ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI criminalização da pobreza intensificada cada vez mais pelo recrudescimento penal, cenário que atinge determinada população, com determinada raça e classe. Wacquant(1999) em sua obra “As prisões da miséria” faz alusão a essa realidade do avanço do Estado repressor, mediante a discussão sobre o encarceramento em massa nos países capitalistas, em especial nos Estados Unidos, no qual “(...) A chave da prosperidade norte-americana, e a solução para o desemprego em massa, residiria numa fórmula simples, para não dizer simplista: menos Estado(...) reduziram fortemente os gastos sociais, virtualmente erradicaram os sindicatos e podaram vigorosamente as regras de contratação(...) (WACQUAN,1999, p.49), vale ressaltar que o movimento do EUA é crucial ao passo que país que até hoje é considerado como referência para o mundo, visto por muitos como “modelo”. Nesse sentido, compreendemos que ao retirar das políticas sociais o Estado deixa inúmeros cidadãos desassistidos e frente a isso o cárcere aparece para o sistema como a “solução” para o controle sobre população pobre, num cenário de retrocessos de políticas, que deveriam está garantindo as condições mínimas de vida e desenvolvimento social. Em que, num contexto de crise estrutural e reestruturação produtiva a lógica do Estado penal vem favorecer o sistema vigente, além do sentido de controle, visto que a população bombardeada de contradições no sistema, como a fome, a miséria, o desemprego e a desigualdade tende a se mobilizar contra o Estado; podemos citar, que a estratégia de um Estado repressor acaba gerando a diminuição do subproletariado e do nível de desemprego, quando uma grande parcela desse grupo se encontra atrás das grades. No entanto, nem de longe esse modelo de segurança pública promove uma quebra no desenvolvimento da violência e do tráfico de drogas, associado ao fato de que os verdadeiros bandidos acabam ficando fora das grades, e não estão nas comunidades, estão nas residências de luxo, e quase nunca são punidos. Além disso, as questões ilícitas importam ao capital que por sua natureza ilícita geram lucro, alimentando e fazendo girar essas riquezas ao sistema. Logo, vem sendo alimentando nesse sentido, os índices de negros encarcerados, que vale ressaltar, sobrepõe o número de brancos. As prisões acabam, por assim, exercendo muito mais um o papel de segregação, do que um ambiente de promoção de justiça. Além dos pontos supracitados destaca-se também os ganhos para economia, em 3429
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI que o avanço das penitenciárias privadas detém o grande movimento das empresas de segurança privada, que lucrando em cima da insegurança social gerada por este cenário de ampliação das problemáticas sociais, é para tanto que grandes empresas de segurança privada contêm espaço em grandes bolsas de valores como a Wall Street, em conjunto com a positiva circulação de dinheiro que o tráfico gera. Como já apontado, as implicações atreladas ao encarceramento em massa, questão que no seu movimento exerce uma postura de criminalização da pobreza, utilizasse de medidas no campo social e cultural, ao passo que para sustentação de uma realidade de aprisionamento da população pobre em conjunto com a fragilização das políticas, se constrói um imaginário de que aquela população merece ser tratada daquela forma. A lógica nos argumentos em que as atitudes individuais estão acima da realidade conjuntural e do sistema que em sua natureza produz desigualdade, miséria e violência, resultando para a população pobre, sem as condições de subsistência, padecer de fome, esperar a caridade ou padecer nos presídios. Nessa sociedade, as condições de sobrevivência da população pobre são incertas só restando à punição, enquanto na outra face da realidade, poucos indivíduos detêm a maior parte da riqueza produzida socialmente. Nesse processo, os impactos caem excepcionalmente na população jovem e em especial no grupo infanto-juvenil, com consequências, muitas vezes irreparáveis, ao passo que além dessa população crescer e se desenvolver num ambiente hostil, também são embebidos diariamente por preconceitos, privações e discriminação. 4 O DECRETO Nº 9.761/2019, A LEI Nº 13.840 E SUAS IMPLICAÇÕES PARA A POPULAÇÃO INFANTO-JUVENILA As mudanças do tratamento das políticas contra drogas em que se destaca o desejo de alteração na Política Nacional de Drogas (PNAD), tornou-se objetivo do governo ainda nos primeiros meses de mandato. Para tanto, aos 11 de abril de 2019 foi aprovado o decreto nº 9.761/2019 que trata da aprovação de uma Nova Política Nacional de Drogas. O Decreto, se formulou em cima de um anexo construído pelo Grupo Técnico Interministerial instituído pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas, que já exibir o caráter das novas políticas para drogas, frente argumentos e diretrizes, no qual, a política se baseia no pressuposto de “2.1. Buscar incessantemente 3430
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI atingir o ideal de construção de uma sociedade protegida do uso de drogas, (...)”, sob a perspectiva de estar alinhada a lógica “(...) contrária a iniciativas de legalização de drogas no país”, bem como destaque maior para um dos objetivos que é “3.18. Promover a estratégia de busca de abstinência de drogas lícitas e ilícitas como um dos fatores de redução dos problemas sociais, econômicos e de saúde decorrentes do uso, do uso indevido e da dependência das drogas lícitas e ilícitas” atrelada a investida orçamentária, em instituições filantrópicas que fazem o acolhimento de pessoas em situação de dependência, em destaque as comunidades terapêuticas. Já sinalizadas no Decreto supracitado, essas questões e diretrizes ganharam corpo a partir da aprovação de alterações na lei de drogas, quando em 05 de junho de 2019 foi instituído a Lei Nº 13.840, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento das políticas sobre drogas. Cenário que significa grandes alterações na Lei de Drogas, que impactam o movimento de toda a lógica de funcionamento das políticas públicas de drogas ao passo que é esta lei que regulamenta o funcionamento do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD). Como principais pontos problemáticos incluídos na lei, podemos citar, primeiro, a centralidade da lógica da abstinência e o fortalecimento de internações involuntárias, no que se destaca na passagem legal, incursões de artigos que dão espaço para as internações sem o consentimento do usuário, no qual têm-se o incremento dos incisos 3 e 5 na Lei de drogas. A problemática se dá ao passo que, dando ênfase a abordagem da abstinência a um consequente atropelo no que se refere a abordagem de Redução de Danos, que vinha na linha de frente nos últimos anos no país, tendo como principais características uma forma de abordagem que envolvem “ políticas, programas e/ou práticas que apresentam como objetivo a prevenção de danos, que possam estar associados ao uso abusivo de substâncias, em pessoas que não querem ou não conseguem parar de utilizá-la (...) o foco principal é fornecer às pessoas que usam drogas, opções que possam ajudar a minimizar os riscos a si mesmo ou a outras pessoas” (Camargo, P. et al. , 2019 apud Stone & Sander, 2016 ). Atropelo que aponta para uma alavancada da estratégia proibicionista retomada pelo governo Bolsonaro, num sentido que vai contrário ao que o movimento da história mostra, ao passo que “o insucesso do modelo proibicionista foi atestado pelo aumento 3431
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI mundial do tráfico e do consumo de drogas. Nesse âmbito, compreende-se o usuário de drogas em termos de duas perspectivas: a moral/criminal e a da doença. O processo de estigmatização decorrente destas perspectivas cria barreiras para a inclusão social e também para o próprio tratamento, ao passo que o rótulo atrelado aos usuários de drogas dificulta, por exemplo, o acesso às instituições de saúde”. (Gomes, T.B. Vecchia, M. D., 2018), Débora Dopra, Subprocuradora federal e Procuradora dos cidadãos, em discussão da internação involuntária, na audiência pública supracitada da Câmara dos Deputados(2019), aponta ainda que considerando a constituição, a única forma plausível para compreender a internação involuntária é sob um viés eminentemente criminal, no qual, adultos enquanto livres por não cometerem crimes, deveriam ter o direito de aderir ou não, aos programas da saúde, levando em conta que a “saúde deve ser vista como um direito e não um dever”. No que toca essa inovação para crianças e adolescentes a Subprocuradora aponta como algo ainda mais grave, ao passo que a realidade em que as crianças e adolescentes enfrentam mediante a internação se dá pautado no isolamento familiar e societário quase que completo, quando a grande maioria dos hospitais que acolhem e internam usuários/as de drogas se colocam distantes de qualquer tipo de socialização. Cenário que inclusive, vai na contramão de um dos direitos básicos de qualquer criança e adolescente salvaguardo em lei, (ECA - Art.19), que é a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. Como segunda problemática, podemos citar a investida inclusive financeira nas comunidades terapêuticas, em que pesam contradições entre, o aumento considerável dos investimentos nas instituições na contramão das ações que essas instituições realizam, em conjunto com a fragilidade da fiscalização sobre essas instituições que exibem um grande número de denúncias de violação de Direitos Humanas dentro do seu funcionamento e tratamento com os usuários. As comunidades terapêuticas, que tem seu surgimento vinculado a grupos religiosos em sua maioria, não realizam o “acolhimento as pessoas com comprometimentos biológicos e psicológicos de natureza grave que mereçam atenção médico-hospitalar contínua ou de emergência”, o que pesa como um atraso a rede de atendimento psicossocial, quando as verbas que deveriam ser encaminhadas as instituições que de fato exercem o tratamento, acaba sendo 3432
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI transferido para as Comunidades terapêuticas, significando assim a transferência de recursos públicos para iniciativas privadas. Sobre a fragilidade do investimento em instituições que não garantem o bem- estar mínimo aos pacientes, têm-se como suporte de fala, um relatório de exploração em Comunidades Terapêuticas no Brasil citado na fala de o Lúcio Costa, representante da Rede Nacional de Luta Antimanicomial na audiência da câmara dos deputados(2019) outrora citada, apontando que, em todas as comunidades visitadas foram encontradas irregularidades e violação de direitos humanos, no qual entre as violações apontadas no relatório pode-se citar, a prática de resgate; a retenção de documentos dos usuários; a privação de liberdade; a não identificação de laudo médico de pacientes e nem de encaminhamento ao ministério público para a internação de usuários; a laborterapia enquanto técnica análoga ao trabalho escravo; e uma das mais recorrentes, a questão da intolerância religiosa, pelas denúncia de que vários usuários ficam submetidos a professarem de forma obrigatória os ritos religiosos. Nesse cenário, com a dificuldade do Estado conseguir averiguar, uma por uma, todas as instituições de comunidades terapêuticas, levando em conta as irregular idas e denúncias existentes como apontado por especialistas, temos um cenário de investimento governamental em instituições que não trazem garantia efetiva de respeito aos direitos humanas, o que coloca em jogo também possíveis violações de direitos contra crianças e adolescentes que considerando a realidade exposta no nosso país, estados e municípios acabam compondo o corpo de usuários que podem ser atendidos por estas mesmas instituições, e tendo em jogo direitos como o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (art.15 ECA); o direito à liberdade compreendendo os aspectos de crença e custos religiosos e participar da vida comunitária e familiar, sem discriminação ( art.16, III,V); o direito ao respeito, que consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente (art.17); direito à dignidade, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor (art.18); O terceiro ponto, refere-se a omissão da distinção objetiva entre consumo pessoal e tráfico de drogas, exibindo a problemática de se delimitar quem é traficante e/ou usuário, e que não é tocando na Lei de drogas. Embora a Lei de Drogas tenha feito a distinção entre usuários e traficantes, alguns estudos apontam que, na prática, a 3433
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI aplicação da lei não é tão clara. Isso porque o critério que separa usuários de traficantes é subjetivo. O juiz tem de levar em conta a “natureza” e a “quantidade da substância apreendida”, o que varia muito de acordo com cada decisão. Uma pesquisa de 2016 da Fundação Getúlio Vargas mostrou que há inconsistência nas decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo em casos de plantio de maconha, com interpretações diversas. Além disso, as pesquisas mostram que a maior parte dos presos por tráfico, não tinha antecedentes criminais; foi indiciada apenas com base no relato de policiais; não contou com advogado no momento em que foi apresentada na delegacia. Parte dos presos não carregava dinheiro no momento da prisão, e muitos afirmaram ser usuários, não traficantes. Para os pesquisadores, os resultados demonstram a seletividade do sistema penal na aplicação da lei, priorizando a prisão de “microtraficantes”, muitos dos quais podem ser, na verdade, usuários presos injustamente. Cenário que nos leva a inferir possíveis implicações também no processo de indicações das medidas expedidas por juízes em casos de cometimento de atos infracionais por crianças e adolescentes, o que poderia trazer um controle se houvesse de fato uma lei clara. Os dados exibem que o perfil de crianças e adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, quando, considerando as notificações do ano de 2015 do SINASE, mediante dados divulgados pelo Ministério da Mulher da Saúde e dos Direitos Humanos (2018), 96% do total de socio educandos(as) eram do sexo masculino e 61,03% foram considerados negros, no que toca o ato infracional, considerando o total de 27.428 atos infracionais em 2015, 24% (6.666) foram registrados como análogo ao tráfico de drogas, estando o mesmo na segunda posição de atos infracionais cometidos por crianças e adolescentes. O que nos leva a indagar será que as crianças e adolescentes são afetadas em alguma medida por essa inexistente delimitação? o que essa realidade nos exibe quando não há uma lei que delimite algo tão necessário para a definição de penas/medidas? para nós aparece como mais um artifício que se atrela a uma lógica de “Guerra as Drogas, provinda da estratégia proibicionista que exibe muito mais uma guerra aos povos, e povos que vivem em determinado ambiente, com determinada cor e status social. 3434
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante o exposto, é possível inferir que as medidas tomadas pelo governo Bolsonaro no enfrentamento a violência, no que se destaca o Decreto Nº 9.761/2019, e a Lei Nº 13.840 que trata das estratégias no campo do cuidado com o uso e/ou abuso do uso de drogas, nos trazem a retomada das estratégias articuladas ao proibicionismo, o que vai na contra mão das estratégias guiadas pela Redução de Danos, que vigoravam nos anos anteriores baseadas em pesquisas e vivências científicas em consonância, com o recrudescimento das medidas neoliberais. Ações que , considerando o atual cenário do modo de produção que nos encontramos se associam ao avanço de um Estado Repressor em derimento de um Estado Social, no qual o moralismo, a repressão, o aprisionamento dos que “desviam” - sejam em cárcere, seja em clínicas - e o conservadorismo, recebem um espaço especial na contemporâniedade. Trata-se de um caminho inverso ao que deveria ser percorrido após a promulgação da Constituição de 1988, em respeito aos Direitos Humanos, bem como aos diereitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que ao consagrar a Doutrina da Proteção fez com que as crianças e adolescentes passassem a serem vistos como sujeitos de direitos que gozam de direitos fundamentais inerentes á pessoa humana, devendo ser-lhes assegurado o desenvolvimento físico, mental, espiritual e social em condições de liberdade e dignidade, devendo viver em um ambiente livre da fome, da violência e de constrangimentos, devendo ser protegido pela sua condição de vulnerabilidade e assegurado á sua dignidade. Tais princípios, contudo, encontram-se hoje ameaçados, o que presumidamente levará a população infanto-juvenil a ficar mais vulnerável, frente um estado incoerente e coercitivo. REFERÊNCIAS BBC. Bolsonaro presidente: As propostas com as quais Jair Bolsonaro se elegeu presidente do Brasil. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil- 46012309. Acesso em: 20 abr.2019. BOSCHETTI, Ivanete. Capitalismo em crise, política social e direitos. São Paulo: Cortez, 2010. 3435
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI BRASIL. DECRETO Nº 9.761, DE 11 DE ABRIL DE 2019.Aprova a Política Nacional sobre Drogas. Presidência da República Secretária-geral Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília, DF, Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019- 2022/2019/decreto/D9761.htm.Acesso em: 02 maio .2020 BRASIL. Lei nº 8.060, de 13 de junho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 jul.1990. BRASIL. LEI Nº 13.840, DE 5 DE JUNHO DE 2019.Altera as Leis para dispor sobre o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento das políticas sobre drogas. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019- 2022/2019/Lei/L13840.htm. Acesso em: 02 maio .2020. CÂMARA dos Deputados. Direitos Humanos e Minorias - Política Nacional sobre Drogas. 21 maio.2019. (03:05:04). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vjg_Yd1xABo&t=7118s.Acesso em: 02 maio .2020. CAMARGO, P. et al.PRÁTICAS DE REDUÇÃO DE DANOS E CONSUMO DE CRACK. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, n.22, Porto. dez 2019. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1647- 21602019000200005&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em: 17 jun.2020. CARCANHOLO, Marcelo. Causa e formas de manifestação da crise: uma interpretação do debate Marxista. 1996. Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade Federal Fluminense, Niterói (RJ), 1996. Disponível em :https://pt.calameo.com/read/0001407492397811573bc. Acesso em 09 fev. 20 GOMES, T.B. VECCHIA, M. D., 2018. Estratégias de redução de danos no uso prejudicial de álcool e outras drogas: revisão de literatura. Ciênc. saúde coletiva. vol.23. no.7. Rio de Janeiro, jul. 2018. Ministério da Mulher da Saúde e dos Direitos Humanos. Divulgado Levantamento Anual do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo. 2018. Brasília, DF. Disponível em:https://www.gov.br/mdh/pt-br/sdh/noticias/2018/janeiro/divulgado- levantamento-anual-do-sistema-nacional-de-atendimento-socioeducativo. Acesso em: 17 jun.2020. NETTO, José Paulo. Crise do capital e consequências societárias. Serviço Social e Sociedade. São Paulo, n. 1111, jul./set. 2012. OBSERVATÓRIO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Cenário da Infância 2018.Disponível em: https://observatorio3setor.org.br/wpcontent/uploads/2018/04/cenario_da_infancia_ 2018_internet.pdf. Acesso em 17 jun.2020. 3436
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI R7cidades.Brasil é o 9º país mais violento do mundo, segundo a OMS. 17 maio.2018. Disponível em:https://noticias.r7.com/cidades/brasil-e-o-9-pais-mais-violento-do- mundo-segundo-a-oms-17052018. Acesso em: 17 jun. 2020. WACQUANT, LOÏC. Prisões da miséria. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. 3437
EIXO TEMÁTICO 7 | DIREITOS HUMANOS, VIOLÊNCIA E POLÍTICAS PÚBLICAS A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS DE SEGURANÇA PÚBLICA EM TERESINA: o desvio e a seletividade nas abordagens da guarda municipal Matheus Bandeira da Silva1 RESUMO As guarda municipais estão em um processo de expansão em todo o territorial nacional desde o processo de redemocratização, mas existe divergências entre suas diretrizes de formulação e suas práticas, fazendo com que se tenha um distanciamento de seu status comunitário e continuem por reproduzir velhas práticas. Além de haver uma grande influência da mídia na opinião pública sobre a emergência de se aumentar o contingente repressivo presente nas ruas, tal clamor faz com que haja a manutenção das mesmas políticas de exclusão e distanciamento social que pouco pensam nas múltiplas realidades existes nas comunidades e quais os reais fatores que levam a ocorrer determinador tipos de crimes em algumas localidades. Palavras-Chaves: Guarda Municipal. Mídia. Políticas de Segurança. ABSTRACT Municipal guards are in an expansion process throughout the national territory since the process of redemocratization, but there are divergences between their formulation guidelines and their practices, causing a distance from their community status and continue to reproduce old ones. practices. In addition to the great influence of the media in public opinion on the emergence of increasing the repressive contingent present on the streets, such a clamor leads to the maintenance of the same policies of exclusion and social distancing that little regard for the multiple realities that exist in communities and what are the real factors that lead to certain types of crimes occurring in some locations. Keywords: Municipal Guard. Media. Security Policies. 1 Graduando de licenciatura em ciências sociais- UFPI. [email protected] 3438
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI INTRODUÇÃO O seguinte artigo fará alguns apontamentos da pesquisa ainda em andamento sobre a guarda civil municipal de Teresina, buscando criar um paralelo entre os noticiários que envolvem a atuação dos agentes e suas diretrizes de formulação nacional para assim saber se a algum desvio em sua prática. Quando se fala sobre segurança público é impossível separar a mídia de tal formulação já que é corriqueiro se deparar com as notícias que falam sobre a crescente violência na cidade. A fim de demonstras o quanto a mídia influencia na criação de um discurso emergencialista sobre a segurança e como isto acabou por influência na legitimação do guarda civil como uma força de polícia, a pesquisa fará uma análise interacionista entre o discurso construído no portal de notícias meio norte e a atuação ostensiva da guarda municipal na capital e seu crescente distanciamento com a população. 2 MÍDIA POTENCIALIZA UM DISCURSO: A violência está à porta A mídia constantemente expõe corpos negros de uma forma que não seriam feitos com indivíduos abastados brancos e de áreas nobres, basta uma leve procura em ferramentas de busca para ver quais corpos são expostos, a seletividade do sistema penal é nítida, além de que segundo dados do Atlas da violência de 2019 no Estado no Piauí foram identificados 629 homicídios sendo 549 destas negras e apenas 55 não negras (neste ano foi incluso amarelos e indígenas) assim como é exposto por diversos abolicionistas, indivíduos mortos tem cor, classe e faixa etária definida já que mais de 50% das vítimas da violência são jovens de 15 a 29 anos, sejam entre si ou por meio de intervenção de agentes de segurança pública. A forma de abordagem em áreas periféricas é diferenciada dependendo e onde ela é feita assim como se existe um constante clamor por meio da mídia em relação a necessidade de mais policiais na rua e mais viaturas, essa condicionante é chamada de cultura emergencialista criando uma hipertrofia nesse sistema de repressão, fazendo com que haja um investimento constante nas mesma políticas na área de segurança pública, sendo pouco abertas a inovações, criando algo descrito por Beck (2011) como 3439
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI sociedade do risco ao qual vive constantemente preocupada com as possíveis ameaças, com medo de ser a próxima vítima . As políticas municipais de segurança estão alinhadas com as nacionais e mesmo não existindo um plano municipal de segurança ou uma secretaria especifica, seguindo uma tendência nacional de não continuidade das políticas o poder público acaba por propor políticas desmedidas e mal planejadas que acabam sendo desproporcionais (Soares, Luiz Eduardo 2007). Os apontamentos feitos por Lila Xavier (2013) em seu trabalho deixam claro a tendência de aumento da violência contra jovens na capital do Piaui e está demonstra como dois programas da então rede de televisão Meio Norte, que era associada a tevê Bandeirantes que se tornou uma emissora regional a partir de 2011. Buscando criar uma programação local que expõe a realidade do estado de uma forma mais objetiva a mesma tem dois como os seus principais programas um é a “Roda do povão” e o outro é o “Agora” O primeiro programa ficou conhecido como Roda do povão por sua suposta proximidade com as demandas populares e como vivíamos em uma cidade totalmente entregue a “marginais” e “vagabundos”, já o Agora que era transmitido em seguida acaba por ter uma abordagem mais técnica sobre a problemática da segurança, trazendo diversos delegados e agentes de segurança para falaram sobre a insegurança das ruas. Fica evidente o quanto o tema da segurança e violência é pautado pela emissora sendo o principal assunto abordado, assim a pesquisa se ateve a como este comprometimento do meio de impressa está presente também em seu portal de notícias e de que modo este pode ter contribuído para a legitimação da guarda civil municipal na capital, estando presente seus apelos para a criação de uma guarda desde 20072 quando o portal anunciava a capital como a única do nordeste que ainda não possuía e já defendendo o uso de arma letal. O portal trata como se estivesse um conflito existe na cidade e que se é necessário se tomar medidas drásticas para sanar esse problema, como se o estado normal das coisas fosse muito frágil e estivéssemos em um verdadeiro caos, onde Fauzi 2 https://www.meionorte.com/policia/zona-norte-e-a-regiao-mais-violenta-de-teresina-25267 3440
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Hassan Choukr nos traz o seguinte conceito de emergência que é constantemente usado pela mídia: Que a ideia de emergência está atrelada a de urgência - e, num certo sentido, ao de crise - isso é inegável. Chama a atenção para algo que, de forma repentina, surge a desestabilizar o \"status quo ante\", colocando em xeque os padrões normais de comportamento e a consequente possibilidade de manutenção das estruturas. Nesse sentido, a ela se atrela a necessidade de uma resposta pronta imediata e que, substancialmente, deve durar enquanto o estado emergencial perdura. Seguindo essa alteração da normalidade que a guarda civil é criada na capital, com um discurso seja oficial, midiático ou popular. Ao certo é umas das principais preocupações dos cidadãos e todos tem seu ponto de vista sobre o mesmo e uma resposta quase unanime sobre a insegurança e necessidade de novas políticas de segurança pública. 3 A GUARDA MUNICIPAL: O início de sua atuação Desde seu primeiro concurso pra agentes3 que foi no ano de 2015 a guarda civil já previa uma rápida expansão contando com a contratação de 50 agentes sendo destes, 10 mulheres. No período de aproximadamente um ano após o processo preparatório estes começaram a agir efetivamente em espaços públicos do centro de Teresina no mês de julho de 2016 já com uma grande força de reserva prevista antes mesmo de sua efetivação. A guarda municipal de Teresina ( GCM) que em teoria é uma guarda de salvaguardo do patrimônio e população de caráter comunitário acaba por agir como força ostensiva em diversas praças da cidade, em complexos esportivos e terminais rodoviários e fazendo rondas próximas a prédios públicos agindo principalmente em zonas periféricas ou em áreas centrais que apresentam um certo desleixo e são vistas como áreas suscetíveis a crimes, sobretudo por apresentam uma grande quantidade de pessoas em situação de rua durando o dia ( praça da Bandeira e Rio Branco)4 Assim será abordando como se foi construído um discurso5 que age como lei (Foucault, 1970) e que não existe intermediários já que em diversas notícias que foram 3 https://www.meionorte.com/concursos/concurso-para-guarda-municipal-de-teresina-acontece-neste-domingo- 281914 4 https://www.meionorte.com/noticias/populacao-recebe-de-forma-positiva-acao-de-guardas-municipais-311815 5 Supõe que em toda sociedade, a produção no discurso é ao mesmo tempo, controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes e perigos, dominarem seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e temível materialidade. (FOUCAULT, 1996, pág. 08- 09) 3441
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI pesquisaram o portal coloca que a guarda tem seu serviço aprovado pela população, mas eles não colocam entrevistas da população sobre os agentes, sempre é uma auto avaliação seja do capitão da guarda ou do secretário, criando uma falsa aproximação da guarda com a população legitimando e tornando possível sua implementação como força de ação ostensiva buscando estabelecer através de algumas matérias de jornal do portal meio norte como desde 2015 que é o ano de seu primeiro concurso até o ano de 2020 a GCM conseguiu aumentar seu efetivo consideravelmente além de ter altos investimentos sendo prevista mais de 40 milhões para o ano de 2020 pelo BNDES para sua expansão, assim a mídia pode fortalecer e até mesmo influenciar o que se pensava ou falava-se sobre o assunto fazendo com que cada vez mais se criasse uma retorica de que segurança pública se resolve com mais com policiamento e armamento investindo cada vez mais em forças ostensivas como forma de prevenção fazendo com que a GCM se tornasse quase uma polícia militar. O estigma6carregado pela zona norte como a mais violenta (revezam com a zona sul) fez com que em 2017 se fosse criada a SEMCASPI – Secretário Municipal de Cidadania, Assistência Social e Políticas Integradas ampliado a guarda municipal de Teresina (GCM) e criando os projetos Vila bairro segurança tendo o período de um ano como teste efetivando 130 agentes, mas já contando com uma força reserva de 400 agentes, esses agentes passam por um período de treinamento multidisciplinar contando com: primeiros socorros, manutenção do meio ambiente, aulas de defesa pessoal e recursos humanos e precisam ter carteira de motorista (CNH) (fonte: SEMCASPI) e agem com armamento letal com grande foco na região norte, tendo assim blitz quinzenais em bares e ponto de socialização na região já estando na vigésima nona ação dos projetos Teresina protege e blitz do sufoco, atuações estas que continuaram até o final do mês de maio, mesmo com o início da pandemia do Covid- 19. A região norte de Teresina é historicamente a mais antigo sendo desde seu início construídas por populações negras e indígenas da região, apresentado uma grande quantidade de pescadores, vazenteiros, oleiros e plantios de fumo tendo e carregando desde seu início um Estigma de não pertencentes a então capital que vem sendo 6 “Deve-se ver, então, que a manipulação do estigma é uma característica geral da sociedade, um processo que ocorre sempre que há normas de identidade. As mesmas características estão implícitas quer esteja em questão uma diferença importante do tipo tradicionalmente definido como estigmático, quer uma diferença insignificante, da qual q pessoa envergonhada tem vergonha de se envergonhar” (Goffman, 1988, p.141) 3442
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI construída que se propõe como um centro regional de comercio, que vem crescendo de forma rápida e já chegando perto de um milhão de habitantes apresentando a necessidade de expandir o mercado imobiliário e com a chegada de grandes empreendimentos se cria a necessidade de mais forças de proteção patrimonial na mesma medida que a desigualdade de renda aumenta e a cidade apresenta uma grande quantidade de ocupações que em sua maioria estão presente na região norte ( IBGE, 2019) 4 A DIFERENÇA ENTRE TEORIA E PRÁTICA O protagonismo dos municípios em relação a serem gestores da segurança pública é algo que vem acontecendo desde o processo de redemocratização já que o artigo 144 da constituição de 1988 previa uma descentralização das políticas assim como Luiz Eduardo(2002) coloca, e ele enquanto um dos elaboradores do primeiro plano de segurança pública propõe incentivos para a criação de novos modelos de políticas de segurança, previsto uma série de benefícios para os gestões que as adotassem e que apresentassem resultados positivos. Mas essas políticas encontram forte resistência e por conta desta descentralização na tomada de decisões acabasse por não ter uma orientação mais ampla do que se deveria fazer para ter acesso ao Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) criado em 2001 pela Lei n. 10. 201 de fevereiro do mesmo ano e vinculada ao Ministério da Justiça, com o objetivo de premiar projetos da área de segurança pública e prevenção a violência, incluindo os municípios. O início da atuação do guarda civil na capital já começa conturbada com uma denúncia formal no tribunal de justiça de que a prefeitura não estava contratando as pessoas que haviam passado no concurso7 e sim terceirizando o serviço, assim sendo no segundo semestre a prefeitura de 2017 começasse um chamada gradual de 90 candidatos selecionados, sendo encontrado na pesquisa algumas divergências em relação ao efetivos de agentes ativos, que já nesta reportagem se contra 120 vagas preenchidas e em outra apenas dois meses depois eles colocam ter um efetivo de 115 7 https://www.meionorte.com/noticias/prefeitura-tem-seis-meses-para-convocar-90-candidatos-classificados- 322630 3443
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI agentes8 além de frisarem fortemente a atuações preventivas em fragrante agindo igual policiais militares. A lei 13.022/2014 - estatuto das guardas municipais anexada ao § 8º do art. 144 da Constituição Federal cria uma serie de diretrizes sobre as obrigações das guarda municipais, preferi destaca alguns tópicos do artigo 3°: Art. 3º São princípios mínimos de atuação das guardas municipais: I - Proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e das liberdades públicas; II - Preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição das perdas; III - patrulhamento preventivo; IV - Compromisso com a evolução social da comunidade; e V - Uso progressivo da força. Os tópicos foram retirados na integra do estatuto afim de demonstrar as divergências da guarda civil municipal de Teresina, mesmo sendo uma polícia comunitária não apresenta uma fórum e nem conselho de participação popular, no máximo eles tem ações e rondas preventivas em creches, praças, centros esportivos, associação de moradores não havendo uma proximidade que faça com que se tenha um conhecimento da demandar locais ou um retorno sobre suas atuações. Magnani utiliza a categoria de pedaço que nos ajuda a pensar o lugar onde os agentes atuam: \"O termo na realidade designa aquele espaço intermediário entre o privado (a casa) e o público, onde se desenvolve uma sociabilidade básica, mais ampla que a fundada nos laços familiares, porém mais densa, significativa e estável que as relações formais e individualizadas impostas pela sociedade.\" (MAGNANI, 1998, p. 116). Ninguém melhor para esclarecer as demandar e problemas do deu pedaço do que os próprios moradores e não tem como se ter conhecimento deste se os agentes atuam em um regime de revezamento dos locais de ação, fazendo com que tanto agente como comunidade não tenham uma proximidade O aumento gradual da força ostensiva da GCM vai contra o parágrafo V que prevê uma diminuição da força quando na verdade se observa um rápido crescimento do uso desta, na medida que o status de especialistas do setor da segurança é ocupado por policiais militares, valendo ressaltar cursos de capacitação que foram feitos com a 8 https://www.meionorte.com/policia/guarda-municipal-apreende-mais-de-500-porcoes-de-drogas-em-teresina- 328548 3444
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI RONE9( Rondas Ostensivas de Natureza Especial) para a criação de uma força de ação tática na GCM e estando a frente da secretaria um delegado civil; assim como já explanado o maior planos se ações são as Blitz realizadas na região do lagoas do norte10 Como citado por Almir de Oliveira e Joana Luiza (2016), existe um isomorfismo institucional na segurança pública e nas guardas que se torna policias “militares”, ou seja se existe uma “prioridade moral” que faz com que os então especialista em segurança tomem velha medidas, fazendo a guarda ceder à pressão já existente na segurança pública mantendo o distanciamento social historicamente existente nas políticas de segurança, recebendo forte influência das policias acabando agindo como tal por ser um “assunto de polícia” (OLIVEIRA JUNIOR, 2016). A seguir será exposto uma nota divulgada pelo Núcleo de pesquisa sobre criança, adolescente e jovem (NUPEC) da Universidade Federal do Piauí, sobre as ações realizadas pelos agentes de segurança: \"Trata-se de um projeto coordenado pela (SEMCASPI), que declara ter como objetivo manter a segurança em bairros de Teresina, com a realização de ações como a “Blitz do Sufoco” e “Teresina Protege”. Entretanto, em geral, os alvos das abordagens são jovens negros da periferia que, apenas a partir de suas aparências, são tomados como prováveis envolvidos com violência e criminalidade. Como suspeitos, são jovens negros da periferia que, apenas a partir de suas aparências, são tomados como prováveis envolvidos com violência e criminalidade. Como suspeitos, são fartamente abordados e “baculejados”, sob a justificativa de prevenção de delito, ferindo frontalmente o Estado de Direito\". Vale ressaltar o trabalho do NUPEC enquanto um núcleo de pesquisa de jovens a 26 anos. É preciso questionar qual o método de abordagem realizada pelos agentes de segurança pública que integram essas operações, levando-se em conta que grande parte das operações são realizadas em localidades específicas da região. Essa indagação se mostra importante, devido a presença da grande desigualdade social existente na região, deixando claro a então temática abordada na obra de Loic Wacquant em punir os pobres, onde ele ressalta como políticas econômicas e assistenciais estão 9 https://www.meionorte.com/noticias/guarda-municipal-participa-de-curso-para-criacao-de-grupo-tatico-330428 10 Região está que sofre grande especulação imobiliária e conta com grandes investimentos do FMI e Banco Mundial para criação de um parque com capacidade para 20 mil pessoas, estando presenta grande obras de infraestrutura nas 8 lagoas presentes no complexo de lagoas da área, além de planos de reassentamentos já em ação 3445
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI profundamente ligadas a projetos neoliberais, buscando assim criar uma nova forma de ordenamento da população que se mostra presente na região. Dessa forma, este feito poderia acarretar em uma ação hegemônica do estado em detrimento das pessoas que possuem um maior poder aquisitivo e se encontram em áreas privilegiadas na região. 5 CONCLUSÃO Nas mais de 40 reportagens lidas e pesquisadas no portal de noticia Meio Norte entre o ano de 2015 até 2020, com exceção de uma de 2007; se notou uma construção discursiva entorno da construção de uma guarda municipal em Teresina, mas como apresentado no decorrer da pesquisa ainda em andamento se percebe que existe um discurso midiático que legitima as ações da guarda civil já que sempre existe uma auto avaliação de seu trabalho, salvaguardo em um caso que um empresário tem sua moto roubada e devolvida rapidamente onde este elogia o serviço da guara. Em momento algum foi colocado relatos da população sobre o papel da guarda e se efetivamente concordam com suas ações, espaço esse que ser quer existe de modo forma já que não existe um fórum ou conselho de participação popular onde seja possível ajudar na formulação de ações que melhor atendam as demandas da localidade. A região que o projeto Vila Bairro desenvolvido pela secretária municipal de Cidadania, Assistência Social e Políticas Integradas (Semcaspi) age com mais força é na região do Projeto Lagoas do Norte (PLN), área está e projeto que veem travando uma dura luta de interesses dentre o PLN e os moradores da região que querem retirar de forma arbitraria. A pesquisa percebeu por meios das notícias uma similaridade entre ambas os projetos, pela área de ação ser a mesma assim como ao distanciamento da população sendo possível notar uma integração de um com o outro tornando cada vez mais concreto a conclusão do projeto PLN pela ajuda dos noticiais e mídias assim com a de uma forma ostensiva que age prioritariamente as áreas de lazer da região do projeto. REFERÊNCIAS Atlas da Violência 2019. Brasília: Rio de Janeiro: São Paulo: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; Fórum Brasileiro de Segurança Pública. 3446
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI BECK, ULRICH. Sociedade de risco: Rumo a Uma Modernidade. São paulo: editora 34, 2011. Brasil. Lei n. 13.022, de 8 de agosto de 2014. Dispõe sobre o estatuto geral das guardas municipais. Diário ofcial da união, brasília, df, 11 ago. 2014. Edição extra. P 1. CHOUKR, FAUZI HASSAN. Processo penal de emergência. 1999. 256 f tese (doutorado) - curso de direito, universidade de São Paulo. FOUCAULT, M. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 1996. GOFFMAN, Irving. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada, Rio de Janeiro: LCT Editora, 1988. LUZ, L. C. X. JUVENTUDE E VIOLÊNCIA: REFLEXÕES SOBRE VIOLÊNCIA CONTRA JOVENS EM TERESINA. Revista Eletrônica Juventude e Políticas Públicas, Brasilía, p. 1 - 19, 15 dez. 2014. MAGNANI, JOSE GUILHERME CANTOR. Da periferia ao centro: Pedaços & Trajetos. Revista de Antropologia (São Paulo), São Paulo, v. 35, n.1, p. 191-204, 1992. Núcleo de pesquisas sobre crianças, adolescentes e jovens (Nupec) / universidade federal do Piauí UFPI. Teresina: ufpi,2019. OLIVEIRA JÚNIOR, ALMIR DE; ALENCAR, J. Novas polícias? Guardas municipais, isomorfismo institucional e participação no campo da segurança pública. Revista Brasileira de Segurança Pública, v. 10, p. 22-32, 2016. Secretaria nacional de segurança pública – senasp. Perfil das organizações de segurança pública no brasil. Brasília: senasp, 2006. SOARES, LUIZ EDUARDO. A Política Nacional de Segurança Pública. Estudos Avançados, v. 21, p. 77-97, 2007. WACQUANT, LOÏC. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos [A onda punitiva]. Trad. Sérgio Lamarão. 3 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Revan, 2007. https://www.ibge.gov.br/geociencias/organizacao-do-territorio/15788-aglomerados- subnormais.html?edicao=16119. https://www.meionorte.com/policia/zona-norte-e-a-regiao-mais-violenta-de- teresina-25267. https://www.meionorte.com/concursos/concurso-para-guarda-municipal-de- teresina-acontece-neste-domingo-281914. 3447
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI https://www.meionorte.com/noticias/populacao-recebe-de-forma-positiva-acao-de- guardas-municipais-311815. https://www.meionorte.com/noticias/prefeitura-tem-seis-meses-para-convocar-90- candidatos-classificados-322630. https://www.meionorte.com/policia/guarda-municipal-apreende-mais-de-500- porcoes-de-drogas-em-teresina-328548. https://www.meionorte.com/noticias/guarda-municipal-participa-de-curso-para- criacao-de-grupo-tatico-330428. 3448
EIXO TEMÁTICO 7 | DIREITOS HUMANOS, VIOLÊNCIA E POLÍTICAS PÚBLICAS PSICOLOGIA, ADOLESCÊNCIA E POLÍTICA DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO Maria Aparecida de Paulo Gomes1 Juscislayne Bianca Tavares de Morais2 Hivana Raelcia Rosa da Fonseca3 RESUMO A referida pesquisa objetiva aproximar a Psicologia das discussões concernentes ao cenário socioeducativo. A violência enquanto questão social vem repercutindo no cotidiano dos adolescentes, sobretudo aqueles que cometem atos infracionais. Com vistas, a acompanhar essa demanda, o psicólogo enquanto componente das equipes que materializam as diretrizes do SINASE, necessita se aproximar das discussões concernentes a esse cenário. Para tal, esse ensaio teórico reflexivo foi elaborado considerando a discussão de autores que compreendem a violência enquanto uma expressão social e que sinalizam a importância do compromisso ético e em defesa dos direitos humanos com o intuito de acompanhar esses jovens. Palavras-Chaves: SINASE. Adolescência. Atendimento Socioeducativo. ABSTRACT The present work aims to bring Psychology closer to the discussions concerning the socio-educational scenario. Violence while social issue has had repercussions in the daily lives of adolescents, especially those who commit infractions. In order to accompany this demand, the psychologist as a component of the teams that materialize the SINASE guidelines, needs to approach the discussions concerning this scenario. To this end, this reflective theoretical essay was prepared considering the discussion of authors who understand violence as a social expression and who signal the importance of ethical commitment and in defense of human rights in order to accompany these young people. Keywords: SINASE. Adolescence. Socio-Educacional-Care. 1 Graduada em Recursos Humanos. Acadêmica do curso de Psicologia do UNINTA. Membro do Grupo de Estudos em Psicologia Adolescência e Atendimento Socioeducativo (GEMPSIAS). Email: [email protected] 2 Docente UNINTA. Graduada em Psicologia. Mestra em Políticas Públicas UFPI. Coordenadora do GEMPSIAS. Email: [email protected] 3 Docente. Graduada em Psicologia. Mestra em Psicologia UFGRS. Doutoranda em Políticas Públicas UFPI. Email: [email protected] 3449
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI INTRODUÇÃO A discussão em torno da relação adolescência4 e violência tem sido realizada sob a ótica de duas perspectivas: a primeira considera que o adolescente deve responder criminalmente pela prática do ato infracional considerando o argumento da redução da maioridade penal, por outro lado, a segunda concepção avalia esse segmento enquanto sujeitos em desenvolvimento, cabendo ao Estado implementar políticas sociais voltadas a prevenção da violência, entre as quais está a aplicação das medidas socioeducativas. Segundo Monte et al. (2011), o desafio de pensar ações de prevenção a prática da violência é ainda maior quando se pensa no Brasil enquanto um país marcado por profundas desigualdades sociais cujas demandas do segmento populacional infanto- juvenil têm sido recorrentemente omitidas pelo poder público, ao mesmo tempo, que o envolvimento de adolescentes em contravenções passou a chamar a atenção da opinião pública e da mídia. Concomitantemente a esse quadro, mesmo sendo considerados o “futuro da nação”, as crianças e adolescentes brasileiros, principalmente aquelas de origem pobre são as que mais possuem seus direitos fundamentais violados e são vitimizados de todas as formas de violências e riscos sociais. A psicologia enquanto ciência e profissão, vem se aproximando das discussões concernentes a temática adolescência e políticas de atendimento socioeducativo. Especialmente nos últimos 20 anos, a psicologia vem se aproximando de diálogos concernentes ao fortalecimento de sua inserção no campo das políticas públicas, incluindo sua prática profissional no Sistema Socioeducativo. Considerando o exposto, essa pesquisa objetiva compreender como o psicólogo se insere neste cenário e como vêm contribuindo para o fortalecimento dessa política pública. 2 DESENVOLVIMENTO Violência e adolescência na realidade brasileira Entre 2016 e 2017 o Brasil passou a ter quase 2 milhões de pessoas a mais vivenciando situação de pobreza, conforme os dados do IBGE (2018). De acordo com a 4 Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. 3450
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI pesquisa, em 2016 havia no país 52,8 milhões de pessoas em situação de pobreza no país. Este contingente aumentou para 54,8 milhões em 2017, um crescimento de quase 4%, e representa 26,5% da população total do país, estimada em 207 milhões naquele ano (em 2016, eram 25,7%) (IPEA, 2018). Já a população na condição de pobreza extrema aumentou em 13%, saltando de 13,5 milhões para 15,3 milhões no mesmo período. Do total de brasileiros, 7,4% estavam abaixo da linha de extrema pobreza em 2017. Em 2016, quando a população era estimada em cerca de 205,3 milhões, esse percentual era de 6,6%. Entre os estados, o Maranhão registrou a maior proporção de pobres, segundo o IBGE. No estado, mais da metade da população está abaixo da linha da pobreza. Acre, Amazonas, Pará, Amapá, Piauí, Ceará, Alagoas e Bahia tinham quase metade da população pobre também. Já Santa Catarina aparece com o menor percentual de pobres - 8,5% de sua população estava abaixo da linha de pobreza. Em todas as demais Unidades da Federação este percentual ficou acima de 13% (IBGE, 2018). Neste cenário, também há uma intensificação da pobreza na realidade das crianças e adolescentes, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. Nessas regiões, respectivamente, 60% e 54% das crianças brasileiras vivem em situação de pobreza. Os dados indicam que a extrema pobreza (com renda per capita de até um quarto de salário-mínimo) é realidade para 5,8 milhões de crianças e jovens. Em geral, os piores indicadores sociais, segundo a Abrinq (2018), estão nas regiões que mais concentram crianças e adolescentes no Brasil: no Norte (41,6%), Nordeste (36,3%) e Sudeste (29,9%) e acrescenta-se que não houve redução do trabalho infantil (IBGE, 2018). As estatísticas supracitadas desvelam os contextos no qual a maioria dos adolescentes assistidos pelo Sistema Socioeducativo estão inseridos. Nestas realidades, não é revelado o fato que o jovem que hoje prática uma infração, no passado foi vítima das mais diferentes formas de violência: a violência intrafamiliar, a violência extrafamiliar e a violência estrutural desencadeada pelo não acesso às políticas públicas e vivenciam violações de direitos no próprio Sistema Socioeducativo. Corroborando com essa realidade de violência vivenciada por jovens, o Atlas da Violência 2018, que se refere as estatísticas entre os anos de 2013 a 2016, descreve que o Brasil alcançou a marca histórica de 62.517 assassinatos por ano, apenas em 2016. Entre as maiores vítimas estão os adolescentes, correspondendo a 56,5% das causas de 3451
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI óbito entre os homens das faixas etárias entre 15 e 19 anos, principalmente das regiões Norte e Nordeste. Outro indicador ressaltado no documento, refere-se à desigualdade das mortes violentas em relação à cor de pele. Em 2016, enquanto se observou uma taxa de homicídio para a população negra de 40,2 por 100 mil habitantes, o mesmo indicador para o resto da população foi de 16, o que implica dizer que 71,5% das pessoas que são assassinadas a cada ano no país são pretas ou pardas (IPEA, 2018). Nota-se, a partir da amostra do Atlas da Violência alusiva ao ano de 2018, que a letalidade de jovens ocorre em um contexto de crescimento da violência e aprofundamento das desigualdades. Toda essa conjectura permeada de desigualdades reflete diretamente na vida dos adolescentes, principalmente os autores de atos infracionais. Esses antes de transgredirem as normas sociais são as maiores vítimas da violência em um cenário marcado por profundas desigualdades sociais. Neste sentido, Piazzarollo (2015), ao investigar uma amostra de 51 adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida, identificou os fatores de risco para o cometimento de ato infracional. A pesquisa mostra que a trajetória de vida da maioria destes adolescentes é perpassada por diferentes formas de violência intrafamiliar ou extrafamiliar, sendo a violência psicológica a modalidade mais presente fora do contexto familiar e a violência física a mais perpetrada por familiares, sendo esses, fatores relevantes para o cometimento de atos infracionais. A pesquisa de Pavezi (2013) aponta que existem dificuldades em se compreender a infração na adolescência, enquanto uma das particularidades da expressão da questão social, resultantes das desigualdades da sociedade capitalista, no qual o cometimento do crime tem sido motivado pela busca por pertencimentos, identidades e autoestima. A autor explica que, inúmeros os fatores que podem levar um adolescente a cometer um ato infracional, e a desigualdade social é apenas um entre esses fatores. São filhos de uma mesma História, gestada na falta de qualidade material de vida e exposição precoce à violência, à luta pela sobrevivência e à opressão de toda ordem. Em sua maioria, estes jovens herdeiros do nada vivem de forma precária, são influenciados pelo fetiche do consumo, intensamente propagandeado pela mídia, e pelos meios fáceis de ganhar dinheiro [...] (PAVEZI, 2013, p. 26). 3452
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Considerando esse contexto Siqueira (2016), discorre acerca da “metáfora da violência” que incide na culpabilização e responsabilização a nível individual dos jovens brasileiros, associando seus comportamentos enquanto “mal da sociedade” contemporânea. Essa representação em torno da imagem do adolescente, que lhe atribui usualmente a autoria do ato infracional e desconsidera estes enquanto as maiores vítimas da violência, tem sido incorporada aos discursos dos setores sociais dominantes e dos meios de comunicação a eles vinculados. Pensar tais questões implica em escapar da banalização da violência e da vida, tencionando a naturalização da imagem dos adolescentes e jovens como o “mal” da sociedade contemporânea. É necessário não aderir à “banalidade do mal”, portanto, refletir, pensar sobre a imagem dos adolescentes e jovens como metáfora da violência (SIQUEIRA, 2016, p. 176). De acordo com Pavezzi (2013), afirmar que o adolescente é o principal perfil etário a cometer infração, desconsidera o fato de que o crime não tem idade, por isso o autor, entende a relação violência e adolescência a partir de dois aspectos: um relacionado as questões econômicas, e o outro que possui caráter político cultural, fundado no processo histórico de formação da sociedade brasileira. Segundo o autor: A juventude se manifesta sob formas diferenciadas, em mundos distintos e antagônicos. [...] De outro lado, encontramos jovens pertencentes às classes de baixo poder aquisitivo, os “herdeiros do nada”, que convivem cotidianamente com a negação dos seus direitos [...].Tais situações colocam como opostos uma mesma parcela da sociedade e concretizam, duas concepções distintas de jovens: os que possuem acesso a condições materiais básicas de existência, os detentores de direitos, portanto, “privilegiados”; de outro, aqueles que têm sua infância, adolescência e juventude negadas, e que e que não conseguem exercer, na plenitude, seus direitos (PAVEZI, 2013, p. 39). A literatura mostra as limitações da sociedade civil e dos agentes operadores das políticas públicas em se reconhecer o adolescente autor de ato infracional enquanto sujeitos em desenvolvimento. Neste âmbito, Castro (2016) ao entrevistar professores e funcionários de escolas de Palmas-TO, que atendem adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de Liberdade Assistida, verificou que para maioria daqueles que operam as medidas socioeducativas, o ato infracional seria um desvio de comportamento que leva o adolescente a marginalidade. Os/As operadores/as do direito e da justiça veem no ato infracional um desvio de comportamento, desvio que leva a pessoa humana – o/a adolescente - à 3453
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI marginalidade. Em nossa análise, ainda os/as leva à invisibilidade e ao preconceito. Inserimos neste contexto condições sociais específicas, tais como a miserabilidade econômica, a ignorância social e a falta de discernimento político das famílias, além da não aplicação da legislação pertinente que, na prática, deveria protegê-los e reinseri-los. (CASTRO, 2016, p. 141). Para Pavezi (2013), além da sociedade ter responsabilidade estrutural na produção do adolescente que infringi as normas, pela forma como o excluí social, cultural e economicamente, a mídia reforça essa concepção, pois, culpa-se os adolescentes pela violência, mas não se questiona a estrutura social na qual eles estão inseridos. Castro (2016) discorre que a violência se torna ainda mais “cotidiana” sob a influência da mídia, na medida que, a massificação dos meios de comunicação fortalece o discurso moralista e conservador da opinião pública. Os meios de comunicação ao mesmo tempo que, propagam o fetiche do consumo ao jovem, também focalizam o ato infracional enquanto faceta mais expressiva da violência urbana. A violência torna-se “cotidiana” e ainda mais comum pela influência da mídia e da aceitação desse contexto pelo meio social. A massificação capitalista que os meios de comunicação promovem constrói um discurso moralista e conservador que ora apoia, ora contradiz, criando uma opinião pública sobre o Poder Público e sobre as ações dos/as adolescentes que cometeram ato infracional, principalmente em relação àqueles/as que cometeram um delito gravíssimo (CASTRO, 2016, p. 58). Rocha (2014) identifica em sua pesquisa que a questão da redução da maioridade penal volta à tona a cada ato infracional cometido por adolescentes, veiculados aos meios de comunicação, expondo a categoria juventude enquanto foco de discussão. Os atos infracionais que culminam em crimes contra a vida representam um pequeno percentual em relação às infrações contra o patrimônio, porém, os casos isolados de jovens que cometeram homicídios, têm reacendido na sociedade a discussão em torno da redução da maioridade penal. Nesta realidade, a exposição midiática repercute na opinião pública que, por sua vez, acaba por argumentar a favor da adoção de medidas penais mais duras a esses adolescentes. Entre os caminhos propostos para superação das situações de violência e proteção da infância e adolescência está o encaminhamento para políticas públicas. Contudo, Lourenção (2015), acrescenta que há pouca efetivação das normas 3454
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI estabelecidas e uma insuficiente operacionalização de políticas sociais realmente voltadas às reais necessidades dessa parcela da sociedade. Conforme Lima e Sousa (2012, p; 104) salientam que “as expressões ‘menor’ e ‘delinquente juvenil’ são concepções presumidas de marginalidade em condição definitiva, que repercutem até os dias de hoje nos modos de implementar políticas públicas para os adolescentes aos quais se atribui ato infracional”. Para os adolescentes que cometem atos infracionais, Andrade (2016) constata o aumento expressivo de aplicação de sansão socioeducativa aos adolescentes que infringem as leis e que são encaminhados para a política de atendimento Sistema Socioeducativo. Assim, as medidas socioeducativas têm sido a estratégia adotada pelo estado brasileiro na prevenção e no combate à violência cometida por adolescentes. Aproximações da Psicologia ao cenário socioeducativo. A inserção da Psicologia no campo das políticas públicas no contexto socioeducativo deu-se a partir da regulamentação de meios que favoreceram a atuação desse profissonal no âmbito da assistência. De acordo com Fonsêca e Develati (2013), a regulamentação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) (Lei 8.069/1990) (BRASIL,1990.p.2) preconizava o atendimento psicológico nas medidas protetivas para o menor de 18 anos que devem ser requisitadas pela autoridade competente, sempre que direitos reconhecidos neste Estatuto forem ameaçados ou violados em razão de conduta do próprio menor, bem como por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, e por falta, omissão abuso dos pais ou responsável (BRASIL, Lei nº 8.069/1990, arts. 98 e 101, inciso V). Neste contexto, a gestão da política de atendimento socioeducativo tem como base a intersetorialidade com as demais políticas de garantia de direito, bem como a necessária articulação com o judiciário e a mobilização social. A partir do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), as instituições governamentais e não governamentais que executam as medidas socioeducativas passam a contar com referenciais comuns, diretrizes mínimas a ser adotadas em todo o território nacional. As modalidades de medidas socioeducativas existentes em nosso contexto são: medidas de meio aberto de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade. 3455
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Neste cenário em discussão a Psicologia tem intervido fundamentada nos princípios éticos que regem sua profissão tendo em vista a necessidade de um olhar amplo que orientado pelas teorias sociais mobilize ações protetivas e urgentes. Assim, constata- se que algumas condições de violência nos espaços que deveriam acolher e ressocializar ainda são presentes e violam a integridade do adolescente, cabendo assim o papel da Psicologia como campo de promoção ao respeito aos direitos e proteção à vida do adolescente. De acordo com o CFP (2010), circunstâncias violadoras persistem desde superlotação, insalubridade até situações de maior gravidade como, tortura física e psicológica, abusos sexuais, maus-tratos, práticas de isolamento, humilhação, medicação excessiva como prática de docilização dos corpos são situações evidenciadas em alguns contextos. Ademais, a compreensão da própria adolescência e dos processos de construção da individualidade são imprescindíveis para se compreender também o ato infracional, bem como para construir estratégias para construção de outros projetos de vida. O saber da Psicologia vai se integrar nas práticas das políticas públicas para que elas efetivamente alcancem seus objetivos e respondam às demandas da realidade. Faz-se relevante considerar que as medidas socioeducativas objetivam a responsabilização do adolescente e que a condição de pessoa em desenvolvimento são aspectos a serem considerados como fundamentação para elaboração de práticas voltadas ao atendimento do adolescente. Segundo Fonsêca e Develati (2013), na configuração do Sistema Nacional de atendimento Socioeducativo (SINASE), o psicólogo atua com os profissionais da assistência social e educação compondo a equipe técnica interdisciplinar voltando para a elaboração de programas de atendimento ao adolescente. De acordo com Zuchetti e Moura (2010), as práticas socioeducativas consistem em atividades de educação realizadas no interior das organizações governamentais e não governamentais, que acolhem crianças, jovens, mulheres, moradores de bairros de periferias das grandes cidades, entre outros, e que desenvolvem desde ações assistenciais de alívio à pobreza até práticas de militância, sociabilidade, formação para o trabalho, etc. O compromisso ético político da profissão do psicólogo deve pautar suas ações em todos os campos de atuação. No âmbito do contexto socioeducativo essa prática é 3456
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI regida em função da mobilização para a garantia de direitos desse adolescente inserido no processo que em muitos aspectos pode ser cenário de violação de garantias individuais. O trabalho do psicólogo nessa conjuntura segundo não deve ser confundido com institucionalização de disciplinamento. “As medidas socioeducativas expressam a posição do Estado diante de um ato infracional cometido por um adolescente e decorrem da doutrina de proteção integral à criança e ao adolescente consagrada na Constituição brasileira de 1988 e regulamentada no Estatuto da Criança e do Adolescente” (ECA- Lei Federal n. 8.069/1990) (MOREIRA; ROCHA; VASCONCELOS, et al, 2015, p. 2). Neste contexto um questionamento importante a ser evidenciado refere-se ao desafio de se pensar em garantir no cotidiano a aplicação das medidas, a proteção e promoção da dignidade do indivíduo. Assim é papel do psicólogo problematizar a sua prática nesse campo de atuação fomentando condições de melhorias para o adolescente assistido. As práticas realizadas no contexto em questão têm especificidades para a condição do adolescente em processo de desenvolvimento, assim a realização dessas medidas e as condições que permeiam as práticas terão implicações para o decorrer da vida do adolescente. “É importante que as ações realizadas nesse período, e os efeitos que produzirão, tenham continuidade, independentemente da medida que o adolescente deverá cumprir. Essa continuidade poderá ocorrer pela elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA), no cumprimento da medida a ele atribuída” (CFP, 2010, p.20). Segundo Moreira, et al. (2015) o PIA, Plano Individual de Atendimento, em sua constituição, a partir da lei do Sinase, insere a temática sobre a importância de se pensar em um plano de atendimento individualizado que considere as especificidades do adolescente. As principais funções do PIA são: assegurar o acesso aos direitos fundamentais preconizados no ECA e promover para cada adolescente a individualização da medida. Nesse sentido é válido considerar que o PIA não é um instrumento diagnóstico, mas uma possibilidade para o desenvolvimento de estratégias que promovam escuta, cuidado e educação com a participação do adolescente e de suas respectivas famílias. O psicólogo tem um grande desafio neste contexto, de voltar-se para os processos de planejar, organizar, implementar e avaliar o contexto institucional criando 3457
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI possibilidades para favorecer experiências educacionais e terapêuticas significativas para os adolescentes envolvidos neste processo. (CFP, 2010). Ao psicólogo também cabe levar em consideração de acordo com sua formação acadêmica a capacidade de ampliar a visão acerca do fenômeno observado, e pensar além do que é determinado pelas instituições normativas e reguladoras. “Entre as atividades desenvolvidas pelo psicólogo estão as avaliações e pareceres, solicitados pelo Poder Judiciário, mas também há o processo psicoterápico que não pode ser esquecido, inclusive por estar mais próximo do desempenho profissional do psicólogo na relação com o seu cliente”. (FONSÊCA; DEVELATI, 2013, p.6). Considera- se assim, que o cliente é o adolescente neste contexto envolvido no processo de conflito com a lei, e que deve e considerada a sua subjetividade e identidade em formação. De acordo com Rocha (2009), o psicólogo, na condição de psicoterapeuta, deve estabelecer uma relação terapêutica com o adolescente em conflito com a lei. Trata-se de um vínculo que requer empatia e disposição do terapeuta. Essa relação é relevante no processo de auxiliar o indivíduo no contexto da reinserção social, posterior as intervenções de medidas de ressocialização. Questões como estigmas, medo, desmotivação são aspectos que podem influenciar o modo como o adolescente prosseguirá após o envolvimento com a infração da lei. O psicólogo tem assim, o papel fundamental de considerar esse sujeito em sua totalidade e as dimensões de suas necessidades e auxiliar o adolescente na construção de um novo projeto de vida, sem o atravessamento do ato infracional. As práticas do psicólogo no sistema socioeducativo, assim como o próprio sistema precisam ser constantemente repensadas e refletidas a fim de que haja uma compreensão suficientemente ampla para compreender o contexto social de cometimento do ato infracional, mas ao mesmo tempo, o universo subjetivo de cada um dos adolescentes que ali se encontram. 3 CONCLUSÃO O campo das medidas socioeducativas requer ainda bastante atenção a fim de poder ir progressivamente refinando suas práticas de modo a responder efetivamente 3458
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI às demandas da sociedade. A Psicologia é a ciência que estuda, compreende e intervém na subjetividade e no comportamento e deve, portanto, pautar e contribuir para qualificação do atendimento no sistema socioeducativo e na intervenção junto aos adolescentes em conflito com a lei. O trabalho do psicólogo ocorrerá de modo articulado com os demais profissionais que integram o serviço, bem como a toda rede de atendimento aos adolescentes em conflito com a lei e suas famílias. É na interlocução desses saberes que as bases teóricas, metodológicas e práticas poderão ir se transformando progressivamente. Ademais, é muito importante também um posicionamento crítico e reflexivo, que compreenda o adolescente em sua singularidade, mas também consiga compreender sua forma de integração a uma família, a uma sociedade, bem como os atravessamentos da questão social em seu desenvolvimento. Essa visão compreensiva é importante para gerar intervenções contextualizadas e complexas o suficiente para buscar a transformação da realidade. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em: 20 mai. 2020 BRASIL, Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012. Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo–SINASE. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12594.htm>. Acesso em: 20 mai 2020 Conselho Federal de Psicologia, 2010. Referências técnicas para atuação de psicólogos no âmbito das medidas socioeducativas em unidades de internação/ Conselho Federal de Psicologia. Brasília: CFP,2010. Disponível em: www.crpsc.org.br › ckfinder › userfiles › files. Acesso em 25 mai 2020 FONSECA, A; DEVELATI, D. O fazer do psicólogo nas instituições de internamento de adolescentes em conflito com a lei. Cadernos de graduação: ciências biológicas e da saúde Fits. Maceió. v 1. N 2. pp. 35-43. 2013. Disponível em: periodicos. set.edu.br › ... › v. 1, n. 2 (2013) › Delevati. Acesso em: 25 mai 2020 IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira: 2018. 3459
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI IPEA. Atlas da Violência. Fórum brasileiro de Segurança Pública, 2018. LIMA, M. L; SOUSA, S. M. G. Idade penal: percurso sócio-histórico da política nacional de atendimento ao adolescente a quem se atribui ato infracional. IN ARPINI, D. M; SIQUEIRA, A. C. (org.) Psicologia, famílias e leis: desafios a realidade brasileira. Santa Maria: editora UFSM, 2012 (103-140). LOURENÇÃO, E. Processos de escolarização de adolescentes autores de ato infracional no município de Presidente Prudente. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Ciências e Tecnologia -Universidade Estadual Paulista. Presidente Prudente, p. 143. 2015. MONTE et al. Adolescentes autores de atos infracionais: Psicologia Moral e Legislação. Revista Psicologia e Sociedade, v. 23 n. 1, pp. 25-134, 2011. MOREIRA, J.; ALBUQUERQUE, B.; ROCHA, B.; ROCHA, P.; VASCONCELOS, M. Plano Individual de Atendimento (PIA) na pespectiva dos técnicos da semiliberdade. Serv. Soc. Soc. São Paulo. n 122. p. 341- 356. Abr-jun. 2015. Disponível em: www.scielo.br › sssoc › 0101-6628-sssoc-122-0341. Acesso em 10 jun 2020 PAVEZI, C. TÁ EM CASA! E agora? Noções dos ex-internos da Fundação CASA sobre escola e família. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Nove de Julho. São Paulo, p. 146. 2013. PIAZZAROLLO, D. Fatores de risco e de proteção presentes na vida de adolescentes cumprindo liberdade assistida: Permanência e evasão escolar. 2015. 267f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Centro de Ciências Humanas e Naturais- Universidade Federal do Espírito Santo. Espírito Santo, 2015. ROCHA, G. Psicoterapia com infratores de alto-risco: trabalhando a mentira, a vergonha e a culpa. In: ROVINSKI, Sonia Liane Reichert; CRUZ, Roberto Moraes (Orgs.). Psicologia jurídica: perspectivas teóricas e processos de intervenção. São Paulo: Vetor, 2009, p. 195-208. Disponível em: periodicos.set.edu.br › ... › v. 1, n. 2 (2013) › Delevati. Acesso em 26 mai 2020. SIQUEIRA, L. Adolescentes em “liberdade assistida”: narrativas de (re)encontros com a escola. 2016. 190f. Tese (Doutorado em Educação) – Centro de Educação- Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória, 2016. ZUCCHETTI, D.; Moura, E. Práticas socioeducativas e formação de educadores: Novos desafios no campo social. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, 18(66), 9-28, 2010. Disponível em: www.scielo.br › scielo › pid=S0104-40362010000100. Acesso em: 26 mai 2020 3460
EIXO TEMÁTICO 7 | DIREITOS HUMANOS, VIOLÊNCIA E POLÍTICAS PÚBLICAS INTOLERÂNCIA RELIGIOSA, UM RACISMO RELIGIOSO QUE DURA MAIS DE CINCO SÉCULOS RELIGIOUS INTOLERANCE, A RELIGIOUS RACISM THAT LASTS MORE THAN FIVE CENTURIES Michelly Cristina Rozeno1 Maria Luíza de Aguiar Interaminense Guerra2 Nathállya Rayanne Soares3 RESUMO O Candomblé é uma religião que resiste a cinco séculos a perseguições e a um racismo religioso institucionalizado, definido por intolerância, mas além de suportar a essa violência, essa religião passou a se torna um espaço que atrai um público que também se encontra a margem de uma sociedade patriarcal, conservadora e moralista, atraindo principalmente mulheres, que na maioria das instituições religiosas são excluídas de terem uma relação direta com o sagrado, e os homossexuais que também não são pessoas bem vindas nessas instituições. Sendo assim o Xangô colocam esses dois atores, em espaço de destaque, onde fazem parte até mesmo do seu contexto histórico, não sendo um fenômeno novo, mas histórico, assim como a intolerância que permeia o Candomblé. Palavras-Chaves: Candomblé. Religião. Intolerância. ABSTRACT Candomblé is a religion that has resisted persecution and institutionalized religious racism for five centuries, defined by intolerance, but in addition to enduring this violence, this religion has now become a space that attracts an audience that is also on the margins of a patriarchal, conservative and moralistic society, attracting mainly women, who in most religious institutions are excluded from 1 Assistente Social pela Universidade de Pernambuco. Residente em Atenção Básica e Saúde da Família pela Asces- Unita. E-mail: [email protected] 2 Assistente Social pela Universidade de Pernambuco. Residente em Atenção Básica e Saúde da Família pela Asces- Unita. E-mail: [email protected] 3 Assistente Social pela Universidade Federal de Pernambuco. Residente em Atenção Básica e Saúde da Família pela Asces-Unita. E-mail: [email protected] 3461
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI having a direct relationship with the sacred, and homosexuals who are also not welcome people in these institutions. Thus, Xangô places these two actors in a prominent place, where they are even part of its historical context, not being a new phenomenon, but historical, as well as the intolerance that permeates Candomblé. Keywords: Candomblé. Religion. Intolerance. INTRODUÇÃO O Candomblé é uma religião de resistência, tendo por referencial a cultura africana com o intuito de suportar ao severo sistema escravagista e a todo sofrimento que eram submetidos os escravizados durante o período colonial brasileiro. Assim, a religião era como área de refúgio para suportar o cativeiro, enfrentando muitas adversidades e sendo alvo constante do preconceito religioso. Tal religião tem por alicerce a resistência e a diversidade representada em seus orixás, que considera que não temos a mesma origem, cada pessoa se origina de algum elemento da natureza, quais sejam da terra, mar, trovão, vento e tantos outros. O Candomblé resiste à perseguição e a um racismo religioso, definido por intolerância, mas além de suportar a essa violência, passa a se torna um espaço que atrai um público que também se encontra a margem de uma sociedade patriarcal, conservadora e moralista, atraindo principalmente mulheres, que na maioria das instituições religiosas são excluídas de terem uma relação direta com o sagrado, e os homossexuais que também não são pessoas bem vindas nessas instituições. Sendo assim o Xangô colocam esses dois atores, em espaço de destaque, onde fazem parte até mesmo do seu contexto histórico, não sendo um fenômeno novo, mas histórico. 2 DESENVOLVIMENTO Desde o princípio dessa pesquisa, realizada no terreiro do Pai Tota e aos demais terreiros que são interligados a ele, pude perceber o quão difícil é a realidade dos integrantes desse espaço por meio de muitas conversas e observações. Constatei que afirmar-se da “macumba”, assim como os não pertencentes dessa religião passam a denominá-la, beira a um ato político. 3462
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Durante toda a construção e desenvolvimento da pesquisa, um tema em particular foi registrado na maioria das falas dos candomblecistas: o forte preconceito que essas pessoas sofreram ou sofrem simplesmente por se afirmarem dessa religião. Muitas vezes preconceito sofrido dentro do seu próprio seio familiar. Os negros e negras africanos que foram escravizados no Brasil, foram proibidos por seus senhores e “donos” de continuarem a professar a sua fé. Cultuando, não a uma imagem de um deus branco, de reputação imaculada e santa, assim como seus apóstolos e santos católicos, mas sim a um deus negro que não apresenta uma reputação intocável, assim como seus administradores aqui na terra, os orixás, que apresentam características mais humanas do que divinas. Desse modo os portugueses que nos colonizaram desconsideraram as divindades dos negros escravizados e os proibiram de seguir a sua religião. Talvez esse tenha sido o primeiro registro de intolerância religiosa com relação à religião africana, violência essa que começa no início do período escravagista e se perpetua até os dias atuais. Verger (2002) explica que os portugueses se preocupavam em “salvar” as almas dos africanos, mergulhados nas “trevas” da idolatria. Como os negros não possuíam alma, eles estariam nas trevas, realizando suas feitiçarias e bruxarias, onde o Catolicismo, religião oficial dos colonizadores, poderia lhes conceder a salvação. Cardoso (2003) aponta que participar da civilização ainda como subalterna, nesse caso os indígenas e africanos, significava a conversão da alma, assim o conquistador aparece como indulgente alguém que, por piedosa tolerância, vai inserir os indígenas na civilização e salvar suas almas em troca da submissão de seus corpos ao trabalho escravo. Desse modo os portugueses eram detentores do poder, dos indígenas, dos negros escravizados, e dentro disso suas culturas, excluindo-as, pois, a cultura do colonizador era a verdadeira e civilizatória. Boaventura de Souza Santos (1999) traz uma abordagem bastante interessante sobre o fenômeno da exclusão, colocando-o como fenômeno cultural, social e sobretudo civilizatório, no qual se trata de um processo histórico através do qual uma cultura, validado por um discurso de verdade, cria o interdito e o rejeita. Desse modo, de acordo com o autor, “estabelece-se um limite para além do qual só há transgressão, um lugar que atira para outro lugar, a heterotopia, todos os grupos sociais que são atingidos pelo interdito social, sejam eles a loucura, o crime, delinquência ou orientação 3463
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI sexual” (SANTOS, p.3, 1999), e no caso destacado, a exclusão perpassa o meio religioso, no caso mais específico, as religiões de matrizes africanas, tornando-se a principal religião excluída socialmente, alvo de um racismo e preconceito colonialmente construído. O fenômeno da exclusão traz outra definição que está diretamente ligado a ela que é a desqualificação, passando a servir como um agente intensificador: “a desqualificação como louco e como criminoso consolida a exclusão e é a perigosidade pessoal que justifica a exclusão” (SANTOS, p.3, 1999). Assim o Candomblé, como uma religião desqualificada, torna-se uma religião excluída, não legitimada socialmente, e essa violência que o circunda tem fundamento em forte racismo religioso, já que ela é de herança negra, e a figura do negro, que também é negativada, está relacionada com essa religião, apesar de que a presença branca nesses espaços torna-se cada vez mais forte. Restringidos de cultuarem ao seu deus, os negros tiveram que arranjar uma maneira de burlar essa proibição, e o resultado disso foi a aproximação do Catolicismo com as religiões de matriz africana, pois, sendo obrigados a serem católicos, os negros passaram a assimilar as divindades católicas aos seus deuses. Dessa forma cada orixá foi sincretizado, foi relacionado a um santo católico, fazendo com seus elementos culturais fossem preservados, apesar das duras lidas desses escravos, já que os portugueses tentavam catequizá-los. O processo de escravidão e, por conseguinte, o racismo, tornaram-se instrumentos fundamentais para a perpetuação dos privilégios de uma minoria, rica e branca, que domina a disputa hegemônica no país, e o resultado dessa força opressora estruturada e organizada na sociedade usa equivocadamente a religião (quase sempre cristã) como justificativa para demonizar as divindades cultuadas pelos povos de matrizes africanas, acirrando as relações interpessoais e de forma categórica, praticando o racismo institucional e religioso nas entrelinhas deste processo (JUNIOR, 2016). Boaventura (1999) relata que no caso do racismo, o princípio de exclusão assenta na hierarquia das raças e a integração desigual que ocorre, primeiro, através da exploração colonial, e depois, através da imigração. Tendo por base a exclusão e a desqualificação de tudo que possa vir das “sub-raças” não só o negro, mas do indígena 3464
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI também, desvalorizando suas aparências, seus elementos culturais e portanto, o seu povo, em uma clara intenção de subalterniza-los, não lhes concedendo voz ou um espaço social, mas sufocando-os com essa violência silenciosa. Desse modo a intolerância religiosa, no caso das religiões de origem africana, passa a configurar também um racismo religioso. De acordo com Mattos (2008), a intolerância contra o “povo de santo” teve uma nova forma de configuração, uma nova face, apresentando certo grau de perseguição e racismo durante o processo republicano brasileiro. Este processo se deu por meio de um golpe de Estado, tendo por alvo principal o estabelecimento de políticas nacionais que assegurassem o poder e prestígio da oligarquia cafeeira de São Paulo. Mas foi nesse espaço de tempo que os negros escravizados obtiveram sua liberdade, sendo homens livres e iguais a qualquer outro homem da República, isso pelo menos no papel, já que a história nos mostra o contrário. A sociedade dessa época continuava marcada pelo domínio do catolicismo, no qual demonstrava grande força e prestígio sendo a religião oficial, bastante cultuada pelas grandes famílias ricas da sociedade que defendiam ferozmente todos seus valores morais. E dentro desses valores morais não cabia à religião negra que, apesar dos negros serem bastante numerosos, eram muito discriminados e mal vistos socialmente, assim como tudo que poderia provir deles, inclusive e, principalmente, a religião, por isso desde sua chegada ao novo mundo sua fé foi contestada, enquanto os portugueses tentavam catequizá-los. As convicções religiosas dos escravos eram, entretanto, colocadas a duras provas quando de sua chegada ao novo mundo, onde eram batizados obrigatoriamente “para a salvação de sua alma” e deviam curvar-se as doutrinas religiosas de seus mestres. (VERGER, 2002, p.14). Assim o Candomblé tornou-se uma religião que resiste, desde o século XVI, a intolerância e preconceito, sendo ainda uma cruel realidade dos terreiros atuais. Essa intolerância está tão institucionalizada na nossa sociedade que se afirmar do Candomblé é traduzido como um ato de coragem, pois ao afirmar-se candomblecista tem que se apresentar alguma justificativa do motivo da escolha da religião, mas além das justificativas são bombardeados por uma série de perguntas, explicando o porquê da escolha dessa religião, se cultuam aos demônios, se os orixás são os demônios, se tem 3465
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI medo dessa religião, se sacrificam pessoas, se tem medo de irem para inferno, e finalmente a pergunta que os candomblecistas mais escutam, se querem aceitar Jesus como seu único deus e salvador. A toda hora eles são atacados por questionamentos e afirmações que sempre colocam em xeque as suas divindades, divindades essas que são relacionados a tudo que é negativo na sociedade, a demônios, diabo, inferno. Um dos adeptos do terreiro do Pai Tota colocou em conversa uma vez que não falava mais de religião com ninguém, que entre os amigos ele era sempre questionado sobre o Candomblé, se ele achava que essa era realmente a religião certa, que ele devia ir a igreja e tantas outras provocações que sempre dirigiam a ele. Enquanto ele devia refletir se estava certo ou errado em seguir essa religião, ou outros não poderiam fazer o mesmo com relação a sua religião? Segundo ele, alguns de seus amigos eram católicos, outros protestantes, mas o único questionado sobre sua religião era ele, isso não é algo sem intenção, isso é a própria construção social brasileira que passa a institucionalizar tipos de violência como o preconceito e a intolerância, naturalizando-as ao invés de combatê-las. Os terreiros em si apresentam dois públicos distintos, o primeiro público são seus adeptos fiéis, a maioria tem essa religião como uma herança familiar, são pertencentes a uma classe social mais baixa, são negros ou de descendência negra, visto que ser negro no Brasil é uma questão mais fenotípica que genotípica; o outro público se beneficia da parte mais comercial do Candomblé, pois os trabalhos realizados pelos pais ou mães de santo junto com os orixás são caros, e geralmente quem procura esses serviços são pessoas de uma classe social de média para alta. Esses serviços não requerem do indivíduo um comprometimento ou uma conversão. Tais indivíduos são como clientes que vão ao espaço, realizam seus trabalhos, pagam por eles, sem pertencer necessariamente ao Candomblé. Esse último público citado, apresenta uma visão distorcidas dessas ações que o Candomblé proporciona às pessoas em geral, pensam que o orixá está sempre para servir-lhes, sem nenhuma hombridade, dignidade, honra e respeito. A ideia que se instaurou socialmente do Candomblé e de seus deuses é que são demônios e por isso fazem mal para as pessoas. A maioria dos trabalhos procurados é justamente para fazer mal ao outro, destruir ou reatar relacionamentos, destruir a vida das pessoas, destruir lares, como se o orixá estivesse ali só para lhes fazer mal, pois, eles são o mal. O próprio 3466
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI Pai Tota me falou que não faz esses tipos de trabalho para ninguém, que tudo que você faz, volta para você, que infelizmente a maioria pensa que os orixás são agências de matrimônio e de emprego e muitas vezes médicos, pois, segundo ele, alguns procuram o Candomblé objetivando alguma cura que não é espiritual, vem gente com doenças que eram pra ser tratadas em hospitais, mas pensam que é macumba, que alguém fez trabalho e o procuram para desfazer o feitiço. Quando ele percebe que realmente é um trabalho feito, trabalha para desfazê-lo, mas quando não, pede que se retire e busque um hospital, quem é do Xangô de verdade não faz mal a ninguém. Percebe-se que a própria procura dessa religião traz incutido um preconceito simbólico que, apesar de procurarem essa religião, procuram por relacioná-la a coisas ruins e malignas. Ninguém procura um padre, um pastor, bispo, rabino, ou demais chefes religiosos para fazerem mal a alguém, pois respeitam seu sagrado, seus divinos são válidos socialmente, enquanto os das religiões de origem africana são divinos contestados, que não apresentam grande prestígio. Em uma das nossas visitas pudemos perceber esse descrédito social com os orixás, pois uma mulher aparentemente evangélica, pois se vestia igual às seguidoras das doutrinas evangélicas e não continha o espanto e medo em seu rosto ao adentrar no espaço do terreiro, pediu ao Pai Tota que fizesse um trabalho para seu marido lhe deixar de vez e abrir os caminhos para um novo pretendente. Só que esse pretendente era casado, então era para desfazer dois casamentos, o dela e o do seu pretendente. Na hora nós estávamos conversando com seu Tota, ia nos retirando quando ele pediu que ficássemos, e no canto da sua sala escutamos tudo, com sua permissão. Seu Tota olhou para ela, pois era nítido o medo daquela mulher, riu e pediu que, por favor, se retirasse que esses tipos de serviços não faziam para ninguém, pois o Candomblé não é isso, e ainda disse que se ela queria conhecer sua religião que ela se dirigisse ao terreiro no domingo as 14 horas, pois teria festa em seu barracão. Depois da saída da mulher ele nos chamou e nos perguntou se havíamos escutado toda conversa, dissemos que sim, e ele nos relatou que diz vários ‘nãos’ desse que ele acabou de dar por dia. Segundo ele essas coisas dão muito dinheiro, mas ao mesmo tempo em que dão dinheiro, perde-se o sossego e a paz de espírito, essa é uma imagem distorcida que o povo tem do Xangô e ele disse que não iria contribuir para a manutenção disso, apesar de ter vários pais e mães de santo que fazem esse tipo de trabalho. O valor dos trabalhos que na sua grande 3467
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI maioria são caros, mas apresentam esse custo, justamente para a manutenção da casa, já que de seus adeptos não é cobrado nenhum valor para a manutenção daquele espaço, ou algo semelhante ao dízimo cristão, sendo bom ressaltar que a maior parte dos candomblecistas são pessoas de classe pobre, sendo assim os custos dos terreiros, como também a subsistências dos seus líderes religiosos, são custeados a partir desses trabalhos. Isso é mais que uma questão de combater a intolerância religiosa, ou seja, “tolerar”, já que essa não é a definição mais cabível nessas circunstâncias, muito menos essa definição chega perto do conceito de alteridade. Só toleramos algo que não suportamos, o que eles querem é o respeito às suas formas de culto, estima essa que foi negada historicamente, tanto que por muitos anos o Candomblé e a Umbanda não eram nem consideradas religiões e sim seitas, pois não tinham um livro sagrado, como o cristianismo e judaísmo tem a bíblia, e o islamismo tem o alcorão, escrituras que embasassem suas divindades, suas crenças, não apresenta deuses santificados, e tantas outras proposições das religiões de matrizes africana que foram usadas com o intuito de desqualifica-la. Os sentidos de tolerância na modernidade, predominantes nos dicionários das línguas latinas, revelam a ideologia da cultura europeia em seu projeto de universalidade e homogeneidade pela dominação das outras culturas. No século XVI, o vocabulário latino tolerância significa constância em suportar, permitir, condescender. Nessa acepção, a tolerância supõe uma relação humana entre desiguais, em eu o superior faz concessões ao inferior. Assim, o verbo ‘tolerar’ aparece frequentemente como sinônimo de ‘suportar’ ou ‘aceitar’ com indulgência. Nesses dois sentidos básicos estão presentes a postura discriminatória e superior dos conquistadores em relação aos povos indígenas da América Latina (CARDOSO, 2003, p.132-132). Mas além dessa intolerância específica para religiosidade, nesse caso as religiões de matrizes africanas, que são historicamente as religiões que registram mais casos de intolerância no Brasil, outras questões também são levantadas, como a intolerância sexual, cultural, étnica e econômica, tudo baseado em uma sociedade patriarcal, marcada por uma forte herança colonial, onde o diferente, o que diverge do “ comum social” é encarado como errôneo, e isso faz com que a intolerância torne-se uma parte 3468
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI constituinte da própria composição social. Não que isso sirva de justificativa para embasar ou até mesmo defender esse tipo de violência, mas é necessário ressaltar para que essas formas de violência não sejam silenciadas, assim como foram durante muitos anos. À intolerância religiosa soma-se a intolerância política, cultural, étnica e sexual. A inquisição está presente no cotidiano aos indivíduos: no âmbito do espaço doméstico, nos locais do trabalho, nos espaços públicos e privados. Ela assume formas sutis de violência simbólica e manifestações extremas de ódio, envolvendo todas as esferas das relações humanas. A intolerância é, portanto, uma das formas de opressão de indivíduos em geral fragilizados por sua condição econômica, cultural, étnica, sexual e até mesmo por fatores etários. Muitas vezes nos surpreendemos ao descobrira nossa própria intolerância. A construção de uma sociedade fundada em valores que fortalece tolerância mútua exige o estudo das formas de intolerância e das suas manifestações concretas, aliado à denúncia e combate a todos os tipos de intolerância. Por outro lado, a tolerância pressupõe a intransigência diante das formas de intolerância e fundamenta- se numa concepção que não restringe o problema da tolerância! Intolerância no âmbito do indivíduo; esta é também uma questão social, econômica, política e de classe (SILVA, 2004, p. 8). Inegavelmente o Candomblé é uma religião perseguida, que resiste desde o início da sua reafirmação aqui no país a duras perseguições, resistindo através do tempo. Mas além dessa vertente de resistência histórica, elemento esse que já se tornou seu símbolo, passou a atrair outros atores sociais que, junto com ela não apresentavam muito crédito social, como os homossexuais e mulheres, público esse que passou a predominar tanto nos terreiros de Umbanda, quanto nos terreiros de Candomblé, fazendo com que essa religião se mostrasse cada vez mais singular e divergente das outras, por não reproduzir uma hierarquia social estabelecida, no qual passa a excluir esses atores, mais integra-los na formação histórica dessa religião. No Candomblé e na Umbanda, os excluídos, os desiguais podem mostrar sua igualdade. Vários registros foram feitos no qual seus adeptos, passam a enaltecer a sua religião por essa liberdade que o Candomblé lhe proporciona, dizendo que por ela não ser convencional, faz com que se torne paradeiro certo aos que se encontram vulneráveis socialmente, pois passam a compartilhar uma dor comum, a violência, e 3469
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI suas diversas roupagens, seja ela a homofobia, o machismo, o racismo e a intolerância de forma geral. Isso explica o porquê o Candomblé vem sendo procurado por movimentos sociais que lutam a favor dessas minorias, do negro, do homossexual, da mulher e outros que buscam nessa religião a sua base de resistência. Outra questão passa a permear a discussão de intolerância e da negação de tudo que possa estar ligado a uma herança negra, nesse caso a tentativa de tornar os orixás mais comerciais, sendo que para isso seja necessário embranquecê-lo. O orixá feminino Yemanjá é um exemplo disso. Yemanjá é branca ou negra? Apesar de ser um orixá, e, por conseguinte, ter sua origem lá na África, ela é constantemente retratada dentro do estereótipo branco, dos cabelos lisos, branca, nariz fino. Não é querendo problematizar, mas ressaltar que ela é um orixá, e como todos os outros é negra, mas por conta da sua grande popularidade no país ,e da sua relação sincrética, que de tão forte passou a modificar a imagem desse orixá, sendo sincretizada com nossa Senhora da Conceição, Maria e outras santas católicas, tornando-a também mais comercial, já que ela é uma das únicas orixás que tem sua imagem em estampas de roupas, seu nome em ruas, pontos comerciais, reprodução de sua imagem em estatuas e tantas outras áreas comercias, sendo a orixá feminina mais popular. O processo do sincretismo religioso foi responsável pela manutenção do Candomblé no país, além de que possibilitou que outras religiões fossem criadas a partir dela, esse engenhoso empreendimento que os negros escravizados daquela época elaboraram, apresenta uma tentativa de burlar as ordens dos portugueses e de uma provável catequização, sendo assim eles enganaram o homem branco, que queria veementemente catequiza-los e salvar as suas almas, assimilando os deuses africanos aos santos católicos, empreendimento de bastante êxito já que se passaram alguns séculos e suas heranças religiosas continuam conservadas. O estereótipo negro é constantemente negado, a isso também se enquadra os deuses de origem negra, os orixás, mas apesar de negativados, apresenta seu valor comercial, por exemplo: (...) a indústria da moda tem sido comum se apropriar desses elementos, destituindo-os de seus significados e apresentando-os em editoriais e capaz de revistas sem que seus protagonistas estejam presentes ou sejam citados, embranquecendo aqueles que são os símbolos que são próprios” (OLIVEIRA; SANTOS; MENDONÇA, 2016 p.84). 3470
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI No dia 21 de janeiro de 2007, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, instituiu pela Lei nº 11.635, como o Dia Nacional de Combate à intolerância. Essa data apresenta todo um marco, pois ela foi a data no qual a Mãe de Santo Gilda, do terreiro Axé Abassá de Ogum, na Bahia, foi vítima de intolerância religiosa, onde, acusada de charlatanismo por algumas pessoas, teve sua casa atacada, e no dia 21 de janeiro a mãe Gilda faleceu vítima de um infarto. Mas apesar dessas diretrizes e outras, que tem por objetivo o combate a intolerância religiosa, ela não cessou, ao contrário, o número de casos só aumentaram nos últimos anos. Segundo o Ministério dos Direitos Humanos, o número de casos registrados desse tipo de violência, só vem aumentando. Em 2014 o ministério registrou por meio da sua Ouvidoria 149 denúncias, em 2015 o número de registros aumentou 69,13%, totalizando 252 denúncias recebidas. No ano de 2016 somente entre os meses de janeiro a setembro, o Ministério de Direitos Humanos, vinculado ao Ministério da Justiça contabilizou 300 denúncias. Essas denúncias contabilizadas pelo Ministério dos Direitos Humanos são obtidas por meio das ligações realizadas pelo Disque 100, juntamente com a Ouvidoria da Igualdade Racial, sendo esses os instrumentos de combate ao racismo ofertado pelo governo federal. Em entrevista à jornalista Juliana Cipriani (2017), Carlos Magno, conselheiro nacional de direitos humanos e secretário da ABGLT, coloca que o ano de 2017 foi marcado por atos de racismo, injúria, homofobia, xenofobia, assédio, censura às artes, discurso de ódio e desrespeito, e isso está repercutido no aumento de números de casos de agressão, principalmente a intolerância. O conselheiro nacional de direitos humanos avalia que o uso das redes sociais e o contexto em que as minorias ganharam mais espaço contribuíram para a exacerbação dos ânimos e opiniões conflitantes, e a tendência de que essas ações venham a se agravar em 2018, e diz: “Houve uma ruptura democrática com o golpe e, com isso, uma espécie de autorização para que emergissem todas as forças conservadoras. E essa onda conservadora não é um fenômeno local, mas global, onde observamos as minorias cada vez mais sufocadas e perseguidas, por esse discurso de ódio, fazendo assim que expressões como preconceito, racismo, intolerância, sejam cada vez mais validadas socialmente, ao invés de serem punidas 3471
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI 3 CONCLUSÃO Apesar do aumento dessas denúncias, a maioria dos casos ainda não é contabilizada. Na casa do Pai Tota, por exemplo, a maioria dos adeptos sofreram com essa violência, mas nenhum registrou ou denunciou essa violência. Alguns motivos dessa omissão proposto por eles é que a justiça não vai agir em nada, e que já basta sofrer uma vez, além de confiarem na proteção de seus orixás. Santos (1999) questiona o posicionamento e as ações do Estado no que diz respeito às minorias oprimidas, situando que historicamente o Estado não dispõe de políticas que tenham por objetivo eliminar a exclusão, mas tão só de fazer a sua gestão controlada, descaracterizando as suas diferenças. “O Estado moderno capitalista, longe de procurar a eliminação da exclusão, pois que assenta nela, propõe-se apenas geri-la de modo a que ela se mantenha dentro dos níveis socialmente aceitáveis” (SANTOS, p.20, 1999). Essa análise cabe muito bem dentro das circunstâncias sociais das religiões afro no Brasil, excluídas, desqualificadas, não legitimadas, todas essas definições fizeram e fazem com que essas religiões se tornem o principal alvo de intolerância, e ainda atrelado a essa violência está a ausência de medidas mais rígidas, que passem a combater essa exclusão, que não seja apenas do Xangô, da Umbanda, mas das diversas minorias não atendidas pelo Estado. Para se ter uma política sem distinção, e sem diferenças, é necessária que “uma política de igualdade genuína, é a que permite a articulação horizontal entre identidades discrepantes e entre as diferenças em que elas assentam” (SANTOS, p.44, 1999). Constitucionalmente falando, temos o direito de sermos iguais, sem que quaisquer singularidade seja usada para nos inferiorizar, somos diferentes, de cores que divergem, no idioma, na classe, na opção religiosa e sexual, e dentre outras particularidades, mas em meio a tantas diferenças, temos algo comum, igual a todos os outros, somos humanos, temos dessemelhanças, e é essa diferença que nos torna iguais, tornando-nos responsáveis por respeitar as escolhas do outro, pois “ o outro pode ser cada um de nós” (SANTOS, p.30, 1999). 3472
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI REFERÊNCIAS CARDOSO, C.M. 2003. Tolerância e seus limites: um olhar latino-americano sobre diversidade e desigualdade. São Paulo Editora: UNESP. CIPRIANI, Juliana. 2017 foi o marcado pela intolerância, especialistas temem repetição, 2017. Disponível em: https://www.geledes.org.br/2017-foi-marcado-pela-intolerancia- especialistas-temem-repeticao-em-2018/>. Acesso em:13 de jan.2018. JUNIOR, Walmyr. Racismo religioso é o retrato da intolerância no Brasil, 2016. Disponível em: https://www.geledes.org.br/racismo-religioso-e-o-retrato-da- intolerancia-no-brasil/>. Acesso em:13 de jan.2018. MATTOS, Wilson Roberto de. Negros contra a ordem: astúcia, resistência e liberdades possíveis (Salvador, 1850-1888). Salvador: EDUFBA,2008. OLIVEIRA. T.C.S.; SANTOS.E.C.M; MENONÇA. A.F.F.N. Odayá, minha mãe! Desconstruindo o uso da imagem da Iemanjá a partir do caso Farm. Revista Udesc Ano9, n.17, jan-jun 2016. ISSN 1982-615x SANTOS, B. S. A construção multicultural da igualdade e da diferença. Coimbra: CES, 1999. SILVA, A.O. da. 2004. Reflexões sobre a intolerância. Disponível https://www.espacoacademico.com.br\\>. Acesso em: 05 de jan.2018. VERGER, Pierre. 2002. Orixás: deuses iorubas na África e no Novo mundo (6. ed). VIEIRA, R. Etnobiografias e descobertas de si uma proposta da Antropologia da Educação para a formação de professores para a diversidade e cultural. 3473
EIXO TEMÁTICO 7 | DIREITOS HUMANOS, VIOLÊNCIA E POLÍTICAS PÚBLICAS SERVIÇO SOCIAL, DIVERSIDADE SEXUAL E COMBATE AO PRECONCEITO: contribuições a partir do código de ética da profissão SOCIAL WORK, SEXUAL DIVERSITY AND COMBATING PREJUDICE: contributions from the professional code of ethics. Rafael Victor Medeiros de Sousa1 Karina Maria Bezerra Rodrigues Gadelha2 Leonardo Diego da Silva Silveira3 RESUMO Na sociedade ultraliberal a qual vivemos atualmente, expressões de violência e violação de direitos, por intermédio de desrespeito aos direitos humanos e preconceito revestido de práticas de ódio ao próximo, são nítidas e recorrentes. Diariamente, homens e mulheres são vítimas do preconceito em suas mais distintas expressões: identidade de gênero, cor de pele, orientação sexual etc. Diante disso, o Serviço Social tem contribuído efetivamente no combate dessas expressões, seja com trabalhos socioeducativos, seja também com orientações e viabilização de acesso a direitos, repudiando toda e qualquer prática de preconceito e discriminação. Assim sendo, o presente artigo visa contribuir, de forma introdutória, com o debate acerca do combate ao preconceito e respeito a diversidade sexual, a partir de elementos presentes no código de ética do Serviço Social brasileiro. Trata-se de um estudo social, em que se desenvolveu pesquisa bibliográfica e documental, mediante uma abordagem qualitativa, tendo como base o método dialético. Palavras-Chaves: Código de Ética. Serviço Social. Diversidade Sexual. Preconceito. 1 Graduado em Serviço Social pela Universidade Potiguar (UnP), discente do curso de Especialização em Instrumentalidade do Serviço Social no Âmbito das Políticas Públicas da Faculdade Vale do Jaguaribe – Mossoró. E-mail: [email protected] 2 Assistente Social Me. Meio ambiente e Desenvolvimento sustentável; aluna da pós-graduação de instrumentalidade do serviço social no âmbito das políticas públicas-FVJ. E-mail: [email protected] 3 Assistente Social. Mestrando pelo programa de pós-graduação em Serviço Social da UFRN. E-mail: [email protected]. 3474
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI ABSTRACT In the ultraliberal society we live in today, expressions of violence and violation of rights, through disrespect for human rights and prejudice coated with hateful practices towards others, are sharp and recurring. Daily, men and women are victims of prejudice in its most distinct expressions: gender identity, skin color, sexual orientation etc. That said, the Social Work has effectively contributed to combating these expressions, either with socio-educational work, also with guidelines and enabling access to rights, repudiating any and all practices of prejudice and discrimination. Therefore, this article aims to contribute, in an introductory way, to the debate about combating prejudice and respecting sexual diversity, from elements present in the Brazilian Social Work code of ethics. This is a social study, in which bibliographical and documentary research was developed, using a qualitative approach, based on the dialectical method. Keywords: Code of Ethics. Social Work. Sexual Diversity. Preconception. INTRODUÇÃO Diante a atual conjuntura ultraliberal presente no Brasil, torna-se ainda mais significativo o duro retrocesso aos avanços na conquista dos direitos sociais a população, em especial aos segmentos populacionais que historicamente sofrem com o preconceito, a opressão e a escassez de políticas setoriais, como no caso das mulheres, negros, índios, população LGBTT+ etc. Outrossim, as expressões da questão social nesse mesmo processo têm avançado ferozmente. Perante a situação, o Serviço Social como profissão inserida na divisão sociotécnica do trabalho, que ao longo de sua objetivação profissional construiu um projeto crítico, com fundamentos históricos e teórico-metodológicos embasados pelo materialismo histórico dialético possui princípios éticos e técnicos que afirmam o compromisso com os interesses desses segmentos populacionais, os quais fazem parte da classe trabalhadora, principal público de ação da profissão. Nessa lógica, o projeto profissional construído pela profissão tem permitido considerar a/o assistente social como um ser prático-social dotado de liberdade, capaz de projetar coletivamente seu trabalho, buscando sua implementação por meio de sua atividade (IAMAMOTO, 2014). Nessa perspectiva, com a construção do código de ética das/os assistentes sociais e suas respectivas edições, na qual o de 1993 e suas atualizações é o que vigora 3475
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI atualmente, houveram mudanças que repercutiram em discussões no âmbito da categoria profissional, as quais reafirmaram o compromisso com os princípios e deveres profissionais para com a classe trabalhadora, dentre eles a defesa intransigente dos direitos humanos, o combate a todas as formas de preconceito e o exercício profissional sem ser discriminado, e nem discriminar, por questão de classe, raça e gênero. De tal modo, consideramos importante debater a respeito da temática, principalmente na atual conjuntura, perante os novos desafios a serem enfrentados na contemporaneidade, no intuito de superar o conservadorismo no exercício profissional da/o assistente social. Assim, o presente estudo tem como objetivo contribuir, de forma introdutória, com o debate acerca do combate ao preconceito e respeito a diversidade sexual, a partir de elementos presentes no código de ética do Serviço Social brasileiro. O artigo foi desenvolvido metodologicamente por meio de pesquisa bibliográfica e documental, mediante análise de cunho qualitativa, tendo como base o método dialético. Em nível de estruturação, esse artigo está organizado em um item de discussão, o qual se ramifica em um subitem, seguido da conclusão. O item e subitem deste estudo irão esboçar, respectivamente, sobre o contexto histórico de construção do Código de Ética (CE) da/o assistente social, assim como a discussão problematizada pelo Serviço Social acerca da diversidade sexual e o posicionamento contrário as formas de preconceito existentes na sociabilidade corrente. 2 UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE A CONSTRUÇÃO DO CÓDIGO DE ÉTICA DA/O ASSISTENTE SOCIAL Com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), segundo Iamamoto e Carvalho (1982), começam a surgir obras e instituições que possibilitam a manifestação das primeiras formas do Serviço Social, as chamadas “Protoformas do Serviço Social” (p. 176), complementa se ainda segundo os autores referidos acima que [...] Caracteriza esse momento, no plano externo, o surgimento da primeira nação socialista e a efervescência do movimento popular operário em toda a Europa. O Tratado de Versailles procura instituir internacionalmente uma nova política social mais compreensiva relativamente à classe operária. É também o momento em que surgem e se multiplicam as escolas de Serviço Social. [...] os grandes movimentos operários de 1917 a 1921 tornaram 3476
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI patente para a sociedade a existência da “questão social” e da necessidade de procurar soluções para resolvê-la, senão minorá-la. O surgimento do Serviço Social no Brasil é objeto de discussão de alguns autores brasileiros, dentre eles Iamamoto e Carvalho (1982), que irão apontar que seu surgimento no país é fruto da relação entre o desenvolvimento capitalista industrial e a expansão urbana. Dessa maneira, o início da profissão tem grande influência da igreja católica junto a uma parcela da burguesia que, preocupados com as pressões e movimentações provocadas pela classe operária que cobrara melhorias nas condições de existência humana, viabilizaram um profissional técnico apto a atuar diante das manifestações da questão social. Segundo Iamamoto (1998, p.27), a questão social pode ser apreendida: Como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação de seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade. As mudanças no contexto da industrialização e do sistema capitalista em sua era dos monopólios provocaram modificações nos distintos setores da totalidade social, inclusive o setor social, atingido pelo grande avanço tecnológico e pelo aprofundamento da questão social, com reflexos profundos sobre a classe trabalhadora. O Serviço Social, portanto, surge no país como profissão destinada a atuar para fortalecer os interesses do Estado no trato das expressões da questão social junto à população, onde, no início, sua atuação com estas expressões se pautou numa perspectiva moralista. Também no período de sua gênese, o Serviço Social apresentava uma proposta de trabalho com viés conservador, vinculado fortemente a Igreja Católica pela busca da recuperação da hegemonia ideológica, através do fortalecimento da Ação Católica Brasileira (ACB). Como profissão inscrita na divisão do trabalho, o Serviço Social surge como parte de um movimento social mais amplo, de bases confessionais, articulado à necessidade de formação doutrinária e social do laicato, para uma presença mais ativa da Igreja Católica no ‘mundo temporal’, nos inícios da década de 30. Na tentativa de recuperar áreas de influências e privilégios perdidos, em face da crescente secularização da sociedade e das tensões presentes nas relações entre Igreja e Estado, a Igreja procura superar a postura contemplativa (IAMAMOTO, 2011, p. 18). 3477
ANAIS III SINESPP 2020 SIMPÓSIO INTERNACIONAL ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS | PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS - PPGPP UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ – UFPI A aliança com o Estado procurou conter as mudanças trazidas pela industrialização a partir de uma proposta de humanização, com estratégia de intervenção no processo de recristianização que interferiu fortemente na vida cotidiana da classe trabalhadora (CARDOSO, 2013 apud SILVA, 2015) Nesse contexto, com forte influência do projeto conservador cristão surge o Serviço Social. A formação profissional era de responsabilidade da Igreja e o projeto profissional atendia aos interesses dessa aliança conservadora. Tal projeto compreendia a questão social como desordem social e deveria ser enfrentada a partir de uma educação moral, através de forças coercitivas (ARALDI, 2007). Dessa forma, a criação de instrumentos (o Código de Ética, a Lei de Regulamentação Profissional e a Política Nacional de Fiscalização), sendo não apenas normativo e de deveres profissionais de Serviço Social, foram criados de acordo com o projeto societário da categoria profissional em cada tempo histórico, mediante as distintas mudanças societárias por que passou a sociedade brasileira. Logo, é importante mencionar que as discussões sobre ética profissional ganharam destaque no país a partir da década de 1940, entretanto, uma concepção ética conservadora, já que as características profissionais do Serviço Social nas primeiras décadas de sua existência refletiram sobre todas as dimensões da profissão, com orientações e pressupostos a-críticos e despolitizados face às relações econômico- sociais. A concepção conservadora da profissão esteve presente nos Códigos de Ética de 1947, 1965 e 1975: \"Os pressupostos neotomistas e positivistas fundamentam os Códigos de Ética Profissional, no Brasil, de 1948 a 1975\" (BARROCO, 2001, p.95). Com a chegada das décadas de 1980 e 1990, permeado pelo processo de efervescência dos movimentos sociais, haverá a queda da ditadura militar e abertura política no Brasil. Na esteira desse novo contexto societário, teve início um amplo processo de debates conduzido pelos Conselho Federal de Assistentes Sociais (CFAS) e aos Conselhos Regionais de Assistentes Sociais (CRAS), visando a alteração do Código de Ética vigente em 1975. Desse processo resultou a aprovação do Código de Ética Profissional de 1986, que superou a \"perspectiva a-histórica e a-crítica onde os valores são tidos como universais e acima dos interesses de classe\" (CFESS, 1986, p. 1). 3478
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