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ContoContigo

Published by Ana França, 2021-03-03 17:35:20

Description: Conto Contigo
Fotografia e Poesia de mãos dadas
Autores:
Fotografia: Henrique Santos
Texto: Ana França

Keywords: Fotografia, Poesia,Educação

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Fotografia e Poesia de mãos dadas O olhar do Henrique, o cantar da Ana conto contigo

aconchegos lugares

No alto da brancura Alentejo mora o sino. É um menino, dono dos sons. Dança e canta… Canta que dança… Dança e balança lá das alturas! A sua voz toa e ecoa, soa a lonjuras! Parede direita, branca caiada de sol alva de luz… E o sino, aquele menino de voz risonha, que me seduz.

Casa risonha. Amor Porta vermelha: uma centelha! É ninho escondido perdido além Tejo, que rima com beijo, um sinal de secreto desejo: amor vivido numa casinha de porta risonha…

Em dias que chove Chuva assim, sem parar, o meu dia fica de pernas para o ar! Em vez de acordar só quero dormir: a água do céu embala ao cair... Se a mãe me deixasse experimentar perdia a vergonha: saía à rua, mesmo ali à porta, o frasco do gel a toalha em punho e havia de ser um duche a preceito com águas das nuvens a cair assim mesmo para mim dos céus no meu peito!

Há uma lanterna pendurada lá no alto, Lanterna junto às telhas onde os gatos dormem tardes sem fim de sonhos ensolarados, nos telhados… A lanterna que espreita cá para baixo, que segue o pousar dos meus pés na rua, que me pisca o olho, que balança para mim o corpo de vidro, que se acende (como se pensasse), numa ideia luminosa a traçar a noite, já é uma amiga, porque a encontro todos os dias, desde que me lembre de olhar para cima… (às vezes esqueço-me!) Nesta mesma noite, em que caminho pela rua porque me sabe bem caminhar, ouvir o som dos meus passos e ver os desenhos de sombras mudas do meu corpo nas paredes brancas, há a lanterna que me faz companhia, ela eternamente pendurada lá no alto, onde os gatos se passeiam na noite, silenciosos, em passos de luar…

Uma alvura quieta Lugar em arco um arco caiado… De cal ou açúcar barrado? Um desenho em traço lavado. Um sossego moldado em tranquila mudez. Lugar de aconchego como segredo sussurrado uma vez… Brandura calma… Aqui sento os medos no chão e embalo à sombra o meu coração. Doçura caiada…

- Moinho, moinho, Moinho que fazes no altinho? -Estou quieto, sossegado, parado. Se viesse um vento... - Ou um ventinho? Assim, devagar, devagarinho, ganhavas movimento? - Com um ventinho punha-me ligeirinho e já moía um grãozinho!... Com um vento eu ganhava alento! Minhas velas em movimento já não seria lento: rodar, girar sem parar, nunca parar de girar! - E com um ventão? - Com um vento, ventão eu moía todo o grão! Com um vento, ventania eu moía, moía, moía...

Sentar em descanso manso Penumbra num lugar antigo. Penumbra. Ombro encostado à frieza da pedra. Sentir a muralha dura. Abrigo. O assento é seguro. Solta-se um suspiro perdido e desaparecem as rugas da conversa interior que pesava por dentro. Olhar na vidraça… O longe e o perto ficam ao alcance de um piscar… Olhar e repousar…

Ah! Se eu fosse ponte! Ponte Atravessaria rios… Voaria em vales… Tocaria montes… Mesmo como fazem as pontes! Ah! Se eu fosse ponte! Com um pé aqui e outro acolá deixava passar carros e comboios patins, bicicletas… Ligaria gentes de cá para lá, de lá para cá… Ah! Se eu fosse ponte! Que em mim corressem rumo ao horizonte!

Tenho (Re)canto um canto encantado em pleno sol. Lugar ensolarado em solar familiar. Recanto perfeito de lonjura… Encantamento de tudo olhar deste lugar: o céu e o ar, cheirar o dia seguir, pleno de altura, o voo da cotovia… Meu recanto para cantar. Meu esconderijo para estar. Soltar a voz escondida num canto assim sem ninguém saber de mim, só eu saber aonde vim…

Que bem que sabe vir para a rua! De dia o sol à noite a lua. Que bom que é Gosto de olhar Rua saltar as pedras a minha rua! ao pé coxinho, De dia o sol bater à porta à noite a lua. daquele vizinho! Sentar à porta Ai como eu gosto refastelada da minha rua! a mordiscar De dia o sol pãozinho quente à noite a lua. com marmelada! Lavar a rua O escuro chega à mangueirada à minha rua… com os amigos, De dia o sol largar a rir à noite a lua. à gargalhada!

Há amigos assim. Segredo Como uma casinha quieta, em ar de sossego… Singela brancura à beira da rua, à espera de alguém a quem dar aconchego. Casinha-amizade. Casinha-segredo. Casinha-verdade.

Grades – agarrar Varanda Varandim – inclinar Sacada – assomar Vidraça – espreitar Pedra de antigamente Vaso pendurado por gente Janela fechada Madeira cuidada Bordado em pano-cru Floreira dependurada Uma casa à varanda: - É abrir a janela a ver passar a banda!

aromas viços

Amigos são como estrelas. Amizade Amigos são como pão. Estrelas de pão, brancas de luz, brancas, no chão. Estrelas de luar, abraços sem par, presenças. Estão sempre lá, mesmo invisíveis, persistem no brilho, esperam por nós, persistem no amor, persistem, persistem em dar-nos calor. Amigos, estrelas de céu, amigos, estrelas de chão, amigos, estrelas de mar. Amigos-estrelas amam sem par. Ensinam o dar. Estão lá. Para conversar. Para apoiar. Para incomodar. Amigos-estrelas com quem brincar. Para quem olhar. Com quem repousar.

Frondosas copas Árvores Verdes alturas, fresco rumorejo Ramagem matizada de luz Catadupas de folhas e nervuras Entrelaçar de ramos e galhos… O corpo das árvores é assim. Encostar no tronco e ficar… Estalos e rangidos pela força dos ventos Balanços de ramaria Frescos rumores pelo toque de aragens suaves… A voz das árvores é assim. Olhar para o alto e ficar… Silêncios protetores Sombras esbatidas no chão Breves chilreios da passarada escondida Convite a uma sesta A presença das árvores é assim… Sentar, recostar e ficar…

Princesa branca… Branca-flor Borboleta-amor… Mistério, perfume de flor… Cetim florido. Segredo nascido em forma de flor… Bailarina num só pé. Suave, balança… Tranquila, dança… Brancura de seda… Planta-boneca… Gosto de tocar a tua pele de flor.

Amigo de campos em flor Campos em flor que rima com cor e dor e amor. Amigo de verdes sem fim de campos floridos de sol salpicados de sonho por dentro de mim. És vento a tocar cada flor em jeito de aragem, em pleno calor, que rima com cor e dor e amor. Inundados de luz embalados de sombra conversamos, mudos e dizemos tudo sem abrir a boca. O amigo e eu. Um passeio. Um sorriso. Um voo de ave que riscou o céu. Repouso, tranquila penumbra.

Palmeira, palmeira Dança da palmeira palminhas te dou: Palmas, palminhas, e vira, virou! Tenho uma palmeira na palma da mão: É a sombra dela que apanhei do chão. Deitada da terra olho para o ar… Lá está a palmeira sempre a balançar! Palmeira, palmeira tão descabelada: És uma menina de árvore disfarçada. Pareces vassoura a varrer o ar: Palmeira, palmeira eu vou-te abraçar!

Riso de flor Dourada em amarelo perfeito Cara dourada, risonha Cabelo de pétala num penteado inclinado, ajeitado em forma de sol. Menina vegetal quase que fala quase que olha quase que dança quase que chama quase que corre, mãos dadas comigo, e quase me ama…

Espreitar, num piscar? Espreitar Ou olhar, devagar sem pressas, sem ânsias de ver? Deixar acontecer? Ou ter fome de ser? Espreitar, brincar… Aprender a olhar.

A flor. Flor A cor. A cor da flor. Colorida - vida! Flor - amor. Colorida com amor Viva a flor! Viva a cor! Pode ser amarela Pode estar à janela Ser aroma de canela Pode nascer neste chão que é o meu coração.

As folhas Folhas são pegadas das árvores no chão? Ou são lágrimas do choro do vento nos ramos? Ou são pistas, secretos desejos que a árvore me deixou? Mensagem de silêncio para eu adivinhar… Ou não? As folhas serão para mim? As folhas serão para ti? As folhas serão do chão? Será que importa para onde irão?

Há um jardim dentro de mim. Jardim Será que sim? Será que sim? Faço um sorriso, assim e assim Nasce um jardim dentro de mim. Dou-te a mão, assim e assim Cresce um jardim dentro de mim. Corremos juntos, assim e assim Voa um jardim dentro de mim. Provo o teu pão, assim e assim Cheira a jardim dentro de mim. Ouço o que dizes, assim e assim Chove agora no meu jardim. Dou gargalhadas, assim e assim E o sol brilha no meu jardim. Há um jardim dentro de mim. Será que sim? Será que sim?

Laranjas… Laranjas Meninas redondas Brilhantes de cor. São lanternas, Balões de doçura pendurados, à espera. Seguro na bola de sumo da forma do sol. Abro a caixinha da casca. Sinto a lisura da pele. Separo uma polpa de gomos. Desvendar o aroma do espanto. Trincar um perfume de oásis. Beber este laranjal.

Malmequer, malmequer, Malmequer o que quer o malmequer? Mal me vê, mal me sente, o malmequer não mente: Dá-me a cor, dá-me o seu coração de flor! Mal o olho, mal o toco, mal o vejo no jardim, sou feliz porque sim, porque vi um malmequer a florir para mim.

Ali está um muro! Muro Verde Não. É uma parede. Não. É um verde. É… Uma certa subida de muro que voa. É… Um certo ar de tapete voador farfalhudo de verdura. É… Um desafio de escada verde para o céu. Porque está este tapete posto de pé? Oh! Infinita tontura de subir…

Se uma papoila dançasse para mim,Papoila seria tango. Movimento para além dos nomes, passos com o poder de quedas de água, abraço mais envolvente que pele, pés em desenho quente pelo chão fora. E o corpo dança, leve e sedutor, como o ar e o fogo rodando e atravessando a música, papoilas vermelhas de emoção e o tango, e os passos, o abraço em dança leve de chama. A labareda de dançar porque não se pode parar. Como papoilas no campo a voltear.

Rosinha amarela Rosa rosinha em botão gosto de tocar-te com a minha mão. O que te dizer? Como te chamar? És rosa, charmosa sedosa cheirosa mimosa… Olho a tua cor, minha preferida, e volto a dizer: florida tingida esculpida e plena de vida!

evasões olhares

Pele. Areal Areia. Areia na pele. A pele na areia. Areal. Calor. Sensação. Espalhar-se no chão. Sol na pele. Pele solar. Sonhar por dentro da pele. Despir o luar. Pele emudecida. Pele acordada. Um vale na pele. Resvalar na pele. Pele musgo. Pele sal. Pele tocar. Pele. Mar.

O senhor candeeiro, Candeeiro muito alto, altaneiro, lá está no meio da rua, mais propriamente no passeio. Se fosse animal seria girafa com cabeça de vidro, talvez de garrafa. Se fosse uma árvore seria cipreste, esguio, aprumado, rumorejando ao vento sueste. E se fosse pessoa? E se fosse gente? Seria um gigante com olhos luzentes, faria passeios de grandes passadas no meio da noite iluminando estradas.

Era uma onda. Chão Posta no chão. Era só uma? Não era, não! Lá estava ela com outras ondas para pisar, escorregar correr e chapinhar… Até ao fundo, até lá longe, lanço o olhar naquele salão. Chão ondulado Chão penteado… Ondas, ondinhas Pedras, pedrinhas… Agora sou um patim: Vou-me lançar dar tudo de mim e deslizar, sem me molhar nesta maré de ondas sem fim!...

Ai! Que pressa! (Com)pressa Estou com pressa! Depressa, anda, Corre Depressa Depressa, mais DEPRESSA… Oh! Tropeça! Agora tudo, Toda essa pressa Acaba Numa compressa…

Longe, no horizonte, Distância um ponto de luz um mergulho de estrela a chamar a noite… Perto, o mar profundo água sem fim estendida, ondulante até chegar a tocar o céu lá, onde o sol mergulha no mar e salpica de cor todo o ar. No fim deste dia que se oferece, como um tesouro em baú aberto, exposto em pleno azul sim ficar perto, até provar o sal numa onda e sim, partir, imaginar voar para fora do mundo.

Tecer o fim da tarde. Entardecer Entontecer de luz. Beber a dissolução do sol pelo olhar… Afagar cabelos de erva. Sentir marulhar a tarde na liquidez em brasa... Mansamente mar.

Cetim dourado Liquidez Ouro líquido Suave ondular Escutar o marulho Lançar em mergulho A emoção no mar Deixar-se ficar Poder deslizar Entre céu e mar

Ser assim, Lugar casa sem telhado. Ser assim, varanda aberta em muro antigo. Lugar de eterno abrigo. Ser assim, janela sem vidro, debruçada, escancarada, espantada de olhar! Ser assim, presente em mim como a pedra no muro. Agora. Sempre. Posta no lugar em que deve estar.

A luz Sombra chinesa faz esta magia de me dar a sombra. A luz faz esta magia de me pôr no olhar a força das cores condensada no preto. Negro recortado tudo aparece traçado a carvão. A luz faz esta magia de bocejar a sombra para cima do mundo. Contraste recorte traço forte marcado de noite. Sombra chinesa ou lado lunar? E se neste instante o sino tocar vejo, entrevejo a sombra bailar…

Calma solidão no pensamento. Sonho Dourada paisagem. Ficar pousado na ondulante imensidão, toda a planura entre céu e terra para alcançar. Abraçar a luz, repousar no dorso dos montes.

Telhado Telhado Céu estrelado Chaminé Que miras tu Lá no alto Em pé? Telhado Sonho alado, aguado Pousado no amanhecer. Telhado És o chão do entardecer. Quando anoitecer Eu sou o meu gato Miro o céu estrelado Lá no alto do telhado.

O tempo, lá no alto Tempo olha para mim… Diz-me que sim, que está a passar, que não preciso de me ralar. Que o deixe correr. Que o deixe voar. Que apenas queira, que apenas saiba, saborear! Saborear! Saborear!

Torre Torre Sobe Altaneira Torre Altura Segura Torre Fronteira Entre chão e céu… Torre Aí vou eu Corro sem parar A alcançar… Torre Desce Em vertigem Torre Altura Insegura Torre Distância Entre céu e chão…

Um dia chegou Varandim pousou ali na grade ficou quase suspenso como se sempre tivesse feito parte do varandim. Quietude total. Afinal tudo estava à espera daquele voo: O bordado da janela de pedra a grade de ferro intemporal a coluna segurando o meio do dia… Parou em sossego real de pavão num pouso de cauda de seda a escorregar verdes e azuis egípcios pelo tempo abaixo sem mais palavras que o momento presente.

fronteiras passagens

Cor Alegria Intensidade Vermelhos Plumas Luz Bulício Festa na rua!

Era uma casa na noite. Casa Era uma casa na noite escura. Era uma casa na noite escura, janelas de olhar aceso. Era uma casa na noite escura, olhos acesos, a boca aberta. Uma casa espantada. Janelas a olhar, porta a gritar. Uma casa. Uma casa iluminada. Quem quer lá morar?

Passada - Pausada Depressa Elástica - Marcada. Pernitas pequenas Andamento apressado. Tremuras no andar Vacilante Hesitante de cansaço… Sempre, sempre… Andar, avançar! No tempo e no espaço… Não há que afrouxar! O que dirá cada pé Dentro de cada sapato? De-va-gar, que tenho pressa…

Ah! Dêem-me um vento! Vento, faz-me voar! Vento que em mim pegasse e me transportasse num pensamento para lá do mar… Cabelos de lua eu, a navegar ao colo das nuvens… Minha alma nua à solta no ar em pleno luar! Pensamento… Vento… Subo no azul sem fim. Sou as montanhas e vales que trago em mim.


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