2000) o valor de concentração de TPH sem efeito tóxico para a biota aquática é de 3000 ggâ. Os resultados obtidos por ENTRIX-NATRONTEC (op. cit.) na área estudada (Figura 8), indicam que em nenhuma das amostras coletadas foram encontradas concentrações que ultrapassassem este índice de referência. 100 Referência de LONG et ai. (1995) 10 - iiiiii.iiiiii11I1I1•ii __._IIII 10 Referência de LONG et ai (1995) O) E iIIIuIIIIIIIIulI 0,1 - Figura 7. Concentrações totais de PAH comparadas com valores de referência de LONG et ai (1995) 10000 1000 -J 100 lo 1111111111111e 111 11.iiIiIii F- WF- aJH co co -w i- mF-CÜ H coco COE- COCIJ COCOH CO -COE-LO u uu uH (O (O 04 O) O O co co (O (O Figura S. Concentração total de TPHs na água comparadas com índice de referência de concentração tóxica mínima para biota aquática (Modificado de ENTRIX-NANONTREC, 2000). Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 163
CONCLUSÕES Os resultados obtidos nas análises efetuadas nas amostras de sedimentos de fundo e na coluna d'água não foram suficientes para afirmar, com significativo nível de precisão, que o óleo nela contido possui relação direta com aquele derramado, quando do acidente com a balsa Miss Rondônia. Em algumas amostras foi detectada a presença de óleo com perfil geoquímico (\"finger print\") bastante semelhante ao apresentado pelo óleo Ai originário da balsa. Contudo, a presença de alguns componentes da família de PAHs encontrados no óleo Ai nos sedimentos, não pode ser tomada como prova inequívoca da contaminação dos mesmos pelo óleo derramado, a não ser que grande parte ou toda a série de PAHs contidas no óleo coletado na balsa estivesse presente nos sedimentos. Outro fato a ser considerado na interpretação da procedência do óleo encontrado nos sedimentos é que a área onde ocorreu o acidente com a balsa Miss Rondônia possui todo um histórico de intensa atividade marítima e portuária, inclusive com operações de carga e descarga de combustíveis Ai. Segundo ENTRIX- NATRONTEC (2000), cerca de 20.000 toneladas de óleo tipo Ai são movimentadas no porto de Vila do Conde todos os meses. De um modo geral, os resultados encontrados na coluna d'água não comprovam alterações nas carac- terísticas do meio aquoso, como decorrência direta do derramamento do óleo Ai. Entretanto, a presença de óleos e graxas em todas as amostras coletadas ressalta o comprometimento ambiental deste setor do rio Pará, em decorrência da intensa atividade marítima e portuária, o que inclusive impede que essa água seja classifi- cada como uma das Classes Especiais (i, 2 e 3) da Resolução CONAMA 20/86. As concentrações de poluentes potencialmente tóxicos, que poderiam estar relacionados com o óleo Ai oriundo da balsa Miss Rondônia, situaram-se bem abaixo daqueles considerados como referência internacional. Contudo, em função da natureza bioacumuladora desses poluentes nos sedimentos e, por conseguinte, na cadeia trófica, é necessário o monitoramento constante desses compostos na área em questão, até por quê trata-se de uma área com intensa atividade portuária e industrial e, consequentemente, de alto potencial de impacto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CDP - 2001 - Condições meteorológicas e hidrográficas do Porto de Vila do Conde. http:\\www.cdp.com.br ENTRIX-NATRONTEC - 2000 - Avaliação ambiental do incidente com a balsa Miss Rondônia, Be- lém-Brasil. Relatório Técnico-Pericial. LIMA & KOBAYASHI - 1988 - Sobre o quimismo predominante nas águas do sistema flúvio-estuarino de Barcarena, Pa. Geochimica Brasiliensis, 2 (i): 53-71. LONG, E.R.; MACDONALD, D.D.; SMITH, S.L & CALDER, F.D. —1995— Incidence ofadverse biological effects of chemical concentrations in marine and estuarine sediments. Environ. Manage. 19:81-97 RESENDE, WM. & FERRADAES, J. - 1971 - Integração geológica da bacia sedimentar da foz do rio Amazonas. Congr. Bras. Geol., 25./ São Paulo, Anais, 3:203-214. SCHÃLLER, H.; VASCONCELOS, D.; CASTRO, J. - 1971 - Estratigrafia preliminar da Bacia Sedimentar da Foz do rio Amazonas. Congr. Bras. Geol., 25. São Paulo, Anais. 3:189-202. Ecossitemas Costei7vs. impactos egestão ambiental 164
STANDARD METHODS FOR THE EXAMINANTION OF WATER AND WASTEWATER —1998, 20a ed. APHA-AWWA-WPCE NOTAS 'MCT-Museu Paraense Emílio Goeldi-MPEG. Coordenação de Ciências da Terra e Ecologia. Campus de Pesquisa, Av. Perimetral, 1901. Cep 66077-530, Belém-PA. E-mails: [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected] Ecossistemas Costeiras: impactos egestão ambiental 165
Processos Sociais e estratégias de vida
OCUPAÇÃO HUMANA DO LITORAL AMAZÔNICO' Lourdes Gonçalves Furtado' Resumo Enfatiza-se o processo de ocupação no litoral amazônico, particularmente na zona costeira do estado do Pará. As reflexões retomam ao período pré-histórico da ocupação dessa região, assinalando para a relação equilibrada mantida pelo homem, primero com o ambiente marinho, de onde resulta a reprodução social desses grupos. Parte dessa herança passada aos povos posteriores, é ainda encontrada residualmente no sistema tradicional dos habitantes contemporâneos, nessa região. Entretanto, a pressão demográfica e de outros fatores e ordem economica social e política, vem afetando drasticamente essa relação, causando impactos que merecem solução partilhada entre governo, cientista e comunidade nativa. Este trabalho chama a atenção para a necessidade de ações práticas a curto e médios prazos visando a solução dos problemas causados por esse impacto às populações tradicionais dessa região e congêneres, reforçando a recomendação da Reunião de Especialistas, realizada pela UNESCO, em Novembro de 1996, em Paris. Abstract This work emphasized the process ofoccupation in the Amazonian coast, particularly in the coastal zone of state of Pará. The reflections retake to the prehistoric period of the occupation of this region, designating for the balanced relation kept for the man with the marine environment, ofwhere the social reproduction ofthese groups results. Part of this inheritance passed to the posterior generation is still found in the traditional system of the inhabitants contemporaries, in this region. However, the demographic pressure and other social, economical and politics fàctors comes drasticaily affecting this relation, causing impacts that deserve common solution between government, scientist and native community This work calls the attention for the necessity ofshort and the average stated periods practical actions aiming at the solution of the problems caused for this impact to the traditional populations, strengt}iening the recommendation of the Meeting ofSpecialists, carried through for UNESCO, in 1996 November, Paris. APRESENTAÇÃO Decorridas mais de duas décadas de pesquisas e estudos antropológicos entre populações haliêuticas da Amazônia, na Coordenação de Ciências Humanas do Museu Paraense Emílio Goeldi, mostra-se aqui alguns dados sobre a ocupação do litoral amazônico, resultantes da convivência prolongada com diversas \"comunidades\" pesqueiras dessa região, em sucessivos anos de trabalho de campo e de análises bibliográfica e documental aos quais se incluem trabalhos de pesquisadores de outras instituições parceiras ou não. Essa convivência nos permitiu transitar em categorias de conhecimentos, muitas vezes, não traduzíveis pela simples quantificação de dados, mas sobretudo, pela observação direta e ação interpretativista. Nestes anos de pesquisa antropológica associada a outras ciências afins, deparamo-nos com um cenário socioambiental real, no qual se identificam especificidades socioculturais na relação h )mem-meio ambiente, que devem ser levadas em conta nas análises para o planejamento e gestão regionais; e no qual aparecem também problemas e conflitos, cuja solução está na base das expectativas da população. Este cenário é o da região costeira, entendida aqui como habitat de segmentos da chamada população cabocla ou tradicional da Amazônia.
A área de estudo compreende uma faixa litorânea que vai desde a costa do Amapá até ao Golfão Maranhense, onde a pesca é praticada com intensidade, principalmente por pescadores \"artesanais\". No Amapá, o litoral perfaz 598 km e no Pará 562 km, aproximadamente. Grandes e pequenos estuários enriquecem essa grande área cuja territorialidade tem sua construção histórica. \"Estuários e manguezais constituem refúgio e berçário de inúmeras espécies de animais (Isaac 1997). O maior estuário é formado pelas desembocaduras dos rios Amazonas e Tocantins, que apresenta uma riqueza em fitoplâncton a qual responde pela principal fonte trófica para a comunidade aquática, tornando- se alvo, portanto, da demanda social. Segundo Isaac e Barthem (1996) \"a corrente equatorial desvia grande parte da descarga da bacia amazônica para NW, ao longo da costa do Amapá\". Esse fenômeno, associado aos diferentes tipos de sedimentos da foz e plataforma amazônica, propicia a formação de ambientes que podem ser categorizados em quatro regiões pesqueiras distintas: Salgado, Baía e Ilha do Marajó, Foz Amazônica propriamente dita e Região Norte. Com tais características, a pesca enquanto manifestação dos usos dos recursos pela população costeira e de fora, encontra um campo propício para seu desenvolvimento. Assim praticam-se a pesca de subsistência, a pesca comercial e a pesca industrial. A sazonalidade das chuvas e, principalmente, do nível das águas do rio Amazonas influenciam na morfologia social, mobilidade espacial e estratégias de vida na região, de modo tal que é necessário que se invista esforços e recursos para seu conhecimento, tendo em vista programas e políticas que venham atender às demandas das diversas comunidades localizadas nas diferentes áreas ecológicas da atividade pesqueira. Pensar as relações das comunidades pesqueiras é atentar para essas variáveis. A exemplo, ao se observar a realidade enfocada, nota-se que o regime de vazão do rio Amazonas e seus sazonais níveis de enchente, associam-se a diferentes realidades sociais: (1) concentração comunitária no tempo das cheias e dispersão comunitária na vazante nas regiões do Médio e Baixo Amazonas; (2) dinâmica da territorialidade da região do Médio e Baixo Amazonas, modificando os aspectos das propriedades físicas dos moradores ribeirinhos nos dois tempos; (3) movimentação de pescadores costeiros nos sentidos norte (no tempo da menor vazão, no verão amazônico, estação seca) e sul (no tempo da maior vazão, na cheia, no inverno amazônico). No verão as águas estão mais salgadas, os peixes dessa estação correm para a costa, diminuindo o circuito de pescaria; no inverno os pescadores costeiros descem o litoral do Pará no sentido sul em busca do peixe que migra (Furtado 1987). Se contabilizarmos o numero de pessoas envolvidas nesta atividade, constata-se que na Amazônia ela assume um papel relevante. Segundo dados de associações de pescadores, entidades de classe e da antiga Sudepe, existem no Pará 78.850 pescadores artesanais, destes 30.000 (45%) dedicam-se à pesca interior; no Acre registraram-se 1.020; no Amazonas, 18.234; em Rondônia (Porto Velho e Guajará Mirim) 750 e no Amapá, 5.500 somados, registram 55.000 pescadores atuando em águas interiores. Segundo Isaac et al. (no prelo), no Médio Amazonas, em áreas marginais aos lagos, em cada 5 ribeirinhos (incluindo homens, mulheres e crianças), 1 exerce a atividade pesqueira, sendo 40% deles pescadores comerciais e 60% pescadores de subsistência. Para a Amazônia como um todo se estimaria cerca de 300.000 pescadores tradicionais atuantes, fornecendo aproximadamente 90% do pescado para abastecimento interno. Além destes valores materiais, não menos conhecido é o patrimônio sociocultural e histórico presentes nestes diferentes ambientes cujo construtor é o homem da região, que em diferentes tempos, cria e recria seu ambiente, que o constrói e o modifica numa relação dialética com a natureza, imemorialmente ocupando a terra. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 170
Falar portanto, de ocupação do litoral é não ficar apenas no presente, mas, remontar os tempos pri meros da história da Amazônia, ou seja, através das evidências arqueológicas, passando pela história colonial de par com documentos manuscritos e dados diversos de pesquisa básica. Assim conseguimos entender o ser e o estar da gente do mar que ocupa a orla costeira amazônica. A Gente do Mar Quem são estas pessoas que dependem do mar no litoral norte do Brasil? Quero reportar-me àqueles que historicamente habitam às beiras dos rios costeiros, de baías, de praias, enseadas, em pequenas unidades sociais chamadas sítios, povoados, lugares e/ou pequenas vilas e cidades, perto ou um pouco distantes da orla marítima. Onde estão estas pequenas unidades sociais? No Pará, para dar exemplos, estão na costa das ilhas Mexiana e Caviana; são representadas por cidades como Colares, Vigia, São Caetano de Odivelas, Curuçá, Marapanim, Maracanã, Salinópolis, Pirabas, Bragança, Augusto Corrêa e Vizeu, pelas pequenas vilas de Marudá, Camará, Fortalezinha, Mocooca, Cachoeira, ilhas Barreta, Romana, Canelas, Maciel, Tamaruteua, Sacaiteua, Algodoal, Pilão, Picanço, Felipa e outras. No Amapá, ao longo da orla marítima desse estado. Algumas dessas unidades sociais tiveram seu povoamento originado de pequenos pontos de baldeação das rotas de navegação entre Belém e São Luís do Maranhão, no período colonial, sobretudo no tempo da Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão, atuante entre 1755 e 1778, no século XVIII. Dentre estas estão Salinópolis, Maracanã e Bragança. O fomento mercantilista dessa Companhia de Comércio, contribuiu deveras para ocupação humana e utilização econômica das Capitanias do norte, como ação colonizadora (Nunes Dias 1970:55). O sistema de Capitanias Hereditárias precedente no século XVII em caráter de juro e herdade contribui também para a ocupação humana do litoral amazônico, resultando daí as possessões de Souza do Caeté, em 1622, hoje Bragança, dada por Carta Régia de maio de 1622 a Gaspar de Souza; do Cabo Norte, da ilha de Joanes em Carta Régia de 23 de dezembro de 1665 (ibid 56). Importante mesmo na história da ocupação humana dessa região é a presença de índios Tupinambás, ao longo da costa, à chegada dos colonizadores portugueses à região amazônica. Segundo Curt Nimendaju (1944-mapa), estes índios no século XVII (1619) já habitaram ao longo da costa, às proximidades de São Luís entre os rios Turiaçu e Mearim, e entre rios Caeté. Assinala que passaram pelo rio Maracanã, seguindo em curva para as regiões que mediante os rios Moju e Tocantins (Figura 1). Estes índios, que aos poucos foram absorvidos pelo avanço da sociedade nacional sobre suas terras e pelos descimentos indígenas, deixaram como legado cultural à posteridade, um modo de ser e de viver em relação ao meio ambiente, presentes na cultura que se formou nesta região e amalgamados com a contribuição de outros contingentes humanos para cá deslocados. A política da metrópole portuguesa e mais tarde a imperial, desde o século XVII até final do século XIX foi a de viabilizar as comunicações entre Belém e São Luís do Maranhão, ao longo da costa, evitando assim o caminho tortuoso e difícil através da floresta inaugurado por Pedro Teixeira. Pela orla marítima, aproveitando os rios, estabeleciam portos seguros para baldeiações (Dias & Valverde 1967:11). Em geral ficavam nas embocaduras dos rios, no canal, pois ficavam abrigados dos encalhes e das vagas que incidem obliquamente sobre a costa (ibid). A montante da foz instalavam-se estes portos. Vizeu, Urumajó (atual Augusto Corrêa), Quatipuru, Primavera, Salinópolis, Maracanã, Curuçá, São Caetano de Odivelas, Vigia estão em sítios dessa natureza (ibid). Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 171
050 - 45o 40 0 :5° 0° APAJO -'A- ©a© MIA 10 ai )rJ a 1t111r rialeza o • GRANt\\ OO NORTE I?,5,• / ,--- - 4° 1 7 A ti'! Joo PCSSØJ 41 // -'L' Re 100 Figural. Corte do mapa Etno-histórico do Brasil e regiões adjacentes (adaptado de Curt Nimuendaju, 1944). Recuando mais no tempo ressalto, também, que dos povos pré-históricos que habitaram a costa do Pará e Amapá, vêm hábitos ainda hoje presentes na cultura das comunidades pesqueiras do litoral desses estados. Há registros arqueológicos da presença humana nessa região, realizados por arqueólogos do Museu Goeldi. Instrumentos li'ticos, resíduos de alimentos e de fogueiras, instrumentos de trabalho, raladores, moedores, restos de panelas, carimbos corporais, ossadas humanas em enterramentos cerimoniais, grandes depósitos de conchas e valvas de moluscos, conhecidos como sambaquis; espinhas de peixe, atestam, através de datações a partir do C14, a milenaridade da presença de povospescadores-coletores no litoral paraense. E aí que aparece uma importante fase arqueológica no Pará, a Fase Mina, que remonta a 3.000 anos antes do presente. Retornemos agora para o presente se olharmos para essas populações no seu cotidiano. A expressão do mar é a mesma em termos de seus valores, com redefinições, a partir da dinamicidade que é inerente à sociedade humana. A dialética, entretanto, entre homem, terra e mar, entre homem e natureza, permanece, se reproduz na linha do tempo, com redefinições históricas que lhe são inerentes. A vida dessas populações portanto, tem sua base de sustentação social e econômica nas relações com o mar, através da pesca tradicional, da coleta e do extrativismo, com métodos e técnicas de trabalho eminentemente simples. Sua economia é simples, com base na mão-de-obra familiar. A comercialização dos produtos naturais obtidos por essas práticas visa a adquirir bens que não produzem, sendo, por isso, uma estratégia de subsistência. Suas unidades sociais são part-societies de um todo mais amplo, para quem as relações de mercado ganham uma expressão necessária e relevante. Em conseqüência estão sujeitas às pressões do mercado, que lhes levam a pressionar o recurso face às demandas. Terra e água, portanto, são pólos dessa relação, em cujos Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 172
intervalos transitam ou circulam a busca de bens materiais e sociais, e onde se desenvolvem relações que permitem sua continuidade, sua reprodução social; são ambientes crucialmente construídos na vida desse povo, tanto do ponto de vista prático quanto simbólico. A propósito disto, memorizo aqui expressões dos pescadores, recolhidas por Maldonado: \"O mar é terra liberta: não tem patrão nem cerca de ninguém... \"(Mestre Cacau, pescador de Cabedelo-PB) e \"Terra de mar é como terra de índio: é do pescador\" (Pescador autônomo do litoral Fluminense). Quem vai ao mar se avia em terra, diz um velho adágio popular bastante conhecido na Amazônia; remete-nos à relação homem-terra-mar que permeia a vida dos habitantes desses quase 562 km de costa paraense. Terra, local de moradia; Agua, o mar, rios e igarapés, locais de trabalho permeados de valores culturais, duas realidades indissociáveis, que se fundem diferentemente das unidades sociais de base exclusivamente agrícola. Antropólogos brasileiros têm dado especial atenção à vida da gente do mar, pressupondo que \"a especificidade do mar enquanto meio arriscado, indivisível e inapropriável juridicamente\" (tal como revela a expressão do citado pescador), resulta num tipo específico de trabalhador cuja relação com a natureza seja estruturalmente diversa dos demais tipos\" (Maldonado 1986). Analisando-se aqui a importância do mar para os habitantes da zona costeira e das pequenas ilhas, deve-se destacar dois pontos importantes: o mar enquanto fonte de alimento e trabalho/um valor pratico, e enquanto espaço de construção e reprodução sociocultural/um valor simbólico. São pontos recorrentes em outras áreas costeiras do Brasil (Maldonado 1996; Grankow 1996; Leitão 1997). Da costa do Amapá à costa do Maranhão, no colar de vilazinhas pesqueiras, estes valores estão presentes de forma evidente, fazendo do mar portanto, um espaço de vida, trabalho, realização profissional e espaço simbólico do qual fluem valores que permeiam seu imaginário. O uso do mar como fonte de vida é acessado pelos seus instrumentos de trabalho: redes malhadeiras, barcos de pequeno calado que variam de 6 a 30 Hps, canoas a velas ou a motor, botes que não têm autonomia para alcançar a competitividade com os barcos da indústria pesqueira que, sabemos todos, entram nas águas reservadas à pesca tradicional na costa e estuário do Pará. O manguezal ou mangal, enquanto ambiente associado ao mar, é também alvo da intervenção antrópica da população costeira para retirada de moluscos, crustáceos, madeira para feitura de currais, pesca com currais, viveiros de peixe, moirões para ancoragem de barcos, e para construção de ranchos de pesca e moradia de pescadores. Nas ilhas de Tamaruteua (na costa de Marapanim), Canelas e Ajuruteua (na costa de Bragança) encontram-se exemplos desse tipo. Não obstante essa intervenção, possuem representações simbólicas que atuam como mecanismos de preservação ambiental através de suas crenças e mitos, vistos entretanto erroneamente como meras crendices ou simples invenções. Evidentemente que com instrumentos desse tipo, frágeis face aos riscos e incertezas que o mar impõe, os pescadores costeiros não podem se fazer ao largo para explorar mais qualitativamente os recursos pesqueiros disponíveis nas águas oceânicas. Não é por limites de saber ou de capacidade intelectual - como se possa falsamente imaginar - que os pescadores tradicionais da região não se lançam ao mar tlto, além da conhecida pesca costeira, mas por falta de condições objetivas para tal. Os de Marapanim, por exemplo, quando muito chegam ao canal do navio, denominação local para a área marítima onde os navios de grande calado navegam, seus equipamentos não lhe permitem ir além. O problema é de outra ordem, isto é, faltam-lhes subsídios para a pesca, crédito para aquisição de frota qualificada, manutenção e reposição de peças; infra-estrutura em frio, armazenamento, estocagem, Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 173
FORMAS ORGANIZATIVAS E ESTRATÉGIAS DE VIDA NO LITORAL PARAENSE Graça Santana' Resumo Este texto é um conjunto de informações sobre as mudanças ocorridas nas áreas costeiras, causadas por fatores naturais e humanos, que foram observadas durante a pesquisa de campo realizada nas comunidades pesqueiras do litoral paraense. Além de sua experiência pessoal, outros aspectos foram importantes para este trabalho, tais como estudos de outros pesquisadores sobre os problemas sociais e ambientais que preocupam as comunidades pesqueiras na Amazônia. Em uma perspectiva antropológica, o trabalho chama atenção para o problema e instiga outros pesquisadores a fazer uma abordagem baseada em outras disciplinas, mostrando, desta maneira, a natureza inseparável da relação entre o homem e meio ambiente e o papel das novas maneiras que os pescadores estão utilizando neste contexto, em que eles desenvolvem estratégias para lidar com recursos naturais, grupos alternativos e compreensão política, que são um modo de reação contra as mudanças sociais e ambientais a que estão sujeitos. Abstract This text is a set ofinformation about changes accured on the coast area caused by the natural facts and man, observed during the fieldwork in fishery communities in the paraense littoral. In addition to a personal experience, others aspects were important to this work, such as: studies made by other researchers about the social and environmental problems which worry the fishery communities in Amazon. In an anthropological perspective, the work draws attention to the problem and it tempta other researchers to do an approach based on other subjects, showing this way the inseparable nature from the relation man and environmemt and the role ofthe \"new\" manners that fishermen are organizing themselves in this context, where they develop strategies in dealing with the natural resources, alternative groups, political understanding, being a way ofreaction against the social and environmental changes they are subjected to. INTRODUÇÃO No 1 Workshop do Programa de Estudos Costeiros do Museu Paraense Emílio Goeldi, realizado no município de Salinópolis, estado do Pará, em dezembro de 1997, pesquisadores brasileiros e estrangeiros enfatizaram a importância dos estudos interdisciplinares entre as áreas do conhecimento científico e o saber tradicional na compreensão dos problemas sociais e ambientais no mundo, e explanaram sobre as mudanças que vêm ocorrendo nas regiões costeiras, causadas pelos fatores naturais e antrópicos e suas conseqüências para o equilíbrio dos ecossistemas litorâneos e das populações que tradicionalmente manejam os recursos naturais ali existentes, como fonte de vida e de trabalho. Este trabalho trata de um conjunto de considerações sobre as mudanças ocorridas nos ambientes costeiros causadas pelos fatores naturais e antrópicos, observados durante pesquisas de campo em comunidades de pescadores, localizadas em pequenos povoados no litoral paraense, enquanto integrante do Projeto Renas', do Museu Paraense Emílio Goeldi - que desde 1970 realiza estudos em antropologia pesqueira, tendo a interdisciplinariedade como uma das suas metas. Além das experiências pessoais oriundas de trabalho de campo, servem de fonte para este texto, estudos de pesquisadores que analisam os problemas que afligem as populações pesqueiras na Amazônia. Numa perspectiva antropológica, o texto constitui-se em um ensaio e procura chamar atenção para o problema e
instigar outros pesquisadores para uma abordagem interdisciplinar; que permita mostrar o caráter indissociável da relação entre o homem e a natureza, ou seja, que levem em consideração a interrelação entre os aspectos sociais e ambientais na região. Só para citar um exemplo da relevância de estudos desta natureza, durante um dos seminários do projeto Renas: pesquisadores em biologia e ecologia pesqueira do MuseLi Goeldi, que adotam o modelo bioeconômico ou modelo de produção geral em suas análises para avaliar o potencial pesqueiro da região amazônica, dizem que para o modelo funcionar satisfatoriamente não basta levar em consideração somente o esforço de pesca, a biologia dos peixes, mas, também, outras variátreis que estão interrelacionadas, como por exemplo, as condições ambientais e sociais, ou seja, estudos mais ciomplexos que vão requerer informações de outras áreas do conhecimento para tentar resolver o problema. Para Furtado (1997), o cenário litorâneo apresenta especificidades socioculturais na relação homem-meio aibiente e que devem ser levadas em conta nas análises científicas e estudos voltados para o planejamento e gestões regionais. Nesta perspectiva, o texto apresenta alguns aspectos da ocupação humana no litoral paraense, que vêm enfrentado mudanças de ordem social que estão interrelacionadas, também, com a dinâmica costeira que interfere nos espaços de trabalho e de moradia. Estas transformações sociais e ambientais alteram os modos de vida e a reprodução social dos grupos de pescadores que vivem em diferentes ambientes e contextos culturais na região costeira do estado do Pará. Esta população, no intuito de enfrentar estas mudnças, vem se organizando em centros comunitários, associações e grupos de trabalhos. Criam espaços de discissões, formam lideranças dentro dos parâmetros comunitários; surgem nas comunidades novas formas organizativas que procuram intercambiar conhecimentos com pesquisadores, órgãos do governo e ONGs, no sentico de esclarecer e resolver seus problemas, referentes ao trabalho, ao exercício da cidadania e aspectos da vida cotidiana. ALGUNS ASPECTOS RECENTES DA OCUPAÇÃO HUMANA NO LITORAL !PARAENSE Segundo Furtado (1997), a partir da década de 70, com a consolidação do eixo rodoviário regional, estas populações entraram em contato mais efetivo com outros mercados, com uma rede de comercialização complexa e exigente e com estilos de consumo próprios do mundo moderno. Estimula-se, portar4to, a produção mercantil e os produtos haliêuticos tornam-se alvo de intensa exploração. Esta corrida em buscla dos recursos marinhos determinam a modernização do setor pesqueiro, com a mecanização das embarcações e a introdução de certos elementos simples, porém considerados pelos pescadores como mais predatórios em comparação a seus implementos anteriores, como é o caso da rede malhadeira, do \"gancho\" e do \"laço\". Estes últimos utilizados na captura de caranguejos (Maneschy 1993). Com a ampliação da malha rodoviária, o turismo e a especulação imobiliária assentara suas bases de exploração no litoral paraense, devido ao seu potencial natural e social. Os ecossistemas comçaram então a conviver com a presença do lixo urbano, resíduos sólidos (plásticos, vidros, latas) deixados $ela população flutuante. O lixo passou então a constituir um problema que se agrava e para cujo manejo as comunidades não estão preparadas. Este problema vem assumindo proporções consideráveis e dignas de atençãd em quaisquer programas de gerenciamento. Neste processo a população local assimilou novos comportamentos, influenciando na sua relação com o meio ambiente costeiro. Para atender um mercado cada vez mais sofisticado e dependente dos produtos do mar; hoje as comunidades retiram dos manguezais as \"conduruas\" ou \"condessas\" (fêmeas do caranguejo) para a comercialização. Retiram madeira para construção civil, para cercados e para os fornos de padarias e olarias, sem a devida seletividade, colocando em risco a vida dos ecossistemas manguezais. Por outro lado, não são só as comunidades que vêm agindo de forma negativa em relação aos ambientes costeiros. Os pescadores denunciam também projetos que vêm alterando os mangues com objetivos específicos, como por exemplo a construção da Ecossistemas Costeiros: impactos gestão ambiental 178
rodovia Bragança-Ajuruteua, sobre áreas de manguezal causando na metade da década de 70, que recebeu inúmeras críticas por parte da população local (Maneschy 1995). Em 1996 e 1997, realizando pesquisas pelo projeto Madam3 , ainda se ouviam relatos da população local afirmando que as áreas degradas do mangue, neste percurso, tinha como principal responsável a construção da estrada. Os pescadores pressionados pela especulação imobiliária vendem suas casas, principalmente para os turistas e passam a fixar residências em áreas de manguezal, como é o caso dos assentamentos observados no bairro do Agreste, no município de Pirabas e Camambá, na ilha de Algodoal, litoral de Maracanã. Outro aspecto considerado nesse contexto são as construções e a retirada de areia das dunas feita pela população, formando enormes crateras em sua base para atender interesses pessoais (turistas e especuladores) externos, que desejam construir casas, restaurantes e bares na orla marítima. Para citar um exemplo, um caso na ilha de Algodoal onde foi construída uma casa na região de dunas, retirando a vegetação (elemento importante na sua fixação) e que, passado algum tempo, esta construção foi soterrada; e este não é um caso isolado. Em Salinópolis, município do litoral paraense, há notícias de outras residências que foram soterradas em áreas de dunas. O pior de tudo isto é que esta prática vem se estendendo por todo o litoral. A população, que até então tinha no barro e na madeira o material básico para construção de suas casas, hoje, paulatinamente, vem preferindo a alvenaria, em que a areia é, em sua maioria, retirada das dunas e, juntamente com o cimento, são os principais componente na mistura da massa para o assentamento do tijolos. O que podemos analisar diante desse quadro é que nas áreas litorâneas há um jogo de interesses de grupos particulares com objetivos específicos no manejo dos ecossistemas, atrelados aos interesses, por vezes divergentes, de populações de fora e das comunidades locais. As mudanças sociais e ambientais na Amazônia ampliaram-se, alterando completamente o contexto litorâneo manejado pelas populações de forma tradicional. As alterações nos ambientes costeiros causadas pelos fatores antrópicos e naturais são reconhecidas pela população como responsáveis pela fisionomia que hoje o litoral apresenta, que pode ser exemplificado neste relato \"a Terra está mudando, a natureza está mudando, ora um banco de areia ali, agora não está mais, antes tínhamos praias de areias brancas e hoje \"praias de pedras\", \"praias de lixo\". \"O córrego que passava distante da comunidade hoje está mais próximo\", assim falou um pescador de Fortalezinha, uma das comunidades pesqueiras do litoral paraense. Neste depoimento podemos observar que os pescadores pontuam com precisão os agentes de transformações: a natureza e o homem. Nos depoimentos dizem, ainda, que a \"sujeira\" nos ambientes (mar, rios, praias, manguezal) e nas comunidades, antigamente, eram constituídas pelos restos de comidas que se misturavam com os detritos da natureza nas áreas de residências, trabalho e lazer. Os impactos naturais causados pela ação marinha e eólica, por vezes, contribuem com a diminuição dos espaços de trabalho dos pescadores artesanais que instalam seus \"ranchos de pesca\" na praia, próximos a linha d'água. Estes \"ranchos\" são, muitas vezes, a única residência do pescador que vive com seus familiares. Estas áreas de praia são invadidas pela maré, tendo como conseqüência a destruição das casas, estaleiros, impedindo o desembarque de peixe e levando os pescadores a migrarem para outras localidades. Em 1996, em pesquisa de campo na vila de Ajuruteua (antiga vila de pescadores), no município de Bragança, bastante afetada pela erosão marinha, um dos pescadores entrevistado, resistindo a este fenômeno, prestou o seguinte depoimento: \"enquanto houver espaços na praia, a gente fica na praia, pois o meu trabalho é aqui e não vou mudar para a terra firme, porque todos os lugares já tem dono, e o que resta é longe do meu trabalho\". Outro mais desafiador falou: 'fico aqui enquanto o mar determinar\". O local de terra firme que os pescadores se referem neste relato, é a vila de Bonifácio, fundada próximo à rodovia Bragança-Ajuruteua, pelas famílias de pescadores que abandonaram suas antigas casas na vila de Ajuruteua, fixando-se nesta localidade. Nesta nova moradia as Ecossistem4s Costeiros: impactos e gestão ambiental 179
famílias de pescadores tiveram que se organizar em forma de \"mutirão\", onde a reciprocidade foi um fator determinante durante as atividades que tiveram que empreender na construção de poços, casas aberturas de caminhos, ruas, etc., para o tráfego de transporte desta população para a sede do município e localidades vizinhas. Nesta reorganização as famílias atingidas pela erosão, através de suas lideranças intrnas, fizeram pleito perante aos políticos da área, para que pudessem ter o direito de um saneamento mais estiiiturado, com instalação de posto de saúde e outros serviços. Outro exemplo observado é o que vem acontecendo com a vila de Tamaruteua, Inunicípio de Marapanim. Devido sua localização geográfica, a comunidade vem passando por um proces$ semelhante. O mar invadiu a praia, fazendo com que seus habitantes se deslocassem para o centro da vila. Há muitos anos, o casario se localizava de tal forma que, na parte fronteiriça havia um trapiche que servia do ancoradouro para as embarcações de pesca, e uma arborização de coqueiros que foram soterrados pela aria das dunas circundantes, deixando os pescadores desolados diante dos \"ditames da natureza\". A comunidade de Mocoóca, município de Maracanã, visitamos pela primeira vez em 1989. Existia uma enorme praia cheia de coqueiros e muitos \"ranchos\" de pescadores que com o avanço do mar foram recuando até onde puderam. Alguns mudaram-se para a praia de Fortalezinha, outros foram para a localidade 40 do Mocoóca - povoados mais próximos, outros para a localidade de Camará, em Marapanim. O mar avançou, soterrou as casas, a praia foi coberta pelas pedras, causando problemas à navegação, fazendo desaparecer das praias as atividades de consertos de barcos, salga e desembarque de peixes e as atividades de lazer, principalmente o jogo de futebol que era realizado pelos pescadores nesta área. Vê-se, pois, que o ambiente costeiro paraense apresenta um forte dinamismo, em que a erosão de praia, movimentação de dunas e assoreamento de estuários são fenômenos freqüentes. Todavia, os moradores passaram a associar manifestações mais radicais dessa dinâmica ambiental, a ação predatória dos homens, desaracterizando a orla marítima. Dizem os pescadores de Fortalezinha e da vila de Algodoal: \"... a culpa não é só da natureza, mas também do homem que sem nenhuma orientação técnica retira areia, pedra das praias e desmata o mangue, facilitando a entrada do mar e trazendo problemas para os pescadores que realizam suas atividades na beira da praia.\" A erosão marinha, para os pescadores de Camará que moram na eira da praia, é um dos fatores que impedem a criação de animais domésticos, os plantios de hortaliças utilizadas na culinária e os canteiros de plantas medicinais. Estes espaços de trabalho são de fundamental importância. Como diz Castro (1997): %) espaço não é apenas o território, mas os significados construídos socialmente e registrados nas fases da vida desses grupos, na concepção de mundo que dão sentido ao seu modo de vida, organizando a memória enquanto lembrança do lugar. A memória alimenta a continuidade e religa o passado de forma dinâmica ao presente?' E, portanto, estas mudanças causadas pelos fatores naturais e sociais desarticulam a relação que os pescadores têm com a natureza e entre si, na constituição e permanência de suas comunidades. ALGUMAS ESTRATÉGIAS ADOTADAS PELOS PESCADORES FRENTE AOS PROBLEMAS SOCIAIS E AMBIENTAIS O que podemos perceber é que as comunidades tem seus mecanismos de reação diante das intempéries da natureza e das mudanças sociais a partir de suas estratégias de sobrevivência. Na falta do peixe fazem roça, onde a mão de obra familiar é muito importante no processo de fabricação da farinha. Coletam ras praias e nos manguezais moluscos e crustáceos; nas regiões de dunas, frutos silvestres; na mata, plantas medicinais e nos quintais cultivam árvores frutíferas, hortaliças e plantas para remédios caseiros e ainda fazem carvão. Para aumentar a renda familiar, empregam-se nos trabalhos de construção civil, nos bares, restaurantes e como Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 180
caseiros de casas de turistas e veranistas, principalmente no período de férias ou feriados prolongados. Investem também na capacidade de lideranças, constroem ou idealizam outras formas organizativas, tais como: associações de pescadores, de produtores rurais, clubes de mães, clube de jovens, grupos de trabalho e clubes de futebol; grupos que vêm lutando pela educação e causas ambientais, grupos que lutam pela qualidade básica da saúde, fabricando remédios naturais e contribuindo com a renda familiar. De forma ainda embrionária, sob a égide comunitária, estas novas formas organizativas, com interesses próprios de cada comunidade, vêm-se ampliando no litoral paraense. Numa tentativa de fortalecer o grupo, representantes ou líderes destas comunidades, procuram apoio do Monape4 e suas ramificações estaduais, os trabalhos da Igreja Católica, dos técnicos e pesquisadores de diversas instituições, inclusive do Museu Goeldi, e de outros parceiros, que reconhecem o potencial desses grupos nas tomadas de decisão para o desenvolvimento sustentável da região. Estas instituições, além das pesquisas, têm atuado nas comunidades com assessorias, cursos, palestras, seminários, exposições e encontros, enfim, subsidiando com instrumentos políticos que permitam às comunidades enfrentar os problemas internos e as transformações causadas pelos fatores econômicos, sociais e ambientais. A participação das comunidades nestes eventos é de fundamental importância, pois enriquece suas experiências e aprendem a lidar com os trâmites das instituições, discutem os interesses da pesca, da comunidade e das alterações no meio ambiente, requisitos importantes para os acordos e políticas de gestão pesqueira na Amazônia. Essas iniciativas demonstram o grau de maturidade política das comunidades, o reconhecimento das competências locais e o desempenho de pesquisadores e técnicos de instituições que ao longo dos anos vêm trabalhando na área, apoiando suas lutas e produzindo conhecimentos científicos politicamente comprometidos com os interesses das comunidades, conforme Leitão (1992). Esta resposta das comunidades, segundo Mello (1995), está no desafio dos pescadores que procuram conquistar a cidadania em nosso país, participando de um projeto político que lhes garanta melhores condições de trabalho e qualidade de vida. BIBLIOGRAFIA CASTRO, E. 1997 Território, Biodiversidade e Saberes de Populações tradicionais. In: CASTRO, E. & PINTON, F. (orgs.). Faces do Trópico úmido: conceitos e questões sobre desenvolvimento e meio ambiente. Belém, Cejup/UFPA-NAEA. FURTADO, L.G. 1997. Problemas ambientais e pesca tradicional na qualidade de vida na Amazônia. In: FURTADO, L.G. (org.). Amazônia: desenvolvimento sócio diversidade e qualidade de vida. Belém, UFPA- NUMA, p. 143-163. FURTADO, L.G. 1997. Ocupação Histórica do Litoral Amazônico.WORKSHOP DO PROGAMA INSTITUCIONAL DE ESTUDOS COSTEIROS, 1. Resumos. Salinospólis. LEITÃO, W 1992. Participação social e manejo dos recursos pesqueiros. In: ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E O MAR NO BRASIL, 4. Coletânea. São Paulo, PPCAUB/LTSP, p. 172-178. MANESCHY, M. C. 1995. Ajuruteua, uma comunidade pesqueira ameaçada. Belém UFPA-CFCH. MANESCHY M. C. 1993. Pescadores nos Manguezais: estratégias, técnicas e relações sociais de produção na captura de caranguejo. In: FURTADO, L.G; LEITÃO, W. & MELLO, A.F (orgs.). Povos das Águas: realidades e perspectivas na Amazônia. Belém, Museu Paraense Emílio Goeldi. MELLO, A.F 1985. Movimentos Sociais na Pesca: breve balanço bibliográfico, novos desafios teóricos. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi, sér Antropologia, 11(1): 19-39. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 181
NOTAS 1 MCT/MPEG-Museu Paraense Emílio Goeldi. Coordenação de Ciências Humanas. Tecnologista. Caixa Postal 399. Cep 66040-170. Belém, Pará, Brasil. E-mail: [email protected] 2 Projeto - Recursos Naturais e Antropologia das Populações Marítimas, Ribeirinhas e Lacustres da Amazônia: estudo do homem e seu meio Ambiente. 'Projeto - Mangrove Dynanics and Management. MovimentoNacional dos Pescadores. Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 182
DINÂMICA COSTEIRA, OCUPAÇÃO HUMANA E MIGRAÇÃO. O CASO DE TAMARUTEUA Ivete Nascimento' Resumo Neste trabalho é analisada a relação entre dinâmica costeira e ocupação humana no litoral do Nordeste do Pará. Um dos aspectos desta ocupação é a migração que vem se dando do interior para a costa, a medida que a pesca se torna atividade exclusiva com a decadência da área agrícola. A pesquisa se baseou em trabalho de campo e dados acumulados de 1981 a 1996, na Vila de Tamaruteua, município de Marapanim, onde o processo migratório é acentuado. Os habitantes levantam a possibilidade da Vila voltar a ser um \"rancho de pesca\", diante dos problemas que enfrentam em conseqüência da instalação da comunidade em uma área de intensa dinâmica costeira, que vem inviabilizando sua reprodução enquanto comunidade. Este processo que vem ocorrendo em Tamaruteua é recorrente no litoral do Pará, como é o caso dos municípios de Maracanã e Bragança, permitindo a visão de como dinâmica costeira e migração se articulam na configuração do povoamento do litoral do Pará. Abstract In this study, it is analyzed the relationship between coastal dynamics and human occupation on the northeast coast of Pará State. One of the aspects ofthis occupation is the migration which has been going on from interior to coast, because fishing is becoming the exclusive activity with agriculture decline. The research is based upon field work data collected from 1981 to 1996, at Tamaruteua Village, Marapanim Municipality, where the migration process is evident. The inhabitants think that the Village may turn back as a \"fishing farm\", because of the problems they have faced in consequence of the community settlement in an area ofintensive coastal dynamics, which is making it possible its reproduction as a community This process at Tamaruteua is also taking place on the coast of Pará, with examples in Maracanã and Bragança, which give us a view how ofcoastal dynamics and migration articulate in the configuration of the process ofpopulating on the coast of Pará. INTRODUÇÃO Este artigo é uma reflexão sobre um dos aspectos da ocupação humana do nordeste paraense e a migração e sua articulação com a dinâmica costeira. A base destas reflexões é o caso da vila de Tamaruteua, localizada no município de Marapanim, NE do estado do Pará. O contato inicial que vem se mantendo de forma intermitente, data de 1978, tendo a viagem mais recente ocorrido em 1996. Este fato nos permitiu observar as transformações que vêm ocorrendo no modo de vida da comunidade. Por outro lado, a convivência no litoral, em vários municípios da região do Salgado, onde se observa a recorrência dos problemas enfrentados por Tamaruteua, vem possibilitando se pensar a migração não só no contexto local, mas sim como fenômeno mais amplo, ligado ao conjunto de fatores que configuram a ocupação do litoral. A preocupação com o tema migração está presente desde o início da articulação do grupo que vem se dedicando aos estudos sobre a pesca artesanal no Museu Goeldi/Coordenação de Ciências Humanas, nos vários desdobramentos que iniciaram-se com o projeto Marapanim, até o Renas.' Este projeto, contempla como um de seus eixos temáticos a questão da migração, diante da importância deste fenômeno que vem afetando, em muitos casos, a reprodução social das comunidades pesqueiras artesanais.' A literatura produzida pelas ciências sociais sobre e em comunidades pesqueiras, avolumou-se a partir da década de 70, momento em que as áreas de pesca se integraram à economia de mercado com as
demandas dos produtos do mar, a expansão da rede viária e a especulação imobiliária, que se articula com a intensificação do turismo e vem impactando no modo de vida tradicional dos estabelecimentos pesqueiros no litoral do Pará. Nos últimos anos as abordagens das ciências sociais articulam-se às contribuições das ciências naturais, perseguindo uma visão mais holística dos fenômenos sociais. E no bojo destas preocupações que o Programa de Estudos Costeiros-PEC4 do Museu Goeldi se coloca, buscando a interdisciplinariedade, articulando homem e natureza no litoral da Amazônia. MIGRAÇÃO E POVOAMENTO NO LITORAL - PESCA E AGRICULTURA A migração teve historicamente um papel importante na configuração dos estabelecimentos humanos no litoral do Pará. Nas microrregiões homogêneas do Salgado e Bragantina, onde se encontram os principais núcleos pesqueiros, este fenômeno tem particular relevância. A agricultura foi uma das bases da ocupação desta área: 'A maisfamosa experiência colonizatória foi a empreendida por anos na zona bragantina do Pará e tirante uns poucos resultados positivos em que se realça o medíocre abastecimento da capital paraense, ela constitui um erro agronômico e ecológico, assim como a estrada de ferro ali implantada logo se revelaria um erro econômico: com solos, culturas e colonos mal escolhidos, o saldo histórico dessa colonização é uma vasta região mais pobre e cheia de problemas na atualidade\" (Santos 1980:117). Ao longo das últimas décadas a diminuição da produtividade com esgotamento dos solos, aliado às regras de herança e partilha vem inviabilizando a agricultura, e levando a um movimento em direção à atividade pesqueira. Esta tendência tem sido apontada na literatura que se dedica à temática pesqueira (Furtado 1987; Mello 1985). Vimos que tanto a literatura quanto o trabalho de campo atestam a mobilidade da população nesta região, inicialmente das áreas agrícolas para a pesqueira e, igualmente, de uma comunidade pesqueira para outra. Registra-se, também, um movimento sazonal de pescadores em função das safras que ligam-se à enchente e a vazão do rio Amazonas, o \"rodízio\" que ocorre na \"subida\" e \"descida\" das espécies de peixe que tem maior valor comercial, conforme Furtado (1987). Nos últimos anos observa-se um movimento sazonal mais intenso para a ilha do Marajó, onde reúnem-se pescadores de vários municípios da Zona do Salgado, nos períodos de escassez em suas comunidades. A atividade pesqueira no litoral do Pará é marcada pela mobilidade: 'or temperamentos nômades, levam a estas expedições que duram uma semana e mais, toda a família, mulheres, crianças, cachorro, algum xerimbabo de estimação, e a vigilenga, assim carregada, leva além dos apetrechos da pesca os paneiros de sal, com que hão de salgar o pescado, ... Pronta a canoa, desfraldadas as velas, em geral, tintas também de muruci, vermelho escuro, saem da Vigia, de Cintra, de Soure, de Marapanim, de todos os pontos daquelas costas em direção dos \"viveiros\", ou pontos deles já conhecidos em que sabem mais abundantes as gurijubas. \"(Veríssimo 1970:62). Este era o tempo dos pescadores polivalentes (Furtado 1990), em que a pesca não era atividade exclusiva, e a agricultura, coleta e artesanato consorciados no pluralismo econômico, segundo Maldonado (1991), garantia a sobrevivência. Nos locais mais propícios à pesca - os \"pontos de pesca\", surgiram os \"ranchos\", espécie de moradia temporária para os períodos de safra. Eles são característicos da ocupação humana do litoral, estando na origem de muitas vilas pesqueiras. O processo inverso vem ocorrendo quando as dificuldades de assentamento como por exemplo, as áreas de intensa modificação ambiental, levam as comunidades a desagregarem-se. Neste caso, quando a moradia permanente é inviável e o espaço é um \"ponto de pesca\" privilegiado, ele volta, muitas vezes, a ser Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 184
um \"rancho\", onde só permanecerão os homens pescando. Em vários municípios da Zona do Salgado este processo está em curso. O fluxo migratório da área agrícola para a pesqueira se mantém' e vem aumentando a mobilidade entre as áreas de pesca com a perda e ganho de população, modificando a fisionomia das vilas ao longo do litoral. No padrão de povoamento do litoral nordeste do Pará, tradicionalmente denominado Zona do Salgado, as comunidades se estabeleceram às margens dos rios, na maioria dos casos em baías, em áreas protegidas da ação do mar. Tomemos como exemplo o município de Marapanim - sua sede fica às margens do rio Marapanim, que tem sua foz na baía homônima. Os principais aglomerados humanos, até os anos 50, se situavam em áreas de terra firme, ao longo do rio Marapanim, incluindo a sede municipal. Ao longo da orla marítima, na \"área das praias\", o povoamento era mais rarefeito, com a predominância de ranchos de pesca e pequenas vilas. A pesca era a atividade sazonal e a agricultura era a atividade principal. Com as modificações que se intensificaram nas décadas de 60/70, associadas às dificuldades de reprodução de pequenos agricultores, a \"área da água doce\" (Furtado 1987) passou a fornecer um fluxo migratório, que contribuiu para o crescimento e/ou surgimento de núcleos humanos no litoral. A agricultura historicamente praticada na área foi baseada na derrubada e queimada da cobertura vegetal, em um sistema extensivo de produção que exige a incorporação de novas áreas, associado aos problemas fundiários e ao sistema de partilha vigente na região, que é acentuado pelo fato dos solos sem reposição de elementos terem sua produtividade diminuída, vêm levando ao enfraquecimento da produção agrícola. A partir dos anos 60/70, a pesca cada vez mais se coloca como atividade exclusiva. As vilas pesqueiras do litoral vão assumindo maior importância na produção com a perda da área agrícola. Vale ressaltar que estes aglomerados muitas vezes se instalaram em locais que têm como fator de atração a produtividade da pesca; são \"pontos de pesca\", mas que estão assentados em áreas de intensa dinâmica costeira característica do litoral do Pará: 'A costa paraense apresenta particularidades de processos eformas que denotam à mesma um caráter singular no contexto costeiro brasileiro. Destaca-se a morfologia costeira recortada em forma de rias (vales fluviais afogados) pela ação combinada de ondas e marés, resultando no desenvolvimento de sistemas estuarinos e seus ecossistemas associados\" (Mendes 1997). No passado eram utilizados apenas para \"ranchos de pesca\" depois passam a receber moradores permanentes. Furtado (1987), ao chamar atenção para a existência na área do Salgado, das duas micro-áreas ecológicas, a \"água doce\" e a \"praiana\", enfatizou a complementariedade entre elas. Pudemos observar no município de Maracanã esta articulação (Nascimento 1993). Esta relação homem x natureza, no passado ocorria mais harmonicamente e a complementariedade entre as duas áreas era a mais efetiva. Vale ressaltar que esta relação se expressa em um modo de vida específico e em variados aspectos do cotidiano, como padrão de construção, hábitos alimentares, etc. Na \"água doce\" o padrão de assentamento é rarefeito, com grandes distâncias entre as casas, cercadas por amplas áreas em frente e aos fundos. Nos \"terreiros\" plantam-se espécies decorativas e medicinais; nos quintais, as árvores frutíferas, o \"sítio\" e, mais distante, os roçados. O abastecimento de água vem de poços, ou igarapés. As construções são de sapé ou alvenaria. As \"casas de farinha\" fazem parte desse padrão. A criação de pequenos animais como galinhas e porcos é característica marcante, sendo parte importante do suprimento de proteínas. Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 185
No litoral, muitas vezes, as habitações estão em áreas de dunas cercadas pelos manguezais. O padrão de construção é tipo palafita com pequena distância entre as casas, em geral, de madeira. O abastecimento de água é problemático, havendo casos em que não há água potável na comunidade, sendo necessário buscá-la a longas distâncias, em embarcações, transportando em tonéis, como é o caso da Sauaá, no município de Marapanim. Neste caso, \"as plantações\" não são viáveis e só se encontram em pequenos jiraus, sendo iais comuns as plantas medicinais ou de culinária, como a pimenta, e temperos utilizados no acompanhamento do peixe, moluscos e crustáceos, principais fontes de proteínas. A criação de pequenos animais é problemática, pois em muitos casos a área é inundada pelas marés. A farinha de mandioca (Maniroh sculenta) deve ser obtida fora da comunidade, pois, juntamente com o peixe, são a base da alimentação. Figura 1. Casa com girau - Tamaruteua. No modo de vida anterior, a alimentação é mais variada, com o suprimento das roças, hops e quintais. No segundo caso ela se limita basicamente ao peixe e outros produtos do mar, acompanhads da farinha. Entre as duas áreas a base da troca é o peixe seco/salgado, que tem um mercado consumidor na zoia interiorana, e a farinha que é item básico na zona costeira. A necessidade de acesso a este produto ocasiona o uso de mecanismos, onde o parentesco é acionado, quando as famílias que tem indivíduos nas áreas propicias para os roçados se associam aos seus parentes e dividem o produto. Na comunidade de Camará,, município de Marapanim, por exemplo, há pessoas que juntam-se aos parentes em Bacuriteua para \"botá roçado\". Ecossistemas Costeiros: impactos gestão ambiental 186
Figura 2. Venda ou \"taberna\" onde a comunidade se abastece. DINÂMICA COSTEIRA E MIGRAÇÃO - TAMARUTEUA, APENAS UM CASO Tamaruteua está situada na ilha de Cajutuba, litoral do município de Marapanim. O rio Cajutuba é a principal via de acesso à comunidade, que dista cerca de duas horas em lancha motorizada da sede municipal. A comunicação com a Vila, atualmente, vem apresentando maiores dificuldades, com o enfraquecimento da atividade pesqueira e a intensificação da migração; as \"lanchas de linha\" deixaram de circular e o transporte de passageiros e cargas depende dos atravessadores (marreteiros) que freqüentam o local. A principal atividade econômica é a pesca artesanal, que ocupa quase a totalidade dos homens. O espinhel ou tiradeira é o instrumento mais utilizado; as embarcações (montarias pesqueiras) tem propulsão à vela. A organização do trabalho é em tripulações de três pescadores. O produto é vendido aos marreteiros, depois de retirado o necessário ao consumo da família (Furtado & Nascimento 1982). Tamaruteua vem apresentando fluxo migratório constante, nas últimas décadas como mostra o quadro a seguir: Anos Casas Habitantes 1976 71 426 1981 59 233 1996 30 180 Fonte: Trabalho de Campo. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 187
Figura 3. Pesca de Espinhel - embarcações - Tamaruteua. Ao analisar as motivações para tomada de decisão para a migração (Nascimento 1981), as penosas condições de vida no local que passavam pelo abastecimento de água, invasão do mar, dificuldades de desenvolver criação de animais e cultivo de plantas, eram enfatizadas e, ao lado da busca da educação formal, que interrompia-se na 4a série do 10 grau,' se colocavam como as mais presentes no discurso dos informantes. Em 1982, a população mudou-se para o Furo do Breu, próximo aos dois poços, únicas fontes de água potável da área. As casas foram desarmadas e transferidas, um trapiche foi construído e a vila passou a chamar-se Nova Tamaruteua. A mudança, em princípio, deveria solucionar os principais problemas enfrentados pela população. A distância entre as fontes de água e o casario, uma das dificuldades que afetava principalmente as mulheres, pois cabia a elas a tarefa de transportar água para o consumo da casa, foi superada pois estas ficaram próximas aos poços. O trapiche resolveu a questão das embarcações que ficaram mais protegidas, facilitando, igualmente, o transporte de cargas e passageiros. A povoação estava fora do alcance do mar, que antes, nas grandes marés de sizígia, obrigava o uso de embarcações para a locomoção dentro da vila. Quando o contato foi retomado em 1996, a Nova Tamaruteua continuava com os velhos problemas. O abastecimento de água está mais precário, pois só um poço apresenta condições de uso e, mesmo assim, tanto a quantidade, que no verão desce a níveis críticos, quanto a qualidade, deixam a desejar. O trapiche ruiu e os problemas de embarque e desembarque continuam. A energia elétrica, anseio dos moradores, teve curta duração, com um pequeno motor, que funcionou precariamente por problemas de manutenção e combustível, cujas flutuações da política local não o mantiveram. A área onde as moradias foram instaladas continua com problemas de inundação e algumas casas correm o risco de soterramento pelas dunas. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 188
CONSIDERAÇÕES FINAIS Há uma presença constante nos discursos sobre o passado e o presente, em Tamaruteua, a noção de que a vida era melhor: \"Era influído, entrava bem umas 180 montaria aqui\". A atividade pesqueira era intensa, e grande o movimento de pescadores de outras comunidades. A descrição sobre o ambiente enfatiza as diferenças atuais; haviam árvores, um trapiche e um poço em frente a comunidade. No trabalho de Furtado & Nascimento (1982:4), foi apresentado um croqui da área com base nestas descrições. Para Nascimento (1981) era uma paisagem bem diferente que se apresentava; a ruína do antigo poço era coberta pela água a cada maré e a única vegetação existente era a típica dos manguezais, à esquerda e à direita da vila. No contato mais recente (Nascimento 1996), depois da mudança para a nova área, o mar avançou e a ruína do poço não está mais à vista. Tamaruteua, exemplifica uma situação recorrente no litoral, onde estamos trabalhando. No município de Maracanã os depoimentos dos habitantes mais idosos nos falam do povoamento da vila do Quarenta, quando os pescadores migraram da praia do Mocoóca (Nascimento 1993). Desde meu primeiro contato com a área (1985) até hoje, foi possível observar as modificações ambientais, como o surgimento e desaparecimento de praias e manguezais e a articulação entre dinâmica costeira e o comportamento da população. Há exemplos deste processo em vários pontos do litoral. No município de Bragança, a vila de Ajuruteua vem enfrentando o mesmo gênero de problemas - uma nova comunidade surgiu, o Bonifácio. No município de Marapanim, na praia do Crispim, um dos pólos turísticos, no período das \"águas grandes\" (março/abril de 1998) vários bares e pequenas pousadas ruíram, outros estão sendo soterrados pela movimentação das dunas. Em Marudá, ponto turístico do município de Marapanim, a implantação de um manguezal, vem diminuindo a área de praia, preocupando os poderes públicos, já que ela é a principal motivação do turismo nesta área. Estes casos exemplificam como vem se dando a relação homem e ambiente no litoral e chamam a atenção para a necessidade de estudos interdisciplinares, que dêem conta da articulação entre mudança natural e antrópica, em busca tanto da proteção da natureza quanto da qualidade de vida da sua população. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS FURTADO, L.G. & NASCIMENTO, M.I. 1982. Pescadores de Linha no Litoral Paraense: uma contribuição aos estudos de campesinato na Amazônia. Boil, Mus. Para. Emilio Goeldi, nova sér Antropol. (83). FURTADO, L.G. 1984. Pesca Artesanal: um delineamento de sua História no Pará. Boi. Mus. Para. Emilio Goeldi, nova séi Antropoi. Belém (79):1-50. FURTADO, L.G. 1987. Curraiistas e redeiros de Marudá: pescadores do litoral do Pará. Belém. Museu Paraense Emílio Goeldi. FURTADO, L.G. 1990. Pescadores do Rio Amazonas. São Paulo, Universidade de São Paulo. Tese de doutorado. MALDONADO, S.C. 1986. Pescadores do Mar. São Paulo, Ática. MALDONADO, S.C. 1991. Em Dois Meios em Dois Mundos: a experiência pesqueira marítima. Brasília, Universidade de Brasília. Tese de doutorado. MELLO, A.F. 1985. A Pesca sob o Capital: a tecnologia a serviço da dominação. Belém, Universidade Federal do Pará. Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 189
MENDES, A.C. 1997. Projeto \"Caracterização Hidrodinâmica e Geoambiental do Estuário do Rio Marapanim e Baía de Urindeua e Adjacências (NE do Estado do Pará)\". Belém, Museu Paraense Emílio Goeldi/ Departamento de Ecologia. NASCIMENTO, 1. 1993. Homens e Peixes: o tempo da pesca artesanal. João Pessoa, Universidade Federal da Paraíba. Dissertação de mestrado. NASCIMENTO, 1. 1981. Êxodo rural em uma comunidade pesqueira. ENCONTRO DE PESCA- DORES ARTESANAIS, 1. Anais. Belém, IDESP NOTAS MCT/MPEG-Museu Paraense Emílio Goeldi. Coordenação de Ciências Humanas. Pesquisadora. Caixa Postal 399. Cep 66040-170. Belém, Pará, Brasil. E-mail: [email protected] 'Projeto - Recursos Naturais e Antropologia das Populações Marítimas, Ribeirinhas e Lacustres da Amazônia: estudo do homem e seu meio Ambiente. Potiguar e Marinho, bolsistas de iniciação científica do Projeto Renas, estão desenvolvendo estudos nesta temática. O primeiro na vila de Marudá e a segunda na zona metropolitana de Belém. Participamos do Programa com o Projeto «Manguezais do Litoral Paraense: Recursos naturais, uso social e indicadores para a sustentabilidade\". 'Depoimentos na reunião de pescadores organizada pela CPP (Comissão Pastoral da Pesca), em Belém (1998), e o trabalho de campo em Camará, município de Marapanim. 6 ABREU, Caetana Regina. \"O Sistema Educacional Formal e o Êxodo Rural em uma Área Pesqueira, 1982. Inédito. ocasião das tomadas de cenas para o vídeo-documentário Tamaruteua, 17 anos depois, com a participação das pesquisadoras Ivete Nascimento, Lourdes Furtado e o cinegrafista Helder Messias. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 190
ESTUARINE COMMUNITIES OF THE AMAZONIAN COAST: MANGROVES FOR LIFE AND LIVING' Henrique de Barros' Abstract Building strategies for balancing both long term-sustainable and short term-quick-profit interests is becoming an urgent question for social and environmental sciences. Understanding the rationale behind the relationship between communities and their adjacent environment : empirical knowledge are made necessary, in particular oriented for the foliowing aspects: (a) the degree ofinterdependence between local people and the natural resources, (b) the way local people understand the territorial and biological limitations of the natural environment, and, overail, (c) their ability to dealing with the conflict of interests associated with environmental conservation issues. Resumo A construção de estratégias para balancear a sustentabilidade de longo prazo e os interesse de curto prazo está se tornando uma questão urgente para as ciências ambientais e sociais. Compreendendo a racionalidade atrás da relação entre comunidades e seu meio ambiente adjacente: o conhecimento empírico se torna necessário, em particular, orientado para os seguintes aspectos: (a) grau de interdependência entre a população local e os recursos naturais; (b) o modo como a população local entende as limitações biológicas e territoriais do ambiente natural, e (c) sua habilidade para lidar com os conflitos de interesses associados com os instrumentos da conservação ambiental. 1 NTRODUCTION Local knowledge and environmental management In this section we discuss the need for a better understanding of the actual demands of local people in relation to the use of the environment and the natural resources. That seems a basic step to reach a realistic strategy for dealing with the environmental conservation chailenge. As some of the most important ecosystems for conservation are under increasing pressure from local production systems, the building ofstrategies for balancing both long term-sustainable and short term-quick-profit interests is becoming an urgent question for social and environmental sciences. Work under this orientation may be instrumental for project definition and financial support to local private sector initiatives. Consistent with this perspective, this chapter addresses the rationale underlining the relationship between communities and their adjacent environment. To reach this understanding, empirical knowledge were oriented to the foliowing aspects: (a) the degree ofinterdependence between local people and the natural resources, (b) the way local people understand the territorial and biological limitations of the natural environment, and, overail, (c) their ability to dealing with the conflict of interests associated with environmental conservation issues. This paper presents the first results of a survey conducted during the period October 1 996-March 1997 among estuarine communities of the Northeast coast of Pará, a major state of the Brazilian Amazonia. The analysis was drawn, firstly, on questions dealing with the structure of the estuarine household; secondly, we explore the local understanding of the connections between the mangrove ecosystem and the productivity of the adjacent coast. Thirdly, local perception of environmental problems is discussed, supplemented by suggestions offered by local people to guide further development intervention in the area.
METODOLOGICAL CONSIDERATIONS Criteria for community inclusion in the questionnaire-based survey Comrnunities were chosen for their involvement with the main production systems found in the estuarine arca of Bragança. The town is located by the Caeté river, a major builder of the 13 miles wide stretch of mangroves which responds for most the fish and crabs that makes Bragança a major fishing port of the east coast of Pará. Because of the high mobility of the coastal population within the arca (Maneschy 1995), and the exchange ofproduce between mangrove and adjcent fields, a good understanding of the socio-economic features of the arca is thought to be instrumental for future environmental management recommendations toward the conservation of the mangrove ecosystem. For the purpose of this chapter, the household rather than the family is taken as the main focus of analysis. The household is defined as a social working group living under the sarne roof. Family members living in their own houses were not included in the household data, although their contributions for the household income have been considered arnong the surviving strategies undertaken by its members. The questionnaire-based survey was complemented by open interviews with communities leadership, which provided use ful information on trends and prospects of community projects in face of the recent changes in local political leadership. The development of the Bragantina coast in historical perspective During the golden period of rubber export, on the last quarter of the 1 9th century, the supplying of subsistence goods became a main problem for the rubber tapers and Brazil nuts collectors working far in the heart of the western Amazonia. Fish and manioc flour were not easy to catch and grow in the jungle. However, they were abundant along the fertile coast of the Bragantina region. This prompted the Brazilian government to attract European immigrants to settle in the Bragantina arca. Agriculture colonisation schemes were opened and maintained by state government subsidies. A railroad would be built to make the arca accessible and to allow produce to reach the Western Arnazonia. However, a number ofunforeseen factors were responsible for the failure of the European colonisation programme. Firstly, few of the European contractors were able to meet their immigration quotas, resulting in substantive losses to the state. Secondly, a significant number of immigrants is reported to having refused to settled in the newly open colonisation arcas, many of them deciding, either for the immediate return to their countries, or moving to Belém after a short period of time. A 1955 review of the Bragantina colonisation policy offers some figures on the origin c f migrants. A summary of these data is shown in Tables 1 and 2. Table 1. Country of origin of foreign settlers Origin of foreign settlers 1.582 Spain 69 Italy 50 Portugal 16 Cuba 5 United States 3 Belgian 1 Suede 1.726 Total Source: Cruz,Ernesto. A estrada deferro de Bragança: Visão social, econômica epolítica, 1955. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 192
Among the foreigners, the Spanish made the larger group of the colonisation schemes, many ofthem settled in the Benjamin Constant \"núcleo\", dose to the city of Bragança. Among the Brazilians, to whom the policy was turned after the closing of the immigration incentives, the Northeast region makes by far the largest contribution. This is consistent with the historical trend of the region population running out the periodical droughts and the hard working conditions of the North-eastern agriculture. Table 2. State oforigin ofBrazilian settlers Origin ofBrazilian settlers Ceará 5.924 Rio Grande do Norte 1.266 Paraíba 125 Pernambuco 114 Piauí 32 Maranhão 16 NoribeastRegion: 7.477 Pará 909 Other States 10 Total 8.396 Source: Cruz , Ernesto.A estrada deferro de Bragança: Visão socia4 econômica epolítica, 1955. Traces of the colonisation heritage are still visible in the architecture of the city of Bragança. Descendants of the Spanish colonists are easily met among the middle class local families. Specific cultural influence on production organisation and techniques is still to be traced, and has been suggested as a subject to be developed in local graduate research. The estuarine communities of Bragança: the social structure of the main economic activities Overview of the economy of the Bragantina region The colonisation policy was the main source of public incentives which brought some dynamism to the Bragantina region during the first quarter ofthis century. From the 1940s, as the stagnation of the coastal agriculture proved evident, the littoral started to lose public investments for the newly open western frontier of the Bragantina region. The opening of the Belém-Brasília road in the 1960s, 100 km west of Bragança, has contributed to move private and public interests away from the sea. Later, the further opening of federal roads linking Belém with the neighbouring state of Maranhão, on the eastern Amazonian border, has worked to aggravate the situation. The positioning of these roads along the southern part of the region has sealed the development pattern typical of the 1970s decade. The development policies for the Amazonia would be based on the tripod agriculture, livestock, and mining, which became the focus ofgovernment incentives for the followed two decades (Maneschy 1995). Marginalised by public investments in credit and infrastructure, the Northeast coast was forced back to its former and traditional specialisation: the exploitation oftheir rich mangrove and fishery resources. This overlooking of the coast by quick profit investments has been a main reason for its relative environmental preservation. Comparing with the southern Bragantina area, forest based natural resources Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 193
were virtually devastated for the replacement of the former extractive economy for both export agriculture - mainly black pepper and \"açafrão\" - and extensive livestock oriented farms. More recentiy, land valorisation and monetary stabilisation has worked to bring agricultural interests back to the cultivation of some capital semi-intensive products, such as oranges and coconuts for an expanding domestic market. The production in the main ecological arcas: an economic characterisation of the open fields and the mangroves A few words have been said above in the Introduction about the ecological diversity of the estuarine area of Bragança. It has been defined to include not only the mangrove area, but also a second major ecosystem of Bragança: the open fields (\"campos\"). The fields are large flood plains bordered by mangroves. Poor drainage conditions contribute to make the area flooded for most of the winter season. Small farming communities occupy small islands and fieid borders working mainly on the cultivation of manioc, maize and beans, and tobacco.3 Fish is caught in the flooded fields over the rainy season, while in the summer it is found in small ponds formed in the lower areas.` Recent changes in the ecology of the open fields have been reported by local residents, and are discussed later 7. They are consequence of the introduction ofbuffaloes in the area by some landowners. The ecological changes brought about by buifaloes are becoming a main environmental concern for field residents. The mangrove area is situated in the north and eastern parts of the Bragança municipality, extending eastwards to the Maranhão and Piauí states. To the west, mangrove forests spread over the Amazonas river deita towards the extreme north of the continent. The Bragantina sample of the Amazonian mangroves impresses for the height and density of their vegetation when compared with other mangrove areas, as those of Pernambuco (Northeast region). Productivity of shellfish and estuarine fish are also likely to be higher, although reliable data are not available. Borders and islands saved from high lides are occupied by the local population working on a rich combination of agricukural, shellfish collection, and fishing. The identification of traditional coastal production systems Theoretical and empirical evidence have suggested that production systems based on natural resources are normally highiy vulnerable to market uncertainties inherent to the primary commodity markets. In the absence of specific extra-market incentives, the strengthening of the capacity of commodity farming to retain its production ability will be largely dependent on the existence of multiple non-farming sources ofincome.5 The relative importance ofhousehold activities may interchange for households situated in mangroves or the open fields. Field households have agriculture as their main source ofincome, while in the mangrove predominates a combination offishing and crab coilection. Also, commercialisation facilities have promoted the specialisation oftwo communities - Caratateua and Treme - in the processing of crab meat. The activity invoives a substantive number of households and household members, especially women. In spite of the iow remuneration of the activity, the absence ofalternatives and the relative stabiiity of the market for crab meat, has attract a growing interest to the acfivity. For the area as a whole, with exception of the communities situated by the beaches, a small agriculture is always present in support of family subsistence, reinforcing the pattern found in other communities aiong the coast. Rice is also found, but restricted to areas reciaimed from the mangrove forest, as in the community of Acarajó. Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 194
A variety of tropical fruits is normally present in the rear wild gardens of the estuarine households. A combination of native palm trees, such açaí, muruci, and pupunha supply the households with valuable sources ofsubsistence and some extra income. Fruits include cupuaçu and bacuri, both highly demanded in the regional fruit market for juices and ice-creams. Malva fibber is another commodity found in the estuarine area, used for making grain storage sacks(?). Despite the competition with the fibber imported from India had made local prices drop over the last decade, the low cost of production - the plant reproduces freely over the rainy season - seems to explain the marginal, although persistent, position retained by the malva production in the area. Secondary household activities in either the fields or the mangroves are not limited to the selling of fruit or manioc flour, or even subsistence fishing or crab catching. The mangrove has being a major source oflumber and charcoal consumed in local bakeries, households, and even public schools. Legal restrictions to the exploration of mangrove wood has worked to increase the risk, and therefore prices, for the activity. Wood extraction is one among many other environmental issues in the area which will benefit from the reaching of a balance between conservation and community needs.6 Estuarine communities are family based systems of production in many cases formed by households originated from few family groups. This creates special user rights and facilitates the sharing of the adjacent natural resources on a communal basis. This also promotes mutual support and reciprocity in case ofspecial needs by households. Special extra-market conditions are not rarely adopted in the remuneration oflabour among fishermen in the area. (Maneschy 1995). The diversity of estuarine activities engaged on by household members has not been enough to prevent the migration of part of their members in search ofjob opportunities in Belém and other large cities. Remittances by this contingent has become a source of stability for local households, as suggested by field data. This result is consistent with studies on rural families of the neighbouring Northeast region during the late 1980s. (de Barros 1991). EDUCATION AS A FUTURE SOURCE OF DIFFERENTIATION Schooling of household members has been measured by the number of years of education. A comparison between the average schooling ofparents and children indicates a greater valorisation of formal education today comparing with the past generation. Better supply ofbasic education facilities, easily found today in most communities, together with a lower dependency of household from children paid labour, can certainly explain this trend. WIVES IN MANGROVE AND FIELDS The involvement of the wives in the household main activities become more evident for the mangrove area. Data suggest that women are increasingly involved with non-domestic activities, especially teaching or working as health community agents. In the communities dedicated to the capture and processing ofcrabs - Caratateua and Treme -, women are highly involved in the organisation and operation of the meat extraction work. Men are normally employed in the coilection of crabs and the commercialisation of the processed crab meat. Ecossistemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 195
THE CRAB MEAT PROCESSINCi ACTIVITY The extraction of crab meat is becoming increasingly relevant in the mangrove area, for both the number of people involved and also for its direct environmental implications. The processing allows communities to retain an additional source of income. The amount effectively appropriated will depend of the size of commercialisation chain for an specific supplier. Community residents are increasingly involved in the distribution of crab meat directly to the main market in Belém. In the near future, competition is likely to contribute for the concentration of the activity on local \"patrões\" (owners). For this specific activity, the role of the \"patrão\" is limited to the buying of crabs from the \"tiradores\" (crab catchers) and the paying of households for the extraction of the meat. An intermediary activity is the breaking of crabs for separation of the non-eatable parts. Legs and the remaining body are then cooked in conic shaped straw baskets - the \"paneiros\". According to \"catadores\" - the crab meat processors - from Caratateua, each \"paneiro\" may hold up to 35 crabs ofmedium size. In average, \"catadores\" are able to process 4 \"paneiros\" in 7 hours work, starting at 6 o'clock in the morning. The 4 \"paneiros\" yield about 4 kilograms of crab meat and one kilogram of crab legs. Labour is paid for the amount of meat produced, averaging in March 1997 US$ 0,70 to US$ 0,80 per kilogram. That results in a remuneration around US$ 2,80-3,20 per working day per household member involved. To raise the remuneration margin, large households are increasing the participation oftheir members in the processing activity. Men dedicate to the typically male catching activity while women and children (although not exclusively), concentrates in the monotonous breaking and skinny of the crab legs. The activity has being the target of local environmental concerns for the not rare capture of crab females, the \"conduruas\", threatening the future reproduction of the specie. Concern has also been raised from evidences showing a reduction of the average size of the crabs caught in other mangrove areas of Pará. Recent environmental education campaigns in Bragança have focus on the need to understand and protect the reproduction cycle of crabs, as a way to guarantee the conservation of the specie.8 SEASONALITY OF ESTUARINE ACTIVITIES Activities of estuarine households are not severely restricted by the rainy (winter) or dry seasons. Rather, differentiation occur in the volume and quality of capture for fish and crab. Musseis are the most sensitive to seasonal variations, being abundant only during the early winter season. Agriculture is naturaily favoured by the rainy season for the land preparation and sowing ofbeans, maize, and manioc. Harvest are normally done by the early summer - October to December - for those annual crops, while the perennial, mainly fruits, are ready by the late summer (December - February). The little influence ofseasons on household activities may be assessed by the low proportion (20%) of respondents reporting a seasonal change of activities. In the open fields, the summer is typically dedicated to agriculture, in particular the harvesting and preparation of tobacco and manioc flour. On the other hand, subsistence during the rainy winter will be highly dependent on fishing for severa! households. For the mangrove area, household activities may alternate between fishing or agriculture in the winter and crab catching in the summer. However, field data suggest that a variety ofalternative sources of income is likely to work to undermine the importance of seasonally as a significant explanation for incidental income variations. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 196
ESTUARINE INCOME: COMPOSITION AND VARIATION A variety ofactivities respond for the household monetary income in the estuarine areas. Lcd by fishing, mangrove dependent activities predominate as the main source ofcash, followed by agricukure and commerce. Other sources include retirement pensions, public employment as teacher or community health agent. Particularly noticeable is the contribution of family members living outside the estuarine arca, which was mentioned by a proportion of 17% ofthe respondents. This is consistent with studies of income composition in arcas of the Northeast regions, which indicates a significant role of extra-household activities for supporting family income. Although this situation may be seen positive because it cases pressure on the natural resources base, in the limit it may threat the stability and permanency of the households themselves. CONDITIONS OF THE FISHING ACTIVITY TODAY Fishing is largely the main economic activity for estuarine households. Capitalisation and modernisation ofboats and fishing gear have been restricted to few short lived credit programmes during the 1970 and 1980 decades, benefiting a small number of local entrepreneurs.9 The relative low productivity of local artisanal fishermen is usually connected to their lacking of the necessary fishing equipment. That is also true for the Bragança arca, as motor boats are owned by less than 20% of the households while nets by 30% of them. Specific questions on the general situation of the fishing activity today and the prospects for the near future were proposed to household members. Comparing with time of their childhood, fishing conditions are seen generaily better today for little more than two thirds of the respondents. A haif of the reasons given is related with the greater availability of resources today compared with their parents time. For a significant 30% of respondents, better conditions are associated with better commercialisation fadiities, especially the existence of ice factories in the arca (Bacuriteua and Bragança) and a growing network of middlemen, together with the relative increase of fish prices. Greater experience in fishing tcchniqucs and the work as a self employed have also been mentioned among the reasons. The worsening of fishing conditions are highly concentrated on a single argument: each season the valuable commercial fish is being found farther than the previous one. Journeys from the estuarine communities are getting longer comparing with 20 or 30 years ago, with the natural implications on operational costs. For the near future, prospects are mixed. For little more than a halfof the respondents, a better future will depend particularly on the availability of \"resources\", mainly related with credit and governmcnt support. The help offamily members and the likelyvalorisation offish has been mentioned for a smaller number ofrespondents. The worsening of conditions in the future scems inevitablc for the other half of households. The increasing population pressure on local fish and shellfish resources is perceived as the main reason for concern. Also, a growing competition lcd by some large fishing interests against sirail fishermen was also mentioned as an unwanted corollary of the pressure on the resources base. The conditions necessaries for improving local fisheries and the means to reach them concentrate themselves on the purchasing of a motor boat, which will allow fishermen to reach the best commercial fishing arcas. Fishing gear comes as the second preference, followed by better prices for fish and an unspecified government help. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 197
The means to reach an improvement in estuarine fishing are mainly through co-operatives and credit. Help from government comes well behind, while the traditional \"patrão\" will be a solution for only 4 out of 43 cases. The above results underline the interest of local communities for modernisation, as the best way to improve living conditions. For a significant number of households, the channelling of funds for the fishing activity will depend either (i) on the constitution of a co-operative or (ii) on a more active role to be played by the Bragança fishermen association. The local understanding and problems of the estuarine environment For almost 50% of the respondents, the mangrove is essential for providing the nutrients necessary for feeding fish and shellfish. For another group of about 10% of responses, the tides or the \"waters\" are those responsible for bringing the fish to the mangrove. On the other hand, a significant 27% of respondents see no relation between mangrove and the fisheries. These results indicate a long future work to be done with local people for a better understanding of the features of the estuarine ecosystem and their connections with fisheries productivity. This understanding will be a necessary step for gaining local support for future environmental manage initiatives. Rather than the environmental authorities, the local communities must be prepared for future engagement in the protection and management of their adjacent environments. Changes in the local environment are connected with the destruction ofmangroves for almost one half of the respondents. Another significant group (18%) associate changes with the growing of population and its consequent pressure on forests. Significant is also the perception ofenvironmental change in terms ofits implication to reduce catching of both fish and shellfish (11%). For residents in the open fields, the presence ofbuffaloes has being a major reason for concern (8% of total and 30% of the fields respondents). Buffaloes are claimed to deepen the soil and breaking earth dikes, damaging the drainage system of some areas. Of particular interest are the responses linking forest destruction to local climate changes (7%). For this group, the relative delay for starting the rainy season is taken as an indicator of the changes. Another group of respondents (8%) claims that environmental changes are minimised for the capacity of the mangrove forest to regenerate itself. Solutions proposed for the main environmental concerns are linked to the need to preserve mangroves. Other responses suggest the need to protect the female crabs (5%) and the replanting of the forest (5%). Other suggestions cail for the use of government power (7%), the obtaining of credit and industrial plants for the creation of local jobs (9%). Among the responses given to the question, two are particularly suggestive. They cail the government for known better the local reality and the actual extension and conditions of the environmental degradation. The last question asks respondents about their wilingness to help with eventual environmental initiatives. Data offieldwork indicates that \"Conscientization\" and \"fiscalisation\" have attracted the largest proportion of respondents (58%). Other rhetoric responses have been \"not allowing forest destruction\" or \"not allowing the killing of female crabs\" (13%). The supplying of labour or material means lias been limited to only another 13% of the respondents. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 198
An interpretation of the above results is linked to the relative surprise of local people when asked for contributions, rather than just opinions, about fundamental issues such as what \"you could do\" for the environment. This lacking of experience in dealing with practical decisions on public issues must be a subject of further attention as a condition for a good involvement of local people in future environmental management decisions. CONCLUSIONS Aspects of the estuarine household and the estuarine economy of the Bragança arca lias been described in this paper. Data provided by a direct questionnaire based research suggests the importance of multiple sources of activities for the estuarine economy. Fishing and crab catching represents a main activity for households of the mangrove arca, which is being increasingly combined with non-fishing sources ofincome. The destruction of the mangrove forest is largely the main environmental problem perceived by local people in the mangrove arca, with implications for the productivity of the ecosystem and the climate in the arca. Proposed solutions for the environmental problems are mainly concentrated in the organisation of the communities themselves and the protection of the mangrove forest. As proposed by local people, the expected role ofgovernment for solving environmental problems is related with the increasing ofjobs and investments in the arca, as a way to release pressure on the environment. All these arguments suggest the correct understanding by local people of the main problems of their local environment and offer a realistic way to deal with them. They also suggest that the government should exercise its environmental protection mandate, not without priorizing policies to generate alternativejobs for the local people. BIBLIOGRAPHY DE BARROS, H. 1991. Small commodity agriculture in north-east Brasil: the case of horticultural farming in Pernambuco brejos. London, University Coilege London. Ph.D. Thesis. FURTADO, L.G. 1987. Curralistas e redeiros de Marudá: pescadores do litoral do Pará. Belém, Museu Paraense Emílio Goeldi. IBGE-Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1991. Censo demográfico. Resultados do universo relativo às características da população e dos domicílios-Pará. Belém, IBGE. IBGE-Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1991. Produção agrícola municipal: culturas temporárias e permanentes-Pará. Belém. IBGE-Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1991. Situação demográfica, social e econômica: primeiras considerações-Pará. Belém. IBGE-Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1992. Produção agrícola municipal: culturas temporárias e permanentes-Pará. Belém. IBGE-Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 1994. Produção agrícola municipal: culturas temporárias e permanentes-Pará. Belém. Ecositemas Costeiras: impactos e gestão ambiental 199
IDESP-Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará. 1977. Caracterização sócio-econômica da região nordeste do Pará. Belém, Governo do Estado do Pará. MANESCHY, M.C. 1995. Ajuruteua: Uma comunidade pesqueira ameaçada. Belém, UFPA. PARATUR-Companhia Paraense de Turismo. 1994. Inventário turístico do município de Bragança. Belém, Governo do Estado do Pará. jul. SANTOS, C. 1992. A luta da mulher rural pela cidadania: o caso de Acarajó, Bragança, PA, 1980-90. Belém, Universidade Federal do Pará. Trabalho de conclusão de curso. NOTES 'This paper resulted from a cooperation between the Center for Tropical Marine Ecology -ZMT, Bremen - and the Universidade Federal do Pará e Museu Paraense Emilio Goeldi, both in Belém, as well as the Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, under the Governmental Agreement on Cooperation in the field of Scientific Research and Technological Development between Germany and Brazil as part of the MADAM Program financed by the German Ministry for Science and Technology (BMBF) (project number 03170 1 54A). 'Universidade Federal Rural de Pernambuco; Fundação Joaquim Nabuco/Instituto de Pesquisas Sociais. Rua Dois Irmãos, 92- Ed. Anexo Anízio Teixeira. CEP 52071-440, Apipucos - Recife/PE. E-mail [email protected] 3Tobacco cultivation was introduced in the area bya local entrepreneur about 10 years ago. Leaves are dried and processed in an artisanal way by local frmers and the produce is sold in the open markets for the making of straw cigarretes. Data on tobacco production are shown in the Anexe. 4During the high summer season -october to december -, different species of grasses generates a particularly beautiful and colorful landscape, creating a potentially attractive scennary still to be explored for tourism. 'The main support for this proposition is found in the literature on commodity farming generated under a post-marxist perspective fmm the mid- 1980s. Distinguished representatives ofthis stream are Harriet Friednian, HenryBernstain, and Gibbon and Neocosmos. Fora review of this; literature see de Barros, H., 1991. 6 0n the issue of mangrove wood exploitation, an alternative still to be assessed is the allowing of the trimming of some species, choosed by their ability to regenerate in short time. As reported by Maneschy in her study of the fishermen ofAjuruteua (Bragança area), the immediate needs of a worker may be a determinant of the salary, rather than the market price. Another example, proved by this researcher, is the rale of the beach, according which anyone in need is allowed to get the necessary fish for eating. 'Brochures calling for the preservation ofthe mangrove have been produced locally, as part ofa campaign supporting women activities of estuarine communities. (Santos, C. Cartilha sobre Educação Ambiental. O manguezal é nosso berçário, volumes 1, 2,3, Bragança, 1996) 9The limited impact ofcredit programmes for fisheries is discussed in Governo do Pará.Instituto de Desenvolvimento Econômico- Social do Pará. Caracterização sócio-econômica da região nordeste do Pará (IDESP 1 977;Maneschy 1995). Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 200
SABERES TRADICIONAIS: USO E MANEJO DE RECURSOS MEDICINAIS EM UMA VILA PESQUEIRA' Má rija Coelho Ferreira' Resumo Para os povos tradicionais da Amazônia, o conhecimento e o uso dos recursos naturais como fonte de remédios integram-se dentro de uma visão holística da saúde. Na vila pesqueira de Marudá, situada no litoral nordeste do estado do Pará, estes saberes sobrevivem, apesar das forças aculturativas da sociedade maior, representadas principalmente pelo turismo. Assim, neste artigo de cunho etnobotânico, são abordados os saberes tradicionais concernentes ao uso e manejo dos recursos vegetais medicinais, bem como a posição que assumem na busca pela saúde. Abstract For traditional peoples ofAmazonia, knowledge and use of natural resources for remedies is linked to an holistic health perpective. In the fishing village ofMarudá, situated in the northeast coastal region of Pará state, Brazil, traditional knowledge persists in spite of acculturative pressures from mainstream societ) which come primarily from tourism. This article approaches traditional knowledge from an ethnobotanical perspective, concerning the use and management ofplant medicinal resources. We also examine the role that these resources represent from an health perspective. INTRODUÇÃO Enquanto a Amazônia representa para índios e caboclos o seu bem conhecido e explorado local de morada e sustento, para aqueles que não compartilham dos mesmos valores, ela representa, segundo Diègues (1997), um obstáculo a ser vencido. Isto, aliás, evidenciado ao longo da história de ocupação da região, cujo processo foi amplamente descrito e analisado por Oliveira (1983). No entanto, Schultes (1994) alertou para o fato de que devido ao rápido e crescente processo de aculturação e ocidentalização na região, o conhecimento detido por indios e caboclos estaria condenado à extinção. Ressaltava ainda que, em conseqüência disto, a busca de novas drogas vegetais estaria comprometida (já que se considera a Amazônia como um extraordinário laboratório químico), assim como os esforços de conservação de todo o ecossistema amazônico. Este grito de alerta tem suscitado, mais que nunca, a atenção de etnobotânicos quanto a importância daqueles povos para o entendimento, a utilização e a proteção da diversidade vegetal (Plotkin 1988; Posey 1987; Prance 1987; Bird 1991). Assim, estudos etnobotânicos pertinentes às plantas medicinais, em especial, vêm sendo realizados, muitos dos quais não se ocupando apenas da identificação e documentação daquelas, mas visando, também, seu manejo e suas potencialidades bioativas (Schultes 1979; Elisabetsky 1986; Amorozo & Gély 1988; Amorozo 1993; Elisabetsky et ai. 1995a; Elisabetsky et al. 1995b). Na Amazônia estes estudos estão voltados, sobretudo, para as áreas de florestas tropicais (terra firme, várzea, igapó e capoeiras); da zona costeira amazônica pouco tem-se falado. No entanto, o litoral do estado do Pará, à leste da desembocadura do rio Amazonas, vem sofrendo grandes transformações. Caracterizado por manguezais e restingas, constitui-se em um importante centro de migração e turismo, devido à abundância em recursos alimentares e belezas naturais.
Desta microrregião existem apenas dois estudos enfocando os saberes tradicionais sobre o mundo vegetal: Furtadoet ai. (1978), pioneiramente, descrevem a utili7ação das plantas medicinais no município de Marapanim; mais recentemente, Bastos (1995) documentou o uso cotidiano da vegetação por três comunidades pesqueiras. Assim, com este artigo pretende-se contribuir para um maior conhecimento da área costeira amazônica no domínio da etnobotânica, destacando-se saberes tradicionais relativos ao uso e manejo de recursos vegetais medicinais da vila pesqueira de Marudá. O mesmo reflete dados preliminares de pesquisa inserida no quadro do Programa Renas' (1996-1998) e que resultou em tese de doutoramento da autora Os dados referentes aos informantes e plantas foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas e observação participante. A coleta do material botânico realizou-se nos quintais, praias, mangu.ezal, capoeiras e campos de área adjacente ao local de estudo. As plantas coletadas foram identificadas e depositadas no Herbário João Murça Pires do Museu Paraense Emilio Goeldi, em Belém - Pará. A fim de esclarecer as palavras ou expressões locais encontradas neste texto, organizou-se um glossário no final deste. AVILA DE MARUDÁ A vila pesqueira de Marudá, situada no litoral do município de Marapanim - Zona do Salgado paraense, limita-se ao norte com a baía de Marapanim, a leste com a foz do rio homônimo, a oeste com o igarapé Marudá e ao sul com o igarapé Sumaúma e partes dos povoados do Cafezal e Recreio (Figura 1). Marudá possui 2.617 habitantes, contando em sua área geográfica 1694 casas, cuja maioria pertence a veranistas. A vila é formada basicamente por 3 bairros: Alegre, Sossego e Vila Nova ou Areal. E interessante observar que cada um destes traz em sua denominação a sua principal característica, o que é freqüentemente ressaltado pelos próprios moradores. O primeiro é um antigo bairro de pescadores, onde concentram-se, atualmente, os empreendimentos turísticos, tais como hotéis, bares e casas de veranistas, sendo considerado o bairro nobre da vila; o segundo, abriga grande parte dos pescadores, cujas moradias deslocaram-se da beira da praia para o interior da vila, à medida em que os veranistas foram estabelecendo suas vivendas; do último, mais recentemente formado, não se tem ainda uma definição de seu perfil populacional. De acordo com Furtado (1987: 94), duas categorias populacionais estão representadas em Marudá: A categoria permanente, constituída de pessoas com longo tempo de moradia no local; está relacionada a um aspecto que eu chamaria de econômico, por estar engajada numa atividade de subsistência com base nos recursos oferecidos pelo contexto geográfico da área.., destinados não somente ao consumo local, mas também ao atendimento das solicitações do mercado extra-local... A categoria flutuante reflete o aspecto de lazer que emerge das condições físicas do contexto geográfico de Marudá. A extensa praia de águas salgadas, o clima ameno, a abundância em peixes,... No contexto atual, a categoria permanente sofreu alterações: antes, composta essencialmente por pescadores, inclui agora, além destes, comerciantes, empresários do setor turístico e pessoas exercendo atividades informais diversas. Os marudaenses vivem predominantemente da pesca artesanal, a qual Furtado (1978, 1997) caracteriza pelo manejo sazonal e por tecnologias simples, com predomínio de redes em barcos à vela e armadilhas fixas - currais, na maioria; produção em pequena escala, assentada principalmente no sistema de parceria. Nesta modalidade de pesca, o saber empírico dos pescadores funciona como bússola e detector de cardumes. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 202
Figura 1. Localização da vila de Marudá, Município de Marapanim - Pará. O turismo, presente desde a década de sessenta, vem crescendo e transformando a pacata vila de pescadores. Esta atividade, até então, apresenta-se de maneira contraditória. Por um lado, representa alternativa de renda, ou melhor, possibilidades de aumento do orçamento familiar para os nativos. No período de baixa temporada, por exemplo, o carvão produzido nas caieiras e destinado ao preparo da alimentação familiar, é então estocado para atender a demanda dos visitantes, para os quais, aliás, cultivam os cheiros verdes. Na alta temporada (julho e feriados prolongados), as mulheres se empregam nas casas dos veranistas como domésticas ou lavadeiras; os homens tornam-se pedreiros e capinadores. Tais ocupações são, apriori, economicamente viáveis, mas não deixam de ser responsáveis por um certo transtorno no modus vivendi da comunidade em questão, dado que a pesca, enquanto principal atividade de subsistência, se desestrutura. Esta exige uma dedicação praticamente exclusiva; além da pesca propriamente dita. Furtado (1987: 87) ressalta estar nela incluída todas asfases preparatórias e as transações comerciais atreladas ao sistema da pesca. A fim de atender as necessidades do turismo, os pescadores deixam de pescar, ficando esta atividade em segundo plano. Por outro lado, porém, os marudaenses embora reconhecendo vantagens e gostando do que veio renovai percebem e sentem a sua Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 203
pouca importância ao comentarem, por exemplo, a capina das ruas visando o bem estar de veranistas, assim como a presença diária de ambulâncias e médicos no Posto de Saúde apenas durante a temporada estival. Segundo o depoimento de alguns informantes, é também nesta época que ocorre um aumento da população de moscas, ocasionado pelo acúmulo de lixo, bem como alastramento de doenças sexualmente transmissíveis. A QUESTÃO DA SAÚDE Sá et al. (1997) descrevem o ambiente como uma unidade integrada pelos planos fi'sico, biótico e antrópico, e que a harmonia destes gera a saúde. Assinalam ainda que, no contexto de um processo de desenvolvimento dirigido para atender necessidades alheias às da população envolvida, ocorre alteração do plano fi'sico, depredação do plano biótico e graves conseqüências para o plano antrópico. No caso de Marudá, com a atividade turística se expandindo, estaria a vila passando por esta degeneração ambiental? Ou ainda: estaria a exploração dos recursos naturais contribuindo para este processo? Estas questões, até então, não foram respondidas; para tanto, seria necessário uma pesquisa mais direcionada. O saneamento básico é praticamente inexistente. Os dados disponíveis são relativos ao Censo Demográfico de 1991 (IBGE) e revelam a situação não tão confortável da vila. Dos 347 domicílios particulares permanentes, apenas 24 possuem canalização interna de água ligada à rede geral; dos 323 restantes, 219 abastecem-se em poços artesianos e 104 da rede geral, de maneira irregular. A água proveniente desta não sofre qualquer tipo de tratamento. Quanto ao escoamento da instalação sanitária, a grande maioria (287) faz uso de fossas rudimentares, para outros, as valas são a solução. Em relação ao destino do lixo, de modo geral, abre-se um buraco no quintal, onde os entulhos são despejados e queimados; mais freqüentemente, porém, são simplesmente jogados nos fundos de quintais, alguns dos quais se estendendo até o manguezal, que por sua vez, sendo invadido periodicamente pelas marés, os oferece às águas. Em determinadas localidades, o lixo é francamente lançado ao rio. Com o crescente consumo de alimentos industrializados, o acúmulo de embalagens não degradáveis vem afetar o equilíbrio do meio ambiente. Um levantamento preliminar conduzido entre os habitantes e reforçado pelos dados do Posto Médico local, acusou como doenças mais ocorrentes a diarréia, disenteria, infecções repiratórias agudas, reumatismo, hipertensão, anemia, picadas de arraia e miquim, doenças sexualmente transmissíveis e problemas dermatológicos. A diarréia é geralmente causada pela presença de parasitas intestinais (Entamoeba hystolitica, Ancilostoma duodenale, Giardia lamblia, Ascaris lumbricoides) , os quais por sua vez estão correlacionados com anemia, desnutrição e baixa resistência à outras doenças. Este quadro é bastante comum em crianças, principalmente durante o longo período de estiagem. Convém lembrar aqui a análise sobre a relação desenvolvimento-doenças no Brasil realizada por Nations & Rebhun (1996), onde mostram que a gravidade da diarréia infantil entre as comunidades carentes deve-se à contribuição de fatores físico, biológico e social, entre os quais as condições insalubres em que vivem, especialmente a falta de acesso à água limpa. Já o reumatismo é bastante incidente nos pescadores e pessoas idosas, que ao Posto de Saúde recorrem somente quando todas as práticas tradicionais de tratamento tiverem sido esgostadas. Parece haver uma maior incidência de doenças sexualmente transmissíveis durante a estação de veraneio. No caso destas, as medidas de prevenção não são consideradas e desconhecem-se as informações sobretudo respeitantes a seu tratamento. Enfim, constata-se de maneira geral que este quadro converge para aquele citado por Escouto (1993), onde doenças de pele e anexos, infecções respiratórias agudas e doenças do aparelho digestivo são algumas das principais patologias encontradas entre populações indígenas e caboclas amazônicas. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 204
OS RECURSOS DA MEDICINA OCIDENTAL Conhecida também por medicina oficial, medicina científica e biomedicina, a medicina ocidental compreende o conjunto de conhecimentos e experiências técnico-científicos aceitos e legalizados pelo Estado. Em seu âmbito, excetuando-se as grandes cidades, onde estão instaladas importantes estruturas hospitalares, a região amazônica conta basicamente com serviços de nível primário, os quais são constituídos pelas unidades de saúde prestadoras de serviços ambulatoriais, educacionais e informativos (Estreila 1995). No contexto de Marudá, estes serviços estão disponibilizados no Posto de Saúde fundado na década de 70, sob a direção da Fundação Nacional de Saúde (FNS). Como em toda a região, este tipo de atenção mostra-se deficiente em qualidade, já que o seu funcionamento é bastante irregular, oscilando muito em função do momento político e da presença de veranistas. Em geral, um médico da Unidade Hospitalar de Marapanim faz a visita a cada sexta-feira, no período matinal. Hoje, a equipe de saúde é integrada por uma auxiliar de enfermagem e 3 agentes comunitários. A primeira, responsável pelo funcionamento do Posto, tem como principal trunfo, além dos seus 11 anos de prática, ser moradora da vila e, portanto, conhecedora dos problemas locais. Se por um lado é identificada nas entrelinhas de alguns relatos como \"uma igual\", isto é, pertencente à comunidade, por outro, conhece e tem acesso aos recursos terapêuticos oferecidos pela medicina ocidental, dos quais os marudaenses visam essencialmente os medicamentos industrializados. Nota-se que existe confiança para com ela falar dos seus \"sofrimentos\", especificamente daqueles considerados passíveis de serem tratados por esta alternativa terapêutica, cuja escolha é feita a partir de um diagnóstico previamente estabelecido no domínio familiar. Já aos 3 agentes de saúde, cabe-lhes atender e visitar doentes impossibilitados de se deslocarem, respondendo, desta forma, cada um por um bairro. Os medicamentos industrializados são procurados na única farmácia existente, instalada há praticamente 2 anos; contudo, alguns antibióticos, analgésicos e antitérmicos podem ser adquiridos nas boticas e bares, onde nem sempre os seus prazos de validade são considerados. Até então enfocaram-se as medidas curativas, as mais enfatizadas, inclusive, pelo sistema médico do país. No entanto, no que diz respeito às preventivas, a equipe de saúde cumpre, quando possível, um cronograma anual de vacinação (febre marela, BCG, anti-tetânica e anti-rábica). Quanto à vigilância epidemiológica, os Guardas de Endemias, funcionários da Fundação Nacional de Saúde (FNS), são os agentes responsáveis, atuando através da coleta de sangue e confecção de lâminas em casos de suspeita de malária e borrifação de DDT Nos últimos meses, o exame preventivo para a detecção de câncer no colo do útero tem sido incentivado, com encaminhamento das mulheres e controle mensal. Entretanto, percebe-se que um longo trabalho de conscientização da importância deste procedimento está por ser feito. A MEDICINA TRADICIONAL Em Marudá, a medicina tradicional representa todo um conjunto de conhecimentos e práticas fundamentadas em saberes médicos ameríndios ancestrais, que ao longo dos tempos foram se modificando através da inclusão adaptativa de influências européias e africanas, tanto no uso de recursos naturais quanto na religião. A medicina ocidental constitui-se em um outro fator que vem contribuir para a diversificação desta prática tradicional, através da incorporação de seus produtos farmacêuticos mais popularizados. Muito embora a introdução destes venha acontecendo gradualmente, ainda que de maneira irregular, as práticas terapêuticas tradicionais continuam vivas na memória e no cotidiano da comunidade marudaense. Para a Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 205
cura e prevenção de seus males, utilizam-se de maneira diversificada todas as terapias, fazendo uso dos recursos naturais, muitas vezes associados a fatores místicos e religiosos. Entre estes recurso, destacam-se aqueles de origem vegetal pela sua grande contribuição e diversidade. A grosso modo, os adultos - homens e mulheres - possuem um conhecimento geral sobre os recursos naturais integrantes da farmacopéia tradicional, porém as mulheres dominam os conhecinjentos sobre a manipulação e uso daqueles, destacando entre estas as especialistas tradicionais, cujos perfis serão comentados adiante. Entre os jovens, aqueles saberes se restringem às jovens mães de família, que assumindo o papel de administradoras da vida familiar e desde então, responsáveis pela qualidade de vida de sus famílias, se induzem nos caminhos ancestrais, considerando os tratamentos, as recomendações e os remédios dos antigos. Quanto aos celibatários de ambos os sexos, mais influenciáveis pelos valores culturais trazidos plos veranistas, denunciam um certo descaso ao comentarem as práticas médicas tradicionais, às quais na necessidide, consciente ou inconscientemente, recorrem. Movimentos comunitários preocupados com a falta de assistência médica surgiram nos meados desta década. Formados por mães de familia, em sua maioria mulheres de pescadores, estes movimentos tomaram fôlego e resistem às dificuldades encontradas ao longo de seu percurso. Estão representados pelo Grupo Erva- Vida e pela Associação das Mulheres da Área Pesqueira de Marudá, que têm como principal atividade a manipulação de remédios caseiros, cujos constituintes são recursos vegetais e animais colet4ios na própria comunidade, ao lado daqueles adquiridos nos ervanários de Belém. Enquanto um foi inicialmente apoiado pela Igreja Luterana da capital, o outro o é pela Pastoral da Saúde, através do Centro Pastoral do Pescador (CPP) criado pela Igreja Católica. Observa-se, porém, que as especialistas tradicionais estão às margens destes movimentos e supõe-se que isto deva estar relacionado às suas práticas, criticadas e mal vistas por aqueles que não comungam nas suas percepções de doença e na eficácia de seus remédios. Embora este aspecto seja de relevância por estar diretamente implicado na questão da saúde, o mesmo não será aqui analisado. AS ESPECIALISTAS TRADICIONAIS As especialistas da medicina tradicional atuam ativamente na vida cotidiana desta co4iunidade, onde são respeitadas e assiduamente procuradas. Dependendo do aspecto em que atuam, são cl4sificadas como curandeiras ou pajés, rezadeiras ou benzedeiras e parteiras. Os poderes de cada uma dests é revelado ou adquirido diversamente. Nas curandeiras, também denominadas pajés, o poder se manifesta em duas ocasiões precocemente, através do choro ainda no útero materno e/ou, também, durante a infância, ao serem escolhids e levadas para as profundezas das águas pelas entidades que lá habitam. Explicam que aquelas que consguem retornar transformam-se em respeitáveis pajés; se o contrário ocorre, passam a integrar o mundo das ncantarias. Em seu trabalho utilizam-se de cigarros, penas, maracá, cachaça e mirra. Enquanto os quatro primeiros elementos são característicos da pajelança ameríndia, ouso da mirra foi posteriormente introduzido neste ritual. Destinada à defumação e conhecida desde a Antigüidade, a mirra, adquirida no Mercado Ver-o-No ou Casas de Umbanda em Belém, é geralmente substituída pelas resinas odorantes do breu (Protium heptaphyllum) ou do umiri (Humiria balsamfera), duas espécies nativas. Na falta destas resinas, empregam-se as suas cascas em defumação. As curandeiras diferenciam-se das macumbeiras, com as quais são confundidas pelos leigos, por terem recebido de Deus o dom da cura, ao passo que àquelas o mesmo não foi concedido. O aprendizado das macumbeiras se dá através de livros; entre estes, o de São Cipriano, bastante temido pelas curandeiras. Segundo estas, mesmo que o quisessem não poderiam acedê-lo, já que são iletradas. Além do mais, as Ecossistemas Costeiros: impaaos e gestão ambiental 206
curandeiras são da linha branca, que é a linha de cura e trabalham com caboclos, enquanto as macumbeirasfazem malinêza e trabalham com sangue de bicho... na magia negra, pra negociar com a vida dos outros, adverte uma informante. Em relação às benzedeiras, aquelas têm uma mais ampla atuação: toda curandeira pode ser rezadeira, mas nem toda rezadeira é curandeira, afirma uma curandeira entrevistada. As benzedeiras são dotadas de poderes distintos, os quais se manifestam através de sonhos. Esta manifestação ocorre, portanto, como já havia assinalado Wagley (1957) no seu estudo sobre uma comunidade amazônica, de maneira mais branda que os poderes das pajés. Desta forma, tratam doenças específicas tais como quebranto, mau-olhado, isipla, espinhela caída, rasgadura e dismintidura, através de orações do catolicismo popular e de recursos medicinais. As parteiras, por sua vez, são as grandes conhecedoras dos problemas femininos, para os quais sempre apresentam soluções. Conhecem bem as plantas indicadas para limpar, fortalecer e, assim, propiciar o útero para a concepção. Com este objetivo, preparam com maestria as fmosasgasrafados, das quais são grandes conhecedoras. Em geral, acompanham as mulheres em todas as fases marcantes de sua vida, principalmente durante o período de gestação e o pós-parto. Fazem puxações a fim de bem acomodar o bebê no útero materno ou de expulsar as bolas de sangue que persistem naquele órgão após o parto; emplastram e aquietam a mãe-do-corpo. Se por um lado as especialistas da medicina tradicional, através de seus saberes, representam um conforto para os marudaenses; por outro, suas práticas são francamente reprimidas pelas igrejas católicas e evangélicas, presentes na vila. Ressalta-se, porém, que a repressão é particularmente direcionada às curandeiras, cuja fé católica não impede, no entanto, o exercício de seu dom. INTERPRETAÇÃO DAS DOENÇAS Considera-se neste artigo a classificação de Maués (1977) para as doenças, baseada na causalidade destas. De acordo com a mesma, existem, em Marudá, doenças \"naturais\" e doenças \"não-naturais\". As \"naturais\" são em parte explicadas pela síndrome quente-friO4 (reumatismo, gripe, iip1a,curuba, etc.), mas podem ser provocadas em casos de transgressão de regras alimentares (diarréia, dor de estômago, feridas que não cicatrizam, etc.), ou causadas pelo vento que penetra no corpo através da respiração (vento encausado, baques), ou pelos acidentes (ferrada de arraia, picada de miquim, rasgadura, dismintidura, peito aberto e espinhela caída). As \"não-naturais\" estão relacionadas a agentes causais que atuam motivados pela maldade, inveja ou raiva que sentem em relação à vítima (panemice, feitiço, mau-olhado), ou pela admiração (quebranto). Enquanto as primeiras podem ser tratadas tanto pelos remédios caseiros e/ou especialistas da comunidade quanto pelos médicos, as segundas requerem a intervenção de especialistas tradicionais para que o tratamento seja eficaz. RECURSOS VEGETAIS MEDICINAIS: USO E MANEJO Todos os recursos possuidores de um poder curativo para a população em questão são medicinais; no entanto, obedecendo a abordagem etnobotânica proposta, restringem-se neste artigo ao mundo vegetal. De acordo com a percepção deste mundo pelos marudaenses, os vegetais são classificados em duas categorias: 1) os que se encontram na natureza sem influência antrópica, denominados \"pau\" ou \"mato\": um, em referência ao porte arbóreo ou lenhoso e o outro, mais abrangente, engloba outros hábitos vegetativos; 2) os que são selecionados e submetidos às mãos do homem, então, considerados \"plantas\". Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 207
Através de entrevistas semi-diretivas, discussões informais e observação participante for*m levantadas aproximadamente 162 espécies botânicas, distribuídas em 63 famílias distintas, das quais se evidenciam por ordem de importância: Lamiaceae (Labiatae), Asteraceae (Compositae), Euphorbiaceae, Fabacea (Leg.Papi.), Caesaipiniaceae (Leg.Caesa), Piperaceae, Rutaceae e Zingiberaceae. Souza Brito & Souza Brito (1993) mostram que as 5 primeiras famílias estão entre as mais freqüentemente pesquisadas no Brasi,i e esclarecem que isto se explicaria pelo fato de serem abundantes na natureza, além de bastante utilizadas popularmente. Este último fator tem sido responsável pela escolha e seleção de espécies botânicas em pesquisas frmacológicas, com comprovadas atividades. Cronquist (1981) ressalta que a importância da família Asteracae, por exem- plo, está relacionada aos seus constituintes químicos tais como os óleos essenciais, os policetiienos e as lactonas sesquiterpênicas. Schultes (1990), pioneiro no estudo etnobotânico de plantas medi inais e tóxicas amazônicas, comenta que devido às propriedades aromáticas das Piperaceae, várias espécies enfram na medi- cina 'foik' da América Tropical. Observa ainda que as Rutaceae são especialmente ricas e metabólitos secundários, representados pelas classes de alcalóides, flavonóides, taninos, triterpenos e cuarinas, entre outros, com potencialidade bioativa. A grande maioria (130) das espécies levantadas é cultivada; do restante, 32 são espontânas e 23 podem ser encontradas nos dois estágios ou, poder-se-ia dizer, em processo de domesticação. A propóito, Cabaliero (1986) observa que a interação homem/planta não está limitada à domesticação das plantas cultivadas conhe- cidas e que grande número de espécies se sujeitam a diversas situações de manejo pelo homem,1 que vão desde a sua proteção consciente até a sua domesticação. Este gradiente de interação homem/planta éobservado em Marudá. Nos quintais, domínio doméstico das espécies cultivadas, as plantas estão, à primeira vita, espalhadas de maneira desordenada; no entanto, quando de uma observação mais minuciosa, a lógica de sua disposição metódica emerge claramente. Muitas são arbóreas frutíferas, mas com reconhecidas propriedades medici- nais. Neste caso estão os abacateiros (Persea americana Mill.), laranjeiras (Citrus sinensis Osbck), limoeiros (Citrus limon (L.) Burn.f.), gravioleiras (Annona muricata Linn), coqueiros (Cocos nucfera L.), bananeiras (Musa spp), cajueiros (Anacardium occidentale L.) e goiabeiras (Psidium guajava L.). As plantas herbáceas distribuem-se, principalmente, em canteiros suspensos ou cercados - visando a sua proteção contra os animais domésticos (galinhas, patos, cachorros, gatos, etc) -. ou ainda em latas e panelas velhas, paneios e cascos de canôa em desuso. Incluem-se aqui as plantas introduzidas e que, portanto, requerem mais ciidados, como arruda (Ruta graveolens L.), catinga-de-mulata (Aeollanthus suaveolens G. Don), hortelão grande (Plectranthus amboinicus Lour.) spr., malva cheirosa (Pelargonium zonale) e gengibre (Zingiber officinalis Rosc.). Apesar de ser um espaço manejado, muitos dos quintais visitados abrigam espécies espontâneas, as quais sempre apre- sentam alguma utilidade. As espécies nativas como o apuí (Ficus maxima) e o caratepê (Vzbernaemontana angulata C. Martius ex MueIl. Arg.) ilustram bem esta situação. Reparados em vários quintais, seus latexes são empregados em emplastros; além disto, o fruto do caratepê, sob a forma de chá, combate a tosse e o catarro. Da mesma forma, a vassourinha (Scoparia dulcis L.) e o mastruz (Chenopodium ambro4oides L.), tidos como mato que brota no quintal, são protegidos quando da capina deste. Juntamente com algumas orações conhecidas pelas benzedeiras, a vassourinha compõe o remédio por excelência para se tratar d quebranto, ao passo que o mastruz é uma vitamina para o corpo da pessoa. Quanto às espécies espontâneas, estas são procuradas nos diversos ambientes vegetaconais, tanto na própria vila como em seus arredores. Nas areias da praia coletam o capim-da-beira-da-praia (Spa-tina alternflora Loisel), espécie nativa, de cuja raiz seca preparam um chá indicado para asma. Já nas beiras de rua crescem vassourinha-de-botão (Borreria verticilata G.FWMey), mussambê (Cleome spinosa Jacq), pecaconha Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 208
(Hybanthus calceolaria (L.) Schultze) e gergelim (Sesamum indicum DC), entre outras. O gergelim, apesar de ser uma planta introduzida, cultivada em quase todos os quintais, brota espontaneamente nas áreas que sofrem pressão antrópica. O manguezal, cuja vegetação enriquece e mantém a produtividade das águas costeiras, é importante fonte de remédios: mangueiro (Rhyzophora mangle L.), mangue-de-butão (Conocarpus erectus L.) e tinteiro (Laguncularia racemosa (L.) Gaertner) tem raiz, fruto e caule respectivamente coletados para o preparo de chás anti-diarréicos. Os campos do Crispim - uma comunidade vizinha - contituem-se em uma outra área de exploração de inúmeros produtos medicinais. Identificados como locais abertos, arenosos, com uma vegetação baixa permeada de bolas de mata; estes campos corresponderiam à 3 das 6 formações vegetais descritas por Bastos (1995), as quais compõem a restinga. E neste ecossistema que coletam o breu e o umiri anteriormente citados, assim como a cebola brava (Clusia grandflora Splitg.) de cuja flor ou fruto preparam um xarope para tosse e a sucuúba (Himatanthus articulata (Vahl.) Wood), considerada excelente remédio para combater os problemas útero-ovarianos, evitar filhos (chá da casca), além da indicação de seu látex nos casos de tosse (xarope) e espinhela caída (emplastro). As velhas capoeiras situadas nos arredores da vila são frequentemente visitadas, pois além de fornece- rem madeira para a produção do carvão e construção de casa, fornecem frutos e remédios. Entre estes últi- mos, o denominado barbatimão da capoeira (Connarus perrotteti (DC) Planchon var. angu ti &ius Radik.) é amplamente referenciado e utilizado por sua propriedade antiinflamatória, principalmente nos problemas femininos. Relevantes no tratamento das diarréias e do diabetes, a camembeca (Polygaia spectabilis DC) e angélica (Guettarda angélica Mart.), respectivamente, são também aí coletadas. Bastos et ai. (1995) citam a presença destas duas espécies em mata de restinga, ao passo que a angélica ocorre também em dunas, tendo desta forma um maior espectro de ocorrência. Muitos dos recursos vegetais conhecidos e empregados no passado, sempre descrito como tempo de abundância, já não são mais encontrados localmente nos tempos de hoje. A mata ficou muito distante!, afirma uma informante. A sua obtenção dá-se, então, através: a) da rede de amigos e parentes habitando a região de água doce; b) do caminhão das colônias rurais que trazem seus produtos agrícolas nos fins de semana; c) de longas caminhadas e d) excursões de canoas pelos igarapés. Uma outra ocasião profi'cua é o início da estia- gem, durante o mês de maio, quando os pescadores adentram as terras interiores à procura de madeira usada na construção de seus currais, no retoque de seus barcos e de suas casas. Segundo alguns curralistas, durante as suas incursões pelo mato, ao avistarem espécies medicinais conhecidas, coletam os elementos que certa- mente serão de serventia imediata ou poderão ser estocados para necessidades futuras. No tempo em que as familias se dedicavam às roças de subsistência, estas abrigavam plantas medici- nais. As transformações acarretadas principalmente pelo acesso ao mercado de consumo, facilitado pela aber- tura de rodovias, fizeram com que muitas roças fossem abandonadas, com consequente rareamento daquelas plantas lá existentes. Naquelas poucas que resistem, não é raro serem encontradas o carrapato (Ricinus communis L.) e o batatão (Operculina alata (Harm.) Hub.). O óleo das sementes do carrapato ou mamona com suas propriedades purgativas, fora bastante usado tempos atrás para limpar o intestino e o útero após o parto, bem como para secar o umbigo de recém-nascido e assear os cabelos; nos dias de hoje, porém, sua importância diminuiu. Talvez, por isto mesmo, a técnica de extração do óleo parece ser praticada por apenas uma mulher, quem, aliás, mantém sua roça. A raiz do batatão, no entanto, continua tendo lugar privilegiado neste aspecto da medicina tradicional, haja visto que para consegui-Ia percorrem longas distâncias. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 209
O crescimento das águas durante o inverno amazônico contribui, por sua vez, na diversificação dos recursos medicinais utilizados. É caso da andiroba (Carapaguianensis Aubi.) e da fava-do-iapó (Vatairea guianensis Aubi), cujas sementes aportam na praia de Marudá trazidas pelas marés, principalmente du- rante o mês de abril. A coleta das sementes de andiroba, em particular, é feita por mulheres ecrianças, mas a técnica de obtenção do seu óleo é dominada por poucas. Em Marudá, este óleo está par a terapêutica como a farinha de mandioca e o peixe estão para a dieta. Trata-se de um produto amplamente empregado, principalmente de grande serventia para as benzedeiras e parteiras, cujas práticas exigeni massagens e fricções. Acondicionado em pequenas garrafas, este óleo é estocado, constituindo-se em fbnte de renda para quem o produz. ESCOLHA DOS REMÉDIOS Existe toda uma fase de observação e de experimentos no processo de busca dos remédios provenientes da natureza. Assim, um remédio pode ser escolhido por ter uma qualidade oposta àquela da doença que se deve tratar ou prevenir. Considerada uma doença quente, a isipla deve ser tratada com plantas tidas como refrescantes, tais como a babosa (Aloe barbadensis Mi1L) e o pirarucú (B7yophyiium calicinum Salisb.), cujas folhas quando esfregadas exsudam sumo. A fim de reforçar o efeito refrescante destas plantas, é prática comum adicionar cachaça, considerada fria. Além do seu sumo, aplicado diretamente sobre d local, as folhas são também colocadas em emplastro, procedimento este que conduz ao equilíbrio térmko desejado. O ressecamento da folha, sucessivamente substituída por outra até o desaparecimento do mal, sugere a absorção de sua frialdade pela quentura da isipla. Outro maneira de selecionar plantas específicas baseia-se em suas características orgnolépticas, tais como cor, cheiro, sabor, etc. Esta seleção corresponde à Teoria das Assinaturas atribuída à Paracelso, onde preconizava que tudo que a natureza cria, recebe a imagem da virtude que ela pretende esconder ali Di Stasi 1996: 20). É o caso do sumo, chá ou macerado das folhas vermelhas do pariri (Arrabidaea chica VerI), indicadas para anemia e fraqueza, \"doenças\" estas evidenciadas pela cor amarela da pele. Aproveitam-se da propriedade adstringente do leite da ucuúba (Virola surinamensis Warb.) para combater inflamações em geral. Por outro lado, pela mesma razão, o chá ou lambedor da casca dojutaí (Hymenaea courbaril L), indicado para combater a tosse, deve ser evitado em se tratando de asma, devido ao fato de arrochar demais. A forma de lança das folhas do tajá-de-cobra e da espada-de-são-jorge, duas espcies do gênero Sansevieria Thunb., evoca carcterísticas agressivas e protetoras. São cultivadas nas entradas klas casas ou em cruz, atrás da porta de entrada, a fim de afastar o mau-olhado de terceiros. Estes poucos exemplos vêm ilustrar a maneira como os marudaenses pensam e praticam a seleção de seus remédios. As razões que a justificam, embora difiram de uma explicação causal \"cient(fica\", não excluem a possibilidade de uma ação farmacológica da planta (Amorozo & Gély 1988: 72). Nestes termos, quase nada se conhece sobre a maioria das espécies nativas amazônicas. Porém, outras amplamente empregadas - não apenas na comunidade em questão, mas, também, em outras regiões do país e do mundo, tit'eram alguns de seus usos tradicionais validados cientificamente (Carriconde et ai. 1996; Matos 1997; Farnacopea... 1997). Entre estas destacam-se babosa, pirarucu, mastruz, hortelã grande, cajueiro e goiabeira. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 210
CONCLUSÃO Apesar do seu caracter preliminar, este artigo pretende registrar a importância dos saberes tradicionais concernentes ao uso dos recursos vegetais medicinais em uma comunidade costeira amazônica em transformação. As influências urbanas relativas à percepção das doenças e do tratamento destas não conseguiram apagar o modelo tradicional existente, fruto de um sincretismo semelhante àquele relatado em outras comunidades regionais. A instalação de um Posto de Saúde e de uma farmácia em Marudá não provocaram a substituição de seus remédios caseiros. Além do funcionamento precário de um e do alto custo dos produtos oferecidos pela outra, desfavorecendo o consumo destes, constata-se grande cumplicidade entre especialistas tradicionais e pacientes, bem como confiança nos remédios da terra. Diferentes ambientes são explorados e o manejo das plantas se dá em função da sua utilidade ou abundância, com destaque para as espécies cultivadas. Alguns recursos, embora conhecidos e úteis, tornaram- se de difícil acesso, já que no entorno da vila a vegetação vem sendo devastada para fins imobiliários. Muitas vezes esta lacuna é sanada pelos laços familiares e pelas possibilidades de aquisição junto aos moradores das terras interiores, através da compra ou troca de produtos. Enfim, os conhecimentos constatados somados à situação sanitária e ambiental atual da vila de Marudá, agravada pela atividade turística nem sempre planejada, só vêm incentivar a continuidade de estudos desta natureza, os quais serão certamente de grande valia para a saúde de sua população. GLOSSÁRIO Curuba - \"coceira que dá nos pés, nas mãos, entre os dedos e nas juntas. Vai fazendo uns camininhos e no final dá um piolhinho. O bicho tem um micróbio danado!\" Dismintidura - \"um jeito que dá quando, por exemplo, tá jogando bola. O osso sai do lugar\". Luxação. Encantaria - \"fundo do mar, onde moram os encantados (entidades)\" Espinhela caída ou peito-aberto - \"afastamento da espinhela (apêndice xifóideo do externo), às vezes por que carregou muito peso. Quando não tratado pode virar tuberculose\". Garrafadas - fórmulas de uso interno, utilizadas a longo prazo, têm como veículo um produto alcoólico, que pode ser cachaça ou vinho tinto, no qual folhas, raízes, cascas, sementes, lenho, etc, são deixados em maceração. Isipla - \"vermelhidão que dá no corpo da pessoa. Geralmente dá aquela ferida e inchaço, por causa da quentura do sangue\". Corruptela de erisipela. Mãe-do-corpo - \"localiza-se normalmente no umbigo. Quando tá espalhada pela barriga, tá atacada. E a sustância da pessoa ... se a gente não tivesse, a gente não vivia\". Mau-olhado - \"difere do quebranto por ser mais forte\". Panemice - \"quando o curral não dá peixe... a pessoa vai pescar e não traz peixe, não traz nada. No comércio é a mesma coisa.\" Falta de sorte em qualquer atividade, atingindo tanto a pessoa como seus objetos. Quebranto - \"provocado pelo olhar firme e admirado sobre uma criança. A criança amofina, tem vômitos, febre e diarréia\". Rasgadura - \"a carne rasga por dentro... não bole com o osso... a pelia não abre\". Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 211
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NOTAS 'Trabalho referente a tese de doutoramento em Ciências Biológicas, no Centro de Ciências Biológicas da UFPA/rvtEG/Embrapa- CPATU. 2 IEPA-Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Amapá. Pesquisadora III. Av. JK, s/n - Fazendinha. ep 68925-000, Santana-AP 'Recursos Naturais e Antropologia das Populações Marítimas, Ribeirinhas e Lacustres da Amazônia: estudo da r1ação do homem com seu meio ambiente. 4 Sua origem se encontra na medicina hipocrática dos antigos gregos, a qual concebia o corpo humano saudável corpo o resultado do equilíbrio entre os humores ou fluidos corporais, compostos por uma combinação do quente e do frio com o úmilo e o seco. Estas idéias foram trazidas da Europa para a América Latina pelos colonizadores.., permanecendo vivas, porém, as idéiaso respeito da saúde como resultado do equilíbrio entre o quente e o frio corpóreo (Maués 1977: 20). Ecossistemas Costeiros: impados e gestão ambiental 214
ORGANIZADORES Maria Thereza Ribeiro da Costa Prost Geógrafa, doutora em Geomorfologia pela Université Paris VII. Pesquisadora Titular, Coordenadora de Ciências da Terra e Ecologia e do Programa de Estudos Costeiros do Museu Paraense Emílio Goeldi. E autora de diversos artigos científicos, capítulos de livros e resumos expandidos publicados no Brasil e exterior. Organizadora e participante em eventos científicos nacionais e internacionais. Amilcar Carvalho Mendes Geólogo, Mestre em Geologia Marinha e do Quaternário pela Universidade Federal do Pará. Pesquisador Assistente da Coordenação de Ciências da Terra e Ecologia e do Programa de Estudos Costeiros do Museu Paraense Emílio Goeldi. Autor de diversos artigos científicos, capítulos de livros e resumos expandidos, no Brasil e exterior. Participação em eventos científicos nacionais e internacionais. Ecossistemas Costeiros: impactos e gestão ambiental 215
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