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Published by ismaelmoura4, 2016-06-28 06:16:11

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A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. The Legal condition of Optometry in Brazil Post - 88 . José Roberto Lopes da Silva Filho1RESUMOHá anos existe uma divergência jurídica entre oftalmologistas e optometristas sobre de quem é areal competência para prescrever orteses e próteses oftalmológicas. Vale esclarecer que orteses: sãoobjetos utilizados junto ao corpo temporariamente como, por exemplo, óculos e lentes de contato;enquanto próteses: são objetos implantados ao corpo. Os oftalmologistas defendem que talprescrição é exclusiva de ato médico enquanto os optometristas defendem argumentação contraria eadvogam que a atividade da optometria, é reconhecida desde 1932 pelo decreto 20.931 e que suaatividade está regulamentada pelo Código Brasileiro de Ocupações. Este trabalho pretendeprimeiramente conceituar tanto a palavra “Optometria”, como a atividade do “Optometrista”,analisando os aspectos jurídicos e legais existentes na Constituição atual e em demais Leisinfraconstitucionais. Tem o propósito de demonstrar, dentro do plano constitucional, o direito deuma pessoa optar em exercer toda e qualquer profissão desde que atendidas suas qualificaçõeslegais exigidas, caso haja tal exigência expressa em Lei.Essa demonstração será feita através deuma evolução histórica, analisando todas as Leis inerentes à categoria da Optometria até omomento atual, demonstrando quais aspectos constitucionais são relevantes para constatar alegalidade da profissãoPalavras-chave: Optometria, legalidade, exercício profissional.ABSTRACTFor years there is a legal dispute between ophthalmologists and optometrists about who is the realpower to prescribe orthotics and prosthetic eye. It is worth clarifying that orthotics: objects are usedby the body temporarily, for example, glasses and contact lenses; while prostheses: objects aredeployed to the body. Ophthalmologists argue that such prescription is exclusive of medical act asoptometrists defend and advocate that argument contradicts the activity of Optometry, has beenrecognized since 1932 by Decree 20,931 and its activity is regulated by the Brazilian Code ofOccupations. This paper aims first to conceptualize both the word \"Optometry\" as the activity of\"Optometrist\", analyzing the legal and juridical aspects existing in the current Constitution andother laws infra. It aims to demonstrate, within the constitutional level, the right to choose a personto exercise any profession since met their legal qualifications, if there is such a demand expressedin Lei.Essa demonstration will be done through a historical evolution, analyzing all laws related tothe category of Optometry to the present time, showing which constitutional aspects are relevant toestablish the legality of the professionKeywords: Optometry, legality , professional practice.1 Bacharel em Direito, pós graduado em Direito Constitucional e Processo Constitucional, pesquisador daárea Optométrica no Brasil. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

3A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. 1. INTRODUÇÃO De acordo como Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, optometria é umsubstantivo feminino que deriva de duas palavras gregas: opto que significa visão, maismetria que quer dizer medir, sendo assim optometria nada mais é do que medida da visão. Com essa definição fica fácil de perceber que optometrista equivale a um especialistaem optometria, ou seja, um especialista em medida da visão, segundo dicionário Aurélio dalíngua portuguesa ( p. 1514 ). De lima, em sua obra: Optometria Legal no Brasil traz definições mais abrangentessobre Optometria e Optometrista dizendo o seguinte, na página 13 mais precisamente: A Optometria é a ciência da área da saúde ligada à física que trata da visão principalmente dos problemas de saúde primários, não patológicos, sobre o ponto de vista físico. O Optometrista não utiliza nenhum procedimento ou conhecimento invasivos, ele só observa e aplica técnicas de avaliação quantitativa e qualitativa do sistema de visão do paciente e é considerado preventivo. Caso o profissional encontre qualquer problema ou alteração ocular de origem patológica, ele esta apto a reconhecê-lo e a encaminhar a um especialista. O papel de do Optometrista é avaliar e medir a estrutura da visão em aspectos funcionais e comportamentais, além de propor meios ópticos de correção dos defeitos encontrados no globo ocular. O mesmo autor fecha sua linha de raciocínio e informação sobre a área e oprofissional pesquisado com uma importante informação transcrita em sua página 15: “O optometrista é preparado para resolver alterações visuais não patológicas, querepresentam quase 80% de todo os casos de problemas visuais”. O Art. 1º, da nossa Constituição traz como um dos seus princípios fundamentais: “osvalores sociais do trabalho”, isso significa dizer que o trabalho é algo fundamental paranossa lei maior, pois sem trabalho a pessoa humana não tem, na sua plenitude, o alcance àsua dignidade humana contemplada, pois o trabalho dignifica o homem. O Art. 5º, inciso XIII, também da nossa Constituição, estabelece que: “é livre oexercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as qualificações profissionaisque a Lei estabelecer”. Sendo assim, se não existe Lei estabelecendo que a prescrição deórtese oftalmológica seja ato exclusivo de médico, por que o optometrista não pode fazeressa prescrição, já que para o princípio da legalidade ninguém é obrigado a fazer ou deixarfazer algo, senão em virtude de Lei? Qual a importância social e econômica dessa profissão para a sociedade brasileira,tendo em vista que a demanda de profissionais para atuar na atenção primaria da saúdevisual é insuficiente no País e a profissão gera emprego e renda de forma direta e indireta? Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

4A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Ai estão os questionamentos que deverão ser enfrentados, de formaconstitucionalmente técnica, neste trabalho. Do tipo exploratória, a pesquisa focou sobre os direitos fundamentais da Constituiçãoatual, principalmente no que diz respeito ao valor social do trabalho e a livre iniciativa,bem como o livre exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas asqualificações que a lei estabelece, onde foram utilizados métodos de pesquisa bibliográficae observância do respeito à dignidade humana do profissional em Optometria, uma vez queem que se partiu do princípio de que o trabalho dignifica o homem.2. NOÇÕES DE TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.2.1direitos humanos e direitos fundamentais: expressões sinônimas? Não, não são sinônimas, pois existe uma distinção entre as duas expressões, muitoembora não seja esta a impressão inicial. Desta forma, Direitos Humanos é uma expressão utilizada para identificar valoresnormativos trazidos em tratados, pactos ou convenções internacionais enquanto DireitosFundamentais são expressões utilizadas para identificar valores normativos positivados emuma Constituição. Seguindo essa linha de raciocínio o professor Paulo Bonavides, na 25ª edição do seulivro Curso de Direito Positivo, mais precisamente na página 560 diz que: (...) direitosfundamentais são aqueles direitos que o direito vigente qualifica como tal. O trazido até o momento, não foi ainda capaz de expressar a importância dos direitosfundamentais em uma Constituição e visando preencher essa lacuna, podemos citar GeorgeMarmelstein(2014) que em sua obra Curso de Direitos Fundamentais, 5ª edição, ensina, apartir da pagina 15 que: Os direitos fundamentais são os valores básicos para uma vida digna em sociedade e eles estão intrinsecamente ligados à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder, pois em um ambiente de opressão do Estado não há espaço para uma vida digna. O autor destaca ainda que: Os Direitos Fundamentais, que tem a Constituição como fonte primaria, são normas jurídicas intimamente ligadas à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder, positivadas no plano constitucional de determinado Estado Democrático de Direito, que, por sua importância axiológica, fundamentam e legitimam todo ordenamento jurídico. Na constituição vigente do Estado Brasileiro os direitos e garantias fundamentaisestão contemplados no título II que abrange desde o Art. 5º até o Art. 17, de modo que eles Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

5A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.são tão importantes para a vida de um cidadão, que Uadi Bulos, em seu livro Curso deDireito Constitucional, edição de 2007, precisamente na página 401, afirma que: Sem osdireitos fundamentais, o homem não vive, não convive, e, em alguns casos, não sobrevive. Para exemplificar a importância das garantias fundamentais em nossas vidaspodemos nos valer do que determina o principio da legalidade, que está posto no inciso II,do Art. 5º da Constituição Federal que traz a seguinte redação: ninguém será obrigado afazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Bem, este princípio é exercido de forma diferente entre o particular e a administraçãopública, quer dizer, para o particular: nada que está proibido, está permitido, ou seja, paraque o particular não possa fazer algo ou alguma coisa, isso deve estar previsto em Lei, porexemplo: é proibido ingerir bebida alcoólica e logo após dirigir. Em contra partida, aadministração pública só poderá fazer algo caso a Lei diga que terá que fazer. Muitas vezes a vigilância sanitária, ao fiscalizar uma óptica, por exemplo, argumentauma infração instada no Art. 16 do Decreto 24.942/1934, que traz a seguinte redação: Oestabelecimento comercial de venda de lentes de grau não pode ter consultório médico, emqualquer de seus compartimentos ou dependências, não sendo permitido ao médico suainstalação em lugar de acesso obrigatório pelo estabelecimento. O que se pode perceber é que existe uma vedação de consultórios de médicos e nãode Optometristas no interior de uma óptica, porém, geralmente o fiscal sanitarista aoencontrar um Optometrista com seu consultório no interior de uma óptica,automaticamente faz uma analise prejudicial ao profissional, análise essa não contempladaou permitida por Lei. Ora, se não existe uma Lei proibindo um Optometrista de atender no interior de umestabelecimento de venda de lentes de grau, é por que essa pratica lhe é permitido, o quenão ocorre com relação aos médicos, caracterizando assim, crime de abuso de autoridade,caso a autoridade sanitária queira fechar o estabelecimento por esse motivo, conforme Art.3º, alínea j. Lei 4.898/1965; Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. Eis aqui um pequeno exemplo da importância das garantias fundamentais que freia aatuação da administração pública, impossibilitando ofensa à dignidade humana de quematua nesse seguimento. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

6A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. A sociedade como um todo, desenvolve sua cultura, seus comportamentos e suasnecessidades ano após ano e, como não poderia deixar de ser diferente, o direitoobrigatoriamente acompanha esses desenvolvimentos sociais proporcionalmente. A primeira dimensão dos direitos fundamentais, conforme pensamento de MarceloNovelino (2010) ocorreu no final do século XVIII com as revoluções liberais (francesa enorte-americana) onde a principal reivindicação era a limitação do poder do Estado emrazão das liberdades individuais. Nesta época nasceram as primeiras Constituições escritas consagrando os direitoscivis e políticos no mundo, que por sua vez valoraram o lema da liberdade, consagradacom a Revolução Francesa. George Marmelstein (2014) preconiza que os direitos fundamentais foram criados,inicialmente, como instrumento de limitação do poder estatal, visando assegurar aosindivíduos um nível máximo de fruição de sua autonomia e liberdade. Ou seja, elessurgiram como barreira ou escudo de proteção dos cidadãos contra a intromissão indevidado Estado em sua vida privada e contra o abuso do poder. São exemplos de Direitos Fundamentais de primeira geração dentre outros, oprincipio da legalidade, já exemplificado no final do tópico 1.1, bem como àinviolabilidade de domicilio, trazida pela nossa Constituição, no seu Art. 5º, inciso XI quereza que: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar semconsentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestarsocorro e ainda durante o dia, por determinação judicial. Vale a pena informar que em nossa Constituição o conceito de casa é bem maisamplo do que aparenta aos nossos olhos, não tocando assim apenas “a casa” (residência doindividuo). Esse conceito se estende a qualquer compartimento privado não aberto ao público,como por exemplo, as dependências privativas de uma empresa, ou o consultório de umOptometrista. Oportuno se faz lembrar que, os compartimentos abertos ao público não sãoconsiderados asilos invioláveis. Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2012) comentam na pagina 139 que: “essedispositivo colocou fim na possibilidade de determinações administrativas de busca eapreensão de documentos, práticas hoje absolutamente inconstitucionais”. Sob a vigênciado atual texto constitucional, busca e apreensão só são legítimas se determinadas pelopoder judiciário. Assim, ressalvadas as situações excepcionais no Art. 5º, XI daConstituição, se não houver consentimento, as autoridades administrativas (fiscais Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

7A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.fazendários, trabalhistas, sanitários, ambientais e servidores congêneres) somente poderãoadentrar nas dependências do administrado se munidos de ordem judicial. Assim sendo, a autoridade que invadir local restrito (não aberto ao público) deempresas ou consultórios Optométricos, por exemplo, estarão cometendo crime de abusode autoridade conforme Art. 3º, alínea b da Lei 4.898/65. Lei 4.898/1965; Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: b) à inviolabilidade de domicilio; Os direitos fundamentais de segunda dimensão surgiram com um propósito diferentedos direitos fundamentais de primeira geração, é que no século XX após a consolidação darevolução industrial o mundo presenciou um momento de grande desenvolvimento, porém,este desenvolvimento acontecia sem o devido respeito aos direitos sociais, econômicos eculturais de grande parte da população principalmente aos trabalhadores. Desta forma, o Estado não estabelecia carga horária semanal de trabalho, saláriomínimo, direito a descanso remunerado semanal, muito menos férias. Estes problemasacarretaram revoltas entre os trabalhadores que aos poucos foram se organizandopoliticamente para dia após dia lutarem por melhores condições de trabalho e,consequentemente, por melhores condições de vida. Desta feita se percebeu que o Estado deveria atuar de forma positiva, ao contrario doque acontecia na primeira geração dos direitos fundamentais, para que se pudesse impor e,consequentemente, assegurar os direitos: sociais, culturais e econômicos dos seustrabalhadores e do seu povo. A terceira dimensão dos direitos fundamentais consagra o terceiro lema da bandeiradefendida na Revolução Francesa: a fraternidade. Essa dimensão de direitos fundamentais nasceu no final do século XX (segundoPaulo Bonavides) com a preocupação de amenizar as diferenças entre países desenvolvidose subdesenvolvidos (conforme Marcelo Novelino) e objetiva privilegiar os direitos difusos(direitos destinados à todos sem distinção de grupos sociais) .bem como os direitoscoletivos (direitos destinados à um determinado grupo social) Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2012) registram na página 103 que os direitosfundamentais de terceira dimensão não se destinam especificamente a proteção dosinteresses individuais de um grupo ou de um determinado Estado. Sua titularidade é difusaou coletiva, haja vista que tem por preocupação a proteção de coletividades, e não dohomem individualmente considerado. Representam uma nova e relevante preocupação com Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

8A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.as gerações humanas, presentes e futuras, expressando a ideia de fraternidade esolidariedade entre os diferentes povos e Estados soberanos. Marcelo Novelino (2010 pg.356) destaca: “A quarta dimensão de direitosfundamentais pode ser associada à pluralidade. São direitos como a democracia, ainformação, e o pluralismo, os quais foram introduzidos no âmbito jurídico em razão daglobalização política”. Paulo Bonavides observa que esses direitos compreendiam o futuroda cidadania e correspondem à derradeira fase da institucionalização do Estado social,sendo imprescindíveis para a realização e legitimidade da globalização política. Pedro Lenza (2012) cita pensamento do jurista italiano Norberto Bobbio referente aquarta dimensão dos direitos fundamentais e diz que: referida dimensão de direitosdecorreria dos avanços na engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existênciahumana, por meio da manipulação do patrimônio genético. Segundo o mestre italiano: “...já se apresentam novas exigências que só poderiam chamar-se de direitos de quartadimensão, referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos de pesquisa biológica, quepermitirá manipulações do patrimônio de cada individuo. Pedro Lenza, agora na página 961 da mesma obra faz o seguinte comentário arespeito do direito fundamental de quinta geração: Conforme já dissemos, o direito à paz foi classificado por Karel Vasak como de 5ªdimensão. Contudo, Bonavides entende que o direito à paz deva ser tratado em dimensãoautônoma, chegando a afirmar que a paz é axioma da democracia participativa, ou, ainda,supremo direito da humanidade. Após o comentário de todas as dimensões existentes em nossa doutrina até omomento, interessante se faz insculpir o ensinamento dos autores Vicente Paulo e MarceloAlexandrino que, na pagina 104, dizem: Finalmente, vale ressaltar que uma nova dimensão de direitos fundamentais não implica substituição ou caducidade dos direitos das gerações antecedentes. Ao revés, os direitos das dimensões antecedentes permanecem plenamente eficazes, e atuam como infraestruturais das dimensões seguintes. O que acontece, na maioria das vezes, é que os direitos integrantes de uma geraçãoantecedente ganham uma outra dimensão, novo conteúdo e alcance, com o surgimento deuma dimensão sucessiva. Os direitos das dimensões posteriores se transformam empressupostos para compreensão e realização dos direitos da geração anterior. Por exemplo:o direito individual de propriedade, de primeira dimensão, nasceu no Estado liberal, comfeição tipicamente privada, portanto; com o surgimento da segunda dimensão de direitosfundamentais, adquiriu feição tipicamente social, a partir da exigência dos textos Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

9A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.constitucionais de que a propriedade atenda à sua função social; modernamente, com oreconhecimento dos direitos fundamentais de terceira dimensão, a propriedade deverárespeitar, também, as leis ambientais. 2.2 As perspectivas subjetivas e objetivas dos direitos fundamentais A perspectiva subjetiva dos direitos fundamentais, diz respeito à obrigação que oEstado tem, de garantir os direitos fundamentais a cada pessoa da sociedade de formaindividual, garantindo inclusive o desenvolvimento de mecanismos eficazes de respeito,proteção e promoção desses direitos fundamentais. Esses direitos fundamentais exercem uma força normativa tão importante, queGeorge Marmelstein, em obra já citada neste trabalho, na página 298, faz o seguintecomentário: Os direitos fundamentais, por serem normas jurídicas, são direitos exigíveis e justificáveis, ou seja, podem ter aplicação forçada através do Poder Judiciário. É o que os constitucionalistas chamam de (perspectiva) “dimensão subjetiva”, expressão que simboliza a possibilidade de os direitos fundamentais gerarem pretensões subjetivas para seus titulares, reivindicáveis na via judicial. Assim, caso o Poder Público deixe de cumprir com os deveres de respeito, proteção e promoção a que está obrigado, poderá ser compelido a fazê-lo forçadamente por força de um processo judicial. Após analise de tudo que foi dito até agora, interessante se faz a seguinte pergunta: equando o direito fundamental não está posto nem na Constituição e nem na normainfraconstitucional? George Marmelstein(2014,pg.302) afirma que: Em hipótese alguma um direito fundamental pode deixar de ser concretizado pela ausência de lei. Se determinado direito fundamental está deixando de ser efetivado por ausência de regulamentação infraconstitucional, cabe ao judiciário tomar as medidas cabíveis para que o direito não fique sem efetividade. Em outras palavras: o juiz, no atendimento concreto das providencias que se revelem indispensáveis para concretizar dado direito fundamental, pode (e deve) atuar independente e mesmo contra a vontade da lei infraconstitucional, pois, para efetivar os preceitos constitucionais, não é preciso pedir autorização a ninguém muito menos ao legislador. A aplicação direta e imediata dos direitos fundamentais implica, ainda, oreconhecimento da possibilidade de surgirem direitos subjetivos diretamente daConstituição. Ou seja, a norma constitucional torna-se fonte direta de comandos eobrigações aos órgãos públicos, com força normativa autônoma, independe de qualquerregulamentação. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

10A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Sendo assim, qual análise se deve fazer dentro de uma perspectiva subjetiva dosdireitos fundamentais, de uma profissão cuja as qualificações de seu exercício não foramestabelecidas em Lei, conforme mandamento do Art. 5º, inciso XIII, da Constituiçãovigente? Art. 5º (...) XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as qualificações que a leiestabelecer. Vejamos, em 2002 foi dada entrada no Senado Federal, o projeto de lei de número268. Neste projeto, mais precisamente no artigo 4º, inciso IX, dizia que: São atividadesprivativas do médico a prescrição de órteses e próteses oftálmicas. Em 2013 nasceu a Lei 12.842 (que ficou conhecida pela alcunha de Lei do AtoMédico) que vetou o mandamento acima citado retirando dos médicos, a competênciaprivativa da prescrição de órteses e próteses oftálmicas, ocasião em que a justificativautilizada para tanto, foi a de que a manutenção do texto original do projeto 268 trariaimpacto negativo ao atendimento à saúde nessas hipóteses, segundo as razões do veto. Alheio ao que fora explicado acima, os autores Vicente Paulo e MarceloAlexandrino, em obra já citada neste trabalho, mais precisamente na página 143, salientamque: Assim, enquanto não estabelecidas em lei as qualificações para o exercício de determinada profissão, qualquer individuo poderá exercê-la. Quando estabelecidas as qualificações profissionais pelo legislador, somente aqueles que cumprirem tais qualificações poderão exercer a profissão. Já a perspectiva objetiva dos direito fundamentais, se dá dentro de uma ideia de queos direitos fundamentais exercem um valor axiológico dentro do ordenamento jurídico deum país, de modo que a interpretação das normas infraconstitucionais devem ser irradiadase decididas conforme interpretação da Constituição, ou seja, conforme os direitosfundamentais. George Marmelstein (2014,pg 332) faz a seguinte consideração: A dimensão objetiva dos direitos fundamentais nada mais é do que a capacidade que esses direitos possuem de se irradiar pelos diversos ramos do ordenamento jurídico, como manifestação da “ordem de valores” que eles representam. Ela é fruto de um dever específico de proteção que obriga que os direitos fundamentais sejam levados em conta na hora da tomada de decisões pelos agentes públicos. Imagine, a título ilustrativo, que os direitos fundamentais funcionem como uma espécie de óculos especial. Toda vez que o jurista tiver analisando uma norma jurídica – constitucional ou infraconstitucional – deverá colocar esse óculos para conseguir captar o sentido da norma à luz dos valores constitucionais, de modo que a solução buscada seja sempre compatível com esses valores. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

11A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.3. A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NA REALIDADE CONSTITUCIONAL PÓS-883.1. – Breve recorte histórico-evolutivo do regime jurídico da Optometria no Brasil A atividade de Optometrista se faz reconhecida quando da publicação do artigo 3º dodecreto lei 20.931 de 11 de janeiro de 1932 que informa que os Optometristas estãosujeitos a fiscalização e que só podem exercer a profissão aqueles que provarem suahabilitação à autoridade sanitária. Art. 3º Os optometristas, práticos de farmácia, massagistas e duchistas estão também sujeitos à fiscalização, só podendo exercer a profissão respectiva se provarem a sua habilitação a juízo da autoridade sanitária. No ano de 2002 o Ministério de Estado do Trabalho e Emprego publicou a Portaria397, aprovando assim a Classificação Brasileira de Ocupações (CBOO-2002) que traz noseu corpo, a regulamentação da profissão, informando qual sua formação e quais atividadespodem ser exercidas por estes profissionais: Classificação Brasileira de Ocupações – CBO 2.002 3223: Ópticos optometristas 3223-05 – Técnico em óptica – Contatólogo, Óptico contatólogo, Ópticoesteticista, Óptico montador de óculos, Óptico oftálmico, Óptico refracionista, Ópticosurfaçagista, Ténico contatólogo. 3223-10 – Técnico em optometria – Óptico, Óptico optometrista, Ópticoprotesista, Técnico optometrista. Descrição sumária: Realizam exames optométricos; confeccionam lentes; adaptam lentes de contato;montam óculos e aplicam próteses oculares. Promovem educação em saúde visual;vendem produtos e serviços ópticos e optométricos; gerenciam estabelecimentos.Responsabilizam-se tecnicamente por laboratórios ópticos, estabelecimentos ópticosbásicos ou plenos e centros de adaptação de lentes de contato. Podem emitir laudos epareceres ópticos-optométricos. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

12A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. 3223: Ópticos optometristas Condições gerais de exercício Exercem suas funções em laboratórios ópticos, em estabelecimentos ópticos básicose plenos, em centros de adaptação de lentes de contato, podendo, ainda, atuar no ramo devendas e em atividades educativas na esfera da saúde pública. São contratados nacondição de trabalhadores assalariados, com carteira assinada e, também, na condição deempregador. Atuam de forma individual e em equipe, sem supervisão, em ambientesfechados e também em veículos, no período diurno. Formação e experiência : O exercício dessas ocupações requer curso técnico de nível médio, oferecido porinstituições de formação profissional. O pleno desempenho das atividades profissionais sedá após o período de três a quatro anos de experiência. 3223: Ópticos optometristas Áreas de atividades A) Realizar exames optométricos 1) Fazer anamnese 2) Medir acuidade visual 3) Analisar estruturas externas e internas do olho 4) Mensurar estruturas externas e internas do olho 5) Medir córnea (queratometria, paquimetria e topografia) 6) Avaliar fundo de olho (oftalmoscopia) 7) Medir pressão intra-ocular (tonometria) 8) Identificar deficiências e anomalias visuais Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

13A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. 9) Encaminhar casos patológicos a médicos. 10) Realizar testes motores e sensoriais 11) Realizar exames complementares 12) Medir refração ocular (refratometria e retinoscopia) 13) Prescrever compensação óptica 14) Recomendar auxílios ópticos 15) Realizar perícias optométricas e em auxílios ópticos B- Adaptar lentes de contato 1) Fazer avaliação lacrimal 2) Definir tipo de lente 3) Calcular parâmetros das lentes 4) Selecionar lentes de teste 5) Colocar lentes de teste no olho 6) Combinar uso de lentes (sobre-refração) 7) Avaliar teste 8) Recolocar lentes de contato 9) Recomendar produtos de assepsia 10) Executar revisões de controle O grande debate jurídico travado entre os operadores do direito consiste na seguinteindagação: o Código Brasileiro de Ocupações tem validade legal (com força de Lei) ou Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

14A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.apenas validade administrativa, não tendo valor normativo para regulamentar tal atividadeprofissional? No ano de 2002, chega ao senado o projeto de lei de número 268, mais conhecidocomo projeto do “ato médico”. Este projeto teve o objetivo de estabelecer quais atividadessão de competência exclusiva de profissionais com formação médica. O projeto 268 teve no seu Art.4º, inciso IX, o condão de taxar exaustivamente asatividades privativas de médico e se tivesse sido aprovado conforme o projeto original,teria fulminado a profissão de Optometrista, senão vejamos:  Art. 4º São atividades privativas do médico:  IX – prescrição de órteses e próteses oftalmológicas, (ORTESE: sãoobjetos utilizados junto ao corpo temporariamente, como óculos e lentes e PROTESESsão objetos implantados); Deste projeto, resultou a Lei 12.842 de julho de 2013, que restou conhecidavulgarmente como “Lei do Ato Médico”. Esta lei sofreu alguns vetos por parte daPresidente em exercício daquele ano, inclusive o que diz respeito ao inciso IX, do artigo 4º,salvando assim a extinção de milhares profissionais da Optometria em todo País. Utilizou a chefe do executivo as seguintes razões para justificar o referido veto: Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei nº 268, de 2002 (nº 7.703/06 na Câmara dos Deputados), que “Dispõe sobre o exercício da Medicina”. Incisos VIII e IX do art. 4º IX - prescrição de órteses e próteses oftalmológicas; Razões dos vetos (...) No caso do inciso IX, a Organização Mundial da Saúde e a Organização Pan-Americana de Saúde já reconhecem o papel de profissionais não médicos no atendimentode saúde visual, entendimento este que vem sendo respaldado no País pelo SuperiorTribunal de Justiça. A manutenção do texto teria um impacto negativo sobre oatendimento à saúde nessas hipóteses. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

15A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Pelo disposto até o presente, podemos concluir que a competência para prescriçõesde órteses e próteses oftalmológicas não é exclusiva de profissionais médicos ouoftalmologistas, uma vez que, conforme o princípio da legalidade, não existe lei queobrigue um profissional ter formação médica ou oftalmológica, para promover talprescrição.3.2. – Um dilema central: Os artigos 38 e 39 do Decreto nº 20.931/32 foramrecepcionados pela Constituição Federal de 1988.–> A teoria da recepção A teoria da recepção é um instituto que ocorre na seguinte forma: O fundamento devalidade de um ordenamento jurídico de um País é simplesmente a sua Constituição econsequentemente os direitos fundamentais nela existentes. Desta forma quando uma Constituição deixa de existir em virtude da entrada emvigor de uma nova Constituição, os fundamentos de validade da antiga Constituiçãotambém deixam de existir dando lugar aos fundamentos de validade da nova Constituição,ocorre que as normas infraconstitucionais não são revogadas com essa nova Constituição,elas apenas passam a ser interpretadas com um novo fundamento de validadeconstitucional uma vez que se faz quase que impossível obter continuidade das relaçõesjurídico-sociais sem o vigor de determinadas normas. A respeito do assunto explica Marcelo Novelino (2010) mais precisamente na página151, o seguinte: A revogação de uma Constituição faz com que todas as demais normas do ordenamento jurídico percam seu fundamento de validade e, portanto, sua vigência. Com o objetivo de dar continuidade às relações sociais, tendo em vista a impossibilidade fática de nova regulamentação imediata de todas as hipóteses indispensáveis, as normas infraconstitucionais, cujo conteúdo seja compatível com a da nova Constituição, são recepcionadas por ela (novação legislativa), adquirindo novo fundamento de validade. Sendo assim, quando uma nova Constituição nasce para o seu povo, as normasinfraconstitucionais existentes anteriormente, devem passar por uma nova maneira de seanalisar, ou seja, devem ser analisadas com base nos fundamentos de validade trazidospela nova Constituição para que se possam perceber quais normas serão recepcionadas ounão pela nova ordem Constitucional. Novelino, ainda na mesma página da obra supracitada ensina que: Ao ser promulgada uma nova Constituição, duas situações poderão ocorrer. As normas infraconstitucionais anteriores materialmente compatíveis com a Lei Maior ganham um novo fundamento de validade e são recepcionadas por ela. As Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

16A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. normas materialmente incompatíveis perdem seu fundamentos de validade e deixam de ter vigência (incompatibilidade material superveniente). Os artigos 38 e 39 do Decreto Lei 20.931/32, trazem em seu bojo a seguinte redação: Art. 38 É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas, optometristas e ortopedistas a instalação de consultórios para atender clientes, devendo o material aí encontrado ser apreendido e remetido para o depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimento da Procuradoria dos leitos da Saúde Pública e a quem a autoridade competente oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial será recolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias. Art. 39 É vedado às casas de ótica confeccionar e vender lentes de grau sem prescrição médica, bem como instalar consultórios médicos nas dependências dos seus estabelecimentos. Percebe-se, preliminarmente, que o ortopedista também recebe restrição legal quantoà instalação de consultórios, conforme o Artigo 38, acima citado, porém, não se temnoticias de impedimento por parte dos órgãos fiscalizadores na instalação dos mesmos. O fato é que o STF já decidiu na Ação Direta de Inconstitucionalidade 533-2/MCque continua em vigor o Decreto 20,931/32, como se recepcionado fosse, uma vez que oDecreto 99.678/1990, que retirava o Decreto Lei 20.931/32 do ordenamento jurídico, foijulgado formalmente inconstitucional. Ocorre que nossa constituição traz em sua estrutura vários direitos fundamentais queobviamente servirão como fundamentos de validade para a análise das normasinfraconstitucionais anteriores a sua publicação, a fim de se detectar quais delas poderãoser recepcionadas parcial ou totalmente pela ordem constitucional de 88. Como exemplo desses direitos fundamentais, podemos citar o instado no inciso XIII,do Art. 5º da Constituição atual que carrega a seguinte redação: Art. 5º (...) XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; Conforme análise estabelecida pela teoria da recepção, o Decreto de 1932, muitoembora esteja em vigor em nosso ordenamento jurídico, deve ser analisado com osfundamentos jurídicos de validade da Constituição em vigor inclusive com todos seusdireitos fundamentais recebendo a mesma autoridade de fundamentos de validade. Podemos perceber por tudo que foi argumentado até o momento, que a Optometria éuma profissão legalmente reconhecida, através do artigo 3º do próprio Decreto de 1932,porém, sua regulamentação está posta na portaria 397/2002 estabelecida pelo Ministério doTrabalho e Emprego. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

17A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Desta feita, temos duas correntes que tratam a respeito da prestação autônoma doserviço de Optometria, sendo uma que defende ampla atuação da profissão de Optometriadentro daquilo que já foi citado nesse trabalho pelo professor George Marmelstein, napágina 302 da obra Curso de Direitos Fundamentais, e outra que defende que o ato deprescrever órtese e prótese é ato exclusivo de médico, haja vista a falta de regulamentaçãolegal da profissão de Optometrista. Vale repetir os ensinamentos de Marmelstein referentes ao inciso XIII daConstituição, neste momento, que traz a seguinte reflexão: Em hipótese alguma um direito fundamental pode deixar de ser concretizado pela ausência de lei. Se determinado direito fundamental está deixando de ser efetivado por ausência de regulamentação infraconstitucional, cabe ao judiciário tomar as medidas cabíveis para que o direito não fique sem efetividade. Em outras palavras: o juiz, no atendimento concreto das providencias que se revelem indispensáveis para concretizar dado direito fundamental, pode (e deve) atuar independente e mesmo contra a vontade da lei infraconstitucional, pois, para efetivar os preceitos constitucionais, não é preciso pedir autorização a ninguém muito menos ao legislador. A aplicação direta e imediata dos direitos fundamentais implica, ainda, o reconhecimento da possibilidade de surgirem direitos subjetivos diretamente da Constituição. Ou seja, a norma constitucional torna-se fonte direta de comandos e obrigações aos órgãos públicos, com força normativa autônoma, independe de qualquer regulamentação. Desta feita resta a seguinte indagação: Quais os limites de atuação da profissão deOptometrista, uma vez que não existe norma regulamentadora dessa profissão?3.3. – O status da questão após a “Lei do Ato Médico” (Lei nº 12.842/13): Umainterface com a Hermenêutica dos Direitos Fundamentais: O princípio da máximaefetividade dos Direitos Fundamentais e sua aplicação ao caso. O professor Marcelo Novelino, na página 124 da obra Teoria da Constituição eControle de Constitucionalidade, publicada no ano de 2008, adverte que: O postulado desse princípio foi desenvolvido pelo tribunal alemão para conferir maior efetividade dos direitos fundamentais, os quais devem ser submetidos a uma interpretação ampla, impondo lhes que seja atribuído o sentido que confira a maior efetividade possível dos direitos fundamentais, visando à realização concreta de sua função social. O professor George Marmelstein ao comentar sobre principio da máxima efetividadeesclarece que os direitos fundamentais podem gerar pretensões subjetivas, exigíveisjuridicamente, cabendo ao poder judiciário, ao interpretar normas definidoras de direitosfundamentais, buscar soluções que dê mais eficácia ao direito fundamental em jogo. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

18A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Canotilho, apud Lenza(2012, pg.157) expressa seu entendimento sobre tal princípioafirmando que também chamado de principio da eficiência ou da interpretação efetiva, oprincípio da máxima efetividade das normas constitucionais deve ser entendido no sentidode a norma constitucional ter a mais ampla afetividade social. Segundo Canotilho é um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normasconstitucionais, e embora a sua origem esteja ligada à tese da atualidade das normasprogramáticas (THOMA), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais(no caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça a maior eficácia aosdireitos fundamentais). Todas essas citações explicando o funcionamento do princípio da máximaefetividade se faz necessário para que possamos interpretar a lei 12.842 de 2013 (Lei doAto Médico), mais especificamente o inciso IX, do seu artigo 4º à luz dos direitosfundamentais. Como já foi comentado no tópico anterior deste trabalho, no ano de 2002,chegou ao senado o projeto de lei de número 268, mais conhecido como projeto do “atomédico”. Este projeto teve o objetivo de estabelecer o exercício da medicina determinandoinclusive quais atividades são de competência exclusiva de profissionais com formaçãomédica. O projeto 268 teve no seu Art.4º, inciso IX, o condão de taxar exaustivamente asatividades privativas de médico e se tivesse sido aprovado conforme o projeto original teriafulminado a profissão de Optometrista senão vejamos:• Art. 4º São atividades privativas do médico:• IX – prescrição de órteses e próteses oftalmológicas, (ORTESE: são objetosutilizados junto ao corpo temporariamente, como óculos e lentes e PROTESES são objetosimplantados); Será possível nos dias atuais afirmar que a lei 12.842/2013, revogou ou derrogou osartigos 38 e 39 do decreto 20.931/1932, possibilitando assim, aos profissionais daOptometria atuarem na atenção primaria da saúde visual? Ou, o que esta lei fez foi apenasautorizar aos profissionais da Optometria atuarem de forma a auxiliar os profissionaismédicos? O doutor Fabio Luiz Cunha, assessor jurídico do Conselho Brasileiro de Óptica eOptometria (CBOO), instituição de grande importância, porém, de natureza associativa enão autárquica, defendeu no I Fórum de Discussão Política e Jurídica do CBOO, realizadodo dia 17 de abril 2015 em São Paulo, a tese da revogação dos artigos 38 e 39 do referidodecreto. Segundo o assessor, os artigos 38 e 39 não têm mais força contra a atuação Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

19A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.profissional dos Optometrista conforme o § 1º, do artigo 2º da Lei de Introdução àsNormas do Direito Brasileiro que trás a seguinte redação: Art.2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra amodifique ou revogue. § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando sejacom ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. Fabio Cunha chama a atenção para o objeto das leis em questão, senão vejamos: odecreto 20.931 de 1932 traz em seu preâmbulo a seguinte redação:“Regula e fiscaliza o exercício da medicina, da odontologia, da medicina veterinária e dasprofissões de farmacêutico, parteira e enfermeira, no Brasil, e estabelece penas”.Já o objetoda lei do ato médico, lei 12.842/2013, trazido em seu preâmbulo, carrega a seguinteexpressão :“Dispõe sobre o exercício da medicina” Desta sorte advoga o doutor Fabio Cunha no sentido de defender a tese que a lei doato médico revogou o decreto 20.931, com fundamento no parágrafo 1º do artigo segundoda Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, uma vez que a lei do ato médicoregulou inteiramente a matéria que tratava o decreto 20.931/32, qual seja o exercício damedicina. Com relação ao tema (revogação) Marcelo Novelino, na obra Direito Constitucional,já ventilado neste trabalho, mais precisamente na página 150, traz um importantecomentário: Quanto à forma, a revogação pode ser expressa quando a norma posterior enumera as normas revogadas por ela. Nesse caso, devem ser elencados os dispositivos a serem revogados, não bastando a expressão genérica: “ficam revogadas as disposições em contrario.” A revogação tácita ocorre em razão da (1) incompatibilidade entre duas normas ou quando uma (2) norma posterior regula inteiramente a matéria tratada por uma norma anterior. Esta hipótese é denominada de “revogação por normação geral. Desta forma, já que o artigo 4º da Lei do Ato Médico (12.842/2013) traz um roltaxativo das atividades privativas de médico, e nesse rol não está contido a prescrição deórteses e próteses oftalmológicas, como deverá ser a interpretação dos artigos 38 e 39, dodecreto 20.931/32, uma vez que a profissão de Optometrista esta legalmente reconhecidano artigo 3º do mesmo decreto e uma vez que o inciso XIII do artigo 5º da constituição dizque o exercício de uma profissão é livre, tendo que ser atendidas as qualificaçõesprofissionais que a lei estabelecer, a luz do principio da máxima efetividade. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

20A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88. Seguindo o mesmo raciocínio, seria justo um Optometrista ser condenado, ou atémesmo prezo por crime de exercício irregular da medicina, arte dentária ou farmacêutica,crime este tipificado no artigo 282 do código penal brasileiro, a luz do princípio da máximaefetividade? O doutrinador penal Rogério Greco(2011,pg.799), classifica doutrinariamente oartigo 282 como sendo crime comum no que diz respeito à conduta de exercer, ainda que atítulo gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal. Masum Optometrista, que tem como finalidade medir a visão, se estiver de posse de habilitaçãolegal, prescrever uma órtese, ou uma prótese oftalmológica, que não é mais atividadeespecífica do profissional médico, conforme artigo 4º da lei 12.842/213, poderá mesmo sercondenado pelo crime de exercício irregular da medicina? É bem sabido que no Brasil existe uma grande escassez de profissionais da área dasaúde, prova esta é o Programa Mais Médicos, do governo federal, que tem como grandeobjetivo levar profissionais da saúde às pessoas menos favorecidas deste país, além dissose tem relatos de que o Optometrista desbrava lugares totalmente isolados pelos interiores,levando a atenção primária da saúde visual para milhares de brasileiros, normalmenteexcluídos pelo acesso e pela concentração das atividades em grandes centros urbanos. Greco(2011) ratifica essa realidade ao afirmar que há lugares isolados, onde nãoexistem médicos, dentistas ou farmacêuticos. Se alguém nessas localidades, que possuiconhecimento básico das profissões mencionadas, com finalidade de auxiliar aquelacomunidade carente de recursos, vier a exercê-las com regularidade, não se poderáimputar-lhe o delito em estudo, tendo em vista tratar-se de uma situação pertinente aoraciocínio do estado de necessidade.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os princípios fundamentais da constituição atual são fundamentos de validade detodo o ordenamento jurídico em vigor no nosso país, devendo as normasinfraconstitucionais ser interpretadas conforme orientação desta constituição, mesmo aselaboradas anteriormente a constituição de 88 e que, por motivos de manterem as relaçõessociais, foram recepcionadas por esta constituição. Desta forma e levando em consideração que uma pessoa para ter a plenitude de suadignidade humana deva ter os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa respeitados,pois o trabalho dignifica o homem, não concordamos com a imposição de uma proibiçãotácita aos profissionais da optometria, no que diz respeito à prescrição de órtese e prótese Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

21A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.oftalmológica uma vez que é totalmente livre o exercício de qualquer oficio ou profissãoatendidas às qualificações profissionais que a lei determinar, conforme o inciso XII, doartigo 5º do mandamento constitucional. Para chegar a essa conclusão pode se levar em consideração dois pontos; primeiro ofato de não existir lei determinando qualificações onde só o profissional médico poderáfazer tais prescrições, pelo contrario, o que existe é justamente uma lei que determina quaisas atividades são de competência exclusiva desse profissional, porém a competência para aatividade de prescrição de órteses e próteses oftalmológicas não constam neste rol. Nestecaso, se não existe lei estabelecendo que o profissional médico detenha exclusividade parao exercício deste ofício, então parece razoável o entendimento de que o optometristatambém disponha dessa competência. O segundo ponto que se deve levar em consideração, é o fato de que a profissão éreconhecida desde o ano 1932 e naturalmente houve a multiplicação desses profissionaispelo país de modo que hoje, apesar de não se ter dados concretos, são milhares deprofissionais atuando pelo interior dos estados brasileiros, levando atenção primaria dasaúde visual para brasileiros que não têm acesso a esse serviço. Vale salientar que 80%(oitenta por cento) da cegueira no país, é ocasionada por falta dessa atenção primaria,sendo assim, pode se chegar à conclusão da imprescindível e incontestável carência quantoaos serviços de atendimento primários da visão. Ainda no tocante ao segundo ponto, podemos dizer que essa profissão é capaz degerar emprego e renda, de forma direta e indireta, não apenas àqueles que trabalham comoptometria, mas também à todos que sobrevivem do setor óptico. Ainda assim existe umagrande parcela da sociedade defendendo que o optometrista não pode exercer sua profissãoou se poderia, deveria ser sob supervisão de um médico oftalmologista, dificultando maisainda o direito das pessoas a terem uma saúde visual de qualidade. De certo só resta uma única maneira desse profissional atuar com o devido respeito asua dignidade humana e profissional, qual seria a criação de uma lei federal queregulamentasse toda sua profissão, desde a sua formação acadêmica até a sua atuação,determinando ainda a criação de uma autarquia que tivesse competência de fiscalizar,orientar e punir os casos em desalinho com a lei. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

22A CONDIÇÃO JURÍDICA DA OPTOMETRIA NO BRASIL PÓS – 88.REFERÊNCIASBONAVIDES, Paulo: Curso de Direito Constitucional. 25 Ed- Malheiros, 2010.BULOS, Uadi lammego: Curso de Direito Constitucional. São Pulo: Saraiva, 2007.DA SILVA, José Afonso: Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 8 ed. Malheiros,2012.DA SILVA, José Afonso: Curso de Direito Constitucional Positivo. 29 ed. Malheiros,2006.LENZA, Pedro: Direito Constitucional Esquematizado. 16 ed.rev. atual e ampl – SãoPaulo: Saraiva, 2012.MARMELTEIN, George: Curso de Direitos Fundamentais. 5 Ed- São Paulo: Atlas,2014.NOVELINO, Marcelo: Direito Constitucional. 4Ed. rev, atual e ampl. – Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: METODO, 2010.______________: Teoria da Constituição e Controle de Constitucionalidade–editoraJus Podivm, 2008.VICENTE Paulo & ALEXANDRINO, Marcelo : Direito Constitucional Descomplicado.9 ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método: 2012.WWW.PLANALTO.GOV.BR (legislação consultada) Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.2-22

SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ USER SATISFACTION WITH THE IMPROVEMENT OF CEARÁ GOODS TRANSIT TAX COLLECTION PROCESS Emiliano Estigarribia Canese1 Raimunda Elianir Cavalcante de Castro2RESUMOOs tributos são a principal fonte de financiamento do serviço público. Para o Estado, omais importante deles é o Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços deTransporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação – ICMS. Nesse sentido, aSecretaria da Fazenda vem melhorando o processo de arrecadação e fiscalização damercadoria em trânsito, investindo em sistemas de informação para evitar a evasão fiscal.Um exemplo desse esforço foi a substituição do sistema de Controle de Mercadoria emTrânsito – Cometa, no processo de controle e cobrança do ICMS, pelo Sistema de Trânsitode Mercadoria – Sitram. Este trabalho analisa, através de uma pesquisa quali-quantitativa,a satisfação do usuário em relação ao novo sistema. O resultado demonstra que os usuáriosinternos e externos estão satisfeitos com as alterações e concordam que há poucosproblemas. O foco agora devem ser as melhorias apontadas pelos usuários durante apesquisa.Palavras-chaves: serviço público, imposto, controle de processos e satisfação do usuárioABSTRACTTaxes are the main source of public service funding. For the State, the most important ofthem is the tax on Goods Transit and Transport Services Interstate and intercity andCommunications - ICMS. In this way, the State Finance Department has improved theprocess of collection and inspection of goods in transit, investing in information systems toprevent tax evasion. An example of this effort was the replacement of the goods in transitcontrol system - Cometa, for ICMS control and collection process, for the goods in transitsystem - Sitram. This paper analyzes, through a quantitative research, user satisfaction with1 Doctor en Gestión de Empresas pela Universidad Autonoma de Asuncion(2012). Experiência na área deEconomia, com ênfase em Crescimento, Flutuações e Planejamento Econômico.http://lattes.cnpq.br/74072745502545122 Graduada em Letras pela Universidade Estadual do Ceará – UECE, especialista em PlanejamentoEducacional pela Universidade Salgado de Oliveira, especialista em Administração de Empresas pelaAutarquia Educacional do Araripe – AEDA. Auditora Adjunta da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

the new system. The result shows that the internal and external users are satisfied with thechanges and agree that there are just a few problems. The focus should now be theimprovement suggested by users during the research. Keywords: public service, tax,process control and user's satisfactionKeywords: public service, tax, process control and user's satisfaction Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

25 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ1 INTRODUÇÃO O tributo é a maior fonte de financiamento do Estado. A máquina administrativadeve ser bem equipada para realizar a tarefa de arrecadá-lo com competência. Acomplexidade da legislação tributária dificulta a vida do fisco e do contribuinte. Alémdisso, a relação entre o Estado e o contribuinte nunca foi muito amistosa. Os contribuintes,de uma forma geral, procuram escapar da obrigação de recolher o tributo e o Estado estásempre atento para evitar a evasão e a sonegação. A extensão territorial e os diversos acessos por meio terrestre dificultam afiscalização nas divisas do Estado. Outra dificuldade é a quantidade de notas fiscais queacompanham as mercadorias, tornando-se praticamente impossível a análise detalhada detodos os documentos que entram ou saem do Estado, mesmo que o número de funcionáriofosse maior, porém a tendência é exatamente o contrário, vem sendo reduzido a cada dia.Todas essas limitações geram a insatisfação do cliente interno e externo. Mas, o Ceará éum Estado arrecadador, por este motivo, a Secretaria da Fazenda (Sefaz) sempre teve ocuidado de criar procedimentos para facilitar e garantir uma arrecadação rápida e segura. Conforme a tecnologia foi evoluindo, procurou-se implantar sistemas deinformação para atender a demanda cada dia mais crescente na difícil tarefa de arrecadarimposto. O desenvolvimento tecnológico, aliado ao uso dos documentos eletrônicos, taiscomo Nota Fiscal Eletrônica (NF-E), Conhecimento de Transporte Eletrônico (CT-E) eManifesto de Documentos Fiscais Eletrônicos (MDF-E), possibilitaram um melhorcontrole das operações com mercadoria em trânsito. Taylor, em 1902, afirmava que é possível estabelecer a melhor maneira de se fazerum trabalho e que o ser humano tem predisposição para procurar máxima recompensautilizando o mínimo de esforço (Rocha, 2013, p 77). O primeiro sistema de informática usado na Sefaz com a finalidade de minimizar oesforço e obter maiores resultados foi o Controle de Mercadoria em Trânsito – Cometa,criado em 1986. Sua principal função era aumentar os controles das operaçõesinterestaduais com mercadoria que circulavam pelas divisas nas entradas e saídas. Porém,com o passar do tempo foi ficando limitado, não conseguia acompanhar as constantesmudanças da legislação. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

26 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ Então, para atender satisfatoriamente toda a demanda foi que a Sefaz, em 2003,começou o processo de renovação dos sistemas de informática. Com a finalidade atender otrânsito de mercadoria foram desenhados sete projetos de novos sistemas. O Sistema de Trânsito de Mercadoria (Sitram) é o núcleo do trabalho de cobrançade imposto antes da mercadoria adentrar no Estado. Outros sistemas funcionam comocomplemento das ações executadas pelos agentes do fisco que trabalham nas unidades defiscalização do Ceará. O novo sistema tinha uma proposta diferente: a sistemática de trabalho, aplataforma de informática, a interação, tudo mudou. Após essas mudanças, as expectativasdos usuários foram atendidas? O novo procedimento superou o antigo? Quais seriam asmaiores dificuldades enfrentadas? Esse novo procedimento atendeu às necessidades dosusuários? Após os ajustes e adaptação inicial, decidiu-se analisar o sistema pela ótica dousuário. Neste trabalho, analisou-se a satisfação dos usuários internos e externos quantonas melhorias sistêmica no processo de arrecadação do ICMS nas divisas do Ceará a partirdo novo sistema de controle e fiscalização das mercadorias em trânsito. Como objetivosespecíficos ficou definido: descrever um breve relato do financiamento do Estado e doprocesso do trânsito de mercadoria como ferramenta de angariar recursos; demonstrarsatisfação do usuário em relação ao sistema e em comparação à sistemática anterior; eainda verificar quais as principais necessidades do usuário em relação a melhoriassistêmicas. Geralmente a administração pública não avalia seus procedimentos do ponto devista do usuário, como faz a iniciativa privada. Este trabalho é uma quebra de paradigmaonde os resultados poderão ser usados em melhoramento do processo ou em futurasdecisões administrativas.2 O FINANCIAMENTO DO ESTADO O Estado Brasileiro está organizado em uma República Federativa constituído pelaUnião, os Estados, o Distrito Federal e os municípios. Dentre suas principais funções está odever de organizar o espaço territorial de suas unidades federativas, proporcionando a Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

27 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁprópria defesa e sustentação econômica e, principalmente, garantindo os direitos coletivose individuais, promovendo o bem comum e proporcionando meios para que o cidadãotenha uma vida digna. Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (CF/1988) O serviço público, na perspectiva socioeconômica, visa a satisfação denecessidades coletivas através de bens e serviços distribuídos gratuitamente, a preçosinferiores ao custo de produção ou superiores ao custo de produção, mas inferior ao domercado (Silvestre, 2010, p24). Na tarefa de realizar seus objetivos o Estado precisa de recursos para financiaras demandas sociais e manter a máquina funcionado adequadamente. Os recursosfinanceiros adquiridos pela União, Estados, Distrito Federal e municípios, seja porqualquer modalidade, são chamadas receitas públicas. As receitas públicas têm a função de financiar as atividades do funcionamentodo Estado para garantir, assim, o bem estar do cidadão. De acordo com o manual deprocedimentos da receita pública da Secretaria do Tesouro Nacional (STN)3, as receitasorçamentárias são todos os ingressos disponíveis para cobertura das despesas públicas, emqualquer esfera governamental. Dentre as receitas orçamentárias a que dá mais retornopara o Estado é o tributo.3 SISTEMA TRIBUTÁRIO Pode ser definido como “os princípios e normas que regem o complexo orgânicoformado pelos tributos instituídos no Brasil.” (Amaral, 2012). São todos os documentoslegais que versam sobre tributos. O Sistema Tributário Nacional Brasileiro (STN) é regido no Código TributárioNacional (CTN), em leis complementares, em resoluções do Senado Federal, em leisfederais, nas Constituições e em leis estaduais, e em leis municipais as quais compreendema todas os tributos.3 Manual de procedimentos: aplicado à União, Estados, Distrito Federal e Municípios / Ministério daFazenda, Secretaria do Tesouro Nacional, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Secretaria deOrçamento Federal. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

28 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ Cabe ao Sistema Tributário proporcionar meios de arrecadar recursos para suprir asociedade dos seus direitos constitucionais pela criação de tributos.3.1 TRIBUTOS O Código Tributário Nacional – CTN, regulamentado pela lei 5.172 de outubro de1966 define tributo como. ... toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. (CTN, 1966, Art.3º) Ou seja, deve-se dá com transferência de valor econômico, obrigatório por lei epago apenas em moeda e cobrado pelo poder público (Ribeiro Neto, 2011. p.124). Os tributos que compõem o sistema tributário são cinco: imposto, taxa,contribuição de melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios. Os impostos são a espécie de tributo mais importante considerando o ponto de vistada arrecadação. Sempre que possível, terão caráter pessoal e serão graduados segundo acapacidade econômica do contribuinte4. As taxas têm sua importância no ponto de vista dajustiça tributária, uma vez que o serviço público é prestado para beneficiar diretamentequem pagou por ele. E, finalmente, a contribuição de melhoria tem seu valor na justiça dedistribuição de renda visto que é cobrando de que se beneficiou da valorização do seu bem(Ribeiro Neto, 2011. p.124). Cabe à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios recolher tributos desua competência. São de competência da União: Imposto sobre a Renda e Proventos (IR),Imposto Territorial Rural (ITR), Imposto sobre Produtos Industrializado (IPI), Impostosobre operações de Crédito, Câmbio e Seguro (IOF), Imposto sobre a Importação (II) eImposto sobre a Exportação (IE); os impostos de competência dos Estados e do DistritoFederal são: Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), Imposto deTransmissão Causa Mortis e Doações – ITCD e Imposto sobre Circulação de Mercadoria esobre Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação – ICMS; Osimpostos de competência dos Municípios são: Imposto Predial e Territorial Urbano –4 Ver Constituição Federal de 1988, Art. 145 § 1º Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

29 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁIPTU, Imposto de Transmissão Inter Vivos – ITBI e Imposto sobre serviço de qualquernatureza – ISS Dos três impostos de competência dos Estados e o Distrito Federal o ICMS é o demais representatividade em termo de arrecadação. A arrecadação total deste imposto em2014 representou mais de 93% dos impostos arrecadados no Ceará, conforme tabela 1. Tabela 1 - Arrecadação do Tributos do Ceará em 2014 Tributos Valor em Reais (R$) % ICMS 9.455.729.056,21 93,28 IPVA 601.430.062,70 5,93 Outros 79.585.662,83 0,79 Total 10.136.744.781,82 100,00 Fonte: SefazO ICMS é um imposto sobre o consumo que incide sobre toda cadeia produtiva,isto é, enquanto a mercadoria estiver mudando de dono, da produção até o consumidorfinal, esse imposto faz parte do valor da mercadoria. Por isso o controle na circulação éfundamental.4 A SECRETARIA DA FAZENDA E O CONTROLE NO TRÂNSITO DEMERCADORIA A Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará (Sefaz-CE) é órgão da administraçãodireta do Poder Executivo Estadual que tem a competência de arrecadar os tributosestaduais. “A organização moderna existe para prover um serviço específico para asociedade” (Drucker, 2010, 319). Ela tem que está presente na sociedade, tem que fazer oseu trabalho voltado para a responsabilidade social. Na estrutura atual, a Sefaz está seguindo a nova tendência do pensamentoestratégico da administração de empresa, a Gestão Estratégicas Responsável, que teveinício nas primeiras décadas do século XXI, em que, conforme Silva (2014), as empresasalém de estarem voltada para a Gestão Estratégica Empresarial e sistematizar aAdministração Estratégica deve incorporar a Responsabilidade Social Corporativa em suasatividades, onde passa pelo desafio de equilibrar os interesses da empresa com osinteresses dos públicos com os quais se relaciona Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

30 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ A Sefaz está sempre se adequando à história e às peculiaridades do momentosocioeconômico, neste sentido, sempre que necessário ajusta sua estrutura, visto queconforme Drucker (2010, 566) “a melhor estrutura não garante resultados e desempenho,mas a estrutura errada é garantia do não desempenho”. Em busca de melhores resultados, o Ceará, como Estado consumidor, sempre teveque dispensar muita atenção à circulação de mercadoria a fim de não perder receitas, e porisso tem que manter uma boa estrutura de fiscalização, por onde a mercadoria circular. Toda a estrutura da fiscalização do trânsito de mercadoria está organizada em umasó unidade: Célula de Fiscalização do Trânsito de Mercadorias (Cefit), composta porquatro núcleos e 18 postos fiscais. A Cefit gerencia, acompanha e desempenha asatividades de fiscalização de mercadorias em trânsito, relativas ao controle das operações eprestações do ICMS no território cearense e define ações estratégicas, elaborando eimplantando projetos para o eficiente controle na atividade do trânsito.5 CONTROLE NOS PROCESSO DE ARRECADAÇÃO DO ICMS NO TRÂNSITODE MERCADORIA A Sefaz para cumprir o papel de arrecadar e no intuito de garantir eficiência noprocesso do trânsito de mercadoria, há algum tempo, vem modernizando sua máquinaadministrativa e para isso investiu em Tecnologia da Informação (TI) transformando seusprocessos em sistemas informatizados possibilitando o aumento da receita pública e dacapacidade de autofinanciamento do Estado. A Sefaz tem uma das melhores e mais complexas estruturas tecnológicas do Estadoonde oferece acesso de internet e intranet nos serviços automatizados e de qualidade, osquais atendem à demanda cada vez mais crescente da área de negócio. Todas as unidadesda Sefaz, das sedes, na capital, ao mais longínquo posto fiscal, têm disponíveis os serviçosinformatizados de que necessita para a realização dos trabalhos. E o contribuinte, por suavez, pode acessar suas informações sempre que necessitar. Para Drucker (2012, p251), o retorno da automação é efetivamente alto e rápido e oprincipal benefício da automação consiste em eliminar, ou ao menos minimizar, os custosde não fazer. Com a informatização dos processos, principalmente das áreas de Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

31 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁArrecadação e Fiscalização, a TI tornou-se um recurso e um canal crítico para a Sefaz,permitindo ganhos efetivos de produtividade, redução de custos e proporcionandomelhorias nos serviços disponibilizados e agilidade no atendimento ao cliente.6 PROCESSOS DO TRÂNSITO DE MERCADORIA O trânsito de mercadoria é o grande processo de fiscalização e acompanhamentodas mercadorias que circulam no território cearense em operações interna, de entrada, desaída, de importação, de exportação ou trânsito livre. Para acompanhar, cobrar o ICMS efiscalizar as irregularidades ou fraudes a Secretaria da Fazenda mentem sistemas deinformática, cada dia mais sofisticados para dá suporte ao agente da tributação. O Cometa substituiu a Guia de Entrada de Mercadoria por uma etiqueta que passoua ser afixada na nota fiscal com as informações impressas geradas pelo sistema. A afixaçãodessa etiqueta tinha a pretensão de marcar a nota fiscal que acompanhava uma mercadoriapara garantir que esta nota só seria utilizada uma vez. Depois a etiqueta foi substituída peloSelo de Trânsito, cheio de itens de segurança, e, atualmente, o Sitram eliminou o uso deselo físico para o controle virtual da selagem dos documentos fiscais5. Segundo o Jornal Novo Tempo da Sefaz, O Sistema Cometa, que na época eraconhecido pela expressão “Projeto Cometa” foi considerado um dos principaisinstrumentos de Combate à circulação de mercadoria sem documentação fiscal. Após maisde duas décadas de funcionamento, o Cometa tornou-se limitado para atender à crescentedemanda do trânsito de mercadoria. Então, com a finalidade de atender satisfatoriamente toda a demanda é que a Sefaz,desde 2003 começou o processo de renovação dos sistemas de informática e, para atendero trânsito de mercadoria, foram desenhados, não somente um sistema, mas sete projetos denovos sistemas, ilustrado na figura 1.5 Lei 11961 de 10 de julho de 1992 Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

32 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ Figura 1Subprocessos do Trânsito de Mercadorias7 SISTEMA DE TRÂNSITO DE MERCADORIA (SITRAM) E SISTEMAS AFINS O Sistema do Trânsito de Mercadoria (Sitram) foi um dos primeiros dentre osgrandes sistemas da SEFAZ da plataforma anterior, Mainframe utilizando Natural eAdabas a ser implementado e implantado na nova plataforma Web definida de acordo comas diretrizes do governo do Estado, com a utilização da linguagem e servidores deaplicação Java. Seu principal módulo começou a funcionar em novembro de 2012, fazendo registrodas notas fiscais de entrada interestadual com o cálculo dos impostos devidos na entrada doCeará. Em resumo, o Sitram funciona do seguinte modo: na chegada da carga ao postofiscal, o agente de trânsito abre o processo de fiscalização, denominado de “Ação Fiscal doTrânsito”. A carga pode estar acompanhada, além das notas fiscais, do conhecimento detransporte e do manifesto de carga. Todos os documentos são registrados no sistema queanalisa e calcula o imposto devido. O registro dos documentos também está sendo feito poruma equipe ligada a estrutura da Cefit usando apenas as informações eletrônicas dosdocumentos fiscais e quando os veículos chegam ao posto fiscal o processo já estáadiantado, inclusive, se o contribuinte desejar, pode pagar o imposto antes da mercadoriachegar ao Estado e assim, ganhar tempo na liberação. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

33 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ O processo pode ser acompanhado pela gerência ou pela transportadora que tem apossiblidade de consultar se a carga foi liberada ou se ainda aguarda no posto fiscal. Ocontribuinte, de posse da Nota Fiscal Eletrônica, também pode saber se o imposto já foicalculado pela consulta na Internet e, se desejar, efetuar pagamento. Esse procedimento trouxe muitas melhorias tanto para a Sefaz como para ocontribuinte tais como: rapidez, facilidade e segurança no atendimento, economia com ofim da utilização do selo físico. Os contribuintes, empresa, transportadoras ou seus representantes legais podemacessar o Sitram pela internet através do acesso seguro, de forma abrangente. No ambientelivre, qualquer pessoa física ou jurídica pode consultar as notas fiscais, basta que tenha achave de acesso da NF-e. Pela internet pode-se emitir o Documento de ArrecadaçãoEstadual (DAE) para pagamento do ICMS. Em 2014, foram registradas no Sitram, 11.685.656 (onze milhões, seiscentos eoitenta e cinco mil, seiscentos e cinquenta e seis) notas fiscais que totalizaram R$2.548.999.192,26 (dois bilhões, quinhentos e quarenta e oito milhões, novecentos enoventa e nove mil, cento e noventa e dois reais e vinte e seis centavos) de impostoslançados que corresponde 26,96% da arrecadação total do mesmo ano. O Sitram, integrado aos demais sistemas, permitiu agilidade aos postos fiscaisresultando no fim do envio de malotes de notas fiscais para registro na Cefit, localizado emFortaleza, uma vez que o trabalho se tornou mais produtivo a cada passo dado em direção àautomatização. O Sitram funciona com o auxílio dos vários sistemas de suporte aos processos dotrânsito, os mais recentes são: I. Sistema da Nota Fiscal Avulsa e Autorização de Livre Trânsito (Sinfa) – É o sistema responsável pela emissão da Nota Fiscal Avulsa (NFA) e Declaração de Livre Trânsito (DLT) – através da Intranet e Intranet. O Sinfa atende aos contribuintes ou não que não tem a obrigação de emitir nota fiscais, mas esporadicamente tem necessidade deste documento para acompanhar o trânsito de mercadoria. II. Sistema de Credenciamento (SICRED) – Credenciamento do contribuinte é o diferimento para pagamento de ICMS calculado nos postos fiscais ou em outras unidades que digitam notas fiscais, é uma forma de parceria entre a Sefaz e o contribuinte, inclusive a com transportadoras que não querem e nem podem perder tempo nos postos fiscais de divisa aguardando que o imposto seja recolhido. III. Sistema de acompanhamento dos processos judiciais e administrativos (Sipaj) – passou a organizar e acompanhar as informações de termos de acordo, pareceres, liminares e Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

34 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DAARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ mandados judiciais. Essas informações não estavam organizadas de forma a serem conhecidas automaticamente pelo Sitram.IV. Sistema do Comércio Exterior (SISCOEX) – está fase de conclusão, pretende controlar as operações de comércio exterior: importação exportação, direta e indireta.V. Sistema de guarda e liberação de mercadoria apreendida (SISGUARDA) – desenhado para padronizar procedimentos de retenção, apreensão e liberação de mercadoria que se encontrem em situação irregular e controlar da emissão de documentos relativos ao processo (Termo de Retenção, Certidão de Guarda e Termo de Liberação).VI. Sistema de informação da Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA) – apenas deveria fornecer informações relativas as saídas interestaduais com isenção de ICMS, destinadas às áreas de livre comércio da Amazônia. Mas ainda não foi concluído. VII. Catálogo Eletrônico de Valores de Referência (CEVR) é um sistema que surgiu após oVIII. desenho do Sitram, mas é de fundamental importância para completar o processo de modernização do trânsito de mercadoria. É um agrupamento de produtos comercializados no Estado do Ceará gerado a partir do item das Notas Fiscais Eletrônicas, formando um grande catálogo de trabalhado de forma inteligente, onde se possibilita a Secretaria da Fazenda realizar vários controles de acompanhamento de preço. Inicialmente foi pensando para fornecer subsidio para o cálculo padronizado do imposto em todos os setores, seja de arrecadação e fiscalização e para calcular o valor de referência da mercadoria, a pauta fiscal, que a partir desta sistemática tornou-se forma mais ágil e justa. NF-e, Ct-e e MDF-e – apesar de serem gerenciados pela Receita Federal, os o Ceará faz os controles dos documentos eletrônicos que acompanham mercadoria em seu território e por isso a foi desenvolvido um sistema para cada processo de documentação eletrônicas.8 METODOLOGIA Esse trabalho é o resultado de uma investigação. “A investigação é um conjunto deprocessos sistemáticos, críticos e empíricos aplicadas ao estudo de um fenômeno”(Sampieri et al, 2010, p. 5). Esse processo sistemático é chamado de metodologia. A metodologia trata de conhecimento sobre método, tem a ver com a dimensão dabusca científica por meio de fontes de estudo para o alcance de resultados científicos(Biktar 2013, p 46). Então o conhecimento, para ser considerado científico é necessárioseguir métodos ou regras específicas determinadas pelo mundo acadêmico. Assim comoafirma, Alvarenga (2013, p 3) é a forma de se produzir um conhecimento científico que porsua vez são obtidos através de procedimentos com aplicação de métodos. “Metodologia científica: parte da lógica geral para se constituir como ramoespecífico, voltada para a aplicação do discurso científico e os meios de investigaçãocientífica” (Bittar, 2013, p 48). Para se produzir um trabalho científico é necessário o usoda ciência e esses meios são conhecidos como método científico que, para Alvarenga(2013, p5), é um conjunto sistemático e lógico que direciona uma investigação Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

35 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ O presente trabalho foi feito com o cuidado de seguir as recomendações dessesmétodos, pois, desta forma, o conhecimento produzido pela pesquisa realizada éconsiderado um trabalho científico. Portanto, esse trabalho seguem um roteiro estruturadosistematicamente, uma vez que segue todos os passos para chegar a conclusões dashipóteses levantadas, tais como definição do problema, objetivos, desenho, coleta dedados, interpretação dos mesmo e conclusões conforme define Alvarenga, (2013, p 7). Gestão Organizacional foi a linha de pesquisa escolhida para este estudo científico,visto que, após a sua conclusão, a gerência da Sefaz pode usar os resultados para a tomadasde decisões. Priorizou-se a investigação de caráter quantitativa com um estudo desatisfação do usuário dos sistemas informatizados de controle e cobrança do ICMS noEstado do Ceará. Uma pesquisa deve responder a perguntas que incomodam o pesquisador. Portantonesta investigação, procura-se conhecer a satisfação do usuário com as melhorias namodernização de processo. Essa era a dúvida que incomodava, tinha-se a ideia que o novosistema melhoraria o trabalho em vários aspectos, ajudaria no controle da operação commercadoria no Ceará, mas não se podia afirmar cientificamente esse sentimento por partedo usuário. Substituir um sistema que funcionava há mais de 20 anos com o qual o usuárioestava acostumado a lidar por um sistema totalmente novo, poderia ter o efeito nãoesperado pela gerência da Sefaz. O usuário interno sentia que o seu trabalho estava muitolimitado, mas já estava habituado a operar de forma quase que automática. Mudartotalmente seria um risco, a adaptação podia demorar e gerar resultado negativos. A Sefaz não podia correr o risco de ir contra a sua visão de alcançar a excelência nodesempenho da administração fazendária, com a satisfação dos clientes, gestãoparticipativa e inovadora. Desta forma, o resultado desta pesquisa pode trazerconhecimento para outros processos de mudança que sempre serão necessários. A tarefa de arrecadar imposto não é fácil e a obrigação de pagá-lo nunca foiagradável. Quando somado a estas dificuldades existe o entrave burocrático e a morosidadedo atendimento o resultado é de muita insatisfação para o fisco e a para a sociedade. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

36 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ A tecnologia, sozinha, não resolve problemas, é necessário ser bem empregada emsistemas inteligentes e direcionados às necessidades do usuário. Por esta razão, após aimplantação de um sistema de grande proporção como o Sitram é essencial saber se alémde atingir o objetivo da empresa também agradou o usuário. O crescimento de arrecadação,o tempo de atendimento e a quantidade de erro podem ser medidos em número extraídosdo próprio sistema, mas a satisfação deve ser expressa pelo próprio usuário. Ter o sentimento que a nova sistemática de trabalho estava agradando ao usuário,não é o mesmo que comprovar cientificamente. “A ciência é o conhecimentosistematizado, testado, organizado, diluído em uma trama postulada metodológica. Aciência é uma prática racional da qual resulta conhecimento” (Bittar, 2013, p 49). Após oresultado comprovado cientificamente, ficam as tomadas de decisões administrativasimportantes mais fáceis. Na abordagem quantitativa, na proposição do problema já são estabelecidas asrelações variáveis a estudar, caracterizam-se pela medição do mesmo e o tratamentoestatístico das informações. Seu objetivo é descrever ou explicar os resultados. (Alvarenga,2013, p 9). Também pode ser considerado uma pesquisa descritiva, uma vez que“descrever as tendências em um grupo ou população” (Sampeire et al, 2010, p 80). O enfoque qualitativo dá ênfase às características sociais, antropológicas,psicologias, entre outras, mais ligada ao comportamento humano (Alverenga 2013, p. 10).Nesta abordagem, este trabalho fala da importância do tributo para a sociedade. A pesquisa foi realizada entre 16 e 26 de setembro de 2014, através da ferramentaLimeSurvey, administrada pela SEFAZ. O questionário foi disponibilizado nos sítioseletrônicos da SEFAZ, um link na intranet para o usuário interno e outro na Internet para ousuário externo. A população abrangeu todos os usuários internos e externos do Sistema do Trânsitode Mercadoria – Sitram da Sefaz Ceará. Os usuários internos, atualmente, contam com1.522 (um mil quinhentos e vintes e dois). É difícil mensurar o número de usuáriosexternos, que seria composto por mais de 240 mil empresas inscritas no cadastro da Sefaz,somadas aos 8 mil contadores, às inúmeras transportadoras, aos caminhoneiros quetransportam mercadoria no território cearense, aos fornecedores que vendem suas Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

37 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁmercadorias para clientes do Ceará e às pessoas físicas que podem comprar mercadoria deoutras unidades da federação. A amostra ficou em 415 usuários internos e 660 representantes de contribuintes etransportadoras. Com essas amostras, considerando a estimativa da população interna eexterna, foi obtida 95% de confiança, de acordo com classificação do sítio da empresaSurvey Monkey. As respostas dos questionários foram inseridas em planilha e os resultados foramrepresentados por gráfico em forma de pizza, onde cada fatia representa uma dasalternativas de resposta das perguntas9 ANÁLISE DE DADOS E RESULTADOS De acordo com pesquisa 85% dos usuários internos e 97% dos externos pensam queo Sitram é melhor ou muito melhor que o Cometa. Figura 2 Comparação com COMETA – usuário externos Figura 3 Comparação com o COMETA – Usuário interno Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

38 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ Quanto ao aspecto em que o Sitram deveria melhorar, os itens mais escolhidosforam ‘clareza de mensagens e críticas’ e ‘velocidade de internet’, 63% dos usuáriosexternos e 82% pelo usuário interno. Figura 4 Sugestões para melhorias do Sitram – usuário externos Figura 5 Sugestões de melhorias do Sitram – Usuário interno O Sitram, independente de outros sistemas, foi considerado bom ou ótimo por 85%dos usuários externo e 93% dos usuários interno. Figura 6 Classificação do Sitram – usuário externos Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

39 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁ Figura 7 Classificação do Sitram – Usuário interno10 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho teve como objetivo geral analisar a satisfação dos usuários quanto àsmelhorias sistêmicas no processo de arrecadação do ICMS nas divisas do Ceará a partir docontrole e fiscalização das mercadorias em trânsito. Foi feito um breve relato sobre os recursos públicos, onde o tributo é o maiorrepresentante em termos de arrecadação. Dada a devida importância, a Sefaz dispensamuitos controles nas operações de circulação de mercadoria em trânsito. Os sistemas ficamcada dia mais sofisticados e acompanham as mudanças tecnológicas, e, desta forma,atendem as necessidades da Sefaz e melhora o acesso do usuário. Quanto a satisfação do usuário em relação ao sistema e em comparação àsistemática anterior, percebe-se que tanto o usuário interno como o externo consideram onovo sistema muito bom e que é melhor que o anterior. O usuário interno, talvez por estarusando diariamente, mostrou-se mais satisfeito que o usuário externo. No que diz respeito as principais necessidades do usuário em relação a melhoriassistêmicas, os itens mais citados foram clareza nas mensagens e críticas e velocidade deinternet. O usuário interno solicitou mais velocidade e o externo mais clareza. Essasrespostas deixam clara que é necessário facilitar a interpretação do sistema e melhorar olink de internet. É de grande relevância para a administração do serviço público executar novaspesquisas sobre o tema abordado neste trabalho onde possa detalhar mais as dificuldadespor grupo de usuário no sentido de verificar onde o processo pode ser melhorado. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

40 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DA ARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁREFERÊNCIASALVARENGA, Estelbina Miranda de. Metodologia de la Investigación Cuantitativae Qualitativa: Norma técnicas de presentação de trabajos científicos. Ed. A4Deseños, Asunción. 2013.AMARAL, L. S. P. G. A Progressividade da Tributação Sobre o Consumo: EstudoComparativo entre os Estados do Ceará e São Paulo 2012. 71 f.. Dissertação(Mestrado Profissional em Economia – MPE) – Universidade Federal do Ceará – UFC,Curso De Pós-Graduação Em Economia – CAEN. Fortaleza (2012).BITTAR, Eduardo C. B. Metodologia da Pesquisa Jurídica: Teoria e Prática daMonografia para Curso de Direito. Ed 11. Editora Ática. São Paulo 2013.BRASIL Constituição Federal (1988) Constituição da República Federativa doBrasil. Disponível emhttp://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 20 demarço de 2015.BRASIL. Lei Nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema TributárioNacional - e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados eMunicípios, denominado Código Tributário Nacional. Brasília, DF Presidência daRepública. Disponível em http://www.planalto.gov.br acesso em 19 de setembro de2014.CEARÁ, Decreto Nº 24.569/1997 de 31 de julho de 1997. Consolida e regulamenta alegislação do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobrePrestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação(ICMS), e dá outras providências (Regulamento do ICMS do Estado do Ceará -RICMS). Diário Oficial do Estado de 04 de abril de 1997. Fortaleza, CE.CEARÁ, Lei 11.961 de 10 de julho de 1992 – Selo Instituiu o Selo Fiscal e dá outrasprovidências. Diário Oficial do Estado de 11 de junho de 1992. Fortaleza, CEDRUCKER, Peter Ferdinand. As Fronteiras da Administração. Tradução RicardoBasto Vieira. Elsevier. Rio de Janeiro 2012DRUCKER, Peter Ferninad. Gestão Managent Com Joseph A. Maciariello.Tradução de Luis Reyes Gil, Agir, Rio de Janeiro, 2010 Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

41 SATISFAÇÃO DO USUÁRIO COM A MELHORIA NO PROCESSO DAARRECADAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA DO CEARÁFINLEY, Rya. Survey Monkey, fornecedor mundial de soluções de questionário pelaWeb. Disponível em https://pt.surveymonkey.com/) acesso em 10 de novembro de2014JORNAL Sefaz Novo Tempo, Fortaleza, Sefaz maio de 1993, Ano I nº 003RECEITAS PÚBLICAS: manual de procedimentos aplicado à União, Estados,Distrito Federal e Municípios / Ministério da Fazenda, Secretaria do TesouroNacional, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Secretaria deOrçamento Federal. – 4. ed. –Brasília: Secretaria do Tesouro Nacional, Coordenação-Geral de Contabilidade, 2007. Disponível emhttp://anexos.datalegis.inf.br/arquivos/1235321.pdf acesso em 17/01/2015.RIBEIRO NETO, José. Direito Tributário & Legislação Tributária do Estado doCeará: Comentários Doutrina e Jurisprudência. 4. Ed. – Fortes, Fortaleza, 2011ROCHA. J. A. Oliveira. Mudança do Estado e mudança da AdministraçãoPública: A história duma disciplina, in Handbook de Administração Pública, InaEditora, Lisboa, 2013SAMPIERI, Roberto Hernández. Collado, Carlos Fernández & LUCIO, Pilar Baptista.Metodología de la Investigación. 5 Ed. Editora McGraw-Hill. México DF. (2010)Disponível emhttps://www.academia.edu/6399195/Metodologia_de_la_investigacion_5ta_Edicion_Sampieri. Acesso em 10 de janeiro de 2015.SILVA, Jorge Vieira da. Administração estratégica responsável: competitividade eresponsabilidade. Update, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 1-25, jan./jun. 2014. Disponívelem http://periodicos.faccentro.com.br/index.php/Update/article/view/16/5 em 16deoutubro de 2014SILVESTRE, Hugo Consciência. Gestão Pública: Modelos de Prestação no ServiçoPúblico. Escolar Editora, Lisboa 2010 Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.23-41

A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICA Luiz Carlos Mendes de Vasconcelos¹RESUMOO objetivo central deste artigo é apresentar elementos para discussões acerca datransmissão do saber psicanalítico no âmbito das Universidades. Para que possamoscompreender melhor o conhecimento proporcionado pela teoria psicanalítica, necessário sefaz discorrer sobre algumas premissas básicas da Teoria Psicanalítica, com o auxílio dealguns autores renomados, além do pai da psicanálise, Sigmund Freud, autoresconsiderados pós-freudianos como, por exemplo, Jacques Marie Émile Lacan, MelanieKlein, Donald Woods Winnicott, dentre outros. Por conseguinte, iremos analisar acerca dafragmentação na transmissão do saber psicanalítico, por conta da fragilização e dainformalidade existentes nas diversas instituições de ensino que se propõem a lidar com oensino da teoria psicanalítica. Dentre as dificuldades existentes na transmissão dosaber psicanalítico, iremos investigar sobre a linguagem inconsciente, enquanto saberenigmático, considerado por alguns autores, apresentados neste artigo. Por fim,discorreremos acerca das possibilidades do ensino da teoria psicanalítica no âmbito dasuniversidades, sua importância para o campo dos demais saberes, quais sejam asociologia, a antropologia, as ciências exatas, mais especificamente a biologia, a filosofia,a psicologia, a psiquiatria, e tantas outras. A metodologia adotada para a elaboração destetrabalho, quanto a abordagem, será uma pesquisa do tipo qualitativa; quanto aos objetivos,será uma pesquisa do tipo descritiva e explicativa e, quanto a modalidade, será do tipobibliográfica.PALAVRAS-CHAVE: Teoria Psicanalítica, Universidades, Inovação Pedagógica,Inconsciente, Ciência, Ensino Superior.¹ Mestre em Gestão Pública pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, Especialista em TeoriaPsicanalítica pela Faculdade Redentor do Rio de Janeiro, Licenciado em Ciências Físicas e Biológicaspela Universidade Estadual do Ceará – UECE, Bacharel em Administração de Empresas pelaUniversidade Estácio de Sá – UNESA e Funcionário da Caixa Econômica Federal. Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

ABSTRACTThe main objective of this article is to provide elements for discussion about the transmissionof psychoanalytic knowledge within the universities. So we can better understand theknowledge provided by the psychoanalytic theory, they have to talk about some basicpremises of Psychoanalytic Theory, with the help of some renowned authors and the father ofpsychoanalysis, Sigmund Freud, post-Freudian authors considered such as Jacques MarieEmile Lacan, Melanie Klein, Donald Winnicott Woods, among others. Therefore, we willexamine about the fragmentation in the transmission of psychoanalytic knowledge, due to theweakening existing and informality in different educational institutions that purport to dealwith the teaching of psychoanalytic theory. Among the difficulties in the transmission ofpsychoanalytic knowledge, we will investigate the unconscious language, as knowledgeenigmatic, considered by some authors in this article. Finally, we will discuss about thepossibilities of the psychoanalytic theory teaching within the university, its importance to thefield of knowledge too, namely sociology, anthropology, sciences, specifically biology,philosophy, psychology, psychiatry, and so on. The methodology adopted for the preparationof this work, as the approach is a qualitative type research; the aims, will be a survey ofdescriptive and explanatory type and, as the sport will be the bibliographical.KEYWORDS: Psychoanalytic Theory, Universities, Pedagogical Innovation, Unconscious,Science, Higher Education Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

44A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICA 1. INTRODUÇÃO Segundo Sigmund Freud (1918), fundador da teoria e da prática psicanalítica, oensino de sua teoria no âmbito das universidades pode ser analisado sob dois pontos devistas: o da própria psicanálise, enquanto teoria e práxis, e o da universidade, como oespaço mais adequado para a transmissão desse saber. No referido artigo, intitulado Sobreo Ensino da Psicanálise nas Universidades, ele afirma que: A inclusão da psicanálise no currículo universitário seria sem dúvida olhada com satisfação por todo psicanalista. Ao mesmo tempo, é claro que o psicanalista pode prescindir completamente da universidade sem qualquer prejuízo para si mesmo. Porque o que ele necessita, em matéria de teoria, pode ser obtido na literatura especializada e, avançando ainda mais, nos encontros científicos das sociedades psicanalíticas, bem como no contato pessoal com os membros mais experimentados dessas sociedades. No que diz respeito à experiência prática, além do que adquire com a sua própria análise pessoal, pode consegui-la ao levar a cabo os tratamentos, uma vez que consiga supervisão e orientação de psicanalistas reconhecidos (FREUD, Obras Completas, Volume XVII, 1918, p.187). Quando pensamos na relação entre psicanálise e educação, não devemos propor aaplicabilidade da teoria e, principalmente, da prática na educação, mas sim como a formade transmissão dessa teoria na busca da compreensão desse saber. Essa preocupação existee pode ser encontrada nos dizeres de Freud, conforme acima explicitado, sobretudo no quediz respeito às distinções claras e precisas que o autor faz ao mencionar as diversasinstâncias em que o saber psicanalítico se propõe a estar. A psicanálise pode ser absorvida pelo sujeito sob vários pontos de vista, dosquais um pode ou não se relacionar com os outros. Pode-se entender a psicanálise comoum estudo do funcionamento psíquico do ser humano, como uma teoria científica paraaplicabilidade na prática clínica, como uma prática de cura das doenças da alma, ou ainda,como uma prática filosófica de vida, etc. Esta ideia encontra acordo em ZIMERMAN(1999), quando diz: O gênio de Freud possibilitou que, entre avanços, recuos e sucessivas transformações, ele construísse os alicerces essenciais do edifício metapsicológico e prático da psicanálise, sempre estabelecendo interrelações entre a teoria, a técnica, a ética e a prática clínica (ZIMERMAN, 1999, p.25). Outro importante ponto a ser considerado na relação entre psicanálise eRevista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

45A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICAeducação está no conceito de “saber” de ambas as partes. O conceito de saber para aeducação está intimamente ligado ao conceito de conhecimento, na medida em que osujeito sabe a partir da soma de conhecimentos que adquire ao longo de sua vida. Osconhecimentos adquiridos na educação infantil, educação básica, educação superior,etc., além dos conhecimentos absorvidos pelo senso comum. A teoria psicanalítica coloca o conceito de saber numa instância outra com relaçãoao conhecimento proposto pela educação. Enquanto esta coloca o saber comopossibilidade, a psicanálise propõe a derrota do sujeito enquanto possibilidade de saber, namedida em que o sujeito que sabe é o sujeito do Inconsciente, como instância inacessível àconsciência. Paulo Freire (1992), em Pedagogia da Esperança, diz: Minha experiência vinha me ensinando que o educando precisa de se assumir como tal, mas, assumir-se como educando significa reconhecer-se como sujeito que é capaz de conhecer e que quer conhecer em relação com outro sujeito igualmente capaz de conhecer, o educador e, entre os dois, possibilitando a tarefa de ambos, o objeto do conhecimento (FREIRE, 1992, p. 47-9). Segundo o autor a educação tem como foco a busca do conhecimento. Esta ideiasegue na contramão do conceito de saber de muitos psicanalistas, assim como para asdiversas escolas, associações, cartéis e sociedades psicanalíticas espalhados pelos diversospaíses do globo. Podemos dizer que o conceito fundamental da psicanálise é o conceito deInconsciente proposto por Freud no início do século XX, onde afirma existir uma instânciapsíquica que se manifesta no sujeito consciente. Um saber que surge por meio dossintomas, dos atos falhos nas palavras, atos falhos nos gestos, nos sonhos e nos chistes, naqual não se pode ter acesso pela via da consciência humana. J.-D Nasio (1993), nos revelao Inconsciente como: ... um saber que não podemos apreender diretamente. O inconsciente como saber é mais do que uma hipótese, é quase uma tese, ou melhor, um princípio, ou ainda um axioma. Isso quer dizer que não conhecemos o inconsciente, não podemos apreendê-lo, ele não é tangível, é tão intangível quanto o número imaginário i (NASIO, 1993, p. 52).A transmissão da teoria psicanalítica nas universidades, o discurso do sujeitoRevista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

46A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICAinconsciente enquanto um saber inacessível à consciência humana, a possibilidade deadmissão do saber psicanalítico como uma ciência capaz de aceitar o insabido, são algunsdos questionamentos que propomos trabalhar mais elaboradamente neste artigo, para quepossamos sutilmente colocar em discussão e tentar produzir uma teia deconhecimentos, com vistas a uma maior inserção da teoria psicanalítica na academia e nasociedade. Para tanto discorreremos acerca de algumas premissas e conceitos fundamentaisrelativos à teoria psicanalítica, a fragmentação na transmissão desse saber, por conta dainformalidade e da não regulamentação nas diversas instituições oficiais de ensino.Discutiremos também sobre a linguagem inconsciente, enquanto um saber que foge àconsciência humana, e, por fim, falaremos sobre as possibilidades e dificuldades existentespara o ensino da psicanálise no âmbito das universidades. Neste contexto este artigo se propõe responder a seguinte questão central: Comointercalar a Teoria Psicanalítica, enquanto um saber verdadeiramente cientifico, noâmbito das Faculdades e Universidades como forma de inovação pedagógica, criando umamodalidade de licenciatura no ensino de nível superior? A metodologia adotada neste trabalho será múltipla, conforme segue: Quanto à abordagem, a pesquisa será do tipo qualitativa, pois diferentemente dapesquisa quantitativa, que normalmente aborda aspectos objetivos e mensuráveis, aqualitativa abordam pesquisas mais voltadas para o campo das ciências sociais, pela suaprópria etimologia que teve início pela prática desenvolvida no estudo da antropologia. Segundo Lakatos & Marconi (2007): A metodologia qualitativa preocupa-se em analisar a interpretar aspectos mais profundos, descrevendo a complexidade do comportamento humano. Fornece análise mais detalhada sobre as investigações, hábitos, atitudes, tendências de comportamento, etc. (LAKATOS e MARCONI, 2007, p. 269). Quanto aos objetivos, a pesquisa será do tipo descritiva e explicativa, na medida emque, faz-se necessário descrever as características fenomenológicas das variáveisestudadas, bem como explicar os fatores determinantes que contribuem para as ocorrênciasdos fenômenos colocados em questão, na busca de se chegar às razões e aos porquêsquestão central e seus objetivos específicos. O trabalho aqui apresentado, quanto à modalidade, ou seja, quanto aos Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

47A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICAprocedimentos técnicos utilizados, será do tipo bibliográfico, pois segundo Vergara (2007)a “Pesquisa Bibliográfica é o estudo sistematizado desenvolvido com base em materialpublicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, isto é, material acessível aopúblico em geral (VERGARA, 2007, pág. 48)”, que, neste sentido, atende ao objetivoproposta deste trabalho acadêmico. Devido a abordagem da pesquisa ser do tipo bibliográfico, os dados serãocoletados por meio de livros, dicionários, trabalhos acadêmicos, como teses de doutorado,dissertações de mestrado, monografias ou artigos com dados pertinentes ao assunto, bemcomo páginas da internet. 2. ALGUMAS PREMISSAS BÁSICAS DA TEORIA PSICANALÍTICA Na teoria psicanalítica nos deparamos com vários conceitos fundamentais que foramse aperfeiçoando ao longo da trajetória científica e literária de Freud. Neste artigo noslimitares a expor o conceito de pulsão articulada aos princípios de funcionamento doaparelho psíquico: princípio de Constância ou nirvana, princípio do prazer e princípio darealidade. Justifica-se nossa escolha em virtude de que tais conceitos constituem-se basesepistemológicas da psicanálise. Nos subitens seguintes também trabalharemos com oconceito de Inconsciente. Em 1915, ao escrever um artigo intitulado O Instinto e suas Vicissitudes, Freudreforça suas articulações e ideias acerca da dinâmica do inconsciente, enquanto umsaber independente e livre da influência da dinâmica consciente. Segundo Freud, o homem dispõe de um sistema perceptório do aparelhopsíquico, que sofre uma ação constante dos estímulos provindos tanto do mundo externoquanto do interno. Freud denomina os estímulos internos, que se impõem dentro doaparelho psíquico, de instintos (pulsões), e que busca de uma forma constante passar dosistema inconsciente para o sistema consciente. A pulsão de vida, também chamada de“Eros”, abrange a energia de natureza sexual, e visa a auto conservação do sujeitoenquanto organismo. Em contraposição a essa força, Freud denomina a pulsão de morte.Segundo Laplanche e Pontalis (2000), em Vocabulário de Psicanálise, com relação àpulsão de morte, dizem: No quadro da última teoria freudiana das pulsões, designa uma categoriaRevista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

48A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICA fundamental de pulsões que se contrapõem às pulsões de vida e que tendem para a redução completa das tensões, isto é, tendem a reconduzir o ser vivo ao estado anorgânico. Voltadas inicialmente para o interior e tendendo à autodestruição, as pulsões de morte seriam secundariamente dirigidas para o exterior, manifestando-se então sob a forma da pulsão de agressão ou de destruição (LAPLANCHE E PONTALIS, 2000, p. 407). Relativamente aos estímulos externos o sujeito tem possibilidade de fuga, na medidaem que pode identificá-lo como desagradável através da percepção sensorial, ou seja, peloscinco sentidos; visão, audição, tato, paladar e olfato. Contudo, quanto à força pulsional,surgida do interior do aparelho, não há possibilidade de fuga, mas sim apenas a tentativade resistência frente a sua manifestação das diversas formas possíveis e inimagináveis. Apartir dessas ideias, Freud realiza estudos sobre a ansiedade, a angústia e a depressãocomo consequência da dinâmica psíquica. O princípio de constância ou princípio de nirvana representa a força que atua dentrono inconsciente e que, de certa maneira, possibilita o movimento dos demais sistemas, queFreud denomina pré-consciente e consciente. O desejo inconsciente atua o tempo todo como forma de descarga de catexiaspulsionais de natureza sexual, não no sentido sexual propriamente dito, mas no sentido debusca de prazer, de modo que, tudo o que visa prazer, tem natureza sexual. Esta ideia,na época, foi bastante criticada pela classe científica, como também pela opinião pública. Podemos entender que não há dualismo entre o psíquico e o somático, entremente e corpo. Só existe um se existir o outro. A pulsão surge da fusão dessas duas coisas:psique e corpo; e desta forma, o sentido de conceito de pulsão ganha o mesmo sentido deconceito de vida orgânica, na medida em que aquela se utiliza do psíquico para semanifestar no corpo, mesmo que por utilização da fala enquanto uma extensão somática dosujeito. Portanto, podemos pensar na pulsão como o elo entre o psíquico e o corpo, quetransforma o inorgânico em orgânico, e vice-versa, regido primeiramente, único eexclusivamente, pelo princípio de constância, e à posteriori, pelo conflito existenteentre os princípios de prazer, regido pelo sistema inconsciente do aparelho psíquico, eprincípio da realidade, como sistema criado pelo sistema consciente para se defenderfrente às pulsões provindas da dinâmica inconsciente. Freud denota a importância dessa guerra psíquica para o desenvolvimento dosórgãos sensoriais, que se acham voltados para o mundo externo, pois são ligados àRevista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

49A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICAconsciência, como se esta aprendesse a abranger qualidades sensórias, como a notação, aatenção e a memória, capazes de dar conta o suficiente para conter as forças internasprovindos do sistema inconsciente. Daí a importância de se entender que é a partir datenra idade e do conflito intrapsíquico que o sujeito torna-se capaz de compreender omundo e interagir no meio social, primeiramente adquirindo a capacidade deadministrar seus conflitos internos, para que num segundo momento possa ter a força e osmeios necessários para se defender frente às ameaças oriundas do mundo externo. A teoria da aprendizagem é uma consequência da resultante dessas forças,inicialmente alheias ao sujeito, na medida em que o sujeito só terá capacidade decompreender o mundo que está a sua volta se passar por esse processo de conflitos,baseados no trauma, na cisão, na repressão e no recalcamento dos significantes,inicialmente não compreendidos pelo próprio sujeito, mas que, a posteriori, no chamadoretorno do recalcado, o sujeito dê nome ou significado a esse material estranho que voltaráà consciência, quando esta estiver pronta o suficiente para conseguir dar um sentido àquiloque vem a toma em busca de uma explicação lógica. Freud coloca que o princípio da realidade contribui para esse feito, ou seja, aconsciência tenta dar sentido ao caos que surge da linguagem enigmática vinda dasprofundezas do inconsciente; o sonho sem sentido, regido pelo princípio do prazer, quebusca único e exclusivamente a satisfação da pulsão, enquanto pura energia, que tenta sairdo sistema, como um vulcão que jorra sua lava com toda voracidade e sem pensar nasconsequências lógicas, apenas flui. Para conter essa explosão, a realidade busca a lógica,se utilizando das ações, do pensamento e das palavras como válvulas de escapes para que aenergia se dissipe de forma mais diluída, moderada e equilibrada. A educação que trabalha o sujeito e o faz aprender, ler, pensar, falar, etc. Tudo issocontribui para o equilíbrio do sistema, como um todo. Quanto mais se trabalha aconsciência, maior a possibilidade de articular ideias e mais força se adquire paramanter longe a forte pressão de descarga proporcionada pelo princípio do prazer. Freud(1911), em Formulações Sobre os Dois Princípios do Funcionamento Mental, colocaque, A educação pode ser descrita, sem mais, como um incentivo à conquista do princípio do prazer e à sua substituição pelo princípio da realidade; isto é, ela procura auxiliar o processo de desenvolvimento que afeta o ego. Para este fim, utiliza uma oferta de amor dos educadores como recompensa; e falha, portanto, se uma criança mimada pensa que possui esse amor de qualquer jeito e não pode Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

50A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICA perdê-lo, aconteça o que acontecer (FREUD, Obras Completas, Volume XII, 1911, p. 242). A lógica criada pela consciência, regida pelo princípio da realidade do mundoexterno, se conflitua com a linguagem ilógica, insana e caótica do inconsciente. É nesse contexto inicial de seus estudos que Freud cria todo um arcabouçoteórico para transformar suas ideias e de outros autores, dos quais fez uso, para fazernascer uma nova ciência, na qual, até os dias de hoje, os intelectuais se amparam e sebaseiam para provar as mais variadas hipóteses no mundo acadêmico, seja nas ciênciassociais, biológicas, filosóficas e humanas. 3. A FRAGMENTAÇÃO NA TRANSMISSÃO DO SABER PSICANALÍTICO Um aspecto importante diz respeito à informalidade existente no ensino da teoriapsicanalítica. A diversidade de associações e sociedades, inclusive com fins religiosos,espalhadas nos mais variados países do globo, sobretudo nos países da América Latina,tenta se apropriar da teoria com o objetivo de propor a cura dos males da alma. Podemos supor que esta fragilidade na estrutura do ensino da teoria, e até por quenão dizer banalização, se dá por conta de não haver uma formalidade única na formaçãode psicanalista, bem como na formação de especialistas, na qualidade de professores, parao ensino da teoria psicanalítica nas universidades. Encontramos as mais variadasposturas na formação de analistas, desde a análise didata¹, com a formação decartéis vinculados a determinada associação ou sociedade, que seguem suas regrasinternas como forma de se obter o passe de analista vinculado a esta ou aquela, sem omínimo controle ou acompanhamento de um órgão nacional ou internacional. No que diz respeito ao Brasil, sabemos que a profissão de Psicanalista estádevidamente amparada segundo as normas do Ministério do Trabalho, e é consideradauma profissão livre, não regulamentada. Contudo, é reconhecida como profissão pelaClassificação Brasileira de Ocupações (CBO), instituída pela portaria ministerial nº.397, datada de 9 de outubro de 2002, sendo o psicólogo e o psicanalista identificados como mesmo código, o de n.º 2515, qualificando-os como uma das ocupações no mercado detrabalho. Apesar de haver uma subdivisão especificando o Psicanalista com o subcódigo50, ou seja, 2515-50, tanto para o profissional psicólogo como para o psicanalista éRevista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64

51A TEORIA PSICANALÍTICA COMO UMA POSSIBILIDADE DEINOVAÇÃO PEDAGÓGICAusada a mesma Descrição Sumária constante do CBO (2550), que diz:1 [Do grego didaktós] Pessoa que instrui. Fonte:Dicionário Aurélio 2515:: Psicólogos e psicanalistas Descrição Sumária Estudam, pesquisam e avaliam o desenvolvimento emocional e os processos mentais e sociais de indivíduos, grupos e instituições, com a finalidade de análise, tratamento, orientação e educação; diagnosticam e avaliam distúrbios emocionais e mentais e de adaptação social, elucidando conflitos e questões e acompanhando o(s) paciente(s) durante o processo de tratamento ou cura; investigam os fatores inconscientes do comportamento individual e grupal, tornando-os conscientes; desenvolvem pesquisas experimentais, teóricas e clínicas e coordenam equipes e atividades de área e afins (CBO, 2009, http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTituloResulta do.jsf ). Como vemos, no Brasil, no que concerne ao mercado de trabalho, bem como nosórgãos do governo federal e na legislação vigente não há distinção na descrição dasprofissões de psicólogo e psicanalista. De certa forma, entendemos que existe um paradoxo, na medida em que se colocamduas profissões nas quais os tipos de formação são completamente adversas, pois de umlado há um rigor convenientemente cientifico, e do outro há uma informalidadeexacerbada, pois sabemos que se exige do psicólogo uma formação acadêmicarigorosa, onde o estudante que se propõe a seguir essa carreira se prepara dentro dos anaisdas diversas academias universitárias por um período mínimo de cinco anos. Por outrolado, os cursos “livres” disponíveis para os estudantes interessados em se tornarempsicanalistas ou professores psicanalistas são tão variados que se torna inviávelidentificarmos no meio de tanta diversidade o período, o conteúdoprogramático e a qualidade desses profissionais no mercado de trabalho. É importante salientar a tamanha responsabilidade que os profissionais ligados aosofrimento psíquico humano têm em suas mãos. Na busca de soluções para aliviar seusofrimento tão íntimo e peculiar, que muitas vezes o guardam por tanto tempo, resistindo àbusca da solução necessária para aliviar sua dor, chegando ao consultório muitofragilizado, o paciente procura um profissional, seja psicanalista, psiquiatra ou psicólogo,Revista Trabalho e Sociedade, Fortaleza, v.2, n.2, Jul/Dez, 2014, p.42-64


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