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Anuário 2010

Published by Merkadia, 2018-04-06 09:40:16

Description: Anuário 2010

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Anuário de Itajaí - 1959 151pioneiros entre os congêneres do país. Dá aos legatários ou herdeiros do funcionárioum seguro de vida; propicia auxílio ao funcionário aposentado por invalidez temporáriaou licenciado em gozo de benefício enfermidade pelo IAPB; a partir de 1 de novembrodo ano corrente passará a conceder um auxílio pecuniário de CR$1.000,00 para cadafilho legítimo de funcionário. Financia a aquisição da casa própria bem como concedeempréstimos simples à razão de 5/6% ao mês. Todos estes benefícios realiza porintermédio do Serviço a que nos aludimos nas linhas acima. Vê-se, por conseguinte, queesta instituição admirável realizou na prática aquela aspiração tão sentida e tão buscadaque é a da justiça social. O INCO é indiscutivelmente um orgulho dos catarinenses. Sua diretoria, à frenteda qual vamos encontrar essa figura humana e capaz de Genésio Miranda Lins, com oritmo seguro imprimido à orientação do Banco, fê-lo um dos mais sólidos e conceituadosdo país. Quando Itajaí festeja o primeiro centenário da sua emancipação político-administrativa, não pode deixar de associar o INCO ao júbilo da grande efeméride, poiso progresso que vem conhecendo neste último quarto de século, teve o INCO um dosseus artífices e poderoso impulsionador.001-Anuario-003-137-174.indd 151 22/02/2011 10:53:12

Anuário de Itajaí - 1959 152 COBRAZIL símbolo de progresso A COBRAZIL – Companhia de Mineração e Metalurgia Brazil– organização que opera no ramo de engenharia, no setor de portos,barragens, pontes, estradas, dragagens, eletrificação de estradas deferro, etc., foi fundada em 08 de setembro de 1917. Nestes quase cinqüenta anos de atividades, a COBRAZILfirmou uma tradição valiosa de competência e lisura, realizandoobras importantíssimas em vários pontos do país. Em Itajaí, está operando desde 1928, com ocasionaisinterrupções decorrentes de intervalos entre contratos. Suas obras nesta cidade marcam pontos assinalados donosso progresso. Realizou, para o Governo Federal, por intermédiodo Departamento Nacional de Portos, Rios e Canais as seguintesobras: Abertura e manutenção da barra, constando este serviçode execução de obras fixas (molhes, guias-correntes e espigões)e dragagem; obras do cais acostável, numa extensão de 700 mts;dragagem do canal de acesso e da bacia de evoluções; obrascomplementares ao cais: aterro, linhas férreas, galeria de águaspluviais, etc.; armazéns do porto, sendo um de 100 x 40 mts e outrode 160 x 40 mts; duas pontes sobre o riacho da Caetana; aberturae pavimentação das avenidas Cel. Eugênio Müller e Portuária;instalação de água para o porto, consistindo numa cisterna comcaixa elevada e rede de distribuição; instalação elétrica para o porto,consistindo numa sub-estação e rede de distribuição; instalaçãopara inflamáveis, consistindo numa ponte par atracação, armazéme casa de guarda. Atualmente, executa para aquele Departamento as seguintes obras: obrascomplementares do último trecho do cais executado; entreposto frigorífico; silos paracereais, com a respectiva instalação para movimentação dos mesmos a granel; edifícioda Administração do porto; retificação e proteção das margens do riacho da Caetana. Para o governo Estadual executou as seguintes: captação da água do rio daConceição; estação elevatória, de filtragem, de tratamento e reservatório de água nomorro do Araponga; linha de adução, ligando o reservatório acima até o centro dacidade; reservatório elevado, com capacidade de 1.000.000 de litros de água, na cidade,de onde sai a rede de distribuição de água.001-Anuario-003-137-174.indd 152 22/02/2011 10:53:13

No momento, para o Departamento Nacional de Estrada de rodagem, estáconstruindo a grande ponte sobre o rio Itajaí-açu, na BR-59-SC, trecho Itajaí-Joinville. A COBRAZIL, pelo volume de trabalhos executados em nossa terra, estáintimamente ligada à vida do itajaiense, razão porque, focamos neste Anuário as figurase as organizações que nos ajudaram a construir o Itajaí do presente, não poderíamosesquecer essa importante organização.001-Anuario-003-137-174.indd 153 22/02/2011 10:53:15

Anuário de Itajaí - 1959 154 Três grandes clubes Três grandes clubes se constituem no ponto convergente da vida social de Itajaí:Guarani, Atiradores e Bloco dos XX. O primeiro foi fundado em março de 1897, inicialmente como clube carnavalesco.Só em 1906 é que tomou o caráter que conserva até hoje. Sem ser um clube estrito,mantém, contudo, incólume aquela tradição de somente reunir em seu quadro associativoo que mais expressivo oferece a sociedade itajaiense. Muitas das festas e reuniões que tem promovido se constituíram em verdadeirosacontecimentos na vida social da cidade. Instalado em elegante e moderno edifício, construído na Rua Hercílio Luz, principalartéria da cidade, proporciona aos seus associados toda espécie de conforto, somentepossível com a sede que atualmente possui. Mantém em permanente funcionamentoum bar, restaurante, jogos de salão e uma biblioteca. No terreno dos esportes, mantém uma seção de tênis, para a qual mandouconstruir duas quadras, e outra de bolão, cujas instalações estão se complementandono momento. Neste ano do centenário da criação do município, o Guarani está completandoos seus 62 anos de existência, aureolado pela tradição firmada através de anos,concretizando assim o sonho de seu fundador, o saudoso Joca Brandão. É seu atualpresidente o Sr. Genésio Miranda Lins.001-Anuario-003-137-174.indd 154 22/02/2011 10:53:16

Anuário de Itajaí - 1959 155 Outro é o clube de Caça e Tiro Vasconcelos Drummond, uma das mais antigasassociações da cidade. O velho e tradicional Clube dos Atiradores foi fundado no séculopassado pelos alemães ou seus descendentes residentes em Itajaí, e que transplantarampara a nova pátria uma das mais caras tradições da velha Germânia. Os Atiradoresfazem uma das mais belas páginas da história associativa da nossa cidade. Instaladoem sede própria, atualmente remodelada e situada nas encostas do Morro do Rodi ou daCruz, no fim da Rua Uruguai, ainda hoje é centro de intensa atividade social e esportiva,mantendo aquela mesma chama de entusiasmo e sadia alegria que sempre animaramsuas tradicionais celebrações. O Bloco dos XX é um clube de gente moça. Foi fundando em agosto de 1929, enestes 30 anos de existência tem mantido firmemente aqueles propósitos que levaramAbdon Fóes e mais um grupo de animados jovens a organizá-lo. Suas festas de aniversáriose constituem, invariavelmente, num dos pontos altos da nossa vida social. Tem suasede no edifício do Clube Náutico Almirante Barroso. Não poderíamos deixar de mencionar neste anuário, também, o Grêmio 21 deJulho e a sociedade Recreativa Foliões da Vila que, sem dúvida alguma, se encontramna primeira linha de clubes que animam a vida social itajaiense.001-Anuario-003-137-174.indd 155 22/02/2011 10:53:17

Anuário de Itajaí - 1959 156 O esporte em Itajaí O Clube Náutico Marcílio Dias é uma autêntica glória do esporte itajaiense. Foifundado em 19 de Marc ode 1919. A três jovens esportistas de então deve-se a fundaçãodo clube: Alírio Gandra, Gabriel Collares e Vítor Miranda. Seu crescimento foi rápido e auspicioso. Da seção inicial de remo, embrião doclube, surgiram logo em 1921 as de basquete e de futebol, e no ano seguinte a detênis. Da história esportiva do Marcílio Dias brotam páginas marcadas pelos maisbrilhantes feitos. Assim foi a conquista da Taça Centenário de Itajaí, disputada numarenhida competição náutica quando das comemorações do centenário da fundaçãoda cidade, em 12 de outubro de 1920. A vitoriosa guarnição rubro-anil estava assimconstituída: Orlando Guedes, Roberto Reiser, Ernesto Kuhn, João Willert e CurtBernhardt. Outros feitos memoráveis vieram juntar-se àquele primeiro, inclusive, a conquistade um campeonato estadual de remo e o arrojado raid Itajaí-Florianópolis, realizadoem 27 de setembro de 1922, na yole Yara, tripulada pelos valorosos remadores JoãoTabalipa, João Willert, Pedro Santos e José Corbeta, tendo como patrão Gaspar da CostaMoraes. Se no remo o Marcílio brilhou intensamente, não menor seria a sua atuação nofutebol e tênis. Naquele, sempre tem possuído poderosos esquadrões. O seu atual e modelar estádio, construído na Rua 07 de Setembro e inauguradoem 1921, tem servido de cenário a memoráveis pugnas esportivas, onde as cores rubro-anil tem conquistado consagradores lauréis. O Clube Náutico Almirante Barroso é uma das entidades esportivas maistradicionais de Itajaí. Sua fundação data de 11 de maio de 1919. Decorreu de umdesentendimento havido no Clube Náutico Marcílio Dias com um grupo de associadosdesta agremiação, que não vendo escolhida sua candidata à madrinha de uma yole,afastou-se, fundando o Barroso. O Barroso logo firmou-se no cenário da canoagem em Santa Catarina, sagrando-se campeão catarinense de remo nos anos de 1920, 1921, 1927 e 1928. Tempos houve em que as disputas entre os dois grandes e valorosos rivais doesporte náutico da cidade decorriam num clima de contagiante entusiasmo e vibração,levando suas torcidas a verdadeiras explosões de júbilo quando vitoriosas as coresde sua preferência. O verde e branco e o azul e vermelho marcaram uma época navida da cidade. Mas tudo acabou. À saudável rivalidade clubística de então sucedeuum período ainda não terminado de completa indiferença pelo esporte náutico. Nunca001-Anuario-003-137-174.indd 156 22/02/2011 10:53:18

Anuário de Itajaí - 1959 157mais tivemos as grandes disputas nas águas do rio Itajaí-açu. Daqueles tempos restamapenas recordações, e alguns troféus, testemunhos mudos, mas eloqüentes, de umaépoca de esplendor para o remo itajaiense. O Clube Náutico Almirante Barroso possui sua sede própria, um edifício delinhas sóbrias, com dois pavimentos, construído na Rua Pedro Ferreira, naqueles bonstempos. Em 1950 criou uma seção de futebol, possuindo atualmente ampla e modernapraça de esportes bem no centro da cidade. Sua atual diretoria é presidida pelo Sr. Camilo Mussi, cuja ação em proveito doclube tem sido das mais assinaladas. Do seu dinamismo está ressurgindo um novoBarroso, porém, uma coisa Camilo ainda não conseguiu restaurar no velho e gloriosoclube: a sua seção de remo. Agora, quando parece que a cidade se prepara para as comemorações de maisum centenário, o da sua emancipação político-administrativa, seria oportuno sugerir ainstituição de uma nova Taça, a do Centenário do Município de Itajaí, a ser disputadanas águas do nosso grande rio em junho de 1960. Seria um convite e ao mesmo tempoum estímulo a volta à paisagem das velhas yoles, singrando acima e abaixo aquelaságuas que lhe foram tão familiares.001-Anuario-003-137-174.indd 157 22/02/2011 10:53:19

Anuário de Itajaí - 1959 158 Território da Infância Lausimar Laus Meu território da infância nasce na Barra do Rio Itajaí-açu, ano norte; a leste, asmargens do mesmo rio; a oeste, o Caminho do Atalho, a Fábrica de Papel, os domíniosde seu Serafim da Passagem, pastos de Jacó Villain, venda do seu Vicente Meirinho,casa branca e doce de seu Nilo Bacelar, com a escola do lado, Palmeiras de dona IdaKuster e terrenos de seu João Tabalipa; do sul, a rua comprida e larga que vai dar naFazenda. Meu território de infância tem configuração geográfica diferente. Não é só aconfiguração, mas até o sentido. Que importa que seja inexistente para os outros.Para mim ele tem a consistência das coisas eternas, flutuando alto, pairando acima dastransformações que se operaram no tempo. Todos os dias vou correndo ao Quilomboapanhar guabirobas e venho com o colo cheio de bacuparis maduros, correndo maisveloz que o negrinho do pastoreio e mais feliz que um senhor principado. Quando da última vez estive procurando meu território de infância o rio me contoucoisas tristes. As terras eram estranhas e a população, que era minha e era doce, estavaem êxodo como as andorinhas fugitivas. Não era setembro, por isso andava muito longea primavera. E a correnteza do rio brincava de levar troncos, galhos, natureza mortacom jeito de coisa viva chorando. Conversei muito com meu território, sozinha, aosborbotões. Era como cair em colo gordo de mãe saudosa, assim como se num territóriosó houvesse uma mulher. Ninguém mais. Só a mãe esperando sozinha. Esperando quea enchente de Itoupava Seca chorasse até a última gota e escorresse toda a mágoa atéperder-se no mar. Esperando meu corpo pesado que agora carrega visões, trapos e sonsainda nítidos, apesar do eco do tempo se ter partido nos longes. Corpo que saiu levecomo uma nuvem diáfana e volta nimbo carregado de chuva. Corpo, cuja carência desonho, marcou, como ao gado o ferro do peão. Não tem vento Sul, não tem nada... Eta barbaridade! É só puxar o cordãodo silêncio e lá vem meu território acenando, e por fim, chegando perto. Até meunamoradinho de bicicleta atrás de mim, à sombra comprida das palmeiras do Tabalipa.Que susto! Ele é corado como minha vergonha subindo à face, e eu fico com jeito demenina tocada. Meu namorado é o mesmo e a mesma presença vem com aquele sorriso deterritório de infância, colo macio e gordo, cheirando a leite e ternura. Como é bom voltar, ainda que em seu êxodo minha população espere, como asandorinhas, uma revoada primaveril, para um segundo brincar de sonho.001-Anuario-003-137-174.indd 158 22/02/2011 10:53:19

Anuário de Itajaí - 1959 159 Festa de Nossa Senhora dos Navegantes A bela e tradicional igrejinha de Navegantes, situada no bairro de mesmo nome, nooutro lado do rio, é uma das mais atraentes visitas que se pode fazer em Itajaí quandoaqui se aporta para fazer turismo, ou como mais comumente se diz, conhecer a cidade.a travessia do rio é feita em confortáveis lanchas, em menos de dez minutos, e a Igrejaestá logo à frente do ponto de desembarque, em Navegantes. Foi iniciada em março de 1897 e inaugurada no dia 2 de fevereiro de 1898. Suaconstrução deve-se principalmente a uma iniciativa do Sr. Manoel dos Santos Gaya,português da Vila Nova de Gaya, mestre e proprietário do lanchão São João, que navegavaentre o porto desta cidade e o de Santos. Antes da inauguração da Igreja já existia nobairro de Navegantes a devoção a Santo Amaro e São Sebastião, ainda hoje conservadase festejadas no mês de janeiro de cada ano. O novenário era celebrado, respectivamente,nas residências dos srs. Antonio Inácio da Silva e Dionísio Rodrigues dos Passos. Da comissão construtora da igrejinha de Nossa Senhora dos Navegantes faziamparte pessoas de destaque não só daquele bairro como também da cidade. Entre elasfiguravam os nomes do srs. João Gaya, Geraldo Pereira Gonçalves, Manoel de SouzaCunha, Manoel F. D. Oliveira e Manoel Marques Brandão. A bela imagem de Nossa Senhora dos Navegantes, padroeira do bairro, só foitrazida para a sua igreja em 1899, quando no dia 08 de setembro daquele ano foitransportada em grande procissão. Deve-se a vinda dessa imagem ao Sr. Manoel dosSantos Gaya, que a adquiriu no Rio de Janeiro. Atualmente, no dia 02 de fevereiro, celebra-se a festa de Nossa Senhora dosNavegantes, uma das festas mais populares de Itajaí e que conserva até hoje aquelescostumes tão típicos das velhas festas religiosas do nosso povo. A procissão fluvial quese realiza através do grande trecho do Itajaí-açu, na sua originalidade e singeleza, é deuma extraordinária beleza. O coroamento de tais festejos é a grande queima de fogos deartifício – que nas girândolas, chuveiros e alegorias reflete todo o ardor e fé dos homensdo mar à sua santa e milagrosa Padroeira – que em grande maioria habitam o bairrodos Navegantes. Esta festa bem merece o apoio que lhe emprestam, tão enraizada jáse acha entre as mais caras tradições da nossa terra.001-Anuario-003-137-174.indd 159 22/02/2011 10:53:20

Anuário de Itajaí - 1959 160 Itajaí e a Marinha Mercante Osny Duarte Pereira Nenhum dos itajaienses que vivem fora poderá deixar de associar arecordação de sua terra aos seus marujos. Incontestável é a apaixonanteatração exercida pelo mar, o que tem permitido a Itajaí irradiar seuprestígio, conduzindo para além de Santa Catarina e mesmo do Brasil,a propaganda dos encantos de nossa pequena pátria e do valor de seusfilhos mais eminentes e, sobretudo, é o que tem proporcionado aoprodigioso vale de seu rio, realizar o intenso comércio, fonte de riquezadessa região de Santa Catarina e base para a cultura de seus filhos. Quem ignorará que em Itajaí existiu uma pujante indústrianaval e que seus técnicos, muitos, verdadeiros autodidatas, foramconsiderados os melhores do país? Embarcações construídas emestaleiros de nossa terra eram como relógios da alta classe. Eram osPateks do Oceano. A tradição nessa atividade é, aliás, uma tradição do Brasil,desde que, no século XVII, se principiou a medir força de um Estado,pela importância de sua esquadra. Efetivamente, a Invasão Holandesaadvertira a Portugal de que as madeiras da Colônia deveriam, antes detudo, ser empregadas na construção de navios. A Carta Régia de 2 dejaneiro de 1666 mandou criar no Rio de Janeiro “uma fábrica de fragatasde guerra, sendo dela nomeado diretor Sebastião Lamberto e dando-separa as despesas da mesma fábrica 15.000 cruzados anuais”. Desde então, principiaram a surgir estaleiros no Brasil, eItajaí, pela sua abundância das madeiras adequadas, pela topografiada embocadura e pela colonização européia, tornou-se um centroideal de indústria náutica. Por esse tempo, o Brasil chegava a sera sexta potência do mundo, em marinha mercante e a segunda daAmérica. Construímos vários grandes navios que atuaram na guerrado Paraguai. Mas, assim como o imperialismo penetra em outros setoresde países subdesenvolvidos, arrebatando as quedas de água, paraproduzir energia elétrica e levar os lucros para fora do país; assim001-Anuario-003-137-174.indd 160 22/02/2011 10:53:21

Anuário de Itajaí - 1959 161como se introduz como intermediário entre o pecuarista e o consumidor, erigindo-se emtorno da indústria frigorífica que é a parte mais rendosa do ciclo econômico da carne degado; assim como se torna o intermediário, no café, no algodão, no cacau e surrupiavárias vezes lucros maiores do que o agricultor brasileiro recebe por seu trabalho; assimcomo se enquista como banco de depósitos, dá ensejo a que industriais estabelecidosnegociem com o capital dos brasileiros e cria dificuldades aos banqueiros nacionais; assimtambém o imperialismo penetra na Marinha Mercante Brasileira e está destruindo, um aum, os estaleiros nacionais e as pequenas empresas de cabotagem que foram as artériasanônimas e silenciosas, por onde o sangue econômico do Brasil circulou, trazendo o progresso das pequenas cidades do interior. Cada ano que passa, definham os estaleiros nacionais e as pequenas companhias de navegação entram em bancarrota. A constituição pretendeu reservar para as firmas brasileiras a navegação de cabotagem, mas, por meio da corrupção, na Comissão de Marinha Mercante, subornando e trazendo a inépcia, chegou- se ao paradoxo, de apodrecerem as mercadorias por alta de transporte e os navios brasileiros trafegarem de porões vazios. A destruição do organismo nacional de transportes realizou-se com tamanha desenvoltura que um Comandante Fernando Frota deixou diretamente o posto de Diretor- Gerente da Moore-Mac Cormack, no Brasil, para ser o Diretor de Marinha Mercante. O Sr. José Nunes Marçal deixou o cargo de Agente da Moore-Mac Cormack para assumir o de Diretor do Loide Brasileiro. O jornal “Última Hora”, de 10-06-958 revela uma série de escândalos pelos quais, de passo em passo, estão sendo destruídos os estaleiros nacionais.001-Anuario-003-137-174.indd 161 22/02/2011 10:53:24

Anuário de Itajaí - 1959 162 Uma atitude patriótica no setor de reerguimento da indústria naval seria associaros pequenos e grandes estaleiros nacionais numa grande empresa de economia mistade que participassem também as empresas de navegação e, unidos os técnicos e oscapitalistas, com o apoio do Estado, recolocar o Brasil em suas gloriosas tradições.Os lucros ficariam no Brasil, abrindo novas e extraordinárias perspectivas. E note-se que o Estaleiro Cruzeiro do Sul, por exemplo, já está aparelhado para construirembarcações de 5.000 toneladas e em vias de ampliar. Com um financiamento de 200milhões, Carreteiro, um grande construtor naval, no ano passado, prometia entregarum navio dessa tonelada em 120 dias. Nada disto foi feito. Preferiu-se entregar a umtruste ianque-japonês a indústria de construção naval que engolirá todos os pequenosestaleiros nacionais. Estabelecido o monopólio dos estaleiros, fácil será monopolizar anavegação de cabotagem, porque se o truste cobrar preços absurdos por um navio,ou pelos reparos, nenhuma empresa nacional de navegação subsistirá. Os fretes nãocobrirão os gastos. Nesta mensagem aos itajaienses ciosos das tradições náuticas, sentimos o deverpatriótico de despertar a atenção das classes produtoras para esta grave ameaça quepaira sobre as indústrias e os lavradores que conhecem a importância de uma navegaçãode cabotagem próspera, com navios abundantes e fretes razoáveis. Se a navegaçãonacional cair em mãos estrangeiras, acontecerá ao Brasil, o que ocorreu com a China.O Japão apoderou-se de sua navegação e impediu a exportação de seus produtos dasfábricas de Xangai, de Cantão e de outros centros industriais. Apenas os fabricantesque admitissem sócios japoneses teriam praça nos navios. Em poucos anos, o parqueindustrial chinês caiu em mãos japonesas. Com esta experiência imperialista, os japoneses encaminham-se agora para oBrasil. Estamos certos de que acontecerá a eles, em nosso país, o que lhes sucedeu naChina. Não desejamos, porém, que essa expulsão se faça com os sacrifícios em vidas ebens, impostos àquele grande povo asiático. Devemos aproveitar as lições da História eprevenir os males, antes de remediá-los. Raro é o navio brasileiro que não tenha em sua tripulação um marujo de Itajaí.Graves, pois são as responsabilidades de nossa terra, neste cruciante problema. Está no momento exato de iluminar os cérebros adormecidos e ignorantes, paradefesa da Marinha Mercante e da soberania do Brasil.001-Anuario-003-137-174.indd 162 22/02/2011 10:53:24

Olha a Bernúnica 22/02/2011 10:53:25 A. A. Nóbrega Fontes Lá por volta de 1930, lembro-me de ter visto pela primeira vez o boi de mamão. Tinha meus seis para sete anos e da janela da casa de minha avó, à Rua Pedro Ferreira, vi o boi, a cabrinha, o médico, a viúva, os tocadores, os cantadores. Era um boi que vinha da Fazenda, pois até hoje sou capaz de cantar o estribilho do Pau de Fitas, que era assim: Rolou, rolou, Rolou que não saía Pau de fitas da Fazenda Na rua com alegria. O pau de fitas se apresentava depois do boi de mamão e como para desmentir o boato de que não saíram naquele ano, estavam a cantar na rua com alegria. Pequena multidão acompanhava o boi e se nós estávamos na janela era mais por medo da bernúncia que por sermos tão pequenos ainda. Durante o ano a bernúncia era o bicho papão com que nos amedrontavam: Olha a bernúncia! Não vai lá, menino, que tem a bernúnica! E agora, diante de nossos olhos arregalados, lá estava ela, enorme, escura, rastejante, disforme, com uma bocarra sem fim, procurando um menino levado para engolir. Não houve guri que não a respeitasse ao mesmo tempo que era quase como uma glória dizer alguém que já tinha sido engolido pela bernúncia. Afinal, que bicho era a bernúncia? Como um dragão, mas sem rabo; como um hipopótamo, mas sem as pernas; como um jacaré, mas só a cabeça!001-Anuario-003-137-174.indd 163

Anuário de Itajaí - 1959 164 Mais tarde encontraríamos explicações, dadas pelos estudiosos: tiravam o encantoda coisa, é verdade, mas a verdade é que nós também já não tínhamos mais medo dabernúncia. Como bem desconfiávamos a bernúncia não existia. Seu nome? Era umacorruptela do latim. Quando no batismo o padre perguntava, geralmente em meio agritaria do afilhado, “Abrenuntias Satane?” era o padrinho que respondia “Abrenuntio”,o que equivalia a “Renuncias a Satanás?” – “Renuncio”. Ora, aquele “abrenuntias”, tãoperto de Satanás levou a gente simples a pensar que ambas as palavras eram a mesmacoisa e se havia um bicho que não era nem jacaré, nem dragão, nem hipopótamo, sendoos três ao mesmo tempo, então só podia ser a “bernúncia”, o próprio Satanás. Há boi de mamão em todo o Brasil: com diversas designações, mas sempre omesmo folguedo. A bernúncia, porém, só existe no boi de mamão de Santa Catarina. Epara a alegria nossa, ela é itajaiense. Sim, foi em Itajaí que surgiu a primeira bernúnciae ficou definitivamente incorporada ao folguedo de todo o litoral barriga-verde. Quem disto nos dá conta é o professor Álvaro Tolentino de Souza. Conta eleque, em 1932, num boi de mamão feito em São José, apresentou-se a bernúncia pelaprimeira vez, naqueles lados. Fora trazido pelo preto Felipe Roque de Almeida, dossertões de Itajaí. Felipe, o introdutor da novidade, contou então que o inventor do bichoera Antônio (ele não lembrava o sobrenome), um empregado da Linha Telegráfica,natural de Itajaí. Este Antônio é que armara a primeira cabeça, grande boca articulada,dentes enormes, ameaçadores e barulhentos, quando manobrados com habilidade.Depois veio o corpo, escuro, disforme, capaz de conter duas pessoas e por isto mesmopermitindo as mais variadas contorções. Metidos na primeira bernúncia, Antônio e umcompanheiro juntaram-se a um boi de mamão e foi o povo quem batizou o monstro, aogritar – Olha a bernúncia, olha a bernúncia! Até hoje, grandes e pequenos, nos distraímos com ela e, maravilhados, como quevoltando à infância, ao recordar seus versos ingênuos: Olê, olé, Olê, olé, olá, Arreda menino Que a bernúncia qué passá. Arreda, arreda, Se não ela te come, Arreda do caminho Que a bernúncia tá com fome.001-Anuario-003-137-174.indd 164 22/02/2011 10:53:26

Anuário de Itajaí - 1959 165 O Fundador de Itajaí José Ferreira da Silva Agostinho Alves Ramos, que no começo da terceira década do século passado, seestabeleceu na foz do maior rio do litoral catarinense, não foi o primeiro moradorde Itajaí. Em ali chegando, já encontrou, donos de terras com moradia e plantação,a Alexandre de Azeredo Leão Coutinho, no lugar Fazenda, José Coelho da Rocha,doador do terreno para a capela, Domingos Francisco de Souza, Manoel Franciscoda Costa, Silvestre Nunes Leal Corrêa e muitos outros que, entre 1792 e 1819,requereram e obtiveram sesmarias no grande e pequeno Itajaí, nas proximidades dacidade desse nome. Mas, o que já agora não padece dúvida, é que foi esse Alves Ramos quem,construindo casa de pau-a-pique, onde montou negócio, levantando a primitivacapelinha e para ali trazendo o primeiro padre, fundou o povoado, origem da atual sededo município de Itajaí. A versão que atribui a Vasconcelos Drummond o princípio do povoado, em facedos documentos vindos à luz ultimamente, deve ser posta de lado porque não encontrabase alguma na verdade histórica. Aquele futuro diplomata recebera ordem de El-rei para tomar posse de terras à margem do Itajaí-mirim, onde deveria fundar umestabelecimento, terras que ficavam cerca de doze quilômetros para cima da confluênciadesse rio no Açu, pela altura do local ainda hoje conhecido por Taboleiro. Sendo certo, pois, ter sido ele encarregado de colonizar terras no pequenoItajaí, não iria, desobedecendo a ordens expressas do rei, começar um povoado e fazerderrubadas em local já comprovadamente ocupado por particulares, que nele tinhammoradas e roças, muito longe daquelas. Aliás, há documentos oficiais que afastamtoda a incerteza de que as derrubadas, empreitadas por Drummond, foram feitas emsesmarias, de que existe planta autenticada, nas margens do pequeno Itajaí. Não se sabe ao certo em que ano Agostinho Alves Ramos se estabeleceudefinitivamente no local. Segundo indicações merecedoras de crédito, ele deve teraportado em Desterro no milésimo de nossa independência política. Guarda-livrosque era e muito hábil, associou-se a Anacleto José Pereira, negociante de grandeprestígio na capital da Província. E, por conta da firma, deve ter visitado os moradorese os poucos povoados, espalhados pela costa norte catarinense desde Desterro a São001-Anuario-003-137-174.indd 165 22/02/2011 10:53:26

Anuário de Itajaí - 1959 166Francisco, vendendo e comprando gêneros da terra e fazendas, em lanchões que semprevoltavam à procedência carregados de farinha, cereais, madeira cerrada. Esta última,era mercadoria abundante nas margens do Itajaí, onde muita gente se empregava nomister de desdobrar em tábuas as toras abatidas nas densas florestas, ricas das maisvariadas essências. Aos serradores do Itajaí, Aires Casal já se referira na sua CorografiaBrasílica. Não escaparam, certamente, à acurada observação de Agostinho Alves Ramos,as riquezas que jaziam inaproveitadas às margens do Itajaí e o futuro reservado aterras tão férteis de ser trabalhadas e os benefícios que adviriam a ele e ao país, da suaexploração racional e metódica. Resolveu, assim, transferir sua residência do Desterro para a foz do Itajaí, ondeadquiriu pequena área de terra para a construção de uma casa de comércio que suprisseos moradores das redondezas e, ao mesmo tempo, lhes adquirisse os produtos daslavouras e das suas incipientes atividades industriais. Agostinho era casado com dona Ana, portuguesa natural de Peniche, senhoraativa, desembaraçada e profundamente religiosa, que muito auxiliou o esposo nassuas árduas jornadas que precederam à instalação do casal, jornadas trabalhosas, dedificuldades sem contas, de grandes e penosas renúncias. Ainda e não obstante todas as indagações que tenho feito, não consegui esclarecerse Frei Pedro de Agote, que sabemos ter sido nomeado cura de Itajaí em 1824, aí seestabeleceu com Alves Ramos, tendo vindo em sua companhia. Mas, tudo indica que,ao transferir-se para Itajaí, Alves Ramos tenha trazido o franciscano em sua companhia,pois um cômodo da casa que construira para negócio e sua residência, fora reservadapara a capela, onde frei Pedro oficiava todos os dias.001-Anuario-003-137-174.indd 166 22/02/2011 10:53:27

Anuário de Itajaí - 1959 167 Mesmo depois que Alves Ramos, dando prosseguimento aos seus planos,conseguiu que José Coelho da Rocha, que ali vivia desde muitos anos antes, doasseum terreno de 180 braças quadradas, contíguo ao seu, em que foi construída umacapela com cemitério, frei Pedro continuou morando com o casal Alves Ramos, até oseu falecimento. Alves Ramos redobrou de atividade logo que se viu instalado convenientemente àbeira do rio. Por intermédio de frei Pedro, conseguiu do Bispo do Rio de Janeiro provisãopar a construção de uma capelinha decente e para a qual concorreu com quase todoo necessário. Montou uma olaria no ribeirão Conceição, entregando-se a um comércioativo de lavradores e tiradores de madeira da região. A capelinha foi atraindo, para as proximidades do negócio de Alves Ramos, outrosmoradores e, assim, em pouco em pouco, estavam lançados os alicerces do povoadodo Santíssimo Sacramento. E Alves Ramos deu tal impulso ao desenvolvimento daregião que se tornou logo o homem indispensável, o conselheiro e amigo a quem todosrecorriam nas precisões do corpo e do espírito. O seu prestígio estendeu-se a toda aregião, sujeita, então, à Vila de Porto Belo. Não é, pois, de admirar que ele se visseeleito deputado provincial nas eleições que se verificaram em 1834, as primeiras danova ordem política estabelecida no país. Valeu-se da sua posição para conseguir favores e medidas tendentes à exploraçãoe ao aproveitamento das terras marginais dos dois Itajaí. Apresentou e conseguiu veraprovada e sancionada a lei 11, de 1835, que criou duas colônias na região, uma noItajaí-mirim, provavelmente nas mesmas terras em que Drummond, trinta e poucos anosantes, mandara fazer derrubadas e outra no Itajaí-Açu, em Belchior, de que se originoua atual cidade de Gaspar. E não ficou apenas nisto o trabalho de Alves Ramos. Junto àsautoridades provinciais e aos amigos de Desterro, desenvolveu intensa e entusiásticapropaganda de Itajaí e de tal forma lhe cantou as belezas e a fortuna que conseguiu levar,par a região, colonos de todas as partes da Província. De São Pedro de Alcântara, da ilhade Santa Catarina, de Porto Belo, de toda a zona habitada da costa catarinense, foi genterequerer e cultivar terras à beira dos dois grandes rios, estradas naturais que favoreciamas entradas, até muitas dezenas de quilômetros para o oeste, do braço civilizador. É assim que, entre os requerentes de terras do Itajaí daqueles tempos, vamosfigurar nomes como o de Silva Mafra, Livramento, Etur, Anacleto Pereira e outros nomesde prestígio no comércio e sociedade desterrense. Percorrendo os livros de registro de informações prestadas, pela Câmara dePorto Belo, nos requerimentos de terras da bacia do Itajaí, fica-se admirado o númerorelativamente grande de requerimentos entre 1830 e 1840, em comparação com os demilésimos anteriores. Obra indiscutível da atuação incansável e abnegada de Alves Ramos,que não poupava esforços, sacrifícios nem despesas para intensificar o povoamento daregião. Ele é, praticamente, o responsável pelo grande impulso que tomou a colonizaçãodesde a foz do Itajaí, até as alturas do Salto do Ribeirão Branco, além da atual cidadede Blumenau, pois até lá haviam sido requeridas e concedidas áreas cultiváveis, muitoantes mesmo do início da colonização alemã com Hermann Blumenau.001-Anuario-003-137-174.indd 167 22/02/2011 10:53:27

Anuário de Itajaí - 1959 168 Por tão bons serviços prestados à coletividade e ao progresso da Província, foiAlves Ramos distinguido pelo Imperador Pedro II, por ocasião da sua estada em SantaCatarina, em 1840, com a emenda da Ordem de Cristo. Dona Ana não se mostrava menos interessada que o marido no engrandecimentodo povoado. Pelo seu espírito caridoso, pelo fervor com que cuidava dos interessesreligiosos da nascente comunidade, auxiliando frei Pedro na manutenção da ordem edo asseio da capelinha, dotando-a de paramentos e de alfaias condignos, concorreu demaneira proveitosa também para que se reunissem muitos dos fatores que trouxeram,depois, maior desenvolvimento à povoação incipiente. Tinha um irmão médico, queandava pelo Rio Grande do Sul e que, nos últimos anos de sua vida, veio igualmentepara o Itajaí, com alguns escravos, tendo morrido em casa de Alves Ramos. Nessacasa morreu também frei Pedro de Agote, deixando livros e papéis que, por ocasião doinventário do coronel, foram mandados queimar pelas autoridades de Porto Belo. A biografia de Alves Ramos, uma narração tanto quanto possível completa dassuas atividades como militar (era tenente-coronel de milícias), como negociante eguarda-livros, como legislador e como político, como colonizador e como intelectual,precisa ser escrita para que não se apague, jamais, da lembrança dos itajaienses amemória de uma vida, toda ela dedicada aos interesses do povoado que criou e fezprogredir até levá-lo às portas da emancipação político-administrativa. Há aspectos do seu caráter, circunstâncias de sua vida, passagens de sua atuaçãopolítica, que bem mereceriam capítulos especiais. Era um homem inteligente e, para aépoca, de bastante cultura intelectual. Sabemos que era mestre em riscar plantas denavios e que vários dos grandes barcos construídos no Itajaí obedeceram a planos porele elaborados. Escrevia bem e tinha, igualmente, veia poética muito acentuada, compredileção para a sátira, pelas quadrinhas alegres, brejeiras, mordentes, sarcásticas.Guarda-se, desses seus pendores, uma amostra bastante irreverente, dedicada ao padreFrancisco Hernandez, vigário de Itajaí por volta de 1850 e que, diga-se de passagem,e em justificativa de estilo em que foi vazada, tinha lá as suas e muitas mazelas queandavam malevolamente comentadas na boca do povo. Morrendo-lhe a esposa, começou também a decadência de Alves Ramos quandoItajaí, por obra sua, já era sede de distrito, uma freguesia de suas oitenta casas, espalhadasentre a foz e a barra do rio, com a sua capelinha sem torre a espelhar-se nas águasbarrentas do Itajaí. Vendeu os terrenos que tinha na Barra ao Dr. Hermann Blumenau;vendeu outros bens e escravos e quando a morte o colheu, quase repentinamente, em1853, era praticamente um homem pobre, tendo sido enterrado no cemiteriozinho atrásda capela, a segunda que ele construíra. E do pouco que deixou, uns amigos e a justiçade Porto Belo deram conta. Tenho esperanças de encontrar tempo e vagar para escrever com mais minúciasa vida desse homem que não sei como Itajaí pode esquecer. Assim Deus me dê maisum pouco de vida e de saúde.001-Anuario-003-137-174.indd 168 22/02/2011 10:53:27

Anuário de Itajaí - 1959 169 A cocada A cocada, se falasse, seria a crônica viva da vida itajaiense desta última vintena.Como instituição itajaiense, é intocável... Mas, afinal, o que é a cocada, perguntarão muitos itajaienses ausentes longosanos do chão natal. Ela é nada mais nada menos do que um banco circular construído à sombra deum daqueles oitis plantados frente à velha Igreja Matriz. São duas realmente, mas comoem todas as sociedades há os mais “mais”, com as cocadas sucede o mesmo. A que ficapróxima aos dois cafés principais da Praça Vidal Ramos é a preferida, a mais bem... Ali os seus habitantes se reúnem em horas apropriadas ao lazer e se põem adissecar a vida da cidade, os acontecimentos palpitantes, a anunciarem as últimas... É uma espécie de areópago, com a pequena diferença de que este modeloitajaiense não passa de um tribunal de julgamentos da vida alheia... Mas sem ela o que seria da nossa adorável cidade, com a sua rotineira vidade província, com o dia a dia de sempre lá de longe em longe quebrado por um fatoqualquer de maior relevância. Por isso, dizemos nós, viva a cocada.001-Anuario-003-137-174.indd 169 22/02/2011 10:53:29

Itajaí: pórtico do vale Victor Márcio Konder Não é a cidade mais populosa, nem o maior produtor industrial, nem mesmo o melhor porto. Também como centro cultural, não ostenta a primazia no Estado. No entanto, o seu papel tem sido extraordinário, singular o lugar que ocupa na terra barriga-verde e, especialmente, no Vale maravilhoso que leva o seu nome: Itajaí. É difícil definir a exata missão de Itajaí, sua influência multiforme e sempre presente, por vezes imponderável, nesse complexo que é a vida econômico-social de uma região. Sabe-se do papel que desempenham os portos na colonização do interior, e, depois, como intermediários no comércio e agentes civilizadores. Itajaí tem sido tudo isso. E mais ainda. A cidade plantada na embocadura do rio foi e é o berço constante de homens ilustres e notáveis no Estado, dentre eles Lauro Müller, o maior dos catarinenses. É inegável o papel de relevo dos itajaienses na vida de toda Santa Catarina, desde os tempos da República. Há uma espécie de liderança política tradicional emanando do porto. É curioso: a gente das outras cidades do Vale, e mesmo além, aceita os de Itajaí como seus, sem rivalidades nem ciúmes. Onde o segredo dessa influência? Como explicar a postura original de Itajaí no cenário catarinense? É fato que se trata de um porto, com tudo o que isso representa, tal como descrevem os geógrafos. Mas aqui estamos diante de um porto íntima e organicamente ligado a toda uma vasta região. Num Estado onde predominam as estradas cortando de Norte a Sul, o Itajaí-açu, descendo no sentido Leste-Oeste, constitui uma escelente via natural de penetração no interior e um meio de integração econômica de boa parte do território barriga- verde. Pelos caminhos do Vale subiram os primeiros desbravadores até os campos de Curitibanos e Lajes, ou para o Norte. Seguindo a trilha do rio, de tão001-Anuario-003-137-174.indd 170 22/02/2011 10:53:31

suave declive, viajaram o Dr. Blumenau e seus companheiros, possuídosda idéia titânica de construir a qualquer preço. De fato, apesar dos obstáculos de diversa natureza, as condiçõesnaturais oferecidas pelo sistema fluvial do Itajaí tornaram possível, ou pelomenos facilitaram, a epopéia da colonização alemã em Santa Catarina. Uma vez ocupado e povoado o Vale por brasileiros de diferentesorigens, fundadas Gaspar, Blumenau, Brusque, Indaial, Pomerode,Hamônia, Rio do Sul, Ituporanga e tantos outros núcleos maiores oumenores de uma constelação de trabalho, Itajaí passou a ser o pontode referência, o local de partida e o porto de destino de todas ascomunidades. Dos trapiches de Itajaí vinham as mercadorias de fora, ascargas dos navios de Santos e Rio de Janeiro, bem como de Hamburgoou Buenos Aires. Mas também por ali chegavam idéias, novidades, ofermento civilizador. A cidade se tornou não apenas o pórtico de todoum fecundo jardim, mas igualmente a sede de uma liderança suave, talcomo Blumenau ficou sendo o pujante centro da vida econômica. É certo que vieram depois as comunicações rodoviárias, o contatodireto entre as cidades interioranas, através de Joinville, estrela ao Norte,com Curitiba e São Paulo. O próprio porto se transmudou, vivificado pelainiciativa pioneira de seus filhos e a atividade de suas irmãs afanosasna hinterlândia. De uma antiga terra de embarcadiços, comerciantes eroceiros, tornou-se, também ele, um centro industrial de significação,sem, contudo, perder a sua nunca desmentida vocação para o mar, umdos traços definitivos do seu caráter. A modernização, entretanto, nãoveio em nada minorar o papel de Itajaí na terra catarinense, difícil deidentificar de pronto, mas real e atuante. Talvez por isso mesmo a gente de Itajaí é modesta, excessivamentemodesta. Está sempre pronta a aceitar, quase humilde, a superioridadeque se faz alhures, a reconhecer, não sem contentamento, os sucessosde outras terras. Dir-se-ia que os itajaienses descrêem de seus valorese como que se apagam para não chamar a atenção para os própriosméritos. No fundo é sabedoria, são os contatos contínuos de seus filhoscom outras gentes, diferentes costumes, viajantes e forasteiros dediversos Estados e mesmo várias nações a indicar a justa medida dascoisas, a obrigar a comparações que o isolamento tornaria improvável.De tanto ver e tanto cotejar nasce uma espécie de ciência, que se faz001-Anuario-003-137-174.indd 171 22/02/2011 10:53:33

Anuário de Itajaí - 1959 172modéstia sem alardes, natural e espontânea. Não ingênua, porém, que o conhecimentode variadas formas de vida desenvolveu também um agudo realismo, capaz de discernirentre o joio e o trigo e reagir, com sadia malícia, ante a falsidade sonora dos gestospostiços e das fachadas vazias de substância. É estranho, ninguém pode falar de Santa Catarina sem mencionar Itajaí. Pergunta-se: que cidade é essa? Que há lá de notável? O viajante hesita, não sabe responderao certo, cita vagamente Cabeçudas, tão pequena e encantadora. Acha pouco, porém.Busca outras lembranças, o porto, a Barra do Rio, o Bico do Papagaio, Navegantes,nenhuma delas, por si só, suficiente para justificar uma impressão inesquecível. Aocabo, diz, enfim, que Itajaí... é uma cidade como tantas outras. A cidade, porém, nãose apaga na memória e, no decorrer do tempo, será sempre um ponto de referênciaobrigatório na recordação dos roteiros do mundo de cada um. Talvez pudéssemos falar no espírito de Itajaí. As cidades têm a sua personalidade,mais ou menos marcante. Algumas se definem por uma nítida contextura sociale psicologia própria, oriunda de peculiaridades, fatores econômicos, históricos eculturais, que lhes moldaram a formação. Assim o Rio de Janeiro, Recife, Bahia ouParis. Assim também o pequeno e modesto porto de Itajaí, onde nada se impõeostensivamente, mas onde tudo grava indelevelmente a alma dos que ali viveram ouali tiveram o priilégio de nascer. Rio de janeiro, março de 1959. FIM DE ANUÁRIO DE ITAJAÍ - 1959001-Anuario-003-137-174.indd 172 22/02/2011 10:53:34

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Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 174 Neste ano do Centenário da instalação do nosso Município, acontecimento que lembrao início da nossa emancipação políticio-administrativa, não podíamos faltar com a nossacolaboração às comemorações que por certo estão acontecendo na terra natal, comentusiasmo e a unção cívica com que costumamos festejar os grandes eventos que tãode perto nos tocam. Itajaí - Cem Anos de Município, representa, pois, aquela nossa contribuição.Contribuição despretenciosa, mas que procura fixar da melhor maneira, a passagem deum acontecimento de tanta significação para a nossa cidade. Recebam-na os nossos conterrâneos com o seu natural espírito de crítica etolerância, pois nem de leve nos anima a idéia de que tenhamos com este trabalhoesgotado o assunto Itajaí, no que ele tem de vário e rico nos seus múltiplos aspectos. A ITAJAÍ o nosso trabalho. O Editor001-Anuario-003-137-174.indd 174 22/02/2011 10:53:38

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 175 Itajaí - Cem Anos de Município Deputado Federal Antônio Carlos Konder Reis Aqueles que, num dia recuado, a ti chegaram, pelo verde mar que acaba na areiasempre branca do Pontal ou nos amoráveis rochedos das Cabeçudas, em velhas naus,que a imaginação sonha heróicas, tiveram, certamente, a mesma emoção que sentiram,mais tarde, os que ganharam a tua primeira visão ao deparar-te do topo do MorroCortado, após admirar os campos que te circundam ou, desses, de hoje, que descem dasnuvens brancas e deixam o céu azul, para pousar na tua que é a nossa terra, Itajaí.001-Anuario-004-175-204.indd 175 22/02/2011 10:54:17

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 176 As montanhas, que emolduram a tua planície, realçam o rio que te consagra etimbra. Desde os primeiros, a tua história é uma admirável sequência de idas e vindas,marcando a tua eterna permanência. Nascida nos primeiros dias da Independência, foste, na infância, vila-menina,recatada e bela, com os pés brincando nas ondas e o corpo gracioso recostado no rio. Aprendeste a rezar na velha igreja de taipa, na Praça, onde ainda está teunobre coração. Foste ganhando vida e consciência nos dias curtos e agitados daRegência e nos longos e tranqüilos do Segundo Império, entre a faina dos teus filhos– comerciantes, artesãos, agricultores e marinheiros – e as lutas apaixonadas, entreliberais e conservadores. Viveste a glória das grandes fazendas importadas das terras vizinhas à Corte ea sublimidade da colonização germânica, ao longo do Vale, ao qual serves de pórticoinigualável. Às vésperas da Campanha do Paraguai, ganhaste a maioridade. Foste feita sededo município. Era a autonomia política e administrativa, há muito sonhadas. Com taisresponsabilidades, vibraste com a Abolição e a República e sofreste com as lutas de1893. Teu porto, tua grande porta, tua razão de ser, foi, durante muitos anos e, aindao é, em parte, a grande preocupação daqueles que te amam. Com o desenvolvimento social que atingiste, ficaste pólo real do gênio catarinense.O Guarani, o Estrela, o Humaitá, o Cruz e Sousa, o Marcílio, o Barroso, o Lauro foramos precursores dos salões em que vives, hoje, as grandes noites, abertas a todas ascategorias sociais, em exemplar fraternidade, dos dias de alegria e expansão. À vida pública do Estado e do País, desde Ministros de Estado, Governadores,Secretários de Estado, Desembargadores, Deputados, Professores e Sacerdotes,projetando, no cenário da Pátria, tua fé, tua inteligência e teu civismo.001-Anuario-004-175-204.indd 176 22/02/2011 10:54:19

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 177 Já senhora de si, sincronizaste, nestes últimos tempos, com a ânsia dodesenvolvimento econômico que nos anima e fizeste presente à Santa Catarina damaior organização bancária do Estado, mola que dinamizou a tua economia, fundadanão só em teu porto, nas tuas fábricas, nas tuas casa de comércio mas, acima de tudo,nos esforços dos teus filhos mais humildes e sacrificados: os nossos irmãos estivadores,terresteiros, operários, enfim, da cidade e do campo. Construíste, então, uma Catedral. Chamaste os filhos de Dom Bosco e as Irmãzinhas da Imaculada, para teenriquecerem com escolas modelares. Reformaste teus clubes e associações, grandes e pequenas. Ganhaste um modelar hospital. Embelezaste tuas ruas. Ergueste residências e edifícios. Ocupaste, honradamente, a terra com que Deus te cumulou. Chegas, assim, gloriosa, aos cem anos de tua emancipação. Sem ódios ouressentimentos. Sem falsos compromissos com o passado. Olhando firme para ofuturo. Por tudo isso, és o princípio e o fim dos sonhos dos teus filhos, bons brasileirospor fiéis à tua cintilante e exemplar história centenária. Tu, Itajaí, querida, sempre moça, sempre bela, sempre nossa.001-Anuario-004-175-204.indd 177 22/02/2011 10:54:20

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 178 Carros de Mola Uma das mais características impressões de Itajaí. Teriam já sido usados na cidadeantes do advento do automóvel? É provável. Ora, por que não existiriam carruagens nopassado também de Itajaí? Pois seriam os carros de mola, no passado, as carruagensmais plebéias. Enfim, aqueles que viveram Itajaí pelos idos 1915/1920 podem dar o seutestemunho de se existirem ou não carros de mola naquela Itajaí saudosa... Aí por 1938 eram vistos alguns sacolejantes, por ruas ainda não calçadas, oscavalinhos trotando. Veio a Guerra. Faltou a gasolina. Os automóveis se adaptaram aogasogênio, de gás pobre, de lenha ou de carvão. Surgiram epítetos para os “gasogênios”– epítetos impublicáveis. As dificuldades trazidas pela guerra fizeram com que se encostassem muitosautomóveis: falta de gasolina, falta absoluta de peças e assessórios. Então apareciam,(ou reapareciam?), multiplicando-se, os carros de mola. O importante era a prestaçãodo serviço à população. A falta de carros-de-praça seria plena e satisfatoriamentesuprida... E apareceram. Uns discretos, sóbrios, outros enfeitados, puxados ao carnaval.E ficaram, continuam, concorrendo hoje com os seus colegas carros-de-praça, uns eoutros prestando bons serviços à cidade. Carros de mola de Itajaí são enfim impressão boa, guardada durante anos pelosque nos visitam, vindos de outras terras...001-Anuario-004-175-204.indd 178 22/02/2011 10:54:22

Nova Matriz – Marco da fé O principal sinal da fé católica dos itajaienses, que sempre esteve na Praça Vidal Ramos e que para os forasteiros foi motivo perene de agradável satisfação, embora com as modestas aparências de suas formas e de seu singelo interior, a matriz, elo universal das gerações passadas com a pujante geração moderna, transferiu-se, acompanhado dos resplendentes e ofuscantes raios de luzes religiosas, para o novo templo que vemos na foto ao lado, sem dúvida, um símbolo do belo e da catolicidade de um povo. É a nova geração dos filhos de uma terra sagrada! É a vida do fiel moderno! É a fé dos dois mil anos, que encontrou, com o Santíssimo Sacramento, em Itajaí, um tabernáculo colossal e fértil de fiéis, demonstrado nas linhas arquitetônicas e nos altares de fino mármore de sua nova Igreja Matriz e, Itajaí, ao completar cem anos de sua trajetória ascensional como município, dá mostra que não progrediu, somente, na indústria, no comércio e na sua vida comuna, mas na vida religiosa, preservando, outrossim, a tradição deixada pelos primeiros colonizadores que aportaram nas suas plagas, quando elevaram, na velha Igreja Matriz da Praça Vidal Ramos, a sagrada Eucaristia dos altares. Uma Reims, uma Colônia, uma Milão, uma Londres e uma Roma, têm, nos seus templos, a convergência das atenções dos visitantes, como símbolo de um passado glorioso e emblema de esperanças no porvir. Itajaí, também, marca, com a sua moderna Igreja Matriz, o presente de voluptuoso progresso e o futuro de incontáveis promissões. A alma do povo da terra, porém, é sempre a mesma: mansa, pacífica e hospitaleira; o forasteiro encontra abrigo como se fosse um filho e os da terra adquirem confiança para as lutas em outros rincões. Não se encontra ninguém no Brasil que passasse por Itajaí, que não fale da singeleza e da simpatia de seu povo.001-Anuario-004-175-204.indd 179 22/02/2011 10:54:23

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 180 A nova Igreja Matriz foi iniciada no vicariato do atual monsenhor José Locks,companheiro de seminário do Cardeal Dom Jayme Câmara, o qual teve fases difíceispara concretizar tão gigantesca obra, não só devido aos percalços da Grande Guerra,como às conseqüências que esta trouxe para todo mundo. Coube ao Cônego Vendelino Hobold, completar a obra de seu antecessor, eo fez com singular dinamismo e invulgar dedicação, legando à cidade uma obra dearte e de religiosidade como poucas existentes no país. Desde as linhas e formasarquitetônicas externas até os painéis interiores, estes de notáveis artistas italianos,tudo enfim, demonstra o gosto e a arte de seus promotores e dos encarregados dostrabalhos artísticos. Ao festejar o seu centenário e quase no limiar do terceiro milênio da humanidadena vida cristã, Itajaí revela aos seus patrícios e aos forasteiros de outras terras, doquando é possível, a fé de seu povo acolhedor e amigo.001-Anuario-004-175-204.indd 180 22/02/2011 10:54:25

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 181 Eles ensinaram o b-a-bá e muito mais: Dona Maria dos Anjos Stuart Laus A primeira normalista Em 1909 formava-se em Florianópolis pela Escola Normal, a moça Pequenina, comoera chamada em toda Itajaí, D. Maria dos Anjos Stuart; foi a primeira professora formadapor Escola Normal no município itajaiense. Os mais antigos da cidade conheceram seu Saturnino Stuart, o homem sossegadoe manso, de coração largo e sensível, ansioso por ver sua filha Pequenina uma professorade verdade, formada pela capital do Estado. Fez sacrifício dentro dos poucos recursosque tinha como homem pobre de cidadezinha simples, funcionário de seu Konder, pai deMarcos, Victor e Adolpho, e lá mandou a mocinhas estudar no Desterro. Antes, porém,que a visse formada, um dia a morte veio o buscar. Pequenina, assustada, chorandoinconsolável, veio ver seu Saturnino, beijando sua face imóvel, compreendendo naquelapaz de rosto sereno, a certeza de que ela realizaria o que ele tanto desejava.001-Anuario-004-175-204.indd 181 22/02/2011 10:54:26

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 182 Logo depois a moça Maria dos Anjos Stuart se formava e era nomeada paraexercer o magistério na então vila de Brusque, arcando agora com o pesadelo encargode chefe de família, levou sua mãe, D. Maria Amélia Stuart e seus quatro irmãos:Rosinha, Guiomar, Jove e João para a velha Brusque, onde começou sua nova vida. Blumenau regurgitava, como pequena metrópole que se realiza e se exponde elá veio a escola nacional que faltava para o ensino da língua pátria. Pequenina foi entãochamada pelo Governo do Estado para a nova meta nacionalista. E lá foi outra vez afamília e a professora. Ali fez grandes amigos, porque permaneceu até 1913, recordandode vez em quando a figura de Victor Konder, naquele tempo um jovem advogado nacidade do Dr. Blumenau. Hoje sente saudades não só das horas boas e alegres dos diasda viva juventude, e já em Itajaí, como professora da Primeira Escola Mista da Barrado Rio, conta coisas da enchente-grande de 1911, que lhe carregou elogios e títulos deserviços prestados à educação, porque a cidade inteira se refugiara no morro das freirase as casas do Bairro da Velha ficaram com água até o telhado. Na Barra do Rio Pequenina casou, criou seus filhos e educou muitas gerações,até que foi transferida para o Grupo Escolar Victor Meirelles, onde lecionou depois atéaposentar-se no ano de 1941. Os filhos dizem que até hoje quando ela vê crianças saindo de uma escola, chorade saudades. Saudades de ser professora, talvez pensando na espinhosa e florida estradado magistério, talvez recordando o grande caminho trilhado com tanta fé, ternura ededicação, talvez revendo a face imóvel de seu Saturnino que tanto desejou e nãochegou a vê-la mestra feita. Ela é merecedora da estima da cidade que hoje completa cem anos, porque comsua palavra e seu livro ajudou a erguer a bandeira da civilização e progresso da terrabarriga verde. Em sua modéstia ela é bem o glorioso símbolo da verdadeira mestra, queviveu professora, amou o magistério e fez de sua vida um livro aberto à crença do amorao Bem, ao Belo e ao Bom. D. Maria dos Anjos Stuart Laus, porque assim se chamou com o casamento,vive na Cidade da Guanabara, para onde a levou a saudade dos filhos que ali vivem.Embora há alguns anos na terra carioca, continua a ser itajaiense, contando coisas daColoninha, recordando Atiradores, Cabeçudas e a velha pracinha da Matriz, projetandonos olhos da gente a saudadosa lembrança do Quilombo e a beleza serena da Barra doRio que foi sua, no velho tempo em que a Primeira Escola Mista lhe pertencia.001-Anuario-004-175-204.indd 182 22/02/2011 10:54:28

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 183João Maria Duarte – Um fundador de colégio O professor João Maria Duarte nasceu em Florianópolis, antiga Desterro, no dia1º de outubro de 1854. Ex-professor da Escola de Aprendizes de Marinheiros da entãoProvíncia de Santa Catarina, de 1885 a 1898; exerceu o cargo de diretor do ColégioDuarte, fundado em 1882 e extinto no ano de 1900; foi professor-fundador do Liceude Artes e Ofícios de Florianópolis, em cujo estabelecimento ocupou sucessivamente oscargos de Secretário, Vice-diretor e Diretor. Pela deliberação da Congregação, foi-lheconcedido o título de Professor Benemérito, por ter completado três anos de exercíciode professor de português, sem faltas. Por motivo de saúde, transferiu-se para a cidade de Laguna, onde exerceu, pelotempo de oito meses, o cargo de Professor-diretor do Instituo Municipal de Instruçãoe ainda pelo mesmo motivo transferiu sua residência para a cidade de Itajaí, ondeexerceu o cargo de Professor-diretor do Colégio Itajaí desde 1901. O Colégio Itajaí representou papel saliente na cidade, podendo até dizer-se quefoi de algum modo o precursor do grupo escolar. O professor João Maria Duarte teve destacada atuação no setor do ensino primárioem nossa terra. Pelo seu colégio passaram centenas de jovens itajaienses, muitos dosquais, anos mais tarde, teriam destacada atuação no cenário político do Estado e domunicípio. Por isso mesmo, seu nome merece ser lembrado e venerado pela notávelcontribuição que ofereceu ao desenvolvimento do nosso já agora centenário município. Do saudoso educador que foi casado com a Sra. Maria José Cunha Duarte, existemainda vivas duas filhas: dona Natália Duarte Emmendoerfer, residente na cidade do RioGrande, e dona Eulália Duarte Pereira, residente da cidade do Rio de Janeiro, viúva doSr. Plácio Conrado Pereira, que foi pro muitos anos negociante em Itajaí. Deste casalhá vasta descendência, na qual sobressai o Dr. Osni Duarte Pereira, Juiz de Direito,atualmente convocado para exercício no Tribunal de Justiça do Estado da Guanabara.001-Anuario-004-175-204.indd 183 22/02/2011 10:54:29

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 184 Os primeiros moradores J. Ferreira da Silva Não resta a menor dúvida de que o povoamento e a colonização das terras, próximas a foz do grande Itajaí, começaram a ser feitos depois da ocupação da Ilha de Santa Catarina pelos espanhóis em 1777. Em decorrência desse vergonhoso episódio, grande parte dos habitantes daquela Ilha passou- se para o continente fronteiro. E deste mesmo, tiveram que se afastar os estabelecimentos portugueses mais chegados à sede da capitania. A Armação da Piedade, por exemplo, que ficava ao norte de São Miguel e em franca prosperidade, teve que ser mudada para Itapocorói, enseada de abrigo seguro para embarcações e de fácil defesa e que, sobretudo, ficava bem longe da vigilância, que o invasor exercia em derredor da Ilha ocupada. E foi, certamente, a mudança da armação para Itapocorói, feita sob as vistas do administrador Jacinto Jorge dos Anjos, homem de brilhante carreira, a melhor contribuição para que aquelas terras fossem sendo aproveitadas para agricultura, ou, simplesmente, como objeto de especulação de lucros certos. É bem verdade que o sargento-mor Manoel Gonçalves de Aguiar, quando andou explorando as costas catarinenses, no começo do século XVIII, informa, nas suas comunicações, ter um certo Miguel Dias de Arzão se estabelecido às margens do Itajaí, onde explorara faisqueiras de outro, mas que, já em 1711, dali se havia retirado, em face da pobreza das jazidas.001-Anuario-004-175-204.indd 184 22/02/2011 10:54:31

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 185 Essa é a referencia mais antiga, que conhecemos, a respeito de moradoresdo Itajaí. Como veremos no decorrer deste artigo, esse Arzão, ou deve ter regressado,posteriormente, ao Itajaí, ou ali deve ter deixado descendência, pois são vários osindivíduos desse nome que ali encontraremos, anos mais tarde. Ou quem sabe mesmose as informações colhidas por Aguiar não foram rigorosamente exatas, e o referidoMiguel continuasse às margens do Itajaí e dele proviessem as diversas famílias aliestabelecidas e mencionadas em documentos posteriores. As esperanças que animaram os que entendiam ser a enseada de Itapocorói,a mais propicia da costa catarinense, para os trabalhos da pesca e beneficiamentode baleias, foram plenamente satisfeitas. Itapocorói progrediu. O número de cetáceosarpoados anualmente era compensador e, de todas as partes da província, aportavamà armação forasteiros, em busca de trabalho nos fornos de frigir, no envasilhamento doazeite, ou no transporte deste para bordo dos barcos, que o levariam para a capital dopaís, ou diretamente a Lisboa. Embarcações costeiras, atopetadas de mercadorias dos negociantes doDesterro, de Santos e de outros núcleos, ali apareciam, periodicamente, vendendosal, fazendas, ferramentas e adquirindo os produtos das lavouras dos colonos,posseiros, das férteis terras que se estendiam pelo litoral, desde a foz do Itajaí- Açuaté para cima do Itapocú. Distando as terras marginais do nosso maior rio litorâneo, Armação de Itapocorói,pouco mais de uma dezena de quilômetros, é bem possível, quase certo mesmo, quea posse e cultivo dessas terras fossem contemporâneos da fundação do contrato dosIrmãos Quintela. Mas, para uma afirmação categórica desse detalhe, não possuímossenão, suposições, embora muito fortes. Entretanto, não sofre dúvidas, em face de provas abundantes e seguras, o fatode que, já no último decênio do século XVIII, os terrenos banhados pelo Itajaí-Açu,nas mediações de sua foz, eram ocupados e cultivados por cerca de quarenta famílias.Estas, se espalhavam pela Praia do Itajaí, pelo rio acima, de uma e outra margem,pela Praia Brava, pela margem sul do Itajaí-Mirim até os terrenos, de que os açoritascolonizadores e os seus descendentes, se foram apossando, da Ilha capital, para onorte, até onde, posteriormente, se criariam a Colônia Ericeira e Ávila de Camboriú,conseqüência daquela. O que os tripulantes dos barcos de comércio diziam da feracidade, daconsiderável riqueza, que encerravam as terras do Itajaí, despertava a ambição doshomens de prol e de fortuna da sede da capitania, formando-se, em torno dessaregião, lendas que, ultrapassando a medida do razoável, alcançavam as raias domaravilhoso e do absurdo. Dizia-se, por exemplo, que o rio escorria de serras, que eram montões de ouro eprata, que os índios, que acampavam nas redondezas, guardam tesouros em toneladaspor onde o rio abria caminho para o oceano, eram povoadas de caça de toda espécie e001-Anuario-004-175-204.indd 185 22/02/2011 10:54:33

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 186tamanho, que vinham ao encontro do caçador; que o éden bíblico talvez não possuíssetanta beleza e tão imponente magnificência, como aquelas terras por onde só faltavamserpear os riachos de leite e mel. Assim é que, por volta de 1793, verificou-se um verdadeiro rush em direção àsterras do Itajaí, movimento que o próprio Governador, Soares Coimbra, estimulava,embora, não ignorasse que, naquelas terras, já haviam estabelecido posse, mansa epacífica, desde alguns anos, várias famílias de caboclos. E esse movimento deu origem ao pedido, e conseqüente concessão de dezenasde sesmarias, feito por militares, eclesiásticos e civis de posição no governo dacapitania. A darmos crédito a reclamações levadas à presença do vice-rei, no Rio deJaneiro, até mesmo o governador de Santa Catarina requereu, por interposta pessoa,duas léguas em quadro, as quais fazendo frente na praia de Itajaí, iam confrontar,pelos fundos, com as terras dos Arzões e o ribeirão dos Machados que, já naqueletempo, tinha esse nome.001-Anuario-004-175-204.indd 186 22/02/2011 10:54:35

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 187 Tal sesmaria, requerida para Coimbra, pelo seu “testa-de-ferro” Manoel da CostaFraga, conforme se vê no mapa que aqui reproduzimos e cujo original tivemos a felicidadede encontrar no Arquivo Nacional, confronta com as terras de Antônia Pinheiro, José daSilva Cascaes, João Fagundes e outros, já moradores antigos. Outros requerimentos foram feitos por Alexandre de Azeredo Leão Coutinho,Domingos Francisco de Souza, Francisco José Ferreira da Rocha Gil, Manoel Franciscoda Costa, Joaquim Manoel da Costa Lobo, Manoel Fernandes Lessa, José Corrêa, MatiasDias de Arzão, Manoel José Diniz, Ana Margarida de Santa Cruz e Melo, para ficarmosapenas nos requerimentos datados da era de 1700, a maioria dos quais não tinha outrofito, senão a aquisição de terras para fins de especulação e lucro fácil. Ao que nos consta até agora, apenas Alexandre de Azeredo Leão Coutinhoocupou, efetivamente, a sesmaria de duas léguas em quadro, que lhe foi concedida eque compreendia os terrenos por onde se estende, hoje, o bairro itajaiense da Fazenda, eonde sua viúva, Dona Felícia, mais tarde dirigiu farta escravatura, dedicada aos serviçosda lavoura de café, mandioca, cana e outras culturas e aos tecidos de algodão. Os padres Francisco da Rocha Gil e Domingos de Souza Coutinho, pouco depois que as obtiveram, se desfizeram, com lucro, das suas concessões. Joaquim Francisco de Sales e Melo e sua irmã, Dona Margarida de Santa Cruz e Melo, cederam os seus direitos sobre as sesmarias, que lhes haviam sido outorgadas, nas margens do Itajaí-Mirim, à Coroa, quando tiveram conhecimento de que o Ministro de D. João VI, Tomaz Antônio de Vila Nova Portugal, pretendia fundar novas colônias em Santa Catarina e encarregar delas Vasconcelos de Drummond. Desse fato, nasceu a afirmativa – já hoje suficientemente desfeita – de que fora Drummond o fundador de Itajaí, quando a verdade é bem outra. Silvestre Nunes Leal Corrêa, também cultivava as sesmarias que adquiria, nas margens do Itajaí Mirim, de Feliciano Gutierrez e de Manoel de Souza Sarmento que, por sua vez, as haviam obtido por despacho do governador Teixeira Homem, portanto entre 1778 e 1794, época em que este esteve à frente dos destinos administrativos de Santa Catarina. Não conseguimos ainda elementos para dizer o que Manoel da Costa Fraga, o “testa-de-ferro” do governador Coimbra, fez dos terrenos que requereu na praia de Itajaí e que o demarcador da real Fazenda José Ferreira de Mendonça, mediu em 1798.001-Anuario-004-175-204.indd 187 22/02/2011 10:54:36

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 188 Esse “avanço” nas terras do Itajaí foi providencial para o historiador. Isso porquedeu origem a uma documentação muito valiosa e em virtude da qual, sabemos, hoje,com bastante certeza, quantas e quais eram as famílias que moravam próximas àsmargens do grande rio, pelos fins da era de 1700. O mapa ilustrativo destas notas referem-se às da margem esquerda. Eram elas:José da Silva Cascais, com 375 metros de frente na praia de Itajaí, logo depois doterreno de Antonia Pinheiro já mencionado; Antônio Manoel dos Santos, com terras queficavam mais ou menos, à altura da pedreira, de onde foi, há anos, retirado o materialpara a construção dos pontais; João Machado Fagundes e João Inácio d’Espindola; aviúva Maria Inácia e Antonio Machado Lemos, todos fazendo frente na praia de Itajaí,com 1.500 metros de fundos; João Dias de Arzão, cuja fazenda ficava bem defronte àfoz do Itajaí-Mirim na margem esquerda do Açu, onde hoje a fábrica de papel tem suasplantações de bambus e eucaliptos. Todos esses confrontantes assinaram, alguns decruz, o respectivo auto de demarcação. Na margem direita por força de outros documentos, nós sabemos que moravamos Correia de Negreiros (que mais tarde se associaram a Agostinho Alves Ramos, nassuas práticas de colonização de todo o vale), Silvestre Nunes Leal Correia e outros. Pelos livros de registros de batizados, casamentos e óbitos do Curato de São JoãoBaptista de Itapocorói, a que toda a região estava sujeita, vem-nos a certeza de queos moradores das margens do Itajaí eram em tão grande número, que já tinham, antesmesmo de 1793 o seu cemitério próprio e que ficava, onde hoje, se situa o bairro dosNavegantes, no lado oposto à cidade Itajaí. Dissemos que os terrenos de Antônio Pinheria (sic), delimitavam-se, ao sul, coma margem esquerda do Itajaí-Açu, por esta acima até meio caminho a Barra do Rio.Compreendida, portanto, todo o território do bairro dos Navegantes. Será interessante contar-se alguma coisa dessa senhora. Ela era parente de JoséCoelho da Rocha, que depois se tornou proprietário daquelas terras, e de outras, àmargem direita do rio, uma parte das quais doou em 1823, a instâncias de AgostinhoAlves Ramos, para a construção da capelinha do Santíssimo Sacramento, em torno daqual se formou o povoado que deu origem à cidade de Itajaí. Coelho da Rocha, como muita gente naqueles tempos de aventura e de ambições,teve brigas com seus parentes, por causa da terra que adquirira de Antônia Pinheira.A querela está bem explicada nesta informação que a Câmara da Vila de Porto Belodeu, num requerimento dos interessados, dirigida ao Governador da Província: “Asterras que os suplicantes (João Coelho e José Antônio da Rocha) pedem, o primeiropossuidor delas foi João ou Francisco Pinheiro e deste casal ficaram três filhos. Antônia,Caetano e Joaquim. Caetano morreu afogado há mais de quarenta anos (sendo de 1842o requerimento, o afogamento dataria, por conseguinte, de 1802); Joaquim é ausentehá mais de 60 anos e não deixou mulher nem filhos. Antônia ficou e vendeu a partede sua herança a Francisco Lourenço da Costa, cujas terras hoje possui José Coelhoda Rocha, pai do primeiro suplicante, por compra que dela fez a Francisco Lourenço da001-Anuario-004-175-204.indd 188 22/02/2011 10:54:38

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 189Costa. Aquela Antonia Pinheira, teve uma escrava de nome Ana. Esta escrava teve umafilha, que depois de ser mulher, a senhora a libertou e o primeiro suplicante casou comela, mesmo contra a vontade de seu pai, a saber o primeiro suplicante; nem ele nemfilhos, nem consta que venda gêneros de cultura sua e José Antônio da Rocha vive dooficio de carpinteiro. Apesar da primeira petição, que o primeiro suplicante fez ao juizde paz, a qual alega que sua sogra, Ana Pinheira, tem trabalhado nas terras há mais de40 anos e dizem os que se acham assinados, nas costas da dita petição, que justificamser verdade o que o suplicante alega, esta Câmara não nega essa verdade, mas tem adizer que sendo a sogra do suplicante escrava, trabalhou para sua senhora e não podeadquiri posse para o genro, por isso julga que essas terras pertencem a ausentes e é deparecer que devem ser concedias a José Coelho da Rocha, pai do primeiro suplicante.” Não queremos deixar cair o ponto final neste ligeiro apanhado histórico, semtranscrever a petição que, em 1794 (notem bem o ano, os que ainda possam ter dúvidasquanto a antiguidade do povoamento das margens do Itajaí), Matias de Arzão e Silvestree outros, se dirigiam ao vice-rei. É um documento de real interesse para a história deItajaí e que este “Anuário” pode se orgulhar de publicar, em primeira mão: - “Ilmo. E Exmo. Senhor. Dizem os moradores do Rio de Itajaí, da comarca daIlha de Santa Catarina, Matias Dias de Arzão e Silvestre Nunes, José Corrêa e outros,casados com famílias e escravaturas, que todos fazem o número de quarenta e tantosmoradores, que estavam situados nas margens do dito rio, com suas casas, sítios elavouras de mandioca e outras, criações de aves e animais e outras benfeitorias deárvores de espinho, que de tudo pagavam dízimos ao real patrimônio; naquela vivendase arrancharam os suplicantes e viviam, há muitos anos, por serem matos gerais ebaldios, incultivos, sem dono algum e só pertenciam ao patrimônio régio, de nossaaugusta soberana, como senhora de todas as conquistas e por serem muito longe dapovoação de Santa Catarina, situada de casais, do número por se não entender com ossuplicantes, foram para aquele lugar distante, do qual muitas vezes pediram sesmarias,que lhes denegaram e estando assim de posse na conformidade da provisão e lei quese acham registradas nos livros da Câmara de Santa Catarina, que mandam conservaros moradores, que estiverem de posse, para evitar as confusões de demandas e pleitos,foram os suplicantes abolidos e desapossados dos seus sítios, no tempo do governadorManoela Soares Coimbra e, este mesmo, pela interposta pessoa de seu secretário,001-Anuario-004-175-204.indd 189 22/02/2011 10:54:40

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 190Manoel Lopes Fraga, e o reverendo vigário da Vara que então era Antônio Teixeira, estepela interposta pessoa do governador da fortaleza de Inhatomerim, Alexandre José deAzeredo Leão e este também por si e seu cunhado Otávio Borges e o capitão AntônioFerreira Lessa e outros, que cada um tirou a sua sesmaria de grande número de terras,que a todos as concedeu o dito governador, para si e para seu dito secretário em nomede quem as tirou, depois disso se juntaram todos e por modo de barulho, ou de assuadae foram embarcados e andaram pelo rio de cima, mais de quarenta léguas, medindo comos olhos, cada um o que melhor lhe parecia, despejando aos suplicantes e a todos osseus e tomaram aquelas terras, inviciosamente, para as venderem, como foi o reverendovigário, que já vendeu as suas por trezentos mil réis, pelo pouco que lhe custaram, nemos suplicados as pretendem situar nem trabalhar porque não podem pela distância desuas moradias. Os suplicantes, por força despejados, no que receberam perda irreparável,sendo espoliados pelos suplicados, para fazerem negócio mercantil na venda daquelasterras contra as disposições da lei do reino, que proíbe, vender aas mercês e graças quelhe faz soberano, e como aquelas terras são do real patrimônio, que costuma repartir comos vassalos pobres, de que nunca é inseparável a real clemência, para lhes restituir dodano, que lhes foi feito, pedem a V. Excia. Seja servido mandar restituir aos suplicantesos seus sítios, ficando de nenhum vigor aquelas ditas dos suplicados, visto o que ficaexposto.” (O requerimento, que se encontra no Arquivo Nacional, não tem data nemassinatura. O seu andamento restringiu-se ao seguinte despacho: “Informe o governointerino, ouvindo a câmara. Rio, 23 de agosto de 1794”. Com a rubrica do vice-rei). Esse é, como se vê, um documento muito interessante, não porque se refira àépoca muito anterior à do início do povoado do Smo. Sacramento do Itajaí, mas porquenega, categoricamente, a afirmativa dos que requereram, em 1793, as terras do Itajaí,com intuitos especulativos, de que as mesas eram “devolutas e a sua concessão tantonão prejudica a real fazenda, que antes a promete interessar, não só pelo suplicante termeios de nelas de poder estabelecer, de que resulta aumento dos reais dízimos, comoporque, assim, se podem ir povoando estes e outros vastíssimos sertões, que ainda aopresente se acham desertos e incultos”. (Parecer do escrivão da fazenda real e do seuprovedor, João Prestes de Melo, no requerimento de Alexandre de Azeredo Coutinho). Não! As terras do Itajaí, nos fins do século XVIII, não estavam “desertas eincultas”. Ao contrário. Cerca de quarenta famílias por ali moravam e tinham culturas demandioca e de outros cereais e muitas delas viviam da arte da construção de barcos, oude carpinteiros da ribeira, como se dizia, em que os seus chefes ocupavam. J. Ferreira da Silva nasceu em Tijucas, Santa Catarina, em 1897 (16 de janeiro). Estudou no Ginásio Catarinense. Professor público em Canoinhas em 1916. Escrivão de paz de Rodeia em 1919. Escrivão do Cível e Comércio em Blumenau, em 1924. Fundou, em Rodeio, o semanário O Escudo. Em Blumenau, com Octaviano Ramos, fundou “A Cidade” que ainda hoje existe. Depois fundou “O Correio de Blumenau”. Inspetor Federal de Ensino em 1931. Presidente da Câmara Municipal de Blumenau em 1937. Em 1939 Prefeito Municipal até maio de 1942. Publicou, além de artigos em vários órgãos da imprensa Catarinense, “O Padre Jacobs”, 1929; “O Doutor Blumenau” 1931; “Fritz Mueller” 1932; “A Colonização do Vale do Itajaí”, 1933; “Blumenau”, monografia do IBGE; “Colônias para o Brasil”, 1940; “História de Blumenau”, 1950; “Calendário Blumenauense, 1931 – 1932)001-Anuario-004-175-204.indd 190 22/02/2011 10:54:40

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 191 ATA DA INSTALAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ A“ nno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil e oitocentos e sessentaannos, trigésimo nono da Independência e do Império. Aos quinze dias do mez de Junhodo dito anno, n´esta Parochia do Santíssimo Sacramento do Itajahy, termo da ex Villade Pôrto Bello, na salla da caza destinada pelos encarregados de a promptificarem, paraservir de Paço da Câmara Municipal, e n´ella se celebrar as sessões, a qual pertence aJoão Clinaid, ahi achando-se presente o Tenente José Antônio da Silva Simas, Presidenteda Câmara Municipal da Vila de São Sebastião da Comarca de São José desta Província,comigo Secretário da mesma Câmara, tendo comparecido o Vereador da CâmaraMunicipal mais votado eleito para esta nova Villa do Santíssimo Sacramento d´Itajahy,o cidadão Brasileiro Joaquim Pereira Liberato, bem como os vereadores imediatos emvotos, os cidadãos brasileiros José Henrique Flôres, Claudino José Francisco Pacheco,José da Silva Mafra, Francisco Antonio de Souza, deixando de comparecer JacintoZuzarte de Freitas por talvez ignorar o presente auto e Manoel José Pereira Máximo porse achar doente em perigo de vida, o Senhor Presidente fez sciente aos ditos SenhoresVereadores que por ordem do Exmo. Senhor Presidente d´esta Província de trinta domez próximo findo, que havia se apresentado nesta salla, a fim de prestar juramentoaos ditos Senhores Vereadores, lhes dar posse, e fazer installar esta Villa do SantíssimoSacramento d´Itajahy, da Comarca de Nossa Senhora da Graça da Província de SantaCatharina, em virtude da lei de sua creação, que é da forma, maneira e teor seguinte”(segue-se a lei anteriormente descrita). “Depois do que declarou que os limites das Freguezias e districtos, de que secompõe este novo Município são expressas e designadas nas Leis, e Ordens respectivasda ereção das mesmas Freguezias, sendo as do Município, ao Norte o rio de Itapocú,e ao Sul as vertentes do Môrro do Boy, logo passou a deferir juramento aos sobreditosVereadores, os quais puzeram sua mão direita em um livro dos Santos Evangelhos, e naforma do Artigo sessenta da Lei de primeiro de outubro de 1828 jurarão desempenharas obrigações de Vereadores desta Villa do Santíssimo Sacramento d´Itajahy, e depromoverem em quanto em si couber, os meios de sustentar a felicidade pública. Acceitaspor elles, assim o dito juramento o Senhor Presidente proclamou a inauguração destaVilla do Santíssimo Sacramento d´Itajahy da Comarca de Nossa Senhora da Graçada Província de Santa Catharina, que por esta forma e auto solemne fica instalada,e elevada à cathegoria de Villa, compondo-se seu Município da Parochia desta Villa,e de Camboriú e a de Nossa Senhora da Penha do Itapocoroy, que d´ora em diantefica desmembrada do Município de S. Francisco, como determina o artigo segundo dacitada Lei de creação deste Município: assim concluído este acto o Senhor Presidenteinstalador desta Villa convidou ao Senhor Presidente da nova Câmara tomar assento,cedendo-lhe a cadeira, bem como todos os demais senhores e Vereadores os quaes001-Anuario-004-175-204.indd 191 22/02/2011 10:54:42

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 192concordarão em fazer celebrar na Igreja d´esta Villa em Te-Deum às duas horas datarde em acção de graças ao Supremo Creador do Universo bem como no regresso darum respeitável “Viva” à Sua Magestade o Imperador, o Senhor Dom Pedro Segundo,à Constituição Política da Nação Brasileira e à Religião Catholica Apostólica e Romanado Estado, e ao Exmo. Senhor Presidente d´esta Província. E de tudo para constar selavrou este auto que foi assinado pelas pessoas acima mencionadas. E eu José Mendesda costa Rodrigues, Secretário da Câmara Municipal da Villa de São Sebastião, que aJescrevi – osé Antonio da Silva Simas, Joaquim Pereira Liberato, José Henrique Flôres, Claudino José Francisco Pacheco, José da Silva Mafra, Francisco Antonio de Souza.001-Anuario-004-175-204.indd 192 22/02/2011 10:54:44

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 193 Relíquia histórica Nestor Seara Heusi Blumenau em Cadernos, esta hoje vitoriosa publicação, em boa hora criada por JoséFerreira da Silva, nome sobejamente conhecido nos meios intelectuais do país, penabrilhante que sempre militou em favor das boas causas, e profundo e arguto conhecedorda História Barriga Verde, em seu número 9, tomo I, de agosto de 1958, sob o título“Pareceres e Sugestões”, traz à baila um assunto deveras interessante que, se nãomereceu, deveria ter merecido a mais carinhosa atenção dos chamados “homens deresponsabilidade” do Vale do Itajaí. Muito nobres e altamente justos os conceitos emitidos naquele original artigo.Não poderíamos, pois, nos furtar ao propósito de aqui transcrevê-los, de vez que tãobem se ajustam ao tema que nos propusemos desenvolver. É o que, “data venia”, passamos a fazer. “... A Imprensa e os demais interessados na vida administrativa e cultural domunicípio de Blumenau, discutem, atualmente, o destino a ser dado ao vapor “Blumenau”,que ia ser vendido pela Estrada de Ferro Santa Catarina, a cujo acervo pertence, comosucata e que, em boa hora, o ilustre senhor diretor daquela ferrovia resolveu entregar adestino mais compatível com a relíquia histórica que aquele barco representa. O “Blumenau” foi, incontestavelmente, um dos grandes propulsores do progressoda colônia fundada à margem do Garcia. Por dezenas de anos consecutivos, ele e o“Progresso” foram os únicos meios de transporte de passageiros e cargas entre a sededa colônia e Itajaí, o porto de mar por onde a lavoura, o comércio e as indústriasblumenauenses escoavam os seus produtos para outras localidades da província, dopaís e mesmo do exterior. Desempenharam um papel relevantíssimo no aumento dariqueza. Seria, pois, para o “Blumenau”, depois de velho, imprestável, quase, para aprestação de outros serviços, um fim bem amargo jogá-lo ao canto, como cousa inútil,ou atirá-lo às forjas pra transformar as suas peças em outros objetos de ferro. O destino que lhe querem dar os interessados na conservação dessa relíquia, élouvável. Mas, parece-nos que ele teria continuado sua gloriosa carreira se a sociedadeAmigos de Blumenau, ou mesmo a Prefeitura Municipal, tomasse a sua tarefa detransformar o “Blumenau” num museu flutuante.001-Anuario-004-175-204.indd 193 22/02/2011 10:54:45

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 194 Seria mais um motivo de orgulho para a cultura blumenauense e seria tambémmais uma atração turística, com que a cidade contaria, o tradicional vaporzinho, fundeadonum dos aprazíveis recantos do nosso rio, em local de fácil acesso, apresentando aosolhos dos visitantes, objetos e documentos ligados à nossa história e ao desenvolvimentomaterial e intelectual da colônia e do município. A nosso ver, esse seria o mais glorioso destino que poderia ser dado ao “Blumenau”que, durante tantos e tantos anos, foi fator indispensável na vida blumenauense deanos atrás. Considerem a prefeitura e a Sociedade Amigos de Blumenau a idéia e realizem-na,na certeza de estarem praticando uma obra, que terá o apoio de quantos se interessempela nossa comuna”. Sim, “relíquia histórica”. Melhor e mais feliz não poderia ser a expressão escolhida.E nós que temos a pretensão de conhecer bem de perto a história da empresa quese denominava “Companhia de Navegação a vapor Itajaí-Blumenau”, por isso que aela prestamos durante vários anos, a nossa modesta colaboração, podemos falar decadeira, dizendo, em alto e bom som, sem receio de contestação, o que o vaporzinho“Blumenau” representou para a vida econômica deste majestoso e rico Vale do Itajaí. O “Progresso” e, posteriormente, o “Blumenau” marcaram, em verdade, umperíodo inconfundível grandeza, visto como foram eles o fator exclusivo de uma notóriatransição. A mesma que se operou com advento do veículo motorizado, que baniu paraum segundo plano as viaturas de tração animal. Marcaram, pois, uma época. As chatas, as peruas e todas as demais embarcações que trafegavam, até então,as águas, ora mansas e parcas, ora caudalosas e fartas, do soberbo Itajaí, se locomoviampela força única do homem, impulsionadas que eram por longos e fortes varejões,apoiados aos ombros dos míseros lancheiros. E aquelas penosíssimas viagens, máximerio acima, se eternizavam dia após dia, noite após noite, num verdadeiro trabalho deescravos. Quem quisesse demandar o porto de Itajaí, em busca de outras plagas teria dearrostar mil e uma peripécias que aqueles caminhos agrestes, tortuosos e cheios deperigo, impunham ao pobre viajante. Eis, porem, que, trazidos da velha Germânia, passam a singrar as águas doItajaí, primeiro o “Progresso” e depois o “Blumenau”.001-Anuario-004-175-204.indd 194 22/02/2011 10:54:47

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 195 Dá-se o milagre... Mas, o milagre do Progresso, o que vale dizer, palpável,concreto, real. Muda-se por completo a face da história. O que antes era aventura, com todo um cortejo, já agora, era progressoque despontava radioso, trazendo em seu bojo conforto, eficiência, segurança etranqüilidade. E como era pitoresco, agradável de se contemplar, quando, depois do terceiroapito – qual possante despertador a alertar e convocar os passageiros e curiosos,zarpeava o vaporzinho, espadanando e mergulhando as águas com as pás das suasduas fortes rodas laterais, embandeirado e faceiro, pejado de viajantes e conduzindo areboque uma, duas ou mais lanchas repletas das mais diversas mercadorias. Eram então - todas aquelas embarcações – o único, ou melhor meio de transporteentre Blumenau e o vizinho porto de Itajaí. Vale, pois, dizer que, durante algumasdécadas, a população deles se utilizaram para sua locomoção. Muito bem organizada e melhor dirigida era a empresa alemã que, inicialmente,superintendia a todos aqueles serviços de navegação fluvial. Além dos dois vapores, de um bom rebocador – o “Santa Catarina” - e de umaconsiderável frota de lanchas-reboque (chatas, pontões, peruas, etc.), dispunha tambéma empresa de um estaleiro otimamente aparelhado, que atendia com invulgar presteza atodos os trabalhos de reparo e conservação das embarcações que compunha a sua frota. O “Santa Catarina” foi então adquirido com a finalidade primordial de conduzirpara fora da barra os navios a vela (tão comuns naquela época) e outros barcos, serviçoeste que representava uma apreciável fonte de renda. Posteriormente, ou para sermos mais exatos, em 1919, a exemplo do que forafeito, pouco antes, com a Estrada de Ferro Santa Catarina, foi também encampada peloGoverno da União, a Companhia de Navegação a Vapor Itajaí-Blumenau, que passou,desde então, a considerá-lo como um prolongamento da mencionada ferrovia.001-Anuario-004-175-204.indd 195 22/02/2011 10:54:48

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 196 Por oportuno, abrimos aqui um parêntesis, a fim de narrarmos um fato que nãodeixa de ser interessante ao nosso caso. Decorrido já algum tempo da administração federal, quando o serviço fluvialsofria forte competição, já no próprio rio, já pelos transportes rodoviários que sedesenvolviam rápida e eficientemente, o saudoso e ilustre itajaiense João MarquesBrandão, cuja verve humorística era bastante conhecida de todos aqueles quetiveram a felicidade de privar da sua convivência, olhando, certa feita, a bandeiraque tremulava no topo do mastro principal do vaporzinho “Blumenau” e que traziaas iniciais E. F. S. C. S. F. – Estrada de Ferro Santa Catarina – Seção Fluvial – semvacilar, zombeteiro e irônico, como só ele sabia sê-lo, definiu: “Estrada de Ferro SemCarro e Sem Frete”... Passaram-se céleres os anos. E o Progresso, de mãos dadas com a Evolução,na sua marcha incessante, no espaço e no tempo, com a força e o poder de umaverdadeira avalanche, tudo vai levando de roldão, rasgando novos rumos, superandovelhos preconceitos, tornando obsoletas conquistas milenares. Assim, pois, nosso vaporzinho “Blumenau” – claro está – não poderia escapar àvoragem incoercível do progresso e da evolução.001-Anuario-004-175-204.indd 196 22/02/2011 10:54:50

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 197 Ele que, no seu tempo, foi fulcro, a alavanca propulsora do desenvolvimento eda prosperidade do Vale do Itajaí, já agora superado, arcaico e obsoleto – numa épocaem que cruzam os nossos céus em todas as direções e aos mais longínquos recantosda Terra, um sem número de possantes aperfeiçoadas aeronaves, em que transpõemas nossas rodovias, amplas e modernamente pavimentadas, milhares e milhares deveículos motorizados, cortando o nosso vasto continente em todos os seus quadrantes;numa época em que já se faz valer a energia atômica, e já se empreendem viagensinterplanetárias, - foi posto de lado, entregue à ação nefasta do tempo, o nosso velho“caixa de rodas”, o nosso tradicional vaporzinho “Blumenau”, que durante várias dezenasde anos, foi o “São Cristóvão” da nossa gente e das nossas coisas, numa luta aturadae sem tréguas. Portanto, justo, mas sobretudo nobre, o apelo aqui transcrito. Resta, pois, aoshomens de responsabilidade deste rico majestoso Vale, chamarem a si tão altruísticatarefa, tirando do abandono, verdadeiramente criminoso, em que jaz esse velho barco, detão gratas recordações, e colocando-o no lugar que merece, a fim de, como uma “relíquiahistórica” de inestimável valor, torná-lo ainda muito útil e altamente proveitoso. Nasceu na cidade de Itajaí aos 23 de fevereiro de 1903. Fez as primeiras letras na Escola de João Maria Duarte, aquele velho professor que deu as luzes do saber a várias gerações, ingressando, mais tarde, na Escola Alemã, ambas da sua cidade natal. Menino ainda aos 14 anos de idade, empregou-se na Companhia de Navegação Fluvial Itajaí-Blumenau, posteriormente encampada pelo Governo da União. Em 1919, foi transferido para Blumenau. Na E. F. Santa Catarina, subordinada à qual estava a “Seção Fluvial”, trabalhou durante mais de 20 anos, cujos serviços deixou em 1943. Ocupava o cargo de Chefe da 1ª Divisão- Contabilidade. Deixou os serviços na E. F. S. C pra empregar as suas atividades na Indústria Têxtil Companhia Hering, onde, na qualidade de seu procurador geral, ocupa, ainda hoje, o cargo de Secretário da sua Administração.001-Anuario-004-175-204.indd 197 22/02/2011 10:54:52

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 198 Itajaí menina Walson Simões Bidigaray Cem anos na vida de uma cidade, não é velhice. É uma infância bem formada, bemcimentada, bem alicerçada. No caso de Itajaí, então, é um início de tenra idade, poispelos caminhos da industrialização e da força econômico-financeira, tem de ser longo epróspero. O Brasil, pela sua constituição histórica e geográfica, a par de sua formaçãoétnica, vem amadurecendo na sua evolução de nação nova e pujante, oferecendo àscidades litorâneas e interiores, um prenúncio de progressos verticais, ciclópicos, emtodos os setores da vida dessas comunas. Agora, no limiar de um novo milênio, quando quase todos os quadrantes daTerra já tiveram a oportunidade de mostrar o seu apogeu, desde a China milenar,Oriente Médio, Europa, até a América do Norte, a vez do Brasil não pode estar longee, naturalmente, as comunidades brasileiras, em todos os recantos da pátria, também,terão o bafejo dessa grandiosidade social. Não devemos olhar pra trás, porque a impressão que nos causa, o desmantelosocial-econômico da vida brasileira, não deixa margem para confiarmos no futuroda pátria. A centralização administrativa do Brasil desgastou, demasiadamente, aspopulações interiores, levando para o centro das operações políticas federais, o maiorpunhado de arrecadação do produto das cidades pequenas do interior. Onde existe o maior espírito de brasilidade, não há duvida, é nas cidades dointerior, porque a terra lhe dá o que há de mais sentido na força econômica do país, queé o trigo, o arroz, o milho, a alimentação, enfim, e, com a produção rural e agrícola,sentem o verdadeiro calor da vida nacional. Não tem, nem existe ninguém no Brasil, quenão tenha e não pense com carinho e sentimento, quando se fala do centenário de umacidade, pois encontram na notícia a satisfação de um trabalho árduo e prolongado, parasuperar todas as fases difíceis de sua vida social. Itajaí, diga-se de passagem, é valente e valorosa e o seu povo tem levado devencida toda a sorte de agruras e vicissitudes, que cercou a trilha encetada pelos seusprimeiros habitantes, seus fundadores. Primeiro, uma fazenda e uma ermida; depois umaglomerado de casas, uma capela e um arruamento rústico; agora, em franca paridadecom os progressos hodiernos, uma cidade pujante, uma catedral e uma sociedade001-Anuario-004-175-204.indd 198 22/02/2011 10:54:53

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 199vigorosa, que faz valer a atuação de seus filhos nos pontos mais distantes da vidanacional e levando aos quatro pontos cardeais o nome de sua terra natal. Itajaí vai ficar jovem, mais bonita e mais simpática, porque está na época dainteriorização das coisas no Brasil; é o retorno ao campo, aos prados, como medidade salvação nacional. A mudança da capital do Brasil para o interior vai proporcionar àpopulação do “hinterland” um revigoramento na força produtiva de seus componentes,mercê do gosto e da satisfação que as pradarias e o trabalho calmo oferecem. Assim, quando essa cidade, onde temos bons amigos e onde passamos gratosmomentos de nossa existência, completa um centenário glorioso de vida municipal,prestamos a nossa sincera homenagem a seu povo probo e laborioso, fazendo votospara que o progresso de sua sociedade, da sua indústria, de seu comércio atinja ospináculos e a perenidade de uma Roma eterna. Walson Simões Bidigaray é natural da cidade de Jaguarão, no Rio Grande do Sul, onde nasceu aos 17 de abri de 1921. Tendo residido por varias anos em Itajaí, tornou-se um filho honorário da terra, pois a maior de sua juventude passou entre os itjaienses. Fez seus primeiros estudos em Pelotas, nos Colégios Sagrado Coração de Jesus e Gonzaga dos Irmãos Lassalistas e completou-os na Escola Amaro Cavalcanti no Rio. Atualmente é acadêmico de Direito da Faculdade Nacional de Direito e do curso de História da Universidade do Rio de Janeiro. É serventuário da Justiça do Distrito Federal, onde ingressou por concurso. Entre outros, colaborou durante muito tempo no “Jornal da Tarde” de Pelotas e foi Secretário de “O Cooperador”, revista que se edita no Rio.001-Anuario-004-175-204.indd 199 22/02/2011 10:54:54

Anuário de Itajaí - 1960 - Cem Anos de Município 200 Quando o município festejar seu segundo centenário Antônio Augusto Nóbrega Fontes Sim, porque isso acontecerá no ano 2060! Nós que agora nos empenhamos nas comemorações do seu primeiro aniversário,devemos deixar aos que vierem depois uma experiência, fruto de nosso trabalho e denosso amor. No Brasil, infelizmente, ainda não se acredita muito no significado dos “Festivais”como iniciativas artísticas, culturais, recreativas, de turismo. Gostamos muito, istosim, de improvisar. Com isto perdemos a oportunidade de nos valermos da experiênciaadquirida. Agora, por exemplo, estamos dando por paus e pedras para realizarmos as festasdo centenário do Município. O mais freqüente mesmo, é cada um dizer: “noutra eu não memeto!”. Aí é que está o erro. Pois noutra é que nos deveríamos nos meter para obtermosmelhores resultados. Toda esta Comissão que deu o melhor de seus esforços e de sua boavontade, deveria ser convocada em 62 para a realização de outra festa, na mesma época,que, em caráter permanente, marcasse sempre o aniversário da Cidade. Minha contribuição neste sentido, junto com o oferecimento de trabalhar por ela,é para o lançamento do “Festival de Itajaí”, com caráter permanente, realizado sempreneste mês de junho, um mês por si tão festivo, com as tradicionais noites de SantoAntônio, São João e São Pedro. O “Festival de Itajaí” terá a duração de uma semana, verdadeira semana deturismo, iniciativa inédita no Brasil. Uma cidade, por sete dias, se dedica exclusivamente a receber visitantes de todoo Brasil, para proporcionar-lhes dias de festa, alegria e encantamento. Programações as mais diversas, juntarão ao espírito recreativo deste Festivaluma alta contribuição cultural, de grande significação. Ao lado de festas de caráter social e popular, o teatro, a musica sinfônica, obailado, os salões de artes plásticas.001-Anuario-004-175-204.indd 200 22/02/2011 10:54:57


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