relatividade com que se caracterizam, os direitos vassa de dados e conversas de WhatsApp obtida di- fundamentais não acarretam posições de vantagens retamente de aparelho celular apreendido durante a nem proteção jurídica definitivas a seus titulares, não situação de flagrante. sendo, portanto, um direito superior ao outro. Os auto- res acrescentam que, desta forma, os direitos funda- Levando em consideração a aparente impossibili- mentais estão sujeitos a restrições, que impedem se- dade de quebra do sigilo do WhatsApp, em decorrên- rem absolutos. Vale destacar ainda o que afirma Dutra cia de sua criptografia, a apreensão de aparelho telefô- (2017): nico de pessoa envolvida em crime se apresenta como uma possível alternativa para o acesso às conversas “[...] uma característica dos direitos e garantias realizadas pelo referido aplicativo, devendo-se atentar fundamentais é o seu caráter não absoluto a suma importância da autorização judicial para a rea- (caráter relativo), uma vez que encontram lização da extração das conversas do aparelho. limites nos demais direitos constitucionalmente consagrados, bem como são limitados pela No entanto, deve-se fazer uma reflexão, visto que intervenção legislativa ordinária, nos casos a criptografia do WhatsApp está dando ao direito à expressamente autorizados pela própria privacidade o status de direito fundamental supremo, Constituição (princípio da reserva legal). o sobrepondo sobre todos os outros direitos funda- mentais, principalmente sobre o direito à segurança, Neste sentido, fica claro que é necessária a realiza- 22REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA ção de mudanças na criptografia do aplicativo What- dando destaque à necessidade de serem respeitadas sApp, permitindo desta forma que ele seja utilizado as imposições feitas pela lei nº 9.296/1996 (Lei de In- como um eficiente meio de produção probatória, con- terceptação Telefônica), sob pena de nulidade. tribuindo para a sua efetividade na formação da Opnio Delict. Por fim, foi realizado um estudo acerca do aplica- tivo WhatsApp que pode demonstrar a complexidade CONCLUSÃO que existe diante de sua criptografia ponta-a-ponta, a qual impede uma investigação mais profunda em si- Ante o exposto neste artigo, concluiu-se que o di- tuações que as provas principais estão em conversas reito à privacidade é bem mais antigo do que se ima- realizados por meio do referido aplicativo. Deve-se le- ginava, tendo surgido há muito tempo e evoluído var em consideração que se faz necessária uma modi- constantemente até se apresentar nos moldes que ficação no sistema de segurança do software, para que o conhecemos nos dias atuais. Pode-se extrair que o seja possível a quebra de seu sigilo através de autori- referido direito possui previsão constitucional e infra- zação judicial. constitucional em nosso ordenamento jurídico, bem como está expresso em tratados internacionais e na Enquanto as modificações no aplicativo não são re- Declaração Universal dos Direitos Humanos. Além dis- alizadas a alternativa encontrada para a imediata so- so, foi possível analisar a divisão do direito à privacida- lução parcial do problema é a apreensão de aparelho de em direito à imagem, à vida privada, à intimidade e celular de pessoa supostamente envolvida em crime, à honra. para que sejam extraídas as conversas realizadas via WhatsApp, não deixando de ser necessária a autoriza- Vale destacar que foi comprovada a importância da ção do juiz responsável pelo caso. interceptação telefônica para a investigação criminal, REFERÊNCIAS AZEVEDO, R. F. de. Direito à Imagem. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2306/direito-a-imagem>. Acesso em: 30 mar. 2020. BARACHO, D. D.; ARGOLO JUNIOR, C.; BEZERRA DINIZ, L. A. J. A Quebra do Sigilo do WhatsApp como Meio de Prova Aceito no Direito Pátrio:A necessidade de interceptação do sigilo das comunicações de dados para fins de persecução criminal. Disponível em: <https://egov.ufsc.br/portal/conteudo/quebra-do-sigilo-do-whatsapp-co- mo-meio-de-prova-aceito-no-direito-p%C3%A1trio-necessidade-de>. Acesso em: 15 abr. 2020. BERNARDES, J. T.; FERREIRA, O. A. V. A. Direito Constitucional: Tomo II. 4 ed. rev. e atual. Salvador: Editora Jus- Podivm, 2015a. 23REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
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A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO CIRURGIÃO PLÁSTICO THE RESPONSIBILITY OF THE PLASTIC SURGERY PHYSICIAN Mariana Lucas Chagas 1 Rildo Mourão Ferreira 2 RESUMO the country has been judging; establish positioning Este artigo propõe-se a explanar desde os primórdios regarding aesthetic damage and the responsibility da responsabilidade civil até a contemporaneidade. Visa of plastic surgeon in repair of the damage to the pa- esclarecer o que é o dano estético que o paciente pode tient. The methodology used was the bibliographical vir a sofrer, como também a extensão da culpa do pro- research, through the decisions of the courts, trial of fissional que se relaciona com a responsabilidade con- statistical data and legislation. It is concluded that tratual. Aborda o que os tribunais do país vêm julgando, the aesthetic methods, which most of them are ba- firma posicionamentos a respeito do dano estético, da rely executed due to the doctors are not qualified for responsabilidade do médico cirurgião plástico e como the surgery procedure. se dá a reparação do dano causado ao paciente. O tra- balho foi desenvolvido pelo método dedutivo, através KEYWORDS: Civil Liability. Aesthetic Damage. Moral de pesquisa bibliográfica, julgamento de dados estatís- Damage. Procedures. ticos e legislação. Como resultado, percebe-se que os procedimentos estéticos, que na maioria dos casos são 1 INTRODUÇÃO executados sem êxito, ocorrem, majoritariamente, em face de que as cirurgias são realizadas por médicos não Atualmente os procedimentos estéticos estão em capacitados para tal procedimento. alta e, com isso, a responsabilidade civil do médico au- menta. É comum ver nos noticiários procedimentos PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade civil. Dano es- estéticos realizados sem êxito, trazerem tanto danos tético. Dano moral. Procedimentos. estéticos como morais ao paciente. Nestes casos em que ocorre negligência, imperícia ou imprudência de ABSTRACT um profissional, como fica sua responsabilidade peran- The objective of this paper is to present from the be- te o dano? Será responsabilidade objetiva ou subjetiva? ginning of civil liability until now. Aims to clarify what Este artigo pretende explicar como se deu a evolução is aesthetic damage that the patient is exposed to da responsabilidade civil do médico até os dias de hoje, suffer, just as the guilt of the professional in contrac- o que de fato é responsabilidade civil e até que ponto o tual responsibility. Encompasse what the tribunal of agente pode ser reparado por erro médico. *Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO), Especialista em Direito Em- presarial pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV/SP) e em Direito Público pela Faculdade Professor Damásio de Jesus, Professora Adjunta da Faculdade de Direito da Universidade de Rio Verde/GO e Procuradora do Município de Rio Verde/GO. *Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC/GO), Especialista em Direito Público pela Universidade de Rio Verde (UniRV), Professor Adjunto da Faculdade de Direito da Universidade de Rio Verde/GO e Advogado. 26REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA A pesquisa versará sobre o Direito Civil e suas le- giu do Direito Romano com previsão legal na Lei das XII gislações, ressaltando a responsabilidade civil e o dano Tábuas, neste período a responsabilidade que predo- aos pacientes decorrentes por erro, negligência, impe- minava era a responsabilidade sem culpa. No entanto, rícia e/ ou imprudência do médico cirurgião plástico, esta experiência não foi das melhores, pois a responsa- como também a reparação desse dano causado no pa- bilidade sem culpa trazia consigo acusações injustas. ciente. Tartuce (2017, p. 327) expõe que [...] “a responsabili- dade mediante culpa passou a ser a regra em todo o Para a elaboração do presente artigo, utilizar-se-á Direito Comparado, influenciando as codificações pri- de pesquisa bibliográfica, através do método deduti- vadas modernas, como o Código Civil Francês de 1804, vo, sendo abordados estudos de doutrinadores, juris- o Código Civil Brasileiro de 1916 e ainda o Código Civil prudência e legislação que tratem do Direito Civil, com Brasileiro de 2002”. base nos pontos evidenciados. Além disso, serão con- sultados dados oficiais divulgados por órgãos como Desta forma, o legislador manteve o posiciona- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mento sobre a responsabilidade civil na forma aferida Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e ou- mediante culpa no Art. 186 do Código Civil Brasileiro tros. de 2002. “Aquele que, por ação ou omissão voluntá- ria, negligência ou imprudência, violar direito e causar 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, co- mete ao ilícito”. Observa-se que no Direito houve evoluções confor- me o passar dos anos. Sobretudo, a responsabilização 3 RESPONSABILIDADE CIVIL do dano causado a outrem sempre existiu, o que se modificou ao longo da história foi a aplicação de san- É o dever jurídico dado ao agente de se responsabi- ções a um ato ilícito em virtude do descumprimento lizar e responder por suas ações ou omissões, ressar- a um dever de conduta. A responsabilidade civil surge cindo os danos que causou a alguém. Pode ser contra- em face do descumprimento de regra estabelecida em tual, prevista em contrato regente; e extra-contratual contrato, ou pelo fato de a pessoa deixar de observar (aquiliana), que se baseia no princípio da culpa. um preceito normativo que regula a vida (TARTUCE, 2017). Primeiramente, para se falar em Responsabilidade Civil, deve-se ficar atento aos elementos básicos que Gonçalves (2014, p. 47) traz o seguinte entendi- ensejam a reparação ou indenização dos danos cau- mento sobre os primórdios da responsabilidade civil: sados. Sendo assim, são listados da seguinte forma, a “ação”, o “dano”, o “nexo de causalidade” e a “culpa”. Nos primórdios da humanidade, entretanto, não se cogitava do fator culpa. O dano provocava a A “ação” propriamente dita é a forma através da reação imediata, instintiva e brutal ao ofendido. qual se pratica o ato concreto com efeito sensível. O Não havia regras nem limitações. Não imperava, “dano” é o ato praticado com efeito de um mal ou pre- ainda, o direito. Dominava, então, a vingança juízo. O “nexo de causalidade” é a junção da prática privada, forma privativa, selvagem talvez, mas com o resultado de forma perceptível. Já a “culpa” é o humana, da reação espontânea e natural contra resultado de uma prática reprovável, embora existam o mal sofrido; solução comum a todos os povos diversos tipos de modalidade culposa. (COUTO, 2016). nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal. Tartuce (2017, p.339) traz em seu livro um quadro comparativo sobre o entendimento de alguns doutri- Este conceito caracteriza a responsabilidade civil nadores: exclusivamente objetiva. A lei de Talião (ou Retaliação) traz consigo o seguin- te conceito, “olho por olho, dente por dente”, criada na Mesopotâmia a lei exige que o agressor seja punido na mesma medida em que causou o sofrimento (Respon- sabilidade Civil de caráter objetivo). A referida lei sur- 1 De acordo com Naím (2013, p. 20), “Estados soberanos têm quadruplicado de número desde a década de 1940; além disso, eles agora competem, brigam ou negociam não apenas entre si, mas também com numerosas organizações transnacionais e não estatais.” 27REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA QUADRO 1 - ENTENDIMENTOS DE DOUTRINADORES A responsabilidade profissional é, de fato, inseparável da responsabilidade do indivíduo - Maria Helena Diniz aponta a existência de três como ser humano. Não existe uma pessoa elementos, a saber: a) existência de uma ação, comis- que seja responsável como ser humano e siva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que irresponsável profissionalmente, e vice-versa. se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da A responsabilidade é a virtude maior que um culpa como fundamento da responsabilidade civil há o profissional pode possuir. Isto se reflete na risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial preocupação constante com quem lhe contrata, causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano com o cliente que encomenda um serviço ou um e a ação, o que constitui o fato gerador da responsa- objeto, preocupação em cumprir o prazo ou dar bilidade.14 satisfação no momento preciso. Ele deve, enfim, - Sílvio de Salvo Venosa leciona que quatro são ser confiável. os elementos do dever de indenizar: a) ação ou omis- Em todas as profissões, quando se alia são voluntária; b) relação de causalidade ou nexo cau- responsabilidade ao talento, o profissional se sai, c) dano e d) culpa.15 torna insuperável. E cada vez mais ele se realiza, - Carlos Roberto Gonçalves leciona que são mais constrói e vê resultados naquilo que gosta quatro os pressupostos da responsabilidade civil: a) de fazer. Como é saudável e bom fazer aquilo ação ou omissão; b) culpa ou dolo do agente; c) rela- que amamos. É um presente. É a plenitude da ção de causalidade; d) dano.16 felicidade profissional que, junto com o amor, completam o homem e representam os mais gratificantes dos sentimentos humanos. - Para Sérgio Cavalieri Filho são três os elemen- 3.2 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL tos: a) conduta culposa do agente; b) nexo causai; c) dano.17 Responsabilidade contratual é um contrato em que o contratante e o contratado expõem fatos sobre o FONTE: TARTUCE (2017) “objeto” contratado. No caso do médico, é neste con- trato que são estabelecidos valores, obrigações e de- Desta forma, em matéria de Responsabilidade Civil, veres. necessário se faz falar em culpa genérica, relacionada à voluntariedade do agente em produzir o dano, po- O Diário Oficial do Estado de Goiás afirma que o mé- dendo ser de forma consciente e querida (dolo) ou de dico tem como obrigatoriedade a obtenção de resulta- forma negligente, imprudente ou imperita (culpa em do, bem como prática da responsabilidade contratual. sentido estrito), em que ambas ensejam responsabi- lização, in casu, do cirurgião plástico se presentes os TRATA-SE DE CIRURGIA PLÁSTICA, NA QUAL O elementos do dever de indenizar. MÉDICO ASSUME A OBRIGAÇÃO DE RESULTADO, PELO QUE SUA CULPA É PRESUMIDA. SENDO 3.1 RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL ASSIM, BASTA QUE A PACIENTE DEMONSTRE O DANO, PODENDO O MÉDICO, PARA ELIDIR SUA O profissional responsável está interligado com o CULPA, COMPROVAR QUE O EVENTO DANOSO bom comportamento do ser humano, é a pessoa que TENHA DECORRIDO, POR EXEMPLO, DE MOTIVO assume o risco se algo der errado na ação ou omissão DE FORÇA MAIOR, CASO FORTUITO OU MESMO do ato, e faz de tudo para que nada saia do planeja- DE CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. OU SEJA, do. Para a pessoa que não tem honestidade e respeito, SE AS ALEGAÇÕES DA PACIENTE FOREM as chances de demonstrar responsabilidade profissio- VEROSSÍMEIS, E CABÍVEL A INVERSÃO DO ÔNUS nal são quase nulas, visto que honestidade e respeito DA PROVA, EM RAZÃO DA CULPA PRESUMIDA compõem a identidade profissional. NOS CASOS DE CIRURGIA PLÁSTICA. NESTE SENTIDO ENTENDE O STJ: Santos (2018) expõe seu entendimento sobre a res- CIVIL E PROCESSUAL - CIRURGIA ESTÉTICA ponsabilidade da seguinte forma: OU PLÁSTICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL OU OBJETIVA) - INDENIZAÇÃO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. I - CONTRATADA A REALIZAÇÃO DA CIRURGIA ESTÉTICA EMBELEZADORA, O CIRURGIÃO ASSUME OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL 28REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA OU OBJ ETIVA), DEVENDO INDENIZAR PELO modalidade culposa no caso, - negligência, imprudên- NÃO CUMPRIMENTO DA MESMA, DECORRENTE cia ou imperícia - exlcui-se a fixação da responsabiliade DE EVENTUAL DEFORMIDADE OU DE ALGUMA civil do médico (DINIZ, 2014). IRREGULARIDADE. II - CABÍVEL A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. III - RECURSO CONHECIDO E Diante do exposto, será apresentado o posiciona- PROVIDO. (STJ - RESP: 81101 PR 1995/0063170- mento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina ante 9) CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. (GOIAS, 2017). um caso concreto analisado e julgado. O contrato é uma segurança que a pessoa tem so- APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR bre o trabalho vendido do médido, o descumprimento DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS deste contrato pode causar, em certas circunstâncias, DECORRENTES DE ALEGADO ERRO MÉDICO [...]. danos materiais como também danos morais (DINIZ, O descontentamento da paciente com o resultado 2014). do procedimento realizado por cirurgião plástico, não implica responsabilização do profissional 3.1 RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL [...]. (TJ-SC - AC: 00123038020098240036 Jaraguá do Sul 0012303-80.2009.8.24.0036, O crescimento de serviços na área de cirurgia plás- Relator: Saul Steil, Data de Julgamento: tica gerou impacto na responsabiliade do médico no 13/06/2017, Terceira Câmara de Direito Civil). exercício de sua atividade. Quando se faz contrato com (SANTA CATARINA, 2017). uma finalidade, o paciente confia e se entrega ao pro- fissional que se diz capaz de solucionar aquilo que o No mesmo entendimento apresentado acima, jul- incomoda. Mas antes desse contrato, deve o médico gado por erro médico decorrente de imperícia médica fazer inúmeros exames para saber a extensão dos ris- o Tribuna de Justiça do Rio de Janeiro trás o seguinte cos que determinado procedimento poderá trazer ao posicionamento. paciente. APELACAO DES. CAETANO FONSECA COSTA - Com este mesmo entendimento de que o médico Julgamento: 31/10/2006 - SETIMA CAMARA responsável pelo procedimento se atente a todos os CIVEL RESPONSABILIDADE CIVIL. Erro médico. exames do pré-operatório, bem como, que informe ao Imperícia constatada pela prova pericial, que paciente dos devidos riscos dos quais vier a ter, neste identifica a origem do dano como sendo o sentido tem se o entendimento do Tribunal de Justiça mau atendimento dispensado à Autora pelos de São Paulo TJ - SP, ante um caso concreto analisado prepostos do Primeiro-Réu, assim como pela e julgado. atuação equivocada do Segundo-Demandado, responsável que foi pela realização da primeira INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. cirurgia. Responsabilidade solidária que deve ser reconhecida para ambos os Réus, não se ERRO MEDICO. DANO ESTÉTICO DECORRENTE justificando a exclusão do segundo como a princípio fora decretada pela sentença. Dano DE CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE moral fixado de acordo, em R$26.000,00 (vinte e seis mil reais), que sofrerá correção monetária da RESULTADO. MÉDICO QUE NÃO ESCLARECEU data da sentença e juros legais da citação. Dano estético que merece ser reconhecido, porque o DE FORMA SATISFATÓRIA OS RISCOS QUE A fez o perito, sendo razoável seu arbitramento em R$5.000,00 (cinco mil reais).Deve ser CIRURGIA ENVOLVIA. DANO QUE É VISÍVEL A igualmente admitido o pensionamento, haja vista que o perito reconheceu a incapacidade OLHO NU. RESULTADO NEGATIVO DA CIRURGIA parcial e permanente da Autora. Percentual de 9% (nove por cento) no lugar dos 20% (vinte por QUE JÁ GERA O ABALO PSICOLÓGICO. cento) recomendados, eis que não se deve para esse fim considerar aquilo que foi estipulado para INDENIZAÇÃO DEVIDA. SENTENÇA compensar a falta de sensibilidade do local e sim a efetiva redução laboral e de movimentos na mão REFORMADA. RECURSO PARCILAMENTE esquerda da Demandante. Os juros moratórios nesse terreno deverão ser computados da PROVIDO. (TJ-SP – APL: 00147172220138260047 época do evento. Súmula nº 54 do E. Superior Tribunal de Justiça. Pensionamento que deve SP 0014717-22.2013.8.26.0047, Relator: Vito ser arbitrado tendo como base, tanto para as prestações vencidas como para as vincendas, o Guglielmi, Data de Julgamento: 16/06/2016, 6° efetivo salário da vítima a época do evento, que Câmara de Direito Privado, Data de Publicação 17/06/2016) (SÃO PAULO, 2016). Feitos os exames pré-operatórios ou pós-operató- rios, se houver eventual sequela da qual não se sabe a origem, não haverá obrigação por risco profissional do médico que realizou a operação, tendo em vista que os procedimentos cabíveis foram tomados. Não havendo 29REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA correspondia a -14, 133 salários mínimos (doc. lha de São Paulo, dados interessantes sobre o cresci- fls.35). Necessária a constituição de capital mento na área de cirurgia plástica, no Brasil. De acordo garantidor para as vincendas Art. 602 do Código com a reportagem, o Brasil fez 12,9% dos 11,6 milhões de Processo Civil. Período de incapacidade total de procedimentos. O relatório segundo a Sociedade In- e temporária que deve encerrar-se em 20.09.96, ternacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) apon- para atender ao que recomenda o expert. tou que o país fez 1,49 milhão de operações estéticas Honorários advocatícios arbitrados segundo os em 2013, contra 1,45 milhão dos EUA. parâmetros legais. Provimento parcial de ambas as apelações. (RIO DE JANEIRO, 2006). Embora este número tenha caído em 2016, devido à crisce econômica, atualmente, está no ranking em 2° Conforme o Tribunal de Justiça do Estado do Tocan- lugar, ficando atrás somente para os Estados Unidos. tins, o pedido de indenização por danos morais e ma- teriais foi indeferido tendo em vista a falta de provas, Dentre as cirurgias mais frequentes realizadas no ou seja, faltou o nexo de causalidade e culpa país, tem-se a lipoaspiração, seguida do auto das ma- mas por silicone e da elevação dos seios. Vale ressaltar APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR que a procura para realizar procedimentos estéticos DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. em homens vem crescendo em todo o mundo, o que RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. INEXISTÊNCIA antes era considerado “tabu”, hoje é ação normal à DO DEVER DE INDENIZAR. CULPA E NEXO DE população masculina. CAUSALIDADE NÃO CONFIGURADOS. 1. O Apelante alega que sofreu danos de ordem moral 4 DO DANO ESTÉTICO e material causados por erro no atendimento médico cirúrgico realizado pelo 1º Apelado, o Quanto ao que se trata do dano estético Elpídio que teria gerado muitas dores, prolongamento Donizetti e Felipe Quintella apresentam em seu Livro no tratamento e sequelas permanentes. 2. A – Curso Didático de Direito Civil – de forma clara, a fi- responsabilidade do médico é subjetiva, devendo gura do dano estético. “[...] é a figura do dano estéti- ser comprovada sua atitude culposa de forma a co, categoria de dano extrapatrimonial destacada do gerar o dever de indenizar. Precedentes – Resp dano material. Trata-se do dano causado ao corpo e à 1104665/RS. 3. Concluiu o Laudo Pericial que o imagem da pessoa [...]” (DONIZETTI; QUINTELLA, 2017, procedimento cirúrgico adotado no momento p.411). do atendimento de emergência do Apelante foi correto, e que na ocasião, não poderiam ter Quanto aos cirurgiões plásticos, eles assumem a sido adotados procedimentos menos gravosos responsabilidade de apresentar resultado ao paciente, ao paciente, que tivesse o condão de minimizar diferente do médico comum que está ali para diagos- ou evitar as sequelas sofridas. 4. O Apelante ticar. Neste momento, o caso deve apresentar um fim, não logrou êxito em demonstrar a presença de pois os cirurgiões ali estão para reparar um defeito ou todos os requisitos necessários à configuração problema estético (GONÇALVES, 2014). do dever de indenizar, vez que não restou comprovado que efetivamente o 1º Apelado O Código Civil de 1916, em seu artigo 1.538, para- agiu com negligência, imprudência ou imperícia; gráfos 1° e 2°, trazia expressamente sobre o dano esté- ou que houve um erro médico ou, ainda, que tico ao utilizar os termos “aleijão e deformidade”. Diniz as sequelas sofridas decorreram diretamente (2014) leciona da seguinte maneira, do atendimento e tratamento ministrado pelo médico, ora apelado no atendimento de O dano estético é toda alteração morfológica emergência, caracterizando ausência de culpa do indivíduo, que, além do aleijão abrange e nexo de causalidade entre o ato e os danos as deformidades ou deformações, marcas e relatados. 5. Recurso de Apelação improvido. defeitos, ainda que mínimos e que impliquem, (TJ-TO - AC: 50020148820138270000, Relator: sob qualquer aspecto, aferimento da vítima, RONALDO EURÍPEDES DE SOUZA). (TOCANTINS, consistindo em simples lesão desgostante ou num permanentemente motivo de exposição ao 2013). ridículo ou de complexo de inferioridade. No entanto, se o responsável pelo procedimento deixar passar alguma informação importante ao caso, Ou seja, dano estético é a deformidade anormal que agindo de forma negligente na análise dos exames pré surge na pessoa, após a realização de um procedimen- ou pós-operatórios ou até mesmo durante a cirurgia, to, desde uma cicatriz superficial à mutilação decor- pode ocorrer sua responsabilização pela violação dos rente de uma infecção, por exemplo. deveres de cuidados objetivos. A colunista Cláudia Collucci trouxe em 2014, na Fo- 30REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Há entendimentos que o dano estético esteja ligado (RIO GRANDE DO SUL, 2018). ao dano moral, passível de indenizações como ocor- rem quando se tem angústia, causada pelo sofrimento, Ao se falar de indenização, o Código Civil de 2002 trou- bem como a vergonha que leva em conta os sentimen- xe os parâmetros que se devem utilizar para indenizar tos da vítima. Neste caso, há de se falar que pode ter alguém. como cumuláveis a indenização por dano estético e a indenização por dano moral. (DINIZ,2014). Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir Deveras que não são todos os casos em que isso outras reparações: ocorre, por exemplo, em caso concreto em que a ví- I - no pagamento das despesas com o tima não tem lesão física, mas foi psicologicamente tratamento da vítima, seu funeral e o afetada, tem-se dano moral. Por outro lado, quando a luto da família; deformação física causada não atingir o estado psico- II - na prestação de alimentos às pessoas lógico da vítima, tem-se a reparação de dano estrita- a quem o morto os devia, levando-se mente estético. em conta a duração provável da vida da vítima. O Superior Tribunal de Justiça traz a súmula nº 387 Art. 949. No caso de lesão ou outra que afirma a possibilidade de acumular as indeniza- ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ções por dano estético e dano moral. “É lícita a cumu- ofendido das despesas do tratamento lação das indenizações de dano estético e dano moral” e dos lucros cessantes até ao fim da (BRASIL, 2013). convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, julgou sofrido. procedente a Apelação Cível de 2° Grau sobre o dano Art. 950. Se da ofensa resultar defeito estético causado pelo médico em cirurgia estética, pelo qual o ofendido não possa exercer conforme citação abaixo. o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a APELAÇÕES. RESPONSABILIDADE CIVIL. indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao AÇÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do DE ERRO MÉDICO. DANOS MATERIAIS, trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu. MORAIS E ESTÉTICOS. CIRURGIA ESTÉTICA Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização (RINOPLASTIA). OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. seja arbitrada e paga de uma só vez. Art. 951. O disposto nos arts. 948, AÇÃO PROCEDENTE. MAJORAÇÃO DO 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no QUANTUM INDENIZATÓRIO. 1. Pretensão exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, indenizatória de reparação pelos prejuízos causar a morte do paciente, agravar- lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá- sofridos em decorrência de erro médico lo para o trabalho. (BRASIL, 2002). em cirurgia plástica (Rinoplastia) realizada O Código trouxe medidas para facilitar e ter como fundamentação a razão pela qual se dá a indenização, pelo médico demandado na autora. 2. A mas vale lembrar que será aplicada nos casos concre- tos isolados de acordo com o entendimento dos ma- responsabilidade civil do médico, na condição gistrados do caso. de profissional liberal, é regida pelo art. 14, § Conforme pesquisa realizada em 2017 pela ISAPS – International Society of Aesthetic Plastec Surgeons – o 4º, do Código de Defesa do Consumidor, ou Brasil encontra-se em segundo lugar no ranking entre seja, apurada mediante a verificação de culpa. Em se tratando de cirurgia estética, prevalece o entendimento no sentido de que a obrigação é de resultado, sendo a responsabilidade subjetiva, com culpa presumida. 3. Hipótese em que o conjunto probatório carreado ao feito, em especial o laudo pericial e a prova testemunhal, apontam para a ocorrência de erro médico a ensejar a responsabilidade do profissional pelo resultado insatisfatório reclamado pela autora. 4. Cabível a majoração dos valores fixados a título de indenizações pelos danos morais e estéticos, levando-se em consideração a gravidade da deformidade causada no rosto da autora. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO DO RÉU DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70075706697, Nona... Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 12/07/2018). 31REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA os países que mais realizam procediementos estéticos, ficando atrás somente dos Estados Unidos. Como mostra a tabela a seguir: 32REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA A Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) traz gráficos pertinentes ao ano de 2016 referentes às cirur- gias plásticas realizadas no Brasil. Se comparar o número de cirurgias plásticas realizadas, com o número de cirurgias plásticas reparado- ras realizadas no ano de 2016, como mostra o gráfico, fica nítido que houve mais realizações frutíferas do que infrutíferas, no entanto a reparação de tumores cutâneos apresentou mais efetuação do que a cirurgia de mama apresentada na imagem anterior. 33REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA Nota-se que o número de pacientes que procu- em relação ao processo cirúrgico que pode não ram esse tipo de procedimentos são jovens e ado- ser bem-sucedido. lescentes. Em pesquisa realizada pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica em 2018, mostra A responsabilidade civil do médico cirurgião que os adolescentes buscam melhor forma de se plástico surgiu devido à procura de procedimen- adequar à sociedade, pretendendo de alguma for- tos estéticos dos últimos tempos, quando hou- ma serem aceitos no modelo estético considerado ve necessidade de responsabilizar aquele que no ideal. exercício de sua função deixou de cumprir o dever de dar ao paciente o resultado almejado. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O dano gerado por negligência, imperícia ou O desenvolvimento da presente pesquisa pos- imprudência do cirurgião plástico, gera o dano sibilitou análise acerca da responsabilidade do material, por matéria; o dano moral, quando atin- médico cirurgião plástico, e se mostra fundamen- ge a moralidade do paciente; e o mais falado dano tal nos dias atuais ao se estudar o profissional an- estético, quando o resultado fim não fica confor- tes de contratá-lo. me o prometido pelo médico. Destaca-se que o número de cirurgias plásticas Conclui-se que a responsabilidade civil do mé- a cada ano aumenta em face de que as pessoas dico cirurgião plástico é uma responsabilidade sempre estão insatisfeitas com o corpo e, de algu- contratual, pois se exige um contrato com resul- ma forma, buscam ajuda médica para resolver im- tado estético final, e por se ter um resultado fim perfeições. As vezes essas cirurgias ocorrem e as tem-se que a responsabilidade é objetiva, ou seja, pessoas não conhecem as garantias dos direitos aquele que assume a obrigação de resultado, res- ponde independentemente de culpa. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da Re- pública, [2002]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 11 ago. 2020. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n. 387. É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral. Brasília, DF: Superior Tribunal de Justiça, [2013]. Disponível em: https://ww2.stj. jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2013_35_capSumula387.pdf. Acesso em: 11 ago. 2020. COLLUCCI, Cláudia. Brasil ultrapassa os EUA e se torna líder de cirurgias plásticas. Folha de S. Pau- lo, São Paulo, 27 jul. 2014. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2014/07/ 1493030-brasil-ultrapassa-os-eua-e-se-torna-lider-de-cirurgias-plasticas.shtml. Acesso em: 01 out. 2020. COUTO, Rafael. Os elementos necessários para caracterização da Responsabilidade Civil. 2016. Dis- ponível em: https://rafaghovatto.jusbrasil.com.br/artigos/325947447/os-elementos-necessarios-pa- ra-caracterizacao-da-responsabilidade-civil. Acesso em: 6 ago. 2020. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2014. 34REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
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REFLEXOS DO ACORDO DE PARIS NAS POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO BRASIL REFLECTIONS OF PARIS AGREEMENT ON PUBLIC POLICIES ON CLIMATE CHANGE IN BRAZIL Letícia Alves Vieira 1 Carolina Merida 2 RESUMO algumas políticas públicas e leis já foram implemen- tadas como, por exemplo, a Política Nacional sobre O objetivo deste trabalho é abordar o regime jurí- Mudança do Clima, entretanto, é notável que o Brasil dico internacional de mudanças climáticas, nomea- está perdendo seu papel de protagonismo no com- damente o Acordo de Paris, e os compromissos as- bate ao clima, em virtude da perda da prioridade da sumidos pelo Brasil por meio do respectivo Acordo, agenda ambiental que se iniciou no Governo Dilma pela Contribuição Nacionalmente Determinada. A Rousseff e que cresce no Governo Bolsonaro. princípio, serão tratados os principais documentos internacionais que versam sobre o tema. Em segui- PALAVRAS-CHAVE: : Acordo de Paris. Contribuição da, serão abordadas as principais políticas públicas Nacionalmente Determinada. Gases de Efeito Estufa. e legislações que tratam sobre a regulação climática Aquecimento Global. no Brasil, nas esferas federal e estadual, bem como os mecanismos de execução dos compromissos ABSTRACT impostos pela Contribuição Nacionalmente Deter- minada. Por fim, será dado enfoque à questão da : The objective of this paper is to address the inter- importância que as florestas e a vegetação têm na national legal regime of climate change, namelly the redução dos gases de efeito estufa e, consequente- Paris Agreement, and the commitments assumed by mente, no aquecimento global. O método utilizado Brazil through the respective Agreement, by the Na- foi o hipotético-dedutivo, com material levantado tionally Determined Contribution. At first, the main in- por meio de pesquisa bibliográfica e documental, ternational documents dealing with the subject will be sendo uma pesquisa descritiva e qualitativa. O artigo discussed. Next, the main public policies and laws dea- conclui que o Acordo de Paris inovou no sentido de ling with climate regulation in Brazil, at the federal and estabelecer metas de mitigação de gases de efeito state levels, and the mechanisms for implementing the estufa não apenas aos países desenvolvidos (como commitments imposed by the Nationally Determined previa o Protocolo de Kyoto), mas a todos os paí- Contribution will be addressed. Finally, the focus will ses que se comprometeram a ratificá-lo, com metas be on the importance of forests and vegetation in re- especificamente ao Brasil, de redução de gases de ducing greenhouse gases and, consequently, in global efeito estufa em relação aos níveis de 2005 em 37% warming. The method used was the hypothetical-de- até 2025, e 43% até 2030. Concluiu-se, ainda, que ductive, with material raised through bibliographic 1 Acadêmica de Direito da Universidade de Rio Verde (Unirv). 2 Doutoranda em Direito pela Unisinos, Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Professora Adjunta na Faculdade de3 Direito da Universidade de Rio Verde (Unirv) e Procuradora do Município de Rio Verde - GO. 36REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA and documentary research, being a descriptive and va, tendo como método o hipotético-dedutivo. qualitative research. The article concludes that the As crescentes preocupações com o futuro do pla- Paris Agreement has innovated to set greenhouse gas mitigation targets not only for developed countries (as neta e da vida humana na Terra fizeram emergir o provided for in the Kyoto Protocol), but for all countries regime internacional sobre mudanças climáticas. Se- that have committed to ratifying it, with targets spe- rão tratados logo na primeira parte os principais do- cifically to Brazil, to reduce greenhouse gas emissions cumentos que o integram: a Conferência das Nações from 2005 levels by 37% by 2025, and 43% by 2030. It Unidas sobre o Meio Ambiente de 1972 (Conferência was also concludes that some public policies and laws de Estocolmo), a Conferência das Nações Unidas sobre have already been implemented, such as the National Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro Policy on Change, however, it is noteworthy that Bra- de 1992 (ECO-92), a Convenção-Quadro das Nações zil is losing its leading role in the fight against clima- Unidas sobre Mudança Climática de 1992 (Convenção te, due to the loss of the priority of the environmental do Clima), o Protocolo de Kyoto de 1997 e, por fim, o agenda that began in the Dilma Rousseff Government Acordo de Paris de 2015. and which grows in the Bolsonaro Government. Na segunda parte serão abordados de que forma KEYWORDS:Paris Agreement. Nationally Determined o meio ambiente é tratado na Constituição Federal Contribution. Greenhouse gases. Global warming. de 1988 e as principais políticas públicas que versam sobre regulação climática no Brasil, como a Política 1 INTRODUÇÃO Nacional do Meio Ambiente, a Política Nacional sobre Mudança do Clima e as Políticas Estaduais sobre Mu- Os estudos científicos que comprovam que o aque- danças Climáticas, neste caso, com foco na política cimento do planeta advém das emissões de gases de aplicada ao Estado de Goiás. efeito estufa (GEE) são numerosos, entretanto, não é o único ponto analisado para se revelar a importância Os mecanismos de execução dos compromissos de tratar do tema em questão. A imprescindibilidade assumidos pela Contribuição Nacionalmente Determi- consiste em perceber que o Planeta Terra é único e nada do Brasil (NDC) serão tratados na terceira parte, com capacidade limitada. O contínuo consumo desen- com esclarecimentos quanto às metas de mitigação, as freado da população poderá causar uma catástrofe, o ações em adaptação e os meios de implementação da que faz importante a tomada de consciência acerca do NDC, assim como os setores nos quais ela visa atuar. termo “desenvolvimento sustentável”. Por fim, na quarta parte, será demonstrada a impor- As florestas acabam se revelando como uma das tância que as florestas trazem em termos de contribui- principais fontes de absorção de GEE. Se o nível de ção na redução dos GEE, em específico a maior floresta desmatamento ilegal continuar a se elevar e não hou- tropical do mundo, a Amazônica. Consequentemente, ver sua reposição, não há que se falar em diminuição sua grandiosidade acaba por atrair o desmatamento desses gases e, em consequência, o Planeta Terra fi- ilegal, outro ponto bastante polêmico atualmente, que cará cada vez mais quente e difícil de ser habitado. É também será abordado. importante perceber que essas emissões de GEE não começaram recentemente, o que torna o tema emer- 2 AQUECIMENTO GLOBAL E MUDANÇAS CLIMÁTI- gente em ser abordado e resolvido. CAS: CONCEITOS E PRINCIPAIS DOCUMENTOS INTER- NACIONAIS QUE VERSAM SOBRE O CLIMA O presente artigo procura questionar quais as ino- vações e diretrizes trazidas pelo Acordo de Paris sobre É contínua a discussão sobre as mudanças climáti- o regime internacional de mudanças climáticas; quais cas atualmente e acerca dos impactos que essas mu- os compromissos assumidos pelo Brasil por meio da danças podem vir a repercutir não só na sociedade referida Convenção Internacional; o que já foi imple- atual, mas nas próximas gerações. Com vistas a com- mentado no Brasil para tornar efetivo o cumprimento preender o objeto do estudo em questão, importante do Acordo; e ainda, analisar a questão da prioridade da se faz esclarecer acerca da diferença de “efeito estufa” agenda ambiental no Governo atual. O material levan- dos “gases de efeito estufa”. tado será analisado por meio de pesquisa bibliográfica e documental, sendo a pesquisa descritiva e qualitati- Efeito estufa diz respeito a um fenômeno natural que existe para manter a Terra em equilíbrio térmico adequado à vida. Essa camada de gases que o compõe é formada principalmente por vapor d´água e dióxido 37REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA de carbono, o que impede que boa parte da radiação cia humana no sistema climático, a Assembleia Geral solar seja refletida de volta para o espaço, mantendo das Nações Unidas respondeu aos apelos internacio- a temperatura em cerca de 16°C. Sem o efeito estufa, nais iniciando formalmente, em 1990, negociações re- a temperatura média da terra seria em torno de -17°C lativas a um acordo multilateral denominado Conven- (temperatura semelhante a Marte e Vênus). (FURLAN, ção-Quadro sobre Mudanças do Clima, que foi aberta 2010, p. 28). a assinaturas na ECO-92, entrando em vigor no dia 21 de março de 1994 (THOMÉ, 2017, p. 775). Atualmente, Quanto aos gases de efeito estufa, pela Lei nº a referida Convenção tem uma adesão quase univer- 12.187/2009, que regula a Política Nacional sobre Mu- sal, contando com 197 países. (ONU, 2019). dança do Clima, são conceituados como “constituin- tes gasosos, naturais ou antrópicos, que, na atmos- O principal objetivo da Convenção-Quadro é al- fera, absorvem e reemitem radiação infravermelha”. cançar a estabilização das concentrações de GEE na (PNMC, 2009). Com o advento da Revolução Industrial, atmosfera num nível que impeça uma interferência por volta do ano de 1850, as atividades humanas têm antrópica perigosa no sistema climático. Isso deve- acentuado a concentração de GEE na atmosfera. O 5º rá ser feito em um prazo suficiente que permita aos Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental ecossistemas adaptarem-se naturalmente à mudança sobre Mudança do Clima (IPCC), de 2014, confirma do clima que assegure que a produção de alimentos que “o sistema climático está sendo perturbado pelo não seja ameaçada e que permita ao desenvolvimento ser humano e a mudança climática representa riscos prosseguir de maneira sustentável. (CQNUMC, 1992). para os sistemas naturais e humanos”. (THOMÉ, 2017, p. 774). Naquela época, havia consenso de que a maior parcela das emissões de GEE era originária dos países Objetivando a regulação do sistema climático glo- desenvolvidos, o que motivou a aplicação do princípio bal emerge, assim, o regime internacional de mudan- das responsabilidades comuns, porém diferenciadas ças climáticas. Em 1972, em Estocolmo, na Suécia, foi e respectivas capacidades, gerando a esses países, a realizada a Conferência da ONU sobre Meio Ambiente, obrigação de tomarem uma iniciativa no combate às considerada um marco para o movimento ecológico e mudanças climáticas. (KÄSSMAYER; FRAXE NETO. a emergência do Direito Internacional Ambiental, ape- 2016). sar de os problemas ambientais já despertarem preo- cupações há muito mais tempo. Trouxe como diferen- Seus dispositivos foram complementados pelas cial em relação às outras convenções (que partiam de deliberações do órgão supremo e decisório institu- problemas em áreas específicas), a proposta de anali- ído pela Convenção, a Conferência das Partes (COP), sar a questão da preservação ambiental de um modo que tem a responsabilidade de tomar as decisões ne- ecológico amplo e global. (FURLAN, 2010, p. 30). cessárias para promover a efetiva implementação da Convenção, com reuniões anuais. Quanto ao estabe- Para a maioria da doutrina, a Conferência de Esto- lecimento de um nível específico e aceitável que cada colmo, constituiu no plano jurídico o verdadeiro ponto país pudesse vir a gerar de GEE, este foi acordado na de partida para uma percepção global da preocupação COP-3, realizada no Japão em 1997, com o Protocolo com o meio ambiente. É tida como o primeiro tratado de Kyoto. (THOMÉ, 2017, p. 776-777). que apresentava princípios com objetivo de proteção do meio ambiente, entre eles o referente ao desenvol- Em 1997 se consolida o Protocolo de Kyoto. Segun- vimento sustentável. (BRUNO; FROZZA; FRAGA, 2017). do informações da ONU Brasil (2019), o mencionado Protocolo criou diretrizes para que as nações cum- Posteriormente surge, em 1992, a Conferência das prissem metas para a redução de emissões de gases Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvi- causadores do efeito estufa, e o primeiro período de mento no Rio de Janeiro - CNUMAD (ECO-92), da qual compromisso começou em 2008 e terminou em 2012. resultou o texto da Convenção do Clima, que reconhe- O segundo período começou em 2013 e terminará em ceu a necessidade de um esforço global para o enfren- 2020. tamento das questões climáticas (BRUNO; FROZZA; FRAGA, 2017). Durante sua ocorrência, a comunida- Quando foi adotado, só entraria em vigor se alcan- de científica e política internacional reconheceu cla- çasse pelo menos 55 depósitos de ratificação dos Es- ramente que era preciso conciliar o desenvolvimento tados constantes do Anexo I da Convenção do Clima socioeconômico com a utilização dos recursos da na- (países industrializados/desenvolvidos), devendo tais tureza. (SENADO, 2012). Estados representar 55% do total mundial das emis- sões de dióxido de carbono em 1990. Os Estados Uni- Tendo em vista as constatações sobre a interferên- dos, apesar de fazer parte da Convenção, optou em 38REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA não ratificar o Protocolo, com o pretexto de que isto tribuições, que são comunicadas ao Secretariado da prejudicaria sua economia e desenvolvimento. Desse Convenção. modo, o Protocolo só entrou em vigor em 2005, com a ratificação da Rússia. (FURLAN, 2010, p. 51). Por fim, convém mencionar a Agenda 2030 da ONU, que inclui dezessete objetivos de desenvolvimento Durante a 21ª Conferência das Partes da Conven- sustentável (ODS) que devem ser cumpridos até 2030, ção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do dentre os quais cabe ressaltar o objetivo número tre- Clima (COP-21), que ocorreu em dezembro de 2015, ze (ODS 13), que busca “tomar medidas urgentes para na França, sobreveio um Acordo que substituiu o Pro- combater a mudança climática e seus impactos”, o que tocolo de Kyoto, sendo considerada uma das “Confe- reforça a importância deste tema emergente. (ONU, rências do Clima” mais importantes e influentes para o 2015). futuro do desenvolvimento dos países envolvidos e da governança global ambiental. Entrou em vigor no dia Destarte, de acordo com Gabriel Wedy (2018, p. 4 de novembro de 2016, a partir da ratificação de 55 152), “o ano de 2015 pode ser chamado do ano da pre- países que representassem, no mínimo, 55% das emis- ocupação mundial para com a sustentabilidade”, des- sões globais. (KÄSSMAYER; FRAXE NETO. 2016). tacando três documentos produzidos no aludido ano que revitalizaram o conceito de desenvolvimento sus- Segundo informações do Ministério do Meio Am- tentável, a saber: a Encíclica Laudato Sì (que defendeu biente (2019), o Acordo tem por objetivo principal for- a ecologia integral e o desenvolvimento sustentável), talecer a resposta global à ameaça da mudança do cli- os ODS da ONU e, por fim, o Acordo de Paris. ma e reforçar a capacidade dos países para lidar com os impactos decorrentes dessas mudanças. O compro- 3 LEGISLAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE MU- misso ocorre no sentido de manter o aumento da tem- DANÇAS CLIMÁTICAS NO BRASIL peratura média global “bem abaixo de 2°C” em relação aos níveis pré-industriais e de envidar esforços para No âmbito interno, a proteção ambiental ganhou limitar esse aumento da temperatura a 1,5° acima dos mais espaço e importância na Constituição Federal de níveis pré-industriais. 1988, sendo abordada sob enfoque mais protecionista e menos utilitarista, diferente do que previam as Cons- Em seu preâmbulo, o Acordo expressa que procura tituições anteriores. A constitucionalização do meio atingir o objetivo da Convenção do Clima e é guiado ambiente no Brasil proporcionou um verdadeiro salto pelo princípio de equidade e responsabilidades co- qualitativo em relação às normas de proteção ambien- muns, porém diferenciadas e respectivas capacidades, tal (THOMÉ, 2017). à luz das diferentes circunstâncias nacionais, e “reco- nhece a necessidade de uma resposta eficaz e pro- A atual Constituição consagrou, de forma nova e gressiva à ameaça urgente da mudança do clima com importante, a existência de um bem (meio ambiente) base no melhor conhecimento científico disponível”. que não possui características de bem público e, muito (ACORDO DE PARIS, 2015). menos, privado, voltado à realidade do século XXI, re- conhecendo características próprias para a tutela dos A fim de que pudesse ter seus compromissos efe- valores ambientais. (FIORILO, 2019). tivados, foi acordado que cada país estabelecesse sua própria meta de mitigação, levando em consideração o Quanto à competência material (ou administrativa) que cada governo considerasse viável a partir do cená- em matéria ambiental, a CF/88 tratou da competência rio social e econômico local. Essa meta específica são material comum repartida entre os entes da federação as chamadas Pretendidas Contribuições Nacionalmen- para o cumprimento de tarefas em forma de coopera- te Determinadas (iNDC, na sigla em inglês). (MINISTÉ- ção, por entender que a proteção dos recursos naturais RIO DO MEIO AMBIENTE, 2019). será mais eficiente se todos os entes federados estive- rem envolvidos e atuarem de forma integrada (THOMÉ, Seu objetivo principal é atingir um pico de emissões 2017, p. 142). Dentre as competências comuns a todos globais para, posteriormente, alcançar um equilíbrio os entes federativos, é importante ressaltar duas: “pro- entre as emissões antrópicas e as remoções por su- teger o meio ambiente e combater a poluição em qual- midouros de GEE, na segunda metade deste século. É quer de suas formas” e “preservar as florestas, a fauna através das iNDCs que o Acordo de Paris se diferencia, e a flora”. principalmente, do Protocolo de Kyoto, tendo em vista que este quantificava limitações de emissões somente A Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA, ins- aos países desenvolvidos. No Acordo de Paris, as pró- tituída pela Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, afigu- prias partes que o ratificaram estabelecem suas con- ra-se como uma norma geral sobre proteção ambien- 39REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA tal, estabelecendo princípios, objetivos e instrumentos ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), e disponibiliza para a implementação da preservação dos recursos recursos nas modalidades reembolsáveis, administra- naturais no País, além de instituir o Sistema Nacional do pelo BNDS e não-reembolsáveis, administrado pelo do Meio Ambiente – SISNAMA (THOMÉ, 2017, p. 187). MMA. Em 2018, o Fundo Clima recebeu cerca de R$ Em relação às metas de redução de GEE, estabelece 391 milhões com vistas a atender pessoas físicas e mi- um instrumento de licenciamento e revisão de ativida- croempresas interessadas em instalar energias reno- des efetiva ou potencialmente poluidoras e o Cadastro váveis em suas propriedades. (MMA, 2018). Técnico Federal de Atividades e Instrumento de Defesa Ambiental. (PNMA, 1981). Na esfera estadual, a Política Estadual sobre Mu- danças Climáticas foi instituída no Amazonas (Lei nº A PNMA tem como objetivo principal a preservação, 3.135/2007), Tocantins (Lei nº 1.917/2008), Para- melhoria e recuperação da qualidade ambiental propí- ná (Lei nº 16.019/2008), Goiás (Lei nº 16.497/2009), cia à vida. Dentre os princípios que a regem, destaca- Santa Catarina (Lei nº 14.829/2009), São Paulo (Lei -se o controle e zoneamento das atividades potencial nº 13.798/2009), Rio de Janeiro (Lei nº 5.690/2010), ou efetivamente poluidoras, com vistas a assegurar o Pernambuco (Lei nº 14.090/2010), Espírito San- equilíbrio ecológico e a regulação do clima através da to (Lei nº 9.531/2010), Rio Grande do Sul (Lei nº ação governamental. (PNMA, 1981). 13.594/2010), Bahia (Lei nº 12.050/2011), Paraíba (Lei nº 9.336/2011), Piauí (Lei n. 6.140/2011), Distrito Fe- Outra política introduzida no ordenamento jurídico deral (Lei nº 4.797/2012), Mato Grosso do Sul (Lei nº brasileiro é a Política Nacional sobre Mudança do Cli- 4.555/2014) Acre (Lei nº 2.308/2010 e Lei Comple- ma - PNMC, instituída pela Lei nº 12.187/2009, a qual mentar nº 300/2015). (MMA, 2019). busca garantir que o desenvolvimento econômico e social contribuam para a proteção do sistema climáti- No Estado de Goiás, a Lei nº 16.497/2009, que ins- co global. Essa Política oficializa o compromisso volun- tituiu a PEMC, foi aprovada pela Assembleia Legisla- tário do Brasil junto à Convenção-Quadro das Nações tiva de Goiás, e busca incentivar: linhas de crédito e Unidas sobre Mudança do Clima, no sentido de reduzir financiamento para implementação de processos in- dos GEE entre 36,1% e 38,9%, a partir das emissões dustriais que contribuam, efetivamente, para a redu- projetadas até 2010. (MMA, 2019). ção ou supressão de GEE que influam na alteração do clima; linhas de crédito para alterações arquitetônicas No texto da lei são definidos os conceitos de adap- e construção de edificações sustentáveis; indicadores tação, dos efeitos adversos da mudança do clima, de de sustentabilidade; recuperação de matas ciliares; o emissões, de fonte, de gases de efeito estufa, do im- desenvolvimento de linhas de pesquisa por agências pacto, da mitigação, da mudança do clima, de sumi- de fomento; dentre outros instrumentos. (ESTADO DE douro e da vulnerabilidade. A PNMC e suas ações são GOIÁS, 2009). executadas sob a responsabilidade dos entes políticos e dos órgãos da administração pública, em que são ob- Os objetivos previstos na PEMC do Estado de Goi- servados os princípios da precaução, da prevenção, da ás condizem com a Política Nacional sobre Mudanças participação cidadã, do desenvolvimento sustentável Climáticas. Visam incentivar o uso de tecnologias al- e o das responsabilidades comuns, porém diferencia- ternativas não poluentes, conscientizar a sociedade das. (PNMC, 2009). sobre a necessidade de preservação, conservação e recuperação dos recursos ambientais, estimular prá- Em seu art. 4º, a PNMC enumera um rol de metas ticas empresariais que visem à redução ou sequestro e, dentre elas, é prevista a compatibilização do desen- dos GEE, promover a pesquisa e a disseminação do volvimento econômico-social com a proteção do sis- conhecimento sobre as mudanças climáticas, dentre tema climático, a redução das emissões antrópicas de outros objetivos. (ESTADO DE GOIÁS, 2009). gases de efeito estufa em relação às suas diferentes fontes e a implementação de medidas para promover 4 MECANISMOS DE EXECUÇÃO DOS COMPROMISSOS a adaptação à mudança do clima pelas 3 (três) esferas ASSUMIDOS PELA NDC DO BRASIL da Federação, com a participação e a colaboração dos agentes econômicos e sociais interessados ou benefi- A pretendida Contribuição Nacionalmente Deter- ciários. (PNMC, 2009). minada (iNDC) do Brasil, foi apresentada ao Secreta- riado da Convenção-Quadro das Nações Unidas so- Um de seus instrumentos é o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, ou Fundo Clima, que é vinculado A saber: Penitenciária de Segurança Média, Casa de Prisão Provisória- CPP e Casa de Albergado. 40REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA bre Mudança do Clima (UNFCCC) em 27 de setembro Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC), de 2015, a qual foi adotada na COP-21 (ITAMARATY, inclusive por meio da restauração adicional de 15 mi- 2015). Com o depósito do instrumento de ratificação lhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 do acordo pelo país, em setembro de 2016, a NDC do e incremento de 5 milhões de hectares de sistemas de Brasil deixou de ser “pretendida”, entrando em vigor integração lavoura-pecuária-florestas até o respectivo em 4 de novembro de 2016. (MMA, 2017). ano. (NDC, 2015). Trata-se de um instrumento universal, juridicamen- Para o setor industrial, buscar-se-á “promover no- te vinculante, em respeito ao princípio das responsa- vos padrões de tecnologias limpas e ampliar medidas bilidades comuns, porém diferenciadas e respectivas de eficiência energética e de infraestrutura de baixo capacidades, com propósito de alcançar o último obje- carbono”, e no setor de transportes, “promover medi- tivo da Convenção, nos termos da decisão 1/CP.20, pa- das de eficiência, melhorias na infraestrutura de trans- rágrafo 9, e com “pleno respeito aos direitos humanos, portes e no transporte público em áreas urbanas”. em particular os direitos das comunidades vulneráveis, (NDC, 2015). das populações indígenas, das comunidades tradicio- nais e dos trabalhadores nos setores afetados e pro- Além das medidas de mitigação, são previstas ain- movendo medidas sensíveis a gênero”. (NDC, 2015). da, ações em adaptação e meios de implementação. Instituído em 10 de maio de 2016, por meio da Porta- A Contribuição Nacionalmente Determinada Bra- ria nº 150: “O Plano Nacional de Adaptação fornecerá sileira para consecução do objetivo da Convenção- as bases para que o Brasil reforce sua capacidade de -Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima adaptação, de avaliação de riscos climáticos e de ges- expressa que “o Brasil pretende comprometer-se a re- tão de vulnerabilidades nos níveis nacional, estadual e duzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% municipal.” (NDC, 2015). abaixo dos níveis de 2005, em 2025”. E subsequente- mente, a “reduzir as emissões de gases de efeito estu- Ressalta-se que só recentemente a questão da fa em 43% abaixo dos níveis de 2005, em 2030”. (NDC, adaptação às alterações climáticas foi considerada 2015). uma preocupação pelo governo federal, pois o foco maior era dado apenas em ações de mitigação e de A NDC impõe medidas de mitigação aos setores combate ao desmatamento. Embora o Brasil tenha de energia, florestas e mudança do uso da terra, agri- uma certa estrutura em relação ao combate às mu- cultura, indústria e transportes (KÄSSMAYER; FRAXE danças climáticas, ela tem claras deficiências quando NETO, 2016). Para o setor de energia, as metas in- procura promover uma justiça climática a toda a socie- cluem, em síntese, “aumentar a participação de bioe- dade. (SILVA; RAMOS, 2017). nergia sustentável na matriz energética brasileira em aproximadamente 18% até 2030, expandindo o con- As políticas firmadas para se alcançar a NDC serão sumo de biocombustíveis (...)” e “alcançar uma parti- implementadas sem prejuízo de utilizar o mecanismo cipação estimada de 45% de energias renováveis na financeiro da Convenção do Clima, bem como de uti- composição da matriz energética em 2030”, incluindo lizar outras modalidades de cooperação e apoio inter- medidas específicas. (NDC, 2015). nacional. Reforça-se que a NDC do Brasil não é condi- cionada a apoio internacional, mas que esta é aberta No setor florestal e de mudança do uso da terra, as ao apoio de países desenvolvidos no propósito de ge- metas são um pouco mais audaciosas. A NDC visa re- rar benefícios globais. E quanto à questão da preserva- forçar o cumprimento do Código Florestal, em todas as ção florestal, prevê que a implementação de atividades esferas da Federação, e “fortalecer políticas e medidas de REDD+3 e a permanência de resultados obtidos re- com vistas a alcançar na Amazônia Brasileira, o des- querem a provisão contínua de pagamentos por resul- matamento ilegal zero até 2030 e a compensação das tados de forma adequada. (NDC, 2015). emissões de gases de efeito estufa provenientes da su- pressão legal da vegetação até 2030”. Prevê ainda, o Rei, Gonçalves e Souza (2017) tiveram uma percep- reflorestamento de 12 milhões de hectares de florestas ção distinta em relação à NDC do Brasil, que apesar até o mesmo ano. (NDC, 2015). de ambiciosa, apresenta-se com propostas genéricas, não mostrando ações concretas para atingir as metas A principal estratégia para o desenvolvimento sus- de redução de GEE. O Brasil estaria perdendo seu papel tentável na agricultura é de fortalecimentodo Plano de de protagonismo quanto ao combate ao clima, ficando 3Mecanismo de incentivo desenvolvido no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados não apenas no combate ao desmatamento e à degradação ambiental, mas também na promoção do aumento de cobertura florestal. (THOMÉ, 2017, p. 803). 41REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA à margem das grandes decisões e articulações, em vir- veis têm uma imensa capacidade de reter e armazenar tude da perda da prioridade da agenda ambiental que carbono, mas o desmatamento para o uso agrícola ou se iniciou com o Governo Dilma Rousseff (2011 – 2016), extração de madeira libera GEE e desestabiliza o clima. e que cresce no governo Bolsonaro (atual). Em condições naturais, as plantas retiram CO2 da Desde o início do atual mandato presidencial, inú- atmosfera e o absorvem para fazer a fotossíntese. Sem meras medidas vêm sendo adotadas com o intuito de as florestas tropicais úmidas e todas as suas plantas esvaziar e negligenciar questões relacionadas ao clima fazendo fotossíntese durante o dia todo, o efeito estufa e à proteção de florestas no Brasil, a exemplo da alte- provavelmente seria mais pronunciado, o que agrava- ração de competências do Ministério da Agricultura, ria ainda mais as alterações climáticas. Quando as flo- Pecuária e Abastecimento, que passou a concentrar restas são queimadas, a matéria de carbono da árvore competências anteriormente atribuídas ao Ministério é liberada no ar na forma de CO2, poluindo ainda mais do Meio Ambiente4. a atmosfera. (WWF, 2019). Registra-se, para os fins da presente pesquisa, a ex- Na Lei nº 3.135/2007 que institui a Política Estadual tinção, no Ministério do Meio Ambiente, do departa- sobre Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental mento responsável pela condução das políticas de pre- e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas, reco- venção e controle dos desmatamentos na Amazônia e nhece-se a “importância da conservação das florestas demais biomas5, bem como da secretaria responsável ante as atividades antrópicas que provocam os efeitos pela coordenação das políticas de clima no Brasil. nocivos de mudança global do clima (...)”, levando-se em consideração a cooperação nacional e internacio- Adicionalmente, os órgãos federais incumbidos da nal para alcançar os objetivos de estabilização da con- fiscalização ambiental perderam verbas e funcioná- centração de GEE na atmosfera, no âmbito da Conven- rios, sendo certo que muitos cargos de chefia no IBA- ção do Clima. (ESTADO DO AMAZONAS, 2017). MA e no ICMBio estão vagos, o que facilita a atuação de grileiros e a prática de desmatamento, além de ou- Outra questão relevante a se mencionar é o regime tros crimes ambientais na Amazônia, na Mata Atlântica de chuvas, considerando que a área da Floresta Ama- e no Cerrado. zônica, ao contrário de ser improdutiva, produz imen- sas quantidades de água para o restante do país. Os 5 IMPORTÂNCIA DA CONSERVAÇÃO DAS FLORESTAS chamados “rios voadores”, formados por massas de ar ANTE OS EFEITOS NOCIVOS DA MUDANÇA CLIMÁTI- carregadas de vapor de água geradas pela evapotrans- CA piração na Amazônia, levam umidade da Bacia Ama- zônica para o Centro-oeste, Sudeste e Sul do Brasil. É notável a importância que a preservação da Flo- Assim, preservar a Amazônia é essencial para o agro- resta Amazônica tem no cumprimento da NDC do negócio, para a produção de alimentos e para gerar Brasil, tendo em vista que em seu próprio texto é re- energia no Brasil. (G1, 2017). conhecida como meta o fortalecimento de políticas e medidas com “vistas a alcançar na Amazônia Brasi- A NDC do Brasil também é conduzida por leis que leira, o desmatamento ilegal zero até 2030 e a com- tratam do âmbito florestal, como a Lei de Proteção das pensação das emissões de gases de efeito estufa pro- Florestas Nativas (Lei 12.651/2012, o chamado Código venientes da supressão legal da vegetação até 2030”. Florestal), da Lei do Sistema Nacional de Unidades de (NDC, 2015). Conservação (Lei 9.985/2000) e da legislação, instru- mentos e processos de planejamento a elas relacio- Em matéria do G1 (2017) explica-se que a Amazônia nados. A NDC busca incrementar, também, a sua ca- e as florestas tropicais, que armazenam de 90 bilhões pacidade nacional em conservação e uso sustentável a 140 bilhões de toneladas métricas de carbono, aju- da biodiversidade, pelo Plano Estratégico Nacional de dam a estabilizar o clima no mundo todo. Só a Flores- Áreas Protegidas e da regularização ambiental pelo ta Amazônica representa 10% de toda a biomassa do Código Florestal, em particular das Áreas de Preserva- planeta. ção Permanente. (NDC, 2015). As florestas que foram degradadas são as maio- É notável a magnitude que a Floresta Amazônica res fontes de emissões de GEE depois da queima de tem para o meio ambiente como um todo, pelo seu re- combustíveis fósseis. Isso porque as florestas saudá- conhecimento como Patrimônio Nacional pela Consti- 4Vide Decreto Federal 9.672, de 2 de janeiro de 2019. 5Em virtude de pressões internacionais, foi editado, em fevereiro deste ano, o Decreto Federal 10.239/2020, que transferiu o Conselho Nacional da Ama- zônia Legal para a Vice-Presidência da República. (BRASIL, 2020) 42REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA tuição Federal Brasileira de 1988, sendo tratado como Noruega e Alemanha, em que se admitiu a possibili- um bem de interesse difuso cuja preservação é inte- dade de extinção do Fundo. O impasse se deu após o resse de toda coletividade, de forma indistinta, enfa- Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciar tizando sua importância ambiental através de uma que o governo quer passar a usar o dinheiro do fun- proteção genérica. Como patrimônio nacional, signifi- do para indenizar proprietários rurais em unidades de ca dizer que sua utilização far-se-á na forma da lei e conservação, entretanto, a Noruega e a Alemanha não dentro de condições que assegurem a preservação dos se mostraram favoráveis a essa decisão. (G1, 2019). seus atributos biológicos. (THOMÉ, 2017, p. 152-153). Além dessa instabilidade no Fundo Amazônia, ou- Melissa Furlan nota que “a metade das metas de tra polêmica se dá quanto ao aumento do número de redução pode ser atingida evitando-se a devastação queimadas. Segundo dados recentes, é da ordem de florestal. O IPCC observa, ainda, que a proteção às flo- 34% o aumento médio de focos de queimadas desde restas pode trazer outros benefícios, como empregos, 2016. Todos estes fatores trazem insegurança à socie- aumento de renda, conservação da biodiversidade e dade como um todo, quando se coloca em questão o de mananciais”. (FURLAN, 2010, p. 27). cumprimento das metas previstas na NDC do Brasil, principalmente em relação ao setor de florestas. (G1, Entretanto, apesar do reconhecimento que pos- 2019). suem perante a legislação brasileira, é notável o au- mento contínuo do desmatamento florestal, princi- 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS palmente da Floresta Amazônica. Segundo matéria do G1 (2019), “a Amazônia Legal teve aumento de 26% O Acordo de Paris, que procura atingir o objetivo do índice de desmatamento no mês de maio de 2019, da Convenção Quadro do Clima, inovou no sentido em relação ao mesmo período do ano anterior, segun- de estabelecer metas de mitigação a todos os países do dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da que se comprometeram a ratificá-lo, e não apenas Amazônia (Imazon)”. Registrou ainda, que um terço aos países desenvolvidos, como previa o Protocolo do desmatamento ocorreu em Unidades de Conserva- de Kyoto. É regido pelo princípio das responsabilida- ção. des comuns, porém diferenciadas e respectivas ca- pacidades, à luz das diferentes circunstâncias nacio- Vincula-se ao combate ao desmatamento da Flo- nais, de onde advém a Contribuição Nacionalmente resta Amazônica o Fundo Amazônia, que visa captar Determinada do Brasil. doações para investimentos não reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao No âmbito interno, a Política Nacional do Meio desmatamento, e de promoção da conservação e do Ambiente, instituída pela Lei 6.938/1981 se confi- uso sustentável da Amazônia Legal. Possui um total de gura como uma norma geral de proteção ambiental 103 projetos apoiados, R$ 1.860 bilhões de valores ar- que permitiu avanços na proteção do meio ambien- recadados para apoio do Fundo e R$ 1.860 bilhões de te, mas foi após a Constituição Federal de 1988 que valores desembolsados. Apoia, também, o desenvol- essa proteção ganhou mais espaço e importância, vimento de sistemas de monitoramento e controle do tendo sido instituída, posteriormente, a Política Na- desmatamento no restante do Brasil e em outros paí- cional sobre Mudança do Clima, que reverberou na ses tropicais. É regulado pelo Decreto nº 6.527/2008, introdução de políticas do clima na maioria dos esta- e instituído pelo Governo Federal, Ministério do Meio dos brasileiros, inclusive no Estado de Goiás. Ambiente, Ministério da Economia e gerido pelo Banco BNDES. (FUNDO AMAZÔNIA, 2019). Com a entrada em vigor do Acordo de Paris no Brasil, foi necessária a implementação de mecanis- Desses valores arrecadados, quase 60% são desti- mos de execução dos compromissos assumidos pela nados a instituições do governo, sendo os outros 40% NDC do Brasil, com vistas a cumprir com o seu maior divididos para instituições do terceiro setor, universi- objetivo, o de redução das emissões de gases de dades e cooperação internacional. O Fundo já captou efeito estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005, até mais de R$ 3 bilhões junto aos doadores (principal- 2025, e redução de 43% abaixo dos níveis de 2005, mente Noruega e Alemanha), mas parte desse mon- até 2030. Esses mecanismos serão implementados tante ainda não recebeu uma destinação específica. sem prejuízo de utilização do mecanismo financeiro (G1, 2019). da Convenção do Clima, bem como de outras moda- lidades de cooperação e apoio internacional. Entretanto, recentemente instaurou-se uma insta- bilidade na continuidade do Fundo Amazônia por falta Na busca pela redução na emissão de GEE e es- de acordo entre o Governo Brasileiro e os Governos da 43REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA tabilização do clima no mundo todo, nota-se que as contro aos compromissos assumidos para redução florestas desempenham um papel importante neste de emissão de gases de efeito estufa, seja por meio processo, o que acaba por atrair atenção à maior flo- de medidas estruturais de extinção de órgãos fede- resta tropical do mundo, a Floresta Amazônica, que rais responsáveis por questões atinentes ao clima e tem sido alvo de polêmicas recentes com o aumen- à Amazônia e deslocamento de competências do Mi- to desenfreado das queimadas e do desmatamento, nistério do Meio Ambiente para o Ministério da Agri- trazendo insegurança quando se coloca em questão cultura, Pecuária e Abastecimento; seja em razão do o cumprimento das metas previstas na NDC do Bra- desmantelamento de órgãos responsáveis pela fis- sil. calização ambiental, com a redução sistemática de verbas destinadas a eles e a demissão de ocupantes Nesse passo, muito embora seja perceptível um de cargos de direção. avanço na preocupação com a redução da emissão de GEE a partir dos últimos 30 (trinta) anos, a partir Nessa conjuntura, é fundamental que a sociedade da adoção de normas e de políticas públicas com vis- exerça seu papel na proteção do meio ambiente e, tas a amenizar o aquecimento global, é fundamental especialmente, na fiscalização das medidas adota- que haja constância e esforço coletivo na aplicação das pelo Governo, exigindo que as políticas públicas e cumprimento dessas políticas globais, nacionais e sejam alinhadas ao disposto na Constituição Federal locais em defesa do clima. de 1988 e aos compromissos assumidos por meio do Acordo de Paris. Lamentavelmente, observa-se ao longo dos úl- timos anos no Brasil uma tendência que vai de en- REFERÊNCIAS ACORDO DE PARIS. 12 de dezembro de 2015. Disponível em:<https://nacoesunidas.org/wp-content/uplo- ads/2016/04/Acordo-de-Paris.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2019. AMARAL JÚNIOR, A. D.; Comércio Internacional e a Proteção do Meio Ambiente. Edição. São Paulo: Atlas, 2011. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Ed. Senado, 1988. BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Portaria n. 150, de 10 de maio de 2016. [Institui o Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima e dá outras providências]. Diário Oficial [da] República Federativa do Bra- sil, Brasília, DF, 11 de maio de 2016. Não paginado. Disponível em:<https://www.mma.gov.br/images/arqui- vo/80182/Portaria%20PNA%20_150_10052016.pdf>. Acesso em: 26 agosto 2019. BRASIL. Presidência da República. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 31 ago. 1981. Não paginado. Disponível em: <http://www.pla- nalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6938compilada.htm> Acesso em: 18 jul. 2019. BRASIL. Presidência da República. Lei n. 12.187, de 29 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC e da outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Bra- sil, Brasília, DF, 29 dez. 1981. Não paginado. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007- 2010/2009/lei/l12187.htm> Acesso em: 18 jul. 2019. BRASIL. Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada (Indc) Para Consecução do Objetivo da Con- venção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/ images/ed_desenvsust/BRASIL-iNDC-portugues.pdf>. Acesso em: 5 abril 2019. BRASIL. Decreto Federal nº 10.239, de 11 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre o Conselho Nacional da Ama- 44REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
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ANÁLISE INTRÍNSECA E EXTRÍNSECA DO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0034576-58.2016.8.19.000. REFLEXOS PROCESSUAL E EMPRESARIAL ANALYSIS INTRINSIC AND EXTRINSIC THE INSTRUMENT Nº 0034576- 58.2016.8.19.000 TORT. REFLECTIONS AND BUSINESS PROCESS Rildo Mourão Ferreira 1 Eumar Evangelista de Menezes Júnior 2 RESUMO ABSTRACT Servido de método de abordagem indutivo e de pro- Served inductive method of approach and bibliogra- cedimento bibliográfico, experimental e observacio- phic, experimental and observational procedure, and nal, sendo marco a tese ético-prático observacional de in March the ethical and practical observational the- Rudolf Ihering, o artigo em questão, apresenta a co- sis Rudolf Ihering, the article in question, presents the munidade científica análise intrínseca e extrínseca do scientific intrinsic and extrinsic analysis community agravo de instrumento nº 0034576-58.2016.8.19.000. interlocutory appeal No. 0034576-58.2016.8.19 .000. O recurso proposto contra decisão interlocutória pro- The appeal filed against the interlocutory decision ferida em ação de recuperação judicial, com trâmite na rendered in action for judicial recovery, with progress 7ª Vara Empresarial foi admissível e deferido parcial- in the 7th Corporate Court was admissible and partly mente pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Ja- granted by the State Court of Rio de Janeiro that hit neiro que atingiu positivismo apenas a tutela provisó- positivism only interim protection created amid fea- ria criado em meio a recurso. Descrevendo trechos do ture. Describing the report stretches exhausted by the relatório exaurido pelo Egrégio Tribunal o estudo pre- Honorable Court the required study and achieved, des- tendido e alcançado, descreve e atinge explicação de cribes and reaches explanation of some of the intrinsic alguns dos vetores intrínsecos e extrínsecos, ou seja, and extrinsic vectors, ie reaches a part of substantive atinge parte de marcos materiais e processuais em and procedural milestones in its various forms, thus suas diversas formas, moldando assim um comentário casting a procedural review and business about trial processual e empresarial acerca do julgamento envol- involving public law matters, Civil procedure and Busi- vendo matérias de Direito Público, Processo Civil e Em- ness and Corporate Law. presarial e Direito Empresarial. KEY WORDS: Interlocutory Appeal. partially granted. PALAVRAS-CHAVE: Agravo de Instrumento. Provi- Criteria. interlocutory decision reflexes. Company pre- mento parcial. Critérios. Reflexos de decisão interlocu- servation. tória. Preservação da empresa. 1Doutor em Ciências Sociais (PUC-SP). Pós Doutor (UNB). Mestrado em Direito das Relações Econômico Empresariais pela Universidade de Franca. Conselheiro - Ordem dos Advogados do Brasil - Seção de Goiás, membro da comissão de educação jurídica - Ordem dos Advogados do Brasil - Seção de Goiás - Diretor Adjunto da Escola Superior da Advocacia ESA-GO. Professor titular da Universidade de Rio Verde Professor da Universidade de Rio Verde – UniRV. Professor do Centro Universitário de Anápolis – UniEVANGÉLICA. Advogado. E-mail: [email protected] 2Doutorando em Ciências Humanas, Sociais e Aplicadas: Ciências da Religião pela PUC-GO – Bolsista FAPEG. Mestre em Sociedade, Tecnologia e Meio Ambiente (UniEVANGÉLICA). Conselheiro da Cátedra Cristovan Buarque. Especialista em Advocacia Empresarial (PUCMinas). Especialista em Direito Notarial e Registral (UNISUL). Professor do Curso de Direito do Centro Universitário de Anápolis – UniEVANGÉLICA. Professor da Escola Superior da Ad- vocacia ESA-GO. Membro da Comissão de Direito Empresarial OAB-GO. Advogado. E-mail: [email protected] 48REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA 1 INTRODUÇÃO cedimento bibliográfico, e já em segundo momento de procedimentos experimental e observacional, sendo Explorando o teor do Agravo de Instrumento nº marco a utilização da tese ético-prático observacional 0034576-58.2016.8.19.0003, recurso proposto contra de Rudolf Ihering (2002), que fez nascer e prevalecer decisão interlocutória proferida em ação de recupera- a luta pelo direito a partir do século XIX que torna-se ção judicial, com trâmite na 7ª Vara Empresarial, esse presente nos dias atuais, uma vez que, a efetividade admissível e deferido parcialmente pelo Tribunal de das normas é princípio basilar da ciência do dever ser, Justiça do Estado do Rio de Janeiro, é estruturado des- isso em discurso retórico de convencimento quando crição e explicação material e processual de trechos do da aplicação das bases da axiologia jurídica retirada do relato decisório, sendo esses o objeto de pesquisa do positivismo jurídico retórico e atual, certo de recordar presente estudo. de Hans Kelsen e de Norberto Bobbio. De forma cristalina, por objetivos o estudo almeja 2 SÍNTESE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO, OBJETO e conquista análise intrínseca e extrínseca do agravo DE EXPLORAÇÃO de instrumento em questão, mais especificadamente atinge os reflexos processual e empresarial produzidos Serve ao estudo, de objeto de exploração o teor da posto protocolo de exordial que pretendeu concessão decisão do Agravo de Instrumento de nº 0034576- de recuperação e atingiu êxito e, logo foi atacada por 58.2016.8.19.000, recurso proposto contra decisão in- agravo, esse julgado parcialmente positivo, sendo con- terlocutória proferida em ação de recuperação judicial, cedido efeito suspensivo a providencias que poderiam com trâmite na 7ª Vara Empresarial, esse admissível e ser tomadas que envolvem ações ligadas diretamente deferido parcialmente pelo Egrégio Tribunal de Justiça ao risco de lapidação do patrimônio das Sociedades do Estado do Rio de Janeiro. Anônimas do grupo econômico, dito por recuperan- das. O agravo foi proposto pelas Sociedades Anônimas OI S.A; TELEMAR NORTE LESTE S.A.; OI MÓVEL S.A. [...] Partindo e mantendo o estudo sob esteira comer- COPART 4 PARTICIPAÇÕES S.A.; PORTUGAL TELECOM cialista, o estudo apresenta vetores de exploração INTERNACIONAL FINANCE B.B.; OI BRASIL HOLDINGS diversos, sendo abordado o sujeito do agravo, sua COÖPERATIEF U.A, que formam entre si conglomerado espécie, o rito, o processamento traçado no trâmite econômico denominado GRUPO OI4. processual, a aplicação subsidiária do Novo Código de Processo Civil, o pedido de manutenção do efeito sus- A matéria em discussão no agravo provém da de- pensivo, sendo objeto de tutela provisória de urgência cisão positiva do pedido traçado na exordial que con- dentre outros. cede a recuperação judicial ao grupo, sendo o pedido principal a suspensão de ações a proteção do patri- Em suma, o leitor inserido no universo proposto, mônio e, pedido acessória de urgência concessão de será capaz de compreender todo o arcabouço jurídi- tutela, essa em medida liminar, para que processual- co que abrange o estudo do Direito Empresarial e de mente seja suspenso os efeitos já ocorridos e os que seus subprojetos como no caso do Direito Falimentar e ocorrerão das ações cambiais em curso, como também Recuperacional, o que muito contribuirá e fortalecerá as ações que possam lapidar o patrimônio das socieda- aprendizado multidisciplinar, partindo do inteiro teor des envolvidas. da decisão do agravo, que faz valer uma reflexão jurí- dica quanto a atividade decisória, sua amplitude e seu O discurso referente a matéria elencada e funda- desfeche, se positivo ou negativo, coerente ou contrá- mentada no pedido de tutela de urgência foi deferido rio à matéria empresarial protecionista do protagonis- pelo juízo ad quem. O juiz de Direito da 7ª Vara Empre- ta da matéria, seja ele o empresário regular, uma vez sarial do Rio de Janeiro foi determinado que à manten- que, já há proteção constitucional indiscutível que ga- ça da suspensão de todas as ações cambiais e as que rante a ele a preservação da sua empresa mercantil. pudessem lapidar o patrimônio. O estudo científico e seus resultados foram possí- Em análise ao mérito, o recurso é pautado de dis- veis graças a pesquisa aplicada, exploratória, descritiva curso de convencimento quanto a não observância e explicativa, sendo pautado de dois eixos. No primeiro dos artigos 49 da Lei 11101 de 2005 e do artigo 914 do momento traçado por abordagem indutiva e de pro- Novo Código de Processo Civil, uma vez que, o juízo de 3 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Oitava Câmara Cível. Agravo de Instrumento n° 0034576-58.2016.8.19.0000. Relator: Des. Cezar Augusto Rodrigues Costa. Rio de Janeiro/RJ, Data do Julgamento 12/07/2016. 4BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Oitava Câmara Cível. Agravo de Instrumento n° 0034576-58.2016.8.19.0000. Relator: Des. Cezar Augusto Rodrigues Costa. Rio de Janeiro/RJ, Data do Julgamento 12/07/2016. 49REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
REVISTA JURÍDICA primeiro entendeu em decisão interlocutória que con- mento da recuperação. cede a recuperação, que nem todos os créditos exis- Se de fato, pensadores ou estudiosos até mesmo tentes na data do pedido não estão sujeitos à ela, sen- do excluídos aqueles nos quais já houve levantamento possam pensar na aplicabilidade da tutela provisória, de valores e que já sofrem rito específico. não desmerecendo e retirando privilégios de juristas, pois a tutela cabe em processos específicos quando se No que pese a objetividade da legislação brasileira, abre brecha para antecipação de efeitos de uma sen- destacando a matéria elencada pela Lei 11101 de 2005 tença. e subsidiariamente a Lei 13105 de 2015, vale ressaltar para que não fiquem dúvidas ao leitor, que quando do O leitor deve ter atenção quando é abordado o ins- protocolo do pedido de recuperação judicial não há de tituto da tutela provisória no relatório da decisão, e se falar em tutela de urgência e de evidência. como foi destacado acima essa tutela não diz respeito a pedido formulado na petição inicial, e em tratamen- O procedimento é especial não havendo aplica- to, por ser procedimento especial, quando é destacado ção do processo de conhecimento pelo rito ordinário o instituto, esse é utilizado para atribuir efeito suspen- ou por qualquer outro. Em sendo especial define que sivo ao recurso de agravo de instrumento, à pretensão quando do protocolo o juiz de direito, competente, de recursal, buscado à segurança de haver comunicação vara especializada, após distribuição, cumprirá com o expressa e definitiva ao juiz de primeiro grau da deci- despacho inicial, sendo que, nesse momento pode até são para suspender o cumprimento de sua decisão, de surgir a necessidade e aplicabilidade do processo de fato o que acontecer no relato decisório do recurso em rito ordinário por analogia, pois a inicial pode neces- comento sitar de emenda ou pode ser declarada inepta, sendo que é alcançável. 3 AGRAVANTES: SOCIEDADES ANÔNIMAS, GRUPO DE FATO E SUAS ESPECIFICIDADES Quando se fala em rito especial quer dizer e con- firmar que o procedimento é específico à matéria em A audiência de custódia está registrada em dois seu tempo e espaço, formalizando um hábito para se doNo que abrange o estudo presente quanto aos agra- chegar a uma verdade que concluirá por deferir ou in- vantes e, suas especificidades faz necessário o estu- deferir o pedido pleiteado. do prévio das Sociedades Anônimas. Essas, são espé- cies de sociedade por ações, regulada por Lei especial Nessa esteira de conhecimento, destacando o pro- (Lei 6404 de 1976), sendo sociedades eminentemente cedimento especial da recuperação judicial, que tem mercantis, estatutárias por natureza, com capital so- alicerce legal a partir do artigo 47 da Lei 11101 de 2005, cial formado por ações, que dispõe ser os partícipes quando protocolado do pedido de recuperação judi- do quadro societário acionistas titulares de ações or- cial, o magistrado deve analisar as condições da ação, dinárias, preferências e de fruição, o que define sua observando o cumprimento dos caracteres formais lis- participação e sua responsabilidade limitada ao preço tados no artigo 51, este dispositivo normativo que es- de subscrição/inscrição seja no mercado de balcão, tabelece rol taxativo de requisitos a serem cumpridos. seja na bolsa de valores, que envolve por si e pelo meio mercadológico os mercados primário e secundário. Certo de um despacho, não havendo vícios ou im- perfeições na inicial o juiz de direito encaminhará os Em análise, as Sociedades Anônimas, não sen- autos para vista ministerial, sendo que se entendido do aqui discutido suas espécies, podem ser inseridas preenchimento de todos os quesitos legais e processu- como partícipes de grupos de fato e de direito, econô- ais o magistrado em decisão interlocutória concede ou micos, sendo mártires a conquista de manutenção de não a recuperação pretendida. exploração econômica em determinado setor merca- dológico. Retirando trechos do relatório da decisão, te- Aplicando subsidiariamente a Lei 13105 de 2015, a mos que foi mencionado na inicial para a confirmação decisão interlocutória poderá ser atacada por agravo do grupo de fato: de instrumento se concedido o pedido de recupera- ção e atacado por apelação caso não seja concedido o [...] OI S.A; TELEMAR NORTE LESTE S.A. [...] pedido. Nesse ponto que relembramos a necessidade OI MÓVEL S.A. [...] COPART 4 PARTICIPAÇÕES de ser fiel ao procedimento especial, criado para mo- S.A. [...] PORTUGAL TELECOM INTERNACIONAL mentos materiais e processuais ditos específicos, e em FINANCE B.B. [...] OI BRASIL HOLDINGS sendo, firmamos que não há em se dizer sobre tutela COÖPERATIEF U.A [...] que se inserem no provisória no processamento do pedido de recupera- conglomerado econômico denominado GRUPO ção judicial, pois o procedimento impõe efeitos e fatos especiais, o que traz tratamento intrínseco ao procedi- 50REVISTA JURÍDICA /Ano 08, Número 10, Dezembro/2020 Universidade de Rio Verde ISSN2177 - 1472
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