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EIXO 6 - Educação, Sociedade e Políticas Públicas

Published by Editora Lestu Publishing Company, 2021-01-22 22:30:04

Description: Educação, Sociedade e Políticas Públicas

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ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI BRASIL. Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007. Institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – REUNI. Brasília, DF: Presidência da República, 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/ 2007/decreto/d6096.htm. Acesso em: 5 abr. 2017. BRASIL. Decreto nº 7234, de 19 de julho de 2010. Dispõe sobre o Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES. Brasília, DF: Presidência da República, 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/Decreto/D7234.htm. Acesso em: 7 jul. 2018. BRASIL. Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 2012. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm. Acesso em: 7 jul. 2018. BRASIL. Ministério da Educação. Portaria Normativa nº 39, de 12 de dezembro de 2007. Institui o Programa Nacional de Assistência Estudantil - PNAES. Brasília, DF: Presidência da República, 2007. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/portaria_pnaes.pdf. Acesso em: 30 jun. 2018. DUTRA, N. G. R.; SANTOS, M. F. S. Assistência estudantil sob múltiplos olhares: a disputa de concepções. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 25, n. 94, p. 148-181, jan./mar. 2017. FONAPRACE (Org). FONAPRACE: Revista comemorativa 25 anos: histórias, memórias e múltiplos olhares. Uberlândia, MG: UFU/PROEX, 2012. Disponível em: http://www.assistenciaestudantil.cefetmg.br/galerias/arquivos_download/Revista_Fo naprace_25_Anos.pdf. Acesso em: 20 jul. 2017. LADEIRA, M. R. A.; MARTINS, R. A. S. Limites e possibilidades para a permanência no Ensino Superior Público: o compromisso social da Universidade. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE POLÍTICA SOCIAL E SERVIÇO SOCIAL, 2015, Londrina. Anais […]. Londrina: UEL, 2015. Disponível em: http://www.uel.br/pos/mestradoservicosocial/con gresso/anais/Trabalhos/eixo1/oral/12_limites_e_possibilidades....pdf. Acesso em: 15 nov. 2017. MACIEL, C. E. ; SILVA, M. G. M.; VELOSO, T. C. M. A. Assistência estudantil: a evolução de uma política pública e os significados no contexto da educação superior. In: SOUSA, J. V. de (Org.). Expansão e avaliação da educação superior brasileira: formatos, desafios e novas configurações. Belo Horizonte, MG: Fino Traço, 2015. p. 255-276. UFPA. Resolução nº 763, 20 de outubro de 2017. Aprova o Regimento da Superintendência de Assistência Estudantil (SAEST) da Universidade Federal do Pará. 2748

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Belém: UFPA, 2017. Disponível em: http://www.ufpa.br/sege/boletim_interno/downloads/resolucoes/consun/ 2017/763_Aprova%20%20Regimento%2020da%20SAEST.pdf. Acesso em: 30 jun. 2018. VARGAS, M. L. F. Ensino superior, assistência estudantil e mercado de trabalho: um estudo com egressos da UFMG. 2008. 205 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008. Disponivel em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/ 1843/FAEC- 84VHVQ/1/disserta__o_michely_vargas.pdf. Acesso em: 5 jan. 2018. 2749

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCAÇÃO E TRABALHO: UMA PERSPECTIVA DE UMA EDUCAÇÃO INTEGRADA EDUCATION AND WORK: A PERSPECTIVE OF INTEGRATED EDUCATION Georges Cobiniano Sousa de Melo 1 Márcio Aurélio Carvalho de Morais 2 RESUMO Indaga-se o significado de ser humano integral. Para o cristianismo, a perfeição é assemelhar-se a Deus. No Humanismo, o homem passou a ser problema, objeto e paradigma, devendo a resposta ser encontrada analisando-se o próprio homem. Declarações da Assembleia Geral das Nações Unidas confirmam o trabalho e a educação como direitos humanos, imprescindíveis para uma vida digna e cidadania ativa. Bibliografia em ensino integrado apontam o trabalho como a essência do ser humano e a educação como instrumento de conscientização, necessária à realização dos direitos humanos. É preciso romper com a dualidade histórica entre educação profissional e propedêutica, que relega a primeira ao mero tecnicismo. Deve-se aliar à educação profissional as dimensões da cultura, conhecimento e tecnologia, formando seres humanos capazes de refletir sobre a práxis do trabalho. No Brasil, o ensino integrado tem como desafio a submissão histórica da educação profissional aos interesses econômicos do capitalismo do tipo dependente. Palavras-Chaves: Educação. Ensino integrado. Trabalho. ABSTRACT The meaning of integral human being is asked. For Christianity, perfection is to resemble God. In Humanism, man became a problem, object and paradigm, and the answer must be found by analyzing man himself. Declarations by the United Nations General Assembly confirm 1 Mestrando em Educação Profissional e Tecnológica, pelo Instituto Federal do Piauí (IFPI). Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Paraíba, Bacharel em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB e Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Escola Superior da Advocacia da Paraíba – ESA/PB. 2 Doutor em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP/ Campus Rio Claro, Mestre em Ensino de Ciência e Matemática pela Universidade Luterana do Brasil. Professor Efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Piauí. 2750

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI work and education as human rights, essential for a dignified life and active citizenship. Bibliography in integrated education points to work as the essence of the human being and education as an awareness tool, necessary for the realization of human rights. It is necessary to break with the historical duality between professional and propaedeutic education, which relegates the former to mere technicality. The dimensions of culture, knowledge and technology must be combined with professional education, forming human beings capable of reflecting on the praxis of work. In Brazil, integrated education has as a challenge the historical submission of professional education to the economic interests of dependent capitalism. Keywords: Integral education. Education. Work. INTRODUÇÃO A definição de ser humano integral depende do ponto de vista adotado. Para as religiões, a exemplo da cristã, pode significar a semelhança com Deus. Mas, certamente, não é esse o conceito mais adotado nos dias atuais. Com a inauguração do Humanismo, o centro das atenções deslocou-se para o próprio ser humano. Assim, o estudo de suas características - e do que os diferencia dos outros animais - é o que deve determinar o que se entende por homem e por ser humano integral. A Declaração Universal dos Direitos Humanos - DUDH - relaciona os direitos considerados humanos, elencando-os como necessários para a construção de uma sociedade internacional justa, fraterna e igualitária. Dentre esses direitos, encontra-se o de trabalho justo e satisfatório, condição sine qua non para uma vida digna. O homem trabalha, alterando a natureza, produzindo sua sobrevivência. Mas o faz de maneira consciente, o que o diferencia dos outros seres vivos. Essa atividade, por sua vez, é o que torna o homem o que ele é. Dessa maneira, deve-se partir da perspectiva do trabalho a conceituação de ser humano integral, bem como do ensino capaz de fazê-lo alcançar essa realização. Este trabalho objetiva verificar o que significa ser humano integral, ao longo do tempo, até os dias atuais, bem como os desafios para a sua concretização. Para tanto, realizou-se pesquisa bibliográfica, para revelação dos conceitos em análise, e documental, buscando-se em pinturas de época a retratação icônica das culturas estudadas. 2751

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 2 SER HUMANO INTEGRAL A expressão ser \"humano integral” pode trazer muitos significados, dependendo do ponto de vista adotado. O primeiro conceito a ser investigado é o que parte do teocentrismo, já que durante muito tempo a humanidade se guiou pelos dogmas que seguem as religiões. Com relação especificamente à religião cristã, Deus é considerado a própria perfeição. Então, como ser humano integral, entende-se a similitude com aquele Ser Superior. É o que se depreende do Livro de Gênesis, da Bíblia, que aborda a criação do homem e da mulher, antes de incorrerem no pecado original: Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher, os criou (BÍBLIA, 2006, p. 8). Interessante observar que essa passagem bíblica já abordava o trabalho como característica humana. Ao apontar que o homem dominaria a natureza, diferenciou-o dos demais animais, apontando-o como capaz de transformá-la para produzir sua própria sobrevivência. Numa mudança de paradigma, a sociedade moderna foi marcada pelo abandono do teocentrismo. Inaugura-se, assim, a Era do Humanismo, conforme explica Renaut (2004 apud BARBOSA, 2011): […] o que define intrinsecamente a modernidade é, sem dúvida, a maneira como o ser humano nela é concebido e afirmado como fonte de suas representações e de seus atos, seu fundamento (subjectum, sujeito) ou, ainda, seu autor: o homem do humanismo é aquele que não concebe mais receber normas e leis nem da natureza das coisas, nem de Deus, mas que pretende fundá-las, ele próprio, a partir de sua razão e de sua vontade. Assim, o direito natural moderno será um direito ‘subjetivo’, criado e definido pela razão humana (voluntarismo jurídico), e não mais um direito ‘objetivo’, inscrito em qualquer ordem imanente ou transcendente do mundo. Dessa maneira, o significado do que é “ser humano” deve ser buscado dentro do próprio homem. Além disso, é recomendável atentar que esse conhecimento é construído paulatinamente, dependendo da época e da sociedade. 2752

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Figura 1 - O Homem Vitruviano, de Leonardo da Vinci Fonte: www.lucnix.be A figura acima, de autoria de Leonardo da Vinci (1490), representa bem o homem como medida de todas as coisas. Propositadamente, o retângulo obedece à clássica proporção áurea, considerada perfeita, com a cabeça ocupando 1/8 (um oitavo) da altura total. Após a Segunda Guerra Mundial, as preocupações com o ser humano aumentaram, em virtude das atrocidades cometidas, especialmente contra os judeus e outras minorias. No ano de 1945, foi fundada a Organização das Nações Unidas - ONU. Tinha por escopo a cooperação entre as nações, com vistas a impedir a eclosão de outro conflito internacional (NAÇÕES UNIDAS, 1945). Em 1948, a Assembleia Geral da ONU aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos - DUDH. A DUDH objetiva materializar as finalidades da ONU, ao estabelecer direitos humanos, que deverão ser respeitados e concretizados, dentre os quais liberdades civis, direitos econômicos e sociais. 2753

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A Declaração Universal dos Direitos Humanos veicula as ideias de justiça, fraternidade e igualdade, enfatizando a dimensão do trabalho, com remuneração justa e satisfatória, que garanta a dignidade do trabalhador e de sua família (NAÇÕES UNIDAS, 1944, Artigo XXIII). Por outro lado, o mesmo documento reconhece a educação como instrumento essencial para o alcance de todos os direitos já mencionados: A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz (NAÇÕES UNIDAS, 1944, Artigo XXVI). Desde já, e a partir dos excertos acima, podem ser elencados dois elementos indispensáveis para a realização do ser humano: o trabalho e a educação. 3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL Por muito tempo, o Brasil conviveu com o ensino profissional apartado da educação. As primeiras instituições eram destinadas às pessoas em situação de indigência, consideradas um problema social. A razão é que essas circunstâncias as levavam, frequentemente, à margem da lei. Com esse espírito assistencialista, surgiam, no século XIX, asilos infantis e colégios de fábrica (RAMOS, 2014). Porém, não se deve inferir que seus propósitos eram altruísticos, desinteressados. Na verdade, a política profissional sempre esteve pautada na consecução dos interesses das classes dominantes. No século XIX, a sociedade brasileira era escravocrata, pautada pelas monoculturas, dispostas em latifúndios. Nesse contexto, o trabalho braçal era considerado inferior, destinado às classes sociais desprivilegiadas. A educação profissional servia para atender à incipiente indústria, que surgia nos centros urbanos. Com a Revolução Burguesa no Brasil, porém, esse quadro não se modificou. Embora tenha adentrado num quadro de acelerada industrialização e modernização, esta era moderada, não sendo acompanhada da esperada evolução nos costumes e valores sociais. 2754

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A razão é que foi adotado um modelo de industrialização dependente, em que a economia brasileira funcionava como destinatária dos excedentes econômicos dos grandes centros hegemônicos. Dessa maneira, a classe trabalhadora era submetida a dupla exploração: a da burguesia local e da burguesia internacional (FERNANDES, 1976). Florestan Fernandes explica ainda que a oligarquia aderiu à “modernização\" para sobreviver. Assim, o burguês brasileiro adveio das oligarquias, do meio rural, portanto, adepto do “mandonismo”. Por esse motivo, a descolonização, a abolição da escravatura e o início do trabalho livre não significariam reais mudanças das condições de vida para a maioria dos brasileiros. A adoção dos ideais burgueses franceses restringia-se ao discurso. O que buscavam os burgueses brasileiros era amortecer as mudanças sociais espontâneas. A educação, nesse cenário, era um risco, uma vez que o despertar da consciência da classe trabalhadora era um risco à violenta estrutura do capitalismo dependente. Figura 2 - Pintura do artista francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) Fonte:http://commons.wikimedia.org/ A pintura acima, do artista francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848), retrata bem a cultura servil brasileira, oriunda de séculos de escravidão. Não seria rompida senão através de uma verdadeira revolução, o que nunca chegou a acontecer. 2755

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A educação profissional, desde a Revolução Burguesa no Brasil, manteve-se separada da educação propedêutica, embora tenha sido estabelecida sua equivalência, na primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1961 (RAMOS, 2014). 4 EDUCAÇÃO INTEGRADA A separação entre o trabalho e a educação propedêutica é uma forma de alienar, reprimir e impedir o despertar do trabalhador (SAVIANI, 2007). A essa conclusão é possível chegar partindo-se de dois pressupostos: que o trabalho é o que caracteriza o ser humano e o de que a educação promove a sua conscientização. O trabalho produz o homem, na medida em que através daquele se modifica a natureza e se produzem as condições de vida deste. É essa a lição de Gaudêncio Frigotto: Diferentemente do animal, que vem regulado, programado por sua natureza, e por isso não projeta sua existência, não a modifica, mas se adapta e responde instintivamente ao meio, os seres humanos criam e recriam, pela ação consciente do trabalho, a sua própria existência (FRIGOTTO, 2007, p. 174). Dermeval Saviani, na mesma senda, explica que: […] a essência humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico (SAVIANI, 2007, p. 154). O trabalho é a essência do ser humano, distinguindo-o dos outros animais. Porém, o trabalho foi expropriado do trabalhador, a partir da mercantilização da mão- de-obra e da implantação da mais-valia (FRIGOTTO, 2009). Nesse sentido, a educação profissional tem se voltado primordialmente ao aumento da produtividade, com a consequente majoração dos lucros do capitalista, reduzindo-se, em grande medida, ao tecnicismo. Além de elevar a mais valia, o tecnicismo na educação profissional tem outra função: a de alienar o trabalhador. Isso porque o ensino é o único meio capaz de conscientizar o ser humano sobre sua realidade e torná-lo um crítico do mundo. Desse modo, é importante uma educação básica unitária, \"politécnica e, portanto, não dualista, que articule cultura, conhecimento, tecnologia e trabalho como 2756

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI direito de todos e condição da cidadania e da democracia efetivas” (FRIGOTTO, 2005, pp. 73 e 74). Sob a perspectiva da formação integral, o homem labora conhecendo a realidade social e histórica, tornando-se capaz de refletir sobre sua prática, transformando-a, bem como o ambiente à sua volta. Desse modo, constantemente reflete sobre a práxis do trabalho, numa constante e autêntica mutação. 5 CONCLUSÃO O trabalho e a educação são direitos humanos, dispostos na Declaração Universal dos Direitos Humanos - DUDH. O primeiro, porque é a essência, característica do ser humano, e o segundo porque é fato ensejador da libertação do ser humano, apartando- o da ignorância e tornando-o um cidadão ativo e crítico. Porém, nada disso é possível sem uma formação integral, que alie, à educação profissional, cultura, conhecimento e tecnologia. Assim, é preciso encerrar a histórica divisão entre educação para o trabalho e o ensino propedêutico. Inclusive, a dualidade entre trabalho intelectual e manual tem sido fruto e também promovido a desigualdade social no Brasil. Portanto, a educação integrada ensejará mudanças, tanto no plano individual, de cada ser humano, como na formação de uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária. REFERÊNCIAS BARBOSA, Emerson Silva. O conceito de homem, pessoa e ser humano sob as perspectivas da Antropologia Filosófica e do Direito. Revista Âmbito Jurídico, nº 90, Ano XIV, jul/2011. Disponívle em: <<https://ambitojuridico.com.br/edicoes/revista- 90/o-conceito-de-homem-pessoa-e-ser-humano-sob-as-perspectivas-da-antropologia- filosofica-e-do-direito/>>. Aces. Em 02/11/2019. BÍBLIA In: Santa Bíblia. Tradução: João Ferreira de Almeida. São Paulo: L.C.C. Publicações eletrônicas, 2006. FERNANDES, Florestan Fernandes. A Revolução Burguesa no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976. FRIGOTTO, Gaudêncio. A polissemia da categoria trabalho e a batalha das ideias nas sociedades de classe. Revista Brasileira de Educação, v. 14, n. 40, jan./abr. 2009. Disp. 2757

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI em: <<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413- 24782009000100014&script=sci_abstract&tlng=pt>>. Aces. em: 19/08/2019. FRIGOTTO, Gaudêncio. Concepções e mudanças no mundo do trabalho e o ensino médio. In: FRIGOTTO, Gaudêcio; CIAVATTA, Maria; RAMOS, Marise (org.). Ensino Médio Integrado: concepção e contradições. São Paulo: Cortez, 2005. NAÇÕES UNIDAS, Assembleia Geral. Carta das Nações Unidas. 1945. Disp. em: <<https://www.un.org/en/sections/un-charter/introductory-note/index.html>>. Aces. em 02/11/2019. NAÇÕES UNIDAS, Assembleia Geral. Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948. Disp. em: <<https://nacoesunidas.org/wp- content/uploads/2018/10/DUDH.pdf>>. Aces. em 02/11/2019. RAMOS, Maria Nogueira. História e Política da Educação Profissional. Curitiba: IFPR- EAD, 2014. SAVIANI, Demerval. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. Revista Brasileira de Educação, v. 12, n. 34, jan./abr. 2007. Disp. em: <<http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v12n34/a12v1234.pdf>>. Aces. em: 21/08/2019 2758

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A “INCLUSÃO” COMO IDEOLOGIA NO CENÁRIO DE LUTA PELOS DIREITOS SOCIAIS DE PESSOAS PÚBLICO-ALVO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL “INCLUSION” AS IDEOLOGY IN THE SCENARIO FOR THE FIGHT FOR SOCIAL RIGHTS OF TARGET PUBLIC PEOPLE IN SPECIAL EDUCATION Alessandra Belfort Barros 1 Maria Eunice Ferreira Damasceno Pereira 2 RESUMO Este artigo discute a inclusão como forma ideológica, sob um discurso de garantia do direito à educação de pessoas público-alvo da Educação Especial no ensino regular, no cenário de ofensiva neoliberal. Utilizamos o método do materialismo histórico dialético, mediante a revisão bibliográfica para fundamentarmos a temática. Os resultados revelaram que a educação inclusiva traz um discurso amparado numa ideologia da inclusão, sendo que para sua viabilização é necessário que haja luta das pessoas desse segmento para materialização do direito à educação. Palavras-Chaves: Inclusão. Educação Especial. Direitos Sociais. Ideologia. ABSTRACT This article discusses inclusion as an ideological form, under a discourse guaranteeing the right to education of the target public of Special Education in regular education, in the scenario of neoliberal offensive. We used the method of dialectical historical materialism, through the bibliographic review to support the theme. The results revealed that inclusive education brings a discourse based on an 1 Professora do Atendimento Educacional Especializado do Colégio Universitário – COLUN, da Universidade Federal do Maranhão – UFMA, Doutora em Políticas Públicas pelo Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão. Email: [email protected]. 2 Professora da Universidade Federal do Maranhão, Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão. Doutora em Economia Aplicada do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Email: [email protected]. 2759

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI ideology of inclusion, and for its viability it is necessary that there be struggle of the people of this segment to materialize the right to education. Keywords: Special Education. Social Rights. Ideology. INTRODUÇÃO O artigo ora submetido à avaliação do III SINESPI reflete sobre a questão da inclusão escolar das pessoas deficientes. Argumenta que apesar de existir normativas que preconizem o direito que as pessoas deficientes têm de serem incluídas no sistema educacional a realidade concreta demonstra que esse direito ainda não se efetiva realmente. Na verdade, podemos dizer que infelizmente o que existe mesmo é um discurso de cunho ideológico de garantia do direito à educação de pessoas público-alvo da Educação Especial, sobretudo no contexto atual que é de intensificação da ofensiva ultra liberal. Neste cenário, que é de retração das políticas sociais e de retirada de direitos, legislações como esta que é direcionada para as pessoas público-alvo da Educação Especial se mostram inócuas, necessitando, de muita luta do movimento social para que venha ocorrer a concretização/materialização desses direitos sociais e educacionais. Para responder a esse desenho pretendido, as discussões do presente texto se estruturam com base no materialismo histórico dialético, trazendo, portanto, a luta de classes como expressão sine quo non para maior aproximação do objeto de estudo, no cenário de ofensiva neoliberal, ademais, pauta-se em referências bibliográficas, banco de dados da CAPES, artigos, dissertações e teses, que estão centralizados em categorias de análise, tais como: política educacional, luta de classes, Educação Especial, Educação Inclusiva, movimento das Pessoas com Deficiência, bem como dispositivos legais específicos da Educação Especial. Desse modo, o texto está estruturado além desta Introdução em dois itens, finalizando com as considerações finais. 2760

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 2 A “INCLUSÃO” COMO IDEOLOGIA NUMA SOCIEDADE DE CLASSES O histórico da política de Educação Especial no Brasil revela que o lugar das pessoas com deficiência no contexto de surgimento da escola pública capitalista mostra logo de início que a escola pública surgiu e se organizou sem considerar esse segmento da população, pois tais pessoas eram vistas pelos liberais como inadaptáveis, improdutivas e inaptas para o mercado de trabalho. Tal percepção contribuiu para que esse público fosse sendo excluído do processo educacional. A partir dessa percepção, deflagrou-se um movimento de luta pela Educação Especial, no contexto de três movimentos históricos: segregação, com vistas a inserir as pessoas com deficiência ao atendimento educacional; integração, demandando a inserção dos alunos da Educação Especial ao ensino regular, tendo o aluno com deficiência de se adaptar à escola; inclusão, num movimento contrário, da escola do ensino regular se adaptar para atender o aluno público-alvo da Educação Especial às suas necessidades educacionais específicas. Nesse sentido, propomos analisar o terceiro movimento – inclusão – partindo do entendimento que ela nasce, no cenário de ofensiva neoliberal, como forma ideológica de garantir o direito à educação às pessoas com deficiência, mas esse direito só se materializa por meio de luta do segmento. Portanto, partimos da perspectiva de que não existe inclusão social numa sociedade de classes. Nessa sociedade, a conquista por direitos sociais se efetiva por meio da luta de classes. Compreendemos por luta de classes a expressão dos conflitos entre as diferentes classes sociais, com interesses completamente antagônicos e inconciliáveis entre si. De posse dessa compreensão, recorremos à definição postulada em Marx e Engels (1998), que definem luta de classes como força motriz da história humana, ou seja, o combustível da mudança do mundo social. Essa definição da luta de classes na histórica nos mostrou, com efeito, que: [...] a educação é o processo mediante o qual as classes dominantes preparam na mentalidade e na conduta das crianças as condições fundamentais da sua própria existência. [...] A classe que domina materialmente é também a que domina com a sua moral, a sua educação e as suas ideias. Nenhuma reforma pedagógica fundamental pode impor-se antes do triunfo da classe revolucionária que a reclama, e se essa afirmação parece ter sido desmentida alguma vez pelos fatos é porque, frequentemente, a palavra dos teóricos 2761

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI oculta, conscientemente ou não, as exigências das classes que representam (PONCE, 2005, p. 171). Sendo assim, observamos que, no Brasil, o direito à educação da classe trabalhadora precisa transcender a legislação para se materializar, posto que, parafraseando Carlos Drumond de Andrade, As leis não bastam. Os lírios não nascem das leis. Em outros termos, para concretizaçãodos direitos sociais, numa sociedade de classes, é necessário que os postulantes ao direito lutem por ele. E, essa luta é travada não apenas no campo econômico, mas também no político e ideológico. Diante dessa assertiva, refletimos com base nos seguintes questionamentos: Comoé possível ocorrer inclusão social, se a natureza do capital é excludente, e, portanto, tende a submeter a classe trabalhadora a constantes processos de restrição de direitos sociais? Como está ocorrendo inclusão educacional, num cenário de ofensiva ultra liberal, em que o Estado capitalista tem buscado priorizar e atender aos interesses privatistas? Como ocorre inclusão, quando esse mesmo Estado transfere recursos financeiros público para instituições privadas e/ou filantrópicas “sem fins lucrativos”, quando deveria investir no setor público? Tais indagações nos levam a formular reflexões que nos conduzem à afirmar de que a inclusão social tem se mostrado ilusória para vastos segmentos de excluídos da sociedade, sobretudo para o Público-Alvo da Educação Especial, posto que ao utilizar-se do princípio liberal da igualdade, que é forjado no bojo da sociedade capitalista para beneficiar a classe elitista, objetiva,na realidade,ofuscar e mascarar a extrema desigualdade causada pelo regime de acumulação capitalista, que em período de internacionalização e crise do sistema do capital tende a se exacerbar mais ainda. Nesse viés, a inclusão representa um pseudorreconhecimento dos direitos sociais, sem, contudo, apresentar mudanças substanciais na estrutura societária, ou seja, há um reconhecimento legal de direitos sociais, mas, no campo prático, de materialização desses direitos, ao refletirmos sobre a ideologia da inclusão, o que impera é a hegemonia da classe burguesa. Embora possamos reconhecer que esta hegemonia pode ser tensionada e disputada num processo de construção de uma contra hegemonia, que se resume na unidade da classe trabalhadora pela via da luta de classes. 2762

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Esta seria a saída para o caso que estamos discutindo, pois entendemos que a inclusão social não se efetivará somente pela via do reconhecimento de direitos, é necessário que haja luta da classe trabalhadora para a sua concretização assim como de todos os demais direitos. Para compreendermos a dinâmica da ideologia da inclusão – germinada na sociedade capitalista – e da luta pelos direitos sociais de vastos segmentos excluídos, precisamos adentrar a esse novo regime de acumulação do capital que se desenvolve no âmbito de uma profunda crise de superprodução (BRENNER, 1999), com características marcadas pela produção destrutiva (MÉSZÁROS, 1989) ou ainda pela acumulação flexível (HARVEY, 1993). Trata-se de um cenário em que a busca pela superação dessa profunda crise mundial ensejou uma nova resposta e uma nova dinâmica para a produção e acumulação do capital. Essa busca pela superação da crise do capital encontra-se alicerçada na tríade: globalização, reestruturação produtiva e política neoliberal. A globalização, de acordo com análise de Chesnais (1996), altera de modo específico o funcionamento do capitalismo e a dinâmica da sociedade, trazendo efeitos devastadores para as políticas sociais, dentre as quais, a política de educação inclusiva. Esse autor revela a face perversa do capital, mostrando seus impactos destrutivos no emprego, nos salários, nos sistemas de proteção sociais, no aumento da concentração de riqueza, principalmente, na condição de vida e no acesso aos direitos de milhares de trabalhadores. O segundo elemento da tríade para superação da crise do capital alicerça-se na reestruturação produtiva. Esta, para Harvey (1996, p. 140): [...] se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional (HARVEY, 1996, p. 140). A reestruturação produtiva acarreta consequências graves, tanto para os trabalhadores quanto para os governos, sendo mais intensa nas economias de mercado dependentes, como a dos países latino-americanos: o desemprego, as relações precárias de trabalho, o trabalho informal, a enorme exigência de qualificação do trabalhador, o 2763

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI enfraquecimento dos sindicatos e das organizações dos trabalhadores, dentre outras. Com a dispersão de trabalhador empreendedor, assim como o surgimento de serviços temporários e subcontratos, torna-se quase impossível a organização da classe trabalhadora. A desestruturação do mercado de trabalho não apenas diminui o poder de reivindicação, desestrutura famílias, produz insegurança e intensifica problemas sociais, como miséria, fome e violência. O terceiro elemento da tríade dá-se com o avanço das ideias neoliberais, que passaram a ganhar espaço no mundo globalizado com a chegada da grande crise do modelo econômico do pós-guerra, em 1973 (ANDERSON, 1995). Tais ideias propunham a solução para a superação da crise, que estaria em manter um Estado forte para o capital, de forma que fosse capaz de romper o poder dos sindicatos e controlar o dinheiro, restringindo, minimamente, a atuação do Estado nos gastos sociais e nas intervenções econômicas (HAYEK, 1987). Sua atuação estaria resguardada restritamente como legislador e árbitro (FRIDMAN, 1982), e no âmbito das políticas sociais, a ação estatal estaria condicionada ao Estado mínimo. O Estado mínimo advogado pelos neoliberais não configura um retorno puro e simples ao Estado guarda-noturno, pois esses expoentes do neoliberalismo são forçados a reconhecer um pouco mais que a mera guarda da propriedade: combatem os sistemas de segurança e previdência social, mas também toleram alguma ação estatal em face do pauperismo. (PAULO NETTO, 1993). A ação estatal configura-se no âmbito das políticas sociais. Corroboramos o pensamento de Bianchetti (2005, p. 88) ao considerarmos “[...] as políticas sociais como as estratégias promovidas a partir do nível político com o objetivo de desenvolver um determinado modelo social”, em que essas estratégias têm em sua composição “[...] planos, projetos e diretrizes específicas em cada área de ação social”. Integram estas políticas, em termos globais, áreas ligadas à saúde, educação, habitação e previdência social. As características destas políticas resultam das condições gerais da sociedade, ou seja, dependem do conflito social e da correlação de forças que nele intervêm. Isto ocorre porque em uma formação social concreta, os setores dominantes promovem 2764

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI uma determinada política social em função de seus interesses estratégicos, utilizando, para isso, as estruturas políticas sobre as quais exercem hegemonia. Ao analisarmos a concepção de política social desenvolvida pelo neoliberalismo, seus ideólogos a concebem como forma de enfraquecimento das atitudes que promovem de fato a liberdade, contrariando os efeitos benéficos da livre sociedade e da livre economia, além de se originar de um equívoco no que se refere à ideia de justiça. O termo justiça, na concepção desses expoentes neoliberais, traz uma ideia equivocada, pois justiça é um conceito moral, atribuído somente aos seres humanos e seus respectivos atos. Já a justiça social refere-se a situações de fato e não às condutas de outros homens, em outras palavras, a justiça social relaciona-se com a distribuição de bens materiais, que, por conseguinte, é demandada em razão do próprio esforço do indivíduo. A tríade “globalização, reestruturação produtiva e política neoliberal” impacta no desenvolvimento das políticas sociais, com sua face mais perversa quando se trata do público-alvo da Educação Especial. Traz uma ideia ilusória de sociedade justa e igualitária, sob o argumento de que, numa sociedade de economia livre, pautada na competitividade, somente os mais habilidosos e sortudos poderão garantir sua posição na escala de rendas e de riquezas (FRIEDMAN, 1982). Portanto, o êxito ou o fracasso individual depende do resultado condicionado da ação do próprio indivíduo e não daqueles com quem se relaciona. Nessa sociedade “justa”, os neoliberais aceitam como instituições de compensação, frente às desigualdades naturais, as instituições de beneficência e caridade ou as fundações (BIANCHETTI, 2005). Segundo Friedman (1982), apesar do sistema de assistência social minar e destruir a família, envenenando o florescimento das atividades de caridade privada, diante da miséria, há necessidade de o Estado prover uma renda mínima aos pauperizados ou aos menos afortunados, também considerados como insanos, dentre os quais estavam o público-alvo da Educação Especial. Essa é a realidade da política educacional e da ideologia da “inclusão” numa sociedade de classes. 3 O PÚBLICO-ALVO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL EM FACE DA IDEOLOGIA DA “INCLUSÃO” 2765

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Na visão de Friedman (1982), os insanos não deveriam ter liberdade (cidadania) e nem serem eliminados, propondo que os governos cuidassem deles, implementando políticas paternalistas e assistenciais, sem descartar, também, a possibilidade de esses cuidados serem oferecidos pelas instituições filantrópicas. No entanto, percebemos a real intencionalidade que perpassa o caráter assistencial. A ideia consiste em fazer com que esse segmento não se reconheça enquanto sujeitos históricos, pois evitaria que mais um grupo se rebelasse contra as práticas de exclusão social, impedindo o surgimento de mais reivindicações sociais. Porque a ofensiva neoliberal é totalmente contra qualquer manifestação de caráter democrático. O neoliberalismo se fundamenta na desigualdade política, econômica, social, cultural. De acordo com Paulo Netto (1993, p. 80), [...] a proposta neoliberal centra-se na inteira despolitização das relações sociais: qualquer regulação política do mercado (via Estado, via outras instituições) é rechaçada de princípio. Ora, é precisamente o conteúdo político desta despolitização que permitiu ao neoliberalismo converter-se em concepção ideal do pensamento antidemocrático contemporâneo [...] Para esse autor, a grande burguesia e a oligarquia financeira, em todas as latitudes, apreenderam minimamente as experiências do desenvolvimento capitalista neste século, pois: [...] O que desejam e pretendem, em face da crise contemporânea da ordem do capital, é erradicar mecanismos reguladores que contenham qualquer componente democrática de controle do movimento do capital. O que desejam e pretendem não é “reduzir a intervenção do Estado”, mas encontrar as condições ótimas (hoje só possíveis com o estreitamento das instituições democráticas) para direcioná-la segundo seus particulares interesses de classe. (PAULO NETTO, 1993, p. 81 grifo do autor). Concordamos com o autor acima referido quando afirma que a grande burguesia monopolista tem absoluta clareza da funcionalidade do pensamento neoliberal, e por isto mesmo patrocina a sua ofensiva. Essa burguesia e seus associados compreendem perfeitamente que a proposta do Estado mínimo pode viabilizar o que foi bloqueado pelo desenvolvimento da democracia política – configurando-se num Estado máximo para o capital. 2766

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Com efeito, se o alvo último da ofensiva neoliberal é qualquer proposta de superação socialista da ordem do capital, o centro do seu ataque constituiu-se no confronto direto contra o Estado de bem-estar. No plano social e político-institucional, a questão refere-se ao conjunto dos direitos sociais, bem como às funções reguladoras macroscópicas do Estado. No plano ideológico-cultural mais amplo, a ofensiva neoliberal contrapõe-se abertamente à cultura democrática e igualitária da época contemporânea, caracterizada pela afirmação da igualdade civil e política para todos e pela redução das desigualdades políticas e sociais entre os indivíduos (PAULO NETTO, 1993). O Estado neoliberal deixa transparecer sua dupla face, uma privada e outra pública. No entanto, percebemos que a face pública é regida em função do capital privado, como se refere Frigotto (1995) no âmbito da educação, vendo-a como um dos setores que vêm sentindo intensamente o impacto das ideias neoliberais concernentes às necessidades do mercado. E, a serviço das leis do mercado, os sistemas educacionais adaptam-se a essa funcionalidade para a qualificação humana. Enquanto defensor dessa lógica de mercado, Friedman (1982) buscou respaldo em argumentos que justificassem as causas danosas para a educação, apontando a perda do poder dos pais na escolha da educação dos filhos. Nessa perspectiva neoliberal, essa perda é considerada como parte de um processo de maior ingerência do governo central na esfera privada, que acabou modificando os próprios objetivos da educação. Nesses argumentos friedmanianos, percebemos claramente a crítica sobre os sistemas de educação pública, pois esses sistemas, na ótica neoliberal, oferecem uma educação de cunho comum, pela imposição de currículos, criando obstáculos à seleção natural da sociedade, limitando as possibilidades de escolha individual. Além da crítica da perda do poder dos pais, Friedman (1982) diz que o sistema oficial sustentado pelas rendas auferidas dos impostos penalizam as pessoas que não usufruem do sistema, já que elas têm que pagar duplamente, ao Estado e à escola particular onde estudam seus filhos. A proposta de Friedman (1982) para reparar esses danos no financiamento da educação primária e secundária alicerça-se na ideia de cupons. Esse instrumento, criado pelo Estado, poderia ser usufruído ou não pelas pessoas, cabendo a elas decidirem pela 2767

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI opção do ensino formal comum ou pela aquisição do cupom para comprar no mercado a oferta educacional de seus filhos. Nesse cenário lógico das leis de mercado, existiriam instituições públicas e privadas com disposição para aceitar os cupons e, caso tais cupons não cobrissem os custos da educação, esta seria complementada pelos pais. Percebemos que a proposta do financiamento na ótica neoliberal é fortemente perversa, já que as escolas públicas, frente à necessidade de atrair a população estudantil e para justificar sua continuidade em termos de existência, seriam obrigadas a incorporarem-se às leis de mercado, pois estariam competindo tanto com outras escolas públicas quanto com particulares. A segunda proposta do modelo neoliberal – descentralização – tem sua premissa baseada na redução da ação do Estado sob as políticas educacionais, redução essa caracterizada pelos imperativos do modelo. A proposta de descentralização deriva na necessidade de se transferir responsabilidade na execução das políticas aos Estados ou aos Municípios. Para Bianchetti (2005), essa transferência de responsabilidade às esferas estaduais ou municipais coincide também com a proposta, defendida pelos neoliberais, da necessidade de um maior controle dos pais sobre a educação. Além disso, essas transferências são propostas como: [...] modelos de participação social, ainda que, se considerarmos a filosofia que as inspira, essa participação não suponha uma maior democratização do sistema, já que a ideia básica sobre a qual se assenta é o interesse individual e as possibilidades materiais de cada um, no marco de uma sociedade competitiva. (BIANCHETTI, 2005, p. 102). Nesse viés, a proposta de descentralização para educação supõe, por um lado, a transferência das instituições nacionais aos Estados e Municípios e, por outro, a decisão de fornecer subsídios do Estado à educação privada. Nestes termos, o ato estatal de subsidiar a educação significa assumir um papel subalterno frente à iniciativa privada, quer dizer, “[...] atender à demanda ali onde as escolas privadas não investem.” (BIANCHETTI, 2005, p. 103). Sob forma estratégica de eficiência administrativa e de redução de custos, a descentralização neoliberal tem como base uma filosofia individualista. No campo educativo do modelo neoliberal, a escolarização é vista como promessa de mudança situacional do sujeito e da sua individualidade. A educação é enfocada e proposta como saída para o desemprego e resulta no ocultamento da realidade 2768

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI histórico-social do capitalismo, na medida em que responsabiliza o indivíduo pela sua condição, pois aqueles que não conseguem se inserir no mercado de trabalho são considerados inaptos e os próprios responsáveis por sua inabilidade e infortúnio. Sobre essa tese de adequação do sistema educacional às novas necessidades do mercado, voltamos nossa atenção aos estudos de Laplane (2004), que diz ser a escola a instituição capaz de oferecer competências e habilidades requeridas pelo mercado de trabalho - como forma de controle social - onde esse mercado passa a ser cada vez mais exigente na formação de mão de obra qualificada. O problema é que, diante dessa exigência do mercado acirrado e competitivo, o processo de educação formal é realizado de tal modo que nem todos os alunos conseguem transpor os níveis de ensino requeridos, resultando na exclusão e marginalização da maioria desses alunos. Corroborando com Dainêz (2009), ao identificarmos pontos que muitas vezes passam despercebidos quanto aos processos socialmente delineados de formação da personalidade/individualidade, marcados pelo aumento da competição/concorrência, pelo individualismo - o indivíduo responsabilizado pelo seu sucesso ou fracasso na vida. Tais aspectos refletem a exclusão, oriunda, por sua vez, da geração e separação de mercados de trabalho e do aumento do desemprego estrutural. (LAPLANE, 2004). Inseridos no contexto da marginalização provocada pela competitividade e individualidade, a educação dos alunos público-alvo da Educação Especial se agrava mais intensamente, pois o fato de o aluno ser diferente (deficiente), no cenário neoliberal, corresponde a uma condição individual. O aluno é responsável pelo seu sucesso ou fracasso. A inclusão, veiculada na política neoliberal, aponta o deficiente não pelas suas potencialidades e possibilidades, mas pelas suas limitações, pelo déficit orgânico. O problema é social; a “[...] sociedade cria ou não situações que possibilitem a superação das dificuldades de ordem biológica” (DAINÊZ, 2009, p. 35), pois, conforme assegura Martins (1998), não estamos em face de um novo dualismo, que nos proponha falsas alternativas de excluídos ou incluídos, mas estamos diante de uma sociedade que tanto exclui como inclui, criando formas também desumanas de participação. O neoliberalismo influencia o discurso hegemônico trazido pela educação, uma vez que origina a crença na evolução natural da sociedade e no desenvolvimento livre das habilidades naturais, sustentando a segregação social. Nesse contexto, a existência 2769

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI da deficiência é entendida como um problema individual que diz respeito à família e implica uma adequação do deficiente à sociedade, e seu atendimento é compreendido como filantrópico-caritativo. Visto de forma geral, essa dinâmica acaba distribuindo os indivíduos de acordo com a sua posição social, ou seja, conforme seu pertencimento de classe. Para aqueles que vêm da classe trabalhadora, uma educação voltada para a classe trabalhadora. Para aqueles pertencentes à classe elitista, uma educação elitista. Visto isso, a educação no cenário da política neoliberal retrata uma dinâmica que acaba distribuindo os indivíduos de acordo com a sua inserção nas diferentes camadas sociais e encaminhando cada um a determinado destino social condizente com sua origem. Assim, a inclusão criada no bojo da política neoliberal constitui-se num elemento necessário para mascarar a verdadeira exclusão social. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS No cenário neoliberal, compreendemos que a ideia de inclusão nasce como forma ideológica de mascarar a exclusão do aluno público-alvo da Educação Especial do contexto social, educacional e escolar, principalmente quando adentramos ao novo regime de acumulação do capital, que se desenvolve numa profunda crise de superprodução, com características marcadas pela produção destrutiva ou ainda pela acumulação flexível. Nesta perspectiva, a inclusão dos alunos com deficiência nas classes comuns do ensino regular passa a ser viabilizada por meio de luta do segmento na materialização da garantia do direito à educação, portanto, configurando-se num grande desafio para a política educacional e, principalmente, para as escolas de ensino regular, que têm que se adequarem, com mínimos recursos financeiros, no atendimento das necessidades educacionais específicas desses alunos. O embate entre o discurso neoliberalizante de educação para todos e a luta pelo direito à educação esbarram nas condições adversas impostas à política educacional e a escola inclusiva, no cenário de ofensiva neoliberal. 2770

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI REFERÊNCIAS ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo. In: SADER, E.; GENTILI, P. (Orgs.). Pós- neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. BIANCHETTI, R. G. Modelo neoliberal e políticas educacionais. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2005. BRENNER, R. \"Replytocritics\". Comparative Studies of South Asia, Africa, and the Middle East, [S. l.], v. XIX, n. 2, p. 62, 1999. CHESNAIS, F. A mundialização do capital. São Paulo: Xamã, 1996. DAINÊZ, D. Algumas Implicações sobre a Educação Especial no Sistema Neoliberal. Comunicações, Piracicaba, SP, v. 16, n. 2, p. 31-45, 2009. FRIEDMAN, M. Capitalismo e liberdade. São Paulo: Nova Cultura, 1982. FRIGOTTO, G. Educação e a Crise do Capitalismo Real. São Paulo: Cortez, 1995. HARVEY, D. O enigma do capital. São Paulo: Boitempo, 1993. HAYEK, F. O caminho da servidão. 4. ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1987. LAPLANE, A. L. F. de. Notas para uma análise dos discursos sobre inclusão escolar. In: GÓES, M. C. R. de; LAPLANE, A. L. F. de. (Orgs.). Políticas e Práticas de Educação Inclusiva. Campinas, SP: Autores Associados, 2004. MARTINS, M. M. Reflexões sobre preconceito – em busca de relações mais humanas. InterAÇÃO, Curitiba, v. 2, p. 9-27, 1998. MARX, K.; ENGELS, F. A ideologia alemã. Trad. Luis Claudio de Castro e Costa. São Paulo: Martins Fontes, 1998. MÉSZÁROS, I. Produção destrutiva e Estado Capitalista. São Paulo: Ensaio, 1989. PAULO NETTO, J. Crise do socialismo e ofensiva neoliberal. São Paulo: Cortez, 1993. PONCE, A. Educação e luta de classes. 21. Ed. São Paulo: Cortez, 2005. 2771

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A EDUCAÇÃO BANCÁRIA NO SISTEMA CAPITALISTA BANKING EDUCATION IN THE CAPITALIST SYSTEM Aldení Gomes de Araújo Júnior 1 RESUMO Este artigo analisa o sistema capitalista, a sua educação bancária e como se associam para a manutenção da ordem burguesa. A educação conservadora baseia-se nas relações entre o detentor do saber e os alunos, em uma vigente polarização e distanciamento entre educador e educando, baseando-se no “depósito” de conhecimento, absorvidos e repassados. Tendo em vista a alienação da classe trabalhadora e reforço na manutenção da ordem burguesa, a educação bancária fortalece a contradição entre capital e trabalho, fator basilar do sistema capitalista. Relatamos os interesses da classe burguesa, os quais visualizam a concentração das riquezas e o empobrecimento da classe trabalhadora, metamorfoseados de “capitalismo humanizado”. Posteriormente, analisaremos a sociedade e a educação para além do capitalismo, uma educação voltada ao pensamento crítico/reflexivo e a emancipação humana. Palavras-Chaves: Capitalismo. Educação. Emancipação. ABSTRACT This article analyzes the capitalist system, its banking education and how they associate for the maintenance of the bourgeois order. Conservative education is based on the relations between the holder of knowledge and the students, in a current polarization and distancing between educator and student, based on the \"deposit\" of knowledge, absorbed and passed on. In view of the alienation of the working class and strengthening the maintenance of the bourgeois order, banking education strengthens the contradiction between capital and labor, a basic factor of the capitalist system. We report the interests of the bourgeois class, which visualize the concentration of wealth and the impoverishment of the working class, metamorphosed from \"humanized capitalism\". Later, we will analyze society and education beyond capitalism, an education focused on critical/reflective thinking and human emancipation. 1 Graduando em Serviço Social pela Faculdade Católica Santa Teresinha - FCST. E-mail: [email protected] 2772

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Keywords: Capitalism. Education. Emancipation. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como proposta analisar a configuração do sistema capitalista e as normativas a qual ele impera, apresentando a polaridade das classes existentes e a exploração acarretada em favor da manutenção conservadora. Através da educação tradicional, os educadores reforçam as normativas burguesas, haja que os educandos são vistos enquanto pessoas aptas a receberem o conhecimento de quem sabe, percebendo-os enquanto folhas em branco, sujeitos assistidos a serem moldados em favor do capital. No primeiro momento, iremos conhecer mais sobre como o capitalismo se mantém e detém força, conheceremos mais sobre as diferentes classes existentes, a exploração no modo de produção capitalista e como elas se correlacionam em um sentido de interesse maior do sistema. Pensando em sua manutenção, apresentaremos as normativas da educação bancária e tradicional, como o capitalismo se apropria de tal ideia, relacionada à alienação da classe trabalhadora, o depósito de conhecimentos e a falsa emancipação humana. Logo em seguida, trataremos sobre a reflexão de uma nova sociabilidade e livre das amarras do capitalismo, baseando-se em uma real emancipação humana, a educação problematizadora e o rompimento com o conservadorismo. Através da visão de totalidade, podemos analisar os sujeitos não mais inseridos em uma visão reduzida, conservadora e alienante, e sim pessoas com as suas particularidades e subjetividades. 2 CARACTERÍSTICAS DO CAPITALISMO E A DISTINÇÃO DAS CLASSES A história nos mostra que a sociedade já se organizou das mais diversas formas, desde o seu agrupamento em pequenos povos nômades, que migravam para outras regiões quando o território já não atendia mais a suas necessidades de sobrevivência, até chegar a modelos feudalistas, tendo na figura do rei o senhor que ditava as normas para os seus súditos. Com o tempo, tais organizações foram se extinguindo e modelos 2773

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI de sistemas foram substituídos por outros que vieram em seguida, assim como apresenta-se o capitalismo que conhecemos na atualidade. Este novo e ainda recente sistema, para Marx (2017), se configura pela desigualdade das classes (burguesia e proletariado), bem como “a redistribuição da riqueza se fez em favor dos mais ricos e a distribuição do poder em favor dos mais poderosos”. (apud LOPES, 2000, p.96). Desenvolvendo uma relação de exploração e a obtenção de lucro como forma de manter a ordem capitalista e a manutenção dos interesses da classe dominante. Por proletariado, segundo Marx (2004), entendemos toda a classe trabalhadora que vende o único fator que possuem, face criadora e transformadora da natureza: a sua força de trabalho. São homens e mulheres inseridos (ou não) no grande mercado trabalhista cada vez mais competitivo e polivalente, tendo em vista que a necessidade de qualificação profissional já não se faz somente para atender a uma função específica, mas de forma a adentrar a metamorfose da atividade para que possa atender cada vez mais este mercado. Já os burgueses são indivíduos que se caracterizam por serem os donos dos meios de produção, como maquinário, as fábricas, instrumentos de trabalho, entre outros, que somente por estes meios não teriam condições de gerarem lucros, utilizando, assim, da força de trabalho para desenvolverem e criarem as riquezas geradas pelo trabalho. Tal binarismo de classes se apresenta para a classe burguesa como forma de exploração da força de trabalho e obtenção de lucro. Ou seja, os interesses das distintas classes têm um teor diferenciado nesta ordem do capital. Sendo assim, entendemos que a base do sistema capitalista, a característica que o norteia é a exploração cada vez maior do trabalho humano. Essa peculiaridade configura e legitima o interesse do capital. Para sobreviver nesta sociedade é necessário que os sujeitos tenham como condição básica a venda da sua força de trabalho. Força essa criadora e transformadora da natureza. No sistema capitalista é preciso a existência dessas classes antagônica, burguesia x proletariado e a sua exploração. Segundo Antunes (2009), os trabalhadores produzem cada vez mais enquanto que os donos dos meios de produção se apropriam da riqueza gerada. Em outras palavras: a pobreza cresce junto com a riqueza, mas em proporções inversas. 2774

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Quanto mais a miséria do proletariado é alastrada, mais a riqueza é concentrada nas mãos de poucos. ‘’Cada vez mais a burguesia suprime a dispersão dos meios de produção, da propriedade e da população. Aglomerou a população, centralizou os meios de produção e concentrou a propriedade em poucas mãos’’. (MARX, 2015, p. 68). Apropriação que legitima as condições capitalistas, quando que o trabalhador que é aquele que participa de todo o processo de criação do produto produz cada vez mais, em condições de trabalho degradantes e desgastantes, e a riqueza que é apropriada por quem não deu vida ao produto, que seria então a burguesia, concentrando todos os direitos acerca da garantia e lucro gerados pelo trabalho do proletariado. De tal forma que, quanto mais o trabalhador produz, quanto mais ele realiza o seu trabalho, ele gera riquezas não para si, mas sim para a classe detentora dos meios de produção: A burguesia. Como vimos anteriormente: A pobreza do trabalhador cresce à medida que a riqueza da burguesia também cresce. Em troca do trabalho prestado, como condição mínima e vigente do sistema capitalista, a classe que comprou a força de trabalho das pessoas envolvidas neste processo garante o pagamento pela atividade realizada. Pagamento este que não condiz com o trabalho efetivado ou que se equipara ao lucro e, outros fatores como a mais- valia que é gerada e apropriada pela burguesia. Assim como reforça Marx: A taxa mais baixa e unicamente necessária para o salário é a subsistência do trabalhador durante o trabalho, e ainda [o bastante] para que ele possa sustentar uma família e [para que] a raça dos trabalhadores não se extinga. O salário habitual é, segundo Smith, o mais baixo que é compatível com a simples humanidade (simples humanité), isto é, com uma existência animal. (MARX, 2004, p. 24). Ao partirmos deste pensamento, entendemos que é necessária ao capital a compra desta força de trabalho que o proletariado dispõe, pois é essa característica que dá vida tanto ao trabalho realizado quanto a riqueza acumulada pela burguesia. O trabalhador adentra nesta esfera de desigualdade eminente e norteadora da base capitalista. A classe trabalhadora se coloca em uma condição não mais de um sujeito à parte, uma pessoa detentora de conhecimento, vida, intelecto, subjetividade e 2775

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI características que possam expressar a sua condição enquanto pessoa. A classe trabalhadora se torna um produto tal qual o que ele projetou a sua força para realizar. Sendo assim, a burguesia desenvolve meios de manutenção de sua ordem capitalista, como forma de que a mesma não se rompa ou se extinguia (Antunes, 2010). Através da alienação do proletariado, onde a classe trabalhadora não se reconhece enquanto sujeito indispensável para a geração da riqueza, processos de empobrecimento proposital, tal que o capitalismo detém meios necessários para cessar às desigualdades existentes, mas, como destaca Marx (2017), entendemos que o capitalismo se configura na exploração e na desigualdade existente entre as classes, sendo este elemento fundante do modo de produção capitalista, tendo em vista que não existe modo de produção capitalista sem exploração da classe trabalhadora. Portanto, o capitalismo não desenvolve condições ou não é de seu interesse cessar as desigualdades, e não o faz de forma a concentrar a riqueza nas mãos de poucos e, a educação como forma de alienação e manutenção da ordem capitalista, através de um pensamento bancário e preso nos interesses da classe dominante. Devemos refletir sobre uma sociabilidade que supere o atual modo de produção. Ou seja, pensarmos para além do capitalismo, como reforça Montaño e Duriguetto (2010): Não haverá emancipação da “trabalhadora-mulher” numa sociedade machista e patriarcal, assim como não haverá emancipação da “mulher- trabalhadora” numa sociedade capitalista. Não haverá emancipação do “trabalhador-negro” numa sociedade racista e xenofóbica, assim como não haverá emancipação do “negro-trabalhador” na sociedade capitalista. A luta anticapitalista não deve caminhar separada da luta contra o machismo e a desigualdade sexual, contra o racismo e a desigualdade racial e étnica, contra as diversas formas de segregação, desigualdade e preconceito. Ela deve reunir todos estes campos de batalha, orientados no curto prazo contra a forma específica de desigualdade (para a emancipação política específica), e no longo prazo contra a ordem burguesa, a sociedade de classes (para a emancipação humana). (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2010, p.132). Todavia, ao adentrarmos nesta esfera do fim ou a diminuição da pauperização existente, ou se pensarmos em uma educação não alienante, por exemplo, estaríamos falando de um sistema capitalista humanizado e voltado aos interesses comuns de todas as pessoas. Ora, mas tal raciocínio não se faz eloquente por se caracterizar enquanto uma forma completamente distinta da base do sistema, quando que a humanização deste não passa de um fator de manutenção do próprio capitalismo. 2776

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI As modificações da ordem do sistema jamais serão voltadas a atender aos interesses e necessidades da classe trabalhadora, tal qual, como dito anteriormente, a gênese do capital se configura pela exploração trabalhista, concentração de riqueza nas mãos de poucos, manutenção conservadora e a clara desigualdade social entre as classes. Como reforçado por Tonet, quando diz que é: Por si evidente que esta relação implica, necessariamente, uma relação de exploração e de dominação do capitalista sobre o trabalhador. O que significa que a produção da desigualdade social não é um defeito, mas algo que faz parte da natureza mais essencial desta matriz geradora do capitalismo. O que, por sua vez, significa que é impossível construir, a partir dela, uma autêntica comunidade humana, vale dizer, humanizar o capital. (TONET, 2012, p. 29). Portanto, pensar em um capitalismo humanizado seria um dispêndio sem valor de energia e luta da classe trabalhadora, onde não passará de mais uma metamorfose do sistema e manutenção dos pensamentos, costumes e interesses conservadores da burguesia, através de uma ‘’pauperização humanizada’’ capitalista, quando que um maior poder de compra não se apresenta enquanto meio de emancipação humana, mas somente mais uma armadilha do capital para o consumo. 3 A EDUCAÇÃO BANCÁRIA E A MANUTENÇÃO DA ORDEM BURGUESA As educações formais e informais fazem parte do processo de socialização dos sujeitos desde a mais tenra idade, sendo o contato com a família o seu primeiro meio de sociabilização enfrentada. Esta família repassa valores, normas, regras, costumes, entre outros, já impostos e criados muito mesmo antes de sua concepção. Ou seja, valores que adotam e seguem como meio correto de viver e socializar, repassando os mesmos para os que virão posteriormente. Os homens fazem a sua própria história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhes foram transmitidas assim como se encontram. A tradição de todas as gerações passadas é como um pesadelo que comprime o cérebro dos vivos. (MARX, 2011, p. 25). Tais normativas, por vezes conservadoras, fazem parte do processo de educação informal dos sujeitos. Já a educação formal é o que vivenciamos nas escolas e nos 2777

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI espaços acadêmicos, existindo enquanto meio de formação, assim como a educação informal. Mas, no sistema capitalista o qual estamos inseridos, a educação sofre a interferência dos interesses do capital e da burguesia, onde o conhecimento repassado para os educandos vem de forma precária e voltada a manutenção do sistema, assim como podemos observar no modelo de educação bancária. Sendo assim, Segundo Freire (1987), ele relembra que é na relação da passagem do saber do educador para o educando, quando que existe uma troca de conhecimento e uma relação entre os sujeitos, de modo que o saber é transferido de “quem sabe” para “quem não sabe”. Ou seja, o educando é visto enquanto uma folha em branco o qual podemos “depositar” e “transportar” o conhecimento, reforçando a transferência de conhecimento e o repasse das informações, não desenvolvendo um pensamento crítico e o diálogo com os mesmos. Na educação bancária, na qual trataremos, Freire (1987) diz que o educador é o detentor do saber e aquele a quem deve repassar o conhecimento, através da reprodução do conteúdo, como forma de aprendizado do educando. Já este educando se caracteriza como alguém que não detém o saber, o apto a receber o pensamento já pré-determinado e configurado através de uma lógica conversadora. Sendo o educando jamais ouvido em tal processo, quando que não existe um diálogo entre os saberes. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros. Busca esperançosa também. Na visão “bancária” da educação, o “saber” é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro. (FREIRE, 1987, p.33). Portanto, a educação bancária tem como foco o “depósito” de conhecimentos para com os educandos, limitando o pensamento e a criatividade aos interesses maiores do sistema, de modo que a educação bancária cria barreiras entre o educador e o educando. Tal normativa educacional se apresenta para os opressores um meio de controle ideológico para que possa ser construído um exército de pessoas não críticas, prontas para serem inseridos no perverso e cruel mercado de trabalho. 2778

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Diferente da educação bancária que somente desenvolve seu papel de repassar e repetir conhecimentos, a educação problematizadora, como dito por Freire (1987) se apresenta com um viés de criticidade e conhecimento voltado para uma relação humanizada entre educando e educador. Os papeis de autoridades, criados e desempenhados pela educação bancária, já não existem neste segmento, tal quais os saberes se correlacionam e são trocados de ambos os lados. O educador aprende com o educando e o educando aprende com o educador, não mais através de um pensamento reduzido e limitado, imposto de forma decorada e presa as normativas conservadoras, mas sim através do que Marx (2017) chama de totalidade, desempenhando uma visão ampla do conhecimento e dos saberes, entendendo os sujeitos na sua mais pura amplitude. O pensamento não é mais reduzido à mera repetição e arquivamento de conhecimento, não mais para formar sujeitos para o mercado de trabalho, mas sim para desempenharem um pensamento crítico/reflexivo e modificarem a sua realidade de acordo com uma visão mais socializada e emancipadora, enxergando os educandos enquanto pessoas detentoras de conhecimento e de subjetividades, inclusos numa lógica cruel no modo de produção capitalista e visualizando-os enquanto inseridos na mesma classe existente. 4 EMANCIPAÇÃO HUMANA: ALÉM DO CAPITALISMO Romper com o sistema capitalista não é tarefa fácil, visto que a alienação e a educação conservadora são percebidas enquanto forte meio de dominação social. Não existirá educação libertadora em um sistema de opressão. Portanto, devemos pensar em uma forma de educação que liberte, nos emancipe e a qual não limite às prisões do capital. Mas, com o fortalecimento cada vez maior do sistema capitalista, acabamos por acreditar que esta é a única forma de organização e sociabilização vigente, mas não é o caso. Da mesma forma que criamos e desenvolvemos o sistema, assim como o conhecemos hoje, podem os mesmos sujeitos nele inseridos, romper com esta normativa. “Ora, se foram os homens os responsáveis pela instauração do capitalismo, 2779

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI não há nenhuma razão, em princípio, para que não possam suprimi-lo e construir uma forma superior de sociabilidade”. (TONET, 2012, p.52). Esta forma superior de sociabilidade teria que romper por completo com os fatores basilares do modo de produção capitalista, como a dicotomia das classes, as desigualdades existentes, a educação bancária, os preconceitos por gênero, etnia, entre outras expressões da questão social que se apresentam enquanto características do sistema capitalista. Ou seja, teríamos que romper, assim lembra Marx (2015), com a exploração do homem pelo homem. Nesta sociabilidade nova e refletida teriam que se apresentar e ter como base a sociabilização das riquezas e focada em uma educação para desenvolver o pensamento crítico e, tendo em vista a formação de pessoas não mais para o mercado de trabalho, mas para uma real vivência em sociedade, visualizando, assim, a sua emancipação humana e liberdade. Tal educação e sociabilidade existiriam no socialismo, onde apresenta características de desenvolvimento livre e longe das amarras do capital. “Pobreza e carência jamais poderão ser a base para o socialismo”. (TONET, 2012, p. 51). Lembremos Netto (1999), que reforça a necessidade de pensarmos em um novo projeto societário que não mais oprima e explore cada vez mais a classe trabalhadora, mas que possamos refletir sobre as desigualdades e superá-las. Os interesses da burguesia não podem e não devem ser prioridade. Todavia, também a experiência histórica demonstrou que, na ordem do capital, por razões econômico-sociais e culturais, mesmo num quadro de democracia política, os projetos societários que respondem aos interesses das classes trabalhadoras e subalternas sempre dispõem de condições menos favoráveis para enfrentar os projetos das classes proprietárias e politicamente dominantes. (NETTO, 1999, p. 03). É através dos espaços educacionais (formais e informais) que as relações entre educando e educador devem ser vistas enquanto oportunidade de questionamento da própria vivência apresentada e das normativas impostas previamente, naturalizadas e seguidas sem uma criticidade da realidade. A educação deverá abrir espaços para entender as mais diversas subjetividades e posicionar-se não mais enquanto favorável à ordem imposta, mas pensando em uma 2780

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI perspectiva de liberdade, tendo em vista uma educação que não limite o raciocínio, a criatividade, que possa contribuir para o desenvolvimento e/ou aprimoramento de novas habilidades manuais, artísticas e culturais e não reduzindo os educandos em uma normativa de interesse da burguesia e o preparo para o mercado de trabalho. A problematização do saber e das normativas geram debates voltadas para a realidade velada pelo capitalismo, acobertada de interesses naturalizados e ideologias repassadas enquanto imutáveis, mas tal questionamento da realidade deve se apresentar para a educação enquanto fator de posicionamento contrário à educação conservadora, tendo em vista que através da problematização que iremos desenvolver um pensamento de consciência de classe. Sendo assim, esta liberdade só se apresentaria como forma de união de todas as pessoas envolvidas neste processo, ou seja, como lembra Freire (1987), que diz que a liberdade se dá através da comunhão de todos. O papel da educação socialista é muito importante nesse sentido. Sua determinação interna simultaneamente social e individual lhe confere um papel histórico único, com base na reciprocidade pela qual ela pode exercer sua influência e produzir um grande impacto sobre o desenvolvimento social em sua integridade. A educação socialista só pode cumprir seu preceito se for articulada a uma intervenção consciente e efetiva no processo de transformação social. (MÉSZÁROS, 2008, p. 95). A construção de uma educação justa e emancipadora só existiriam em uma sociedade em que tais características também fizessem parte. Pensar em uma forma de educação problematizadora e uma sociabilidade onde todas as pessoas seriam livres são refletidos sobre as desigualdades existentes em nossa organização social e pensarmos em uma nova forma de sociabilização para além do capitalismo, rompendo com os interesses de dominação ideológica da classe burguesa e de suas normativas conversadoras. Através de uma lógica libertadora, onde o modo de produção capitalista não dita os espaços e a sociabilização, quebrando com o continuo e, quase infinito, interesse de obtenção de lucro capitalista, tendo em vista a exploração cada vez maior da classe trabalhadora. 2781

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 5 CONCLUSÃO O sistema capitalista impera enquanto sociabilidade atual detém forças e diversos meios para a sua manutenção e organização. Como podemos observar o sistema não foi o único existente e muito menos será o último que empenhará o seu papel diante da sociedade. As mudanças ocorrem diariamente e determinar o modo de produção capitalista enquanto superior e único para a melhor vivência da humanidade, seria de tal pensamento reducionista e limitado. Como bem apresentamos anteriormente, o sistema capitalista se baseia na exploração da classe trabalhadora, na alienação dos sujeitos envolvidos na relação de trabalho e a obtenção de lucro como determinante para a consolidação e permanência da burguesia. O sistema se fortalece através de tais fatores que, juntamente com a educação conservadora o qual conhecemos em nossa sociedade, como a bancária, de modo que o pensamento não crítico da classe trabalhadora se apresenta para os donos dos meios de produção como uma arma impiedosa de controle social, ideológico, cultura e político. Ou seja, a educação conservadora e bancária é apresentada enquanto fator favorável de manutenção dos interesses do sistema capitalista e a quem ele o beneficia. A educação formal está nas mãos do Estado, portanto, correspondendo aos interesses da classe dominante e as suas normativas conservadoras, tendo somente o foco de formar sujeitos para o mercado de trabalho, através do uso de fórmulas já ultrapassadas e contraditórias, como a decoração de conteúdo, a reprodução do saber sem um embasamento crítico, absorvendo, arquivando e reproduzindo tais ensinamentos. A educação conservadora é utilizada pelo modo de produção capitalista como veículo de transmissão da ideologia dominante e perpetuação da ordem imposta, desempenhando um ensino voltado para atender aos interesses do capital, gerando uma falsa emancipação dos indivíduos. Entendendo que, no sistema capitalista, a liberdade é nos colocada até determinados momentos e locais, quando que o valor acumulado, ou seja, a riqueza que irá dizer até onde podemos ir, quais locais podemos acessar, quais serviços nos são ofertados e se poderemos custeá-los. Ou seja, a liberdade capitalista esbarra no poder 2782

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI aquisitivo e social que dispomos, sabendo que a liberdade de ir e vir não são reais, entendendo que só nos locomovemos até onde podemos pagar. É importante reforçarmos a importância do papel da educação na conquista da emancipação humana que, mesmo no modo de produção capitalista, pode contribuir para o desenvolvimento da consciência de classe dos indivíduos os quais, a partir daí, poderão romper com a ordem estabelecida. Cabe a classe trabalhadora, enquanto sujeitos revolucionários a conduzirem o processo de transformação social, mas a educação pode contribuir justamente com o desenvolvimento da consciência de classe que impulsiona esta luta. Para rompermos com a reprodução educacional conservadora, teríamos primeiro que romper com o sistema vigente que impera atualmente. A burguesia detém os meios de produção, grande parte das riquezas produzidas socialmente, dita a cultura, as normas, sendo as classes dominantes as que têm voz e se mostra somente favorável para si mesmo e não para a classe trabalhadora. Mesmo no modo de produção capitalista, a educação desempenha um papel de agir de forma a estimular momentos de encontros e debates acerca da superação do sistema vigente, pensando em uma nova forma de sociabilização onde a classe trabalhadora não seja explorada, que possamos desempenhar e desenvolver a nossa criatividade de forma livre e sem atender a interesses antagônicos. Através de uma realidade cruel do modo de produção capitalista, a classe dos chamados proletariados é a mais afetada nesta forma de sociabilidade, tendo em vista que o capitalismo além de desenvolver e estimular as desigualdades que se apresentam em nossa sociedade, desempenha um papel fundante na exploração cada vez maior da classe trabalhadora, sendo responsável pelas expressões da questão social como a crescente pauperização, as desigualdades de gênero, raça, a destruição cada vez maior dos meios naturais, entre outras, que se colocam somente como princípio de acumulação de riquezas. Não haverá igualdade onde predomina a exploração de uma classe em propósito de atender aos interesses de outra. Portanto, devemos pensar e refletir em uma nova forma de sociabilização, uma educação que liberte, forme sujeitos para uma vida de sentido, com criticidade, emancipação, que desenvolva uma relação social de laços reais e não mais de interesses antagônicos. 2783

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. O Caracol e sua Concha. São Paulo: Boitempo, 2005. ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: ensaios sobre a afirmação e a negação do trabalho. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2009. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho?: Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 16° ed. São Paulo: Cortez, 2015. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17° ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. LOPES, J. T. Desigualdad y Crisis Económica: el reparto de la tarta. Madrid: Sistema, 2000. MONTAÑO, Carlos; DURIGUETTO, Maria Lúcia. Estado, Classes e Movimento Social. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2010. MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. 3. ed. São Paulo: Edipro, 2015. MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004. MARX, Karl. O Capital Livro I: O Processo De Produção Do Capital. 2. ed. São Paulo: Boitempo, 2017. MARX, Karl. O 18 De Brumário De Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011. MÉSZÁROS, István. A Educação Para Além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2008. NETTO, José Paulo et al. A Construção do Projeto Ético-político do Serviço Social. Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional, São Paulo, v. 1, n. 1, p.1-21, 1999. Disponível em: http://www.ssrede.pro.br/wp- content/uploads/2017/07/projeto_etico_politico-j-p-netto_.pdf. Acesso em: 24 jul. 2019. TONET, Ivo. Educação Contra o Capital. 2.ed. São Paulo: Instituto Lukács, 2012. 2784

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: análise do perfil socioeconômico dos estudantes quilombolas assistidos pelo Programa Bolsa Permanência no Campus UFRA Tomé-Açu SOCIAL SERVICE IN HIGHER EDUCATION: analysis of the socioeconomic profile of quilombola students assisted by the Bolsa Permanência Program at the UFRA Tomé- Açu Campus Ivanna da Silva Nascimento 1 Lélia Suzane Machado da Silva 2 RESUMO O presente artigo é o resultado de uma pesquisa bibliográfica que se propõe a analisar o perfil socioeconômico dos discentes quilombolas matriculados na Universidade Federal Rural da Amazônia-Campus Tomé-Açu/PA, os quais são atendidos pelo Programa Bolsa Permanência, objetivando promover uma reflexão crítica a respeito da temática. Este estudo destaca o papel do profissional de serviço social na educação superior e as ações do Programa Nacional de Assistência Estudantil na UFRA, dando ênfase ao Programa Bolsa Permanência que é vinculado a política de assistência estudantil, Fazendo uma discussão a respeito da particularidade das populações tradicionais e suas lutas para garantir o direito a educação Palavras-Chaves: Serviço Social, Perfil Socioeconômico, Discentes Quilombolas ABSTRACT This article is the result of a blibiographical research that aims to analyze the socioeconomic profile of quilombola students enrolled at the Federal Rural University of the Amazon-Campus Tomé-Açu / PA, who are served by the Bolsa Permanência Program, aiming to promote a critical reflection about the theme. This study highlights the role of 1 Assistente Social - Técnica Administrativa em Educação, Universidade Federal Rural da Amazônia - UFRA. Especialista: Gestão Social: Políticas Públicas, Rede e Defesa de Direitos. E-mail: [email protected] 2 Graduanda em Serviço Social da Faculdade de Serviço Social do Campus Universitário Marajó-Breves, Universidade Federal do Pará (UFPA). E-mail: [email protected] 2785

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI the social service professional in higher education and the actions of the National Student Assistance Program at UFRA, emphasizing the Bolsa Permanência Program which is linked to the student assistance policy, making a discussion about the particularity of traditional populations and their struggles to guarantee the right to education. Keywords: Social Work, Socioeconomic Profile, Quilombola Students INTRODUÇÃO O presente artigo científico é resultado de um projeto de pesquisa intitulado “análise socioeconômica dos estudantes quilombolas atendidos pelo Programa Bolsa Permanência do campus UFRA Tomé-Açu” e visa discorrer sobre os principais aspectos socioeconômicos da vida destes estudantes que ingressam em uma instituição pública situada no interior do estado do Pará. Por meio desta análise busca-se promover reflexão crítica a respeito desta temática fazendo-se necessário realizar, no primeiro tópico, uma relação entre o “serviço social e o ensino superior”, no qual explana-se sobre as principais atribuições do assistente social no espaço sócio-ocupacional da educação, assim como traz-se á luz das discussões o importante papel dos movimentos sociais na luta por uma educação pública, gratuita e de qualidade. Destaca-se, ainda, o papel do Estado neste processo, o qual, nas últimas décadas vem investindo maciçamente no capital privado em detrimento da educação pública. O segundo tópico apresenta a forma como o Programa Nacional de Assistência Estudantil - PNAES é desenvolvido na UFRA, e apresenta informações gerais sobre o Programa Bolsa Permanência (para estudantes Indígenas e Quilombolas) tendo em vista que este programa faz é uma ação do Governo Federal, vinculada ao Ministério da Educação (MEC), e integra a Política Nacional de Assistência Estudantil. No terceiro tópico apresenta-se o processo metodológico da pesquisa realizada, a qual foi pautada pela pesquisa do tipo exploratória, sendo utilizada a abordagem qualitativa, haja vista que, este tipo de abordagem fornece meios de explorar vários aspectos do objeto de pesquisa. O delineamento da proposta metodológica utilizada para alcançar os objetivos foi a pesquisa bibliográfica, na qual foram consultados artigos científicos publicados em eventos científicos que abordam a Política de Assistência Estudantil, O Programa Bolsa Permanência, obras que abordam a política de educação, 2786

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI o trabalho profissional do assistente social, dentre outras. As obras foram escolhidas por meio de amostra intencional, em seguida, foi realizado fichamento, interpretação e análise de conteúdo que originaram os tópicos deste artigo. O objetivo geral da pesquisa foi analisar a situação socioeconômica dos estudantes quilombolas atendidos pelo Programa Bolsa Permanência no campus Ufra Tomé-Açu. Os objetivos específicos consistiam em: elaborar um perfil dos estudantes quilombolas e identificar se este programa está contribuindo para a permanência destes estudantes no ensino superior avaliando. No quarto tópico são apresentados os resultados obtidos nesta pesquisa, e finalizando apresenta-se as conclusões. 2 SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO SUPERIOR O Serviço Social é uma profissão inscrita na divisão social do trabalho que tem sua ação profissional inserida no enfrentamento das refrações da questão social. As ações profissionais do assistente social se desenvolvem em diversos espaços sócio- ocupacionais, dentre eles, na área da educação. A atuação do assistente social neste espaço sócio-ocupacional tem como um dos objetivos contribuir para que “a Política de Educação se efetive em consonância com os processos de fortalecimento do projeto ético-político do Serviço Social e de luta por uma educação pública, laica, gratuita, presencial e de qualidade” [...] (CFESS, 2013, p.08). Ao atuar nesta política, “tem-se, portanto, a presença de forças sociais e políticas reais – não mera ilusão-que permitem a categoria profissional estabelecer estratégias político profissionais no sentido de reforçar os interesses das classes subalternas, alvo prioritário das ações profissionais” (IAMAMOTO, 2015, p.25). O direito social à educação sempre foi bandeira de luta dos movimentos sociais e, em especial, do movimento estudantil. Desde o início do século XXI o Governo Federal vem desenvolvendo um movimento contraditório de desmonte do ensino superior público com crescente redução de investimentos neste setor e ao mesmo tempo de expansão do acesso à esta modalidade de ensino, por meio da implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI). A partir da implementação destes planos, segundo MOSCON MARAFON e SANTOS (2016, p.409), foram criadas 14 novas Universidades Federais e mais de 100 2787

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI novos campi em todas as regiões do país. Por meio do REUNI, “foram diversificadas as formas de ingresso nos processos seletivos das universidades, com adoção da nota do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e da implantação das cotas étnico-raciais e sociais” (MARAFON e SANTOS, 2016, p.409), assim como foi diversificada a composição funcional das universidades federais que passaram a compor em seus quadros técnicos profissionais que atuam diretamente nos objetivos do REUNI de implementação de políticas de Inclusão e de assistência estudantil, tais como assistentes sociais, pedagogos, psicólogos etc. Neste processo de reformulação das diretrizes do ensino superior público as cotas étnicos-raciais e sociais foram uma conquista dos movimentos sociais que lutam pela educação pública, gratuita e de qualidade, que tencionaram o Estado pelo reconhecimento deste direito social. Foi a partir do ano de 2012 por meio do projeto de Lei nº 12.711 (Lei de cotas), de 29 de agosto de 2012 que os estudantes mais vulneráveis socioeconomicamente passaram a ter acesso este direito que torna o processo de ingresso ao ensino superior um tanto mais equinanime. No entanto, na contra-mão desse processo de ampliação do ensino superior entende-se que as cotas possibilitam o ingresso, mas não garantem que estes estudantes tenham condições de conclusão do curso de graduação ou mesmo que tenham uma vivência universitária com participação em projetos de pesquisa, extensão, monitoria, eventos técnicos científicos e outras atividades que qualificam a vida acadêmica. Dados do censo do Censo da Educação Superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira-INEP (2016) a pontam que na rede federal de educação em nível superior estão matriculados mais de 1,1 milhão de alunos. Em dez anos, a rede federal mais que dobrou de tamanho. Partindo de 615.542 matrículas em 2007 para 1.204.956 no ano de 2017, somente referente ao ensino presencial, estes dados demonstram um crescimento de 92% na última década, reflexo direto das políticas do REUNI. O INEP apresentou, ainda, dados bastantes expressivos referentes ao quantitativo de vagas disponibilizadas no ensino superior das Instituições Federais do ano de 2016. Destas, no Brasil, nas redes de Ensino Federal foram ofertadas 1.645.079 vagas, sendo que foram realizadas 1.306.351 matrículas, e destas matrículas 133.300 2788

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI vagas que estavam disponíveis foram trancadas. No norte do Brasil de 194.905 vagas disponibilizadas, 152.178 foram realizadas matrículas e destas 22,026 foram trancadas. No estado do Pará de 81.234 vagas disponibilizadas, apenas 52.201 estudantes foram matriculados, e destes 16.497 trancaram a matrícula ao longo do curso. Muitas são as possibilidades que influenciam o trancamento, e outras modalidades de não aproveitamento destas vagas, sendo elas: desvinculação de curso, morte, transferência para outros cursos e ainda a falta de condições materiais para manterem-se em curso superior, que mesmo sendo em universidade pública ainda é bastante oneroso para estudantes oriundos das camadas sociais mais vulneráveis. Os movimentos sociais que defendem a educação pública também mobilizaram a sociedade e o setor político para elaboração de políticas que permitissem, além do acesso, a permanência dos estudantes oriundos das classes sociais mais baixas no ensino superior com igualdade de oportunidades. Neste sentido, foi instituído pelo Governo Federal, a partir da pressão social, o Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES, com os objetivos de democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal, e ainda: minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior; reduzir as taxas de retenção e evasão; e contribuir para a promoção da inclusão social pela educação. As ações de Assistência Estudantil em patamar de Política Pública ganharam dotação orçamentaria própria, a partir da regulamentação do Decreto Nº 7.234, de 19 de julho de 2010 que versa sobre o PNAES. 3 AS AÇÕES DO PNAES NA UFRA: O Programa Bolsa Permanência para estudantes indígenas e quilombolas As ações afirmativas referentes ao ingresso de estudantes passaram a ser desenvolvidas desde o ano de 2012 por meio das cotas, já as políticas afirmativas que visam a permanência de estudantes socioeconomicamente vulneráveis passaram a ser desenvolvidas desde o ano de 2013 quando foi instituída a Pro-Reitoria de Assuntos Estudantis - PROAES que passou a desenvolver as ações do PNAES. As ações do PNAES na UFRA são orientadas pela Resolução do Programa na UFRA, estabelece que as ações do programa visam a “democratização das condições de permanência a a conclusão dos cursos universitários em tempo regular”. As ações do 2789

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI programa são desenvolvidas em dois eixos norteadores, sendo o primeiro denominado como “Atendimento Especializado” que visa atender a toda comunidade discente. O segundo, denominado como “Auxílio”, que se destina ao atendimento prioritário do discente em situação de vulnerabilidade socioeconômica que é o publico alvo desta política. O PNAES é desenvolvido na universidade por uma equipe multiprofissional composta por assistentes sociais, pedagogos (as) e psicólogos (as). O (a) Assistente social, atuando na assistência estudantil, tem dentre seus objetivos “[...] o alcance da formação do universitário superando as adversidades estruturais e individuais e na promoção de uma postura crítica frente à educação alienante promovida pelo capitalismo, atendendo aos princípios éticos [...] (DA LUZ BARBOSA, 2012, p.25)”. O Programa Bolsa Permanência (PBP) é uma ação do Governo Federal, vinculada ao Ministério da Educação (MEC), e integrado a Política Nacional de Assistência Estudantil. Este programa foi criado no ano de 2013 pela Portaria Ministerial 389/2013, e tem como finalidade, assim como o PNAES, minimizar as desigualdades sociais e contribuir para a permanência e a diplomação dos estudantes de graduação em situação de vulnerabilidade socioeconômica. O programa disponibiliza a concessão de auxílio financeiro a estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica e/ou indígenas e quilombolas. Na UFRA, atualmente, este programa tem como público alvo apenas discentes indígenas e quilombolas. No Campus da UFRA em Tomé-Açu tem-se apenas estudantes quilombolas sendo atendidos pelo programa devido não ter matrículas de candidatos indígenas até o ano de 2019. Para acessarem este programa os estudantes indígenas e quilombolas dever estar regularmente matriculados em Instituições Federais de Ensino Superior, possuir uma renda per capita familiar de até 1,5 salário mínimo, necessitam, ainda, comprovar a condição étnica declarada, apresentando um conjunto de documentos específicos exigidos pelo programa. O valor do benefício a ser pago é estabelecido pelo MEC, e prevê um valor diferenciado em relação ao valor pago aos demais estudantes que fazem parte do programa, em razão de suas especificidades com relação à organização social de suas comunidades, condição geográfica, costumes, línguas, crenças e tradições, amparadas pela Constituição Federal. 2790

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Hodiernamente o valor pago aos bolsistas indígenas e quilombolas é de R$ 900,00 (novecentos reais). Os Estudantes contemplados pela política recebem o benefício diretamente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE por meio de um cartão de beneficiário. Esse benefício será pago até o final do curso, desde que o estudante consiga se diplomar em no máximo dois semestres após a duração regular do curso. Além do valor diferenciado, o recebimento deste auxílio é acumulável com outras modalidades de bolsas acadêmicas. Tais como os auxílios para moradia, transporte, alimentação e creche do Programa Nacional de Assistência Estudantil – PNAES. É importante ressaltar que o PBP surgiu como uma ação complementar da chamada Lei de Cotas, com o objetivo de auxiliar os estudantes de baixa renda e os oriundos de comunidades indígenas e quilombolas no enfretamento das principais dificuldades presenciadas nos ambientes de educação superior após o ingresso. Atrelado à Política de Assistência Estudantil, o Programa, enquanto mecanismo de inclusão social, deve promover a adaptação, a permanência e, ao mesmo tempo, eliminar as barreiras que interferem no processo de ensino e aprendizagem desses jovens. 4 METODOLOGIA O processo metodológico desta pesquisa está pautado pela pesquisa do tipo exploratória, a qual, segundo Gil (2008, p. 41) “este tipo de pesquisa tem como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições. Foi utilizada a abordagem qualitativa, haja vista que, este tipo de abordagem fornece meios de explorar vários aspectos do objeto de pesquisa. O delineamento da proposta metodológica utilizada para alcançar os objetivos foi a pesquisa bibliográfica e documental, na qual foram consultadas artigos científicos publicados em eventos científicos que abordam a Política de Assistência Estudantil, O Programa Bolsa Permanência, obras que abordam a política de educação, o trabalho profissional do assistente social, dentre outras, assim como foram utilizadas informações obtidas nos relatórios de execução dos editais de concessão do Programa Bolsa Permanência realizado no Campus de Tomé-Açu nos anos de 2017, 2018 e 2019. As bibliografias e documentos foram escolhidas por meio de amostra intencional, em seguida, foi 2791

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI realizado fichamento, interpretação e análise de conteúdo que originaram os tópicos de artigo. 5 RESULTADOS 5.1 Perfil dos discentes quilombolas na UFRA - Campus Tomé-Açu/PA Compreende-se que estudantes quilombolas tem um passado histórico marcado por estigmas e preconceitos por conta de sua cor, e ainda por conta das desigualdades sociais e econômicas por eles vivenciadas. No entanto, mesmo com todos os desafios estes estudantes encontram-se ingressando nas universidades “ocupando um espaço que antes não era imaginado, ou “permitido”, espaço este que pode colaborar para o fortalecimento de suas lutas pela terra, e por afirmação de sua identidade quilombola” (SANTOS, 2018, p.3). Nessa perspectiva há a necessidade de ter-se um olhar diferenciado sobre a realidade dos indivíduos que se autodeclaram quilombolas, assim, na política de educação brasileira existem algumas ações que auxiliam a permanência destes estudantes nos institutos federais com a finalidade de promover a inclusão social e formação ampliada. Ao compreender que esse público tem suas especificidades, buscou-se discorrer sobre o perfil socioeconômico dos discentes quilombolas ingressos na UFRA-Campus Tomé-Açu que são atendidos pelo PBP. Para elaboração do procedimento de análise do perfil socioeconômicos dos discentes quilombolas foram coletados dados dos relatórios de execução do processo seletivo do PBP de 2017 à 2019 do Campus UFRA Tomé-Açu sendo elencadas algumas categorias fundamentais para este estudo: Quantidade de estudantes que ingressaram no PBP nos editais (2017, 2018 e 2010); Identidade de gênero; Forma de ingresso na universidade; Faixa etária; Renda per capita; e por último município e comunidade quilombola. 5.1.2 Quantidade de estudantes que ingressaram no PBP nos editais (2017, 2018 e 2010) O Campus UFRA Tomé-Açu disponibiliza 05 cursos de graduação com 50 matrículas disponíveis por curso anualmente. No ano de 2020 tem-se um total aproximado de estudantes com matrículas ativas entre 1.000 a 1.2000 estudantes. 2792

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Deste total aproximado, 19 discentes se auto declaram quilombolas e participaram do processo seletivo para concorrer ao auxílio do Programa Bolsa Permanência nos editais de 2017, 2018 e 2019. Gráfico 1: Quantitativo de estudantes quilombolas por ano. QUANTITATIVO DE ESTUDANTES QUILOMOBAS ATENDIDOS PELO PBP UFRA -TOMÉAÇU 14 4 1 2017 2018 2019 123 1.3 Faixa etária e sexo A faixa Etária dos estudantes varia de 19 à 33 anos de idade. Dos 19 discentes 11 se declararam do sexo feminino e 8 do sexo masculino. Estando assim distribuídos nos cinco cursos ofertados no Campus: Tabela 1 - Distribuição por curso e sexo SEXO CURSO M F Administração 4 4 1 Biologia 2 1 Ciências Contábeis 1 3 Engenharia Agrícola 1 2 Letras - Língua Portuguesa 5.1.4 Comunidade Quilombola A inserção de estudantes quilombolas e indígenas no ensino superior público é bastante reduzida em relação aos grupos étnicos, mas o sistema de cotas e as políticas afirmativas vem possibilitando que a cada ano ingressem mais estudantes ao ensino 2793

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI superior. A maioria dos discentes são de comunidades quilombolas do município de Tomé-Açu, porém há discentes oriundos de outros municípios, tais como de Acará, Concórdia do Pará/PA e de Moju/PA. Imagem 1 -Municípios de origem dos estudantes Fonte: Info Escola: disponível em: https://www.infoescola.com/geografia/geografia -do-para/ 5.1.5 Formas de acesso à universidade Tabela 2 -Municípios e comunidades quilombolas Tomé-açu Concórdia do Pará Moju Acará Comunidade Quant. Comunidade Quant. Comunidade Quant. Comunidade Quant. Itabocau 3 Ponte N. Srª das 3 Bom Jesus 1 Alto do 1 Graças Centro Ouro Acará São Pedro 7 Igarapé 3 Marupaúba 1 Marçaranduba Alto Acará 2794

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Dos 19 estudantes atendidos pelo Programa Bolsa Permanência, 13 ingressaram na universidade por meio da cota referente escola pública pretos/pardos. O restante ingressou por meio da ampla concorrência, mesmo possuindo documentação comprobatória de sua etnia quilombola, uma das possibilidades de este fato ocorrer pode se dar pela falta de acesso aos meios digitais de comunicação tais como a internet para serem informados sobre a possibilidade de acesso por meio desta modalidade de cota, ou mesmo por falta de divulgação pelo Ministério da Educação - MEC que poderia estar utilizando outros meios de comunicação para disseminar essa informação e conseguir alcançar um público maior. Ampliando o debate sobre o acesso dos estudantes quilombolas por meio das cotas faz-se necessário avaliar se estas modalidades de acesso ao ensino superior estão recebendo a visibilidade necessária ao publico alvo a que se destinam. Deve-se refletir que o ensino superior a até duas décadas atraz era margioritariamente ocupado pelas classes sociais mais abastadas da população e que o sistema de cotas ampliou a entrada da população socioeconomicamente vulnerável, principalmente aos cursos com “menor prestígio social”, pois os cursos mais elitizados continuam em sua maioria sendo ocupados pela parcela da população com poder econômico mais elevado. Deve-se refletir a quem interessa o discurso negativo atrelado ás cotas? A quem interessa que estas não sejam divulgadas nos meios de comunicação de massa? Quem ganha quando um estudante quilombola não se inscreve na universidade por meio das cotas? 5.1.6 Renda per capita Ao analisar a renda per capita destes estudantes e a participação de suas famílias em programas de transferências de renda identificou-se que no geral a renda per capita varia de zero a R$ 1.200,00, sendo que dos 19 estudantes apenas apenas 06 possuem fonte de renda proveniente de trabalho formal exercido pelo próprio estudante, 04 são mantidos pelo trabalho formal de algum membro da família, 03 por trabalho na agricultura familiar, 02 são dependentes de um familiar que realiza atividade informal, 01 recebe Benefício PBC para Pessoa Com Deficiência, 01 depende dos pais que são aposentados, 02 não declararam nenhuma renda. 2795

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Observa-se que no Campus Tomé-Açu os discentes quilombolas que são atendidos pelo PBP, vivenciam situação de vulnerabilidade socioeconômica estando mais propícios, que outros estudantes, ao processo de evasão. Por isso entende-se que o recebimento deste auxilio tem um papel fundamental para que este público tenhas condições materiais mínimas de concluir o curso de graduação em igualdade de condições aos demais estudantes da Universidade. 6 CONCLUSÃO A partir da visão do serviço social na área da educação o presente artigo busca dar visibilidade as reflexões a respeito do Programa Bolsa Permanência que disponibiliza auxílios financeiros para estudantes advindos de comunidades tradicionais quilombolas e indígenas, trazendo uma abordagem sobre os discentes quilombolas matriculados na instituição de ensino superior UFRA Campus Tomé-Açu e que são atendidos por este programa. Compreende-se que o PBP, enquanto uma ação da Política de Assistência Estudantil, abre caminhos para a inserção, e permanência na universidade de estudantes social e economicamente vulneráveis advindo de grupos étnicos que historicamente sofrem com a segregação e as desigualdades sociais, mas que hoje fazem parte do cotidiano das universidades federais do Brasil. Com isso, como resultado dessa pesquisa, pode-se inferir que nessas últimas décadas muitas lutas sociais foram levantadas para que as populações tradicionais tivessem seus direitos garantidos no que se refere a educação superior, muitas conquistas foram alcançadas como: os sistemas de cotas para pretos/pardos, indigenas; política de assistência estudantil; Programa Bolsa Permanência, etc. É notório destacar que essas políticas não resolvem a situação da educação Superior no Brasil, que vem sofrendo, principalmente nos últimos governos, com a redução de investimento na educação pública ocasionando diminuição das ações de assistência estudantil em todos os níveis da educação. No entanto pela análise socieoeconômica dos estudantes quilombolas do Campus Tomé-Açu percebe-se que toda a sociedade deve lutar para ampliar essas políticas para que essas comunidades tradicionais, que deram origem a nossa sociedade, passem a ocupar mais este espaço e desfrute da riqueza socialmente produzida, 2796

ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI principalmente, por eles. Que por conta do processo de escravidão perderam suas vidas e liberdade, nada mais justo que este espaço acadêmico divida com estas comunidades os seus feitos e contribua para que seus descendentes tenham acesso a universidade, pública, gratuita e de qualidade, e com isso adquiriam conhecimentos que proporcionem desenvolvimento econômico e social para suas comunidades. REFERÊNCIAS BRASIL, Decreto nº 7.234, de 19 de julho de 2010. Institui o Programa Nacional de Assistência Estudantil. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010 / 2010/Decreto/D72 4.htm>. Acesso em: 26/12/2017. BRASIL, Casa Civil; BRASIL. Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências. Diário Oficial da União, v. 149, n. 169, 2012. BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (MEC). Portaria nº 389, de 9 de maio de 2013. Cria o Programa de Bolsa Permanência e dá outras providências. Diário Oficial da União, n. 90, 2013. DA LUZ BARBOSA, Carlos Daniel. Assistência estudantil: compromisso do serviço social com o ensino superior. 2012. Disponível em: https://www.maxwell. vrac. puc- rio .br /Buscaetds.php?strSecao=resultado&nrSeq=20626@1. Acessado em 26/12/2019 DE SERVIÇO SOCIAL, CFESS–Conselho Federal. Subsídios para a atuação de Assistentes Sociais na Política de Educação. 2013. GIL, Antônio Carlos. Como classificar pesquisas?. In: Como elaborar projetos de pesquisa. 4. Ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 41 – 57. IAMAMOTO, Marilda V. Serviço Social em tempo de Capital Feitiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 2015. INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais MOSCON MARAFON, Nelize. SANTOS, Claudia Priscila Chupel Dos. A Política de Assistência Estudantil na Universidade Pública Brasileira: desafios para o Serviço Social.Textos & Contextos (Porto Alegre), v.15, n.2, p.408 - 422,ago./dez.2016. PINTO, Giselle. A política de assistência estudantil da UFF em duas faces: a institucionalidade dos processos e as perspectivas da demanda estudantil. Tese de 2797


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