Anuário de Itajaí - 2002 301 Uma história de sebo Lilian Bittencourt dos Santos Jornalista, assessora de imprensa da Livraria Casa Aberta A Casa Aberta nasceu num desses dias brilhantes de maio, depois de ter vivido, poranos, na cabeça de José Roberto. Beto, como é conhecido pelos amigos, sempre foi um amante dos livros. Durantea juventude leu muito e até hoje, ler é seu lazer mais favorito. A idéia de montar umsebo nasceu em 1987, quando ainda cursava a Faculdade de História. Cultivando estesonho, começou a juntar livros. Em 1988 já tinha uma soma de aproximadamente 200 volumes. Beto vendia etrocava livros na faculdade entre colegas e professores do curso. Em 1990, conversandocom Ierecê, sua professora, descobriu que partilhavam da mesma vontade. Todo esse ano foi de projetos e economia para tornar concreta aidéia de abrir um espaço que viria a ser um dos mais importantespontos de referência para estudantes, músicos e todas aspessoas que de alguma maneira eram ligadas àsáreas culturais e políticas da cidade. A casinha, como é conhecida atéhoje, foi a primeira sede da Casa Aberta.Era uma pequena casa de madeira, comuma grande árvore na frente. Os únicoscômodos em que não se achavam livros,revistas e discos empilhados eram acozinha e o banheiro. Primeiro acervo comprado, casaalugada, faltava ainda um nome quebatesse com as idéias libertárias de Betoe Ierecê. Uma roda de amigos ajudou aescolher. Publicado na íntegra no Anuário deItajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 301 22/02/2011 11:02:39
Anuário de Itajaí - 2002 302 A vida em torno da dança Roberta Bittencourt dos Santos Jornalista Segunda-feira. Chego cinco minutos antes do horário marcado. A academia de dança ainda está fechada; estaciono minha bicicleta e espio através do vidro da janela a sala de recepção. Tudo escuro, não há ninguém. Olho através da grade do portão a garagem vazia na esperança de aparecer alguém. Quando resolvo parar de andar de um lado para o outro e sentar na calçada, um carro entra na academia com três pessoas: minha entrevistada, seu marido e sua filha de apenas dois anos, que me olha curiosa e sorri da janela. Vou até a sala onde Mery está acendendo as luzes para começarmos a conversar. Sento no sofá que fica ao lado da sala de dança. Observo que na parede estão pendurados certificados de cursos de dança fixados numa moldura e também há prateleiras com vários troféus e medalhas. Com uma expressão séria no rosto, ela senta ao meu lado, chama o marido e avisa para não deixar a filhinha nos interromper. Seus cabelos estão presos num rabo de cavalo e na camiseta há uma estampa de uma bailarina. A calça, de nylon, preta, é ideal para aulas de jazz. Durante oito anos, Rosimery Rosa da Rocha fez parte da equipe de Ginástica Olímpica de Itajaí e participava sempre dos Jogos Abertos de Santa Catarina (JASC). Quando fazia exercícios de solo, uma modalidade da ginástica olímpica que é só dança, se dava muito bem, e muitas pessoas elogiavam o seu talento e a aconselhavam a procurar mais informações sobre a dança. Então, lá pelos onze anos, começou a dançar. “Na época, não tinha nada na cidade, só um professor que era de Curitiba e estava dando aulas em Itajaí, por quanto tempo ninguém sabia, porque não tinha nem um lugar adequado para as aulas. Nossas aulas eram feitas na Sociedade Guarani” relembra. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 302 22/02/2011 11:02:40
Anuário de Itajaí - 2002 303 40 Anos do Colégio Cenecista Pedro Antônio Fayal (comemorado em 12 de abril de 2002) Ludgério Niebues Presidente de Conselho Comunitário da CNE/Itajaí Exmo. Sr. Prefeito Municipal de Itajaí, Jandir Bellini;exmo. Sr. Presidente da Câmara de Vereadores de Itajaí,Vereador Renato Ribas; exmo. Sr. Secretário “ad hoc” destasessão, Vereador Rubens Francisco Menon; Ilmo. Sr. Diretordo Colégio Cenecista Antônio Pedro Fayal, Prof. Vilmar Boni;exmo. Sr. Ênio Osmar Casemiro, homenageado com o títulode Cidadão Itajaiense; exmo. Sr. Desembargador Ayres GamaFerreira de Mello, homenageado com o título de CidadãoItajaiense; exmo. Sr. Augusto Emílio Dalçóquio, vice-prefeitode Itajaí; exmo. Sr. Deputado Federal Antonio Carlos KonderReis; Ilma. Sra. Dalva Maria Rhenius, Secretária Municipalda Saúde; ilmo. Sr. Prof. Edison d’Avila, Secretario Municipalda Educação; ilmo. Sr. Noemi dos Santos Cruz, Secretáriode Comunicação Social; demais Secretários; ilmo. Sr. Prof.Moisés Strommer, vice-reitor da Univali; ilmo. Sr. CarlosFernando Priess. Membro fundador do Colégio Fayal; ilmo.Sr. Euclides Visconti, representante da diretoria estadual daCNEC/SC; Ilma. Sra. Maria Izabel Pinheiro Sandri, Presidentada Associação Comercial e Industrial de Itajaí/ ilmo. Sr.Leonel Arcângelo Pavan, ex-aluno e eterno prefeito deBalneário Camboriú; exmas. Senhoras vereadoras; exmos.senhores Vereadores; demais autoridades; representantesde escolas cenecistas; imprensa; rádio – jornal – televisão;funcionários e professores do Fayal; queridos familiares;senhores: Para o Colégio Fayal e sua entidade Mantenedora,Campanha Nacional das Escolas da Comunicado, hoje é umdia não somente de festa pela comemoração de seu 40ºaniversário, mas, também, um dia de júbilo pela honra querecebe da Egrégia Câmara de Vereadores, ao se deslocar desua sede e instalar aqui esta sessão solene, em homenagemao evento que nesta data celebramos. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 303 22/02/2011 11:02:41
Anuário de Itajaí - 2002 304 O Museu por trás das cortinas Marco Antônio F. Ballester Jr. Acadêmico de História da Univali e estagiário da FGML O processo de catalogação do acervo do Museu Histórico de Itajaí Esse artigo pretende demonstrar o funcionamento dos processos de identificação, classificação e catalogação do acervo do Museu Histórico de Itajaí, desde a chegada das peças, através dos meios e processos pelos quais elas passam, até seu destino final: a exposição ao público. O objetivo é demonstrar o trabalho que não aparece aos olhos da população, o qual gera um cuidado maior não só por parte dos funcionários da Fundação Genésio Miranda Lins, mas, também, dos próprios visitantes. O trabalho vinha, ainda, incentivar o respeito e a admiração de todo o conjunto do Museu e, pro conseqüência, uma maior valorização do visitante com a sua cultura, principalmente no que se refere a construção e constituição da cidade dentro de sua história. A impressão do museu para as pessoas e sua função social Quando as pessoas visitam um museu, tem a impressão de que irão adentrar um local que cheira a “mofo”. Entretanto, no caso do Museu Histórico de Itajaí, acabam se impressionando com peças de mobiliário que teriam pertencido a uma pessoa “ilustre” da cidade, ou com alguma ferramenta tão rudimentar que o visitante se deslumbra ao imaginar a dificuldade que a pessoa encontrava ao manuseá-la para desempenhar sua função. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 304 22/02/2011 11:02:42
Anuário de Itajaí - 2002 305 Lá vem o ônibus Profª. Marlene Dalva da Silva Rothbarth Era preciso apressar-se porque o único ônibus só passava naquela hora da manhã. Lávinha ele, o ônibus, lançando fumaça, a 30 ou 40 km por hora, tocado a “gasogênio”.Passava no final da Rua Kurt Hering, na Barra do Rio, ali onde hoje funciona a Promenac.Os passageiros tomavam seus lugares, o motorista fazia a volta e se dirigia ao centro deItajaí. Este ônibus a que me refiro era de propriedade da família Silva e conheci como “oônibus da Cecília Benta”, o primeiro veículo coletivo a circular na cidade. Era um únicoônibus, não se sabe adquirido de quem; não era novo e, por isso, de vez em quando,deixava os passageiros no caminho. O filho da tal senhora Cecília, Hildo Silva, tinha um carro de praça e quando oônibus ficava na oficina para conserto era ele quem levava alguns passageiros até acidade. Os alunos que freqüentavam o Colégio São José, como os filhos do diretor daFábrica de Papel, Luís e Doroti Schmitt, minha irmã e eu, tínhamos a preferência. Demanhã bem cedo ele parava na frente da casa e nos levava até o Colégio, trazendo-nosde volta ao meio-dia. Naquele tempo, só as famílias abastadas tinham o privilégio de adquirir umautomóvel, veículo importado e muito caro para quem fazia parte da classe média. Quando se precisava de um veículo par atender a uma emergência ou parapassear, lançava-se mão de um carro de praça ou dos carros de mola de aluguel. Oponto principal para alugar um carro de praça era na Praça Vidal Ramos e, para umcarro de mola, era ao lado da Prefeitura de Itajaí, hoje Palácio Marcos Konder. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 305 22/02/2011 11:02:43
Anuário de Itajaí - 2002 306 Massas de Promessa, Ex-votose Religiosidade Popular Catarinense Edison d’Ávila Historiador Catolicismo popular do litoral de Santa Catarina A gente catarinense do litoral viveu sempre arraigada à forte religiosidade católica. Trata-se de herança cultural portuguêsa que, no caso da beira-mar de Santa Catarina, teve significativa contribuição açoriana desde a segunda metade do século XVIII. Nos Açores, a Igreja Católica encontrou especiais condições para fazer prevalecentes os valores da sua moral e cultura, muito contribuindo para isto a política colonial portuguesa de união entre a Igreja e o Estado e a peculiaridade das condições de isolamento e periódicos cataclismos vividos nas ilhas. Os ilhéus, por conta disto, construíram uma inquebrantável fé e profunda devoção ao sagrado. Esta crença açoriana, permeada ainda por mitos e forte misticismo, em Santa Catarina foi cruzada com a herança portuguesa vicentista, aqui já presente desde o século anterior. Era um catolicismo rústico, construído sem a interferência da hierarquia da Igreja, característico das camadas populares e eivado de intensa religiosidade no grupo familiar e comunitário. Os habitantes do litoral catarinense, pescadores e agricultores, vivendo, nos primeiros séculos da colonização, num regime de produção e autoconsumo, inclusive no plano religioso, construíram um igualitarismo também em suas relações com o sagrado. Os santos como que conviviam com as pessoas, o que fazia dispensável, em muitas ocasiões, a intermediação dos ministros da Igreja. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 306 22/02/2011 11:02:45
Anuário de Itajaí - 2002 307 Mistério de Santa Catarina Rodrigo de Haro Artista plástico, poeta, membro da Academia Catarinense de Letras Costas, Príncipe da Cilícia, descendia daquele Seleuco I, Generalde Alexandre, que às margens do Tigre, na região montanhosa daTurquia Oriental, levantou a casa dos Selêucidas. Casou-se com Sabinela, filha de Samaritanos, que lhe trouxe comodote terras do Egito, próximas à cidade de Alexandria, orgulhosa cidadedos Ptolomeus entre o Lago Mareotis e o Mediterrâneo – Leksandropolischamam-na os gregos e os turcos Iskandrieh. É a capital,o empório do Egito, da Arábia, da Núbia, cidade das milespeciarias e do livro. Um eremita, Ananias, instrui Sabinela e a conduzao Batismo. Assim a noiva do Príncipe Selêucida trazpara as núpcias, sob o véu sírio bordado, as sementesda nova fé. Estamos no fim do século III. A escola neo-platônicade Celso e Plotino confina com a tradição hebraica de Fílon,chamado também de Platão da Sinagoga. Athanásio, Clemente e Cirilo são leões da IgrejaOriental. A controvérsia ariana já divide os fiéis e a tudoincendeia. O monaquismo semeia o deserto com pequenascomunidades de oração e cabanas de cenobitas. Quando morre o príncipe num acidente de caça (eroguemos sempre por uma bela morte!) a viúva retira-separa os distantes limites do reino, onde vive por algunsanos ainda envolta em seus véus de cinza. Ficara das brevíssimas núpcias uma filhachamada Catarina, contemplativa e atenta, que àsombra dos cedros da Montanha Negra, ali no velhoPalácio desabrochava quase sozinha. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 307 22/02/2011 11:02:46
Anuário de Itajaí - 2002 308 Monumentos José Roberto Severino Professor universitário Se pedir a Deus pelo meu prazer não for pecado, vou rezar pra quando eu voltar, rever todas as brincadeiras do passado, cortejar o meu serrado e em dia de feriado, viva o N cordão azul e encarnado! Eu sei, serei feliz de novo, meu povo, deixe eu chorar com você (Djavan, Serrado) o dia primeiro de janeiro de 2001, numa ensolarada manhã de segunda-feira,alguns homens deram início aos trabalhos de derrubada de um dos edifícios mais antigosde Itajaí. Confesso que parei perplexo, e assisti a tudo boquiaberto. Imediatamentelembrei-me do Consulado Alemão que funcionava naquelas instalações – lá pelo iníciodo século XX quando os fluxos migratórios demandavam problemas que justificavam suaexistência no pequeno aglomerado urbano na foz do Itajaí-Açu. Nos seus anexos, quecompletavam a quadra, funcionou uma barbearia, um botequim e, se não me engano,uma sapataria. Do outro lado da praça outro casarão, também eclético e imponente, masque foi completamente restaurado e que abriga, atualmente, os escritórios da ReceitaFederal, ocupada, entre outras coisas, na fiscalização das atividades aduaneiras. Na medida em que as paredes caíam, ouvia comentários: Um absurdo!, diziamuns; Vão fazer um estacionamento, conjeturavam outros; Era uma casa prostituiçãomesmo, afirmavam os mais moralistas. De maneira geral, a noção de que o velhodeveria dar lugar ao novo estava presente em boa parte dos comentários. E tenteientender o que isso queria dizer. Ao caminharmos pelas ruas da cidade em que vivemos, podemos ter a impressãode que aquele burburinho do “progresso” sempre existiu. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 308 22/02/2011 11:02:47
Anuário de Itajaí - 2002 309 Uma pequena homenagem a um grande homem Euclides José da Cruz Historiador Falar do saudoso Paulo Bauer é, para mim, uma grande responsabilidade, visto queoutras pessoas gostariam de escrever sobre este ilustre itajaiense. Eu não o conhecipessoalmente, não podendo testemunhar seus feitos. Porém, ao entrar em contato como vasto material existente, percebi o grande homem que foi. Portanto, é com prazer quehomenagearei esse baluarte da história da nossa cidade. Paulo Bauer nasceu em Itajaí no dia 21 dejaneiro de 1910. Era pequena e pacata cidade.Entretanto, seguia numa face de construção,trabalho e progresso, governada pelo prefeitoSamuel Heusi. Filho de Jacob Bauer e Anna SchefferBauer, neto do alemão João Bauer, imigrante estevindo ao Brasil em meados do século XIX. Seus estudos iniciais foram nesta cidade, nocolégio das irmãs que ficava na Rua Pedro Ferreira.Isso quando o menino Paulo tinha seus oito anos.Continuou os estudos em Brusque, devido atransferência de residência dos seus pais. Por fim,concluiu seus estudos no Colégio Catarinense emFlorianópolis, já nos fins do anos de 1926. Naquele tempo, a educação na regiãoera quase inexistente, havendo poucas escolasprimárias; quem poderia continuar seus estudosprocurava os colégios ginasiais na Capital ou emoutros estados. Após completar os estudos, foi morar umtempo em Nova Trento (entre 1927 e 1938),onde seu avô montara um armazém de secos emolhados. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 309 22/02/2011 11:02:47
Anuário de Itajaí - 2002 310 Helen Francine Acadêmica de Jornalismo da Univali Quando pessoas preocupadas com a cultura resolveram se reunir, porque acreditamem um caminho comum, o que pode acontecer? Em 1982, um encontro desses resultouna criação do jornal cultural “O Papa-Siri”. O grupo não estava sozinho, contava com o apoio do Conselho Municipal deCultura (COMUC), então sob a presidência de João Marques Brandão Neto, o qual eramuito envolvido com a cultura local. O poder público logo incentivou e apoiou a idéia,através do Secretário do Desenvolvimento Social, Professor Edison d’Ávila, e o entãoPrefeito Municipal de Itajaí, Amílcar Gazaniga. Dessa forma, o grupo responsável pela fundação do jornal era formado peloDiretor de Edição (João Marques Brandão Neto), Editora-Chefe (Constância TeresinhaSeverino), Conselho de Redação (Rosa de Lourdes Vieira Silva e Sônia Moreira), Arte eDiagramação (Adilson Pacheco) e colaboradores (Jéferson, Léo, Magru, Edison, Osmare Marisselva Camargo). No começo, o Papa-Siri mesclava em suas edições duas correntes depensamento: cultura erudita e idéias de quem acreditava que o jornal devesseespelhar a cultura popular. Desde o início, seu projeto é de um jornal com periodicidade mensal, só quenem sempre houve uma regularidade. Ao longo dos anos, as dificuldades financeiras,a falta de apoio e constantes mudanças na equipe de trabalho resultaram em algunsmeses sem uma nova edição. Basta perceber que sua fundação se deu em 1998. Hoje,o jornal deveria estar no volume 20, mas devido às dificuldades que existiram (e quecontinuam a existir) a periodicidade encontra-se atrasada em 05 anos. Mesmo assim, énotável a preocupação com a riqueza do conteúdo, característica que faz do jornal serdenominado de “alternativo” por uns e visto como revista literaria pela mídia (impressaescrita). Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 310 22/02/2011 11:02:48
Museu Histórico de Itajaí – 20 anos Discurso proferido pelo Presidente da Fundação Genésio Miranda Lins (Museu e Arquivo Público de Itajaí)Prof. Edison d’Ávila, em homenagem prestada pelo Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina à esta instituição pela passagem de seus vinte anos, no dia 16 de outubro de 2002. Senhoras e Senhores. A cidade de Itajaí, vivendo grande prosperidade econômica, decorrente do acelerado desenvolvimento do porto e sendo sede de uma fundação de ensino superior, chegou ao final dos anos setenta do século passado sem cuidar da preservação do seu patrimônio histórico e cultural. Uma excelente oportunidade de resgatar esta dívida cultural havia sido perdida em 1960, quando das comemorações do 1º Centenário da Emancipação Política de Itajaí, ocasião em que uma grande exposição histórica fora montada sob a coordenação de Antônio Augusto Nóbrega Fontes. Houve receptividade à idéia na cidade, interesse e gosto do público, porém faltou quem assumisse o desafio e o comprometimento do poder público municipal, sem cujo concurso dificilmente uma iniciativa desta monta poderia prosperar. E, então, o homem, cujo sonho era dotar sua cidade natal de um museu, surgiu. Chamava-se João Amaral Pereira (1923/ 1983), que desde criança demonstra especial cuidado em colecionar peças e objetos ligados à vida social da cidade. Tornara-se um apaixonado pela história e pela preservação do patrimônio cultural. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2002.001-Anuario-009-2002-295-312.indd 311 22/02/2011 11:02:50
Fim de Anuário de Itajaí - 2002001-Anuario-009-2002-295-312.indd 312 22/02/2011 11:02:52
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Anuário de Itajaí - 2003 314 Apresentação O Anuário de Itajaí – 2003, publicação voltada para a pesquisa histórica através de artigos de historiadores, jornalistas e pesquisadores, além de profissionais de outras áreas, como artistas plásticos, poetas e cronistas, enriquece o acervo de obras de referência abordando os mais variados e significativos temas relacionados com a história de Itajaí e região. São histórias de vida, caracterizadas, nos textos de Giovana Kindlen (Homens do mar), Antonio Lanzoni (José João Corrêa, o Zé do Aipim), Alejandra Luna e Marlene de Fáveri (Irene Boemer), pelas trajetórias particulares que se mesclam no cotidiano da comunidade. Histórias coletivas, produzidas pelas necessidades comuns, como a Abertura das Estradas Itajaí-Brusque (Tina Rosa), o Herbário Barbosa Rodrigues em interdisciplinariedade (Flávio André da Silva), a formação do Arraial dos Cunhas (Luís Saulo Adami), os Cemitérios de Itajaí (André Pinheiro). A comunidade, seja por grupos ou coletivamente, protagonista de uma identidade, confere a Gastronomia em Itajaí e Região (Rodolfo Wendhausen Krause), o Carnaval do Povo (Sicília Vechi), a Festa Nacional do Colono (Elizângela Regina Cardoso), as dificuldades étnicas (Silêncio e Violência – Francisco Alfredo Braum Neto). As artes, inerentes aos homens e lugares e, por isto mesmo, participantes ativas da história: a xilogravura de Augusto Raio (Márcia d´Ávila), o Salão de Artes de Itajaí (Charles Narloch), Ofélia dos Navios, de Lausimar Laus (Hélio Floriano dos Santos), ao Contínuo Ato (Artêmio Zanon), além de outros poetas de Itajaí que ora publicamos (Cristiano Moreira, Fernanda Mazzotto, Genésio Adolfo, Didymea Lazzaris – nas diversas páginas do Anuário). Homenagens aos que fizeram e fazem parte desta história, a cidade, se iniciam pelos cem anos de nascimento de Genésio Miranda Lins, patrono da Fundação que leva seu nome; ao Monsenhor Vendelino Hobold; aos veteranos da FEB (Edison d´Ávila). Boa leitura Os editores001-Anuario-010-2003-313-334.indd 314 22/02/2011 11:03:53
Anuário de Itajaí - 2003 315 Genésio Miranda Lins – 1903/2003 Cem Anos de Nascimento Edison d’Ávila Presidente do Conselho Curador da Fundação Genésio Miranda Lins Grata e emocionada homenagem presta a Fundação Genésio MirandaLins, hoje, dia 26 de agosto de 2003, a seu ilustre patrono, na passagemdo centenário do seu nascimento, mandando celebrar, aqui, na Capelado Colégio Salesiano, Santa Missa de Ação de Graças. A nossa gratidão é, com certeza, também a gratidão de todaItajaí, de suas inúmeras instituições empresariais, sociais, culturais,educacionais e religiosas que receberam deste “ilustre conterrâneo” suaatenção, seu apoio, seu trabalho e seu carinho. Empresário e homem público de sucesso, Genésio MirandaLins esteve à frente de iniciativas exitosas e que muito destacaramItajaí, sua terra natal, bem como Santa Catarina: Banco Indústriae Comércio de Santa Catarina S/A e a FEPEVI, hoje Universidade doVale do Itajaí - UNIVALI, podem muito bem ser exemplos daquelasiniciativas de que participou e cujo significado econômico e sócio-cultural tiveram repercussões perenes no desenvolvimento de nossacidade e do nosso Estado. Mas Genésio Miranda Lins foi, antes de tudo, um itajaiensede extremado amor por sua terra e por sua gente. Preocupado comtudo aquilo que tivesse significado para o crescimento de Itajaí e paraa felicidade de seus conterrâneos, a todos buscava ajudar e a tudose disponibilizava, caso a sua ajuda ou a sua participação fossemnecessárias para êxito de uma boa causa itajaiense. Assim, ei-lopresidente da Associação Comercial e Industrial, presidente do ClubeNáutico Almirante Barroso, presidente da Sociedade Guarani, primeiropresidente da FEPEVI. Também fundador do Banco Inco, juntamente com empresáriosdo Vale do Itajaí; do Ginásio, hoje Colégio Salesiano Itajaí; da RádioDifusora Itajaí; do Rotary Club. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 315 22/02/2011 11:03:54
Anuário de Itajaí - 2003 316A abertura das estradas Itajaí-Brusque Tina Rosa Escritora e Fotógrafa Documentos preservados pelo Museu e Arquivo Histórico do Vale do Itajaí-Mirim,a Casa de Brusque, mostram a colonização de Itajaí e Brusque a partir de 1860. Nestesdocumentos, publicados na revista Notícias de Vicente Só, encontramos váriasreferências aos bairros Arraial dos Cunhas, Brilhante, Itaipava (chamada Taipava emalguns relatórios) e Limeira. O diretor da então colônia Itajahy – Bursque, o barãoaustríaco Maximillian Von Scneeburg, escreveu ao presidente da Província de SantaCatharina, Adolpho de Barros Cavalcanti de Albuquerque Lacerda, em 29 de maio de1866, falando da necessidade de abertura de uma estrada ligando Brusque a Itajaí, naqual faz referências ao ribeirão do Brilhante e ao serrador José da Cunha. Até então,suas populações usavam o rio Itajaí-Mirim para se locomover. Ao longo do rio, haviavários pequenos portos fluviais, sendo um dos mais conhecidos o da rua do Tabuleiro, noterreno da atual Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina(Epagri), no Quilômetro Doze. Segundo alguns pesquisadores, esta rua antecedeu aconstrução da estrada Itajaí – Brusque, inaugurada em 1875. A estrada existente na época tinha apenas duas braças de largura, o quedificultava o tráfego quando carroças se encontravam em direções opostas. Cada braçacorresponde a 2,20 metros. Schneeburg queria uma abertura maior, pelo menos trêsbraças, passando por terrenos de particulares, [...] rastos e trilhos em parte na margem esquerda, em parte da margem direito do rio Itajahy-Mirim, e várias picadas estreitas intransitáveis em uma multidão de direções, cheios de tocos, árvores caídas, raízes, de buracos e fundões pantanosos, sem descortinamento por onde não passa sol nem vento. Estas picadas são rastos antigos e novos de puxar madeiras para as serrarias. Vários ribeirões maiores e menores atravessam esta rede de péssimos rastos e trilhos, sem pontes, nem pontilhões, ou somente tais que feitos ou concentrados com palmitos apodrecidos ou outros materiais leves à mão pelos raros passageiros no seu trânsito momentâneo, abatem debaixo do peso dos animais, que quebram pernas ou se precipitam e atolam nos fundos pantanosos. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 316 22/02/2011 11:03:55
Anuário de Itajaí - 2003 317 Homens do Mar O peixe nosso de cada dia Giovana Kindlen Jornalista A série de reportagens Homens do Mar, publicada pelo Jornal de Santa Catarina em julho de 200, foi considerado pelo Prêmio Esso, o mais D tradicional e reconhecido prêmio do jornalismo brasileiro, uma das três melhores matéria produzidas em jornais do Brasil no ano 2000. e calças arregaçadas e sem se importar com a água gelada e o ventofrio que sopra do mar numa terça-feira nublada de inverno, Osvaldo deMelo, o Seu Vardinho, 67 anos, e Dorival Gonzaga da Silva, o Seu Vavá, 49anos, saem d’água com o balaio cheio de tainhas, e vão tirando os 1.518peixes na areia branca da Praia dos Ingleses, conhecida pelos turistas comoRetiro dos Padres, em Bombinhas, a 51 quilômetros de Itajaí. Seu Vardinho, mestre de barco aposentado, está na pesca desde“pequenininho”, como ele próprio diz. Aos 10 anos de idade já acompanhavao pai nas curtas viagens e fazia pequenos serviços a bordo. Privilegiado porter herdado um bom pedaço de terra junto à praia, foi também com o pai eo avô que o velho pescador aprendeu a gostar do mar e a retirar dele umdos primeiros alimentos do homem. Hoje, marcado pelas rugas profundasaumentadas pelo sol, ele relembra: “Saía de manhã para a escola e quandovoltava, à tarde, ia matar peixe. Naquele tempo, meu pai era pobre, masa gente ia vivendo... Hoje estou aposentado na pesca e vim para minhapropriedade para continuar pescando aqui”. Depois de meio século entre barcos, peixes e a imensidão azul, elesabe com certeza da importância de se preservar os costumes, legado tambémdeixado por seu pai. Hoje, conforme Seu Vardinho, a pesca da tainha serveessencialmente para manter a tradição. A pouca quantidade do pescado nãoassegura uma boa rentabilidade, mas serve principalmente para manutenção dasredes e canoas.“Estou incentivando netos e filhos a ficar na pesca. Mantemos issopela tradição e não pelo valor em dinheiro. Os lances não acabarão se todo mundotiver consciência de zelar pela criação do peixe, principalmente na Lagoa dos Patos,no Rio Grande do Sul”, afirma com convicção. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 317 22/02/2011 11:03:56
Anuário de Itajaí - 2003 318O carnaval do povo: blocos carnavalescos e escolas de samba (Itajaí: 1980/2003) Sicília Vechi Jornalista Por meio da união de alguns blocos carnavalescos, apoiados por comunidades negrasresidentes em Itajaí, surgiram as escolas de samba no município. Colonizada por europeusde origem italiana e alemã, como a maioria das cidades catarinenses, Itajaí evidenciatambém os seus fortes laços com a cultura portuguesa, herdada dos ascendentes açorianos.O carnaval na cidade, no início do século XX, tinha características muito semelhantes aoentrudo português, cujos festejos eram comemorados pelas ruas, com trotes. Os desfilesde rua promovidos pelos clubes itajaienses eram muito elitistas, o que se foi alterandona década de 80, quando se constatou uma efetiva participação das comunidades maiscarentes em apresentações durante o carnaval. Diante deste dado, é importante ressaltarque o carnaval itajaiense da atualidade reflete manifestações culturais dos carnavais deoutrora, por peculiaridades encontradas nos festejos de momo da cidade. Desde o século XIX, o carnaval de Itajaí era conhecido como um dos maisanimados festejos de momo de Santa Catarina. Suas características, no entanto,divergiam bastante do que se observa nos desfiles de rua de hoje. Não só pelo curso dotempo, mas por questões sociais e econômicas que envolveram a organização da festano decorrer dos anos. Até a década de 60, imperou o modelo europeu na concepção do carnaval deItajaí. Essencialmente familiar, a folia do momo acontecia nos clubes da alta sociedadeem corsos (automóveis enfeitados que conferiam a seus donos alto status social) pelasruas principais da cidade, onde a elite ostentava o luxo nas fantasias e nos carros demutação, que eram alegorias gigantescas, controladas por roldanas e manivelas; estasabriam e fechavam compartimentos, revelando foliões em destaque. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 318 22/02/2011 11:03:56
Anuário de Itajaí - 2003 319 A gastronomia em Itajaí e região: origens e tendências Rodolfo Wendhausen Krause Coordenador do curso de Gastronomia da UNIVALI A gastronomia do litoral Norte de Santa Catarina tem características de simplicidadee uso de poucos condimentos, com técnicas de preparação artesanais e caseiras. Nasua origem vamos encontrar, basicamente, a cultura indígena e açoriana (a partir de1748, a Ilha do Desterro começa a receber os Açorianos), que irão fundir-se em umacultura culinária que tem no uso do pirão, das raízes (como a mandioca, o cara e o taiá),da carne de caça e de aves, dos peixes e dos frutos do mar, sua essência. A farinhade mandioca e seus derivados, como o pirão, são a herança mais forte deixada pelosindígenas. Ainda dos indígenas, nos acompanham até hoje a canjica, a tapioca, o beiju,o polvilho, a pamonha e a paçoca. O pirão permanece até nossos dias e pode ser preparado de três formas: a primeiraé o escaldado onde a farinha é misturada lentamente a um liquido fervente (água, leiteou caldo), obtendo-se uma textura de papa granulada; a segunda forma é pela diluiçãoda farinha em um liquido frio (água, leite ou caldo) e posteriormente, levado o mesmo aponto de fervura, obtendo-se desta forma uma textura de goma e, a terceira e última, queconsiste na mistura da farinha com um líquido não fervente, obtendo-se, como resultado,uma papa esbranquiçada, chamada em muitos lugares de “Jacuba”. Dos açores, vieram os costumes dos cozidos, do uso de temperos (como a salsa,a cebolinha, o cominho, a pimenta, o cravo, a hortelã, o louro, a cebola eo alho), as sopas derivadas da açorda e os doces. Os açorianos, aquichegando, tiveram que se adaptar aos produtos daterra, substituindo, integralmente, a farinha de trigopela de mandioca e de milho, e a carne bovina e deovinos (apesar de Açores ser um arquipélago,a base de sua alimentação não eram os peixese frutos do mar e sim, a carne de ovinos ebovinos), pela de caça e pelos peixes e frutosdo mar. As formas de preparo dos alimentoseram bastante rudimentares e simples,tradição que, de certa forma, permaneceaté os dias de hoje. Publicado na íntegra no Anuáriode Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 319 22/02/2011 11:03:57
Anuário de Itajaí - 2003 320 Festa Nacional do Colono em Itajaí Elizângela Regina Cardoso Jornalista A Festa Nacional do Colono hoje é considerada a segunda maior festa do município e consta no calendário de eventos da Prefeitura Municipal de Itajaí, da Santa Catarina Turismo S/A – SANTUR, e do Instituto Brasileiro de Turismo – EMBRATUR. Em meio às dúvidas com relação à formação desta festa, e com a deficiência de informações sobre a sua real origem, resolvi pesquisar e realizar um resgate histórico, através do livro-reportagem intitulado Raízes, com o objetivo de perpetuar a trajetória da Festa Nacional do Colono para evitar que se percam memórias fundamentais para a construção da história do meio rural de Itajaí e de seus habitantes. Para desenvolver este livro-reportagem, utilizei a pesquisa bibliográfica, documental e de campo, com ênfase nas duas últimas. Entrevistei colonos, lideranças do meio rural e pessoas envolvidas na organização da festa durante a sua trajetória. Por ser descendente de agricultores, senti imenso orgulho em escrever sobre esta festa, que é considerada o maior evento em homenagem ao colono no Estado. No livro-reportagem Raízes, procurei reunir informações sobre todas as edições da festa, dando ênfase para algumas que marcaram a história, como também levantei sucintamente informações e dados sobre a zona rural de Itajaí. Em poucas palavras, tentarei resumir o livro-reportagem Raízes, que resgata a história da Festa Nacional do Colono de Itajaí. A Festa do Colono surgiu em 1981 por iniciativa da Prefeitura Municipal de Itajaí, através da Secretaria de Desenvolvimento Rural em parceria com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Segundo o secretário de desenvolvimento rural da época, Jorge Chaves, o objetivo da criação da festa era mostrar que além da pesca e do porto, o município de Itajaí também tinha vida agrícola. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 320 22/02/2011 11:03:58
Anuário de Itajaí - 2003 321 José João Corrêa: O Zé do Aipim Antônio Lanzoni Bel. em História No final da primeira entrevista, correuuma lágrima no rosto do seu Zé. Emocionadono relato da sua atividade como benzedor,ficou claro o quanto seria difícil conhecer suahistória. O tema central para ele sempre forasuas ervas e as doenças por ele tratadas. Nãoestava preocupado em falar da sua vida paraalém das suas práticas curativas. Durante asentrevistas, ao questioná-lo sobre determinadoassunto referente à sua trajetória de vida,sempre, em todos os momentos, iniciava outerminava em suas ervas. Refletindo com EcléiaBosi, a memória do narrador está intimamenteligada à importância que esse creditou a certosacontecimentos de sua vida, ou seja, aquiloque foi / é de maior significado. Perceba o leitor o quanto estava e está presente no seu cotidiano o trabalho comas ervas seguidos de rituais; numa frase, seu trabalho com práticas curativas é a suavida. É nisso que ele acredita, e com muito entusiasmo sugere: Vamos marcar o nomede todas as ervas e pra que elas servem. Geralmente seu Zé iniciava a entrevista não com perguntas, mas com relatossobre a eficácia dessa ou daquela erva. Sempre as ervas! Num total de 11 entrevistase conversas em passeios na sua horta, realizadas entre 30/04/01 à 30/10/01, nessecapítulo trago ao leitor a vida de José João Corrêa, o Zé do Aipim, ou simplesmenteseu Zé, como já disse anteriormente, até onde esse permitiu e até onde fui capaz deregistrar. Por que Zé do Aipim? “Dos 25 aos 30 anos eu vendi aipim em Salseiros.Quando eu ia chegando com a carroça cheia de aipim, a criançada vinha gritando: lávem o Zé do Aipim!, e ficou. A pessoa de São Paulo, quando vem aqui, me chama deZé da mandioquinha”. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 321 22/02/2011 11:03:59
Anuário de Itajaí - 2003 322Bairros de Itajaí: Arraial dos Cunhas Luiz Saulo Adami Jornalista e escritor Como morador do Arraial dos Cunhas desde que nasci, sempre procurei entender umpouco sobre a sua história e suas origens. Minhas primeiras curiosidades foram saciadasno balcão do comércio de meus pais que, a exemplo de meus avós, não nasceram nestebairro, mas aqui construíram sua trajetória como trabalhadores e personagens destahistória. Enquanto trabalhei como repórter, colunista e editor de jornais em Brusque eItajaí, estive atento para qualquer história, artigo ou entrevista que pudesse resultar,no futuro, em fonte de pesquisas para meu livro História secreta do Arrayal dosCunhas, ainda inédito. A família Cunha é linhagem das mais antigas que descendeu de Dom CaioGutierres da Silva da Quinta da Cunha, Governador das terras do Rei Dom Afonso deLeão. Fernão Dias da Cunha, filho de Gutierres da Silva, tornou-se Senhor da Quinta,advindo seu sobrenome e dando início a esta família. Membro do Conselho do Reino, eleocupou diversos cargos importantes na Casa Real, foi Provedor da Ordem de Cristo eMestre da Ordem da Rosa. Por Decreto do Rei, lhe foi concedido o Brasão de Armas. Bisavós da professora Digecil Maria da Cunha, o Coronel João Antonio da Cunha esua mulher, Leonor Correia da Cunha, deixaram Portugal no século XIX a bordo do navioque “ancorou no porto do Moura”, em Tijucas, Santa Catarina. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 322 22/02/2011 11:04:00
Anuário de Itajaí - 2003 323Irene Boemer: fragmentos de sua história entrelaçada à radiodifusão em Itajaí Alejandra Garnizo Luna Historiadora Marlene de Fáveri Doutora em História, professora da UNIVALI e UDESC Desde o discurso do Presidente da república, Epitácio da silva Pessoa, em 07 desetembro de 1922, transmitido radiofonicamente do alto do Corcovado para pontos do Riode Janeiro e estados vizinhos, durante as festividades em comemoração ao centenário daIndependência, passaram-se 20 anos até que a sociedade itajaiense contasse com o rádiocomo fonte de entretenimento e informação. Como se lê no Anuário de Itajaí de 1949: A Rádio Difusora Itajaí foi fundada em 1942 e funcionou em caráter experimental até 1947, ano em que recebeu seu prefixo ZYK-9. A estação primitiva era constituída de um minúsculo transmissor de onda local e os seus estúdios eram localizados na sede da Sociedade Guarani. Em 1947, foi definitivamente instalada na atual sede, sendo equipada com um moderno aparelho de 100 watts. Os testes com a nova aparelhagem provaram que em horas de melhor interferência o seu alcance atinge todos os estados do sul do Brasil, tendo sido captada até na Bahia, conforme provam as cartas de ouvintes (Anuário de Itajaí, Editora Aurora, 1949. A atual sede são as instalações da Rádio Difusora no Edifício Catarinense, Rua Hercílio Luz, centro de Itajaí, onde funciona até os dias de hoje). A rádio ganha o prefixo ZYK-9 que “oficializa” a Rádio Difusora de Itajaí, sendo quedeste acontecimento, Irene Boemer nos conta que teve o privilégio de anunciar os novostempos, orgulhosa: “A madame aqui que deu o prefixo da rádio... Alô amigos da ZYK-9”. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 323 22/02/2011 11:04:02
Anuário de Itajaí - 2003 324 Herbário Barbosa Rodrigues: interdisciplinaridade escolar Flávio André da Silva Professor de Geografia da Rede Municipal de ensino de Itajaí Este Trabalho de Conclusão de Curso investigou a importância do Herbário BarbosaRodrigues, como recurso auxiliar para o ensino-aprendizagem, do conteúdo “Vegetaçãodo Estado de Santa Catarina” pelos alunos da 6ª série, turma 1, Ensino Fundamental daEscola Básica Gaspar da Costa Moraes, de Itajaí/SC. O Herbário Barbosa Rodrigues é uma ONG de caráter científico, voltado paraa área botânica, onde estão catalogadas cerca de 98% da flora do Estado de SantaCatarina. Fundado em 1942, está localizado no município de Itajaí (SC). Contribui parao estudo das diversas formações vegetais e sua distribuição pelo território catarinense,sendo um órgão reconhecido nacionalmente e internacionalmente. Para a realização deste trabalho de conclusão de curso, a população envolvidaforam os alunos da 6ª série, turma 1, do Ensino Fundamental da Escola Básica Gasparda Costa Moraes, situada no bairro Fazenda, município de Itajaí (SC). Criada em1943, como Escola Primeira da Fazenda, passou por diversas denominações até sertransformada em Colégio. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 324 22/02/2011 11:04:03
Anuário de Itajaí - 2003 325 Silêncio e violência: ser negro no Bairro Praia Brava em Itajaí Francisco Alfredo Bram Neto Bel. em História e membro do Núcleo de Pesquisa “Oficina de História Oral” Em 1996, fui lecionar história na Escola Básica Iolanda Ardigó, no bairro PraiaBrava em Itajaí. No decorrer do ano letivo, observei uma rotatividade considerável dealunos na escola, boa parte desses vinha de outras cidades; nesse momento, veio-me umquestionamento. O que eles conheciam da história do bairro? Muito pouco, quase nada! Assim, acompanhado de alguns alunos, fomos conversar com os moradores maisantigos do bairro munido de um gravador; registramos algumas conversas. O texto que segue já está calcado na entrevista realizada com os senhores JoãoFrancisco da Silva (41 anos) e Wilson Alexandre Landau (42 anos), realizada na residência dosenhor João, no Bairro Praia Brava, em 11/05/96. Forneceram elemento para refletir sobrea produção de silêncios na historiografia, principalmente no que diz respeito a problemáticada escravidão, da violência étnica e social engendrado no preconceito racial. No decorrer da pesquisa, começamos a perceber o silêncio provocado pelahistoriografia tradicional. Como passamos a perceber isso? Nas aulas de história do Brasilpercebemos que a idéia de democracia racial (sobre o assunto ver: FREYRE, Gilberto, CasaGrande & Senzala. Brasília: Unb, 1963) ainda está veiculada nos manuais de história. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 325 22/02/2011 11:04:04
Anuário de Itajaí - 2003 326Breve histórico dos cemitérios de Itajaí André Pinheiro Jornalista Os primeiros mortos de Itajaí eram sepultados do outro lado do rio Itajaí-Açu.De acordo com o historiador Edison d´Ávila, esses enterros eram realizados em umanecrópole de modestas proporções, na localidade onde hoje fica o vizinho município deNavegantes. A construção da primeira necrópole itajaiense foi apenas parte de um contextode desenvolvimento que, gradativamente, chegava à região. No dia 31 de março de1824, o bispo do Rio de Janeiro, Dom José Caetano da Silva Coutinho, autorizava acriação do Curato do Santíssimo Sacramento de Itajaí. Apenas dois dias depois, ocasal José Coelho da Rocha e Maria Coelho da Rocha, conhecidos como grandesdevotos do Santíssimo Sacramento, doavam as terras para a construção dacapela e do cemitério, com a condição de receber, em troca, sepultura esalvação para suas almas. O local descrito pelo documento de doação do terreno da IgrejaMatriz, assinado em 02 de abril de 1824, fica próximo ao Rio Itajaí-Açu, nofinal da Rua Hercílio Luz, onde hoje existe a Praça Vidal Ramos e a Igrejada Imaculada Conceição, primeira Matriz da cidade. Um ano depois dadoação das terras, ali foi construído, ao lado da capela de pau-a-pique,o pequeno cemitério, que não ficou registrado em qualquer fotografiaou ilustração, o que talvez seja um indício do horror à morte existente,já àquela época, no imaginário dos moradores locais. Terrores e temores à parte, o cemitério permanece semproblemas no local até 1860. Com a emancipação política deItajaí, no entanto, começam as reclamações: é preciso afastara necrópole, empurrando-a para além dos limites urbanos, quenaquele tempo se estendiam somente até a altura da Rua FelipeSchmidt. Mesmo com atraso de aproximadamente de um século,as queixas contra a permanência do cemitério na região centraleram sinais da modernização que chegava, trazendo consigo aautoridade conferida aos saberes médicos e ao conhecimentocientífico da época. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 326 22/02/2011 11:04:05
Anuário de Itajaí - 2003 327 Vinte anos de Ofélia dos navios Hélio Floriano dos Santos Academia Itajaiense de Letras A literatura itajaiense comemorou no ano de 2003 os vinte anos da publicação doúltimo livro de Lausimar Laus. Intitulado de Ofélia dos navios, o romance foi publicadopela consagrada Editora Lunardelli cerca de três anos após sua morte. Ofélia dos naviosé uma volta da autora ao seu território de infância, a cidade de Itajaí e sua inesquecívelBarra do Rio.Vida e obra Lausimar Maria Laus nasceu na cidade de Itajaí no dia 16 de abril de 1916. Filhade Pedro Paulo Laus – oficial da Marinha Mercante condecorado por participar das duasgrandes guerras mundiais – e Maria Stuart Laus – professora do ensino elementar.Foi casada duas vezes, sendo que ficou viúva do oficial do exército Sílvio Conti Filho.Teve dois filhos: Gualberto e Eli. Em muitos documentos, Lausimar Maria Laus é citadapelos nomes de Lausimar Laus Gomes e Lausimar Laus Conti. Contudo, adotou o nomeartístico de Lausimar Laus. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 327 22/02/2011 11:04:06
Anuário de Itajaí - 2003 328 Contínuo Ato Artemio Zanon Academia Catarinense de Letras S “Poesia é gênero literário cuja avaliação critica é fortemente subjetiva, provavelmente com proeminência sobre todas as outras manifestações da arte de escrever”. ingelamente, sabe-se que qualquer dicionário conceitua poesia como a arte decompor ou escrever versos, sendo que poesia é elemento de composição pospositivodo grego poiesis, significando criação, fabricação, confecção e, por extensão, obrapoética, poema, poesia; através do latim poçsis, também como um significado depoesia, obra poética, composição em versos providos de rima, ou sem ela (e por isso amodalidade desses últimos que são referidos como sendo versos livres), cujo conteúdoapresenta uma visão emocional e/ou conceitual na abordagem de idéias, estados dealma, impressões, sentimentos subjetivos, interpretações, quase sempre expressos por associações imagéticas, e nessa arte de elaboração de versos pode-se identificar as características de um poeta em certa época, ainda que aderindo ou não a um geral sentir da manifestação humana consoante o meio em que ele, o poeta como criador, vive e produz seu fazer poético. Sabe-se, também, que desde Aristóteles até nossos dias, poética é a parte dos estudos literários que se propõe a investigar os processos que dizem respeito às normas versificatórias dos textos, os elementos técnicos de que se revestem, bem como os compêndios de poéticas que abordam o assunto. Assim, por seu peculiar fazer, pode-se falar da poética de alguém, de uma época e até de um povo, em regra identificada pela sistemática estrutural caracterizadora, o estilo no discurso buffoniano. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 328 22/02/2011 11:04:07
Anuário de Itajaí - 2003 329 Veteranos da Força Expedicionária Brasileira Edison d´Ávila Professor e historiador Pela segunda vez, a cidade de Itajaí acolhe festivamente as ilustres delegações deVeteranos da FAB – a Força Expedicionária Brasileira – de todo o Brasil, que aqui vêmrealizar o seu encontro nacional. Então, em nome do Prefeito Municipal, Jandir Bellini,tenho a súbida honra de saudá-los e lhes desejar as boas-vindas à nossa cidade. Não há, nas páginas da história contemporânea de nossa Pátria, evento maisdramático e emocionante do que a participaçãodos soldados brasileiros nos campos de batalha daItália, durante a Segunda Grande Guerra. Tambémnão há para nós, aqui reunidos nesta praçapública, tenham certeza, emoção cívica maiordo que contemplá-los. Já avançados em anos,mas firmes e orgulhosos, ostentando medalhas econdecorações, os símbolos de vosso heroísmo edando-nos ainda lições de verdadeiro patriotismoe de eterno amor ao Brasil. Senhoras e senhores, o período que precedeua entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial foiparticularmente conturbado e dramático, pois nossopaís foi, em verdade, obrigado a entrar num conflitodo qual não queria tomar parte, tantas foram asagressões e os desaforos do inimigo nazi-fascista. Nossos navios mercantes foram seguidae traiçoeiramente afundados por submarinosinimigos, causando-nos inestimáveis perdas devidas humanas e elevados prejuízos materiais.Então, o clamor do povo nas ruas e praças dopaís, naqueles tempos fatídicos, obrigou o governobrasileiro a declarar guerra às potências do Eixo em22 de agosto de 1942. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 329 22/02/2011 11:04:08
Anuário de Itajaí - 2003 330 Salão de Artes de Itajaí: um salto em qualidade Charles Narloch Crítico de arte A nona edição do Salão de Artes de Itajaí rompeu suas próprias barreiras e adotouconceitos atuais de montagem e organização de exposições de arte contemporânea.Esse crescimento permitiu ressaltar aspectos positivos nesta edição, a começar peladefinição de curadores. Com sensibilidade e coragem, a coordenação convidou profissionais atuantes nacontemporaneidade que, independentemente da idade ou participação em associações,apresentam um perfil jovem e dinâmico (Paulo Roberto de Oliveira Reis, Nadja deCarvalho Lamas e Maria José Justino). O perfil dos curadores se reflete no conjunto das obras selecionadas e no conceitoda montagem. Percebe-se a preocupação com a leitura seqüencial e o tratamentocuidadoso às obras e ao ambiente, transformando um espaço alternativo, o Centrode Eventos de Itajaí Shopping, em um espaço adequado ao salão, com painéis altos eiluminação própria. No conceito geral da organização, mais pontos positivos. Semináriosasseguraram o debate e o crescimento em formação. Monitores foram preparados parao atendimento ao público e às escolas, valorizando menos o número de visitantes e maiso efeito multiplicador dos processos arte-educativos. A maioria das obras representa bem as poéticas atuais. A atemporalidade e auniversilidade cedem espaço às questões conceituais que contextualizam o homem emseu tempo e seu espaço. As questões antropológicas e sociológicas permitem abordartemas que, apear de regionais, são comuns à humanidade como, por exemplo, oscomportamentos originados nos contrastes urbanos. Um bom exemplo disso são asfotografias de Roberto Barbi, intituladas Auto/Medicação. Mais do que simples registros, suas obras permitem uma forma diferenciada de ver enão apenas retratar. Paradoxalmente ou sugestivamente, automóveis velhos são utilizadoscomo veículos de promoção de um remédio popular que, como milagre, promete a cura dequase tudo. O que se vê aí (quando se vê) vai muito além de uma cena comum. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 330 22/02/2011 11:04:08
Anuário de Itajaí - 2003 331 Augusto Raio: o mar, fonte de intuição do artista Márcia d´Ávila Artista plástica e arte-educadora Augusto Raio nasceu em Porto alegre em 1962. Ainda muito pequeno, mudou-separa Imbituba, chegando a Itajaí em junho de 1970. Com o mar, aprendeu olhar o mundo com esperança de menino, onde buscava –e ainda busca – o tempo bom para a pescaria. No seu traço, sempre buscou o mar – opeixe, na rede, no homem do mar, nas ondas que invadiam o seu quintal e invademhoje os seus desenhos. Eram elas que traziam do infinito o seu herói. Seu pai eramarinheiro. Com o avô, madrugava para espreitar o mar e, com o olhar silencioso dequem espera, foi imprimindo em sua alma os elementos vivos que encontramos atéhoje em seus trabalhos. Começa então sua vida profissional como fotógrafo, utilizando o recurso maissensível do artista – o olhar – cuja sensibilidade germinou no cenário em que cresceu –Imbituba – à beira mar. Depois a necessidade de interferir na natureza das coisas levou-opara a pintura, onde brinca com as cores derramadas em manchas, entrelaçando-as emcurvas, sem roubar delas o que as identifica: a pureza da cor. Com as mesmas manchas,colore muros, paneaux, telhas de eternite ou “ondas”, que ganham estilo próprio. Mais tarde, elementos reais começam a povoar a obra de Augusto Raio. Oobservador não tem dúvidas, eles estão aí, no primeiro plano, e a comunicação lhe chegadireto aos sentidos, aos sentimentos. No contexto da obra, figura e fundo se encontramnuma alternância de lugar, sem com isso impedir que a perspectiva aconteça. E o quechega à percepção do observador, além da temática expressa, é a harmonia, a unidade. São elementos de uma realidade, que na sua trajetória, o artista foi agregandoa sua expressão. Sua arte busca a unidade não somente da forma, quer da unidadetambém ao ser humano que em sua obra aparece seccionado. Esta é uma característicado seu trabalho que o torna contemporâneo, atual. Com isso, coloca-nos diante detemas que merecem reflexão. E a arte cumpre a sua função. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 331 22/02/2011 11:04:09
Anuário de Itajaí - 2003 332 Histórias que eu conto Laércio Mauro Malburg In memorianFAdeus sentimental ui abordado, recentemente, por um conhecido que me perguntou se eu era o L.Malburg, que escrevia no O Tempo. Concordei com ele, curioso para saber sua opinião a meu respeito e ele me disseque gostava dos casos antigos de nossa Itajaí. Isso me deu ânimo para garimpar umpouco o passado para registrar os causos acontecidos. Naqueles tempos em que nossa cidade “era risonha e franca”, pacatae até bucólica, nada ou bem pouco acontecia de extraordinário queviesse a quebrar a normalidade perene dos dias. Nessa atmosfera,a saída e chegada do navio Carl Hoepcke do porto era sempre algonovo, inusitado, e trazia um sabor de novidade para o centro dacidade onde ele atracava. Sempre havia pessoas desembarcando aqui por ser términode sua viagem, ou por mero passatempo, uma vez que o naviodemoraria um ou dois dias, dependendo da quantidade de cargaque tivesse para carregar ou descarregar. Eram pessoas estranhas na terrinha e, por isso mesmo, logonotadas, caras novas no cenário da mesmice da nossa pequena cidade.mais curiosidade ainda havia quando a cara nova era seguida porum carregador de malas, o que era sinal de gente nova emcirculação e que iria logo ser objeto de investigação: quem seria?Teria posses? O que viera fazer aqui? Seria solteiro? Havia também a sensação das partidas, dosembarques daqueles que iriam deixar Itajaí e asconseqüentes despedidas chorosas e cheias de emoçãoincontida. As emoções mais sinceras e sentimentaisocorriam em exclamações espontâneas, na hora delargar os cabos e quando o navio, vagarosamente, ia-seafastando do trapiche de atracação. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 332 22/02/2011 11:04:10
Anuário de Itajaí - 2003 333 Monsenhor Vendelino Hobold marco de fé católica em Itajaí Edison d´Ávila Professor e historiador No domingo – Dia do Senhor – 31 de agosto de 2003, faleceu no Hospital deAzambuja, em Brusque, aos 85 anos, Monsenhor Vendelino Hobold, vigário de Itajaí emdois períodos: de 1947 a 1960 e de 1965 a 1970. Nascido em São Ludgero, Santa Catarina, em 07 de novembro de 1917,ingressou no Seminário de Azambuja aos 12 anos, cursando depois Filosofia e Teologiaem São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Dom Joaquim Domingues de Oliveira, ArcebispoMetropolitano, ordenou-o sacerdote em 11 de janeiro de 1942, em Florianópolis,recebendo como primeira missão pastoral o cargo de vigário coadjutor da Paróquia deOrleães, no sul do Estado. Em 1943, foi transferido para Itajaí, também como coadjutor do vigário Monsenhor José Locks, nos conturbados anos da Segunda Guerra Mundial. Recém chegado, o jovem padre, de 26 anos, enfrentou com desassombro as acusações que radicais nacionalistas faziam a Monsenhor Loks de ser simpatizante nazista. Quando assumiu a paróquia em janeiro de 1947, Padre Vendelino Hobold já era grande conhecedor de Itajaí, cujo município abrangia também Luís Alves, Piçarras, Penha, Ilhota e Navegantes. Revelou-se, então, um homem de trabalho, exigente, culto, empreendedor, enfim, um líder. Tratou logo de pôr em prática um plano pastoral que consolidasse junto aos católicos itajaienses uma intensa vivência religiosa, a qual ele, à época, considerava morna e ainda muito apegada a práticas de um catolicismo rústico, e pouco romanizado. Fundou o Coral Santa Cecília, para animação do culto, e associações de leigos como a Congregação Mariana; a Liga Católica Jesus, Maria, José; a JEC – Juventude Estudantil Católica; a JOC – Juventude Operária Católica e a JIC – Juventude Independente Católica, movimentos de base da Igreja. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2003.001-Anuario-010-2003-313-334.indd 333 22/02/2011 11:04:11
Anuário de Itajaí - 2003 334 Fim de Anuário de Itajaí - 2003001-Anuario-010-2003-313-334.indd 334 22/02/2011 11:04:12
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Anuário de Itajaí - 2004 336 Apresentação Não sem esforço, sem aguerrido desejo e sacrifício, a Fundação Genésio MirandaLins publica a 7ª edição do Anuário de Itajaí. Esforço, talvez, idêntico ao de JaymeFernandes Vieira e Juventino Linhares, em 1924, ao publicarem o primeiro Anuárioda cidade. esta luta, esta persistência, decorridos 80 anos da primeira edição, antesrenova a vontade e a necessidade desta obra, agregadora de histórias e outras histórias,circular pelo Estado e na comunidade. E pela coletividade de autores, o Anuário de Itajaí cumpre suas funções ao irradiarconhecimento histórico, em tornar visível (pelos diferentes textos que o compõem) históriae memória, ao difundir aspectos às vezes desconhecidos, ao abordar releituras de fatos jásabidos, ao propiciar cultura pelo prazer da leitura. E onde encontramos referências parareconhecer nossa história? A história não só de Itajaí como também da região? O Anuário de Itajaí de 2004 é editado para nos lembrar de um Marco: o iníciotemporal de um povoado (pelo artigo de Márcia d´Ávila); e nos lembrar de mais: que aimigração não só de luso-açorianos formou a cidade, mas também italianos e alemães,seja pelo educador Martinho Gervasi (artigo de Edison d´Ávila) ou pelo diário do pastorLange (de Saulo Adami); ou ainda pela transitividade de Antonio da Costa Flores, memóriafixa atemporal compilada (por Euclides José da Cruz) do jornal Novidades, de 1907. Também para nos lembrar de uma outra festa, interpretada por outro foco, doDivino, Espírito regiamente Santo (de Maria Bernadete Prioli), seja católico ou banto,como das tradições afroitajaienses (de José Bento Rosa da Silva); do Clube SebastiãoLucas (Janaína d´Ávila) e outros. E dizer de uma Maria do Cais (Rita de Cássia Neves Nardes), fé em contraponto,disparate de uma formação de creches (Ana Paula Ribeiro Kobarg) para, das crianças,criar um conto; se de lenda ou de verdade, o leitor é desafiado pela história a comporuma leitura de veracidade. O re-olhar do verossímil, quiçá, reproduz as estações (DarlanPereira Cordeiro e Denise Martins Freitas) de tempos idos ou reformula em outrasconcepções trajes típicos (Mara Lúcia Wendhausem Krause Vaz)? É a escrita reproduzida desde jornais, seja pela imprensa no período Imperial(Hélio Floriano dos Santos), seja pela edição deste anuário que, também, carrega ostraços de um Teatro Municipal (Emílio Augusto Dalçoquio). Que dizer, então, das novidades estre passado e presente? O novo paço municipal(Homero Bruno Malburg), assim nomeado, e o ensino superior em Itajaí (Vilmar Boni),com o Instituo Fayal, e mais de 40 anos de Univali (José Roberto Provesi). Boas interpretações! Os editores001-Anuario-011-2004-335-354.indd 336 22/02/2011 11:05:09
Anuário de Itajaí - 2004 337 “Marco Zero de Itajaí” uma leitura de imagens Márcia d’Ávila Artista plástica Ao reunir os elementos para compor a obra que representasse o “Marco Zero” deItajaí, estive refletindo a responsabilidade e o cuidado que tem o artista ou qualquerpessoa que se ocupe do divino ato de criar. Nesta reflexão, lembrei de autores quesão enfáticos, quando se referem a este fazer humano: o da criação, que abrangedesde a elaboração de um prato da culinária à construção de catedrais. Entre estes doisexemplos, de tamanhos extremados, estão incluídas todas as obras de arte. A produção de uma imagem, seja ela de que linguagem for: um gesto, umapersonagem, um material publicitário, uma obra arquitetônica, uma obra de arte,carrega consigo significados de ordem simbólica e estética, construídos e reproduzidosculturalmente. São representações, ou “representantes”, de algo que não está presente.É representado por uma imagem, um signo. O “leitor”, no contato com esta imagem,receberá sinais que tocarão sua dimensão sensorial; a dimensão do pensamento, dossentimentos para, daí, atribuir-lhe um “sentido” ou uma significação. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 337 22/02/2011 11:05:11
Anuário de Itajaí - 2004 338 Itajaí: 180 anos de história e fé(documentos do Arquivo Público de Itajaí – compilação do jornal Novidades de 1907) Euclides José da Cruz Historiador Com a criação do curato, em 31 de março de 1824, Itajaí passoua ser assistida por um capelão, Frei Pedro Antônio de Agote. O Curatodo Santíssimo Sacramento do Itajaí atendia todos os moradores entreo Rio Gravatá, ao norte, e o Rio Camboriú, ao sul. Erguida a primeiracapela e cemitério em terreno doado por José Coelho da Rocha esua esposa, Itajaí passou a agregar novos moradores que aqui seestabeleceram, tendo como núcleo central a pequena igreja. A 12 de agosto de 1833, através da resolução assinada peloPresidente da Província, Itajaí (agora elevada à freguesia) desligou-se da Vila de São Francisco do Sul e integrou-se ao Município de PortoBelo: era criado o Distrito de Itajaí, sede da Paróquia do SantíssimoSacramento e da circunscrição policial. Através de um requerimento dirigido ao Presidente da Provínciaem 1855, solicitava-se a criação do Município de Itajaí que, apesardo parecer contrário da Câmara de Porto Belo, só fora atendido em04 de abril de 1859; nascia o Município de Itajaí com a elevaçãoda Paróquia à categoria de Vila. Entretanto, a própria resoluçãode criação vinculara a instalação do novo município depois que ospróprios munícipes edificassem casa para as sessões da Câmara. Ainstalação do Município ocorreu em 15 de junho de 1860. Erguida a primeira Capela assistida pelo Frei Agote, instaladaem terras contíguas à propriedade de Agostinho Alves Ramos (o qualpossuía casa comercial), e com o advento de novos moradores, oaglomerado, apesar de pequeno (em 1838 contava-se um total de1686 habitantes), com seus hábitos, costumes, cultura, com suadevoção e fé, originou a cidade de Itajaí. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 338 22/02/2011 11:05:12
Anuário de Itajaí - 2004 339Educação e imigração: Martinho Gervasi, um imigrante italiano e professor na região colonial de Itajaí Edison d´Ávila Professor da UnivaliO imigrante e a escola No Brasil Imperial do século XIX, a educação escolar, via de regra, era um privilégiodas elites. As camadas populares tinham acesso tão somente às poucas escolas públicasde primeiras letras ou “escolas de desemburrar”, localizadas quase sempre nos centrosurbanos, de mestres únicos e professores leigos, onde grassavam a reprovação e aevasão escolar. Não era diferente o quadro na Província de Santa Catarina, apesar de diversasreformas educacionais levadas a efeito e que geraram muitas leis e regulamentos. Osistema escolar catarinense de então padecia de males como um deficiente serviçode inspeção escolar, professores despreparados e mal remunerados, inexistência deuma política de formação docente. Apesar de presumível boa intenção das diferentesiniciativas reformadoras, tudo levava a que o quadro permanecesse sem alterações,como comprovava o alto índice de 80% de analfabetos entre a população catarinense. Este era o quadro educacional que os imigrantes europeus encontraram, quandoaqui vieram se estabelecer. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 339 22/02/2011 11:05:14
Anuário de Itajaí - 2004 340 Narrações confidenciais de minha vida(Itajaí, de 16/12/1909 a 05/12/1916) - Pastor Wilhelm Gottfired Lange (1858 – 1930) Tradução de Ursula Rombach Luís Saulo Adami Jornalista Com relação ao tempo vivido em Itajaí, poderei ser breve. Meu estado de saúdemelhorava visivelmente. O descanso e o ar marinho me faziam muito bem. Em poucotempo eu me sentia muito bem, as hemorragias desapareceram completamente. Sóme custava falar por longo tempo e eu não podia fazer demasiado esforço. Em nossacasa de madeira, simples mas confortável, nos sentíamos muito bem e eu podia meocupar à vontade do jardim e do terreno pertencentes à casa. Como minha pensão nãoestava sendo bem suficiente para a onerosa Itajaí, aceitamos novamente pensionistase, principalmente Mamãe (assim o Pastor Lange se referia à sua esposa, Claire ReugeLange), dava muitas aulas. Entre as poucas famílias alemãs de lá, encontramos simpáticorelacionamento, principalmente nos últimos anos, quando, com a construção da estradade ferro, vieram para lá muitos engenheiros e funcionários. Com isso cresceu bastanteo sentimento alemão em Itajaí. Com a guerra, isto foi tudo exterminado. A cidade em si oferecia poucos atrativos, porém, o movimento do porto traziadistrações e também várias visitas de velhos conhecidos em trânsito. Principalmentegostamos de Itajaí pela proximidade do mar. Cabeçudas – Que horas maravilhosas passamos em Cabeçudas! Inicialmente eramuito trabalhoso chegar-se lá e na praia propriamente dita nada havia além de umaspoucas choupanas de pescadores. A gente se banhava, consumia o pão e bananastrazidos junto e às vezes também se coava café à beira do mar. Mais tarde Cabeçudaspassou a ser muito visitada e no verão passamos lá várias semanas, numa casa alugada.Essas então foram semanas idealmente bonitas. Certamente a melhora na saúde teriasido bem melhor então, se as tão queridas visitas fossem em número um pouco menor(chegou a acontecer que tínhamos 17 hóspedes para pernoite!). Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 340 22/02/2011 11:05:15
Anuário de Itajaí - 2004 341 Divino Espírito Santo: festa e resignação em Itajaí/SC Maria Bernadete Prioli Professora de História no Colégio São José e na Rede Municipal de Ensino A Bandeira do Divino Os devotos do Divino, vão abrir sua morada, pra Bandeira do Divino, ser bem-vinda, ser louvada. Deus nos salve esse voto, pela esmola em Vosso nome, dando água a quem tem sede, dando pão a quem tem fome. A bandeira acredita, que a semente seja tanta, que esta mesa seja farta, que esta casa seja santa. Que o perdão seja sagrado, que a fé seja infinita, que o homem seja livre, que a justiça sobreviva. Assim como os três Reis Magos, que seguiram a estrela guia, a bandeira segue em frente, atrás O de melhores dias. No estandarte vai escrito, que Ele voltará de novo, e o Rei será bendito, Ele nascerá do povo (Ivan Lins). presente trabalho teve como tema o Divino EspíritoSanto: festa e resignação em Itajaí – SC, objetivando produziruma monografia para obtenção do grau de licenciatura plena ebacharelado em História, pela UNIVALI, a partir da década de 1990,observando sua restauração no calendário litúrgico da paróquia doSantíssimo Sacramento, após quase cem anos de paralisação, eas resignificações aí presentes. Analisou o ritual, bem como umainterpretação da simbologia desta festa. A escolha do tema, na perspectiva de minha abordagem, estárelacionada a uma interrogação pessoal que me acompanhava háalguns anos: conhecer com mais clareza o sentido da prática. Desdeos primórdios da Igreja, a ação do Espírito Santo tem sido notada nadoutrina, nas obras de caridade e na vida dos cristãos conscientes de suasresponsabilidades de fé. As formas adotadas para homenagear a terceirapessoa da Santíssima Trindade são muitas, mas a que mais chama aatenção e comove é a devoção popular da Bandeira do Divino. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 341 22/02/2011 11:05:17
Anuário de Itajaí - 2004 342 Entre anúncios e imagens: um olhar feminino no Anuário de 1924 Berenice Teresinha Bernardi Professora de História – pós-graduada em Turismo A reprodução sobre as idealizações de mulheres de Itajaí no início do século XXfoi gestado a partir das reflexões contemporâneas sobre a história das mulheres e,mais recentemente sobre o aspecto relacional das construções culturais e relaçõesde gênero. Lendo o Anuário de Itajaí, editado em 1924, notei que as imagens verbais,quando remetem ao feminino – às mulheres – estão impregnadas no olhar masculino,ou, referem-se a um modelo de mulher exigido na época: preparadas para o casamento,angelicais, submissas e conformadas. Se no Anuário estão circunscritos comportamentos e condutas, não estão estasdeslocadas do ideário da época, quando os valores da modernidade, o gosto pelonovo chega na pequena cidade portuária, mexendo com o imaginário das pessoas. Oitajaiense “lido” nas entrelinhas do Anuário para 1924 era filho de sua época e de seumeio, como nós somos, de nossa realidade consensual, não significando, portanto, queos homens dos anos vinte, que se percebe no discurso da publicação, fossem tacanhos,ou carecessem da complexidade que usualmente se atribui a seus contemporâneos dosgrandes centros, em particular, dos locais que produziram clássicos do comportamentohumano, como a Europa, modelo para tudo que fosse de bom gosto. Ocorre que, a construção de seu mundo com a relativa falta de informações sefazia lenta e fragmentada, se comparada a nossa construção de universo num mundosaturado de informações instantâneas em tempo real. Os homens, e as mulheres, porcerto faziam a sua própria leitura do mundo e o representava a sua maneira. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 342 22/02/2011 11:05:17
Anuário de Itajaí - 2004 343 O surgimento de creches em Itajaí Ana Paula Ribeiro Kobarg Graduada em Pedagogia e História, pós-graduada em Educação Infantil e Psicopedagogia, mestranda em Educação na UNIVALI A história das creches no Brasil liga-se às modificações do papel da mulher nasociedade e suas repercussões no âmbito familiar, em especial na educação dos filhos. Também foi resultado de um longo processo de disciplinarização da sociedade,que começou a ter outra visão da criança, e acabou organizando um local (escola) ondeesta foi separada dos adultos e mantida à distância. Iniciou-se, no século XIX, um longoprocesso de enclausuramento das crianças (como dos loucos, dos pobres...) que seestende até os dias de hoje, o qual nomeamos de escolarização. Esta preocupação se justifica dada a importância da família e das escolas, tantono presente como no passado, levando-se em conta que a família é uma instituiçãosocial, de cujas contribuições dependem outras instituições. Diante de toda essa pressão ideológica, advinda também da comunidadecientífica, não foram os resultados positivos das pesquisas sobre creche que mostrarama necessidade de mudança na sua concepção ou a necessária expansão da sua rede. Foiatravés dos movimentos feministas, iniciados na década de 60, que a luta por crechesurgiu com enfoque novo, diferente ao de creche vista como um programa que atendesseà classe trabalhadora pobre. A idéia defendida, então, é a de que a creche estendesse seuatendimento a todas as mulheres, independentemente de sua necessidade de trabalhoou classe econômica. Proposta esta que considera a creche como um direito à educaçãoda criança pequena, desvinculando-se de papel substituto materno. Toda a instituição família começa a ser posta em xeque nas décadas de 60 e 70em decorrência da mudança de papéis exercidos pelas mulheres, quando a “revoluçãosexual”, com o advento da pílula, os novos valores e a maior inserção das mulheresnos espaços públicos, passam a oportunizar certa liberdade às mulheres. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 343 22/02/2011 11:05:20
Anuário de Itajaí - 2004 344Sebastião Lucas: território de interação social afro-descendente Janaína Nailde da Silveira d’Avila Professora da rede municipal de ensino Em Itajaí, vários foram os clubes recreativos que destacaram-se. Estes cluves foramfundados com o intuito de reunir pessoas para dançar, conversar e se divertir, enfim,espaço de sociabilidade. Tal divertimento só era permitido à população branca que nãoaceitava a entrada de negros em seu local de lazer. Marlene de Fáveri, ao investigar uma organização de jovens da elite itajaiense,colheu o depoimento de um ex-diretor que relembrou um fato ocorrido durante a guerra,quando um certo oficial negro quis romper as barreiras de cor. [...] que era preto, bem preto mesmo! E naquele tempo havia aquele racismo, aquela coisa. Preto não dançava junto com branco e branco não dança junto com preto, correto? E ele então, como maior autoridade dentro do Exército, ele comandava a Capitania dos Portos, todo o regimento que estava aqui, e nós não podíamos dizer que não, mandávamos um convite para o comando! Então tinha que mandar um convite para o comando. Mas, não criou problema não. Pelo contrário, sempre, sempre foi uma pessoa de muita classe, um comportamento exemplar. Só que ele era preto, coitado! Era a única pessoa preta que entrava porque era convidado. Nós não podíamos nos negar a convidar um comandante do Exército aqui (risos)! Então ele ia no Guarani, no Bloco dos XX, mas ele era um elemento que estudou [...]. Essa pessoa tinha cultura para chegar e sair na maior dignidade, compreende? No ano de 1944 foi veiculado um panfleto apócrifo na cidade de Itajaí em virtudede uma tensão racial, geradora de um preconceito. Este documento foi recolhido porÂngelo Ardigó e foi reconstituído por Edison d’Ávila da seguinte forma: [...]. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 344 22/02/2011 11:05:21
Tradição oral: fontes para a História de afro-descendentes da região da foz do Itajaí/SC José Bento Rosa da Silva Professor de História, membro do Núcleo de Afro-descendentes Manoel Martins dos Passos da Foz do Itajaí (SC) Quando falamos em tradição em relação à história, referimo-nos à tradição oral, e nenhuma tentativa de penetrar a história e o espírito dos povos africanos terá validade a menos que R se apóie nessa herança de conhecimentos de toda espécie, pacientemente transmitidos de boca a ouvido, de mestre a discípulo, ao longo dos séculos (A. Hampaté Bâ). evisitando meu arquivo pessoal, encontrei o exemplar de um trabalho realizado poralunos do ensino fundamental (6ª série) de uma escola municipal, de Espinheirinhos,um bairro rural da cidade de Itajaí (SC). A iniciativa do trabalho, que visava investir a comunidade local, foi coordenada peloprofessor Ivan Serpa, com o qual tive a oportunidade de longos debates na faculdade,uma vez que lecionei para o mesmo. Posteriormente, fundamos a Oficina de HistóriaOral, um grupo de estudos visando priorizar as fontes orais na pesquisa histórica. HojeIvan é Mestre em História, mas está afastado do ofício de historiador. Naquela época,sabendo Ivan do meu interesse pelo estudo da população afro-descendente, ofereceu-me o exemplar acima mencionado, sobretudo devido ao depoimento da senhora Antônia,com 97 anos de idade, segundo se sabia filha de ex-escravos. O depoimento foi colhido por Vivian Aparecida Cavichiolli, no mês de agosto de1994, portanto, há dez anos atrás. Dona Antônia, como era conhecida, veio a falecer nomês seguinte daquele ano. É importante dizer que há depoimentos afro-itajaienses apontando para a presençade seus antepassados no referido bairro. Sebastião Lucas, por exemplo, filho de escravos,um dos fundadores da Sociedade Beneficente XV de Novembro em 1906, uma entidadedos trabalhadores da orla portuária, nasceu em Espinheirinhos em 08 de janeiro de 1875.Na década de 50 do século passado, foi fundado um clube em Itajaí denominado SociedadeCultural e Beneficente Sebastião Lucas. O nome escolhido foi em homenagem a SebastiãoLucas. O clube é conhecido na cidade como o Clube dos Pretos. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 345 22/02/2011 11:05:23
Anuário de Itajaí - 2004 346A Casa de Maria: o castelo da exclusão.Cotidiano e resistência à beira do cais, em Itajaí, na década de 1960 Rita de Cássia das Neves Nerdes Utilizando fontes jornalísticas e trabalhando com memórias, procuro apresentaro cotidiano de um grupo de pessoas que viviam à beira do cais e ocuparam um prédiofederal inacabado, que deveria abrigar a Alfândega, na cidade de Itajaí, durante adécada de 1960. O prédio localizava-se no final do cais acostável e foi ocupado por aqueles quesem ter um teto viviam pelo cais do porto, dormindo em trapiches, nas ruas da cidadeou nos barcos de pesca quando os donos permitiam. Personagens excluídos socialmente que utilizavam astúcias e táticas paraarticular a sobrevivência. Viviam às margens do que a sociedade considerava comopadrão normal de comportamento, portanto, as marcas de sua existência não eramconsideradas significativas para serem preservadas. Foi necessário procurar indícios, achar pistas, garimpar informações para que,através destes fragmentos, elaborar um cenário onde nossos personagens ganhassemvisibilidade e voz. Pessoas que estavam presentes ao olhar e mesmo excluídas damaioria dos espaços sociais deixaram suas marcas e não podendo ser ignorados foram,no entanto, calados, esquecidos, sua história não existe, uma mancha que a cidadeprocurou apagar. Nas representações sociais, busca-se perceber os enfrentamentos presentesdurante o tempo de ocupação e também da época do despejo, quando o prédio, apedido da administração municipal, foi doado à Prefeitura. Desocupação que, segundo osjornais e governantes, ocorreu de maneira tranqüila e com a mais absoluta colaboraçãodos moradores, mas que a memória de alguns e nas entrelinhas do discurso oficial,aparece como um tempo de medo, opressão e revolta. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 346 22/02/2011 11:05:23
Anuário de Itajaí - 2004 347 Concepção de uniformes para cozinha comercial e de serviços incorporando características da cultura açoriana, germânica e italiana, com ênfase nos aspectos estéticos e ergonômicos Maria Lúcia Wendhausen Krause Vaz Graduanda em Design – Habilitação Moda, pela UNIVALI Através da pesquisa e aplicação de métodos de projeto de produto e análiseergonômica, chegou-se à concepção de três modelos finais de uniformespara cozinha comercial e de serviço, agregando à eles caracteres dasculturas açoriana, germânica e italiana, muito presente no Estado deSanta Catarina, especialmente no litoral e Vale do Itajaí. O estudoresultou em propostas de uniformes diferenciados dando ênfaseprincipalmente nos aspectos estéticos e ergonômicos. A palavra uniforme pode ser definida, segundo Ferreira(1986), como sendo semelhante, análogo, idêntico. Farda ou vestuárioconfeccionado segundo modelo oficial e comum para uma corporação,classe ou grupo de funcionários, etc. “A forma externa da roupa é o traje totalmente determinado pelooutro: o uniforme” (LURIE, 1997). De acordo com o autor, estar usandouniforme, seja um general, garçon, freira ou jogador de futebol, éabdicar do direito da personalidade e de agir com individualidade. Segundo Lurie (1997), o uso do uniforme tem inclusive o poderde alterar o comportamento de quem o usa com constância, levandoa pessoa a mudar seu comportamento. No presente projeto de pesquisa, pretende-se como resultadoconceber uniformes para cozinhas comerciais e de serviços,incorporando à eles caracteres da cultura açoriana, germânica eitaliana, que representam a maioria da imigração no Estado deSanta Catarina, em especial o litoral e o Vale do Itajaí. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 347 22/02/2011 11:05:24
Anuário de Itajaí - 2004 348 Univali – 40 anos depois José Roberto Provesi, Ph.D Reitor da Universidade do Vale do Itajaí Apesar das muitas comemorações alusivas aos 40 anos de implantação do EnsinoSuperior em Itajaí nos remontarem a um passado de lutas e conquistas, a ocasiãotambém nos convida a especular sobre o futuro das universidades e, especificamente, oda Universidade do Vale do Itajaí. Não será leviano prever que, nos próximos 40 anos,veremos a maturação de alguns processos já em marcha, numa fase que podemosdenominar hoje embrionária, considerando o potencial que tais processos poderãodesencadear no desempenho institucional. Uma tendência marcante será o aprofundamento da inserção comunitária daUniversidade em seu entorno. Mas, diferente da ênfase atual, a atuação nas comunidadesnão terá caráter filantrópico tão-somente. Como pólo gerador de conhecimento, aUniversidade terá progressivamente maximizada sua condição de centro de transferênciade tecnologia. Com seu amplo espectro de especialidades, a Universidade estarámais capitalizada nas comunidades regionais, que, por sua vez, fará o maior uso dapotencialidade transformadora da academia. Ao mesmo tempo, a Universidade se perceberá premiada pelo desafio imposto,com bastante evidência, pela conjuntura contemporânea: a produção acadêmica devevirar os resultados. A Universidade precisará produzir novos saberes para dar resposta àcrescente demanda por soluções que só o conhecimento conseguirá engendrar. Por isso,os recursos serão otimizados no sentido de prover volume cada vez maior de projetosde pesquisa e de extensão. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 348 22/02/2011 11:05:26
Anuário de Itajaí - 2004 349Estação Ferroviária Engenheiro Vereza: Depois de Passar o Trem Darlan Cordeiro Arqueólogo da FGML – Coordenador do Museu Etno-Arqueológico de Itajaí Denise Martins Freitas Acadêmica do Curso de História da Univali – Estagiária Bolsista da FGML O projeto de construção da Estrada de Ferro Santa Catarina previa uma ligação doPorto de Itajaí com o Planalto Catarinense, cortando o Estado, de leste a oeste, até afronteira com a Argentina. Mas foi somente em 1906 que um consórcio de empresasliderado pelo Banco Alemão, em Berlim, fundou a “Estrada de Ferro Santa CatarinaSociedade Anônima”. As primeiras locomotivas chegaram em Blumenau no ano de 1907, através doRio Itajaí-Açu, pelo vapor “Koblenz”. Uma delas, denominada nº 1 e fabricada pelaOrenstein e Koppel , “foi apelidada de macuca, pela semelhança de sua silhueta com aave que tem o mesmo nome”. O inicio das obras se deu, somente, no ano seguinte, soba coordenação do Engenheiro-Chefe, Rudolf Krober, que era Tenente-Coronel da reservado Batalhão Ferroviário da Baviera. Em 03 de maio de 1909, dia em que se comemorava o descobrimento do Brasil,foi inaugurado, oficialmente, o percurso Blumenau – Warnow (Indaial), com 30 km deextensão. Logo a seguir, em junho de 1909, o leito estendeu-se até Ascurra. Quatromeses depois, chegou a Hansa (perto de Ibirama). No ano de 1914, a história da EFSC sofre um embate; o governo brasileiro, aodiscordar da posição alemã na primeira grande guerra, cassa sua concessão, e, em1917, a empresa passa a ser administrada por uma comissão militar brasileira. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 349 22/02/2011 11:05:27
A imprensa no Vale do Itajaí nos períodos Colonial e Imperial Hélio Floriano dos Santos Professor do Curso de Comunicação Social da UNIVALI Ao comparar o processo de surgimento da imprensa brasileira com o ocorrido nas Américas Espanhola e Inglesa, bem como nas áreas de colonizaçãoportuguesa da Ásia e África, vamos concluir com certa naturalidade que nossa imprensasurgiu tardiamente. A Espanha começou a ocupar o território americano no ano de 1519 e em 1533 játinha introduzido uma gráfica no território sobre seu domínio. Por sua vez, a Inglaterrainiciou o processo de ocupação do território americano por volta de 1620 e em 1638já havia introduzido a imprensa na América. Enquanto isso, Portugal levou quase trêsséculos para implantar uma gráfica no Brasil (1808). Em Santa Catarina, o primeiroprelo só chegou no ano de 1831 e, em itajaí, o primeiro jornal surgiu em 1884, quasequatro séculos após o descobrimento do Brasil e cerca de 60 anos após a chegada doprimeiro colonizador (Antonio Menezes Vasconcelos de Drummond) e do seu fundador(Agostinho Alves Ramos). Muitas são as teorias que tentam compreender e/ou explicar este processo deatraso histórico da nossa imprensa. Alguns estudiosos promovem uma leitura do atrasopelo viés puro da política, acreditando que Portugal tinha medo de que a liberdadede imprensa na colônia possibilitasse a divulgação de idéias indesejáveis, tais comoindependência e república. Preferia deixar o Brasil no estágio pré-tipográfico, com seupovo na pura ignorância, porque seria mais fácil o controle, mantendo a relação desubmissão total entre a colônia e corte. Assim se justifica, por exemplo, a proibiçãodas atividades de impressão de jornais estabelecida em 1642, bem como a repressãosistemática às casas editoriais clandestinas como ocorreu em 1706 em Pernambuco enos anos de 1724 e 1747 no Rio de Janeiro. Já Nelson Werneck Sodré busca compreender o atraso da imprensa brasileirapelo viés marxista ortodoxo, localizando como fundamento de todo o processo questõeseminentemente econômicas. Publicado na íntegra no Anuário de Itajaí 2004.001-Anuario-011-2004-335-354.indd 350 22/02/2011 11:05:28
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