zero agosto 2017 EDITORES André Piero Gatti, Flávio Brito e Humberto Pereira da Silva REVISÃO Flávio Brito e Humberto Pereira da SilvaPROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Ana Key Kapaz ILUSTRAÇÕES INTERNAS E DA CAPA Herman TacaseyCONSELHO EDITORIAL Arthur Autran Universidade Federal do São Carlos Carlos Alberto Mattos blog Rastros de Carmattos Universidade Federal de Uberlândia Carla Miucci Universidade Estadual de Campinas Filipe Salles Universidade Federal de Pelotas Ivonete Pinto Cinemateca BrasileiraJosé Inacio Melo Souza Universidade Anhembi Morumbi Sheila SchvarzmanCOLABORADORES Adilson Mendes, Ana Key Kapaz, André Piero DESTA EDIÇÃO Gatti, Carla Miucci, Dario Mesquita, Fabíola Notari, Felipe Macedo, Humberto Pereira da Silva, João Massarolo, João Nóbrega, José Inacio Melo Souza, Lucas Navarro e Tania Arrais de CamposRevista disponível para download gratuito www.mnemocine.com.br nos formatos EPUB e PDFISSN 1980 6590
índice EDITORIALA que viemos?ENTREVISTA Alfredo Manevy POLÍTICAS AUDIOVISUAIS André Piero Gatti Atividade econômica da indústriacinematográfica e audiovisual no Brasil, o olhar da Ancine TECNOLOGIA João Massarolo eCentros transmídia e Dario Mesquita startup audiovisual CINEMA E... Humberto Pereira da Silva HISTÓRIAMocinhos e bandidos no Velho Oeste: a história, o cinema e suas representaçõesDesejo, sexualidade e subjetivação Carla Miucci feminina em Queen Christina de Greta GarboNOTA HISTÓRICA José Inácio de Melo Souza
3 PRESERVAÇÃOAdilson Mendes Patrimônio audiovisual sem futuro CINECLUBISMOFelipe Macedo E cineclube hoje?Fabiola Notari ANÁLISE FÍLMICA Entre gravar e revelar: vestígios de uma memória em Elegia Oriental A poética da transformação emAna Key Kapaz A vida dos outrosLucas Navarro NOVOS OLHARES Retraçando o acidente na paisagem em Chris Marker O espírito e os autômatos emJoão Nóbrega O filho de Joseph, de Eugène Green Alberto Cavalcanti,Tania Arrais de Campos um produtor de cinema no Brasil SUBMISSÃO DE ARTIGOS PARA A EDIÇÃO UM
editoriala que viemos?A Revista Mnemocine é uma ESSA EDIÇÃOpublicação semestral que propõe Seguindo essa proposta,um espaço de reflexão e discussão inauguramos a edição númerosobre temas relacionados à história ZERO da Revista Mnemocine comdo cinema e do audiovisual em seu a entrevista de Alfredo Manevy,sentido mais amplo. na qual ele faz um balanço de seu trajeto pessoal no mundo doDesde seu lançamento em 1999, cinema e de sua passagem peloo site Mnemocine publicou MinC.conteúdos pedagógicos, resenhas,críticas assim como textos de maior Em seguida, a partir de umadensidade, muitas vezes também acurada análise dos dadosdisponíveis para download. fornecidos pela ANCINE, André Piero Gatti enfatiza a relaçãoCom intuito de valorizar essa entre atividade econômica e aprodução, lançamos a Revista realização cinematográfica noMnemocine, um projeto editorial Brasil, destacando temas atuaiscom identidade própria, e discussões que apontem parareunindo entrevistas com os novos rumos do audiovisual,personalidades do universo como no artigo Centros transmídiaaudiovisual, textos de docentes e startup audiovisual, assinado porem cinema e áreas correlatas, João Massarolo e Dario Mesquita.assim como de jovens iniciantes nacrítica.
5Nos textos de Humberto Pereira Na seção dedicada às análisesda Silva sobre o Velho Oeste fílmicas, trazemos os textos dee de Carla Miucci, em torno Fabíola Notari abordando Elegiada subjetivação feminina em Oriental e Ana Key Kapaz, sobre AQueen Christina de Greta Garbo, vida dos outros.abrimos espaço para as relaçõesentre cinema e outras áreas do E com Novos olhares, publicamosconhecimento como a História. pela primeira vez (de muitas) textos de estudantes e recémA coluna de José Inacio Melo formados em cinema pela FAAP,Souza, Nota histórica, pinça textos já convidando professores eclássicos da historiografia e tece estudantes de outros cursoscomentários contextualizando as para enviarem uma seleção depolêmicas da época... artigos. Nesta edição da revista, colaboraram João Nóbrega, LucasBuscando convidar para o debate Navarro e Tania Arrais de Campos.sobre preservação e os desafioscolocados pelas mídias digitais, É isso, desejamos uma ótima leituraassim como refletir sobre os e aguardem o número UM daproblemas recentes da Cinemateca Revista Mnemocine!Brasileira, trazemos o texto deAdilson Mendes.E também convidando para umareflexão sobre os espaços deexibição, no site e nas próximasedições da revista, o artigo deFelipe Macedo enfoca a atualidadedo cineclubismo.
entrevista Alfredo ManevyAlfredo Manevy é doutor em audiovisual pela USP, foi secretário-executivo do Ministério da Cultura (2008-2010) e primeiro diretor da SPCine. Atualmente é professor da UFSC.Entrevistadores André Piero Gatti, Cristina Merlo, Flávio Brito e Humberto Pereira da SilvaTranscrição Cristina MerloImagem e som Rafaela Franco Pereira e Amanda de Lima PaivaAgradecimentos Pedro e Isabel Marques
7Origens da Embrafilme, com a produçãoDesde que eu me lembro, sempre cinematográfica brasileirafui uma pessoa muito conectada praticamente indo a zero ou quase:com cinema. Em Belo Horizonte um ou dois filmes por ano.onde passei 10 anos da minhaadolescência, juventude, é uma Então, naquele momento pensarcidade muito cinéfila. Tem uma cinema era algo que vocêtradição de cultura cinematográfica realmente se sentia contracorrente,desde os anos 50/60, com o centro era algo mais alternativo, maisde estudo cinematográfico do experimental, porque não tinha“CEC”. Ali se formaram gerações uma perspectiva muito clara dede militantes do cinema, de horizonte profissional, nem de umapaixonados pela sétima arte e horizonte de atividade de trabalhode certa maneira eu encontrei um nessa área.ambiente muito interessante nosanos 90, de contato com outros A vinda para São Paulo, graduaçãocinéfilos, quando participei de na USPcineclubes e produzimos alguns Então eu tenho uma trajetóriajornais na época. que vem muito dessa relação no inicio como cinéfilo, depois comoEu me sinto um pouco fruto, eu crítico de cinema; a gente produzialembro da biblioteca do “CEC” alguns jornais em Belo Horizonte.como um tesouro de revistas. Era Aí passei no vestibular no curso deum pensamento muito ligado cinema na USP, que eu coloqueia dimensão estética. O grande como meta quando eu moravaviés deles era uma visão mais em Belo Horizonte. Só havia trêsuniversal do cinema, da estética cursos de cinema na época: ocinematográfica, da sétima arte, da FAAP, o da USP e o da UFRJ.do culto ao cinema. Não era muito Então tive a sorte de passar nopolitizado no sentido de outros vestibular; claro que a bagagemmovimentos cineclubistas que cinéfila me ajudou, mas vestibularexistiram antes. Os anos 90 não é sempre uma grande loteria,eram uma época exatamente muito ainda mais no curso de cinema quepositiva pra fazer ou pensar cinema tem gente interessante do Brasilno Brasil, porque era logo depois inteiro fazendo. Então tive essada hecatombe que implodiu as grande sorte de passar, mudar prapoliticas de cinema, com o fim São Paulo. E a oportunidade de
conviver com todo um ambiente realização da revista Sinopse, de pensamento, de reflexão, que Leopoldo Nunes, Mauricio Hirata, naquele momento era a grande Paulo Alcoforado, Leandro Saraiva, ênfase do curso da ECA, porque Newton Canito, Mauro Batista, o fazer cinematográfico estava enfim... E a Sinopse também não cheque no Brasil. Nos anos 90 eu era uma revista só dessa geração; acho que o fazer cinematográfico também ali a participava o Rubens era um grande nó, uma grande Machado, professor de teoria camisa de força, era algo e o Ismail Xavier, um grande traumático, você via os cineastas estimulador de que a gente abrisse e pessoas mais velhas saindo espaço de reflexão… da faculdade falando de uma maneira dolorida, como um parto, Havia um sentimento muito grande um processo difícil, que deixava de perplexidade, vontade de cicatrizes nas pessoas... intervenção nesse ambiente um pouco desarticulado do cinema Por outro lado a gente tinha um brasileiro. Você está na faculdade ambiente extremamente rico de querendo realizar cinema, pensamento, um ambiente de querendo participar da atividade. debate, o curso tinha naturalmente Naquele momento, abrir o espaço uma certa ênfase na discussão de uma revista era a possibilidade cinematográfica. de criar um ambiente de discussão, de expressão, de articulação entreNos anos 90 eu pessoas e de dar vazão imediataacho que o fazer também a uma avaliação sobre ocinematográfico era um cinema brasileiro. Porque realizargrande nó, uma grande filmes naquele momento decamisa de força, era certa forma era se submeter aalgo traumático. um processo draconiano de linha de financiamento obscura, que Colegas de turma, de geração, a retomava paulatinamente leis de Revista Sinopse incentivo; tinha a lei Rouanet e a Vai ter um reencontro de geração, lei do audiovisual, que dominavam o Manuel Rangel, parceiro na um pouco o cenário em termos de viabilidade da produção cinematográfica brasileira. Então a gente realmente encontrou no
9debate crítico um espaço possível Cineclube da USP (Cinusp) ee criativo, para que a gente Revista Sinopsepudesse construir um diálogo Eu acho que de certa maneirade geração também com outras a gente sentiu uma espécie degerações. Assim a Sinopse de certa convite para gastar nossa energiamaneira foi espaço que se prestou criativa, crítica e de pensamento,a isso, da gente mapear um em pensar o campo: a Sinopsepouco os interlocutores, fazer um acabou sendo um instrumento,diagnóstico um pouco espontâneo como revista, para essa discussão,do contexto cinematográficobrasileiro, e criar um ambiente Havia um sentimento muitode formação menos comprimido grande de perplexidade,pela situação da indústria vontade de intervençãocinematográfica que era catatônico nesse ambiente um pouconaquele momento. desarticulado do cinema brasileiro.Um ambiente onde as pessoasdiziam claramente “olha vou porque ela nunca chegou a serabrir uma padaria porque fazer uma revista de crítica de cinemacinema não dá; olha vou para a propriamente dita.área de administração de empresaporque trabalhar com isso é…”, Ela acabou virando uma revistatinha um discurso catastrofista de discussão de filmes sim, masque era totalmente justificável, sempre dentro de uma avaliaçãoe que impregnava um pouco do campo cinematográfico, dao ambiente da parte prática da relação entre crítica e cinema, entreUniversidade. Então eu acho as instituições que formam esseque a dimensão do conceito, a campo - a política audiovisual dedimensão da formulação, toda certa maneira começa a aparecernecessidade de depositar energia ali como um tema.em pensar o cinema brasileiro e ocampo audiovisual no seu sentidomais amplo, foi o que viabilizoua constituição desse campo queestava tão desarticulado.
A revista nasceu primeiro de uma Por exemplo, entrevistar você, necessidade que o Cinusp tinha (André) Gatti, assim como o de ter uma publicação; na época Gustavo Dalh, Sérgio Bianchi, a Maria Dora Mourão, professora Ismail Xavier, (Carlos Augusto) que coordenava o Cinusp queria Calil, Roberto Farias, a revista se fortalecer a discussão dos filmes transformou em uma ferramenta e abrir uma publicação específica de mapeamento de vozes e leituras para audiovisual, e a gente da realidade cinematográfica também já tinha uma ideia de ter brasileira, que nos permitiu ampliar uma revista, uma publicação que o debate da universidade, uma pudesse dar conta de discussões discussão mais ampla e que contemporâneas. Então foi uma recuperasse vozes que estavam aliança, um apoio mútuo que pouco distantes, um pouco surgiu com o Cinusp dando esse exiladas ou que precisavam ser apoio financeiro inclusive, para resgatadas para o debate.Todos esses elementos A Revista acabou em poucasformam um campo que edições, creio que foram dez oué um ecossistema que onze números, em três ou quatroprecisa vibrar internamente, anos. Foi de curta duração, masestar conectado pra que a bem intensa. Acredito que ogente possa desenvolver e grande momento dela foi quandose desenvolver junto. aconteceu o 3º Congresso de Cinema, em 2000. Então isso dá a revista poder existir. Eu lembro mais ou menos um indicativo das que como qualquer revista na datas da revista, ela começa em história do cinema, sempre nasce 1998/1999 e vai até 2001/2002. desse tipo de esforço abnegado, comum, sem recursos, a partir Cursos do Cinusp de uma necessidade mesmo de Os cursos do Cinusp no espaço compreender o ambiente em que da Maria Antônia também estávamos. faziam parte desse projeto. A gente se conheceu em 1999, naquele momento que vocês estavam lançando Mnemocine e ministraram o curso de documentário (com Andréia Paula,
11Carla Miucci e Flavio Brito) e a iniciativas cinéfilas e de estudosgente com a revista Sinopse. sobre cinema brasileiro; então os cursos, a revista, esse ambienteOs cursos de cinema começaram de discussão, de publicação,a virar uma espécie de fonte aquilo foi um caldeirão. Tambémde renda, uma forma de ser acrescentaria a participação deremunerado, já que muitos de algumas dessas pessoas nasnós tinham bolsa de iniciação ABDs (Associação Brasileira decientífica ou de mestrado; isso Documentaristas), que sempreajudava na sobrevivência financeira teve uma trajetória de militânciade algumas das pessoas que na discussão cinematográficatrabalhavam na revista. De certa audiovisual e a nossa participaçãomaneira, esses cursos também ali também combinou discussõesajudaram a criar um discurso e uma da revista, com discussões estéticasabordagem mais didática, menos e da política audiovisual queacadêmica; uma discussão mais começaram entrar de maneira maisaberta com pessoas e coletivos clara na perspectiva.e grupos que não estavam nauniversidade e que queriam fazer Começou a ganhar espaço nacinema, pessoas que inclusive discussão a preocupação com aviraram roteiristas. formação do campo audiovisual, no sentido mais amplo, da crítica,Eu até hoje encontro ex-alunos da distribuição, do público.desses cursos livres que viraram Entendendo o campo no sentidocríticos, que entraram na atividade que o Antônio Cândido dá parafazendo caminhos diferentes do o campo literário, no sentido decaminho que a gente fez academia. articular todos esses elos: a crítica,Então esses cursos livres foram a produção, o pensamento, o fazer,um grande aprendizado, pra mim a criação, a exibição e o encontropelo menos, porque me colocaram com o público.em contato com olhares, pessoase demandas que eram muito Todos esses elementos formam umdiferentes daquelas que estavam campo que é um ecossistema quedentro da universidade. precisa vibrar internamente, estar conectado para que a gente possaA gente conheceu muita gente, desenvolver e se desenvolverse articulou com pessoas como junto. Então acho que essa ideia dovocês (Mnemocine) e com outras
campo começa a ficar mais clara tem concessões aos partidos,exatamente com essa abertura da e isso houve também; mas elediscussão da revista, o Congresso conseguiu impor na negociaçãoBrasileiro de Cinema, que foi o da montagem no Ministério ummomento onde surgiu a ideia da espaço muito consistente emAncinav, que depois se tornou só relação à visão programática queANCINE. ele trazia, de dar ao Ministério da Cultura um protagonismo naGoverno Lula e Gilberto Gil no Esplanada dos Ministérios.MinCAcho que a eleição do Lula e a Com uma receita mínima, iniciaindicação do (Gilberto) Gil para o a grande briga em defesa doMinistério da Cultura era algo que 1% como patamar que é o queninguém esperaria anos antes, a UNESCO propõe, o mínimoque tivesse essa mudança, essa da dignidade possível de umabertura… Trazer uma sumidade Ministério da Cultura, e ele fazdo ponto de vista cultural, artístico essa batalha em público. Issoque se revelou também um grande que é interessante, não fez issoministro… na mesa de negociação com o Ministério da Fazenda; ele vai àEsse momento foi interessante rua e diz: “presidente, eu queroporque o Gil abriu o Ministério sua autorização para fazer esseda Cultura e optou por construir embate”. Daí o que eu soube é queum ministério como se fosse uma o Lula disse: “Mas Gil será que emespécie de antena parabólica, ou público é o melhor lugar pra fazer?seja, captasse o que tivesse de Eles vão fazer isso internamentemovimento cultural vivo no Brasil; na reunião de Ministros” e ele diz:ele abriu o ministério para que “Não, eu quero fazer o debateviesse para dentro; ele não quis em público, porque essa é umaimpor uma visão dele, de gabinete questão da sociedade, a gentepara fora; optou por construir precisa repactuar o lugar daum modelo muito participativo cultura; é um debate que nósdesde o primeiro momento, e da temos de fazer, não é uma decisãocomposição dos principais nomes. tecnocrática e política só doClaro que não trouxe só nomes governo”. Então, ao fazer isso, eleque ele queria, porque como propõe um ministério num patamarqualquer governo de coalizão novo, de refundar o Ministério da
13Cultura e de certa maneira isso trabalhar com audiovisual, e simnos alcança; nós enquanto grupo como gestor da cultura...de pessoas que estava pensandoo cinema, que estava escrevendo Não é exagero dizer quee participando dos congressos, o Ministério da Cultura erana medida em que o Ministério irrelevante até então, porque erapassa a trazer pessoas e aceitar um balcão de projetos, você tinha acontribuições de todos aqueles lei Rouanet que é de 1991, e que éque estavam em alguma medida basicamente a renúncia fiscal ondeformulando. o dinheiro público é decidido por departamentos de marketing.Uma pessoa chave nessa história éo Orlando Senna, que como todo O Ministério ficava emitindomundo sabe é cineasta, roteirista, certificados para as decisões seremescritor, gestor, foi da escola de emitidas fora de uma política deCuba, professor, e acho que uma cultura, fora da única política dedas pessoas do Cinema Novo cultura que existia, aquela queque mais entendeu a questão veio das instituições tradicionaisda mudança, da renovação, do Estado brasileiro, tipo oda necessidade de apostar “IPHAN”, que tem uma política deem outras gerações e abrir osprocessos. Acho que ele tem essa A dimensão culturalcaracterística, como pessoa e ser dos indígenas erahumano, de abrir os processos, decisiva na contribuiçãoque o Gil também tem, de abrir da formação do Brasil.inclusive para pessoas que agente não conhece, mas que a patrimônio, mas era absolutamentegente acredita que trazem ideias isolado. Existia ali algum resquício,interessantes... Então ele convida mas era muito pouco. O ministériopessoas como Leopoldo Nunes, era desconhecido na verdade, nãoManuel Rangel, eu, que entro no tinham pautas, não tinham grandesministério um pouco por esse debates, não tinham políticas ecaminho, embora vá trabalhar programas e ações conhecidos dana secretaria executiva, que não sociedade brasileira.era ligada ao cinema, era ligadaaos temas gerais do ministério;tive oito anos de experiência sem
Um bom indicador disso são os ecossistema que o Ministério da índios, por exemplo, que não Cultura tem que se relacionar em tinham contato com o Ministério alguma medida, se ele quer ser da Cultura; achava-se, e eu acho contemporâneo. um equivoco, que assunto de índio é na FUNAI. A FUNAI lida E ele (Ministério da Cultura) vai com a questão da terra, lida com a trabalhar com três dimensões: questão fundiária que é a central, a dimensão do simbólico, da diversidade cultural, e doA globalização impacta reconhecimento de toda essapositivamente e dimensão rica da diversidadenegativamente em tudo cultural Brasileira, a dimensãoque diz respeito a cultura. da cidadania, de que a cultura é um direito de todos... Então tem ninguém vai negar isso, mas a que ter orçamento, mas cabe ao dimensão cultural dos indígenas Estado um papel na cultura; essa era decisiva na contribuição da é a grande afirmação do Gil: o formação do Brasil e inclusive para Estado não é um mero repassador a possibilidade de manutenção de recursos, ele tem um papel que do modo de vida que está sempre é o de zelar pelos direitos culturais ameaçado, também pela questão da população, direitos de realizar da terra, mas não apenas, tem cultura, de consumir cultura e a saúde; os índios não tinham de participar dessa diversidade contato com o MinC, e o Gil cultural a partir de seu lugar de abre o Ministério da Cultura para fala, do seu lugar de pensamento. todos aqueles que como ele dizia “carregam carga simbólica”, Convenção da Diversidade que tudo aquilo que tem carga Cultural; o Brasil no cenário simbólica interessa a cultura. internacional Então, os ciganos, a produção Uma política que tem resultados imaterial de qualquer grupo que estão ai; podemos criticar cultural, as expressões do grafite aspectos dessa política e urbano, até os surfistas com sua criticamos, mas essa política cultura própria, são parte de um não teria chegado ao patamar que chegou sem uma política de cultura por trás, sem uma compreensão de política mais geral.
15E dai eu vou exatamente na tudo que diz respeito a cultura.questão da Convenção dadiversidade cultural, convenção Então a possibilidade dos paísessobre proteção e promoção terem políticas de cultura é ada diversidade e expressões primeira que “roda” quando vocêculturais, que o Brasil ratificou e tem um ajuste fiscal; por exemplo,teve uma liderança internacional não por acaso Portugal e Grécia,com Gilberto Gil na UNESCO nos quando tiveram suas crises fiscaisanos 2000. Trazendo outros países e passaram por um desmonte dedo mundo, como a França e o instituições, a primeira política queCanadá, para assinarem juntos. foi sacrificada foi a de cultura. IssoOs únicos que resistiram até o fim não é por acaso, Portugal acabouforam os Estados Unidos e Israel, com seu Ministério da Cultura -lutando para que a convenção agora está recriando. A Grécianão fosse assinada. O que diz liquidou com seu Ministério daessa convenção, basicamente? Cultura. Logo a Grécia, onde euEla diz que os países que assinam acho que, mesmo em tempos deessa convenção se autorizam crise, a cultura seria algo que elesmutuamente a realizar políticas não deveriam mexer, porque elesculturais em favor das suas têm um legado fundamental nacinematografias, em favor dos cultura do ocidente. E não só dopovos indígenas, dos povos ocidente.originários, em favor das suasproduções locais, gastando Então os ministérios da cultura e assubsídios, criando fundos no setor políticas de cultura são elementosaudiovisual e criando normas hoje estratégicos da disputaregulatórias. econômica e disputa geopolítica do mundo. É por isso que eles sãoEla é estratégica para a soberania os primeiros a serem negociados,de alguns países, para uma por isso que, por exemplo, nãoisonomia e uma maior equidade me surpreendeu quando ona globalização. A globalização governo Temer colocou na mesaameaça efetivamente culturas o Ministério da Cultura como umlocais, culturas nacionais; destrói dos primeiros atos de governo suatradições, conhecimentos, a extinção. Isso nunca é por acaso,tecnologias; ela impacta isso é parte de você reposicionarpositivamente e negativamente em uma dimensão colonial em uma
dimensão de negociação em torno de um jogo internacional de de aspectos vitais de soberania, disputa de mercado. Então na de como os países se colocam Convenção o Gil defende, assina, estrategicamente faces uns aos e mais do que assinar, nos coloca outros, e como eles negociam que como protagonista no discurso é do seu interesse. internacional; cria um amparo e a base política para ter uma E abrir mão da cultura interessa ANCINE proativa, que começa a a muita gente, economicamente, se posicionar não apenas como porque o Brasil é um mercado de agência reguladora, mas junto com 200 milhões de pessoas, sétima a Secretaria do Audiovisual. ou sexta economia do mundo, Com o Ministério da CulturaOs Estados Unidos sabem capitaneando, passam a formularque o desenvolvimento uma política audiovisual evem de uma articulação cinematográfica, amparado numaentre instituições públicas e articulação mais geral, que passaprivadas, ao mesmo tempo pelo Itamaraty, pelo Ministério daatuando deliberadamente Fazenda e pela mesa do Presidentepara desorganizar da República.isso nos países menosdesenvolvidos. Não há dúvida, porque em última instância a pressão bate um país que tem uma riqueza lá; a pressão para que o Brasil econômica grande, capacidade desregulamente, por exemplo, de consumo enorme, e as salas o Fundo Setorial do Audiovisual cinema, apesar do pequeno (FSA). O que é o FSA? Um subsídio, número, tem aqui um mercado como o subsídio agrícola, como muito importante. o subsídio a qualquer indústria. Isso é contestado na Organização O Brasil interessa como parte Mundial do Comércio, por ferir o princípio de livre comércio; e você tem um Fundo Setorial do Audiovisual. A defesa do livre comércio prega que o Brasil no caso do audiovisual, deveria deixar o
17próprio cinema a mercê dos fizeram uma campanha moralistacapitais locais. Só que toda na época contra o cinema francês;tradição do século XX mostra conseguiram virar o jogo, colocar oque na área da cultura não é cinema francês como minoritário.possível desenvolver economiasnacionais fortes sem o papel Em Los Angeles fui atrás dedo Estado. É isso que a história informações do estado, de comobrasileira mostra, a história da a Califórnia botava recursos emFrança, do Canadá, e até a história Hollywood. Descobri que elesamericana... Estive em um desses colocam por ano 900 milhõesencontros internacionais da de dólares; perguntei se eraUNESCO, com um representante para produtores independentesamericano, diplomata, e ele e falaram: “não, é nos grandescriticava a posição brasileira, estúdios”, para os grandes estúdiosdizendo: “vocês estão criando não saírem de lá. Eles recebemconstrangimento aqui; o Brasil fica 900 milhões de dólares, o que éforçando a barra do protecionismo mais que o Fundo Setorial; issoem relação ao audiovisual e a é dinheiro em qualquer lugar docultura” e eu disse: “olha, nós mundo.estamos fazendo exatamente oque vocês fizeram”… Lembro de um livro de um economista sul coreano, Ha JoonAí ele falou: “mas nós fazemos Chang, Chutando a Escada, queisso?” E eu falei: “basta pegar diz que os países que subirama história americana, como a escada do desenvolvimentoHollywood foi construído, precocemente, como os Estadosos Estados Unidos foram o Unidos, sabem que esse vem deprimeiro país do mundo a uma articulação moderna entreregulamentar seu mercado; os instituições públicas e privadas, defranceses (especialmente a Pathé) um projeto nacional, ao mesmodominavam o mercado americano tempo atuando deliberadamenteaté os anos 1910”... para desorganizar os países que não subiram as escadas; então elesEles montaram uma associação chutam a escada.sindical que junto a Casa Brancadefendeu o mercado americano Está explicado. Conversando compara os americanos, de quebra o diplomata ele diz: “é, mas não é bem assim”; e eu falei: “vocês estão
fazendo o que vocês fazem, então propriedade intelectual, que é oqual o problema?” Assim como grande ativo que é regulado poreles estão no papel deles de fazer alguém. Esse ponto não é forao lobby, e tem os lobistas aqui no da curva porque também remeteBrasil que fazem a diplomacia, a experiência do Cangaceiro, daalias muito qualificados, para (Companhia Cinematográfica)desarticular o governo brasileiro, Vera Cruz, o filme que poderia terdesarticular esses mecanismos. salvo a Vera Cruz da bancarrota, foi distribuído por uma majorAgora, o Brasil não pode entrar (Columbia Pictures) cuja grandeingenuamente nesse processo, receita internacional não retornouentrar a reboque, entrar sem para os investidores iniciais. Essavalorizar. Aquilo que o Gil trouxe, quebra do ciclo econômico locala percepção de que a diversidade tem a ver com uma legislação,cultural brasileira é um grande com uma ausência de políticasativo, que a cultura brasileira, específicas.onde quer que você vá no mundo,a maneira pela qual o Brasil O surgimento da ANCINEpercebido, a maneira pela qual A ironia dessa história é quenão tem hall de hotel no mundo esse projeto da Ancinav já existiaque não toque bossa nova, que em linhas gerais; ele vinhanão toque João Gilberto, talvez de governos anteriores; querseja maneira pela qual o Brasil dizer, a ideia de uma agênciaé percebido no mundo: é um reguladora do audiovisual numpaís que tem na sua cultura uma sentido mais amplo, que dessegrande commodity, um valor conta das relações de cinemaagregado absurdo que nunca foi e televisão, que olhasse para otransformado em uma economia conjunto da atividade audiovisual,em favor do Brasil. já estava em dois documentos. Estava no Congresso BrasileiroAcho que isso é uma coisa de Cinema, de 2000, e ali vocêestrutural no audiovisual brasileiro tinha assinaturas, inclusive dee o lado bom das políticas pessoas que depois vieram naaudiovisuais mais recentes foi cobertura da mídia. Se posicionarnuma linha de quebrar um pouco contrariamente no momentoesse aspecto do patrimônio que o governo Lula apresentou adessas obras, do patrimônio da proposta foi a grande reivindicação
final do Congresso. A Ancinav, grande; foram quatro meses deque inclusive Fernando Henrique capa de revista toda semana, e aíaceitou por pressão dos eu acho que abriu um flanco debastidores foi alterado para Ancine estratégia da oposição em relaçãona mesa do Pedro Parente, Ministro ao governo Lula. Construir a ideiada Casa Civil. de um governo autoritário, queNa época a Secretária do nunca se comprovou, quandoAudiovisual capitaneada pelo a gente pega os oito anos deOrlando Senna tinha uma equipe governo Lula, e até os da Dilma;de pessoas propondo uma eu não participei, mas de fora, nãoreleitura da política de cinema vi nada de errado nesse sentidolato-sensu, de pegar esse projeto que vou falar aqui. Ninguém foique já existia na sua amplitude perseguido, a oposição falou o queque era audiovisual, ou seja, de quis, xingou, criticou, artistas deentender a cadeia do audiovisual oposição captaram recursos; quemcomo televisão, cinema, TV aberta, não tinha opinião captou também,TV a cabo e fazer a regulaçãode maneira conjunta como já Curiosamente esses que agorase colocava desde os anos de se dizem liberais e estão compondo o novo governo,1970 pelo menos, e propor estão indo atrás de artistasum projeto que traduzisse isso que criticam o governo.para um debate. O projetofoi massacrado. Acho que foia primeira grande crise dogoverno Lula; eu me lembro queo governo desfrutava de altapopularidade, até de uma certa ou seja, não houve mistura…lua de mel com a imprensa, demodo geral. E essa crise (digamos Essa ideia de que havia no governoassim) quebrou aquele clima, um monstro autoritário, que ia sairazedou, azedou total… do armário e que começou a serCriou uma coisa assim… Capa da construído já naquele momento,Veja, começou a vir uma avalanche com a ideia do Conselho Nacionalque o governo, o Ministério da de Jornalismo, da Ancinav . E euCultura, apanhou que nem gente diria que não se comprovou que havia um monstro atrás do armário
porque o Lula, com defeitos e regulação de conteúdo. Ninguém qualidades, é um conciliador e não ia propor no século XXI discutir tem a característica de embates temas dos filmes, discutir linhas desse nível. ideológicas, editoriais: era de regulação de propriedade cruzada, O governo foi tolerante com de relações modernas entre os tudo que veio contra, na verdade agentes econômicos. Como tem apanhou constantemente, ou em qualquer economia do mundo, calado, ou reagia, mas não houve tem nos EUA, tem na França, tem o uso da máquina pública para nos países liberais e nos países perseguir ninguém. Curiosamente social-democratas, só que eles esses que agora se dizem liberais sabiam disso e estigmatizaram para e estão compondo o novo matar na origem e de fato foi uma governo, estão indo atrás de tempestade de canivetes tão forte artistas que criticam o governo. que assustou o governo. Porque a ANCINE abriu um processo profundo de relação Conteúdo nacional na TV por com a mídia, abriu uma linha assinatura: a lei 12485 de debate que infelizmente Acho que a diferença para a foi para o lado ruim, o lado de lei 12485 (Lei da Comunicação estigmatização completa, e não Audiovisual de Acesso Condicionado), que em grandeA lei gerou demanda medida tem sido responsávelprivada de compra de por gerar empregos para ativar aconteúdo brasileiro, economia do audiovisual, é que ascriou um um ambiente produtoras hoje têm problema?fundamental de ativação Têm! Mas estão trabalhando parado audiovisual brasileiro. canais. A lei gerou demanda privada de compra de conteúdo no debate do conteúdo em si. O brasileiro, ampliou o número de conteúdo em si era uma proposta canais do Brasil, criou um ambiente moderna de regulação econômica interessante, um ambiente da atividade audiovisual, não de fundamental de ativação do audiovisual brasileiro. Então é um grande acerto da lei, a lei regula a dimensão, o segmento, da TV por assinatura. Ela é parte da a lei
12485, sem a parte da TV aberta, momento nascia um embrião daa parte da TV por assinatura que 12485 com a percepção de queficou, o acerto da TV da lei 12485 essa parte da TV por assinaturaem relação a ANCINE é que aquela poderia ser tramitada de uma outraporrada foi tão forte que nós maneira. Então sem autoria doaprendemos com os erros. Houve governo, pelo Congresso Nacional,um erro de encaminhamento lá, que é o lugar das negociações, dosuma certa ingenuidade, uma certa embates, esse embate acontecepretensão do pactuar com todo de uma outra maneira: tramitamundo nos bastidores e depois vira público com tudo consertado. As empresas de TV abertaObviamente não é assim, não estavam começando a sefazer um grande debate público enfrentar, e isso dava aoprecedendo a reforma, tentar governo uma posição decriar por medida provisória. neutralidade positiva, emEsse eu acho que foi um erro de que ele poderia se colocarencaminhamento que na época, como mediador do processo.eu sei, foi debatido dentro doministério. de maneira a trazer os agentes econômicos e aproveita umaHavia pessoas que eram contrárias janela de oportunidade, que era oà maneira como foi conduzido, conflito da emergência da telefoniamas quem conduziu sempre como provedora de conteúdoesteve no Ministério do Gilberto e da radiodifusão das grandesGil. A prerrogativa de certa empresas de TV aberta no Brasilmaneira liderar e dar sua linha de detentoras desse oligopólio. Elasabordagem política foi levado de obviamente estavam começandouma certa maneira, foi rechaçado a se enfrentar naquele momento,no final, o governo recuou e abriu isso dava ao governo umamão do projeto. Lula, (Antonio) posição de neutralidade positiva,Palocci, etc, o próprio Gil, em que ele poderia se colocaravaliaram que não tinha condições como mediador desse processo,políticas e de fato já não haviamais naquele momento de queprojeto fosse sequer enviado.Então o projeto foi colocado noarmário, na geladeira, mas naquele
e tirar dali um grande acordo maneira isso colocou a TV aberta conservador, ou poderia tentar em uma posição de negociação e tirar dali um interesse público, colocou as empresas de telefonia que foi o que a lei conseguiu em numa posição de negociação com alguma medida levantar. o governo, e o governo manobrou de maneira inteligente, e tirou umaAs produtoras lei que tem uma modernidadeindependentes têm que intrínseca.produzir 8000 horas deconteúdo. Se traduzisse É claro, a proposta originalem longa-metragem, daria era ter, primeiro, um número4000 longas-metragens, no maior de canais brasileiro, umamínimo, para cumprir a lei. maior participação de conteúdo independente no horário nobre. Então essa janela de oportunidade Isso foi sendo desidratado na com o aprendizado da ANCINE negociação e se chegou os levou o governo a montar uma patamares de cota que estão aí, estratégia muito mais interessante tanto de participação de capital que é tramitar pelo Congresso, estrangeiro nessas operadoras fazer o debate no Congresso, da TV por assinatura quanto de criando um processo de defesa conteúdo nacional. Agora mesmo do interesse público, a partir de desidratado, como não tinha uma leitura que eu acho que foi nada, hoje a TV por assinatura uma leitura da complexidade tem uma demanda de 8000 da atividade, percebendo que horas de conteúdo inédito/ano, a globalização desses agentes que tem que ser comprado para internacionais é inevitável, cumprir a lei. Então as produtoras mas que é possível defender independentes têm que produzir o conteúdo local a partir de 8000 horas de conteúdo. Se contrapartidas de lei, de cotas de traduzisse em longa-metragem, canais brasileiros de conteúdo daria 4000 longas-metragens, no independente. Então de certa mínimo, para cumprir a lei. A TV por assinatura tem uma diversidade de oferta que vai ganhando o brasileiro em relação a TV aberta. Acho que ela nunca
vai perder prestígio no Brasil, foi derrotada. Esses três canais emporque Brasil é um país que especial, que apostaram numapelas características a TV aberta zona de conforto, não entenderamvai sempre existir, mas ela vai as mudanças legais, econômicas,perdendo porque tem oferta de tecnológicas e socioculturais doconteúdos, a possibilidade com Brasil e apostaram na zona depreços mais acessíveis de ganhar conforto tradicional da publicidadea classe C, que foi o que a TV por da TV aberta.assinatura fez, que é onde o Netflixdisputa também. A TV aberta não E a outra questão, é que osentendeu muito bem; assim, a conteúdos brasileiros passaramGlobo apostou na Globosat, os a entrar via cota nos canais da leioutros, SBT, Bandeirantes e Record 12485, passaram a brilhar, a ganharsó agora estão entendendo isso, audiência, a ser prime time, a tertentando desesperadamente e a melhor audiência dos canais;reagir e impor uma negociação isso está acontecendo com trêsagora, vinte anos depois que esse ou quatro séries brasileiras hoje.modelo foi implantado. Sete anos Então os canais gostaram dedepois da lei, estão tentando ter esse conteúdo, a ver retornovalorizar o conteúdo da TV aberta, econômico, ter audiência.cobrando das telefônicas um valor,uma taxa, pela exibição desses Os canais que apostaramconteúdos. numa zona de conforto não entenderam asO que acontece? As telefônicas mudanças legais,disseram: “tá bom, se quiser tirar econômicas, tecnológicastira! Tudo bem, a gente distribui e socioculturais do Brasil.conteúdo, a gente não vai pagaresse valor que vocês querem O que está acontecendo hoje énão, mas se vocês quiserem tirar, uma mexida de placa teutônicaa gente para de ofertar vocês, a no subsolo do mundo dagente tem mais de 100 canais aqui radiodifusão; é uma mudança,que a gente oferece, inclusive comconteúdo nacional”. É um outrofenômeno interessante, não sei oque vai acontecer com eles. Nessanegociação acho que a TV aberta
uma revolução nem tão silenciosa E essa briga vai ter novos capítulos.assim, porque há uma “grita” dos Então o que é interessante? Acanais abertos de querer que a Lei deu certo! Com todos osTV por assinatura pague o que problemas, a lei é um case bemlhe é devido. Só que a TV por sucedido de política cultural queassinatura com os canais e com a tem suas raízes em tropeços,lei, que levou lá tráz a obrigação problemas e derrotas de batalhas.de produzir conteúdo nacional e Mas eu digo que ela é bemem língua portuguesa, tem armas sucedida porque o interessena mão para dizer: “olha talvez sua público é o da, q valorização donovela não seja tão interessante, conteúdo brasileiro, da valorizaçãoeu tenho uma série aqui que faz dos produtores independentes,sucesso, eu tenho uma animação da valorização dos artistasque você não tem”. regionais, da possibilidade de gerar emprego do Brasil, de gerar propriedade intelectual, que a gente falou lá atrás: poxa, João Gilberto, a propriedade que ele gerou está gerando milhagem econômica lá fora, não aqui; a moedinha não cai aqui dentro: o plim plim é lá fora. Então você tem agora a possibilidade de gerar propriedade intelectual aqui, gerar ganho econômico social artístico cultural em infraestruturas locais.
políticasaudiovisuais
Atividade econômica da indústria cinematográfica e audiovisual no Brasil, o olhar da Ancine André Piero GattiFormado em Letras, André Piero Gatti fez mestrado na ECA-USP e doutorado no IA-Unicamp.É professor universitário e pesquisador cinematográfico. Sua tese de doutorado, Distribuiçãoe exibição na indústria cinematográfica brasileira (1993-2003), é publicada pela EditoraMnemocine.No período de 2007 a 2014, a se identificando, cada vez mais, com indústria cinematográfica e este ramo da economia. O fato é audiovisual vem apresentando que estudos sobre o assunto têm um crescimento econômico sido publicados de maneira bastante invejável, claro, se comparado ao corriqueira tanto por entes corporativos desenvolvimento que os tradicionais quanto públicos. Mais recentemente, setores da economia brasileira vêm foi a vez da Ancine publicar dois apresentando no mesmo período. estudos, a saber: Valor Adicionado pelo Isto se deve a várias razões, mas, uma Audiovisual e Brasil: comércio exterior razão parece fundamental, que se de serviços audiovisuais. Vale saber que encontra no fato de que os investidores as duas citadas pesquisas da Ancine e empreendedores no Brasil estão se pautaram principalmente sobre a
27categoria do Valor Adicionado Tabela 1. VASA (2007 - 2014)(VA)1. Ano R$ Bilhões VASA/PIB (%)Os dados da Ancine foram 2007 8.7 0,33coletados através de pesquisas 2008 9.9 0,33realizadas pelo IBGE, basicamente 2009 11.5 0,36retiradas da Pesquisa Anual de 2010 13.1 0,35Serviços (PAS), Pesquisa Anual 2011 16.3 0,39de Comércio (PAC) e do Sistema 2012 19.6 0,45de Contas Nacionais, em 2014, 2013 22.2 0,46além de demandas emanadas da 2014 24.5 0,43própria Ancine. TOTAL 125,8 MÉDIA 0,38O Valor Adicionado do SetorAudiovisual (VASA), já faz algum Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas,tempo vem apresentando índices Coordenação de Serviços de Comércio:crescentes de desempenho Pesquisas Anual de Serviços e Pesquisaeconômico, mostrando como este Anual de Comércio – 2007 a 2014, esetor da economia apresenta um Sistemas de Contas Nacionais Referênciadinamismo para acima da média 2000.dos segmentos mais tradicionais Elaboração e pequisa: Spcine/CRIA.da economia brasileira. Vejamoso retrospecto da tabela 1. No Tabela 2. Taxa de Crescimento Anual doperíodo estudado, identifica-se VA x VASAo fato de que o crescimento doVASA apresentou uma taxa de Ano VA (%) VASA (%)181% . Este índice representauma taxa média de crescimento 2008 4.1 7.1da ordem de 22,62 % ao ano, ouseja, o audiovisual cresce em taxas 2009 1.0 7.8vertiginosas. Vale ressaltar tambémo fato de que no triênio 2012-2014, 2010 6.7 5.2a correlação do VASA e o PIB teveseu patamar elevado para uma 2011 2.3 15.9média anual de 0,44. 2012 0.5 13.2 2013 2.5 4.2 Média 2.85 8.9 Fonte: Valor adicionado pelo audiovisual: comercio exterior de serviços audiovisuais, p.6. Elaboração e pesquisa: Spcine/CRIA.
Como já fora comentando uma maneira geral, a economiaanteriormente, o crescimento do do audiovisual ainda continua emsetor audiovisual pode ser melhor passos firmes para um regime deavaliado quando comparamos a solidez único na história econômicataxa de crescimento da economia brasileira.de uma maneira geral e a do setoraudiovisual especificamente, tendo A Ancine também pactuou ocomo base o instrumento do VA desenvolvimento da indústria por(Tabela 2, na página anterior). alguns segmentos da indústria, que obteve o seguinte desempenhoDe posse dos números ao lado, (Tabela 3).fica perceptível que o setoraudiovisual vem apresentando Audiovisual e o mercado externo:um dinamismo de crescimento uma abordagem inéditaeconômico pujante, enquanto O comércio exterior de serviçosoutros setores da economia não audiovisuais no Brasil foi alvovêm acompanhando os mesmos de um estudo que há muito eraíndices. Portanto, apesar do fato de reivindicado pelos agentes doo País estar vivendo num cenário setor; a pesquisa da Ancine obteverecessivo já faz algum tempo, de o seguinte desempenho (Tabela 4, na próxima página).Tabela 3. Evolução do mercado salas de cinema e TV Paga (2002 - 2015)Segmento 2002 2015 Crescimento(%) 1.635 3.005 184Salas de cinema 90 milhões 173 milhões 192 3,5 milhões 19,6 milhões 560Bilhetes vendidos salas de cinema 2 19 950Número de assinantes de TV Paga 29 129 445 22,4 milhões 311Nº Canais de TV paga que veiculam 7,2 milhõesConteúdos Brasileiros ConstituintesDe Espaço QualificadoFilmes Brasileiros lançados em salade cinemaNúmero de espectadores de filmesbrasileirosFonte : Valor adicionado pelo audiovisual: comercio exterior de serviços audiovisuais, p.6.Elaboração e pesquisa: Spcine/CRIA.
29Tabela 4. Comércio Exterior de Serviços Audiovisuais no Brasil (2014 - 2015)Vendas 2014(US$) 2015(US$) Total VAR (%)(Exportações) 73.688.717,89 154.806.638,50 228.495.356,39 110,1Aquisições 1.546.144.985,50 1.436.099.012,49 2.982.243.997,99 2,9(Importações) -1.472.456.267,60 -1.436.099.012,49 - 2,5SaldoFonte: Valor adicionado pelo audiovisual: comercio exterior de serviços audiovisuais, p.6.Elaboração e pesquisa: Spcine/CRIA.Há evidentes problemas de encontra na TV por assinatura.assimetria entre esses números, Isto porque este segmento sepois o setor como um todo tornou o ramo mais desenvolvidomovimentou recursos da ordem economicamente falando do VASA.US$ 1,74 bilhão entre importações Pois, no último ano da pesquisae exportações, apenas em 2015. realizada pela Ancine, o setorEsta assimetria pode ser verificada chegou aos 51.7% do valor totalpelo déficit entre importações e alcançado pelo setor audiovisualexportações, pois as importações como um todo. Chama a atenção aforam da ordem de US$1,6 bilhão queda abrupta da TV aberta, estae a as exportações totalizaram que teve um descenso de 22,2 %US$ 154,8 milhões. Portanto, as do total dos valores alcançadosexportações representam um pela indústria. Curiosamente, nesteíndice de cerca de 10% desta cenário, a economia do audiovisualbalança comercial ou US$ 1,44. de São Paulo saiu fortalecida. Pois,Deste valor US$ 1 refere-se à de acordo com a ABTA as maioresimportação dos EUA, ainda que as e mais importantes empresasexportações tenham crescido em do segmento aqui se encontram110,1%, de uma maneira geral. instaladas. As seguintes empresas programadoras e empacotadorasA TV por assinatura como têm a matriz da sua empresalocomotiva da indústria localizada em território paulistano,audiovisual no Brasil são elas (Tabela 5):Um dos setores que tem dadoeste folego ao audiovisual se
Tabela 5. Empresas de TV por Assinatura com Matriz Esta situação da em São Paulo (2016) concentração paulista da indústria da TV Paga1 – Arris Telecomunicações do Brasil vem a ser corroborada,2 – Associação Neo TV por exemplo, no3 – Cisco do Brasil LTDA que diz respeito à4 – Discovery Comunicações Brasil importação de bens5 - ESPN do Brasil Eventos Esportivos LTDA e serviços para a6 – Fox Latin American Channels do Brasil indústria em São Paulo,7 - G2C como atesta a Tabela 68 – Gamecorp S.A que segue abaixo.9 – Globosat Programadora LTDA10 - Mídia do Brasil Comunicação e Serviços de TV LTDA Destaca-se o11 – Nagra Média Brasil LTDA crescimento que teve12 – Claro S.A. a participação do13 – Pace Brazil Indústria Eletrônica e Comércio LTDA audiovisual na cesta de14 – Sky Brasil Indústria Eletronica e Comércio LTDA serviços ofertados em15 – Superimagem Tecnologia em Eletrônica LTDA São Paulo, este índice16 – Telefonica Brasil S.A aumentou em mais de 100% , em menos de17 – Turner International do Brasil LTDA um ano.Fonte: ABTA.Elaboração: Spcine/CRIA. Tabela 6. Vendas e Aquisições de Serviços Audiovisuais de São Paulo e o Mercado Externo (2014-2015)Ano Vendas(R$) % Total Aquisições(RS) %Total2014 21.190.644,06 0.17(*) 589.373.066,52 3,53(*) 42(**) 73(**)2015 42.108.545,92 0.37(*) 1.012.954.622,30 6.69(*) 65(**) 82(**)Total 63.299.189,98 3,95(**) 1.602.327.688,82(*) Serviços de uma maneira geral (SP)(**) Somente serviços audiovisuais (BR)Fonte: Brasil, comércio exterior de serviços audiovisuais, Ancine, 2016.Pesquisa e elaboração: Spcine/CRIA.
31TV aberta um mercado em domicílios, entretanto, por outrodescenso lado, há grande concentraçãoO agora ex-carro chefe da indústria nos domicílios nas regiões Sul eaudiovisual brasileira, a TV Sudeste, isto em detrimento àsaberta tem visto seu faturamento demais regiões do País.caindo em queda livre, pois ,em 2007, a sua participação NOTASno bolo da receita da indústriaaudiovisual batia em 63,7%, viu 1 É o valor que a atividade acrescentaeste faturamento cair para 41,5 aos bens e serviços consumidos no% em 2014. Em sua história, seu processo produtivo. Em termosesta é a primeira vez que isto macroeconômicos, é o valor dos bensacontece, a indústria da TV aberta produzidos por uma economia, depoisperdeu 22% de mercado, ainda de deduzidos os custos dos insumosque pese o sucesso de alguns adquiridos de terceiros e utilizadoscanais com a sua programação na produção. O VAEB é pautado porficcional, principalmente novelas “preços básicos”. Enquanto o PIB ée conteúdos em vários formatos mensurado por “preços de mercado”dedicados ao público infantil, tais que inclui impostos e exclui subsídios.como Os 10 mandamentos (TVRecord) e Carrossel (SBT). Por outrolado, a Rede Globo tem visto seusíndices gerais caírem de formasistemática, ainda que seja o canalmais visto na TV linear.O que se nota é que está havendouma mudança de fulcro noshábitos de consumo audiovisualpor significativa parcela dapopulação brasileira. Isto porquea pesquisa do IBGE aponta que97% dos domicílios brasileirospossuem pelo menos um aparelhode TV. Vale ressaltar que o índicede penetração da TV por assinaturaronda um percentual de 33% dos
tecnologia
33 Centros transmídia e startup audiovisual João Massarolo e Dario MesquitaJoão Massarolo é Professor Associado do Departamento de Artes e Comunicação (DAC/UFSCar), e do Programa de Pós-Graduação em Imagem e Som da Universidade Federal deSão Carlos (PPGIS/UFSCar)Dario Mesquita é Professor Assistente do Departamento de Artes e Comunicação – DAC/UFSCar. Pesquisador do Grupo de Estudos sobre Mídias Interativas em Imagem e Som(GEMInIS)Introdução por alterações nos processos em cursoA indústria audiovisual é um na globalização, onde a incorporação eempreendimento no qual a dinâmica a fusão de grandes conglomerados dede gestão e de inovação, assim como mídia promovem novas modelagensde organização e de estruturação sofre de negócios - o que diversifica asmudanças ao longo do tempo em alternativas para o consumo defunção de evoluções e transformações conteúdo audiovisual.tecnológicas, econômicas, sociais eculturais que afetam simultaneamente No caso específico do mercadoa produção, a distribuição e o consumo televisivo, por exemplo, o acessodo entretenimento audiovisual. Além aos conteúdos sob demanda afetoudisso, a cadeia de valor também passa o próprio modelo de negócios da
televisão - agora os espectadores criam novos nichos de mercado,consomem seus conteúdos livres onde antes havia apenas fluxo deda antiga grade de programação. produtos massificados. As relaçõesO usuário pode escolher entre entre ‘centro’ e ‘periferia’ se tornamassistir a um filme no cinema, mais complexas do que era notelevisão ou internet (pelo Netflix ambiente midiático do século XX,ou iTunes, entre outros serviços promovendo um maior fluxo dede vídeo por streaming), ou pode trocas, ao mesmo tempo em queainda criar seu próprio conteúdo formatos e canais de mídia see propagá-lo via plataformas tornaram aparentemente invisíveisalternativas de valor (como o diante da ubiquidade do conteúdoYouTube, de acesso gratuito). Essa nas redes. A circulação deproliferação de meios contribui conteúdos pelas redes predominapara a modicidade de preços, sobre produtos industriais doagrega maior valor à experiência tradicional modelo centralizador,dos indivíduos com o conteúdo, no qual o discurso hegemônicoalém de promover a expansão do se fazia sentir nas regiões maismercado, que passa a alcançar periféricas do planeta. Essepúblicos mais amplos e de forma modelo unidirecional relegava asmais personalizada, passando questões locais ao segundo planode um modelo industrial vertical ou subordinava-as aos interessescom visão corporativa, para um de grandes corporações, mas essamodelo com visão horizontal e situação começa a sofrer mudançasarticulado em redes participativas. devido ao aumento da velocidadeEssas estratégias inovadoras que e do volume de informações“circulam pela internet e pelas de caráter multidirecional,redes sociais flexibilizam hábitos através de multiplataformas dede consumo e fornecem novos mídias, que transitam entre osdesafios para a colocação de principais centros transmídiaprodutos que não necessariamente contemporâneos.devem seguir os modelos denegócio do consumo de massa” Essas mudanças tecnológicas,(BIZERRIL, 2012, p.153). comunicacionais e culturais afetam não somente a modelagem deNeste contexto, os centros negócios que fornece sustentaçãotransmídia expandem o campo aos tradicionais conglomeradosdas indústrias de conteúdos e de mídia, mas o próprio ambiente
35de mídia, provocando mudanças elaborar indicadores para análisessignificativas na produção e da produção de séries e websériesconsumo de conteúdo audiovisual. para diferentes plataformas com oEste complexo cenário faz com objetivo de realizar uma cartografiaque as empresas brasileiras da produção audiovisual realizadaprodutoras de conteúdo procurem no centro transmídia de São Paulo.se adaptar às novas lógicas Os resultados alcançados nosdo mercado audiovisual, cujas estudos da segunda etapa serãodemandam por inovação é cada utilizados, posteriormente, comovez mais crescente. O Governo parâmetro para as análises queFederal, através do Ministério serão desenvolvidas sobre outrosdas Comunicações, por exemplo, centros transmídia brasileiros3.criou as Diretrizes para umaPolítica Nacional para Conteúdos Cultura mainstreamDigitais Criativos1 com objetivo de A cultura mainstream é umaintegrar e estimular o potencial questão importante para aeconômico das cadeias produtivas indústria audiovisual e o seudos setores de audiovisual como estudo tem sido desenvolvidoforma de desenvolver e fortalecer pelo campo da comunicaçãoos segmentos produtores de através da criação de indicadoresconteúdos criativos no Brasil. que permitam destacar e analisar os fatores que contribuem deEste artigo trata dos estudos forma decisiva para que algumasrealizados na primeira etapa cidades sejam consideradasdo projeto de pesquisa2 em como capital de mídia. Essasandamento sobre os centros cidades erguidas em lugarestransmídia e startup audiovisual estratégicos para a geopolíticado entretenimento audiovisual regional são importantes polosbrasileiro. Nesta primeira etapa, as de desenvolvimento econômicodiscussões concentraram-se em localizado, atraindo sucessivastorno da noção de capital de mídia levas de imigrantes de diferentesvisando um maior entendimento regiões, fazendo com que ada cidade de São Paulo como diversidade cultural seja uma dascentro transmídia estratégico principais marcas de sua vitalidade.para o desenvolvimento do setor O grande fluxo de capitais dessasaudiovisual brasileiro. Na segunda regiões ofereceu condiçõesetapa de pesquisa, pretende-se para a criação de infraestruturas
midiáticas que impulsionaram a o mercado de entretenimentocirculação de conteúdos globais, globalizado. Para Waytt (1994),principalmente os produtos essa proposta estética e narrativados conglomerados de mídia atende às demandas das novastradicional (cinema e televisão, estratégias de marketing e deentre outras). Neste aspecto, o venda ao longo de uma cadeiatermo capital de mídia se refere a midiática integrada, o quecidades com passaporte global, aprofunda a sinergia entre osque se tornaram importantes conglomerados de mídia e oscentros da produção midiática mercados de entretenimento.globalizada, conforme explica Deste modo, apesar do audiovisualCurtin (2003, p. 2015): vivenciar um processo de interdependência midiática,Cidade que são centros de ainda é fundamental para gerarfinanceiros de produção e novas possibilidades de negóciosdistribuição de produtos no setor de entretenimento,audiovisuais, que apresentam materializando sistematicamentesuas próprias lógicas que não imaginários de plateias globaiscorrespondem necessariamente e provocando, deste modo,aos interesses políticos do Estado- tensões entre uma afirmação denação. Nelas, forças complexas identidade local e/ou regional,interagem, como a cultural, bem como nacional e os processoseconômica e a política. de subjetivação postos em prática pelos fluxos mundiais de conteúdo.Por estarem inseridas em umcontexto de capital globalizado, Desde os anos 1990, as grandesas capitais de mídia são marcadas corporações controlam a produçãopela cultura mainstream, em e a circulação dos conteúdosque estratégias econômicas em escala global, incluindo ose estéticas dos blockbusters mercados de sala de cinema,high concept exploram as home vídeo, TV paga, Pay-per-possibilidades oferecidas pelos view e de videogames, entregrandes conglomerados de outros. Normalmente, essesmídia. Devido aos altos custos produtos chegam ao mercadode produção, assim como de brasileiro praticamente sempropaganda e marketing, os nenhum mecanismo de defesaconteúdos audiovisuais encenam propriamente dito. Mesmo emum texto global para interagir com
37mercados altamente regulados, e distribuição de conteúdocomo a China, por exemplo, audiovisual global. Segundo oa presença das empresas autor, países como a China, a Índia,transnacionais do audiovisual o México e, inclusive, o Brasil,tem gerado ruídos na diplomacia são contra modelos emergentesestadunidense. André Gatti que fazem parte das novas redes(2015), no artigo “1110 Tons de de circulação de conteúdoscinza: notas sobre a ocupação do com uma dimensão cultural emercado e a mexicanização dos econômica de peso própriocircuitos de salas de cinema no diante do entretenimento norte-Brasil”, recorda que no caso do americano e, em menor escala, dablockbusters high concept baseado cultura europeia. Estes países sãoem histórias em quadrinhos de protagonistas de trocas culturaissuper-heróis Homem de Ferro 3, regulares, mas que ainda não“os chineses resolveram não enviar são “medidas pelas estatísticasuma parte dos lucros que o filme do Banco Mundial e do FMI, sãotinha gerado por ocasião do seu ignoradas pelas das UNESCOlançamento na China”. [...] e a Organização Mundial do Comércio as apresenta com outrasNeste sentido, pesquisas recentes categorias de produtos e serviços”sobre as dinâmicas econômicas, (MARTEL, 2012, p. 15).tecnológicas e culturais deprodução audiovisual apontam Nos anos 1990, segundo Keanepara mudanças na cartografia (2006), os estudos sobre “centrosglobal, na qual os contra modelos periféricos” começavam a tentaremergentes se impõem diante do a compreender as produçõesseu público local e/ou regional, audiovisuais (filmes, telenovelasmas, de outro lado, os produtos e dramas televisivos) fora dosna linha blockbusters high concept grandes eixos produtoresnorte-americano são dominantes (Estados Unidos e paísesno plano mundial. Frédéric Martel Europeus). Porém, esses estudos(2012), ao estudar diversos polos compreendiam que essasde produção de entretenimento produções alcançavam apenastanto no ocidente quanto no regiões próximas a esses centrosoriente, conclui dizendo que nos periféricos, sob um contexto deanos 1980 foram se constituindo diáspora de comunidades emnovos centros de produção condições culturais semelhantes,
e ainda abordando a presença sobre as culturas periféricas dode um imperialismo cultural planeta. As dinâmicas globais dedominante. Eram pesquisas que mídias resultam de negociaçõescompreendiam “empresários e complexas que se sobrepõem,redes de televisão que a partir convergem e colidem entre si,das periferias se voltavam para o que rompe com abordagenso exterior utilizando conexões holísticas para a cultura e aemergentes com audiências sociedade (CURTIN, 2003).deslocadas que ansiavam porconteúdo de seu país de origem” A televisão, com seus formatos(KEANE, 2006, p. 838). Para e produtos narrativos, é vistao autor, o termo “periférico” especialmente como parteperdeu relevância nos estudos de importante de um processomídia por uma série de fatores: multidirecional de conteúdos,a vivacidade do mercado da como afirma Curtin (2004, p.televisão via satélite e a cabo; 270), “embora as exportações deo crescimento da coprodução Hollywood continuem a dominarinternacional; a intensificação das o mercado de entretenimentoaquisições e fusões transnacionais; mundial, os debates sobre fluxosa troca de gêneros e formatos transnacionais de televisãoentre diferentes mercados; e o foram além da tese imperialistacrescimento de consumo de mídia da mídia, para se concentrar empela classe média em países em deliberações sobre a globalização”.emergentes. Os produtos televisivos fazem parte de acordos estabelecidosPraticamente todos os países do tanto no âmbito local e regional,mundo produzem e consomem quanto nacional e global, queconteúdo audiovisual e essa operam dinamicamente em váriasdiversidade cultural condiciona esferas: econômica, institucional eo surgimento de posturas tecnológica.anti-hegemônicas de caráterglobalizante. Neste contexto, a Centros transmídia e os fluxos denoção globalização das mídias conteúdo audiovisualdeixa de ser compreendida como Na perspectiva da convergênciauma força unidirecional, sinônimo midiática, o fluxo de conteúdode homogeneização cultural ou de audiovisual por espaçosdominação cultural do ocidente geográficos diversos (Ásia,
39Europa e América Latina, entre soft power4 e de microempresasoutros) não é mais controlado atrás de inovações nas mídiasapenas pela lógica do broadcast e na criação desmaterializada”dos grandes conglomerados de (MARTEL, 2012, p.15).mídia. A entrada no mercado deempresas de telecomunicações O novo padrão de fluxosse constitui num dos principais multilaterais de conteúdostemas da convergência ao produzir audiovisuais, como observa oalterações significativas nos pesquisador norte-americanoesquemas tradicionais da indústria Michael Curtin (2003), nãocultural. Jenkins (2008) denomina envolve necessariamente trocasesse fenômeno típico da cultura entre Estados soberanos, mas departicipativa como convergência localidades específicas, cidadescorporativa e convergência que se tornaram centros dealternativa, onde conflitos surgem finanças, produção e distribuiçãodevido à possibilidade de o de programas de televisão, empúblico participar e interferir numa especial. São cidades que seobra, mesmo que seja contra os estabelecem como capitais deinteresses das corporações de mídia, ou seja, espaços geográficosmídia. que funcionam como centros de mídia para atividade daA associação entre a economia criativa audiovisual,telecomunicação e a lógica que apresentam suas própriasde broadcast evidencia que as lógicas que não correspondemrelações da indústria cultural necessariamente aos interessescom o audiovisual é apenas um políticos do Estado-nação. Essasdos aspectos das ‘indústrias capitais de mídia, a exemplode conteúdos’. Atualmente, é de Hong Kong e São Paulo, sãocomercializada uma gama de locais de mediação, onde forçasserviços, conteúdos, formatos e complexas interagem, como apropriedades intelectuais. Mesmo cultural, economia e a política.a imagem de uma ‘indústria’ Segundo Curtin, esses fluxoscomo engrenagem da economia “emanam de cidades particulares,global das mídias se encontra que se tornam centros de finanças,em questionamento, pois não se produção e distribuição” (CURTIN,trata apenas de “indústrias, mas 2003, p. 203) de produtostambém de governos em busca de audiovisuais, especialmente
obras ficcionais seriadas voltadas grande fluxo comercial – como umpara televisão, em diferentes centro portuário ou ferroviário,plataformas, que atendem ou atividades como o turismo –audiências internas e externas. fatores que permitem não apenas o fluxo e a troca econômica, masUma cidade como Hong Kong, também de valores culturaisum dos principais focos de análise diversos. Curtin (2007) classificado autor, possui um grande as capitais de mídias em duasvolume de produções audiovisuais principais categorias: a) comerciais,voltadas para televisão, visando com destaque para a lógicanão apenas atender uma audiência de migração criativa e cultural,local, mas também outras cidades dinâmica econômica e produçãocomo Taipei, Beijing, Amsterdam, voltada para a audiência;Vancouver, Bangkok, dentre b) oficiais, com o controleoutros. “O nó central de toda e financiamento do Estado;essa atividade é Hong Kong, produções ideológicas orientadasmas as lógicas que motivam o por uma lógica cultural fechada,desenvolvimento do meio não e economicamente marcadasão regidas principalmente pelos pelo monopólio da comunicaçãointeresses do Estado chinês” e pela forte burocratização das(CURTIN, 2003, p. 204), mas trocas comerciais. O Autor definepelo fluxo cultural e econômico como principais fatores para oque circunda o espaço urbano, estabelecimento dessas categoriasconfigurado como centro de a interação de três princípios:mídia. Em contraste, cidades comoBeijing possuem grande parte de (1) acumulação;sua produção capitaneada pelosinteresses do Estado chinês, mas (2) fluxos migratórios criativos;inserida dentro do contexto global. (3) variáveis socioculturais.A constituição desses espaços sedá mediante fatores confluentes Tendo em mente as questõesà formação e estruturação geográficas citadas anteriormente,econômica de uma cidade, como que permitem o fluxo econômicouma geografia que os coloque de uma região, tais condiçõesperto de centros de poder ou viabilizam a acumulação deque ajudem a sustentar um recursos necessários para investimentos para os mais
41diversos setores. De um lado, um boas condições de trabalho e boacentro econômico deve concentrar qualidade de vida na cidade. See integrar diversas frentes de bem-sucedida nesses quesitos,trabalho a fim de reduzir tempo uma capital de mídia é capaz dee recursos para manufatura de se conduzir para a construção deprodutos e, por outro, aprimorar uma forte rede entre comunidadesa distribuição a fim de atender criativas de diversos interessesoutras regiões. Tal dinâmica, econômicos e culturais, não sendosegundo Curtin (2007), estabelece restrita apenas ao audiovisual,a acumulação como primeiro mas abrangendo setorespasso para constituição de uma voltados a explorar a cultura e aseconomia dinâmica e atrativa, que propriedades intelectuais criadasnão apenas retém recursos, mas nesse ambiente.também se foca em atender outrasregiões para expansão do capital. Por trás desses princípios ainda há outras forças que envolvemToda essa dinâmica que provém variáveis socioculturais, queda acumulação contribui para envolvem instituições nacionaisa construção de clusters de e locais com papéis relevantesempresas dos diversos setores, nas dinâmicas de produçãofocados na inovação de produtos, em especial. O Estado, porserviços e de distribuição. exemplo, é um ator importantePara as capitais de mídia, tal na regulamentação ou nodemanda requer que elas sejam financiamento da comunicação,atendidas por uma mão de obra podendo criar incentivos paraqualificada. As cidades precisam produção e exportação deatrair fluxos migratórios criativos, produtos culturais de interesseque as abasteçam com pessoas nacional ou regional, criar barreirasmotivadas para um trabalho tanto ou cotas para empresas dede inovação estética, quanto de comunicação ou obras estrangeirasmercado, “ainda que o casamento no país, além de determinar aentre arte e comércio nunca seja legislação de concessões defácil” (CURTIN, 2007, p. 14). Mas rádio e televisão e as normas queo maior desafio, para o autor, não dizem respeito a propriedadesé apenas atrair pessoas criativas, intelectuais.mas mantê-las por valores que nãosão puramente econômicos, como
Além da primeira classificação b) informal, quando não éentre comercial e oficial, e um processo de negociaçãoos princípios para formação formalmente estabelecido,das capitais de mídias, Curtin prevalecendo acordos abertos.(2003) estabelece um segundoeixo de categorização que O gráfico 1 representa algunsaponta qualidades referentes exemplos de centros de mídiasaos processos comerciais e alinhados às classificaçõesinstitucionais estabelecidos: estabelecidas por Curtin (2014).a) formal, em que as negociações Porém, é interessante percebersão vinculadas a processos formais as limitações existentes ao see burocráticos bem claros; adotar uma noção única deGráfico 1 – Centros de Mídia classificados segundo Michael Curtin (2014)
43capital de mídia – muita atrelada que possa se desenvolver meioàs políticas econômicas de uma a rede de plataformas midiáticas,localidade. O pensamento por que fujam a acordos comerciaistrás deste conceito se prende a das tradicionais indústrias doquestões geográficas, num debate entretenimento.entre o global e o local, dentreoutras questões relacionadas Por esse viés, a noção de centrosà burocracia e os interesses do transmídia surge com a ideiamercado e do Estado, com suas de um nó nas redes de relaçõespolíticas de manutenção da que fluem por plataformaseconomia conforme os interesses midiáticas, conforme as demandasculturais locais – tudo dentro de criativas e de mercado - queuma dinâmica de conglomerados não envolvem unicamente amidiáticos, seguindo o criação de conteúdos, mas adesenvolvimento de propriedades criação de soluções igualmente,intelectuais em meios de com produtos que convergemcomunicação específicos, sem experiências de consumo midiáticorelacioná-los em uma estratégia em multiplataformas em suastransmídia ou de sinergia entre diversas faces tecnológicas e demarcas. Há um cenário de linguagem. O centro transmídiaelementos relevantes ao considerar envolve empresas tradicionais deo conceito de capital de mídia, comunicação e empresas startupsentretanto é necessário um de inovação – dotadas de relaçõesentendimento amplo que consiga transitórias e geolocalizadas, ouabarcar questões contemporâneas, seja, que podem transitar seude uma produção tecnológica núcleo/centro (core) por diversosem rede, que foge da noção de locais conforme interessesconstrução de conglomerados diversos.ou de fronteiras geográficas – oumesmo de interesses puramente Centros transmídia são como nóseconômicos. Deve-se pensar em de uma rede criativa de produçãoum conceito que vá pelo viés de em diferentes frentes profissionais,construção coletiva, que permita que convergem conhecimentos,o experimentalismo e a inovação, vindo a inovar em novos modelossem um território efetivo ou uma de negócio e produção. Arranjosidentidade local fixa, que siga um que podem se estratificarcaminho mais fluído e ambíguo, localmente ou mesmo em rede
através de plataformas midiáticas, cultural sustentável, procurandorelacionados e distribuídos com por um lado “combinar recursosoutros nós, a fim de manter a públicos e privados, enquanto,cadeia produtiva de um circuito por outro, ajudar e sustentareconômico emergente - a exemplo microcomunidades ou círculosdo YouTube, com suas Redes de oposição que não possuemMulticanais (Multichannel Networks nenhum valor comercial” (CURTIN,– MCN) - redes que agregam 2015, p. 25), com ações de longomilhares de canais afiliados, não prazo que busquem promover umasão de propriedade de YouTube, variedade de recursos culturais emmas parceiras da empresa, diversas escalas geográficas.utilizando a sua plataforma devídeo para distribuir, rentabilizar e Nesse sentido, em um contextogerir conteúdos de vídeo criados brasileiro, podemos apontarpelos seus talentos afiliados a existência de iniciativas(VOLLMER; BLUM; BENNIN, 2014). governamentais para constituições de Arranjos Produtivos LocaisOs centros transmídia, tais como (APLs) no campo da comunicaçãoas capitais de mídia, além de e do audiovisual para a criaçãouma infraestrutura tecnológica de centros transmídia no país. Oe econômica, necessitam de Arranjo Produtivo Local (APL), ouum importante elemento que cluster (denominação em inglês), éé o fomento e manutenção da um conceito que pode ser utilizadoforça criativa de trabalho – com para pensar como empresas,melhores condições de vida, lazer, indústrias e profissionais podeme a integração e diversidade de se aglomerar e criar modelos deprojetos criativos que criem novas cadeias de produção nos maisoportunidades de aprendizagem diversos segmentos de mercados.e emprego – um ponto que, como Esses arranjos são criadoscomenta Curtin (2015), as políticas para estimular o crescimentode comunicação negligenciam em mútuo e propiciar a inovaçãofavor de interesses empresariais ao realizar práticas cooperativase institucionais. Nessa questão, de produtos, serviços, mão deo próprio autor coloca que é obra, conhecimento, estruturapreciso ir além de uma visão e tecnologia entre empresaseconômica da criatividade, para e indústrias geograficamentebuscar uma forma de gestão próximas, assim como podem fazer
45com APLs de outras regiões, nos Se os cenários das mídias estãoquais as atuações são similares ou configurando-se como rede, ascomplementares (PORTER, 1998). cidades tornam-se os nós de onde pulsam os conteúdos de mídia.Como comenta Coelho (2012), Talvez as atividades midiáticas deem abril de 2010 a Secretaria do uma região geográfica, como emAudiovisual (MinC) apresentou uma cidade, sejam mais diluídaspara discussão a Política Nacional e transformadoras do que umapara Conteúdos Digitais (PNCD, ideia de capital (que remete a2010), propondo criação de institucionalização, setorização,programas do governo federal geografia estabelecida, autoridadeque visam convergir e desenvolver política, etc. ). Compreende-se queas cadeias produtivas do setor do um centro transmídia é uma capitalaudiovisual e mídias interativas, de mídia, mas inserida na lógicaadotando a estratégia de formar da convergência, e as análisesarranjos produtivos locais de realizadas da cidade de São Pauloconteúdo digital, com a criação como tal (permeada por outrospolos de produção de acordo com centros brasileiros), convergema vocação de cada região (PNCD, para uma rede inovadora de2010, p. 22). produção e distribuição de conteúdo audiovisual paraNeste aspecto, paralelamente multiplataformas.as análises em curso sobre ascapitais de mídias e a economia Centro transmídia da cidade decriativa, existem novas questões São Pauloa serem discutidas, que pedem Historicamente, ocorre umauma releitura desses conceitos. concentração dos setores deSe imaginarmos um contexto em mídia ligados aos grandesque a convergência de mídias conglomerados de comunicaçãovem se colocando cada vez mais na região Sudeste, especialmentecomo um modelo tecnológico, no Estado de São Paulo. Essaeconômico, produtivo e de realidade promove a concentraçãoconsumo, os limites e setores dos capitais financeiros eentre os meios de comunicação e comunidades criativas do setoros serviços de telecomunicações nessa região. Esse modelo desão cada vez mais irrelevantes, negócio centralizado favorece aprevalecendo a lógica em rede. criação e o desenvolvimento de
produtos audiovisuais com traços estes encontros (CANCLINI,identitários relacionados à cultura 2011). De acordo com Canclinilocal e/ou regional. No entanto, (2011), desse encontro resulta ao acelerado desenvolvimento formação de gêneros impuros,tecnológico produz uma série de cuja desarticulação cultural éinovações no tradicional modelo marcada por dois processos:de negócio do audiovisual, o descolecionamento, que dáalterando a lógica de operação do sentido, sobretudo, ao fim dapróprio mercado. A cidade de São produção de bens culturaisPaulo, cosmopolita de formação e colecionáveis, produzindomulticultural por vocação, acolheu, a quebra de divisões entreao longo de sua história, inúmeras diferentes modalidades delevas de imigrantes que marcaram cultura, principalmente devidoa paisagem da cidade com traços ao desenvolvimento dos recursosda cultura portuguesa, espanhola, tecnológicos que permitem queitaliana, alemã, japonesa, argentina um bem cultural seja reproduzidoe boliviana, entre outras. e disponibilizado mais facilmente para o público em geral.A cidade de São Paulo operatais mudanças reconhecíveis no Por outro lado, ainício dos anos de 1950, onde desterritorialização rompecomeça a haver a transformação definitivamente com asde sua malha territorial. Naquele barreiras geográficas físicasmomento, os espaços da cidade ao descentralizar os polos dejá concentram uma significativa produção cultural, permitindo queimigração estrangeira e começara, diversas instituições interajam detambém, a ganhar contornos forma mais natural e harmoniosa,de um maior crescimento com possibilitando migrações efetivasa emigração interna (CASTRO & e trocas simbólicas entre os novosBACCEGA, 2009, pp.172). mercados estabelecidos. Em linhas gerais, o multiculturalismo é vistoEsse processo de mescla/fusão de como um espaço que possibilita odiferentes culturas num mesmo diálogo entre as culturas e permite,espaço acaba por gerar um novo entre outros fatores, a consolidaçãomodelo de cultura marcado pela de determinadas localidadeshibridização dessas manifestações, como centros transmídia, quandocujas práticas multiculturais são observamos a cultura audiovisualpossibilitadas justamente por contemporânea.
47Segundo o autor, os estudos Neste sentido, a cidade de Sãode Martin-Barbero apontam Paulo se caracteriza por suaque formas culturais complexas vocação de atrair pessoas dedas experiências cotidianas damigração, e que são memória Valorizar a criatividadepopular da América Latina, é desenvolver aencontraram expressão na unicidade que marca umprodução cultural das empresas determinado local, o quede comunicação no século acaba por determinarXX. Neste sentido, um centro seu reconhecimentotransmídia oferece algo mais que perante o público.infraestrutura física e tecnológica,fazendo uso do talento e da todas as partes do país e essecriatividade de seus moradores histórico a credencia como umpara encontrar soluções, superar centro que agrega a sede deproblemas e conhecer a si mesmo, “importantes empresas produtorassabendo que sua cultura é única de todos os tipos de mercadorias,e que só poderá ser encontrada onde o audiovisual poderianaquela localidade específica. ser um importante instrumento de divulgação, modernização,Valorizar a criatividade é aperfeiçoamento, competitividadedesenvolver a unicidade que e expansão destas empresas”marca um determinado local, o (GATTI, 2013, p.7). Esses fatoresque acaba por determinar seu são os alicerces para umareconhecimento perante o público. economia sustentável à cidade e seUma produção audiovisual pode estendem ao mercado audiovisual,se aproveitar das particularidades como pode ser observado nado local, ao passo que o local tabela 1 (na próxima página) sobretambém se aproveita dessa os investimentos da Secretariaprodução, ao movimentar toda a Municipal de Cultura (SMC) nocadeia produtiva relacionada a este setor Audiovisual (2005 – 2012), nasetor, além de ser um catalisador gestão de Carlos Augusto Calil.do comércio local, de atividadesculturais e demais atividadescorrelatas.
Tabela 1 - Investimento da SMC da cidade de São Paulo em Audiovisual (2005 – 2012)Ano CM R$* Filmes SP R$ LM R$ Total (R$)2005 0 - 26 2.21 0 - 2.2102006 4 0,28 0 0 14 4,0 4.282007 10 0.8 10 0.39 12 5.6 8.6842008 10 0.79 - - 14 0,96 1.752009 10 0,79 10 0.24 13 1.689 4.0332010 10 0.79 13 0.96 17 3.398 5.1712011 10 0.79 29 1.198 12 4.499 6.4962012 10 0.79 11 0.798 17 4.0** 9.477Total 74 3.45 99 4.756 99 24.146 42.1Fonte: Gatti, 2013. ECINE - São Paulo City Film Commission.Esses investimentos foram Os investimentos da SMC de Sãodistribuídos da seguinte forma: Paulo no setor audiovisual estão em consonância com os objetivos1) Filmes temáticos sobre a cidade da criação da agência SPCine5 -de São Paulo, incluindo o projeto Empresa de Cinema e Audiovisualde documentário ‘História dos de São Paulo, uma iniciativabairros de São Paulo’, ‘Crônicas da Prefeitura de São Paulo, emda Cidade’ e outros produtos parceria com o Governo do Estadoaudiovisuais; de São Paulo e o Ministério da Cultura, por meio da Ancine6.2) Interprogramas, Virada Cultural; Criada pela Lei nº 15.930 de 20 de dezembro de 2013, ela é formada3) Webséries; pela associação da Secretaria de Cultura do Município de São Paulo4) Animação; com entidades do audiovisual que atualmente fazem parte de seualém de editais para o Comitê Consultivo7.desenvolvimento de projetosde sete (07) filmes de longa-metragem e a finalização de outrosquatro (04) filmes.
49A proposta da SPCine é de que promove a circulação de filmesatuar como uma APL – Arranjo pelas regiões da capital paulistaProdutivo Local, voltado para e LEIA – Laboratório de Inovaçãodesenvolvimento, financiamento e Experimentação Audiovisual.e implementação de programas e Recentemente, o Ministério daspolíticas para o setor audiovisual, Comunicações8 e a SMC de Sãocom o objetivo de estimular o Paulo firmaram convênio quepotencial econômico e criativo do prevê o repasse de recursos paraaudiovisual paulista e seu impacto o centro equipar oficinas, estúdioscultural e social da cidade a partir e laboratórios para produção dede três eixos: conteúdos digitais criativos. A implementação da APL SPCine1) Inovação, criatividade e acesso: permite analisar a cidade comoelaboração e apoio a ações um território cultural e criativo,de desenvolvimento criativo um centro transmídia. Para Andrée inovação aplicada a novas Gatti (2013, p. 6), por meio destetecnologias, formatos, linguagens estudo seria possível obter “o maise empreendedorismo no setor, completo domínio das dimensõesalém da formação, capacitação e do espaço ecrânico paulistano.requalificação profissional; Conhecer as suas principais variáveis, ou seja, sua economia,2) Promoção e o desenvolvimento cultura e importância social”.do mercado de audiovisual rumoa um cenário de sustentabilidade Outros incentivos advindos deeconômica; diversos editais de fomento da SMC de Cultura são de patrocínios3) Integração e internacionalização: e copatrocínios de produtosestímulo às coproduções, atração audiovisuais: longas e curtasde produções estrangeiras, metragens, séries de TV, websériesexportação do conteúdo e games, entre outros. O editalaudiovisual paulista e o Nº 01/2015/SMC-NFC, lançadointercâmbio cultural e de talentos. pela SPCine em parceria com o Fundo de Mídia do Canadá,A APL ‘SPCine’ é formada por uma promove o desenvolvimento derede audiovisual interconectada conteúdo audiovisual para TV,que inclui o SP Film Comission - internet e jogos eletrônicos. Estesescritório para filmagens na cidade eventos e festivais contribuemde São Paulo; o Circuito Cultural SP
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