ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI importância para a garantia e efetivação de direitos básicos, como por exemplo, o direito à alimentação. Os dados fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) em 2017, revelam que 54,8 milhões de brasileiros vivem em situação de extrema pobreza, ou seja, uma a cada quatro pessoas. O relatório Cenário da Infância e Adolescência no Brasil (2019) da Fundação Abrinq, por sua vez, indica que 47,8% das crianças do país vivem na pobreza. Além disso, 13,7 milhões de estudantes de 6 a 17 anos são beneficiários do programa Bolsa Família, que prevê a transferência de renda do Governo Federal para famílias que comprovem situação de vulnerabilidade social. Com esses dados não é possível afirmar com exatidão quantas crianças e adolescentes têm a merenda escolar como principal refeição, mas pode-se concluir que estas existem. A verba para a merenda (em escolas públicas) advém de recursos de governos estaduais e municipais, com complementação federal do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Diante do cenário de fechamento das escolas por conta da pandemia, no dia 7 de abril o atual presidente permitiu o uso da verba concedida pelo PNAE para a compra de gêneros alimentícios dos alunos que passaram a estudar em casa. A rede estadual do Governo de São Paulo e do Rio de Janeiro optaram por repassar a verba da merenda para as famílias por meio de cartões alimentação (neste formato, não é possível utilizar os recursos da União, já que a legislação só permite a compra de alimentos e não o repasse do dinheiro em espécie), enquanto algumas redes municipais como a cidade de Santos/SP optaram por utilizar a verba destinada à merenda para a compra e distribuição de cestas básicas. Entretanto, um levantamento feito pelo Jornal O Globo, destaca que em 15 capitais e 19 estados pelo menos 7 milhões de crianças da rede pública não tiveram ajuda alguma do poder público para se alimentar em casa desde o início do distanciamento social. Isso porque muitos Estados e Municípios colocaram critérios para o recebimento das cestas básicas ou do cartão alimentação, como por exemplo que a família seja beneficiária do programa Bolsa Família, considerando que isso seria uma forma de “comprovação de pobreza”, legitimando o recebimento dos recursos alimentares, esse é o caso dos dois Estados e do Município citado acima. Ainda, de acordo com a matéria do jornal, o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública dos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo entraram com ações 2696
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI na Justiça para cobrar uma distribuição mais eficiente dos recursos e apurar irregularidades. Por outro lado, no Nordeste, sete das nove capitais informaram estar fornecendo a todos os estudantes de suas redes municipais os recursos para a alimentação. No Estado de São Paulo, o município de Guarulhos também afirma garantir o direito a todos, antes da liberação da verba PNAE, a prefeitura distribuiu kits com alimentos aos alunos beneficiários do Bolsa Família, após a liberação do recurso da União todos os 120 mil alunos da rede municipal passaram a receber os alimentos em casa. A falha de alguns municípios e estados em garantir a alimentação infringe o Art. 4º do ECA, que preconiza assegurar com absoluta prioridade a efetivação dos direitos referentes à vida, saúde e alimentação, entre outros. Frente à negligência do poder público em garantir esse direito, a sociedade civil tem se mobilizado com campanhas e doações de alimentos destinados às famílias que tiveram seus direitos negados, crescendo exponencialmente os movimentos solidários, ou de instituições como o Movimento dos Sem-Terra. Outro ponto essencial para a garantia de direitos das crianças e adolescentes e para a efetivação da doutrina de proteção integral, é o papel que a escola exercia na identificação e denúncia de crimes como negligência, violência física ou psicológica, abuso e exploração sexual. Em uma matéria para o Jornal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Sabrina Doris Teixeira, delegada da Delegacia de Polícia para a Criança e do Adolescente Vítimas de Delitos (DPCAVD) de Porto Alegre, afirma que professores, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais atuantes nas escolas são essenciais na denúncia de casos de violência. O balanço anual de 2018 do Disque 100, divulgado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) apontou mais de 76 mil vítimas e 152.178 tipos de violações, visto que em uma denúncia pode ter mais de um tipo de violação. Destes, 72,66% foram referentes à negligência, 48,76% violência psicológica, 40,62% violência física e 22,40% violência sexual. Vale ressaltar que muitas vezes o que é tido como negligência familiar, pode ser lido como negligência estatal, principalmente quando se trata de questões de vulnerabilidade social da família, visto que em determinados casos, caberia ao Estado prover as condições de moradia, alimentação, 2697
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI saúde e lazer às crianças quando as mesmas encontram-se em ambientes com vínculos familiares saudáveis, sendo afetados somente pela perversidade do sistema capitalista. Nesse sentido, existe um aumento dos casos de violações, se compararmos entre 2016 e 2018, e durante o distanciamento social os casos aumentaram, ainda que não estejam disponíveis os dados oficiais. Ao tratar-se dos autores das violações denunciadas, os números cedidos pelo balanço explicitam o motivo da preocupação com relação a segurança de crianças e adolescentes no período da pandemia: a violência costuma vir majoritariamente de pessoas que convivem no mesmo ambiente familiar. 37,64% dos casos foram praticados pela mãe, seguido de 18,47% por parte dos pais, 5,32% pelos padrastos, 3,53% tios/as e 3,59% as avós. O quadro exposto demonstra que as questões da educação à distância dependem de outros fatores, como uma criança e um adolescente se concentrarão em atividades, sendo que não possuem o básico? Alimentação, segurança, e as condições materiais de participar desse modelo educacional. O que foi suscitado é exatamente como a meritocracia funciona, e como os governos com agenda neoliberal se posicionam. Será muito mais fácil para essas crianças se exporem a retomada escolar do que os de classe média, se os Estados seguirem as diretrizes da União, essas crianças serão as primeiras a se exporem, tendo em vista as condições sociais que se encontram. O auxílio emergencial proposto auxiliará em inúmeros lares, mas está longe de ser o ideal, conforme dispõe o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socieconômicos (DIEESE) de abril de 2020, a cesta básica nominal de uma família média, até três filhos, deveria ser R$ 4.673,06. O que foge largamente da cotidianidade e do auxílio de R$ 600,00. Isto posto, a relação com a covid-19 é externa a realidade que estava presente, mas se acentua conforme a disseminação do vírus se propaga em território nacional, atingindo diretamente os mais vulneráveis socioeconomicamente, principalmente a população negra, que está relegada à própria sorte desde que esse país existe. E o fato de uma agenda liberal reforçar a meritocracia demonstra que nossa agenda política continua sendo a mesma, salve-se quem puder, e quem não puder, que morra em prol dos ideários neoliberal. 2698
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 4 CONCLUSÃO O exposto no trabalho demonstra um fragmento do que já estamos vivendo após dois meses de distanciamento social. Sendo que haverá desdobramentos de toda ordem na concepção das desigualdades sociais e no processo educacional, até a formulação de uma vacina contra o vírus. A contribuição foi salientar que as desigualdades que sempre estiveram presentes no cotidiano da maioria da população brasileira se acentuaram em tempos de isolamento, e que o EAD é a prova de como os governos com agenda neoliberal não se atentam para as condições de bases da população brasileira. Reforçar a meritocracia é reforçar uma política higienista de exclusão e segregação, mais uma faceta de um governo despreparado e que não contribuiu em nada em políticas educacionais em dois anos de mandato. O Ministério da Educação (MEC) não trouxe, até o momento, nenhuma proposta para a educação em tempos de pandemia. O discurso falacioso que está tudo bem, já não se sustentará por muito tempo; e a nossa contribuição é demonstrar que, apesar de todos os argumentos governamentais, os dados estão expostos, e os indicadores demonstram que o EAD não é uma modalidade viável, pois não considera a realidade brasileira, muito menos quem ficará refém de tal modalidade. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Crianças e adolescentes: balanço do disque 100 aponta mais de 76 mil vítimas. Disponível em: < https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2019/junho/criancas-e- adolescentes-balanco-do-disque-100-aponta-mais-de-76-mil-vitimas>. Acesso em: 25 mai. 2020. ALFANO, B.; FERREIRA, P.; MARIZ, R.; HERDY, T. Estudantes de pelo menos 10 estados deixaram de receber alimentação escolar. Jornal O Globo. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/estudantes-de-pelo-menos-10- estados-deixaram-de-receber-alimentacao-escolar-1-24430856>. Acesso em: 25 mai. 2020. BEHRING, Elaine Rossetti; BOSCHETTI, Ivanete. Política social: fundamentos e história. São Paulo: Cortez, 2006. Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socieconômicos (DIEESE). Disponível em: < 2699
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI https://www.dieese.org.br/analisecestabasica/salarioMinimo.html#2020>. Acesso em 25 mai. 2020. GOMES, M. E. Weintraub e seu enem para fazer injustiça. Portal Veja. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/blog/marcos-emilio-gomes/weintraub-e-seu-enem-para- fazer-injustica/>. Acesso em: 24 mai. 2020. Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas. Retrato da Desigualdades de Gênero e Raça do IPEA. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/revista.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2020. __________. Apontamentos sobre a dimensão territorial da pandemia da COVID-19 e os fatores que contribuem para aumentar a vulnerabilidade socioespacial nas unidades de desenvolvimento humano de áreas metropolitanas brasileiras. Nota Técnica n. 15. Abril de 2020. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica /200423_nt_dirur% 20n%2015_web.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2020. MATUOKA, Ingrid. Rio de Janeiro entre a violência e o direito a educação. Portal Educação Integral. Disponível em: <https://educacaointegral.org.br/reportagens/rio- de-janeiro-entre-a-violencia-e-o-direito-a-educacao/>. Acesso em: 25 mai. 2020. MUNIZ, B.; FONSECA, B.; PINA, R. Covid-19: mortes de negros e pobres disparam. Portal Outras Mídias. Disponível em: <https://outraspalavras.net/outrasmidias/covid- 19-mortes-de-negros-e-pobres-disparam/>. Acesso em: 20 mai. 2020. SAYURI, J. Nada disso é “normal”: como o Covid-19 escancara velhas anomalias do Brasil. Portal UOL. Disponível em: <https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2020/04/05/nada-disso-e-normal-como-a- covid-19-escancara-velhas-anomalias-do-brasil.htm?cmpid=copiaecola>. Acesso em: 25 mai. 2020. TOKARNIA, Marina. Um em cada quatro brasileiros não tem acesso à internet, mostra pesquisa. Agência Brasil. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-04/um-em-cada-quatro- brasileiros-nao-tem-acesso-internet>. Acesso em: 20 mai. 2020. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. COSTA, F. Quarentena imposta para conter a pandemia de coronavírus aumenta a vulnerabilidade dos pequenos a agressões verbais e físicas e ao abuso sexual. Jornal da Universidade. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/jornal/longe-da-escola-criancas-vitimas-de-violencia-podem- nao-ter-para-quemlonge-da-escola-criancas-vitimas-de-violencia-podem-nao-ter-para- quem-pedir-ajuda-no-periodo-de-isolamento-social/>. Acesso em: 23 mai. 2020. 2700
EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS PROGRAMA DE EDUCAÇÃO TUTORIAL: a extensão como Política Pública de combate às desigualdades sociais* TUTORIAL EDUCATION PROGRAM: extension as a Public Policy to fight social inequalites Byanca Viviane de Meneses Bicca 1 RESUMO No Brasil, onde é possível a identificação massiva de cenários repletos de lacunas sociais e assolados pela desigualdade, as políticas públicas apresentam-se como instrumentos centrais para dirimir as disparidades no âmbito da sociedade. Tais políticas são desenvolvidas pelo Estado, através da égide do princípio do bem comum, e a partir da inter-relação com instituições sociais como as universidades há a otimização dos resultados dessas políticas. O presente artigo tem como objetivo identificar os benefícios e os impactos da extensão universitária frente às desigualdades. Para tanto, buscou-se apresentar, por intermédio de pesquisa bibliográfica, a estrutura do Programa de Educação Tutorial e a análise da sua contribuição como política pública a partir da atuação do grupo PET Integração da Universidade Federal do Piauí. Concluiu-se pela aplicabilidade eficaz das ações extensionistas na mitigação de desigualdades sociais, figurando como ferramentas idôneas de política pública. Palavras-Chaves: Extensão universitária, Política Pública, Desigualdade Social. ABSTRACT In Brazil, where it is possible to massively identify scenarios full of social gaps and plagued by inequality, public policies are presented as central instruments to resolve disparities in society. Such policies are developed by the State, under the aegis of the principle of the common good, and based on the interrelation with social institutions such as universities, the results of these policies are optimized. This 1 Estudante de Graduação 5° período do Curso de Bacharelado em Direito na Universidade Federal do Piauí – UFPI, bolsista do Programa de Educação Tutorial - PET -Integração – UFPI. E-mail: [email protected] *Trabalho orientado pela Tutora do PET-Integração, Doutora e Professora do Departamento de Nutrição da UFPI, Cecília Maria Resende Gonçalves de Carvalho. E-mail: [email protected] 2701
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI article aims to identify the benefits and impacts of university extension in the face of inequalities. To this end, we sought to present, through bibliographic research, the structure of the Tutorial Education Program and the analysis of its contribution as public policy based on the performance of the PET Integration group at the Federal University of Piauí. It was concluded that the extension actions were effective in mitigating social inequalities, figuring as appropriate tools for public policies. Keywords: University Extension Project, Public Policy, Social inequality INTRODUÇÃO O Brasil é marcado, em sua conjectura histórica de formação da sociedade, por realidades díspares e por mazelas sociais que assolam, de forma massiva, grande parte de sua população. Tal estruturação social é reconhecida, inclusive, pelo ordenamento jurídico do país que prevê na Constituição Federal, promulgada em 1988, em seu art.3º, inciso III como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil: “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. Além disso, positiva, ainda, em seu art.6º a educação como um dos direitos sociais imprescindíveis para a construção de uma sociedade igual e justa para todas as idades. Apesar disso, após mais de três décadas da promulgação da Constituição Cidadã, realidades assoladas pela desigualdade ainda não foram superadas no Brasil. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro ocupa o 79º lugar com perda de 24,5% quando ajustado à desigualdade – perda maior que a da Colômbia que ocupa a mesma posição no ranking – como mostra o mais recente Relatório do Desenvolvimento Humano 2019 (p.303), divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2019). Diante desse cenário, o Estado brasileiro apresenta-se, conforme os deveres dados pelo ordenamento constitucional, como Welfare State – Estado do Bem-Estar Social – sob a égide do princípio do bem-comum e tem como escopo central regular a sociedade, atender suas demandas e dirimir as lacunas sociais. Isso é feito, primordialmente, pela implantação e direcionamento de políticas públicas que podem ser definidas, conforme Rodrigues (2010): 2702
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Políticas públicas são ações de Governo, portanto, são revestidas da autoridade soberana do poder público. Dispõem sobre “o que fazer” (ações), “aonde chegar” (metas ou objetivos relacionados ao estado de coisas que se pretende alterar) e “como fazer” (estratégias de ação) (RODRIGUES, 2010, p. 53). Tamanho desígnio, entretanto, não é alcançado em sua integralidade por um esforço unilateral do Estado. É necessário, para tanto, a inter-relação institucional para atingir os objetivos almejados, já que as políticas públicas se propõem a alcançar todas as cearas da sociedade. Nesse ínterim, as universidades, como centros de formação e de produção de conhecimento humano-cientifico e técnico, apresentam-se como agentes transformadores da sociedade, conforme dispõe o Plano Nacional de Extensão Universitária (2001), elaborado pelo XVI Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras e pela Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação: As universidades públicas brasileiras são instituições criadas para atender às necessidades do país. Estão distribuídas em todo o território nacional e em toda a sua existência sempre estiveram associadas ao desenvolvimento econômico, social, cultural e político da nação, constituindo-se em espaços privilegiados para a produção e acumulação do conhecimento e a formação de profissionais cidadãos. (BRASIL, 2001, p.2) Dessa forma, tem-se atrelado ao ambiente da academia, a função social inserida como basilar profícuo desde o processo de redemocratização do Brasil. Nessa conjuntura, há, com a Carta Magna de 1988, um processo de introdução institucional da extensão universitária como atividade essencial do âmbito acadêmico como preceitua o art. 207: “as universidades (...) obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão” – esta última, apesar de realizada no meio acadêmico anteriormente à carta constitucional vigente, possuía uma roupagem secundária, como é possível perceber na Lei N. 5.540/68, já revogada, que definia a estrutura organizacional das universidades – compondo, assim, o pilar: Ensino, Pesquisa e Extensão. A primordialidade da extensão pode ser apreendida, ainda, na sua conceituação – dentre tantas – feita pelo I Encontro de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras (FORPROEX, 1987): A Extensão Universitária é o processo educativo, cultural e científico que articula o Ensino e a Pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação 2703
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI transformadora entre universidade e sociedade. A Extensão é uma via de mão dupla, com trânsito assegurado à comunidade académica, que encontrará, na sociedade, a oportunidade de elaboração das práxis de um conhecimento académico. No retorno à Universidade, docentes e discentes trarão um aprendizado que, submetido à reflexão teórica, será acrescido àquele conhecimento. Esse fluxo, que estabelece a troca de saberes sistematizados, académico e popular, terá como consequência: a produção do conhecimento resultante do confronto com a realidade brasileira e regional; a democratização do conhecimento académico e a participação efetiva da comunidade na atuação da Universidade. Além de instrumentalizadora desse processo dialético de teoria/prática, a Extensão é um trabalho interdisciplinar que favorece a visão integrada do social. (FORPROEX,1987, p.11). Diante disso, a discussão acerca da extensão como instrumento de política pública faz-se crucial no que se refere ao combate das desigualdades nos diversos âmbitos da sociedade, uma tarefa complexa que exige a superação de enormes desafios. O presente trabalho, dessarte, propõe-se a compreender de que forma os programas extensionistas figuram como aparato interventivo de modificação e redução das disparidades sociais. Isso é feito, fundamentalmente, a partir da análise da atuação do Programa de Educação Tutorial (PET), modalidade interdisciplinar, grupo PET Conexões, denominado PET Integração: ação integrada em educação, cidadania e inclusão social, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), tendo a pesquisa bibliográfica como principal meio de obtenção informacional. O artigo debruça-se, estruturalmente, na definição, gênese, identificação dos objetivos do Programa de Educação Tutorial e, em como pode contribuir na investida frente às desigualdades. A seguir, os esforços se concentram em apresentar a atuação do grupo PET Integração da UFPI e avaliar a concretude dos impactos de suas atividades extensionistas, enquanto políticas públicas, em disparidades sociais. 2 O PROGRAMA DE EDUCAÇÃO TUTORIAL E OS IMPACTOS DE SUA ATUAÇÃO 2.1 O surgimento e a natureza do Programa de Educação Tutorial (PET) Em 1979 foi criado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoa de Nível Superior (CAPES), o Programa Especial de Treinamento – PET. A ressignificação da sigla aconteceu em 2004 quando o PET passou a ser identificado como Programa de Educação Tutorial. Tal programa é guiado pelos princípios do ensino, pesquisa e extensão, vinculado ao Ministério da Educação com financiamento do Fundo Nacional de 2704
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Desenvolvimento da Educação (FNDE) e regulamentado pela Lei Nº 11.180, de 23 de setembro de 2005 em seu art.12. Seu principal regimento, além da lei instituinte, dá-se por intermédio de portarias, instrumentos normativos infralegais, como as Portarias do Ministério da Educação Nº 976, de 27 de julho de 2010 e Nº 343, de 24 de abril de 2013, e pelo Manual de Orientações Básicas do PET, que tem como fim orientar acerca do funcionamento do programa concomitante a garantia da unidade nacional. O PET, em sua natureza convencional, surge com a formação de grupos organizados a partir de um curso específico de graduação das instituições de ensino superior do país, orientado pelo princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”, como disposto na portaria de 2010 art.2º – atualizada pela de 2013. Hodiernamente, o PET é desenvolvido em 121 Instituições de Ensino Superior com 842 grupos, segundo o Ministério da Educação (MEC), e alguns grupos contemplam estudantes de vários cursos de graduação, a exemplo do PET Integração/UFPI. No que tange aos seus objetivos, é notória a proposta de revolução educacional no ensino superior de forma a complementar a perspectiva convencional de educação nos cursos de graduação ao possibilitar uma gama de experiências aos discentes e tutores tanto no referente à produção acadêmica quanto na formação humana e cidadã através de reflexões, discussões, vivências e trabalho em equipe. Sobre a proposta do modelo pedagógico extensionista, o Manual de Orientações Básicas (2006) discorre: A ação em grupo e a dedicação permitem desenvolver a capacidade de trabalho em equipe, facilitar a compreensão das características e dinâmicas individuais, bem como a percepção da responsabilidade coletiva e do compromisso social. A inserção do grupo dentro do curso permite que estas capacidades se disseminem para os alunos do curso em geral, modificando e ampliando a perspectiva educacional de toda a comunidade. Este desenvolvimento terá uma interação dinâmica com o projeto pedagógico do curso, em processo de mútuo aperfeiçoamento. (BRASIL. MEC, p.6) Apreende-se, a partir da definição dos objetivos pelos instrumentos regulatórios, a primazia do valor social de aproximação entre a sociedade e a universidade. Dentre os objetivos cabe destaque, para uma melhor visualização, o art 2º da Portaria Nº 976: Art. 2º O PET (...) que tem por objetivos: I - desenvolver atividades acadêmicas em padrões de qualidade de excelência, mediante grupos de aprendizagem tutorial de natureza coletiva e interdisciplinar; V - estimular o espírito crítico, bem como a atuação profissional pautada pela cidadania e pela função social da educação superior; VIII - contribuir com a política de diversidade na 2705
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI instituição de ensino superior-IES, por meio de ações afirmativas em defesa da equidade socioeconômica, étnico-racial e de gênero. É inegável que o programa tutorial busca a otimização da educação superior com proposta interdisciplinar e multifacetada. A integração de cursos superiores de diversas áreas entre si e entre a sociedade, que agrega realidades dinâmicas e complexas, é, sem dúvida, uma grande oportunidade de conhecimento humano que transcende a academia. Ofertar ao discente a experiência de conviver e atuar, aplicando seus conhecimentos e habilidades, em realidades diferentes da sua, traz, indiscutivelmente, um enriquecimento e uma modificação na forma de pensar o modelo educacional e a própria produção academicista. Contudo, o que o Programa de Educação Tutorial pode proporcionar além dos benefícios aos seus atores, além dos muros da universidade? O Relatório de Desenvolvimento Humano (2019, p.6), ao fazer a análise das desigualdades, considera a questão das capacidades cruciais para a discussão. Tais capacidades se definiriam, fundamentalmente, em básicas e avançadas de forma que, cada vez mais, faz- se essencial que se busque a diminuição do distanciamento entre as pessoas e as capacidades avançadas. Isso porque estas últimas, segundo o relatório, estão “no âmago do desenvolvimento humano” (p.6) e proporcionariam a liberdade às pessoas sobre suas próprias vidas. Seria, por exemplo, ensinar uma pessoa a escrever o seu nome (capacidade básica), mas não proporcioná-la a oportunidade de ser escritor ou estudar Letras (capacidade avançada). Assim, uma limitação incapacitante e provavelmente intransponível – já que nas mesmas condições as deficiências tendem aumentar ao longo da vida – restringe a liberdade de escolha do indivíduo sobre suas oportunidades. A partir dessa perspectiva, é possível iniciar a compreensão acerca dos impactos do programa extensionista. “Para além dos muros da academia” poderia figurar, inclusive, como slogan do projeto. A extensão universitária atua como instrumento que leva a universidade para além da comunidade acadêmica. Ela transpõe os muros das instituições e as colocam dentro da sociedade como um todo de forma a ampliar as oportunidades e, consequentemente a liberdade, de pessoas em condição de desigualdade. A quebra desse distanciamento tem como consequência, dentre tantas, a democratização do conhecimento, a potencialização da função social das instituições superiores, e a acessibilidade às “capacidades avançadas”. 2706
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 2.2 O PET na Universidade Federal do Piauí O Programa de Educação Tutorial - PET UFPI, criado desde 2006, é composto por 10 grupos tutoriais de aprendizagem, cada um sob a orientação de um professor tutor. O Programa na UFPI, possui vinculação à Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PREXC), seguindo a regulamentação da Portaria de 2013 do Ministério da Educação. Alguns dos grupos PET/UFPI apresentam atuação nas mais diversas áreas do conhecimento: ciências da saúde, humanas, sociais, engenharias e tecnologia. No âmbito dos projetos, essas ciências podem se integrar e se inter-relacionar como metodologia de ampliação da eficiência e da eficácia das ações extensionistas no alcance social e na produção de conhecimento. Tem-se, como um dos principais projetos nesse formato, o PET Integração que é formado pelos cursos de Nutrição, Direito, Serviço Social, Pedagogia e Ciência da Computação – sem prejuízo à interdisciplinaridade com outros cursos. Nesse prisma, o grupo PET Integração desenvolve esforços sobre o pilar Ensino, Pesquisa e Extensão com o fito de contribuir, significativamente, com a produção científico-acadêmica, com o aperfeiçoamento no ensino dos cursos de graduação em geral – não somente na formação individual dos discentes extensionistas – e atuar como instrumento interventivo nas lacunas sociais. 2.3 O PET e o Pilar Ensino, Pesquisa e Extensão Notória se faz as ações de Ensino e Pesquisa do grupo PET Integração. Destaca- se a produção acadêmica como a publicação dos livros “Interdisciplinaridade e Experiências Educacionais e Sociais no Programa de Educação Tutorial” lançado no Salão de Livros do Piauí (SALIPI) em 2019 e “Construindo Elos: Pet Integração e Pet Saúde” com lançamento no SALIPI em 2016, com autoria dos alunos dos grupos PET, sob orientação dos professores e tutores do programa. Muitas outras obras já foram produzidas no âmbito do PET, bem como a publicação dos resultados das pesquisas em revistas indexadas e dos inúmeros trabalhos apresentados em eventos acadêmicos como o Simpósio Internacional de Estado, Sociedade e Políticas Públicas (SINESPP); Encontro Regional dos Grupos PET (ENEPET); Encontro Nacional dos grupos PET 2707
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI (ENAPET); Encontro local dos grupos PET (INTERPET); congressos, entre muitos outros eventos científicos local, regional e nacional (CARVALHO et al., 2018; SILVA et al., 2019). A excelência do grupo é reconhecida, inclusive, por premiações. Em 2018, o PET Integração conquistou o 1° lugar na área de educação no VIII Seminário de Extensão e Cultura (SEMEX), ratificando o compromisso e o potencial do programa. Além disso, o fomento ao ensino extensionista promovido pelo grupo tem uma contribuição determinante na democratização do conhecimento e na política de inclusão social. Para a análise desta assertiva cabe o destaque de alguns projetos. Em 2019, foi posto em prática o projeto “Educação Jurídica”, desenvolvido pelos integrantes do Pet Integração no Centro de Ensino de Tempo Integral Professor Darcy Araújo. Esse projeto consistiu em aulas planejadas, em adequação à realidade encontrada e ao público alvo, sobre conhecimentos jurídicos básicos da Constituição Federal e direitos fundamentais, incluindo o direito à alimentação saudável. A difusão do conhecimento básico do Direito feito pelo projeto, possibilitou aos jovens o conhecimento acerca de seus direitos e deveres de modo a contribuir na formação cidadã dentro da escola. Isso mostra-se importante, pois, diante do Estado Democrático de Direito em que se consagra o Brasil – art.1º CF – é imprescindível – e preconizado pelo ordenamento – o exercício da cidadania, a reflexão ativa e crítica dos cidadãos e a participação social. No entanto, tal formação só será obtida pela educação, como destaca Marlene Ribeiro (2002): (...) pensadores modernos identificam a educação como um caminho para a conquista de direitos sociais. Assim, no que tange à cidadania, parece haver um consenso de que sua conquista implica o conhecimento de direitos e deveres por meio de uma sólida educação escolar básica (RIBEIRO, 2002, p. 23). É transparente, dessa forma, que a educação prescinde à cidadania plena e, sobretudo, a educação jurídica. Isso porque o conhecimento amplamente difundido de noções básicas do ordenamento jurídico proporcionaria as pessoas, desde jovens, em idade escolar básica, a conhecer seus direitos e deveres perante ao Estado e à sociedade. Assim, poderiam exercer, de forma mais ativa e consciente, sua cidadania. Contudo, esse formato de ensino não é encontrado atualmente, de forma ampla, nas grades curriculares das escolas, principalmente públicas, o que gera deficiências na formação 2708
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI cidadã provenientes da lacuna educacional e, consequentemente, vulnerabilidades sociais. Nesse contexto, identifica-se a importância de ações como o “Educação Jurídica e Nutricional” desenvolvidas singularmente, considerando as limitações conjunturais de cada realidade ao mesmo tempo que objetiva contribuir com a modificação do cenário estrutural de fragilização e desigualdade. Ademais, o programa de extensão ainda promove a criticidade, acolhimento dentro da própria universidade, aprimoramento do conhecimento dos discentes com a promoção de cursos como o “Escrita cientifica”, aberta a toda comunidade, o minicurso pré período voltado aos ingressantes da graduação em Direito da UFPI sobre os aspectos da graduação e informações norteadores sobre a pesquisa e o método científico e o VI Bate Papo Acadêmico, organizado conjuntamente entre os PET’s Integração, Pedagogia, Serviço Social e Potência acerca do tema “A crise do capital e seus impactos na educação” que contou com debates, palestras e apresentação cultural. Todos os mencionados projetos foram realizados em 2019. Outro projeto que merece destaque, é o Projeto Bela Velhice (2018) e Informática para Idosos (2014 e 2018). Eles foram desenvolvidos pelo grupo de extensão PET Integração juntamente ao Programa Terceira Idade em Ação (PTIA) – programa de extensão desenvolvido pela Universidade Federal do Piauí por cerca de 20 anos voltado a pessoas com mais de 50 anos, em Teresina e cidades do interior, com atividades como música, dança, línguas e cursos – e têm em comum o foco nas demandas do público idoso. Esses projetos tiveram como objetivo entender o envelhecimento, promover a troca de saberes intergeracionais, a inclusão digital e o cuidado com a saúde mental e física dos idosos por intermédio de debates sobre temas como “humor” e “autoestima” e de oficinas sobre noções básicas de informática, internet e redes sociais. Tais ações mostram-se como aparatos de defesa a um direito personalíssimo: o envelhecimento. Sobre isso, dispõe a Lei nº10.741 em seu Art. 8o: “o envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social”. É defeso ainda ao idoso no art 2º “(...) todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.” 2709
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Apreende-se, dessa forma, pela própria letra da lei, os benefícios gerados pelas ações extensionistas. Devendo-se garantir ao idoso, por questões legais e humanitárias, o acolhimento e a integração no âmbito da sociedade, percebendo-o como agente capaz e sujeito de direitos, as políticas públicas devem ser pensadas e sensíveis as situações de vulnerabilidade em que estão inseridos os idosos. A eficácia desses projetos de extensão como políticas públicas dá-se, principalmente, pela sensibilidade dos atores ao cenário encontrado e atuação singular pormenorizada. Os grupos, antes de darem início as ações, se integram ao público alvo e propõem-se a compreender as demandas internamente a fim de desenvolver de forma eficaz, acessível e humana as atividades. Dessa forma, os projetos extensionistas garantiram os direitos desses idosos, evitando que eles fossem inseridos em um novo panorama de desigualdade e atuando para dirimir as lacunas existentes. 2.4 O PET como uma política pública dinâmica Em 2020, o mundo enfrentou uma crise sem precedentes provocada pelo vírus denominado Covid-19 – uma nova variação de coronavírus. No Brasil, o agravamento deu-se em meados do mês de março e toda a sociedade foi mobilizada em prol do combate à pandemia. Medidas como isolamento social e lockdown foram decretadas e a dinâmica da vida social modificou-se drasticamente concomitante ao surgimento de novas demandas sociais. Diante dessa nova realidade, surgiu a necessidade, em todas as áreas, de redefinição para atender as novas demandas com rapidez. No âmbito da educação, mesmo com escolas e universidades paradas, os projetos extensionistas continuaram suas atividades e buscaram adequar-se à nova conjuntura com o escopo de contribuir com a sociedade. A função social da extensão universitária do Programa de Educação Tutorial, na modalidade Integração, da Universidade Federal do Piauí, desenvolveu-se a partir da dinamicidade na criação de ações imprescindíveis ao momento. Tais ações, efetuadas, em sua maioria, remotamente com o uso da tecnologia e das redes sociais como o Instagram, esforçaram-se na ceara informacional e de educação comportamental. Dentre as atividades desenvolvidas, cabe mencionar a cartilha “Conheça e Previna-se contra a Covid-19” que contém informações sobre a higienização pessoal, de alimentos e de objetos, sobre a prevenção, alimentação e 2710
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI hábitos saudáveis, dicas para ajudar a passar pelo período de isolamento social, além dos cuidados com grupos de risco como os idosos; o projeto de extensão PET Informa; publicações nas páginas do PET Integração, de cunho informacional, com textos e imagens sobre problemáticas agravadas com o isolamento social como a violência contra a mulher e orientações pormenorizadas e didáticas acerca de políticas governamentais de assistência social como o auxílio emergencial. Nota-se, portanto, que a extensão é capaz de contribuir com a sociedade, mesmo em tempos incertos, de forma dinâmica, significativa e basilar. 3 CONCLUSÃO As prerrogativas constitucionais reconhecem as disparidades sociais existentes no âmbito da sociedade brasileira e dispõe como objetivo e dever do Estado a promoção da sociedade igual e o combate à desigualdade. Diante dessas atribuições, o Estado possui, como principais meios interventivos às demandas sociais, as políticas públicas. A implementação destas ferramentas é proposta nas mais variadas cearas da sociedade e necessita, para maior amplitude de eficácia, se inter-relacionar com os direitos sociais – já que estes mostram-se, a partir de sua regulamentação no ordenamento constitucional de 1988, como imprescindíveis na transformação de realidades díspares. Dentre tais direitos sociais, destaca-se a educação. Tal direito, tido como um dos principais agentes de formação e desenvolvimento humano, faz a aplicabilidade de políticas públicas, por intermédio da educação, primordial. Dessa forma, as universidades como centros de produção do conhecimento científico e formação humana e, tendo a função social introduzida em seu âmago desde a redemocratização como característica precípua, apresentam-se como importantes instituições de desenvolvimento e atuação no que se refere às políticas públicas. Nesse âmbito, a extensão universitária mostra-se promissora, com vasta e rica produção e fomento no pilar Ensino, Pesquisa e Extensão. O Programa de Educação Tutorial, PET Integração da Universidade Federal do Piauí, como programa de extensão efetiva, por meio de suas ações extensionistas, a excelência almejada nas disposições legais. Infere-se tal assertiva a partir do destaque e análise de projetos do grupo em que se pode observar impactos como a acessibilidade das ações, a aproximação entre a 2711
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI universidade e as diversas realidades sociais, a vasta produção acadêmica, o fomento ao ensino e à formação cidadã no ensino superior, a democratização do conhecimento e a capacidade dinâmica de alcance social e de se reinventar frente às adversidades e à complexa mutação social. Entende-se, portanto, a extensão como detentora de prerrogativas que a fazem eficaz e idônea como política pública de mitigação das desigualdades sociais, devendo, assim, ser incentivada e valorizada. APOIO: FNDE/MEC REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. 1988 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: maio de 2020 BRASIL. Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968. Fixa normas de organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Brasília. 1968. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5540.htm. Acesso em: 24 de maio. 2020. BRASIL. Lei nº 10.741, de 1 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Brasília, 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm. Acesso em: 8 maio 2020. BRASIL. Lei Nº 11.180, de 23 de setembro de 2005. Institui o Programa de Educação Tutorial – PET. Brasília. 2005. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11180.htm. Acesso em: 24 de maio. 2020. BRASIL. Ministério da Educação. Apresentação PET. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/pet. Acesso em: 24 de maio. 2020. BRASIL. Ministério da Educação. Manual de Orientações – PET. 2006. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/pet/manual-de-orientacoes. Acesso em: 24 de maio. 2020. BRASIL. Ministério da Educação. Portaria nº 343, de 24 de abril de 2013. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, 31 de outubro de 2013. Seção 1, p.40. Disponível em: https://www.ufpi.br/pet. Acesso em: 24 de maio. 2020. 2712
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI BRASIL. I ENCONTRO DE PRÓ-REITORES DE EXTENSÃO DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS. Conceito de extensão, institucionalização e financiamento. 1987. Disponível em: https://www.ufmg.br/proex/renex/images/documentos/1987-I- Encontro-Nacional-do-FORPROEX.pdf. Acesso em: 24 de maio. 2020. BRASIL. XVI ENCONTRO DE PRÓ-REITORES DE EXTENSÃO DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS. Plano Nacional de Extensão Universitária. 2001. Disponível em: https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/694/o/PNEX.pdf. Acesso em: 24 de maio. 2020. CARVALHO, C.R.; BARROS, R. O.; REIS, E.P.; ARAÚJO, L.B.; SOUSA, H.M.H. O Programa de Educação Tutorial (PET) no contexto da crise econômica brasileira. Extensão em Foco, n.15, p.28-45, 2018. DINIZ, F. P. A Extensão Universitária como Instrumento de Política Pública. 2012. 142 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Humanas) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2012. Disponível em: http://repositorio.bc.ufg.br/tede/handle/tde/1614. Acesso em: 24 de maio. 2020. SILVA, A. G. F. et al. A relação entre Estado e políticas públicas: uma análise teórica sobre o caso brasileiro. Revista Debates. Porto Alegre. v.11, n.1, p 25-42, jan-abril, 2017. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/debates/article/view/72132. Acesso em 24 de maio. 2020. FRANCO, F. G. O acesso à educação jurídica como meio de contribuir para a formação da sociedade. Conteúdo Jurídico. Disponível em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/53034/o-acesso-a-educacao- juridica-como-meio-de-contribuir-para-a-formacao-da-cidadania. Acesso em: 24 de maio. 2020. PNUD. PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DAS NAÇÕES UNIDAS. Relatório de Desenvolvimento Humano. 2019. Disponível em: http://hdr.undp.org/en/2019-report. Acesso em: 24 de maio. 2020. RIBEIRO, M. Educação para a cidadania: questão colocada pelos movimentos sociais. Educação e Pesquisa, v.28, n.2, p.113-128, 2002. RODRIGUES, Marta Maria Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: Publifolha, 2010. SILVA, D. et al. Relato de experiências do grupo PET Integração: ação integrada em educação, cidadania e inclusão social da Universidade Federal do Piauí (Teresina, Piauí). In: BRITO, D.A (org.). PET: 40 anos de Ensino, Pesquisa e Extensão, Porto Alegre: PLUS/Simplíssimo, 2019. 2713
EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO THE INCLUSIVE EDUCATION POLICY IN PUBLIC HIGHER EDUCATION Hádria Samille Palhano Galvão 1 Jeovana Nunes Ribeiro 2 RESUMO O presente artigo objetiva analisar as condições de permanência dos alunos com deficiência na Universidade Federal do Maranhão- UFMA. O estudo tem como eixo central a abordagem dialética que assimila a ideia permanente de movimento da sociedade marcada pelas contradições, também faz uso da pesquisa exploratória dos dispositivos normativos da educação inclusiva no ensino superior e dos documentos institucionais que versam sobre as estratégias implementadas pela universidade em favor da permanência do aluno com deficiência. Os resultados atestam que a UFMA vem empregando medidas para o enfrentamento das barreiras arquitetônicas, instrumentais, comunicacionais, programáticas, metodológicas e atitudinais; mas ainda apresenta caminhos a percorrer para consolidação do processo nos termos da política de inclusão defendida pela instituição. Palavras-Chaves: Educação Inclusiva. Ensino Superior. Pessoa com Deficiência. ABSTRACT This article aims to analyze the conditions of permanence of students with disabilities at the Federal University of Maranhão- UFMA. The study's central axis is the dialectical approach that assimilates the permanent idea of society's movement marked by contradictions, it also makes use of exploratory research of the normative devices of inclusive education in higher education and of institutional documents that deal with the strategies implemented by the university in favor of the permanence of the student with disabilities. The results attest that 1 Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected] 2 Professora do curso de Serviço Social da Universidade Federal do Maranhão. Doutora em Serviço Social. E-mail: [email protected] 2714
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI UFMA has been using measures to face the architectural, instrumental, communicational, programmatic, methodological and attitudinal barriers; but it still presents ways to go to consolidate the process in terms of the inclusion policy advocated by the institution. Keywords: Inclusive Education. Higher Education. Disabled People. INTRODUÇÃO O presente trabalho é fruto da monografia: “A permanência do aluno com deficiência no ensino superior: um estudo na Universidade Federal Maranhão” (UFMA), que teve por finalidade analisar a política de educação inclusiva, lastreado no entendimento da pessoa com deficiência enquanto ser dotado de direitos, principalmente, ao acesso e permanência no ensino superior. A análise dessa instituição enquanto espaço de efetivação de direitos desses cidadãos parte da análise exploratória dos documentos institucionais que versam sobre as ações implementadas pela UFMA em favor da garantia de permanência dos alunos com deficiência no Campus de São Luís. A sinopse estatística da educação superior (2017) atesta o universo de 38.272 alunos com deficiência matriculados nos cursos de graduação presenciais e a distância das instituições de ensino superior pública (federal, estadual e municipal) e privada. Os números do cenário nacional revelam que 63% desses discentes estão alocados nas instituições privadas de ensino superior e 37% nas públicas. O estado do Maranhão apresenta dinâmica peculiar quanto à distribuição dos alunos com deficiência nestas instituições. O Censo (2017) mostra 692 pessoas autodeclaradas com deficiência matriculadas nas redes de ensino superior maranhense, aproximadamente 78% estão alocados nas instituições de ensino público e 22% nos estabelecimentos de educação privada. Os dados apontam a relevância das instituições de caráter público para o processo de inclusão da pessoa com deficiência no Maranhão, em especial, a Universidade Federal do Maranhão que em (2017) recebeu 84 novos alunos com deficiência, e que até primeiro semestre de 2019, registrou somente no Campus de São Luís o atendimento de 341 alunos autodeclarados com deficiência nos cursos de graduação ofertados pela instituição. 2715
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI É diante desse contexto, que se objetiva apresentar o estudo acerca das ações adotadas pela UFMA para efetivação do direito à educação no ensino superior da pessoa com deficiência, bem como propõe-se expor o que preconiza as legislações educacionais acerca da política de educação inclusiva e as ações já realizadas pela UFMA em cumprimento ao regramento jurídico. O estudo tem como opção metodológica o método materialista-histórico dialético, pois para seguir essa trilha preestabelecida há de se considerar as complexas relações sociais desiguais empreendidas no decurso da história da pessoa com deficiência, o que acabou por “legitimar” as categorias que oscilam entre exclusão e inclusão desses sujeitos na sociedade capitalista. O exercício investigativo exigiu a revisão bibliográfica, aprofundamento do conhecimento acerca dos fundamentos legais do direito à educação da pessoa com deficiência no âmbito do ensino superior e a pesquisa exploratória dos documentos institucionais disponíveis no site da universidade estudada, em ato mais específico, em seu portal da transparência, a fim de conhecer as ações desenvolvidas pela UFMA para assegurar a permanência dos alunos com deficiência. 2 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA E O DIREITO À EDUCAÇÃO NO ENSINO SUPERIOR A concepção de democratização da educação superior, mantém estreita relação com o conhecimento e atendimento das legislações que preceituam as formas de acesso e permanência do aluno com deficiência nos estabelecimentos educacionais. No Brasil, a Constituição Federal (1988) assegura a educação como um direito de todos, mas é somente a partir da década de 1990 que dispositivos normativos de natureza infraconstitucional são sancionados com o propósito de regulamentar as ações referentes à permanência dos alunos com deficiência no ensino superior. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) de nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, considerada marco legal para a formulação de políticas públicas educacionais de escolarização das pessoas com deficiência, define a oferta da educação especial preferencialmente no ensino regular para os alunos com deficiência e faz menção às condições apropriadas para educação inclusiva (recursos didáticos, professores capacitados, organização curricular que respeita as singularidades). 2716
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Na mesma linha, o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 apresenta avanços em direção do direito à educação da pessoa com deficiência no ensino superior, determinando que as instituições “deverão oferecer adaptações de provas e os apoios necessários, previamente solicitados pelo aluno portador de deficiência, inclusive tempo adicional para realização das provas, conforme as características da deficiência” (BRASIL, 1999, Art. 27). Mais tarde a Lei da Acessibilidade, nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Apresenta também conceitos essenciais para a exequibilidade do acesso desses cidadãos à diferentes lugares. Como se observará adiante, os conceitos de acessibilidade orientam estudos e políticas de inclusão do aluno com deficiência no ensino superior. A efetivação do direito das pessoas com deficiência nada mais é do que a transformação da sociedade para o atendimento de suas necessidades. Nessa tarefa desafiadora o fio condutor para construção da sociedade inclusiva é acessibilidade nas suas mais diferentes formas: acessibilidade arquitetônica; acessibilidade comunicacional; acessibilidade metodológica; acessibilidade instrumental; acessibilidade programática; e acessibilidade atitudinal (SASSAKI, 2005) Com o propósito de assegurar condições de permanência das pessoas com deficiência no ensino superior, o Ministério da Educação e Cultura, pela Portaria nº 3.284, de 7 de novembro de 2003, dispôs sobre requisitos de acessibilidade para instruir os processos de autorização e de reconhecimento de cursos e de credenciamento de instituições de ensino superior. Para que tais instituições possam de fato ser consideradas inclusivas a Secretaria de Educação Superior, em articulação com a Secretaria de Educação Especial determina a observância de critérios a serem cumpridos quanto ao atendimento dos alunos com deficiência física, auditiva e visual. Em busca de resultados satisfatórios no percurso do processo de inclusão e permanência dos alunos com deficiência desde a educação infantil até o ensino superior, o Governo Federal elaborou a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, em 2008, cujo objetivo primordial consiste na ressignificação do atendimento educacional ofertado às pessoas com deficiência. Pode- se entender que: 2717
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Na educação superior, a educação especial se efetiva por meio de ações que promovam o acesso, a permanência e a participação dos alunos. Estas ações envolvem o planejamento e organização de recursos e serviços para a promoção da acessibilidade arquitetônica, nas comunicações, nos sistemas de informação, nos materiais didáticos e pedagógicos, que devem ser disponibilizados nos processos seletivos e no desenvolvimento de todas as atividades que envolvam o ensino, a pesquisa e a extensão (BRASIL, 2008, p. 17). Em complemento à política de inclusão da pessoa com deficiência, é homologado o Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011, que dispõe sobre o atendimento educacional especializado, determinando nas instituições federais de ensino superior, a instituição de núcleos de acessibilidade para “eliminar barreiras físicas, de comunicação e de informação que restringem a participação e o desenvolvimento acadêmico e social de estudantes com deficiência” (BRASIL, 2011a, Art.3º). Compete pontuar que o direito à educação não se encerra no conjunto de dispositivos normativos e conceitos ora apresentados, porque ele se materializa no espaço-tempo educacional utilizado pelas pessoas com deficiência ao longo do seu percurso formativo. 3 A UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO: um espaço de efetivação do direito à educação da pessoa com deficiência Em atenção aos documentos normativos voltados para a educação inclusiva, a UFMA assume o compromisso com a oferta do ensino superior para todos que permaneceram historicamente à margem dos sistemas de educação. Tem-se como ponto de partida a Resolução CONSEPE nº 499/2006 e a Resolução CONSEPE nº 501/2006, que regulamentam procedimentos e critérios para a inclusão de negros, egressos de escolas públicas, indígenas e pessoas com deficiência. Esses documentos colocam a instituição no cenário brasileiro como uma das primeiras universidades a aderir ao sistema de cotas pela adoção da política de ações afirmativas. Cumpre ressaltar que a política se deteve exclusivamente à reserva de vagas (uma vaga por curso para pessoas com deficiência), vez que não deliberava acerca dos itens concernentes a permanência dos alunos provenientes das ações afirmativas. No ano seguinte, 2007, a UFMA aderiu ao REUNI por meio da aprovação do Plano de Reestruturação da Universidade. A dimensão do Compromisso Social postulada no plano expressa a pactuação da instituição com a oferta das condições de permanência 2718
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI mediante a criação do Comitê de Assessoramento e Gestão de Políticas de Acessibilidade (2008), contratação de servidores para darem suporte às Políticas de Inclusão e Acessibilidade e a ampliação da política de cotas (UFMA, 2007). Contudo, essas ações não foram suficientes para consolidar a inclusão das pessoas com deficiência, surgindo a necessidade de empreender outras estratégias para atender as particularidades dos alunos com deficiência que ingressaram gradativamente na instituição. Posteriormente, deu-se a implementação do Programa Incluir, que traz em sua essência criação e consolidação do Núcleo de Acessibilidade nas universidades federais e a eliminação de barreiras para o atendimento dos requisitos legais de acessibilidade. Na UFMA, o programa contribuiu efetivamente para criação do Núcleo de Acessibilidade e a fomentação de ações quanto ao atendimento e serviços especializados (produção e aquisição de equipamentos assistivos, encontros com a coordenação de cursos, produção de materiais assistivos) e a participação em eventos. O sucesso dos ajustes tão conclamados pela inclusão social também perpassa pelo planejamento baseado em demandas concretas desses sujeitos. É nesse sentido que a institucionalização das estratégias de permanência do aluno com deficiência por meio da aprovação do Projeto de Desenvolvimento Institucional (PDI) e do Projeto Pedagógico Institucional (PPI), ambos com vigência de 2017 a 2021, são indícios do discurso inclusivo advogado pela UFMA. A Política de Inclusão Social da UFMA, incorporada ao PPI preconiza que a inclusão dos alunos com deficiência é mediada pelo Núcleo de Acessibilidade, responsável pela oferta de serviços de atendimentos especializados que são gerenciados a partir das principais demandas suscitadas pelos alunos com deficiência auditiva, visual, física, neurológica/psicossocial, intelectual, transtorno do espectro autista e múltipla deficiência (UFMA, 2017b). O Projeto Pedagógico destaca que as atividades realizadas pelo Núcleo de Acessibilidade buscam considerar o aluno com deficiência em sua totalidade, ensejando intervenções nas mais diferentes frentes de trabalho: encontros com a coordenação e os departamentos dos cursos que atendem alunos com deficiência; planejamento das ações de sensibilização com a comunidade acadêmica; realização de ações internas e externas; e atendimento socioeducacional (UFMA, 2017b). 2719
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A UFMA, em seu atual PDI contempla as ações vinculadas à política de acessibilidade da pessoa com deficiência com os seguintes objetivos: a) vincular o Núcleo de Acessibilidade à Reitoria; b) assegurar permanência exitosa dos alunos com deficiência, bem como, contribuir para que os professores organizem suas aulas; c) capacitar a equipe técnica do Núcleo para melhor atender aos alunos com deficiência; d) possibilitar um atendimento integral aos alunos com deficiência; e) atender exclusivamente aos alunos com deficiência, público alvo da educação especial; f) possibilitar acesso aos alunos com deficiência nos espaços do Núcleo de Acessibilidade; g) possibilitar atendimento a todos os alunos com deficiência, independentemente de cotas; h) divulgar o trabalho do Núcleo e fortalecer a inclusão na universidade; i) construir o prédio do Núcleo de Acessibilidade; j) ampliar os equipamentos pró- acessibilidade nos Campus da UFMA (UFMA, 2017a). As concepções e objetivos traçados nos documentos colaboram para a permanência dos alunos com deficiência por defenderem a construção de uma educação ancorada nos preceitos constitucionais de igualdade que considera as necessidades e singularidades educacionais desses cidadãos. 3.1 A permanência do aluno com deficiência: um desafio a vencer frente às barreiras Os vestígios da transformação da universidade em um espaço inclusivo movem- se também pelo conhecimento das ações já realizadas para o cumprimento das metas estabelecidas no planejamento institucional. Sem pretender esgotar as possibilidades de barreiras existentes e o seu enfrentamento, buscou-se identificar as estratégias de acessibilidade adotadas para minorar as barreiras arquitetônicas, comunicacionais, instrumentais, programáticas, metodológicas e atitudinais. No PDI (2017-2021) as estratégias de acessibilidade arquitetônica consistem em: a) criar espaço de atendimento para pessoas com deficiência, em todo o campus da UFMA; b) garantir espaço físico adequado ao Núcleo de Acessibilidade. A acessibilidade arquitetônica obriga a realização de ajustes na universidade para acomodação adequada dos alunos com deficiência na sala de aula, utilização de banheiro, biblioteca, restaurante, acesso ao bebedouro e demais serviços oferecidos. Os relatórios de gestão (2017 e 2018) mostram que a diminuição das barreiras arquitetônicas perpassa pela parceria entre Prefeitura de Campus, Unidades 2720
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Acadêmicas e Núcleo de Acessibilidade que tem realizado estudos das adaptações físicas e arquitetônicas necessárias para assegurar a permanência do discente na universidade (UFMA, 2018; UFMA, 2019). A estratégia relacionada à construção do Núcleo de Acessibilidade tem o propósito de criar um espaço acessível para o atendimento das demandas dos alunos com deficiência, em condições apropriadas para intervenção de profissionais. Os documentos institucionais analisados não fazem menção quanto ao andamento das construções do prédio do Núcleo, mas a instituição tinha até o ano de 2019 para cumprir a meta. O atual PDI também expõe as estratégias para acessibilidade na comunicação: a) estabelecer parceria com o Núcleo de Tecnologia e Informação da UFMA; b) elaborar material informativo acessível aos tipos de deficiência e ficha de atendimento; c) atender por meio de serviços técnicos e profissionais especializados as necessidades específicas, considerando os tipos de deficiência (visual, auditiva, intelectual e física); d) oferecer cursos semestrais de LIBRAS, Braille e Educação Inclusiva para a comunidade acadêmica. O Núcleo de Acessibilidade com base nas demandas apresentadas pelos alunos tem se articulado com o NTI para aprimoramento do desenho do Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA) e melhor atendimento das especificidades do aluno com deficiência visual e auditiva (UFMA, 2018). Essas solicitações buscam proporcionar ao aluno com deficiência autonomia durante o processo de ensino e aprendizagem. A atuação dos Transcritores de Braille proporciona a acessibilidade na comunicação ao realizar atendimentos de ampliação, confecção de textos e outros materiais em Braille para eventos e seminários. Os relatórios de gestão (2017 e 2018) contabilizam 1.436 atendimentos, 12.678 páginas impressas em braille, 4.190 materiais impressos ampliados, 39.115 páginas em arquivo Word ou PDF para posterior leitura com auxílio de leitores de tela (UFMA, 2018; UFMA, 2019). As atividades desenvolvidas pelo intérprete de LIBRAS são fundamentais para a permanência do aluno com deficiência auditiva ao permitir a comunicação na sala de aula entre alunos surdos, ouvintes e professores. O Núcleo de Acessibilidade conta com 2721
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI a atuação de 9 (nove) intérpretes para atender os discentes vinculados aos cursos de graduação (UFMA, 2018; UFMA, 2019). Ainda não foi totalmente alcançada pela instituição a estratégia da oferta semestral de cursos de LIBRAS, Braille e Educação Inclusiva, contudo, a Pró- Reitoria de Recursos Humanos- PRH, ofereceu através do Plano de Capacitação dos Servidores, executado no período de 2017 e 2018, o Curso de Libras Básico, com carga horária de 60 (sessenta) horas, propiciando aos servidores a qualificação para a compreensão da Linguagem Brasileira de Sinais a ser empregada no cotidiano do trabalho (UFMA, 2018; UFMA, 2019). O PDI vigente preconiza como estratégia de acessibilidade instrumental: a) adquirir recursos de tecnologia assistiva para os alunos com deficiência, tais como lupas de mão, notebooks, gravadores de voz. Os relatórios de gestão (2017 e 2018) evidenciam que a parceria entre o Núcleo de Acessibilidade e o Núcleo de Tecnologia e Informação tem sido essencial para promover a permanência dos alunos com deficiência visual, a partir da instalação de software para assegurar o acesso aos conteúdos acadêmicos, bem como serviços relacionados à manutenção dos notebooks disponibilizados ao aluno com deficiência para melhor desempenho acadêmico (UFMA, 2018; UFMA, 2019). O Relatório de Gestão de 2017 revela que, por causa da ausência de recursos financeiros, não foi possível o cumprimento da meta referente à aquisição de lupas de mão, notebooks e gravadores de voz. Também aponta que no mesmo ano não foram recebidos recursos financeiros para subsidiar as ações do Programa Incluir na universidade (UFMA, 2018a). A falta de injeção de recursos financeiros nas universidades ocasiona desdobramentos contraproducentes nas políticas de educação inclusiva no ensino superior gestadas pelo governo brasileiro, provocando a descontinuidade das políticas de acesso e permanência das pessoas com deficiência nas instituições de ensino superior. As estratégias de acessibilidade programática constantes no PDI consistem em: a) estabelecer cotas ou mecanismos de ações afirmativas nos diversos programas, serviços, projetos e benefícios da universidade, considerando as especificidades e/ou compatibilidade da deficiência; b) solicitar a ampliação da equipe técnica do Núcleo de 2722
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Acessibilidade (Psicólogo, Fonoaudiólogo, Pedagogo, Psicopedagogo, Terapeuta Ocupacional); c) organizar equipe multidisciplinar (Médico especialista na deficiência, um Oftalmologista, um Otorrinolaringologista, um Neurologista, um Psiquiatra e um Ortopedista; um Psicólogo e um Assistente social) para perícia de pessoas com deficiência que ingressam por processo seletivo ao curso de graduação. O Relatório de Gestão (2017) expõe que o Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas possui cotas para pessoas com deficiência e essas ações afirmativas na pós-graduação vislumbram a possibilidade de continuidade dos estudos. Quanto à ampliação da equipe, destaca que somente um psicólogo passou a fazer parte do quadro de profissionais. Espera-se que até 2020 um fonoaudiólogo, um pedagogo, um psicopedagogo e um terapeuta ocupacional passem a integrar a equipe técnica do Núcleo de Acessibilidade. Contudo, o cenário de contingenciamento não é nada animador para a concretização da estratégia de ampliação da equipe técnica por via da contratação de novos servidores. A organização de uma equipe multidisciplinar é fundamental para a realização de perícia de candidatos com deficiência, além de proporcionar o melhor acolhimento por profissionais especializados, possibilitando a identificação das reais necessidades do aluno e melhor processo de inclusão na vida acadêmica. Os relatórios de gestão apresentam resultados parciais quanto ao cumprimento da estratégia, destacando apenas a atuação do Serviço Social no acolhimento e acompanhamento dos alunos. O PDI (2017-2021) estabelece as seguintes estratégias de acessibilidade metodológica: a) cadastrar os alunos com deficiência no Núcleo de Acessibilidade; b)elaborar estratégia de identificação dos alunos com deficiência que não ingressam por cota específica; c) identificar e analisar o perfil socioeconômico dos alunos com deficiência ingressantes, a fim de orientá-los quanto aos direitos sociais e o acesso às políticas públicas; d) estabelecer parceria com outras instituições e elaborar encaminhamentos; e) conhecer demandas dos alunos e organizar plano de atendimento; f) informar aos cursos, coordenação e professores, o ingresso da pessoa com deficiência no curso; g) estabelecer contato com os familiares, agendar reuniões e realizar visitas domiciliares. Os relatórios de gestão (2017 e 2018) esclarecem que durante o acolhimento dos alunos com deficiência, identificam-se as principais demandas sociais, psicológicas, 2723
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI econômicas e pedagógicas. E de acordo com os relatórios mencionados anteriormente, as informações fornecidas pelo Núcleo de Acessibilidade são utilizadas para subsidiar o planejamento das atividades acadêmicas com base na pluralidade e diversidade manifestada diariamente na sala de aula. Trata-se o aspecto metodológico relevante para abrangente contemplação da inclusão no ambiente acadêmico. Conforme registra os relatórios de gestão em análise, o Núcleo de Acessibilidade realiza contato com os familiares para fornecer orientações quanto ao processo de inclusão do aluno na universidade. Em relação às reuniões periódicas expõe as dificuldades de organizar o calendário junto aos estudantes. No que diz respeito às visitas domiciliares os relatórios indicam que ainda não foram concretizadas (UFMA, 2018; UFMA, 2019). Os relatórios (2017 e 2018) apontam que a gestão do Núcleo de Acessibilidade faz parte do Comitê Gestor Estadual de Políticas de Inclusão das Pessoas com Deficiência da Secretaria Estadual dos Direitos Humanos e Participação Popular. A articulação da universidade com órgãos estaduais contribui efetivamente para a interlocução das discussões ocorridas no âmbito da universidade e da comunidade maranhense. Ressalta-se que a parceria da UFMA com outras instituições contribui para a realização de encaminhamentos dos alunos com deficiência e seus familiares, assegurando-lhes o acesso aos programas, serviços e benefícios específicos (UFMA, 2018; UFMA, 2019). O PDI (2017-2021) apresenta as seguintes estratégias de acessibilidade atitudinal: a) participar em eventos e cursos com temática sobre a inclusão de pessoas com deficiência, por parte da equipe técnica do Núcleo e sua coordenação; b) desenvolver ações de sensibilização no campus em vistas à construção de uma cultura inclusiva. Os relatórios de gestão em estudo evidenciam que as ações voltadas para acessibilidade atitudinal extrapolam os muros da UFMA, pois documentos registram a participação da equipe do Núcleo em eventos realizados em nível nacional e estadual. Com respeito às ações de sensibilização dentro do espaço universitário, a meta referente ao desenvolvimento de pelo menos duas ações de sensibilização durante o ano de 2017 não foi alcançada (UFMA, 2018). Contudo, destaca-se a criação da Comissão Setorial de Acessibilidade do Centro de Ciências Sociais- CCSO, em 2017, para a realização de atividades de sensibilização da 2724
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI comunidade acadêmica para romper com as práticas excludentes dos alunos com deficiência, com destaque a Roda de Diálogos, o Bate Papo Inclusivo e o Projeto Sentidos. 4 CONCLUSÃO Foi possível perceber que a Universidade Federal do Maranhão busca aprimorar a sua função social quando toma medidas para cumprimento da legislação atinente a garantia do direito à educação de ensino superior da pessoa com deficiência, mediante determinação legal, bem como dos estudantes que pressionam a instituição via NUACES, desde o processo de inclusão das pessoas com deficiência no ato da matrícula que recebem orientações sobre o andamento por meio de uma política operacionalizada majoritariamente pelo Núcleo de Acessibilidade. Ao mesmo tempo a pesquisa evidencia que os impedimentos relacionados às questões arquitetônicas, instrumentais, metodológicas programáticas, comunicacionais e atitudinais, requer a busca de soluções a partir do trabalho colaborativo com os demais setores da universidade, que nem sempre são capazes de assegurar a injeção de recurso humano, financeiro e pedagógico, imprescindíveis para continuidade das ações previstas para interstício de 2017 a 2021. Nessa empreitada, a UFMA circunscrita no movimento permanente da sociedade capitalista precisa constantemente encontrar novos caminhos para consolidação da política de inclusão apregoada em seus documentos institucionais. REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasil, 1988. BRASIL. Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. BRASIL, 1996. BRASIL. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei nº 7853 de 24 de outubro de 1989 e dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência e dá outras providências. BRASIL, 1999. 2725
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. BRASIL, 2000. BRASIL. Ministério da Educação. Portaria nº 3.284, de 7 de novembro de 2003. Dispõe sobre requisitos de acessibilidade de pessoas portadoras de deficiências, para instruir os processos de autorização e de reconhecimento de cursos, e de credenciamento de instituições. BRASIL, 2003. BRASIL. Ministério da Educação. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. BRASIL, 2008. BRASIL. Decreto nº 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado. BRASIL, 2011. BRASIL. Ministério da Educação. Censo da Educação Superior 2017. BRASIL, 2018. Disponível em: < http://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2018/c enso_da_educacao_superior_2017-notas_estatisticas2.pdf > Acesso em: 1º jun. 2019. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: o paradigma do século 21. Inclusão: Revista da Educação Especial. Brasília, v.1, n.1, p.19-23, 2005. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. CONSELHO DE PESQUISA E EXTENSÃO. Resolução nº 499, de 31 de outubro de 2006. Trata da Política de Cotas adotada pela UFMA a partir do segundo semestre de 2007. UFMA, 2006a.. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. CONSELHO DE PESQUISA E EXTENSÃO. Resolução nº 501, de 31 de outubro de 2006. Aprova o número de vagas do Processo Seletivo- Vestibular de 2007. Maranhão (internet). UFMA, 2006b. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. Caderno do REUNI- Universidade Federal do Maranhão- REUNI. Maranhão. UFMA, 2007. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. Plano de Desenvolvimento Institucional. Projeto de Desenvolvimento Institucional- PDI (2017-2021). Maranhão. UFMA, 2017a. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. Projeto Pedagógico Institucional- PPI (2017 a 2021). Maranhão. UFMA, 2017b. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. Relatório de Gestão da UFMA 2017. Maranhão. UFMA, 2018. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO. UFMA. Relatório de Gestão da UFMA 2018. Maranhão. UFMA, 2019. 2726
EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS MERCANTILIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO E SERVIÇO SOCIAL MARKETING OF EDUCATION AND SOCIAL SERVICE Deise Moreira Cavalcante 1 Dalliana Ferreira Brito Grisi2 RESUMO A mercantilização da educação se acentua com a ofensiva neoliberal, com isso o mercado reformula a nova forma de educar, buscando um aluno “cliente” pronto para o mercado. O Serviço Social não ficou imune ao processo de privatização da educação, que trouxe impactos significativos à formação profissional. Diante disso, este trabalho busca abordar como a privatização influência no processo de formação profissional do Serviço Social, apontando como isso se concretiza no lançamento de assistentes sociais no cotidiano profissional Palavras-Chaves: Mercantilização. Educação. Serviço Social. ABSTRACT The commercialization of education is accentuated with the neoliberal offensive, with this the market reshapes the new way of educating, looking for a “client” student ready for the market. Social Work was not immune to the process of privatizing education, which had a significant impact on vocational training. In view of this, this work seeks to address how privatization influences the professional training process of Social Work, pointing out how this materializes in the launching of social workers in professional life. Keywords: Commodification. Education. Social Service. INTRODUÇÃO O trabalho ora apresentado se constitui enquanto investigação acerca da mercantilização do ensino superior e a sua relação com o Serviço Social brasileiro, abordando como a privatização influência no processo de formação profissional 1 Pós-Graduanda em Serviço Social pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 2 Mestra em Serviço Social pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] 2727
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI pertencente a esta categoria, apontando os seus impactos e como isso se concretiza no lançamento de assistentes sociais no cotidiano profissional. A pesquisa se baseará no paradigma teórico crítico, utilizando do materialismo histórico dialético de base marxista para compreensão e análise da realidade. Com o objetivo de se construir ao longo desse processo uma reflexão sobre a realidade e buscar a compreensão de suas transformações. Desse modo, a metodologia utilizada para a pesquisa tem um caráter qualitativo explicativa e efetivou-se por meio de um levantamento bibliográfico. O percurso metodológico se deu através de investigação de materiais teóricos como livros, artigos científicos e produções acadêmicas dos principais autores que discutem tal temática, abordando as categorias centrais deste estudo. 2 A INTENSIFICAÇÃO DA PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL Ao analisarmos de maneira histórica o processo de progressão do ensino superior brasileiro, é de fácil percepção que a partir dos anos de 1990 a modalidade privatista apontou um crescimento significativo no Brasil. Tendo um caráter mercantil e não universitário. Nesse momento o Estado brasileiro desencadeia políticas de caráter econômico e social voltadas para a ideologia neoliberal que defende a limitação da ação do Estado a de um agente regulador, dando ao mercado a liberdade de trabalhar com espaços que antes eram explorados de forma limitada pelo capital, como a previdência, educação e saúde. Ressalta-se que a presença do setor privatista no ensino superior não se inicia nesse período e nem era uma novidade que surgia, tendo em vista que o mesmo esteve desde a sua própria constituição histórica. Entretanto, o aumento assustador e a predominância desse setor, que possui como objetivo principal a lucratividade, apresenta nesse momento características inovadoras (PEREIRA, 2014). Na década de 1990 o país passa pelo processo de reestruturação produtiva junto à contra-reforma do Estado, abarcados pela ofensiva neoliberal que promoveram diversas modificações no mundo do trabalho e na economia brasileira. Surgindo assim, novos padrões societários que determinam uma forma diferenciada de trabalhar, 2730
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI pensar e viver o que exigirá uma atuação voltada para a subjetividade do trabalhador, visando à consolidação e a sociabilidade do capitalismo reatualizado. Sendo necessário formar profissionais com perfis que tragam novas qualidades e atributos, um profissional criativo, empreendedor e que possua a capacidade de adaptar-se e executar seu trabalho sob tensão ou crise (KOIKE, 2009). A face po¬lítica-cultural cria e consolida a cultura de uma nova concepção de universidade, de um novo “modelo” de organização, de estrutura, de planos de ensino, pesquisa e avaliação: essa cultura sustenta que uma boa univer¬sidade deve ser barata (menos anos, menos custos), rápida (cria uma espécie de fast universidade, e defende que se faz o mesmo em menos anos), padro¬nizada (mesmo formato em diferentes realidades), deve ter financiamento auto-sustentável (graduação barata, curta e rápida, mestrados curtos e pagos para uma elite, doutorados curtos para docência e/ou pesquisa acadêmica e para demandas do mercado); mercantilmente adaptada às exigências de ex¬pansão e acumulação do capital, sobretudo em contexto de crise do capital (BOSCHETTI, 2015, p.644-645). O Serviço Social incluso nessas mudanças postas por conta da grande crise do capital precisou acompanhar tais transformações societárias, adequando-se aos novos padrões produtivos, assistindo de perto a grande explosão de cursos de graduação, estando inseridos em instituições não-universitárias, de maneira majoritariamente privados que acompanhavam as características dos movimentos expansionistas do ensino superior. Salienta-se que o aumento dos cursos de graduação na área de Humanas se deu por conta dos baixos custos e dos altos índices de lucratividade para os grandes empresários – como o curso de Serviço Social. Compreende-se que a criação de cursos na área de Humanidades, como o curso de Serviço Social – além de proporcionar novos campos de expansão ao capital, fundamentais na fase atual do capitalismo – responde à necessidade de formação de intelectuais difusores de uma sociabilidade conformista e colaboracionista (PEREIRA, 2014, p. 40). Vale lembrar que historicamente o Serviço Social no Brasil colaborou em suas práticas profissionais com a perspectiva burguesa. Pois, surge nos anos de 1930 e se institui enquanto profissão na “Era Vargas”, onde se criou grandes instituições assistenciais regidas pela influência norte-americana. Contudo, somente após 1964 o mercado de trabalho se torna relevante para os assistentes sociais, com uma política 2731
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI assistencial contraditória e repressiva dos governos militares. Nesse contexto, os cursos de Serviço Social inseridos em ambientes universitários isolados e escolas mantendo o direcionamento conservador, que surge em sua gênese, permanecem até meados dos anos de 1970 e só passa a ser contestado no período de efervescência política e de lutas por direitos no país (LIMA e PEREIRA, 2012). Apenas no fim dos anos 1970 no processo de redemocratização da sociedade brasileira, realizaram-se profundos questionamentos internos na categoria profissional quanto ao direcionamento do Serviço Social. Acontecendo então, nesse momento uma eclosão do Serviço Social crítico – principalmente nas universidades públicas – onde o profissional que transformava as demandas sociais em “patologia social e desajustes”, adentra no campo do reconhecimento de uma sociedade de classes sociais e que busca a viabilização e efetivação pelos direitos sociais. Realizando uma análise crítica e transformadora da sociedade, rompendo com o assistencialismo anteriormente adotado. No ano de 1982 ocorre uma reforma curricular do Serviço Social que traz consigo uma nova concepção de profissão e de formação profissional de assistentes sociais no país, buscando um rompimento teórico-metodológico com o conservadorismo profissional histórico. Há mais de uma década depois de vigência do referido currículo, o Serviço Social brasileiro adjunto a direção da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) passou a considerar de maneira fundamental as revisões curriculares nos cursos de graduação em Serviço Social, tendo em vista às profundas transformações societárias ocorridas no mundo do trabalho, na esfera da cultura e nas relações entre Estado e sociedade civil. Após dois anos de debates (1994-1996) entre as 67 unidades de ensino filiadas à ABEPSS, foram aprovadas, na Assembléia Geral Extraordinária da ABEPSS, em 1996, as Diretrizes Gerais para o Curso de Serviço Social. Ressalte- se que até 1994 existiam 74 unidades de ensino em Serviço Social: portanto, a participação dos cursos nos debates de revisão curricular equivaleu a 90,5%, o que pode ser considerado como uma participação bastante satisfatória (LIMA e PEREIRA, 2012, p.35). O referido movimento de consolidação e aperfeiçoamento de uma direção progressista e de formação de profissionais que possuam um perfil crítico e competente de maneira teórica, ética, politicamente ética, se desenvolveu sob a direção hegemônica 2732
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI dos cursos de Serviço Social inseridos em sua maioria em Instituições de Ensino Superior públicas, universitárias e confessionais. Todavia, apesar de até o ano de 1994, majoritariamente os cursos de Serviço Social estar inseridos em Instituições de Ensino Superior de natureza privada, consegui- se viabilizar a realização de revisão curricular na qual passa a existir o compromisso com uma formação qualificada, pautada na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, além, de manutenção de uma direção social comprometida e coerente com os princípios ético-político provenientes do Código de Ética profissional de 1993 (PEREIRA, 2014). Contudo, desde 1995 até a atualidade, conforme já analisado, encontra-se em movimento uma expansão vertiginosa da participação privada na criação de cursos de ensino superior, majoritariamente em IES não-universitárias, como parte do processo de contra-reforma. No âmbito do Serviço Social, entre 1995 e 2002, foram criados mais 50 cursos, sendo 90% através da iniciativa do setor privado. Da totalidade dos cursos de Serviço Social criados, somente 15 (30%) assim o foram inseridos em ambientes universitários, expressando claramente a política de Estado, durante os governos Cardoso, de expansão do ensino superior via setor privado, preferencialmente com cursos de custo menor, na área de Humanas, e dispensando a necessidade de realização de pesquisa. Desta feita, o movimento de mercantilização do ensino superior atravessou a formação dos assistentes sociais brasileiros no pós-1995, com uma formação majoritariamente realizada em instituições não- universitárias e privadas particulares em sentido estrito (LIMA e PEREIRA, 2012, p.45). Desta forma, com a contra-reforma do Estado sucedeu-se uma reforma no ensino superior com a mundialização do capital, o que acarretou na enorme demanda mercantil do ensino nos anos 2.000 na justificativa de se ter um processo de formação mais moderno, menos burocrático e superando o modo universitário remoto, ocasionando uma reestruturação do “ensino superior no sentido de seu aligeiramento, competitividade e sujeição as demandas do mercado” (BOSCHETTI, 2015). Uma nova adequação emerge na formação profissional sintonizada as exigências colocadas pelo mercado de trabalho, voltado para as necessidades e funcionalidades do capital promovendo um distanciamento da teoria social crítica (IAMAMOTO, 2013). 2.1 Os impactos da mercantilização do ensino superior no Serviço Social A mercantilização do ensino superior reformula o projeto de formação profissional, associando ao novo perfil exigido pelo mercado de trabalho na preparação 2733
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI de profissionais para o emprego, colaborando com o avanço do conservadorismo no “âmbito da formação e apontando para um retrocesso nas históricas lutas para construir uma formação profissional crítica, com perspectiva de totalidade e comprometida com a transformação social” (BOSCHETTI, 2015, p.645). Valorizando a instabilidade e a dispersão, a ideologia neoliberal pós-moderna declara o “fracasso”: dos projetos emancipatórios, das orientações éticas pautadas em valores universais, da razão moderna, da ideia de progresso histórico e de totalidade. O estímulo à vivência fragmentada centrada no presente (resumida ao aqui e ao agora, sem passado e sem futuro), ao individualismo exacerbado, num contexto penetrado pela violência, dá origem a novas formas de comportamento, buscam algum controle imaginário sobre o fluxo temporal. (BARROCO, 2015, p.207). Importa salientar que a mercantilização gerou um aumento significativo na inserção de alunos “clientes” no ensino privado e na modalidade à distância, o que resultou em um salto no número de profissionais brasileiros. Entretanto, é válido lembrar que o sistema de Ensino à Distância (EAD) tem sido o maior responsável por este crescimento assustador, o que traz para o mercado de trabalho um perfil profissional com formação rasa, superficial e de baixa qualidade (BOSCHETTI, 2015). Segundo Pereira (2014, p. 184): O curso de graduação em Serviço Social – criado nos anos 1930 no país e cujo crescimento relaciona-se com o processo de urbanização e industrialização, associado à necessidade de enfrentamento estatal/burguês frente às expressões da “questão social” e às insatisfações de diversos segmentos da classe trabalhadora – assistiu, a partir dos anos 2000, ao surgimento dos primeiros cursos de EaD. A modalidade de ensino a distância é argumentada pela categoria profissional há quase dez anos, pois apresenta um novo modelo de configuração do perfil profissional, dado que na modalidade EAD são formados profissionais sem a vivência acadêmica devida, o processo de contato entre docência e o estudantil é destituído o que afasta o contato com os movimentos sociais históricos, tendo ausência do tripé indissociável do ensino, pesquisa e extensão, possuindo uma bibliografia rasa e enxuta, e etc. Empurrando para o mercado um profissional com o perfil de política social residual, minimalista e focalizada. “Além da primordial resistência política a um perfil de formação que precariza e fragiliza o exercício profissional em seu aspecto crítico e questionador da sociabilidade burguesa” (PEREIRA, 2014, p. 185). 2734
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Esse crescimento acelerado de profissionais pode gerar um “exército assistencial de reserva” podendo ocasionar e reforçar as práticas direcionadas para o voluntariado e da precarização do exercício profissional (IAMAMOTO, 2013). Ao transformar a educação em objeto mercantil, o aluno em cliente consumidor e a universidade em emitente de diplomas banais, essa reforma esvazia a dimensão emancipadora da educação e subtrai o caráter universalista da instituição universitária. Ambiente institucional danificado, do ethos acadêmico degradado, ao se constituir lugar da formação acadêmico-profissional das novas gerações torna-se, também, solo de disputa e resistência aos processos de socialização do atual padrão societário (KOIKE, 2009, p.208). O processo de mercantilização da formação profissional reproduz o retrógado perfil do assistente social conservador, reatualizando a sua atuação reduzida às práticas estabelecidas no âmbito da imediaticidade, contradizendo o caráter emancipador do Serviço Social conquistado por meio das lutas e através do rompimento no campo teórico-metodológico com o processo de intenção de ruptura. O exercício profissional não se limita a um conjunto de instrumentos para a sua intervenção, faz-se necessário a compreensão de que a teoria não se trata de uma receita mágica para intervir profissionalmente, contudo, a teoria de forma investigativa busca a explicação dos fenômenos da realidade de forma totalitária e não individualizada, a teoria conduz embasamento fundamental à ação profissional, sendo uma mediação para esta (BOSCHETTI, 2015). Destaca-se que o neoliberalismo reapresenta por meio da renovação do conservadorismo e da presença de seus traços nas práticas profissionais mais uma forma de alimento para o capital atendendo aos seus interesses. O Serviço Social busca adjunta a categoria profissional a construção de estratégias compromissadas com o Projeto Ético-Político Profissional, pautada na teoria social crítica, o embate de enfrentamento e superação dessas novas roupagens do conservadorismo presentes na formação. No âmbito especificamente do Serviço Social, o desafio de reafirmar nosso Projeto Ético-Político é mais necessário do que nunca, pois não podemos recuar diante da ofensiva conservadora e retroceder nas conquistas alcançadas por tantas gerações. O crescimento acelerado da profissão não pode fagocitar esse precio¬so patrimônio construído coletivamente, que é o Projeto Ético-Político Profissional. Por isso, a formação e o trabalho profissional devem ser oxi¬genados permanentemente pela indignação com a barbárie, pela recusa ao naturalismo das coisas e pelo otimismo e convicção de que a história é construída por sujeitos, homens e mulheres, alimentados pelo conhecimen¬to teórico da realidade (BOSCHETTI, 2015, p.650). 2735
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI O embate entre a teoria e a realidade prática do assistente social não se esgota aqui, entretanto conforme apontado pela autora à reafirmação do Projeto Ético-Político torna-se um desafio na atualidade, carecendo de um avanço da categoria profissional em oposição à ofensiva conservadora, não recuando e abandonando o processo histórico construído através de lutas. Destarte, verifica-se que a formação profissional se encontra em total sintonia com o mercado de trabalho, em razão de que o Serviço Social é participante da divisão social e técnica do trabalho e esta é a condição existente para sua preservação e sobrevivência, fazendo-se necessário a reformulação de um novo perfil profissional, que responda de forma crítica e criativa as demandas estabelecidas pelo mercado de trabalho, possuindo a capacidade de acompanhar as transformações da sociedade e não se abstendo do compromisso ético-político profissional (IAMAMOTO, 2013). A formação profissional possui o papel fundamental de preparar cientificamente profissionais para responder as exigências de um projeto profissional construído de forma coletiva e situado na história, dispondo da capacidade de responder às demandas instituídas na atualidade pelo mercado de trabalho. Qualificando profissionais para a investigação e produção de conhecimentos sobre o seu espaço de atuação, dotados de habilidades tanto em âmbito teórico quanto metodológico, possibilitando a compreensão das implicações de sua prática, a reconstruindo, a efetivando e a recriando nesse jogo de forças sociais existentes. Por intermédio de um projeto profissional de direção social crítica, articulando a teoria e prática aos projetos sociais da classe trabalhadora em suas relações com as forças da classe dominante (IAMAMOTO, 2011). O processo de formação em Serviço Social no Brasil se constitui como uma tarefa desafiadora, principalmente para subsidiar as ações políticas das entidades político- acadêmicas que pertencem a essa categoria profissional para que sejam criados projetos que afirmem e reafirme, no cotidiano prático de formação, o perfil de profissional de Serviço Social indicado pelas Diretrizes Curriculares da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) e pelo projeto Ético-Político do pertencente a essa categoria profissional. 3 CONCLUSÃO 2736
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI O processo de privatização dos cursos de graduação em Serviço Social traz impactos significativos para todo o corpo profissional, uma vez que conforme apontado no texto as faculdades privadas buscam preparar profissionais para o mercado de trabalho e não para um fazer profissional pautado em uma perspectiva crítica da realidade. Com isso, o perfil conservador, que já fora abandonado no percurso histórico da profissão, encontra resquícios para se tornar outra vez existente na categoria profissional. Diante do atual cenário político, econômico e social que estamos vivenciando observamos que a privatização dos direitos se encontra cada vez mais real, os ensinos remotos ganham espaço, os cursos de Ensino a Distância se tornam mais acessíveis e convenientes, enquanto os debates ricos de criticidade vão se esvaindo, assim como o acesso dos estudantes a pesquisa, extensão e etc., dando espaço a regressão. Percebe-se a importância de lutar pela educação pública, para que o acesso ao direito de estudar seja possível em todos os seus níveis para toda a população, principalmente aqueles pertencentes à classe trabalhadora que lutam diariamente para conciliar o trabalho aos estudos. A privatização nada mais é do que uma negação dos nossos direitos instituídos constitucionalmente. Se a educação é para todos, ela deve ser garantida para todos. REFERÊNCIAS BARROCO, Maria Lúcia. Não passarão! Ofensiva neoconservadora e Serviço Social. Serviço Social & Sociedade, n. 124, 2015. BOSCHETTI, I. Expressões do conservadorismo na formação profissional, IN: Serviço Social & Sociedade, São Paulo, n. 124, p. 637-651, out./dez. 2015. DESLANDES, S. F.: GOMES, R.: MINAYO, M. C. de S (Org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 28. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009. IAMAMOTO, M. V. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 24 ed. São Paulo, Cortez, 2013. IAMAMOTO, M. V. Renovação e conservadorismo no Serviço Social. Ensaios críticos. 11 ed. São Paulo: Cortez, 2011. 2737
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI __________. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 7 ed. São Paulo, Cortez, 2012. KOIKE, M. M. Formação profissional em Serviço Social: exigências atuais. Serviço Social: Direitos Sociais e Competências Profissionais. Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009. p. 201-219. LIMA, K. R. de S.; PEREIRA, L. D. Contra-reforma na educação superior brasileira: impactos na formação profissional em Serviço Social. Sociedade em Debate, v. 15, n. 1, p. 31-50, 2012. Disponível em: http://rle.ucpel.edu.br/index.php/rsd/article/view/358. Acesso em 19 de novembro de 2018. PEREIRA, L. D. Análise comparativa entre expansão dos cursos de Serviço Social EAD e presenciais. Temporalis, v. 14, n. 27, p. 181-202, 2014. Disponível em: http://www.portaldepublicacoes.ufes.br/temporalis/article/view/7189. Acesso em 19 de novembro de 2018. 2738
EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS CONTINUIDADE E SUCESSO ACADÊMICO: contribuição da política de assistência estudantil na UFPA, Campus de Salinópolis – PA. CONTINUITY AND ACADEMIC SUCCESS: contribution of student assistance policy at UFPA, Campus de Salinópolis - PA. Martha Luiza Costa Vieira1 RESUMO Neste artigo é apresentado um estudo bibliográfico, realizado em 2018, que teve como principal objetivo analisar a relação entre a assistência estudantil na Universidade Federal do Pará, Campus de Salinópolis e a continuidade e sucesso acadêmico dos estudantes assistidos pelos auxílios disponibilizados ao estudante desse Campus. A análise dos dados foi realizada à luz de autores e legislações que embasaram o estudo. A assistência estudantil foi marcada por ações esparsas e pontuais, assumindo caráter assistencialista. Especificamente no Campus de Salinópolis, os estudantes enfrentam dificuldades em receber os auxílios por falta de compreensão dos editais, insuficiência de vagas para atender às demandas e burocracias que envolvem o processo de inscrição. Esses fatores combinados ocasionam um baixo número de estudantes atendidos no Campus de Salinópolis e contribuem para aumentar os índices de retenção e evasão nesse Campus. Palavras-Chaves: Permanência. Assistência. Estudantil. ABSTRACT This article presents a bibliographic study, carried out in 2018, whose main objective was to analyze the relationship between student assistance at the Federal University of Pará, Campus de Salinópolis and the continuity and academic success of students assisted by the assistance provided to students at that Campus. Data analysis was carried out in the light of authors and legislation that supported the study. Student assistance was marked by sparse and punctual actions, 1 Assistente Social da Universidade Federal do Pará – UFPA, Mestranda do Programa de Pós-graduação em História Social da Amazônia. E-mail: [email protected]. 2739
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI assuming an assistential character. Specifically at the Salinópolis Campus, students face difficulties in receiving aid due to lack of understanding of the notices, insufficient places to meet the demands and bureaucracies that involve the application process. These factors combined cause a low number of students attended at the Salinópolis Campus and contribute to increase the retention and dropout rates at that Campus. Keywords: Permanence, Assistance, Student. Keywords: Permanence. Assistance. Student. INTRODUÇÃO Este estudo é de caráter bibliográfico e sobre a Assistência Estudantil – AE na Universidade Federal do Pará – UFPA, Campus de Salinópolis, vinculado à Divisão de Apoio e Assistência Estudantil – DAAE, setor da Coordenação Acadêmica da UFPA, Campus de Salinópolis, cujo eixo norteador é a relação entre o trinômio: ampliação do acesso, permanência e evasão do estudante no ensino superior. Os debates sobre assistência estudantil no ensino superior têm sido contínuos (DUTRA; SANTOS, 2017; LADEIRA; MARTINS, 2015; MACIEL; SILVA; VELOSO, 2015) e mostram a relevância das lutas travadas pela União Nacional dos Estudantes – UNE a partir da década de 1960 e das discussões promovidas a partir da década de 1980 pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis – FONAPRACE para a sua inserção como direito social e política pública. A política de assistência estudantil é conceituada pelo FONAPRACE (2012, p. 63) como sendo o “[...] conjunto de princípios e diretrizes que norteiam a implantação de ações para garantir o acesso, a permanência e a conclusão de curso de graduação dos estudantes das Instituições Federais de Ensino Superior - IFES, na perspectiva de inclusão social [...]”. Nessa mesma lógica, na UFPA, a AE se engloba nas “políticas para o provimento e manutenção dos auxílios diretos (financeiros) e indiretos (prestação de serviços), condições necessárias à permanência de discentes na UFPA, na perspectiva do direito” (UFPA, 2017, p. 3). Cabe acentuar que em consequência das políticas voltadas à reestruturação das universidades federais e ampliação da oferta de vagas no ensino superior, que instituiu o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais 2740
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI – REUNI por meio do Decreto n° 6.096/2007 e da política afirmativa, Lei nº 12.711/2012, que dispõe sobre a reserva de vagas para estudantes de escolas públicas e oriundos de família de baixa renda, as IFES passaram a receber um grande número de estudantes provenientes de setores da população que eram excluídos desse contexto. Com isso, o PNAES passou a ser considerado o principal meio para contribuir com a permanência desses estudantes. O estudo tem como objetivo analisar a relação entre a assistência estudantil na Universidade Federal do Pará, Campus de Salinópolis e a continuidade e sucesso acadêmico dos estudantes assistidos pelos auxílios disponibilizados ao estudante desse Campus. A escolha pela temática justifica-se pela experiência desta pesquisadora durante um ano como assistente social da Universidade Federal do Pará – UFPA, Campus Altamira, que cotidianamente acolhia discentes que explanavam suas lutas, trajetórias, violências múltiplas e intraduzíveis, sofridas no trajeto de embates e acordos. Nessa lógica, o questionamento que problematiza este estudo foi assim determinado: A política de assistência estudantil adotada no Campus de Salinópolis tem colaborado para a permanência e êxito acadêmico de estudantes desse campus? Essa interrogação foi a norteadora deste estudo, que teve como principal objetivo analisar a relação entre a assistência estudantil no Campus de Salinópolis e a permanência e êxito acadêmico dos estudantes assistidos pelos auxílios disponibilizados ao estudante no Campus. O trabalho foi realizado por meio da pesquisa bibliográfica, a partir da qual foi possível estabelecer aproximação com o objeto de estudo, identificar a trajetória histórica da assistência estudantil no ensino superior brasileiro e autores que discutem o contexto de implantação do PNAES, além de obter dados sobre a AE na UFPA e no Campus de Salinópolis, permitindo a problematização da sua efetivação nesse Campus. Conforme esclarece Boccato (2006, p. 266): A pesquisa bibliográfica busca a resolução de um problema (hipótese) por meio de referenciais teóricos publicados, analisando e discutindo as várias contribuições científicas. Esse tipo de pesquisa trará subsídios para o conhecimento sobre o que foi pesquisado, como e sob que enfoque e/ou perspectivas foi tratado o assunto apresentado na literatura científica. Para tanto, é de suma importância que o pesquisador realize um planejamento sistemático do processo de pesquisa, compreendendo desde a definição 2741
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI temática, passando pela construção lógica do trabalho até a decisão da sua forma de comunicação e divulgação. Também foi realizado um levantamento do aparato legal que norteou a assistência estudantil no contexto da educação superior brasileira. Os dados foram ponderados à luz dos pressupostos teóricos e metodológicos da Análise de Conteúdo referenciada em Bardin (2011). Nesse sentido, buscou-se descrever a conjuntura e elucidar as concepções de assistência estudantil, categoria analítica central deste estudo, a partir da análise e interpretação do conteúdo das mensagens “visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos [...] indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens” (BARDIN, 2011, p. 49). 2 DESENVOLVIMENTO A trajetória da AE no Brasil foi marcada por variados contextos econômicos e políticos que induziram seu percurso até sua legitimação em 2010, como política de Estado. Durante esse processo, a AE foi desenvolvida por meio de ações distantes e precisas, vindo a ganhar notabilidade vagarosamente na medida em que foi sendo inserida nas legislações, sobretudo como resultados das reivindicações de movimentos estudantis em prol de uma universidade pública igualitária e de qualidade. Para fins didáticos, o caminho percorrido pela AE no Brasil foi constituído em três fases: a primeira, apreendida entre a década de 1920, quando é identificada na literatura menção às primeiras ações de assistência ao estudante, até o fim do Regime Militar. A segunda dá-se início no contexto de redemocratização do país, a partir da década de 1980 até o final do governo Fernando Henrique Cardoso (2003); e a terceira fase é determinada pelo início do governo Lula (2003) e se estende até os dias atuais, no governo Bolsonaro (2019). Quanto aos primeiros passos da assistência estudantil no Brasil, não há na literatura brasileira uma conformidade sobre as primeiras ações de assistência estudantil no Brasil. Autores sugerem que podem ter sido as repúblicas da Imperial Cidade de Ouro Preto, antiga Vila Rica e capital das Minas Gerais, que, no início do século 2742
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI XIX, abrigavam os estudantes da Escola de Farmácia e da Escola de Minas, porém a autora não confirma sua hipótese. A Assistência Estudantil assume sua primeira nuance de legalidade ao ser previsto, na Constituição de 1934, em seu artigo 157, que “A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos respectivos fundos de educação” (BRASIL, 1934, não paginado). No parágrafo segundo desse artigo, é determinado que parte do mesmo fundo seria destinada “para auxílios a alunos necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para vilegiaturas” (BRASIL, 1934, não paginado). Na Constituição de 1946, a AE passou a ter um caráter exigido, determinado no artigo 172, segundo o qual “cada sistema de ensino terá obrigatoriamente serviços de assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados condições de eficiência escolar” (BRASIL, 1946, não paginado). Entretanto, na legislação não constam orientações sobre como a assistência educacional deveria ser efetivada e não há indicadores sobre sua abrangência. A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n° 4.024, sancionada em 1961 pelo presidente João Goulart, durante a Ditadura Militar, especifica em seu artigo 90 como deveria se dar a assistência educacional: Em cooperação com outros órgãos ou não, incumbe aos sistemas de ensino, técnica e administrativamente, prover, bem como orientar, fiscalizar e estimular os serviços de assistência social, médico-odontológico e de enfermagem aos alunos (BRASIL, 1961, não paginado). Ainda que tenha havido ordenamento legal na legislação que passou a reger o ensino brasileiro em todos os níveis, a assistência estudantil que deveria estar inserida no âmbito da assistência social não se estabeleceu como um direito efetivo nesse período. No contexto de Redemocratização do país, em 1987, as reinvindicações por assistência estudantil, provenientes dos movimentos estudantis, foram determinantes para a criação do FONAPRACE que congrega pró-reitores, sub-reitores, decanos ou responsáveis pelos assuntos comunitários e estudantis das Instituições de Ensino Superior – IES. Dessa forma, no período de redemocratização do Brasil, também não é 2743
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI efetivada uma política de apoio à permanência do estudante no ensino superior, pois apesar de estar prevista na Carta Magna e na LDB, “esses dispositivos legais foram insuficientes para garantir a implementação de uma política pública de Assistência Estudantil em função da ausência de verbas destinadas para tal ação” (VARGAS, 2008, p. 78). Na primeira gestão do governo Lula da Silva (2003-2006) foi instituído o Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, por meio do Decreto n° 6.096, de 24 de abril de 2007. Nesse panorama de ampliação do acesso ao ensino superior, o Plano Nacional de Assistência Estudantil foi atualizado pelo FONAPRACE, prevendo a assistência ao estudante por meio do desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e extensão nas IFES. Finalmente, em 2007, o PNAES torna-se política de governo por meio da Portaria Normativa n° 39/2007 (BRASIL, 2007), indicando o primeiro passo para que se tenha no ensino superior brasileiro a consolidação de uma política de assistência estudantil. Em julho de 2010, o PNAES foi transformado em Programa Nacional de Assistência Estudantil por meio do Decreto n° 7.234, mantendo a sigla PNAES e constituindo-se em um programa de Estado, indicando uma conquista para todos os setores que lutaram para a consolidação da política de assistência estudantil no país. De acordo com o PNAES, os programas de AE desenvolvidos nas IFES devem ser destinados, prioritariamente, aos estudantes “oriundos da rede pública de educação básica ou com renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio” (BRASIL, 2010, não paginado). Em conformidade com o artigo segundo do Decreto n° 7.234/2010 são objetivos do PNAES: I – democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal; II - minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior; III - reduzir as taxas de retenção e evasão; e IV - contribuir para a promoção da inclusão social pela educação (BRASIL, 2010, não paginado). Para obter esses objetivos, o PNAES propõe que os recursos de assistência ao estudante sejam aplicados em dez diferentes áreas: I - moradia estudantil; II - alimentação; III - transporte; IV - atenção à saúde; V - inclusão digital; VI - cultura; VII - esporte; VIII - creche; IX - apoio pedagógico; e X - acesso, participação e aprendizagem 2744
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades e superdotação (BRASIL, 2010). No período de criação da UFPA, meados dos anos 1950, a instituição não possuía uma política de assistência estudantil consistente, ainda assim, mediante esforços, em 1960 criou a primeira Casa de Estudantes da instituição para abrigar os discentes que não residiam em Belém e não tinham condições financeiras de arcar com despesas de moradia. Posteriomente, na década de 1990, é construído em Belém o primeiro Restaurante Universitário cobrando valores irrisórios, o qual se constituiu em grande apoio aos estudantes em relação à garantia de alimentação. Em 2007, a Universidade Federal do Pará aderiu ao REUNI. Nesse mesmo ano, sua política de assistência estudantil é fortalecida, pois, em função da instituição do PNAES, passa a receber recursos destinados exclusivamente para esse fim. Porém, somente no ano de 2017 a UFPA passa a ofertar macroprogramas de assistência ao estudante, oferecendo auxílios financeiros (auxílios diretos) ou atendimentos por meio de serviços (auxílios indiretos). Os auxílios disponibilizados diretamente são caracterizados na UFPA como sendo da dimensão de assistência: a) Programa Permanência (PP); b) Casa de Estudantes Universitários (PROCEUS); c) Programa Bolsa Permanência do Mistério da Educação (PBP/MEC). De acordo com critérios estabelecidos nos editais, o auxílio Permanência pode ser acumulado com os auxílios Moradia, Creche, Kit Acadêmico, Acesso às Línguas Estrangeiras, Instruir e Taxa Zero, ou seja, o estudante pode adquirir até dois desses auxílios concomitantemente. 3 RESULTADOS A Divisão de Apoio e Assistência Estudantil – DAAE está vinculada à Coordenação Acadêmica do Campus de Salinópolis e à Superitendência de Assistência Estudantil – SAEST com uma equipe que, até o ano 2018, era formada apenas por um técnico em assuntos educacionais. A partir de março de 2019 houve a inserção de uma assistente social, a qual assumiu, dentre outras atribuições, o atendimento aos estudantes que se submetiam aos editais. Um atendimento com vistas a solucionar dúvidas em relação à 2745
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI compreensão do edital, já que essa era uma das grandes dificultades enfrentadas pelos estudantes quando se candidatavam ao auxílio. O entendimento dos editais, que nem sempre são claros em relação à documentação necessária, causava (e causa) o indeferimento de muitos estudantes e a falta de perceptibilidade quanto à interposição de recursos anteparava (e antepara) que muitos desses estudantes, potenciais assistidos, não recebam o auxílio. Os enigmas relacionados aos editais são reconhecidos pela Superitendência de Assistência Estudantil – SAEST, que responsáveis por esse setor têm promovido esforços para solucioná-los. O auxílio de uma assistente social também contribuirá para amenizar esse problema. Porém esse não é o único problema enfrentado no campus pelos estudantes que demandam algum tipo de assistência para dar continuidade e concluir os estudos. Muitos problemas são de ordem operacional (planejamento, oferta, avaliação das inscrições e acompanhamento dos estudantes assistidos), outros são de ordem pessoal e/ou institucional (baixo índice de estudantes beneficiados; muitos estudantes são oriundos de outros municípios e o afastamento familiar gera problemas afetivos e emocionais que comprometem a saúde mental) que, em alguma medida, comprometem a permanência do estudante do Campus de Salinópolis. Entretanto, a efetivação do PNAES no âmbito das universidades e especificamente no Campus de Salinópolis não alcança a todos os estudantes que precisam dos auxílios e não tem sido suficiente para combater os altos índices de evasão e retenção no campus, pois sua operacionalização é feita por meio de processos seletivos que excluem ao tentar incluir, em função da burocratização para solicitação de auxílio e insuficiência de recursos em relação à demanda, o que contribui para manter o caráter assistencialista da assistência estudantil. Ressalta-se que, apesar das fragilidades que envolvem sua operacionalização, o PNAES é relevante para garantir a muitos jovens, pertencentes às classes populares antes excluídas do ensino superior, condições, mesmo que mínimas, de permanecer nas universidades públicas federais. 4 CONCLUSÃO 2746
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A efetivação do PNAES no âmbito das universidades e especificamente no Campus de Salinópolis não alcança a todos os estudantes que precisam dos auxílios e não tem sido suficiente para combater os altos índices de evasão e retenção no campus, pois sua operacionalização é feita por meio de processos seletivos que excluem ao tentar incluir, em função da burocratização para solicitação de auxílio e insuficiência de recursos em relação à demanda, o que contribui para manter o caráter assistencialista da assistência estudantil. Ressalta-se que, apesar das fragilidades que envolvem a operacionalização, o PNAES é relevante para garantir a muitos jovens, pertencentes às classes populares antes excluídas do ensino superior, condições, mesmo que mínimas, de permanecer nas universidades públicas federais. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de conteúdo. Ed. rev. ampl. Tradução de Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. São Paulo: Edições 70, 2011. BOCCATO, V. R. C. Metodologia da pesquisa bibliográfica na área odontológica e o artigo científico como forma de comunicação. Revista de Odontologia da Universidade Cidade de São Paulo, São Paulo, v. 18, n. 3, p. 265-274, set./dez. 2006. BRASIL, Constituição (1934). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 16 de julho de 1934. Brasília, DF: Presidência da República, 1934. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm. Acesso em: 28 nov. 2017. BRASIL. Constitução (1946). Constituição dos Estados Unidos do Brasil: promulgada em 18 de setembro de 1946. Brasília, DF: Presidência da República, 1946. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm. Acesso em: 28 nov. 2017. BRASIL. Constitução (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 5 abr. 2018. BRASIL. Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, DF: Presidência da República, 1961. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/L4024compilado.htm. Acesso em: 9 jul. 2018. 2747
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