Joaquim Alice ... do mais profundo de mim Vilca Marlene Merízio Organização, Introdução e Notas ARTE & LIVROS
... do mais profundo de mim
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JOAQUIM ALICE ... do mais profundo de mim Livro UM – Vermelho Chacra Básico – Muladhara Vilca Marlene Merízio Organização, Introdução e Notas ARTE & LIVROS
© 2020 Editora Arte & Livros Projeto gráfico, capa e editoração: pamalero artes Revisão: Vilca Marlene Merízio Ficha catalográfica A398d Alice, Joaquim ...do mais profundo de mim : Livro Um – Vermelho Chacra Básico – Muladhara [Recurso eletrônico on- line] / Joaquim Alice; Vilca Marlene Merízio, organiza- ção, introdução e notas. – Florianópolis : Arte & Livros, 2020. 119 p. Inclui referências ISBN: 978-65-88719-05-3 (e-book) 1. Poemas. 2. Poesia portuguesa – História e crítica. 3. Filosofia. I. Merízio, Vilca Marlene. II. Título. CDU: 869.0-1 Ficha Catalográfica elaborada por Onélia Silva Guimarães CRB-14/071 Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, arquivada ou transmitida por qualquer meio ou forma sem prévia permissão por escrito dos autores. Impresso no Brasil
Sumário Introdução ao Livro UM ... do mais profundo de mim | 9 Poemas | 19 21 | Marés Natureza | 51 23 | Bolos de arroz... Fugir | 52 Ananás cerebral | 53 24 | Perdido? Da casa de cristal | 54 25 | Obrigado Pétalas de rosa | 55 27 | Observador O abutre | 56 28 | Obrigado Piloto automático | 57 O ego | 58 29 | Buffet A crise | 59 30 | Embotado Vida/respiração | 60 Verde vejo ... | 61 31 | É a toca Verde musgo, fluorescente | 62 32 | Aprendo Ventos | 63 Vento | 64 33 | Lodo Valsa da chuva | 65 34 | Contenho o grito Uivo | 66 Transformo | 67 36 | Fibrosado O pintor – o artista | 68 37 | Fibrosado II Tudo bem! | 69 Um céu... e um mar... | 70 38 | Agradeço Solto | 72 39 | Genuíno Rosa desatada | 73 40 | No meio A caverna | 74 42 | Momentos de instabilidade Ser quem sou | 75 43 | Compor harmonia A caminho da distância | 76 44 | Awakening Atamento | 77 45 | Pássaro solto 46 | Momento de glória 47 | Período da semente 48 | O coração... 49 | Existência inexistente 50 | Apenas
Aliviado | 78 O meu filão | 97 Em vão | 79 Sexo | 98 Ó, finitude | 80 Ode à chuva | 99 A vida do presente... | 81 Santa inquisição privada | 101 S ó b r i o | 103 Açor | 82 Ambição | 105 Atendendo a mim | 83 Longe... | 107 Espaço expandido | 108 Corrompido | 84 Festival de verão | 109 Energia mal aplicada | 85 Liberdade | 110 Pontes... que amo | 111 Calado | 86 Os dias de sombra... | 112 A fanfarra | 87 Descubro-me | 113 Dependência | 88 O meu nascer | 114 (Des)sintonias | 89 Anoitece | 115 Quero outros paradigmas | 90 Valeu a pena | 116 Crueldade | 91 Fim do dia | 117 Bombeiro | 92 Sou feliz! | 118 Encalho | 93 Chuva | 94 Muralha grande da China | 95 O tubarão branco | 96
... querida Vilquita, QUERO levar este projeto por diante, e conseguir publicar os “escritos” ... Não tanto por mim, ... mas sim POR TI ... ... (apreciadora e incentivadora desde a primeira hora/dia e trabalhadora incansável desde então ... e já lá vão muitos anos) ... ... e também PELOS LEITORES (pelo menos pelos leitores que consigam entrar na onda ou vibração adequada para os sentirem ... e desfrutem da sua leitura ... e, ainda, de algum modo, também, para que através de alguns deles (melhor) se encontrem/identifiquem). ... e ainda, mas não por último, a todos quantos estiveram ao meu lado desde a primeira leitura de um dos escritos, e que continuam a estimular incondicionalmente esta publicação. J.A.
escritos ... basta que me liberte de mim... e de tudo ... basta que SEJA ... (simplesmente) TUDO!
Introdução ao Livro UM ... do mais profundo de mim ... do mais profundo de mim é o título que encabeça os Joaquim Alice poemas lançados no Livro UM – Vermelho – da Primeira Parte,1 a Do Quaternário Inferior – desta coleção de oito livros, aqui literariamente considerada como um corpo antropomorfo de escrita, a que Joaquim Alice intitulou ... do mais profundo 9 de (todos) nós. Assim, o presente volume2 engloba poemas que, a princípio, foram criados pelo autor em diferentes datas e circunstâncias, de 2002 a 2018, mas que, especialmente para esta publicação, foram selecionados com o objetivo de compor a categoria que mais se aproxima das características de uma pessoa que age por impulsos e instintos ao ser influenciada pela predominância dos atributos do Chacra Básico. Cada um à sua maneira e competência, os chacras principais e secundários distribuem energia para todo o corpo físico e organizam a relação do ser humano com as suas próprias funções vitais desde as necessidades básicas de sobrevivência 1 Como já foi anteriormente justificada, a distinção tripartida da coleção deveu- se ao entendimento de que os atributos e as funções dos quatro primeiros chacras (Básico ou de Raiz, Umbilical, Plexo Solar e Cardíaco) estão presentes na caracterização das ações, pensamentos e sentimentos do eu poético dos versos que fazem parte dos Livros UM, DOIS, TRÊS e QUATRO, respectivamente. 2 O termo volume aparecerá, às vezes, como sinônimo de livro no que se refere aos livros que constituem esta obra.
imediata, de amparo e acolhida pelo meio, de identificação pessoal, de reconhecimento próprio à autopreservação, de ver satisfeita sua necessidade de tomada de decisão e de relacionar- se com outras pessoas, no sentido de amizade ou de amor. Os chacras agem como se fossem radares ou sensores internos, que nos avisam quando algo não está em bom funcionamento, mas nem sempre os ouvimos como deveria de ser. Se ouvíssemos o nosso corpo, talvez os males não se instalariam, porque primeiro as disfunções acontecem no nível energético para depois se revelarem no corpo físico.3 Em relação ao Primeiro Chacra, as energias movem-se principalmente motivadas pelo desejo de união sexual e de autovalorização, pela necessidade de sentir-se respeitado como um eu em desenvolvimento, pela intempestividade das emoções e dos sentimentos que variam de intensidade, tudo a ser influenciado pelas manifestações densas da mente concreta. No âmbito literário, ao criar os poemas que compõem este livro, provavelmente Joaquim Alice não pensou nesses detalhes, mas, ao se organizar a obra, o conteúdo ligado às funções do .... do mais profundo de mim primeiro chacra destacaram-se como uma categoria, a primeira que corresponde às atitudes da última infância de uma pessoa até a sua puberdade/adolescência. No caso em foco, seria, o despertar dos desejos de autoafirmação do eu lírico, cuja voz se ouvirá no crescer das tensões e no posterior amadurecimento do eu poético e na sua espiritualização, fatores que serão abordados nos livros seguintes. A ideia é apresentar os poemas mais simples e singelos neste primeiro livro, depois, à medida que os poemas vão crescendo em complexidade em relação ao 10 conteúdo, distribuí-los em volumes que vão deste primeiro até 3 Sobre este assunto ver: “El Pensamiento Cuântico”, de Dr. Fabian Ciarlotti et al. In: El Pensamiento Cuántico em las Terapias. Argentina: Ediciones Ricardo Vergara, 2007.
o oitavo desta coleção, cujo patamar de espiritualidade é o mais Joaquim Alice alto que hoje se comparado aos já existentes. Assim, para ser possível a comparação deste corpo antropomórfico de escrita (a obra poética de Joaquim Alice 11 em si) com as funções habituais dos corpos sutis e dos sete chacras principais que formam o corpo humano, farei breve resumo do que se entende por Chacra Básico, e logo em seguida, apresentarei alguns exemplos colhidos neste mesmo volume, que contenham as características que o identificam. Deixarei, depois, o leitor livre para fazer as suas próprias ilações interpretativas. O primeiro vórtice de energia que liga os corpos sutis ao corpo físico do indivíduo é conhecido como Primeiro Chacra, Chacra Básico ou de Base, ou ainda, Chacra Raiz. Em sânscrito,4 seu nome é Muladhara. Ele é o mais denso de todos os chacras que formam o Quaternário Inferior (Básico, Umbilical, Plexo Solar e Cardíaco). Apresenta caraterísticas relevantes no processo de desenvolvimento humano, voltadas para a questão de sobrevivência, segurança e amparo. Conquanto seja grosseiro, este centro de força é o alicerce da vida, o ponto de onde fluem as energias que nutrem todos os chacras do corpo em combinação com as energias astrais que descem do plano espiritual. À medida que a energia do primei- ro chacra vai fluindo para a parte superior do corpo, ela vai se tornando mais sutil, mais espiritualizada, até alcançar os altos patamares da Consciência Pura, do estado de transcendência cósmica. Todas as nadis5 importantes têm origem no centro deste chakra. Na cultura indiana, é no Chacra Básico que são 4 Sânscrito: antiga língua dos brâmanes, na Índia. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. 2008-2013. Disponível em: https://www.priberam.pt/dlpo/ s%C3%A2nscrito. Acesso em: 18 maio 2018. 5 Nadis: canais portadores de energia no corpo.
.... do mais profundo de mim repesentadas as divindades Brahma (criador do plano físico), VishnuShiva (princípio masculino) e a Deusa Kundalini6 (princípio feminino). No corpo humano, o Chacra Básico localiza-se no “períneo, abaixo dos genitais e acima do ânus, dentro do cóccix, no plexo pélvico, na base da coluna vertebral e das primeiras três vértebras”.7 Seu elemento é a Terra (não confundir com a ideia de Terra/planeta) e a sua cor é o vermelho. Simbolicamente, é representado pela flor de lótus de 4 pétalas.8 Seu órgão dos sentidos é o nariz, e seu sentido predominante é o olfato. O ânus é o seu órgão de ação. O seu mantra é a sílaba seminal (bija mantra) LAM que, quando reverbera em som ascendente, propicia atenção plena e força interior, energia que o protege em todos os sentidos. É no Chacra Básico que residem o poder e o desejo e onde dorme a energia Kundalini. Contudo, mesmo sendo o mais denso de todos os demais, este chacra persiste durante toda a vida do corpo físico, influenciando nas atitudes e nas tomadas de decisões do indivíduo, principalmente naquelas ocasiões em que os aspectos financeiros e o apego aos bens materiais estejam em jogo. Cabe à pessoa, conscientemente, transitar deste chacra 6 Kundalini, representada pela deusa Shakti, é de “suprema sutileza e tem um profundo desejo de união com o seu amado Senhor, o Ser Supremo”. Shiva, representando a Linga (falo), e Shakti são o eterno par de opostos. Shiva é a fonte de todo o conhecimento que não pode ser apreendido intelectualmente, só pelo sentir. A pessoa só pode ter acesso a ele quando se torna ‘consciente da verdadeira natureza de Si Mesmo, além da existência física e psicológica. Então, o Si Mesmo espiritual é nascido dentro” desse chacra. JOHARI, Harish. Chakras. Centros e 12 Energia de Transformação Trad. Maria Epstein. São Paulo: Pensamento, 2010, p. 108-109. 7 Idem, ibidem, p. 105. 8 As 4 pétalas representam as quatro modificações mentais importantes: estado de máxima alegria, estado de prazer natural, deleite no controle das paixões e a felicidade suprema na concentração. Idem, ibidem, p. 107.
para os superiores, porque ele sempre continua ativo e operante Joaquim Alice e, por isso mesmo, deve ser mantido em equilíbrio permanente, não importa a idade do sujeito. Para o equilíbrio geral de todos os corpos, deve ser atentamente observado, recebendo atenção constante e cuidados específicos, segundo a sua natureza. 13 Quando a energia que nele flui recebe atenção e cuidado, é certo que há possibilidades na realização dos sete desejos que todo ser almeja: segurança, despertar da sexualidade, vida longa, compartilhamento prazeroso, conhecimento, autorrealização e união sexual.9 Comportamentos agressivos de raiva, ganância, frus- tração, avareza, traição e sensualidade desmedida, geram desequilíbrios que o desalinham em relação ao bom funcio- namento dos outros chacras. Em harmonia com os demais corpos, sem que nada o perturbe e, quando sua força é usada moderadamente, a energia deste pimeiro chacra, influenciada pelo elemento terra, conecta-se com o desejo natural do indivíduo por conforto, estabilidade, remuneração pelo trabalho, abrigo e, principalmente, o desfruto de um prazer compartilhado. Como diz Miller,10 a necessidade de sentir os pés fincados no chão leva o indivíduo a cuidar da sua “ancoragem”11 em lugar seguro que preserve sua identidade e o deixe livre para ser feliz. 9 O chacra básico age como gerador, ativando os que o rodeiam, recarregando- lhes os sistemas de energia e dando-lhes disposição para o movimento. Quando bem alinhado e harmonizado com o coronário, possibilita equilíbrio interior e energia pessoal vibrante. 10 MILLER, Joan P. 2018, p. 50. 11 O nível de consciência do Chacra Base é o da sobrevivência, representado pelos reflexos fundamentais dos instintos diante do perigo e pela vontade de viver em paz em ambiente estável. É essencial equilibrar primeiro este chacra, porque ele constitui a pedra angular sobre a qual o edifício de nosso ser e de nossa consciência se constrói. Se a base for instável, o restante da construção desmoronará um dia ou outro.
.... do mais profundo de mimEsse ponto de ancoragem é a base sólida de um caminho em direção à espiritualidade: “corpo são em mente sã”! Como ponto de partida de uma iniciação poética, tanto quanto é o Chacra Base em relação ao começo da vida no ser humano, os poemas que compõem este Livro UM, de Joaquim Alice, no presente corpo antropomorfo de escrita (obra), são passagens literariamente manifestadas no tempo presente, com o eu lírico vivendo plenamente o seu momento de uma (ainda) pré-adolescência, quando passado e futuro não têm grande importância. Mesmo que os fatos que deram origem aos poemas sejam de caráter infantil ou juvenil, o autor deles se vale como que a dar início à sua jornada espiritual em direção ao Ideal Supremo da Paz e da Liberdade Espiritual, que só vai acontecer bem mais tarde no nível da espiritualização do Terciário Superior (Livros CINCO, SEIS e SETE). Por isso, dá-se o devido valor a esses versos iniciais, quase “naifs”,12 se considerados em comparação com os ulteriores, principalmente os da 3a Parte da obra – nível da Transcendência. Detecta-se coesão nos poemas de Joaquim Alice entre as características deste chacra e as relações com comida, bebida, dinheiro, sexualidade, habitação, locomoção, aspectos da natureza e do temor que tudo isso lhe falte. O medo do momento presente pode parecer pesado demais; então, a solução é o isolamento. 14 12 Naïf (francês): Arte na sua forma mais simples e de fácil compreensão do que está representado. In: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa. 2008-2013 https://www.priberam.pt/dlpo/naif. Acesso em: 18 maio 2018.
EXAURIDO de força e ânimo mentais .../ cego d’ esperanças Joaquim Alice .../... faço-me mudo .../ ... arco de palavras// ...// ... vivo em meu mundo (isolei-me!)13 Vejamos o poema “Marés” deste Livro UM, e localizemos a voz que fala. Fala no presente, fala sobre duas situações 15 íntimas: uma de frustração e outra de alento pelo dia que corre tranquilamente. E o poeta vai buscar, exatamente para expli- car a diferença entre esse dois tipos de estados de humor opostos, imagens simples, compreensíveis por qualquer leitor açoriano (talvez o brasileiro tenha de ir ao dicionário procurar saber o que são lapas e outros termos...) – a de maré baixa (e todo mundo conhece essa expressão como a de momentos difíceis) e a de maré alta, quando tudo corre bem na vida do indivíduo. Para além disso, pela aceitação do que não está bem e a consequente busca de recuperação, há um movimento no sentido de apreciar a natureza, mantendo-se em estado de gratidão e bom humor: Ora em maré-baixa e, quando nesta,/ como agora, [...] fico grato! Sereno!// Aguento-me à bronca. Esse poema pode parecer simples, sem grandes complicações estilísticas, mas na sua simplicidade e até na sua ingenuidade descritiva é que está centrada a mensagem filosófica desse pensador que é Joaquim Alice. Na verdade, os poemas podem parecer ingênuos, com linguagem acessível e pobre de figuras estilísticas e retóricas, mas eles têm uma função ao representarem, neste primeiro livro de Joaquim Alice, o Chacra Básico. Os versos são expressões que denotam o crescimento a que está submetido o ser humano e a evolução natural que vai ocorrendo com o passar do tempo e o amadurecimento consequente provocado pelas experiências da vida. Literariamente não há muito que 13 “Os dias de sombra, peso e desalento”.
se esperar. Todas as pessoas vivenciaram esse começo que prepara o indivíduo para a juventude e, posteriormente, para a vida adulta. Parte do início das aventuras amorosas, da época do deslumbramento e da fase da identificação pessoal. Tem a ingenuidade da infância e o atrevimento da adolescência o pseudo-heroísmo da juventude. O nível de consciência deste chacra de base localiza-se no movimento, na percepção do que é sentido fisicamente. Quando está em harmonia, deixa trasparecer um sentimento de bem-estar físico que permite ao indivíduo uma melhor satisfação vivencial. Quando lhe é negado esse direito, reclama, fala, grita. É o que se percebe extamente em “Bolos de arroz e bolas de Berlim” que podem parecer, à primeira vista, teimosia de criança, cuja vontade quer se afirmar frente a uma situação que a contraria. Mas, entrando no poema, verificaremos a importância do grito de liberdade que há nas entrelinhas: .... do mais profundo de mim Deixem que me aprenda... a mim! Não o que vocês são! [...] Não me impijam vosso gosto, Não me “abanem” o meu gostar. [...] Deixem-me escolher. Deixem-me estar! É o eu, em resistência, tomando forma, ancorando-se no seu próprio querer, que nem sempre, se o chacra estiver bloqueado ou com outro impedimento por excesso ou falta, 16 consegue realizar-se. Em “Perdido (estou)”, essa falta de chão, ancoragem em solo firme, volta a perturbar, talvez pelo fato de o seu portador estar, agora, – quem sabe de uma maneira ainda prematura – tendendo mais às forças energéticas dos
chacras superiores, quer dizer, ao mental abstrato, do que às Joaquim Alice necessidades materiais do corpo físico. [...] flutuo no intemporal... 17 sensação de estar solto... divagando... em sítio nenhum, mas por todo o lado, como se fora possível existir, ... apenas... no plano mental. E o que dizer de “Perdido?” O eu indaga, mas sabe que nesse atordoamento difuso não se encontrará a si mesmo. E a resposta só vem para o público leitor, bem mais tarde, já no período de amadurecimento espiritual, quando revela, no Livro CINCO, em “Meu Recanto”: Meu recanto sagrado não tem local (é cá dentro!). Em nenhum sítio se encontra (é no interior!), está sempre presente, embora, nem sempre, o ache, em cada momento. E assim, as imagens vão sendo lançadas por Joaquim Alice, reiteradas, quase que beirando a repetição exaustiva, na tentativa, sim, de fazer-se compreender, de deixar claro o caminho a seguir. E a voz que se exprime neste Livro UM é a de um EU Sozinho em começo de experiência vivencial, desprendido, isolado, depauperado, deprimido, como bem revela em “Fibrosado”: Estou carente de mim.
.... do mais profundo de mim Ou, quando diz, em “Apenas”, antecipando a próxima fase, a do relacionamento a dois, característica dos acontecimentos governados pelo 2o Chacra, o Chacra Umbilical: Sou... qual buraco negro, invertido. Quanto mais tenho, mais dou... Quanto mais absorvo, mais verto... Quanto mais carregado, mais leve... Quanto mais sério, mais alegre, mais contente. E enquanto sou tudo isso, nada sou! E, essa voz se reconhece na busca por um melhor viver que não seja o exílio de uma pessoa só, desacompanhada, numa ilha. Onde estou? Responde: Exilado/ [...]/ nesta ilha, rodeada de ausência. E, deixa evidente o seu querer bater asas (em “Quero outros paradigmas”) para outras lonjuras: mas brot[o]a... qual rebento pujante/ deste lodo peçonhento e pegajoso... Agora, sim, ... movido por esperança (ainda cega) ... ...qual fênix renascida, transform[a]o o vácuo... em Vida... E esse renascer repetido nunca finda: Termina... o dia, nasço eu... (“O Meu Nascer”). A cada anoitecer, um novo começo. Enquanto isso, vive o presente, conforme afirma em seu último poema, à guisa de fechamento do Livro UM: Felicidade Sim... sou feliz! E mais teríamos a apontar, mas... deixo aos leitores a vontade de saborear cada verso de Joaquim Alice nesta sua 18 verdadeira lição de vida. Florianópolis, 7 de outubro de 2019. Vilca Marlene Merízio
Poemas Olho mais pro Todo que pro lodo, fazendo tudo avançar com alegria e prazer do cumprido (e não do perfeito)... mas... com-pés-pr’andar.
Marés Tal como marés são os ânimos... Joaquim Alice Ora em maré-alta, cheia de força, certeza, segurança, fé ... Ora em maré-baixa e, quando nesta, 21 como agora, [...] fico grato! Sereno! Aguento-me à bronca... Qual lapa que, colada à rocha, se fecha, esconde e aguarda... Compraz-se em sua pequenez, tira partido do que tem ao (seu) dispor. Assim também o faço, olho em volta, em regozijo simples, muito simples, ... algo ingênuo (até), mas aprecio o que está ao meu alcance: o céu, o desenho das nuvens... o vento na cara, o calor do sol, tão agradável... o ruído de crianças a brincar; a música... o trabalho do pedreiro... o malhar do calceteiro, o sorriso da secretária, ... a companhia do pedinte (que pedira dinheiro p’ro café e opto por acompanhá-Lo), a piada do funcionário, o aceno do amigo, o cumprimento do colega, a conversa com o conhecido, o olhar (súbito) do pintor e a beleza colorida do canteiro em flor... A cidade que pulula, o polícia que (se) passeia,
.... do mais profundo de mimos clientes na esplanada, as manchas negras nas caras (que do sol protegem (os) olhos)... Deixo-me ir rua afora, pachorrento, em maré-baixa... mas usufruindo do manancial de ínfimos pormenores, ricos, inspiradores... que, em maré-alta, nos passam como que despercebidos... São migalhas, sim... grãos de areia... soltos, isolados do imenso areal, mas peças divinas ... que... em dia de maré-baixa... são o alento ideal. 22
Bolos de arroz e bolas de berlim Joaquim Alice (Enfardadeiras) Deixem-me escolher meus bolos... 23 ... larguem-me da mão!!! Deixem que me aprenda ... a mim! (Não o que vocês são...) Deixem-me escolher meus bolos, se p’la cor, tamanho, formato ... ou odor. Deixem-me ser. Não me impinjam vosso gosto, não me abanem14 meu gostar. Deixem-me preferir... Deixem-me escolher. Por favor... Deixem-me estar! 14 Abanar: agitar, sacudir, dar abanões a.
.... do mais profundo de mim Perdido? perdi-me ? ...??? Ou será que me estou a encontrar?!!! É estranho este sentir como que atordoado, sonâmbulo... anestesiado, mas sofrido... apoquentado. Centro-me, então, no momento, e aprecio a variedade de tudo que (ele) tem entesourado. Neste sentir me concentro, nesta riqueza recupero a força, a paz... o alento. 24
Obrigado Joaquim Alice Obrigado pela leveza... Obrigado pela clareza... 25 OBRIGADO!!! Bem mais limpo está o céu, já não está enevoado; vou descartando o “chapéu”,15 aos poucos... aliviado! É novo este meu sentir, diferente... outro... (até aqui) ignorado. O peso, o sufoco, a insônia estão a partir... Estou sereno e recatado. Deixei-me de jogos sujos, deixei de ser desatento... Meu outro ser é de cujus,16 aprendo com novo alento... Oferecido é que (já) não sou, passei a ser ofertado. Estou mais atento ao que dou ... ninguém se sente roubado. 15 Chapéu: aqui empregado em linguagem figurada. 16 De cujus: finado, falecido.
.... do mais profundo de mim Muito mais igual-a-mim. correspondo ao interior. Sinto-me melhor assim em vibração superior. E... se em síntese, me encontro, sinal que estou em louvor... Canto... cheio de fervor. Estou mais próximo do centro... 26
Observador Joaquim Alice o sol brilha... tudo aquece. A chuva teimosa cai... tudo arrefece. Nesta estação de inverno, já acredito em tudo: na cor, no doce e no lagarto, na proximidade... e empatia, como o gato que ronrona, não mia. Aconchegado na vida, escolho meu canto. Atento à vibração sou e aceito frio, calor, chuva, o arco-íris, o café e o biscoito (ou sua ausência!). Esbanjo aceitação, fabrico paciência. Sou bom... mas nunca o melhor... Mero servidor. Ao estar centrado, vejo o pormenor, observador... 27
.... do mais profundo de mim Obrigado (Ausência de torvelinho) Agradeço o cuidado, a atenção e o respeito, mesmo a liberdade e... até ... o jeito. É que estar e não estar, o ser aceite e o não ser, são jogos de equilíbrio que, à partida, são (estão) viciados, pois, estás logo vencido, porque te manténs desligado. Deixas o mundo, então, ser. Vais vendo tudo em redor, tentando manter o contato, mas... descontaminado!!! Quando chega o maremoto, estás no topo do morro sentado, e lá ficas ... sossegado... 28
Buffet Joaquim Alice está tudo presente ... sempre como num lauto buffet A mente ... sente quando o sentir ... vê 29
.... do mais profundo de mim Embotado Bloqueado... sem sentido... sem rumo e sem norte, sentindo o sufoco da inação... Nada no horizonte ... FLIC-FLAC... cambalhota... E eis-me de pé... hirto, queixo erguido, sabendo o destino, o objetivo, e crente no sucesso! (sem ligar ao como). 30
É a toca a toca agora se faz, Joaquim Alice constroem-se muros que sobem, emedam-se blocos... Reforçada a estrutura, nasce uma toca... compriiiiiiiida... Planos se fazem, se pensam, se imaginam... e são trocados, algo mesmo... em-ba-ra-lha-dos... Sabe-se apenas o que se desconhece e, em busca da verdade, se parte... ajuda aqui, ali e ainda além... Na cabeça: é um vaivém, chorrilho de decisões, avaliam-se alternativas, fazem-se comparações... E eis que a toca cresce, qual ninho que, de graveto em graveto, fio, pena, folha seca e penugem, forma vai tomando... Consistência e segurança também. Mera toca p’ro corpo, toca p’ro ambiente, protetora... qual refúgio... quer-se... até quente. 31
.... do mais profundo de mim Aprendo Quanto mais espero dos outros é sinal de que mais em falha estou ... para comigo. Quanto mais busco por fora, mais desatento me encontro ... no meu interior. Quanto mais me ofendo com os outros, mais inseguro me encontro (comigo mesmo). Quanto mais inseguro me sinto com os outros, mais esquecido de mim (ando). Quanto mais contido, fechado e zangado. mais vulnerável (me transformo)... Menos EU ... (sou), menos SOL deixo entrar pela janela do meu SER. Na vida tenho o meu ESPELHO... Sempre! O espelho do meu SER ... que aprendo a interpretar. 32
Lodo Por um pormenor apenas, deixo parado... o Todo. Como se perante o riacho cristalino se me detivessem os olhos ... no lodo pondo, assim, tudo em causa... Bastas vezes me entupo... Paro! Estagno! Emboto! Dou graças por este insight17 que permite analisar, ter consciência... e a oportunidade de (me) desembaraçar. Olho mais pro Todo que pro lodo, fazendo tudo avançar com alegria e prazer do cumprido (e não do perfeito)... mas... com-pés-pr’andar. Joaquim Alice 33 17 Insight (do inglês): visão, percepção, conhecimento, ideia, perspicácia
.... do mais profundo de mim Contenho o grito ... e o vento sopra... O mar está sempre chegando em ondas que atira contra a ilha, deixando seu alvo bordado em mancha larga junto à praia. O dia, já no fim, escurece lentamente. Eu contenho o grito, num desatino cego (com o meu interior), às apalpadelas... Não sei de mim... É tal a cegueira ou a teimosia (já nem sei), que nem me enxergo... Neste vácuo em que me encontro, até o ar me falta (mas respiro!). Lateja-me a alma em desatino, neste oceano vasto e profundo de dúvidas. O vento sopra... ligeiro e forte... abana18 o carro (até). E eu contenho o grito... ... Sempre! Esboço um sorriso... vem do fundo, tanto há p’r’agradecer, afinal... eu respiro, vivo! 34 18 ... balança o carro.
Nada me falta de momento, Joaquim Alice apenas o medo (do futuro) me perturba. Tontice... Santa Luzia já sabe, já trabalhou... já se fez luz e compôs a sinfonia, que pode ser ouvida (haja ouvidos afinados!)... E tudo está a encaixar-se na vida ... 35
.... do mais profundo de mim Fibrosado (... é como estou) Sinto-me enrijecer, o contrário de abrir e dar... Sinto-me fechar... anoitecer (entristecer), constrangendo a (minha) vontade. Sinto-me recolher... desconfiar, desimportar... deslizar... Quero eventualmente PARTIR. Magoa-me a tirania do guardar silêncio com tanto para dizer... Pesa-me tanto a Vida... Tinge-me o SER de tons pardos... E, pra onde quer que olhe, pra onde quer que me vire, apenas deparo com fardos... que me pesam... São carga, nada havendo que ma tire [está difícil... sequer sorrir(!)]. Sinto vontade de me voltar para dentro: estou carente... de mim. E essa carência reflete em quem mais prezo e quero... Enfim... 36
Fibrosado II Joaquim Alice no entanto... O sol brilha e verte LUZ, acende cores... a tudo. ... ... E... quero expor-me e... no processo, voltar a acender-me... Por dentro, emanar luz pra tudo... de novo... COLORIR. 37
.... do mais profundo de mim Agradeço (o apetite) Agradeço o apetite... o sabor... a satisfação, o contentamento... a alegria, o sol, a amizade, a diferença (de ser good, unpaired, strange, unusual, excentric)... e a igualdade. 38
Genuíno Joaquim Alice Algo em mim Chora (de rompante) (Sem sequer aviso prévio!) O amordaçado O esquecido O relegado Algo em mim se recusa a desistir Resiste Persiste Sabedor que é... da VERDADE Incontornável... Do mais profundo de mim O genuíno Aquele que sabe... Conhece o caminho. 39
No meio (olho do furacão) ... e então ?! Há furacão? Não sei... nem sequer m’ importo! .... do mais profundo de mim Haja ou não... só quero saber que me encontro no MEIO, lá ... onde tudo jaz... só... já foi agitação... e voltará a sê-lo... depois, tudo passará (à história). Só quero estar atento para que a paz e o silêncio de que desfruto sejam (os) do meio, do “olho do furacão”... e não apenas a paz podre e o silêncio inerte da estagnação. No MEIO é que quero estar, concentrado nesse polo d’agitação, ou de tranquilidade dinâmica, sem querer saber sequer do que se passa em redor. Queres ir consultar-me... (?) tenho a porta aberta, bate e entra... ou mesmo ... entra apenas, 40 que logo te receberei aberto, livre, pronto, p’ra criar em mim o necessário mimetismo, afinar a vibração pelo teu ser, pelo teu diapasão... E... uma vez isso feito, estou pronto p’ra te dar a visão do teu esgar...
E logo podemos julgar que Joaquim Alice caminhos são possíveis e, até, caso queiras, te decidires... (qual deles tomar!)... Até lá, deixa-me em paz... aqui fico... sossegado, no movimento suave, lento... mas muito concentrado, atento, no MEIO... a voar apenas p’ra no MEIO me manter... na certeza convicta, que é lá... lá mesmo... onde está o meu SER. 41
.... do mais profundo de mimMomentos de instabilidade Em planos superficiais é onde me sinto estar. Algo me interrompe ou impede de, mais fundo, mergulhar... são estratos isolados, estanques! 42
Compor harmonia Joaquim Alice Ao domesticar minha dor, fi-lo em muito boa hora: passei a poder compor harmonia... dentro e fora. 43
.... do mais profundo de mim Awakening clareza... luz... vastidão plana do oceano azul-bebê no céu de nuvens malhado... Estou aberto, bem e feliz, após ter mergulhado. 44
Pássaro solto Joaquim Alice embates constantes, vergonhas várias, sentires difusos, contenção, muita contenção, fábrica de silêncios, resignações... humildade exponencial! 45
.... do mais profundo de mimMomento de glória trabalho duro deixa-me puro... Trabalho pesado põe-me centrado... Trabalho diferente traz-me ao presente... É yoga harmonizador (p’ro meu corpo) este labor. Faço bem mais do que (inicialmente) projeto: vou fazer o chão... acabo também o teto e, extenuado ... feliz ... satisfeito... já com pouca luz do sol... em êxtase ... me deito (prostrado) no chão onde estou ... (mesmo ali), envolvido com os cães ... junto ao coração... Eis-me assim a desfrutar de linda bênção... 46
Período da semente Joaquim Alice ... estive morto enquanto vivia, era assim que eu existia... ... concentrava-me na vida, enquanto, a cada momento, morria. ... último olhar, último adeus... tal fora o último instante que, ... consciente ... vivia. ... era o sabor... o paladar... a mistura da vida ... e da morte... que eu sentia. ... queria viver, queria morrer, queria! ... era semente de novo olhar, enquanto o outro... ... lá ia... 47
.... do mais profundo de mimO coração, se pudesse pensar, pararia (F. Pessoa) Ajo... falo... trabalho... alimento-me... conduzo... faço compras... lavo os dentes, qual zumbi... sonâmbulo... pois o mais importante de mim está sabotado (por mim)... (paradoxo!) Sinto ser uma pena entesourar tanta riqueza quando afinal o segredo é... DISTRIBUÍ-LA (com certeza!) 48
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