O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 199 do materialismo histórico de Marx, na medida em que reconhece o fenômeno do desenvolvimento como algo muito mais complexo do que, simplesmente uma conjuntura momentânea e atual (BRESSER-PEREIRA, 2020). Conforme Bresser-Pereira (2006), desenvolvimento econômico é o processo histórico que acontece nos países que realizam sua “revolução capitalista”. Nesta fase, existirá um grande acúmulo de capital, modernização no setor técnico, desembocando em um elevado nível de produtividade. Argumenta ainda que esse fenô‐ meno não será igual e uniforme em todos os setores, variando profundamente de acordo com a capacidade e estratégias de cada país em articular medidas e ferramentas para o alcance do desen‐ volvimento econômico. Em outra perspectiva, Cavalcanti (2009) aponta que entender desenvolvimento econômico associando este com o aumento do PIB per capita, incorre em aprovar o dogma de quanto maior o PIB melhor será a qualidade de vida de todos. Esta relação, para o autor, não merece prosperar, pois, ele entende ser o desenvolvi‐ mento muito mais amplo do que aspecto puramente econômico, precisando ser levado em consideração o nível de educação, saúde e de cultura que o estado é capaz de proporcionar aos indivíduos. Depreende-se, então, das acepções ora apresentadas acerca do desenvolvimento econômico que, este, ainda que percebido por alguns autores de modo mais abrangente, possui uma forte cono‐ tação estritamente financeira, de modo que seu propósito está intrinsecamente direcionado ao acúmulo de capital, ao aumento na produtividade e, portanto, aumento das riquezas dos países, não significando, pois, uma distribuição justa da produção entre os indivíduos. Por sua vez, o desenvolvimento sustentável é um conceito essen‐
200 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO cialmente distinto do econômico. Preleciona Sachs (2007) que a partir de 1972 ganha força o chamado ecodesenvolvimento, o qual seria um novo tipo de crescimento econômico levando em consideração a repartição qualitativa dos seus frutos e a preser‐ vação ambiental. Assim, o ecodesenvolvimento seria simultanea‐ mente um modelo que tinha como pilares o atendimento de necessidades fundamentais, promoção da autoconfiança das populações envolvidas e a produção pautada na prudência ecológica. Esse modelo denominado de ecodesenvolvimento foi discutido na Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambi‐ ente e Desenvolvimento, na Suécia. A partir desse conceito surge a ideia de desenvolvimento sustentável, cuja ideia principal é o enfoque na utilização dos recursos de modo capaz de suprir as necessidades humanas, sem, contudo, comprometer a possibili‐ dade de sobrevivência das gerações futuras. Conforme Buarque (2008), é importante entender que o desen‐ volvimento sustentável não é apenas uma ideia que está na moda, ou uma grande invenção das nações unidas, mas sim um modelo teórico pretenso a orientar as sociedades modernas para enfrentar os problemas da atualidade através de novos paradig‐ mas. É, na verdade, uma proposta viável, a qual é fruto do amadu‐ recimento dos estados acerca das questões sociais e ambientais pertinentes no mundo contemporâneo. Direito ao Desenvolvimento O direito ao desenvolvimento foi disciplinado pela primeira vez, em um documento formal, na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986. Segundo este diploma, este direito, é um direito inalienável e imprescindível, cujo todos os indivíduos e povos estão aptos a participar, contribuir e desfrutar do desen‐
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 201 volvimento econômico, cultural, social e político. Tem como fundamento a perspectiva de proporcionar o bem-estar da popu‐ lação e assegurar uma justa distribuição dos benefícios alcançados. Preleciona Mello (1993) que o direito ao desenvolvimento é pertencente à chamada terceira geração dos direitos do homem, também denominados direito da solidariedade, sendo em verdade a possibilidade de autodeterminação dos povos. Para este autor, é importante entender que não se pode confundir o direito do desenvolvimento com o direito ao desenvolvimento, o primeiro representa o conjunto normativo que visa a concreti‐ zação do segundo, se preocupando com formas de cooperação internacional e dos organismos internacionais. Por outro viés, Feitosa (2013) aponta que o direito do desenvolvi‐ mento está relacionado diretamente com o direito econômico, tendo como preocupação o incremento no âmbito das políticas públicas, internas ou externas, da fiscalidade, do investimento nacional e da regulação financeira; enquanto o direito ao desen‐ volvimento tem “relação” com os direitos humanos, estando incluídos nos direitos da solidariedade e perpassando apenas a faceta econômica. O direito ao desenvolvimento, também tratado como desenvolvi‐ mento sustentável, representa um elemento mais amplo de cres‐ cimento, na medida em que faz referência aos múltiplos elementos da vida humana, abarcando o meio bio-psico-econô‐ mico-social dos agentes sociais, ao passo que o crescimento estri‐ tamente econômico, referenciado por alguns como direito do desenvolvimento, está associado à geração de riqueza. Enquanto o desenvolvimento econômico deve buscar o social, este já contempla e orienta o desenvolvimento econômico, no sentido de garantia de direitos fundamentais individuais e sociais, nota‐
202 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO damente através da efetivação da dignidade da pessoa humana. Não se desconhece que a necessidade de capital e riqueza para efetivação de direitos, pois estes possuem custos para sua imple‐ mentação, todavia, o objetivo precípuo estatal não deve ser a geração de riqueza para ulterior repartição, mas justamente a concessão de direitos como mecanismo para construção e desen‐ volvimento de riqueza (HOLMES, SUSTEIN, 1999). Na atualidade, diante da necessidade da efetivação dos direitos humanos, é preferível pugnar pela ideia contida no direito ao desenvolvimento, visto que este tem por objetivo não apenas o crescimento econômico de uma sociedade, mas também uma visão macro através da qual é pleiteado a realização dos indiví‐ duos na esfera social, cultural e política. Isso não implica dizer que é preciso deixar de lado a busca por maiores níveis de produ‐ tividade, mas que a proposta deve ser mais ampla, a fim de atingir outros aspectos essenciais à vida humana. Outro aspecto que precisa ser analisado é que, em razão dos novos desafios enfrentados no século XXI, o direito ao desenvol‐ vimento precisa ter por parâmetro a sustentabilidade ambiental, não bastando somente a melhoria nas condições pessoais dos seres humanos. A tentativa de buscar um modelo de desenvolvi‐ mento que ultrapasse o viés puramente financeiro, precisa vir acompanhada dos sistemas de utilização moderada dos recursos naturais. Da mesma forma, é preciso que os proveitos resultantes desse novo modelo sejam melhor distribuídos entre os membros da sociedade, a fim de que as melhorias não sejam exclusivas de um grupo minoritário. Documentos Internacionais acerca do Desenvolvimento Sustentável - DS Segundo o relatório Nosso Futuro Comum, entende-se por
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 203 Desenvolvimento Sustentável – DS – aquele capaz de promover as necessidades essenciais dos seres humanos sem comprometer a capacidade de sobrevivência das gerações futuras. Sendo, pois, um processo através do qual a exploração dos recursos deve ser feita sem ultrapassar seu limite de disponibilidade (BRUTLAND, 1987). Corroborando com este documento é possível afirmar que o DS não propõe a erradicação do uso de recursos, mas sim priorizar a produção atendendo aos níveis de regeneração e crescimento natural dos recursos renováveis. No que tange à utilização dos recursos não renováveis, é preciso levar em consideração as tecnologias que minimizem o seu esgotamento, bem como a probabilidade de desenvolver substitutos para eles. Diante da necessidade da implementação de métodos em prol da sustentabilidade, organismos internacionais se propuseram a desenvolver modelos e recomendações de metas para alcançar esse objetivo. Dentre essas entidades é importante destacar a atuação da Organização das Nações Unidas (ONU), a Organi‐ zação para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e também o Programa das Nações Unidas para o meio ambiente (PNUMA), que é agência pertencente a ONU. O Brasil, por exemplo, é signatário do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, internalizado através do Decreto 591/1992, que reconhece em seu artigo 1º o dever de garantir desenvolvimento econômico, social e cultural, refor‐ çando que não se pode priorizar o econômico em detrimento das demais esferas, devendo cada Estado parte salvaguardar a garantia de liberdades e direitos fundamentais, nos termos do art. 6º. De acordo com Hulme (2009), em 2000 foram adotados os Obje‐ tivos de Desenvolvimento do Milênio – ODM – bem como a
204 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO declaração do milênio, documentos que surgiram mediante as discussões entre a cúpula da ONU e também da OCDE, durante o período pós-Guerra-Fria. Esses objetivos tinham como função primordial a adoção de metas para o desenvolvimento e a redução da pobreza, que deveriam ser alcançadas até 2015, com intuito de encorajar os países-membros a enfrentar os desafios sociais do século XXI. Foram oito os objetivos do milênio, a saber: erradicar a extrema pobreza e a fome; universalizar a educação primária; promover a igualdade entre os sexos e empoderar as mulheres; reduzir a mortalidade de crianças, combater o HIV/AIDS, malária e outras doenças; garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Essas metas foram a primeira formulação de medidas a nível global de políticas contributivas para nortear a ação dos governos pelo período de 15 anos. Nesta senda, após 2015, data prevista para serem alcançados os ODM, foi elaborada a agenda nacional da ONU 2030, na Confe‐ rência das Nações sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio + 20), cujas propostas estavam direcionadas a orientar a comunidade internacional nos anos seguintes em prol do DS. Dentre um dos aspectos mais relevantes deste documento estão os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os objetivos supracitados são uma espécie de reformulação dos antigos objetivos do Milênio, tendo em vista que, embora eles também terem surgindo para orientar os países na busca em prol do desenvolvimento sustentável, são responsáveis por elaborar metas mais amplas e, ao mesmo tempo, mais detalhadas que as do modelo anterior. Consoante Alves (2015), o desenvolvimento sustentável funciona mediante três premissas, são elas: a justiça social, a economia
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 205 inclusiva e o meio ambiente sustentável, ou seja, o conjunto dessas três perspectivas em um único modelo de cooperação e enfrentamento aos problemas sociais da atualidade. O referido autor aponta como ponto positivo dos ODS a ampla discussão e participação de governos, empresas e sociedade civil, diferente dos ODM que foram produto de pouco debate e engajamento da sociedade civil. Preleciona Gallo (2014) que a viabilidade da implementação desses objetivos depende de mecanismos de governança e estra‐ tégias de gestão que se utilizem de mecanismos aptos a produzir evidências de sua efetividade em relação ao desenvolvimento sustentável. Ademais, frisa que a programação da Agenda após 2015 significa um avanço comparando à Agenda do Milênio, possibilitando o surgimento de um modelo mais amplo, coopera‐ tivo e solidário de produção e organização social. Diante deste contexto, percebe-se que os ODS representam uma inovação no debate de sustentabilidade, não somente pelo fato de ser um documento discutido e delimitado em nível global, mas por estender os parâmetros definidos na Agenda do Milênio e funcionar como direcionamento para os estados e nações atuarem no combate aos novos problemas sociais, econômicos e ambientais do século XXI. No entanto, ainda é permanente as críticas na seara acadêmica sobre a extensão das metas, seu deta‐ lhamento superficial e a maneira de melhor aplicá-las. Nesta esteira, é importante entender que para adotar modelos sustentáveis é preciso ir além de definir metas e traçar o caminho para a sua consecução. Logo, é peremptório que os estados, a sociedade civil, as empresas e os organismos internacionais estejam engajados em realmente garantir a sua efetividade e monitorar uns aos outros quanto à observância coletiva dos obje‐ tivos definidos.
206 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO A CONTRIBUIÇÃO FURTADIANA PARA CONSTRUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL A utilização do economista Celso Furtado atrelando-o às ideias e perspectivas do desenvolvimento sustentável se justifica pelo fato de, apesar, dele não ter se debruçado de forma expressa sobre o tema, já trabalhava com parâmetros que em muito se assemelham a atual discussão de produção pautada na utilização dos recursos de forma ponderada. Ademais, em muitas obras suas o autor suscita a necessidade de uma divisão mais justa e equitativa das riquezas produzidas, especialmente, nos países que ele chamada de periferia, ou dependentes. Furtado (1974) debatia sobre a insuficiência do desenvolvimento econômico da época, ainda que não utilizasse os termos ora apre‐ sentados. Na sua ótica, caso este desenvolvimento chegasse efeti‐ vamente ao seu ápice e universalização, a pressão sobre os recursos não renováveis e a extrema poluição ambiental seriam tão expressivos que desembocariam no eventual colapso da economia mundial. Através dessas ideias é perceptível que este autor já compartilhava de noções de desenvolvimento sustentável ainda que não o fizesse de forma explícita em suas obras. Para Cavalcanti (2009), Celso Furtado em seu livro “O mito do desenvolvimento econômico” sugere duas questões, as quais não foram esmiuçadamente retratadas em suas demais obras, são elas: os impactos do processo econômico no meio físico da natureza e o caráter de mito do desenvolvimento moderno. Contudo, é quanto à primeira questão que existe uma relação intrínseca com as ideias de ecologia do meio produtivo, apontando para a impor‐ tância do viés de sustentabilidade nas novas formas de atuação da economia contemporânea.
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 207 Quanto à segunda característica, a saber: o mito do desenvolvi‐ mento moderno, tem razão de ser em uma fase mais madura deste economista. Nesse momento, ele vai chegar à conclusão crítica que a industrialização única e isolada não é suficiente para a situação de dependência dos países periféricos, uma vez que para ele o subdesenvolvimento não é um processo necessário precedente do desenvolvimento, mas sim um estágio autônomo (MATTEO et al, 2013). Para Celso Furtado e também autores da Escola Cepalina como Raul Prebisch, a dicotomia entre desenvol‐ vidos e subdesenvolvidos não deveria persistir, na medida em que há uma pluralidade de valores e complexidades que não são abar‐ cadas em um contexto simplório de desenvolvimento/subdesen‐ volvimento (FURTADO, 2009; MENDES; MATTEO 2011) Nesta esteira, segundo Vieira (2009), a perspectiva furtadiana considera que para ocorrer o desenvolvimento de fato é preciso ocorrer uma intervenção estatal, tendo em vista as noções depen‐ dentes precisarão de projetos diferenciados e específicos para atender as suas necessidades básicas. Este processo seria viabili‐ zado mediante ações coordenadas do estado que tivessem enfoque no crescimento de longo prazo. O pensamento de Furtado sobre a necessidade de uma atuação do estado para tornar possível o desenvolvimento das economias periféricas se aproxima das ideias do economista inglês John Keynes, uma de suas influências. Isso porque Keynes (1996) entendia que a mecânica dos mercados não era capaz de regular sozinha a economia, precisando, portanto, da atuação estatal para assegurar por meio de políticas fiscais o pleno emprego, condi‐ ções de vida mais equitativas e reduções na inflação. Portanto, depreende-se que Furtado contribuiu para o amadure‐ cimento do pensamento moderno sobre um tipo de desenvolvi‐ mento cujo enfoque não seja puramente o crescimento
208 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO econômico, como pensavam alguns autores clássicos, mas sim uma busca por ascensão das sociedades periféricas, melhorias no nível de vida das pessoas, assim como utilização mais cautelosa dos recursos naturais. Todos esses objetivos para serem alcan‐ çados precisariam não só da industrialização, mas também da atuação estatal por meio de políticas coordenadas. Armatya sen (2010), corroborando o pensamento de Furtado, defende que o desenvolvimento só se concretiza a partir do desenvolvimento das liberdades substantivas, de modo que a riqueza e o crescimento econômico não são fins em si mesmo, mas meios para efetivação da potencialidade humana (FUR‐ TADO, 1984). Desta forma, Celso Furtado defendia a expansão das potencialidades humanas através do desenvolvimento, ao passo que Sen, com a mesma proposta, defende o alargamento das capacidades humanas em que ambas as propostas apontam, em essência, para a promoção das dimensões humanas e sociais (SOUZA et al, 2009). Sen (2010) argumenta que as liberdades são o instrumento e também a finalidade primordial do desenvolvimento. Isso porque, para alcançá-lo, o autor argumenta que é preciso superar as barreiras que impedem a expansão das liberdades, como é o caso da pobreza, tirania, negligência de serviços públicos, estados autoritários, dentre outros. Nesta senda, ele sustenta que para existir um desenvolvimento efetivo precisa haver o fortalecimento dos sistemas democráticos, sendo relevante nesse ponto a atuação proporcionada pelos direitos civis e liberdades políticas. Sendo assim, menciona a importância do debate púbico não apenas como uma das caracte‐ rísticas da democracia, mas também como uma das formas de fazer com que esta tenha um melhor desempenho. Esse modelo proposto pelo autor, sempre pautado no poder
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 209 argumentativo da razão, também guarda relações com a ideia de desenvolvimento sustentável. Isso porque as discussões sobre como aplicar esse modelo apenas podem ser frutíferas se exis‐ tirem espaços democráticos que permitam o diálogo, exposição de ideias divergentes e convergentes, para ao final existir um consenso. Por sua vez, Sen (2011) já se posicionava sobre as questões ambi‐ entais e a frequente deterioração do meio natural, pontuando a gravidade do problema. Ademais, também tecia comentários sobre a ausência de maturidade da humanidade, tendo em vista a despreocupação em cuidar do meio ambiente e da sustentabili‐ dade da vida, desprezando, assim, os interesses das gerações futuras. Desta forma, apesar das formações como economistas, os estudos de Furtado e Sen apenas reforçam que desenvolvimento susten‐ tável e a efetivação do direito ao desenvolvimento exigem a promoção dos direitos humanos. O fenômeno restrito às rique‐ zas, por si só, não tem o condão de promover direitos sociais e a promoção quali-quantitativa de direitos, de modo que se torna apenas a sua observância reduzida a uma única faceta dentre as múltiplas que compõem a realidade e vida humana. A NECESSIDADE DO ESTADO PARA EFETIVAÇÃO DO DIREITO AO DESENVOLVIMENTO A promoção de direitos sociais e de todas as potencialidades humanas defendidas por Furtado e Sen perpassa pela existência de um Estado com uma função gerencial e alocativa dos recursos, de modo a satisfazer o interesse coletivo. Os agentes econômicos como as empresas, por exemplo, possuem perspectivas individua‐ listas de geração de riqueza, de modo que não se pode conceber o desenvolvimento sustentável dissociado da atuação estatal.
210 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO Sobre o tema, Hardin (1968) já destacava que se todos os agentes econômicos atuassem de forma individual sem um ente para promover a gestão das atuações, teríamos a tragédia dos comuns, ou seja, o pensamento individualista, ainda que racional, quando analisado sob uma perspectiva global geraria uma crise social. Desta forma, como os particulares possuem interesses diversos e, por vezes, conflitantes, a atuação gerencial do Estado deve ser aplicada a partir de uma macrovisão de gestão das potenciali‐ dades humanas com enfoque no desenvolvimento e não apenas em uma política desenvolvimentista (crescimento econômico). Apenas o Estado teria o condão de promover a atuação voltada para o desenvolvimento, processo este caracterizado como um “processo plural de recuperação de capacidades com vistas à distribuição das riquezas, oportunizando metas de solidariedade social e sustentabilidade ambiental” (FRANCO; FEITOSA, 2013, p. 97). A própria nomeação de Celso Furtado para o cargo de ministro do Planejamento a partir da criação do órgão em 1962 apenas reforça o papel do Estado na condução da política (SILVA, 2013). Em verdade, o planejamento estatal seria necessário para romper quadros de dependências e assimetrias existentes, além de garantir um aproveitamento racional de recursos públicos (FUR‐ TADO, 2007). A criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), já em 1959 por Juscelino Kubitschek, e Superinten‐ dência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), em 1966, e a Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sude‐ co), em 1967, respectivamente, destacam que o planejamento para rompimento de ciclos viciosos e reconstrução de novas perspectivas e prognósticos econômicos demandam a atuação do Estado.
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 211 A coordenação estatal para industrialização, geração de riqueza e efetivação de direitos sociais é medida imperiosa, posto que os países periféricos só conseguirão romper a barreira imposta pelos países centrais, seguindo o caminho da industrialização e este demanda a coordenação estatal (MATTEO et al, 2013) Nesta senda, a coordenação estatal se reporta a efetivação do direito ao desenvolvimento, sendo este compreendido como um direito de 4ª geração, pautado no bem-estar coletivo, promoção de direitos humanos, paz e a promoção de igualdade de oportuni‐ dades e garantia aos recursos básicos (BEDIN, 2003). Dentro dessa perspectiva, o Estado promove sua função geren‐ cial, alocativa, distributiva e estabilizadora da Economia e do Desenvolvimento, este não restrito ao cenário econômico, mas utilizando a Economia para promoção das potencialidades e direitos humanos. Ou seja, para Celso Furtado, o desenvolvimento perpassa pelo tempo, considerando a necessidade de romper com parâmetros histórico-sociais, além da necessidade de decisão de como alocar o excedente social no tempo, espaço e setores produtivos (BRAN‐ DÃO, 2020). Como bem destacam Sousa, Theis e Barbosa (2020), o desenvol‐ vimento proposto por Furtado não está assentado em fórmulas mágicas ou projetos gênios extraordinários, mas no planeja‐ mento, arranjos institucionais e burocráticos coordenados com o enfoque na promoção das potencialidades humanas e sociais. Assim, apesar de supostamente as ideias furtadianas datarem o início da segunda metade do século XX, tem-se que o dever de coordenação e planejamento estatal considerando particulari‐ dades regionais permanecem aplicáveis até hoje. O próprio enfrentamento da pandemia da COVID-19, tão em voga na
212 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO contemporaneidade, demonstra que o Estado é fundamental para a construção de políticas públicas. Outrossim, Furtado observa o desenvolvimento não é aquele que promove mero crescimento econômico, na medida em que o desenvolvimento está relacionado à qualidade da promoção dos direitos, enquanto que o crescimento/direito do desenvolvi‐ mento está restrito ao mero crescimento quantitativo de riqueza. O direito ao desenvolvimento / desenvolvimento sustentável que foi inicialmente concebido a partir dos fundamentos furtadianos, converteu-se, em verdade, em um direito humano fundamental ao exigir que o Estado não pode conceber o fenômeno econô‐ mico como um fim em si mesmo, mas a Economia como um instrumento para promoção das potencialidades e direitos humanos. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento, por muito tempo, foi encarado como a potencialidade de produzir e acumular riquezas, em certa medida, baseado em valores do metalismo. A sociedade entendia que a divisão do mundo em subdesenvolvido e desenvolvido. Desta forma, a expressão “países em desenvolvimento” demons‐ trava que tudo representaria uma etapa consequencial para alcançar o desenvolvimento. Celso Furtado, desconstruindo dogmas anteriormente defen‐ didos pela Teoria Econômica, demonstrou que o desenvolvi‐ mento não tem como pressuposto o subdesenvolvimento e que a condição de país periférico ou central está associada à existência de valores e contextos sociais e históricos que influenciaram na relação. Ademais, o próprio status de país desenvolvido não está intrinse‐
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 213 camente ligado ao desenvolvimento, na medida em que este está relacionado à satisfação das potencialidades humanas e sociais por intermédio de um Estado forte e dirigente, ao passo que o crescimento econômico, via de regra, associado aos países desen‐ volvidos está correlacionado ao potencial de produzir/gerar riqueza. A riqueza, apesar de ser um dos aspectos a serem considerados, na medida em que direitos tem custos, não é um aspecto isolado do desenvolvimento, posto que de nada adianta a geração de riqueza se os direitos humanos e sociais são negligenciados. Celso Furtado, desta forma, propôs uma reforma do pensamento econômico, administrativo e jurídico, posto que os novos docu‐ mentos internacionais já contemplam o desenvolvimento não sob uma perspectiva estritamente materialista, mas, sobretudo, na construção e consolidação de direitos humanos e fundamentais. Dado a necessidade de uma macrovisão de alocação de recursos e de promoção do bem-estar social, Celso Furtado defende o poder de gestão e planejamento do Estado como mecanismo de promoção do desenvolvimento, na medida em que apenas a mão invisível não teria condições de implementar as mudanças neces‐ sárias para rompimento da circunstância histórica-fática de centro-periferia. REFERÊNCIAS ALVES, José Eustáquio Diniz. Os 70 anos da ONU e a agenda global para o segundo quadriênio (2015-2030) do século XXI. Revista Brasileira de Estudos de População, v. 32, n. 3. p. 587- 598, set. /dez., 2015. BEDIN, Gilmar Antonio. Direitos humanos e desenvolvimento. Algumas reflexões sobre a constituição do direito ao desenvolvi‐
214 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO mento. Desenvolvimento em questão, v. 1, n. 1, p. 123-149, 2003. BRANDÃO, Carlos Antônio. Celso Furtado e o processo de desenvolvimento-subdesenvolvido visto da periferia: estruturas, decisões e estratégias. In: SOUSA, Cidoval Morais de; THEIS, Ivo Marcos; BARBOSA, José Luciano Albino (org.). Celso Furtado: a esperança militante. vol. 1. Campina Grande: EDUEPB, 2020. p.171-193 BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos Pereira. O conceito histórico de desenvolvimento econômico. Texto para discussão. São Paulo: Escola de Economia. 2006. BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Método e paixão em Celso Furtado. In: In: SOUSA, Cidoval Morais de; THEIS, Ivo Marcos; BARBOSA, José Luciano Albino (org.). Celso Furtado: a espe‐ rança militante. vol. 1. Campina Grande: EDUEPB, 2020. p. 85-113 BRUTLAND, Gro Harlem. World Comission on Enviroment and Development. Our Common Future. Oxford: Oxford University Press, 1987. BUARQUE, Sérgio C. Construindo o desenvolvimento local sustentável: metodologia de planejamento. Rio de Janeiro: Gara‐ mond, 2008. CAVALCANTI, Clovis. Crescimento econômico, desenvolvi‐ mento e ecologia: uma construção a partir de Celso Furtado. Rio de Janeiro: Contraponto, 2009. FEITOSA, Maria Luiza Alencar Mayer Feitosa. Exclusão Social e Pobreza nas interfaces entre o Direito Econômico do Desenvol‐ vimento e o Direito Humano ao Desenvolvimento. In: SILVEIRA,
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 215 Vladmir Oliveria; SANCHES, Samyra Naspolini; COUTO, Monica Benetti. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI. Brasília: Ipea: CONPEDI, 2013. 200 p. FRANCO, Fernanda Cristina de Oliveira; FEITOSA, Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer. Desenvolvimento e direitos humanos: marcas de inconstitucionalidade no processo Belo Monte. Revista Direito GV, v. 9, n. 1, p. 93-114, 2013. FURTADO, Celso. Desenvolvimento e subdesenvolvimento. 5. ed. Rio de Janeiro: Contratempo, 2009. FURTADO, Celso. El desarrollo como proceso endógeno. Ola Financiera, v. 4, n. 8, p. 170-193, 1984. FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 34ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007 FURTADO, Celso. O mito do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974. GALLO, Eduardo. Território, intersetorialidade e escalas: requi‐ sitos para a efetividade dos objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Ciência Saúde Coletiva, v. 19, n. 11, p. 4383-4396, 2014. HARDIN, Garrett. The tragedy of the commons. Science, v. 162, n. 3859, p. 1243-1248, 1968. HOLMES, Stephen; SUSTEIN, Cass R. The Cost of Rights: Why liberty depends on taxes. New York: W.W. Norton, 1999 HULME, David. The Millennium Development Goals (MDGs). Manchester: Brooks World Poverty Institute, 2009.
216 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO KEYNES, John Maynard Keynes. A teoria geral do empego, do juro e da moeda. Trad. de: Mário R. da Cruz. São Paulo: Nova Cultural, 1996. Original Inglês. MATTEO, Miguel et al. O Brasil em perspectiva territorial: regi‐ onalizações como uma estratégia do desenvolvimento emergente. In: BOUERI, Rogério; COSTA, Marco Aurélio. Brasil em desen‐ volvimento 2013: estado, planejamento e políticas públicas. Brasilia: IPEA, 2013. p. 49-87 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Econômico. 9. ed. Renovar: Rio de Janeiro, 1993. MENDES, C. C.; MATTEO, M. Formação e evolução do planeja‐ mento regional no Brasil. CRUZ, Bruno de Oliveira et al. Economia regional e urbana: teorias e métodos com ênfase no Brasil. Brasília: Ipea, 2011. p. 261-280 SACHS, Ignacy. Rumo à Ecossocioeconomia: teoria e prática do desenvolvimento. São Paulo: Cortez, 2007. SEN, Amartya. A ideia de justiça. São Paulo: Companhia das Letras, 2011. SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. SILVA, Sandro Pereira. Considerações analíticas e operacionais sobre a abordagem territorial em políticas públicas. In: BOUERI, Rogério; COSTA, Marco Aurélio. Brasil em desenvolvimento 2013 : estado, planejamento e políticas públicas. Brasilia: IPEA, 2013. p. 89-116 SILVEIRA, Vladmir Oliveria; SANCHES, Samyra Naspolini; COUTO, Monica Benetti. Direito e desenvolvimento no Brasil do século XXI. Brasília: Ipea: CONPEDI, 2013. 200 p.
O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO SOB A PERSPECTIV… | 217 SOUSA, Cidoval Morais de; THEIS, Ivo Marcos; BARBOSA, José Luciano Albino. Celso Furtado: um militante da esperança. In: SOUSA, Cidoval Morais de; THEIS, Ivo Marcos; BARBOSA, José Luciano Albino (org.). Celso Furtado: a esperança militante. vol. 1. Campina Grande: EDUEPB, 2020. p. 17-34 SOUZA, Dellany Maria Dantas et al. O desenvolvimento como alargamento das capacidades humanas: aproximações entre Amartya Sen e Celso Furtado. Revista Brasileira de Desenvolvi‐ mento Regional, v. 2, n. 2, p. 047-058, 2015. VIEIRA, Rosele Marques. Desenvolvimento, subdesenvolvi‐ mento e dependência: uma discussão na visão de Celso Furtado e Fernando Henrique Cardoso. VIII Congresso Brasileiro de História Econômica e 9ª Conferência Internacional de História de Empresas, Campinas/2009.
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO: ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO DEPENDENTE NA PERIFERIA DO CAPITALISMO VINÍCIUS VASCONCELOS BRONZEADO; NADINE GUALBERTO AGRA INTRODUÇÃO ESTE ARTIGO É RESULTADO DE UM LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO em que se pretende investigar a regressividade da tributação e do financiamento do fundo público no Brasil do ponto de vista do seu impacto sobre o fundo de consumo da classe trabalhadora. Quanto à tipologia de pesquisa (MEDEIROS, 2017), trata-se de uma pesquisa de nível descritivo, em que se adotou como proce‐ dimento básico o levantamento bibliográfico, além da consulta a dados consolidados acerca da carga tributária brasileira. O método de exposição adotado é o método dedutivo. Parte-se do referencial teórico da Teoria Marxista da Dependên‐ cia, segundo o qual o traço distintivo do desenvolvimento econô‐ mico nas economias dependentes seria a reprodução de uma forma específica de acumulação capitalista baseada na superex‐ ploração da força de trabalho (MARINI, 2017). A superexplo‐ ração seria a maneira de economias dependentes, com capitais
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 219 menos produtivos, intensificarem a produção de excedentes e aumentarem a taxa de mais valia, refreando a tendência geral à queda na taxa de lucro inerente ao modo de produção capitalista. Desse modo, assegura-se, ao mesmo tempo, a remessa de riquezas produzidas na periferia em direção a países centrais e mais desenvolvidos, e um certo grau de acumulação capitalista nas próprias periferias. O desenvolvimento capitalista depen‐ dente em economias do eixo periférico do sistema é compreen‐ dido, portanto, em sua funcionalidade para as nações mais avançadas e para a lógica geral de reprodução ampliada do capital. Após esta introdução, a próxima seção do texto descreve a supe‐ rexploração da força de trabalho e o intercâmbio desigual enquanto fenômenos associados à concorrência intercapitalista. A seção seguinte investiga quais segmentos sociais arcam com o peso da carga tributária no Brasil, tratando, portanto, da regressi‐ vidade da tributação. Logo após, recorremos à noção de fundo público (COSTA, 2017) enquanto mediação que permite investigar como, partindo-se de uma tributação regressiva, opera-se uma transferência de renda e riqueza entre segmentos sociais com interesses antagônicos. Por fim, a última seção traz as considera‐ ções finais. DESENVOLVIMENTO Superexploração da força de trabalho e intercâmbio desigual Para Marx (1989), o grau exato da exploração da força de trabalho é expresso pela relação entre trabalho excedente e trabalho necessário, o que corresponde à própria taxa de mais valia (LOPES, 2013). Marx (1989, p. 241–242) define como “tempo de trabalho necessário” o tempo gasto pelo trabalhador, na produção, para repor o valor do seu salário. Paralelamente, o
220 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO “tempo de trabalho excedente” é aquele período restante da jornada de trabalho em que o trabalhador cria mais valor do que o necessário para repor o seu salário, é a origem da mais valia. Desse modo, [...] dado o capital variável [salário], quanto maior a mais- valia produzida pela força de trabalho comprada por esse capital, maior será a taxa de exploração dos trabalhadores por ele empregados. Por outro lado, se a mais-valia produ‐ zida é dada, quanto menor for o capital variável adiantado, maior o grau de exploração ao qual os trabalhadores estarão submetidos (NASCIMENTO; DILLENBURG; SOBRAL, 2013, p. 111). Dito isso, como pode, então, o capitalista fazer variar a taxa de mais valia, ou seja, alterar as proporções entre o mais valor criado e o salário pago ao trabalhador, entre o trabalho excedente e o trabalho necessário? Essa variação decorre do emprego das dife‐ rentes formas de exploração do trabalho e, portanto, de produção da mais-valia. Conforme nos lembra Nascimento, Dillenburg e Sobral, (2012, p. 1), Marx (1989) analisa em detalhes, no Livro 1 d’O Capital, os mecanismos utilizados pelo capital para incre‐ mentar a extração de mais valia. Seriam eles i) o prolongamento da jornada de trabalho, em que se amplia o tempo que o traba‐ lhador dispende no local de trabalho executando suas atividades e, consequentemente, a quantidade de trabalho excedente sobre trabalho necessário; ii) a intensificação do trabalho, ou seja, o “aumento da quantidade de mercadorias produzidas no mesmo tempo mediante aumento do dispêndio de energia do trabalha‐ dor” (NASCIMENTO; DILLENBURG; SOBRAL, 2012, p. 1); iii)
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 221 a redução do consumo do operário além do seu limite normal (MARINI, 2017, p. 333), que Osório (2013, p. 65) define como a “apropriação do fundo de consumo do trabalhador para convertê-lo em fundo de acumulação de capital”; iv) por fim, o aumento da produtividade do trabalho, isto é, o aumento da capacidade produtiva em decorrência do progresso técnico e da introdução de novas tecnologias. Os três primeiros mecanismos citados configuram formas de superexploração da força de trabalho, analisadas por Marx. Consistem, conforme definição de Araujo (2015, p. 589, grifo do autor), no “pagamento de um salário inferior ao valor da força de trabalho” e, portanto, ainda segundo o autor, numa “particular configuração da relação capitalista na qual o preço da força de trabalho situa-se, em média, abaixo do seu valor” (2015, p. 589). Segundo Jaime Osório (2013, p. 63, grifo do autor), os meca‐ nismos de superexploração da força de trabalho são formas parti‐ culares de exploração em que “se viola o valor da força de trabalho”. Marini (2017, p. 334) explica porque aqueles três mecanismos implicam nessa violação:
222 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO [...] nos três mecanismos considerados, a característica essen‐ cial está dada pelo fato de que são negadas ao trabalhador as condições necessárias para repor o desgaste de sua força de trabalho: nos dois primeiros casos [i e ii acima], porque lhe é obrigado um dispêndio de força de trabalho superior ao que deveria proporcionar normalmente, provocando assim seu esgotamento prematuro; no último [iii acima], porque lhe é retirada inclusive a possibilidade de consumo do estrita‐ mente indispensável para conservar sua força de trabalho em estado normal. Em termos capitalistas, esses mecanismos (que ademais podem se apresentar, e normalmente se apre‐ sentam, de forma combinada) significam que o trabalho é remunerado abaixo de seu valor e correspondem, portanto, a uma superexploração do trabalho. O último mecanismo de incremento da taxa de mais-valia menci‐ onado, o aumento da produtividade do trabalho, decorrente do aprimoramento sistemático das forças produtivas, não configura superexploração, conforme Araujo (2015, p. 589). Segundo ele, “o aumento da mais-valia decorre, nesse caso, da redução do tempo de trabalho necessário, vale dizer, da redução do valor da força de trabalho” (2015, p. 589). Corresponde, portanto, à forma de produção da mais valia relativa, em que a taxa de mais valia aumenta não em razão do prolongamento do tempo de trabalho excedente, mas em razão da redução do valor da força de traba‐ lho. Esse fato é reconhecido claramente por Jaime Osório (2013, p. 63), que afirma que “o aumento da produtividade em setores produtores de bens-salário [que implica na redução do valor da força de trabalho] (sem aumento simultâneo de intensidade) constitui uma forma de aumentar a taxa de mais-valia sem cons‐ tituir uma forma de superexploração”. Ao contrário, os três
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 223 primeiros mecanismos de incremento da exploração relacionam- se com o prolongamento forçado e não recompensado1 do tempo de trabalho excedente, em que o capital variável (salário efetivamente pago para viabilizar o processo de produção) desrespeita o valor da força de trabalho. Já se conhece, agora, as formas que o capital possui de fazer variar positivamente a taxa de mais valia, ou seja, alterar as proporções entre o mais valor criado e o salário pago ao traba‐ lhador, entre o trabalho excedente e o trabalho necessário, como descrito acima. No que diz respeito à mais valia relativa, resta, ainda, esclarecer como é possível promover esse incremento do grau de exploração e da taxa de mais valia por meio da redução do valor da força de trabalho sabendo-se que, nesse caso, o incre‐ mento não provém do pagamento de um salário abaixo do real valor da força de trabalho, mas pelo próprio rebaixamento desse valor, isto é, pela redução do tempo de trabalho necessário (NAS‐ CIMENTO; DILLENBURG; SOBRAL, 2013, p. 115-116). Isso só ocorreria de forma consolidada, conforme relembrado por Nascimento, Dillenburg e Sobral (2013, p. 116), a partir do desenvolvimentos das “forças produtivas dos setores produtores de artigos que compõem o valor da força de trabalho, reduzindo assim os valores daqueles artigos e, consequentemente, o valor da própria força de trabalho.” Conforme Paulo Gala (2017, p. 100), o Brasil enfrenta atualmente um processo de relevante desindustrialização e reprimarização da pauta exportadora, com destaque para a exportação de commo‐ dities, de modo que, em 2014, 50% do total das exportações brasi‐ leiras consistiu em um mix de ferro, soja, açúcar, petróleo e carnes. O país tem aprofundado sua especialização produtiva pautada na “exploração estática das vantagens comparativas exis‐ tentes, especialmente nos setores com retornos decrescentes de escala, como o extrativismo em geral, [que] não promove o desen‐
224 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO volvimento” (GALA, 2017, p. 126). Do ponto de vista histórico, Jaime Osório (2013, p. 64) relembra que, nos meados do século XIX, já se estabelecera uma clara divisão internacional do traba‐ lho, em que algumas nações atuam “como produtoras de maté‐ rias-primas e alimentos e compradoras de bens manufaturados, e outras como produtoras de bens industriais” (OSÓRIO, 2013, p. 64). Segundo Osório, Esse processo permite uma guinada importante nas econo‐ mias centrais, que passam da mais-valia absoluta como forma predominante para uma economia sustentada na mais-valia relativa. O abastecimento de alimentos e maté‐ rias-primas da América Latina para tais economias teve nesta guinada um papel fundamental, ao reduzir os preços dos bens-salários, o que tornou factível a redução do tempo de trabalho necessário e permitiu “liberar”, por sua vez, uma faixa da força de trabalho nas economias indus‐ triais dos trabalhos agrícolas, para se dedicar à produção manufatureira. (OSÓRIO, p. 64, grifo nosso). Qual motivo levaria, pois, diferentes capitais a lançarem mão dos mecanismos de superexploração da força de trabalho? De acordo com Nascimento, Dillenburg e Sobral (2013, p. 116-117), para Marx, esse motivo seria a concorrência entre capitais e a dispari‐ dade das composições técnicas e níveis de produtividade desses capitais2. Por meio da concorrência entre capitais individuais de composição técnica distintas, opera uma transferência de valor entre esses capitais. Segundo os autores (2013, p. 116-117), isso decorre do aumento da produtividade do trabalho, ou seja, da introdução de alguma inovação técnica no processo produtivo de determinados capitais, responsável por elevar a quantidade de
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 225 mercadorias produzidas ali no mesmo período de tempo. Dessa forma, o valor individual incorporado a cada mercadoria produ‐ zida é reduzido, pois menos tempo de trabalho faz-se necessário para produzi-las. Ao serem lançadas no mercado mercadorias que incorporam valor menor que o “valor social médio dos mesmos bens produzidos por outros capitalistas” (NASCI‐ MENTO; DILLENBURG; SOBRAL, 2013, p. 116), aquele capital mais inovador se apropria de uma mais valia extraordinária, criada, originalmente, por um capital que “não detêm ainda o mesmo nível técnico de produção daquele” (2013, p. 116). Da mesma maneira, Marini (2017, p. 329) esclarece que [...] ao aumentar a produtividade, o trabalhador só cria mais produtos no mesmo tempo, mas não mais valor; é justa‐ mente esse fato o que leva o capitalista individual a procurar o aumento de produtividade, já que isso permite reduzir o valor individual de sua mercadoria, em relação ao valor que as condições gerais de produção lhe atribuem, obtendo assim uma mais-valia superior à de seus competidores — ou seja, uma mais-valia extraordinária. Marini (2017, p. 331) sugere que, por possuir capitais individuais de maior produtividade, uma nação pode vender suas mercado‐ rias abaixo do valor social médio dos mesmos bens produzidos por outras nações. Para Marini (2017, p. 331), “isso se expressa, para a nação favorecida, em um lucro extraordinário, similar ao que constatamos ao examinar de que maneira os capitais indivi‐ duais se apropriam do fruto da produtividade do trabalho”. Em seguida, Marini (2017) procura apontar a diferença existente entre as transferências intrassetoriais e as transferências interse‐ toriais de valor. Afirma que
226 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO Teoricamente, o intercâmbio de mercadorias expressa a troca de equivalentes, cujo valor se determina pela quanti‐ dade de trabalho socialmente necessário que as mercadorias incorporam. Na prática, observam-se diferentes meca‐ nismos que permitem realizar transferências de valor, passando por cima das leis da troca, e que se expressam na forma como se fixam os preços de mercado e os preços de produção das mercadorias (2017, p. 331, grifo nosso). Referindo-se à concorrência intrassetorial (dentro de um mesmo setor produtivo) e à concorrência intersetorial (entre setores que produzem diferentes bens), sugere que “no primeiro caso, as transferências correspondem a aplicações específicas das leis de troca [obtenções de mais valia extraordinária por capitais mais produtivos]; no segundo, adotam mais abertamente o caráter de transgressão delas” (MARINI, 2017, p. 331, grifo nosso). Ou seja, na concorrência internacional entre setores distintos, quando uma nação e seus respectivos capitais produzem mercadorias que outras não conseguem produzir, dada a disparidade de produtivi‐ dade entre esses capitais, isso permite que as nações mais avançadas...
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 227 [...] iludam a lei do valor, isto é, vendam seus produtos a preços superiores a seu valor, configurando assim uma troca desigual. Isso implica que as nações desfavorecidas devem ceder gratuitamente parte do valor que produzem, e que essa cessão ou transferência seja acentuada em favor daquele país que lhes venda mercadorias a um preço de produção mais baixo, em virtude de sua maior produtividade (MARINI, 2017, p. 332). Explica-se, então, que Objetivamente, o que ocorre é que as economias depen‐ dentes acabam se especializando na produção de mercado‐ rias com menor avanço tecnológico (dependência tecnológica)3 e, portanto, estão sujeitas, dada a lei tendencial de igualação das taxas de lucro, a esse tipo de transferência de valor em direção aos países centrais (AMARAL; CARCA‐ NHOLO, 2009, p. 220). Dessa maneira, Marini (2017, p. 332) e a tradição marxista da dependência sugerem, fundamentando-se no que já fora demons‐ trado por Marx, que “frente a esses mecanismos de transferência de valor, baseados seja na produtividade, seja no monopólio de produção [de certos bens], podemos identificar [...] um meca‐ nismo de compensação”: a adoção da superexploração da força de trabalho como forma de criar mais excedentes e compensar aqueles valores perdidos para os capitais mais produtivos.
228 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO Sabe-se que a tributação no Brasil é regressiva, isto é, recai predominantemente sobre o consumo e a renda dos assalariados - seja diretamente ou por meio da repercussão do ônus dos tributos recolhidos pelas empresas, que são embutidos no preço de venda dos bens e serviços comercializados. A regressividade da tributação relaciona-se, portanto, com a equação das bases de incidência tributária e com a repercussão direta ou indireta do encargo financeiro. Quanto à repercussão, a incidência dos tributos pode ser classifi‐ cada em direta e indireta. Na incidência direta, aquele que recolhe o tributo é quem efetivamente arca com ônus financeiro da tributação. Na incidência indireta, por outro lado, há um indí‐ viduo que recolhe o tributo (contribuinte de direito) mas é um terceiro (contribuinte de fato) que, no final das contas, paga por ele. (DIEESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011, p. 10). Isso é possível porque, na incidência indireta, “o encargo acaba repercutindo na cadeia produtiva através do sistema de preços, que embute tal valor como custo do bem ou serviço, onerando ao final pessoa diversa daquela legalmente responsável por recolher o montante” (D’ARAÚJO, 2015, p. 44). Ao contrário, “tributos diretos são aqueles para os quais existe uma forte correlação entre a inci‐ dência jurídica e a incidência de fato. Em outras palavras, os indi‐ víduos inicialmente onerados não são capazes de repassar o ônus a terceiros” (SANTOS, 2014, p. 15). Sabe-se que a incidência do tributo terá efeitos regressivos se todos pagarem o mesmo valor independentemente dos diferentes graus de capacidade contributiva. É o que ocorre, por exemplo, na tributação sobre o consumo, em que, na compra de uma cesta básica, é comum que um indivíduo milionário e uma pessoa paupérrima paguem a mesma quantidade de tributos. Destaque- se que quanto mais indireta for a tributação, menor será a sensi‐ bilidade à diferença entre graus de capacidade contributiva, uma
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 229 vez que perde-se a correlação entre a incidência jurídica e a inci‐ dência de fato, como apontado acima. Isto é, passam a ser indife‐ rentes as particularidades de cada contribuinte sobre o qual recai de fato o ônus tributário. Nesse sentido, “impostos indiretos são regressivos porque fazem com que cidadãos de baixa e de alta renda paguem igual imposto quando consomem o mesmo produto” (DIEESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011, p. 14). Sabendo-se que “em um regime tributário e fiscal ideal, quem tem mais renda deve pagar mais” (DIEESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011, p. 12), cabe lembrar que a progressividade ou regressivi‐ dade geral de um sistema tributário pode ser apreendida, dentre outras formas, pela investigação da equação das bases de inci‐ dência tributária. É a partir da análise da distribuição da carga tributária entre as diversas bases de incidência que se pode perceber quem a sociedade escolhe para arcar com o ônus tribu‐ tário e quais finalidades se pretende alcançar com a tributação (D’ARAÚJO, 2015, p. 34). Aponta-se que as principais bases de incidência tributária são o consumo, a folha de salários, a renda e o patrimônio (DIEESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011). As bases que mais contribuiriam para a promoção da justiça fiscal seriam a renda e o patrimônio (DIEESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011, p. 11). Não por acaso, tratam-se de fatos geradores (auferir renda e possuir patrimônio) que permitem uma incidência direta, em razão de uma forte correlação entre a incidência jurídica e a incidência de fato. Ao contrário disso, a tributação no Brasil recai predominantemente sobre o consumo e a folha de salários, como será demonstrado adiante. D’Araújo (2015, p. 127) explicita que a distribuição da carga tributária onera drasticamente o consumo de bens e serviços, sendo que a soma da carga incidente sobre essa base tributária à carga incidente sobre a folha de salários representaria mais de 70% da carga tributária total (D’ARAÚJO, 2015, p. 127-128). Renda e patrimônio são as bases de incidência
230 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO menos tributadas. D’Araújo relembra ainda que, salvo variações influenciadas por fatores conjunturais, “tal proporção vem se mantendo em uma constante no último quinquênio, [...] [sendo] possível observar que as fatias de participação essencialmente não se alteram” (2015, p. 127). Por esse motivo, o autor sugere que “a matriz tributária brasileira acabou por colaborar reitera‐ damente com o cenário de desigualdades que reina em nosso país, sendo corriqueiramente opção consciente dos agentes polí‐ ticos em estabelecê-la em tais termos” (D’ARAÚJO, 2015, p. 129). De fato, dados recentes reforçam a tese de que essa forma especí‐ fica de equacionar as bases de incidência e distribuir a carga tributária tem se mantido uma constante. A análise da carga tributária de 2018, publicada pela Receita Federal em Março de 2020 (BRASIL, 2020, p. 4), demonstra que o grau de participação de cada base de incidência no total da arrecadação foram os seguintes: consumo (bens e serviços) - 44,74%; folha de salários – 27,39%; renda – 21,62%; patrimônio – 4,64%, trans. Financeiras – 1,60%; e outros – 0,01%. O estudo da Receita Federal (BRASIL, 2020, p.5) acompanha, ainda, a evolução histórica da participação das bases de incidência na arrecadação total. Entre 2007 e 2018, a repartição da carga tributária permaneceu praticamente invariá‐ vel. O estudo disponibiliza também um comparativo entre a carga tributária brasileira face aos países da OCDE (BRASIL, 2020, p.6-9). Em 2017, estavam abaixo das médias atribuídas aos países da OCDE os seguintes indicadores: a carga tributária total brasileira, a carga sobre “renda, lucro e ganho de capital”, a carga sobre o patrimônio e, por fim, a carga sobre a folha de salários, sendo que neste último critério o Brasil ficou poucas (apenas duas) posições abaixo da média. Por outro lado, a situação no que diz respeito à carga tributária sobre o consumo é radicalmente distinta. O Brasil encontra-se muito acima da média dos países da
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 231 OCDE, sendo o quarto país com maior tributação sobre o consumo entre todos aqueles avaliados. Destaque-se que não apenas a tributação sobre o consumo pode ter uma repercussão indireta, adquirindo, portanto, efeitos regressivos e promovendo a concentração de renda e riqueza. Em verdade, “é possível que, em alguns contextos, as empresas consigam repassar TODOS os tributos ao consumidor, embu‐ tidos nos preços – inclusive aqueles considerados diretos” (DIE‐ ESE; IPEA; SINDIFISCO, 2011, p. 10-11). Desse modo, até mesmo os tributos sobre a renda e o patrimônio da pessoa jurí‐ dica podem ser embutidos no preço de mercado dos bens ou serviços comercializados, já que a margem de lucro das empresas é calculada sobre todos os custos implicados no processo de produção, incluídos aí os tributos. Nesse contexto, torna-se válido afirmar que “embora os princípios da capacidade contri‐ butiva e o da progressividade estejam presentes na Constituição brasileira, eles são completamente desrespeitados no acordo social que construímos em nosso país” (DIEESE; IPEA; SINDI‐ FISCO, 2011, p. 13). Santos (2014) chama atenção para a influência do poder econômico na conformação do sistema tributário. Segundo ele, [...] é um confronto desigual, em que a elite, melhor articu‐ lada e organizada leva vantagem. E este problema é particu‐ larmente grave em uma sociedade como a brasileira, na qual a elevada exclusão social e econômica tem como consequência a reduzida participação dos setores sociais desfavorecidos na tomada de decisões políticas. Deste modo, a estrutura tributária não é definida com suficiente controle democrático e não representa um arranjo socialmente justo (SANTOS, 2014, p. 13).
232 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO [...] a correlação de forças políticas reproduz um sistema tributário viesado contra os mais pobres e articulado para favorecer os mais ricos. Para reverter a tendência à regressi‐ vidade - que desde tempos remotos é a tônica do fisco naci‐ onal – e trilhar o caminho indicado democraticamente pela Constituição Federal de 1988 após o fim do regime militar, é preciso implementar profundas mudanças (SANTOS, 2014, p. 8). RESULTADOS E DISCUSSÕES Fundo público e fundo de consumo dos trabalhadores Na medida em que bem mais da metade da carga tributária brasi‐ leira tem incidência indireta e é suportada, no final das contas, pela renda do trabalho assalariado, sendo incontestável que os pobres pagam proporcionalmente mais tributos que os ricos, pode-se afirmar que “os detentores dos meios de produção, juntamente com o aparato jurídico e do controle estatal sobre a economia, extraem do trabalhador o necessário à sua subsistência e diminuem sua qualidade de vida exponencialmente” (LINS, 2015, p. 152-153). Em síntese, Lins (2015, p. 153) sugere que “o Estado, através da tributação regressiva [...] extrai do trabalhador um excedente a tal ponto majorado que o subtrai do necessário a uma sobrevivência digna”. Nesse sentido, como sugerido por Behring (2010, p. 31), o custeio do fundo público estatal consome não apenas parte do trabalho excedente (lucro, juros, renda da terra, etc.), mas parte substancial do trabalho necessário – corpo‐ rificado na renda do trabalho assalariado – ao custeio das condi‐ ções de vida do trabalhador. Lins (2015, p. 157) sustenta que “a extração do que virão a ser as
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 233 receitas públicas se dá predominantemente por meio da apropri‐ ação do fundo de consumo do trabalho”. Essa apropriação opera num processo que envolve tanto a formação quanto a destinação do fundo público. Interessa, então, a forma como essa parte da renda necessária aos trabalhadores é incorporada ao fundo publico e majoritariamente transferida para os segmentos mais altos da sociedade, revelando-se como uma das facetas da incon‐ gruência existente no capitalismo entre “a produção de riqueza e o controle da riqueza produzida” (LINS, 2015, p. 155). Conforme explicitado por Silva, [...] assistimos a um largo processo de desmonte das políticas sociais destinadas a reprodução social dos subalternizados ao capital, alargando-se a apropriação privada de parte do fundo público pelos rentistas, donos do capital que porta juros. E os mecanismos estratégicos para tanto são a transfe‐ rência crescente de recursos sociais para a esfera financeira por meio das contra-reformas das políticas sociais e do repasse de recursos do fundo público para o pagamento da dívida. [...]
234 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO Neste contexto, são drenados do fundo público, o que quer dizer em grande parte dos recursos oriundos da classe traba‐ lhadora, grandes somas para a remuneração do capital portador de juros. Isso é feito por meio do capital fictício, forma exacerbada do fetiche do capital portador de juros e que tem na dívida pública sua principal forma de atuação. O endividamento público tem se tornado um mecanismo de manipulação e controle do Estado de que lança mão a oligar‐ quia burguesa, em meio à correlação de forças presente no cenário contemporâneo a qual se apresenta mais favorável à atenção dos interesses do grande capital (SILVA, 2011, p. 2-3). De acordo com dados consolidados pelo movimento Auditoria Cidadã da Dívida (2020), a execução do orçamento do Governo Federal em 2019 dedicou 38,27% do seu total a pagamentos de “juros e amortizações da dívida” pública. Isso corresponde, apro‐ ximadamente, a um pagamento de 2,8 bilhões de reais por dia com juros e amortizações dessa dívida no ano de 2019. Ao fim desse exercício financeiro, foi pago um valor nominal de cerca de 1 trilhão e 37 bilhões de reais sob a rubrica de juros e amortiza‐ ções da dívida4. Esse fato confirma a centralidade da questão da apropriação do fundo público investigada por Costa (2017). Segundo a autora, ocorre uma retirada de recursos em políticas e direitos sociais a fim de direciona-los para a acumulação de capi‐ tal, “o que impacta visceralmente a vida dos/as trabalhadores/as que passarão a conviver com situações de vida e trabalho cada vez mais degradantes” (COSTA, 2017, p. 96). Trata-se de “um processo de subtração de condições necessárias para a repro‐ dução da classe trabalhadora” (COSTA, 2017, p. 96) que implica, como falava Osório (2013, p. 65), numa “apropriação do fundo de consumo do trabalhador para convertê-lo em fundo de acumu‐
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 235 lação de capital”. Essa apropriação do fundo público expressa, afinal, o fato de que o capitalismo “ancora-se nas expropriações para garantir sua reprodução e ampliação” (COSTA, 2017, p. 96). Pelo exposto até aqui acerca do financiamento e da destinação do fundo público, percebe-se que a regressividade da tributação retira dos trabalhadores parte significativa das suas possibili‐ dades de consumo para conservação e reprodução da sua força de trabalho (COSTA, 2017, p. 82). Trata-se de uma “expropriação de parte do trabalho necessário do operário para repor sua força de trabalho” (LINS, 2015, p. 152). Some-se a isso o fato de que, no Brasil, “historicamente é pago um valor bem abaixo do que o considerado como salário mínimo necessário” (COSTA, 2017, p. 90). O resultado é um atentado contra o fundo de consumo e o fundo de vida dos trabalhadores (COSTA, 2017, p. 87). Nesse ponto, cabe destacar que para Marini (2017, p. 347) há nas econo‐ mias dependentes como a América Latina um divórcio entre produção e circulação decorrente das formas particulares de exploração da força de trabalho, o que que possibilita uma dinâ‐ mica em que a acumulação de capital pode conviver com graves índices de distribuição regressiva de renda e riqueza. Trata-se, segundo Osório (p. 65), de “um capitalismo no qual os trabalha‐ dores contam mais como produtores de valor que como consu‐ midores, de modo que seu papel no mercado local tende a ser pouco significativo”. Isso é possível, ainda conforme o autor, em razão da nossa tendência “a criar padrões de reprodução voltados aos mercados externos. É um capitalismo primário-exportador (GALA, 2017) em que o poder de consumo dos trabalhadores das regiões para as quais exporta é mais importante que a própria economia local” (OSÓRIO, 2013, p. 65). A regressividade da tributação e, portanto, do financiamento do fundo público reforça a tese de que “as relações de dependência condicionam as estruturas internas dos países latino-americanos”
236 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO (COSTA, 2017, p. 80). A acumulação capitalista dependente, assim como o financiamento regressivo do seu fundo público estatal, se reproduz com base na superexploração da força do trabalho, de modo a compensar a remessa de parte de seus exce‐ dentes econômicos e a apropriação de parcela de seu fundo público pelos capitais centrais mais desenvolvidos. Decorrem da inserção dependente da América Latina no capitalismo mundial face a nações que, durante os últimos cinco séculos, vivenciaram um acúmulo capitalista e um desenvolvimento tecnológico de suas forças produtivas fundamentado, em grande medida, na expropriação e violência contra outras nações e povos. Cabe remeter, portanto, às palavras de Eduardo Galeano, em As veias abertas da América Latina, citadas por Costa (2017): [...] aqueles que ganharam, ganharam graças ao que nós perdemos: a história do subdesenvolvimento da América Latina integra, como já se disse, a história do desenvolvi‐ mento do capitalismo mundial. Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória alheia, nossa riqueza gerou sempre a nossa pobreza para alimentar a prosperidade dos outros [...] (GALEANO, 1979 apud COSTA, 2017, p. 81). CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho partiu do referencial teórico da Teoria Marxista da Dependência para analisar a regressividade da tributação e do financiamento do fundo público. O marco principal de uma economia dependente seria a adoção da superexploração da força de trabalho como forma compensatória de gerar mais excedentes. Trata-se da forma decorrente da concorrência intercapitalista de fazer frente à perda de valores produzidos em economias menos
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 237 desenvolvidas em favor de nações que possuem maior sofisti‐ cação produtiva. Esse maior grau de desenvolvimento das forças produtivas advém de um acúmulo prévio de desenvolvimento técnico, processo integrante de uma acumulação capitalista fundada, sobretudo, na expropriação e dominação direta de outras nações e povos. A superexploração consiste na violação do valor da força de trabalho, que é remunerada de forma precária, subtraindo-se da classe trabalhadora as condições necessárias para uma vida digna. Nesse sentido, a regressividade da tributação apresenta-se como um aprofundamento da superexploração, uma vez que consome parte significativa do fundo de consumo dos trabalhadores. O fundo público formado, dentre outros, com as receitas tributárias tende a ser canalizado não para o financiamento de políticas sociais ou investimentos produtivos, mas para a valorização do capital financeiro e especulativo. Percebe-se que, em essência, acontece uma transferência de renda e riqueza entre segmentos sociais com interesses antagônicos. A regressividade da tributação nas economias dependentes é resultado de um embate desproporcional entre esses segmentos sociais distintos. Essa particularidade do desenvolvimento capi‐ talista dependente no eixo periférico do sistema atende, portanto, aos interesses do eixo central dominante. O enfrentamento da regressividade da tributação aponta, pois, para um horizonte de enfrentamento mais amplo: o enfrentamento da propria condição de subdesenvolvimento e dependência em que permanece o Brasil e a América Latina. REFERÊNCIAS AMARAL, Marisa Silva; CARCANHOLO, Marcelo Dias. A supe‐ rexploração do trabalho em economias periféricas dependentes.
238 | DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO Revista Katálysis, Florianópolis, v. 12, n. 2, p. 216-225, nov. 2009. ISSN 1982-0259. AUDITORIA CIDADÃ DA DÍVIDA, A. Gráfico do Orçamento Federal - 2019. [S. l.], 29 maio 2020. Disponível em: <auditoriaci‐ dada.org.br/conteudo/grafico-do-orcamento-federal-2019-2/>. Acesso em: 19 jun. 2020. BEHRING, E. R. Crise do capital, fundo público e valor. In: BOSCHETTI, I. et al. (Orgs.). Capitalismo em crise, política social e direitos. São Paulo: Cortez, 2010. BRASIL. Carga Tributária no Brasil – 2018: análise por tributo e bases de incidência. Brasília: [s. n.], mar. 2020. Disponível em: <encurtador.com.br/AIKP9>. Acesso em: 30 jul. 2020. COSTA, Renata Gomes da. O fundo público e a superexploração do trabalho no Brasil. Temporalis, Brasília, ano 17, n. 34, jul./dez. 2017. D’ARAÚJO, Pedro Júlio Sales. A regressividade da matriz tribu‐ tária brasileira: debatendo a tributação a partir de nossa reali‐ dade econômica, política e social. 2015. Dissertação (Mestre em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília, Brasília, 2015. DIEESE; IPEA; SINDIFISCO. A progressividade na tributação brasileira: por maior justiça tributária e fiscal. São Paulo, 2011. Disponível em: encurtador.com.br/cAO26. Acesso em: 30 jul. 2020. GALA, Paulo. Complexidade econômica: Uma nova perspectiva para entender a antiga questão da riqueza das nações. 1. ed. Rio de Janeiro: Contraponto, 2017. LINS, Júlia Normande. Sistema tributário e apropriação do fundo de consumo do trabalhador. In: NASCIMENTO, Adriano
REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇ… | 239 (org.). Temas de crítica ao direito. Maceió: EDUFAL, 2015. LOPES, Tiago Camarinha. Mais-valia absoluta e relativa em Marx e Marini. In: ALMEIDA FILHO, Niemeyer (org.). Desen‐ volvimento e dependência: cátedra Ruy Mauro Marini. Brasília: IPEA, 2013. cap. 5, p. 125-143 MARINI, Ruy Mauro. Dialética da Dependência. Germinal: Marxismo e Educação em Debate, Salvador, v. 9, ed. 3, p. 325- 356, 2017. MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. 13. ed. [S. l.]: Bertrand Brasil, 1989. v. 1. (Livro I). MEDEIROS, Alexsandro M. Tipologias da Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. Sabedoria Política, [s. l.], dez. 2017. Dispo‐ nível em: NASCIMENTO, Carlos Alves do; DILLENBURG, Fernando Frota; SOBRAL, Fábio Maia. Exploração e superexploração da força de trabalho no Livro I de O Capital de Marx. Cadernos de Ciências Sociais Aplicadas, Vitória da Conquista-BA, ed. 16, p. 107-128, 2013. ______. A (super)exploração da força de trabalho em Marx e Marini. In: VII COLÓQUIO INTERNACIONAL MARX E ENGELS. Anais... Campinas: UNICAMP, v. 1, n. 1, 2012. OSÓRIO, Jaime. Fundamentos da superexploração. In: ALMEIDA FILHO, Niemeyer (org.). Desenvolvimento e depen‐ dência: cátedra Ruy Mauro Marini. Brasília: IPEA, 2013. cap. 2, p. 49-70. SANTOS, João Mário Ribeiro. A regressividade do sistema tributário nacional brasileiro. 2014. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em economia) - Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.
CONGRESSO JURÍDICO DO NUPOD DE 26 A 28 DE AGOSTO DE 2020 NUPOD (NÚCLEO PARA PESQUISA DOS OBSERVADORES DO DIREITO) Direito, Economia e Desenvolvimento: Homenagem a Celso Furtado no seu Centenário Local: PLATAFORMA GOOGLE MEET Coordenação: Profº. Pós-Doutor Luciano Nascimento Silva Béis. Raniely Maria de Andrade Oliveira Béis. Ana Carolina dos Anjos Medeiros Béis. Aline Barbosa dos Santos Comissão Científica: Profº. Pós-Doutor Luciano Nascimento Silva
CONGRESSO JURÍDICO DO NUPOD | 241 (CCJ/UEPB e PPGCJ/UFPB) Profº. Doutor Antônio Roberto Faustino da Costa (DCS/UEPB) Profª. Doutora Anne Augusta Alencar Leite (CCJ/UFPB) Profª. Doutora Maria Creusa Araújo Borges (PPGCJ/UFPB) Conferencistas: Profº. Doutor Antônio Guedes Rangel Júnior (Reitor UEPB) Profº. Doutor José Luciano Albino Barbosa (CLPS/UEPB) Profº. Doutor Cidoval Morais de Sousa (PPGDR/UEPB) Profº. Doutor Emerson Ramos (UNIFIP) Profº. Pós-Doutor Ivo Marcos Theis (PPGDR/FURB) Profª. Doutora Anne Augusta Alencar Leite (CCJ/UFPB) Profª. Doutora Maria Creusa Araújo Borges (PPGCJ/UFPB) Profº. Mestre José Flor de Medeiros Júnior (NEPEDILL)
NOTAS 1. A ADMISSIBILIDADE DA RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA: UMA BREVE ANÁLISE SOB A LUZ DA PROTEÇÃO AMBIENTAL 1. Disponível em: https://www.wwf.org.br/informacoes/noticias_meio_ambi‐ ente_e_natureza/?73944/O-que-se-sabe-ate-agora-sobre-o-derramamento- de-oleo-no-Nordeste 2. Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2015/07/14/quinhentos- anos-de-legislacao-ambiental-no-brasil-artigo-de-sandra-marcondes/ 3. Art. 5, XLV, CRFB 4. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteu‐ do=244969&caixaBusca 5. Disponível em: https://fernandaacm.jusbrasil.com.br/arti‐ gos/184237558/principio-societas-delinquere-n on-potest-e-a-sua-inaplica‐ bilidade-no-direito-penal-atual 6. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42644/o- novo-paradigma-no-direito-penal-pos-moderno-societas-delinquere-potest- ou-non-potest. 4. ANÁLISE SOBRE O ENTENDIMENTO LEGISLATIVO-JURISPRUDENCIAL EM RELAÇÃO AO IMÓVEL RURAL NO BRASIL PARA FINS TRIBUTÁRIOS E DE PARCELAMENTO DO SOLO 1. BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. RESP 1170055/TO, Rel. Min. Eliana Calmon, publicação DJ de DJ de 24/6/2010 2. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 24.503, Rel. Min. Marco Aurélio, publicação DJ de 05/09/2003. 3. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 472628-RS, Rel. Min. Castro Moreira, publicado em: 20/06/2005.
244 | NOTAS 4. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Especial 492869–PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, publicado em: 20/06/2005; e Agravo Regimental no Recurso Especial 679173–SC, Rel. Min. Denise Arruda, publicado em: 18/10/2007. 5. PERNAMBUCO. Tribunal Regional Federal 5ª Região: Apelação Cível 429176–CE, Rel. Des. Geraldo Apoliano, publicada em: 24/02/2011. 5. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA À LUZ DA CONCEPÇÃO SIGNIFICATIVA DA AÇÃO 1. As diretrizes metodológicas de pesquisa que foram utilizadas no presente artigo podem ser vistas em: MEZZAROBA, Orides; MONTEIRO, Cláudia Servilha. Manual de Metodologia da pesquisa no Direito – 5ª edição. Saraiva. 2009. 2. KUHN, Thomas Samuel. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 11.ed. São Paulo: Perspectiva, 2011.p.30. 3. KUHN, Thomas Samuel, op.cit., p.32 4. LISZT, Franz Von. Tratado de Derecho Penal, tomo 2. 3ªed.trad de Luis Jiménez de Asúa, Madrid: Instituto Editorial Reus, S.A, 1927, p. 297, 300 e 302. apud. BUSATO, Paulo César. Direito penal e Ação Significativa: uma análise da função negativa do conceito de ação em Direito Penal a partir da filosofia da linguagem. 2. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.p. 7. 5. WELZEL, Hans. Derecho penal alemán parte general. Santiago de Chile, Ed. Jurídica de Chile, 1976.p.53. 6. Nesse sentido, por exemplo: VIVES ANTÓN, Tomás. Salvador. Fundamentos del Sistema Penal. 2ª Edición. Valência: Tirant lo Blanch, 2011. p. 267-271 7. BUSATO, Paulo Cesar. Direito Penal – parte geral. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2017. p.268. 8. Uma curiosidade ao leitor: Vale lembrar que esse termo foi cunhado por Gustav Bergmann, filósofo austro-americano, e posteriormente popularizado por Richard Rorty graças ao seu homônimo livro. 9. Sobre isso, afirma Carlos Martínez-Buján Pérez: “en último término Vives realiza uma lectura de Kant através de Wittgenstein (o viceversa), porque, partiendo de la concepción del Derecho como um orden externo de convivência, el fin que guia su construccíon es el prevalecimiento del Derecho y eleje de esa construción es la acción com um significado público (externo). Sobre ella versa una ley general (porque todos los ciudadanos prestan su consentimento) y se assume la nítida separación entre Derecho y Moral (moral-virtude).” (MARTÍNEZ-BUJÁN PÉREZ, Carlos.
NOTAS | 245 Derecho penal econômico y de la empresa. Parte General. 2.ed. Valencia: Tirant lo Blanch, 2011.p.40) 10. BUSATO, Paulo César. Direito Penal: Parte Geral, op.cit., p. 239 11. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 29. 12. ANTÓN, Tomás Salvador Vives. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 222. Tradução Livre: “Dizer que a ação é o significado de um feito não é apenas criticar a investigação da ação como um evento natural; mas, ao mesmo tempo, essa afirmação abre tantas questões quanto fecha. Pois não se pode dizer que represente uma solução para o problema do supraconceito da ação, como historicamente havia sido proposto: pelo contrário, já que a classe de todos os sentidos não pode, por sua vez, ser definida conceitualmente (já que não há significado comum para todos os significados), compreender a ação como sentido é entender que o problema do supraconceito da ação foi mal estabelecido e que era, portanto, um pseudo-problema.” 13. ANTÓN, Tomás Salvador Vives. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 216 14. 3 FLETCHER, George Patrick. Conceptos básicos del Derecho Penal. Tradução de Francisco Muñoz Conde, Valencia: Tirant lo Blanch,1997. p. 90-91. 15. BUSATO, Paulo César. Direito penal e ação significativa: uma análise da função negativa do conceito de ação em Direito Penal a partir da filosofia da linguagem. Op.cit. 2010.p.152. 16. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 227 17. WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas; tradução de José Carlos Bruni. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural,1979. p. 11 18. WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas, op.cit., p. 19 19. BUSATO, Paulo César. Direito Penal e ação significativa, op.cit., p. 186 20. ANTÓN, Tomás Vives. Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 265. 21. ANTÓN, Tomás Vives. Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 265. 22. WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações Filosóficas, op.cit., p. 105 23. BUSATO, Paulo César. Direito Penal e Ação Significativa, op.cit., p.193. 24. BUSATO, Paulo César. La tentativa del delito – Análisis a partir del concepto significativo de la acción. ed. Curitiba. Juruá, 2011.p.36. 25. BUSATO, Paulo César. Reflexões sobre o Sistema Penal do Nosso Tempo. ? ed. 1ª; Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. p.218. 26. CARBONELL MATEU, Juan Carlos. Responsabilidad penal de las personas jurí‐ dicas: reflexiones em torno a su dogmática y al sistema de la reforma de 2010. Cuaderno de Política Criminal, núm. 101, 2010. pág.13. 27. CARBONELL MATEU, Juan Carlos. Responsabilidad penal de las personas jurí‐ dicas: reflexiones em torno a su dogmática y al sistema de la reforma de 2010. Cuaderno de Política Criminal, núm. 101, 2010. pág.13.
246 | NOTAS 28. CARBONELL MATEU, Juan Carlos. Aproximación de la dogmática de la responsabilidad penal de las personas jurídicas, in Constitución, Derechos Fundamentales y Sistema Penal. Semblanzas y estúdios com el motivo del setenta aniversario del Profesor Tomás Salvador Vives Antón. Tomo I. [ J.C.‐ Carbonell Mateu, J.L. González Cussac e E. Orts Berenguer- orgs.], Valência: Tirant lo Blanch, 2009. 29. BUSATO, Paulo César; GUARAGNI Fábio André, op.cit., p.42 30. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, , op.cit., , p. 230. Tradução Livre: “O seguimento de uma regra (following a rule) aponta para uma relação da regra com o sujeito, e explica a natureza das regras. Uma regra só pode ser seguida se houver um uso estabelecido, segundo o qual há uma compreensão da regra que se manifesta, em caso de aplicação, naquilo que chamamos de ‘seguir a regra’ e naquilo que chamamos de ‘transgredi-la\". 31. BUSATO, Paulo César; GUARAGNI Fábio André. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: fundamentos criminológicos, superação de obstáculos dogmáticos e requisitos legais do interesse e benefício do ente coletivo para a responsabilização criminal. ? ed. Curitiba: Juruá, 2012. p.43 32. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema penal, op. cit., p. 274. 33. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 228-229. Tradução livre: “Se eu observar que um amigo está andando na rua, acho que, nesse sentido mínimo, ele está agindo, mas eu ainda não sei se ele foge de algo que o assusta, ou se, talvez, ele esteja indo a um encontro. A interpretação subsequente pode até mesmo negar que houvesse qualquer classe de ação, por exemplo, porque, no exemplo proposto, (o amigo) era um sonâmbulo (...).” 34. BUSATO, Paulo César. Tres Tesis sobre la responsabilidad penal de personas jurídicas. ¿ ed. Valência. Tirant Lo Blanch, 2019.p.96. 35. BUSATO, Paulo César. Direito Penal e Ação Significativa, op.cit., p.193. 36. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 227. 37. VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del Sistema Penal, op.cit., p. 220 6. COMPLIANCE TRABALHISTA E A CRIMINALIZAÇÃO DO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: ANÁLISE DO PROJETO DE LEI N° 4742/2001 1. Derecho brando, do espanhol; diritto mite, do italiano; droit mou, do francês. Ainda não se tem uma tradução literal para o português; algumas tentativas
NOTAS | 247 apontaram para direito flexível, direito verde (não maduro) ou direito brando. 8. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS EM INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS: VALIDADE DO PRINCÍPIO DA SERENDIPIDADE 1. BRASIL. TRF 1ª Região, Acrim 96.01.24990-7 DF, rel. Des. Federal Eustá‐ quio Silveira, DJ 07.11.96. 2. STJ. O encontro fortuito de provas na jurisprudência do STJ. Disponível em http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/noticias/noticias/O- encontro-fortuito-de-provas-na-jurisprud%C3%AAncia-do-STJ. Acesso em: 28 mar.2020. 3. STJ. HC 197.044/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 04/09/2014, DJe 23/09/2014. 9. MEMÓRIAS DO CRESCIMENTO ECONÔMICO VERSUS MEMÓRIAS DO DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO 1. A palavra caverna está emprega no sentido utilizado por José Saramago em A Caverna e não referência A Alegoria da Caverna de Platão. Embora em A Caverna o autor português faça uma releitura da alegoria platônica. 2. Brasil: um século de transformações. Organização: Ignacy Sachs, Jorge Wilheim e Paulo Sérgio Pinheiro. São Paulo, Companhia das Letras, 2001. 11. REGRESSIVIDADE DA TRIBUTAÇÃO E SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO: ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO DEPENDENTE NA PERIFERIA DO CAPITALISMO 1. Uma advertência apresentada por Osório (p. 63) deve ser tomada em conta: não é apenas o prolongamento do trabalho excedente que distingue a supe‐ rexploração de uma forma qualquer de aumentar a taxa de mais valia, mas a sua ocorrência associada à redução do capital variável adianto pelo capitalista abaixo do valor da força de trabalho. Se a intensidade ou a duração da
248 | NOTAS jornada de trabalho aumenta, aumenta o desgaste do trabalhador e a quanti‐ dade de bens necessária à reposição de sua energia. Consequentemente, eleva-se o valor da sua força de trabalho. Ilustrando essa situação, Jaime Osório (p. 63) afirma que “é possível estender a jornada de trabalho a magni‐ tudes razoáveis, em períodos exclusivos, e o pagamento das horas extras poderiam compensar esse maior desgaste. O mesmo pode acontecer em relação à intensidade”. Se, ao contrário, o capital variável adiantado não acompanha o crescimento do valor da força de trabalho decorrente da inten‐ sificação do trabalho, ocorre a superexploração. 2. Na disputa entre nações, a disparidade de composições técnicas e níveis de produtividade dos seus respectivos capitais pode ser apreendida também a partir do proxy da complexidade econômica (sofisticação produtiva). A sofis‐ ticação tecnológica do tecido produtivo de uma nação é medida a partir de sua pauta exportadora. Nações capazes de produzir bens raros e complexos, e ao mesmo tempo manter uma pauta exportadora diversificada, são os países com maior sofisticação produtiva. Observa-se fortes correlações entre os níveis de complexidade econômica, de desenvolvimento econômico e de renda per capita de um país. (GALA, 2017, p. 21-26). 3. De acordo com Paulo Gala (2017, p. 20-21), “uma economia aumenta sua produtividade ao subir a escada tecnológica, migrando de atividades de baixa qualidade para atividades de alta qualidade, rumo à sofisticação do tecido produtivo. [...] Migrar de atividades de baixa qualidade (concorrência perfeita) para atividades de alta qualidade (concorrência imperfeita) é muito difícil. [...]. Por definição, as atividades de alta qualidade aparecem em mercados com estruturas de oligopólio e concorrência monopolista, o que dificulta sobremaneira a entreada de novos players de países emergentes”. “O processo de desenvolvimento se dá num ambiente de intensa competição. [...] Na conhecida expressão do economista alemão Friedrich List, os países ricos ‘chutam a escada’ depois de atingirem um elevado estágio de desenvolvi‐ mento, tentando impedir que países pobres percorram o mesmo percurso” (GALA, 2017, p. 126). 4. A título de exemplo, os gastos com saúde e educação foram, cada um, de 4,21% e 3,48% do orçamento federal executado. O maior programa social do país, o Bolsa Família, que visa beneficiar cidadãos em condição de pobreza ou extrema pobreza, custou aos cofres públicos míseros 0,5%. Segurança pública, ciência e tecnologia, e cultura custaram, respectivamente, 0,33%, 0,23% e 0,03% do orçamento público.
Search
Read the Text Version
- 1
- 2
- 3
- 4
- 5
- 6
- 7
- 8
- 9
- 10
- 11
- 12
- 13
- 14
- 15
- 16
- 17
- 18
- 19
- 20
- 21
- 22
- 23
- 24
- 25
- 26
- 27
- 28
- 29
- 30
- 31
- 32
- 33
- 34
- 35
- 36
- 37
- 38
- 39
- 40
- 41
- 42
- 43
- 44
- 45
- 46
- 47
- 48
- 49
- 50
- 51
- 52
- 53
- 54
- 55
- 56
- 57
- 58
- 59
- 60
- 61
- 62
- 63
- 64
- 65
- 66
- 67
- 68
- 69
- 70
- 71
- 72
- 73
- 74
- 75
- 76
- 77
- 78
- 79
- 80
- 81
- 82
- 83
- 84
- 85
- 86
- 87
- 88
- 89
- 90
- 91
- 92
- 93
- 94
- 95
- 96
- 97
- 98
- 99
- 100
- 101
- 102
- 103
- 104
- 105
- 106
- 107
- 108
- 109
- 110
- 111
- 112
- 113
- 114
- 115
- 116
- 117
- 118
- 119
- 120
- 121
- 122
- 123
- 124
- 125
- 126
- 127
- 128
- 129
- 130
- 131
- 132
- 133
- 134
- 135
- 136
- 137
- 138
- 139
- 140
- 141
- 142
- 143
- 144
- 145
- 146
- 147
- 148
- 149
- 150
- 151
- 152
- 153
- 154
- 155
- 156
- 157
- 158
- 159
- 160
- 161
- 162
- 163
- 164
- 165
- 166
- 167
- 168
- 169
- 170
- 171
- 172
- 173
- 174
- 175
- 176
- 177
- 178
- 179
- 180
- 181
- 182
- 183
- 184
- 185
- 186
- 187
- 188
- 189
- 190
- 191
- 192
- 193
- 194
- 195
- 196
- 197
- 198
- 199
- 200
- 201
- 202
- 203
- 204
- 205
- 206
- 207
- 208
- 209
- 210
- 211
- 212
- 213
- 214
- 215
- 216
- 217
- 218
- 219
- 220
- 221
- 222
- 223
- 224
- 225
- 226
- 227
- 228
- 229
- 230
- 231
- 232
- 233
- 234
- 235
- 236
- 237
- 238
- 239
- 240
- 241
- 242
- 243
- 244
- 245
- 246
- 247
- 248
- 249
- 250
- 251
- 252
- 253
- 254
- 255
- 256
- 257
- 258