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3ªEdição da Revista de Jurisprudência do Copeje

Published by Thiago Álvares da S. Campos, 2021-11-25 16:40:24

Description: Homenagem ao Ministro Luís Roberto Barroso

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Código Civil) e as funções por eles desempenhadas, admitindo que a auditoria contábil incida sobre verbas de natureza pública e sobre verbas advindas de fontes privadas. Ou seja, a natureza do recurso, se público ou privado, não serve como baliza para fins de fixação de competência de sua fiscalização em relação aos partidos políticos, tampouco para as fundações, sejam elas partidárias ou não. Acrescente-se, no ponto, que a atribuição legal de competência ao Ministério Público Fundacional para velar pelas fundações partidárias, inclusive em relação a sua contabilidade, é informada pela teoria dos poderes implícitos, sendo-lhe permitido o emprego de todos os meios necessários para o desempenho da fiscalização contábil das fundações vinculadas a partidos políticos. Em suma, as fundações partidárias são pessoas jurídicas de direito privado e, portanto, regidas integralmente pelo regime jurídico extraído dos arts. 62 a 69 do Código Civil, incumbindo ao Ministério Público das Fundações por elas velar e, inclusive, fiscalizar a gestão de seus recursos. 3. DA INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA ANALISAR AS PRESTAÇÕES DE CONTAS DE FUNDAÇÕES PARTIDÁRIAS Registre-se, de saída, que acompanho o e. Min. Relator na compreensão de que inexiste dispositivo normativo que determine a competência da Justiça Eleitoral para o exame de prestações de contas de fundações partidárias. Com efeito, a leitura conjunta do art. 17, III, da Constituição Federal e do art. 32, caput, da Lei dos Partidos Políticos não admite latitude hermenêutica suficiente para se encontrar a mencionada medida de competência desta Justiça Especializada: Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos: [...] III - prestação de contas à Justiça Eleitoral; Art. 32. O partido está obrigado a enviar, anualmente, à Justiça Eleitoral, o balanço contábil do exercício findo, até o dia 30 de junho do ano seguinte. (Redação dada pela Lei nº 13.877, de 2019). (Grifo nosso). Acrescente-se que a própria legislação confere ao Ministério Público das Fundações para a fiscalização das prestações de contas desses entes de direito privado, na forma do já transcrito art. 66 do Código Civil, como, inclusive, assentou o Exmo. Min. Cezar Peluso no julgamento da Pet. nº 1.499, acórdão de 25.3.2008. Em arremate, conforme expus no voto-vista que fiz colacionar ao Plenário do Tribunal Superior Eleitoral no julgamento do 261-34. 2015.6.00.0000/DF: 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 301

O fato de as fundações instituídas pelos partidos políticos receberem recursos do Fundo Partidário para pesquisa, educação e formação política, devendo os partidos contemplar, em separado, nas suas prestações de contas a aplicação de tais valores pelos respectivos comprovantes, conforme disposto no art. 2º da Resolução-TSE nº 23.428/2014, não altera a sua natureza nem faz com que as contas devam ser analisadas pela Justiça Eleitoral. Isso porque o art. 2º da Resolução-TSE nº 23.428/2014 deve ser interpretado em consonância com o que estabelece o art. 44, IV, da Lei nº 9.096/96, o qual determina que os partidos políticos devem aplicar pelo menos 20% dos recursos recebidos do Fundo Partidário na criação e manutenção de instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política. Conclui-se, dessa forma, que o objetivo da norma contida no art. 2º da Resolução-TSE nº 23.428/2014 é tão somente permitir que a Justiça Eleitoral fiscalize se o partido aplicou os recursos do Fundo Partidário conforme determina a lei, não tendo por escopo a fiscalização do emprego desses recursos dentro das fundações mantidas pelos partidos. Além disso, ressalte-se que a referida Resolução nem sequer poderia criar regra de competência da Justiça Eleitoral, tendo em vista o seu caráter meramente regulamentar. Vale dizer, todo o conjunto de normas que circundam a questão da fiscalização contábil das fundações partidárias desvela a inexistência de competência desta Justiça Eleitoral para essa tarefa. À luz desse entendimento, e do que exposto sobre os motivos determinantes na fixação das regras de competência, o princípio da especialidade deve ser lido sob o signo da natureza jurídica do prestador das contas, e não da origem dos recursos por ela geridos. Ainda nesse trilho, a possibilidade de a Justiça Eleitoral fiscalizar a aplicação de recursos do fundo partidário, contida no art. 44, § 2º, da Lei dos Partidos Políticos, não contempla um alargamento da medida de competência desta Justiça Especializada que autorize a fiscalização das contas de fundações partidárias. Em verdade, encerra previsão de que o uso de recursos públicos por quem está obrigado a prestar contas à Justiça Eleitoral é atividade que está constantemente sob fiscalização pública e que eventuais desvios no uso de verbas públicas pode ser objeto de imediata interferência do Estado-Juiz, como inclusive prevê o art. 70 da Res.-TSE nº 23.604/2019: Art. 70. A qualquer tempo, o MPE e os demais partidos políticos podem relatar indícios e apresentar provas de irregularidade relativa à movimentação financeira, recebimento de recursos de fontes vedadas, 302 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

utilização de recursos provenientes do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e realização de gastos que esteja sendo cometida ou esteja prestes a ser cometida por partido político, requerendo à autoridade judicial competente a adoção das medidas cautelares pertinentes para evitar a irregularidade ou permitir o pronto restabelecimento da legalidade. Dispositivo similar é encontrado no art. 71 da Res.-TSE nº 23.464/2015 e, também, no art. 71 da Res.-TSE nº 23.546/2015, que, antes da edição da atual Res.-TSE nº 23.604/2019, continham a regulamentação das prestações de contas de partidos políticos referentes aos exercícios financeiros. Já em relação ao art. 37, § 14, da Lei dos Partidos Políticos, não se deve descurar que a leitura do parágrafo está condicionada ao campo de incidência normativa previsto no caput do artigo: Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento). [...] § 14. O instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política não será atingido pela sanção aplicada ao partido político em caso de desaprovação de suas contas, exceto se tiver diretamente dado causa à reprovação. (Incluído pela Lei 13.165, de 2015) Assim, a interpretação do dispositivo inicia-se pela existência da desaprovação das contas apresentadas pelo partido político, vindo-se a examinar o alcance da sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20%. Nesse compasso, o legislador optou por prestigiar a função de difusão da ideologia política e impediu que eventuais sanções financeiras impostas aos partidos políticos reduzisse os valores recebidos pelas fundações partidárias. Ou seja, a sanção imposta aos partidos políticos não transborda os limites de sua personalidade jurídica para atingir terceiros estranhos à gerência de receitas e despesas da grei partidária. Da mesma forma, a existência de duas personalidades jurídicas distintas impede que as condutas praticadas pela fundação partidária na gestão de seus recursos financeiros possam acarretar sanções aos partidos políticos. A exceção inserida no final do dispositivo não autoriza a compreensão de que a desaprovação das contas do partido político decorre de irregularidades na prestação de contas da fundação partidária, mas, sim, de atos da fundação partidária que tenham prejudicado o cumprimento das obrigações financeiras do prestador das contas, como a rejeição de recebimento dos valores previstos no art. 44, IV, da Lei dos Partidos Políticos. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 303

Em relação às regulamentações internas do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, ressalta-se que são normas insuficientes para produzir efeitos fora daquele ramo do Ministério Público e, portanto, absolutamente ineficazes para suprir lei de competência privativa da União (art. 22, I, da Constituição Federal). Por fim, quanto à aplicabilidade do art. 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei nº 4.657/42), todas as decisões proferidas por esta Justiça Eleitoral e, no caso, especialmente em relação à fixação de sua competência, imprimem a norma extraída do texto legal aos casos concretos apresentados à jurisdição da Corte. A definição dos limites da própria competência é dever primário de todos os órgãos do Poder Judiciário (princípio do Kompetenz-Kompetenz) e funda-se na compreensão de que é inexistente vácuo de competência. Para todas as situações possíveis e que estão sujeitas ao ordenamento jurídico (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal) há um juízo previamente estabelecido em lei (art. 5º, XXXVII, da Constituição Federal). Assim, a situação que ora se apresenta para debate não abarca a previsão normativa do art. 20 da LINDB, uma vez que a decisão a ser proferida não busca assento em valores jurídicos abstratos, tampouco deixa de sopesar as consequências práticas e jurídicas da decisão. Sopesados todos esses argumentos, conclui-se que à Justiça Eleitoral não foi conferida competência para a fiscalização das prestações de contas de fundações partidárias. 4. CONCLUSÃO Ante todo o exposto, acompanho o voto do e. Min. Relator quanto ao primeiro ponto da questão de ordem, que trata da possibilidade de aplicação do novo rito processual instalado pela Res. nº 23.604/2019 às prestações de contas de partidos políticos referentes aos exercícios financeiros anteriores ao de 2020, desde que o relator dos autos promova a necessária adequação do rito, na forma do art. 65, §§ 1º e 2º, da mencionada norma regulamentar. Em relação ao segundo ponto da questão de ordem, referente à inclusão da contabilidade das fundações partidárias no âmbito de análise contábil que essa Justiça Especializada exerce sobre as prestações de contas de partidos políticos, pontua-se que: i) o ordenamento jurídico não contempla a figura de institutos partidários, especialmente para os fins dos arts. 44 IV e 53, caput, da Lei dos Partidos Políticos, salvo aqueles que adotem o arquétipo jurídico de fundações, na forma da Resolução-TSE nº 22.121/2015 e dos arts. 44, 62, 2.031 e 2.032, todos do Código Civil; ii) as fundações partidárias são pessoas jurídicas de direito privado e, portanto, regidas integralmente pelo regime jurídico extraído dos arts. 62 a 69 do Código Civil, incumbindo ao Ministério Público das Fundações por elas velar e, inclusive, fiscalizar a gestão de seus recursos; e iii) à Justiça Eleitoral não foi conferida competência para a fiscalização das prestações de contas de fundações partidárias. Com fundamento em tudo que foi alhures exposto, acompanho o voto do e. Min. Relator. É como voto. 304 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

VOTO O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Senhor Presidente, eu vou, inclusive, encurtar aqui o meu voto, em virtude das manifestações anteriores, que detalharam já bem os dois posicionamentos, tanto o relator, Ministro Sérgio Banhos, quanto o Ministro – se é que podemos chamar assim –, o Ministro divergente, o Ministro Luis Felipe Salomão. E, agora, o eminente Ministro Edson Fachin, que detalhou bem as balizas dessa Questão de Ordem, que envolve dois pontos. O primeiro ponto, não vou nem perder muito tempo. Acompanho – acho que todos acompanharam o primeiro ponto – o relator. A possibilidade, aqui, de o próprio relator analisar a aplicação ou não da resolução, até porque, no caso in concreto, há proximidade muito grande da prescrição, como já foi salientado em sessões anteriores. Então, a possibilidade da aplicação desse rito processual da Res.-TSE 23.604/2019 às prestações de contas dos partidos políticos, referentes aos exercícios financeiros anteriores a 2020, fica a critério do relator dos autos – promover a necessária adequação do rito. Eu, aqui, fico na questão que me parece importantíssima, a questão mais importante: o segundo ponto, em que já há essa divergência, em relação à possibilidade ou não da Justiça Eleitoral analisar, fiscalizar a compatibilidade das fundações partidárias. Presidente, eu poderia, com todas as vênias aqui ao eminente Ministro Relator e ao eminente Ministro Edson Fachin... eu poderia, aqui, resumir a minha manifestação, obviamente não a resumirei tanto, mas a poderia resumir a um ditado do Direito Civil, que “o acessório segue o principal”. Por que essas fundações existem? Para que essas fundações são criadas? Como elas sobrevivem? Quem nomeia o corpo diretivo? Quem manda, efetivamente, nas fundações? Para que elas servem? Então, eu volto à questão: “o acessório segue o principal”. O principal são os partidos políticos. E os partidos políticos desses agora, não milhões, milhões e milhões de reais que recebem, devem passar 20% para as fundações. A Justiça Eleitoral, aqui me parece que a ela é que se aplica a teoria dos poderes implícitos; não às promotorias de fundação, mas sim à Justiça Eleitoral, que tem o dever de fiscalizar, na sua inteireza, o sistema político-eleitoral e os partidos políticos, na aplicação do dinheiro, na aplicação dessa verba pública do Fundo Partidário. A teoria dos poderes implícitos aqui, com todas as vênias às posições em contrário, a meu ver, deve ser utilizada para plena fiscalização dos partidos políticos, inclusive de suas fundações, em que pese personalidades jurídicas distintas, mas que utilizam-se do mesmo recurso público, do recurso público partidário, que deve ser fiscalizado pela Justiça Eleitoral. Eu aqui, e tenho um conhecimento muito próximo – assim como, tenho certeza, todos, mas especialmente o Ministro Mauro Campbell – do Ministério Público Estadual e das promotorias, antigas curadorias de fundações. As curadorias de fundações, agora chamadas promotorias de fundações, elas não realizam nenhum tipo, nenhum tipo de fiscalização na utilização de recursos partidários das fundações ligadas a partidos políticos. A fiscalização realizada pelas antigas curadorias de fundação, e hoje promotorias de fundação, é uma fiscalização meramente formal. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 305

E, eventualmente, no desrespeito aos estatutos, ela atua. Em nenhum momento, na história eleitoral, em nenhum momento, em nenhum estado, as promotorias de fundação realizam essa fiscalização: essa ideia de que os recursos do Fundo Partidário utilizados pelas fundações devem também ser fiscalizados pela promotoria, pelas promotorias de fundações estaduais. Parece-me que, na prática, não ocorre; parece-me que realmente quem deve realizar essa fiscalização, que não vai afastar, não vai colocar de lado, a fiscalização formal, estatutária, que as promotorias de fundação realizam, nessas fundações como em todas as outras, correrão paralelamente, mas quem a deve realizar é a Justiça Eleitoral. Aprovar minuta de escrituras das instituições de fundações, verificar suas alterações, prestação de contas dos administradores, dos tesoureiros, elaborar o estatuto fundacional... todas essas questões continuam com as promotorias de fundação. Agora, a fiscalização, a efetiva fiscalização dos recursos públicos, dos recursos partidários, destinados às fundações, isso me parece competência da Justiça Eleitoral. E, se nós não resolvermos essa questão, nós vamos continuar com uma realidade que retrata um verdadeiro vácuo fiscalizatório de 20% dos recursos do Fundo Partidário. Quase R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais) – mais, na verdade, de R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais) – sem uma fiscalização efetiva. E há diversas notícias – eu cito no voto, não vou cansá-los – de malversação desses recursos públicos, por intermédio desses entes fundacionais, com pagamento inclusive de situações pessoais, como hotéis, viagens, bebidas. Ou seja, o que a promotoria de fundação analisa é se formalmente aquelas contas estão sendo prestadas, se tem nota fiscal; mas não analisa a destinação, se a destinação do Fundo Partidário, dos 20% do Fundo Partidário de determinado partido político... se essa destinação está sendo realizada de acordo a legislação eleitoral. É aí que entra a Justiça Eleitoral. Eu faço, inclusive, também pedindo todas as vênias às posições em contrário do Ministro Sérgio Banhos e aqui, especialmente, do Ministro Edson Fachin, eu faço, inclusive, uma leitura diferente do art. 37, § 14, da Lei dos Partidos Políticos, faço a partir daquela ideia de que “o acessório segue o principal”. Se o caput diz que a desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% e no § 14 diz: “o instituto ou fundação de pesquisa e de doutrinação e educação política não será atingido pela sanção aplicada ao partido político em caso de desaprovação de suas contas, exceto se tiver diretamente dado causa à reprovação”; ora, se aqui se coloca “exceto se tiver diretamente dado causa à reprovação”, só é possível verificar se deu causa à reprovação, se a Justiça Eleitoral tiver efetivamente condições de fiscalizar também as fundações. A meu ver, o § 14 do art. 37 reforça a necessidade de efetiva fiscalização por parte da Justiça Eleitoral. Presidente, aqui eu não vou me alongar mais, mas entendo que a pretensão da Procuradoria-Geral Eleitoral, ao provocar o Tribunal Superior Eleitoral, de que a competência da Justiça Eleitoral existe, no tocante às contas das fundações, essa pretensão é plenamente válida. 306 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Assim, Senhor Presidente, eu acompanho o relator, em relação ao primeiro tópico, principalmente no tocante à impossibilidade do exame das contas da Fundação Milton Campos, que é o que está em jogo – no exercício de 2015 – pela nova Resolução, e essa possibilidade de adequação, em relação às contas anteriores, do relator, para que não prescreva, não dê nulidades, para que nós cheguemos à efetivação plena da prestação de contas. E acompanho a divergência do eminente Ministro Luis Felipe Salomão, no tocante à tese que Sua Excelência pretendeu para fixação, para o exercício financeiro de 2020 em diante – se entendi bem o voto do eminente Ministro Luis Felipe Salomão –, de que a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos, envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário. Novamente reiterando as vênias ao eminente relator e ao Ministro Edson Fachin, acompanho, nesse ponto, a divergência inaugurada pelo Ministro Luis Felipe Salomão. VOTO O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES: Senhor Presidente, trata-se de questão de ordem apresentada pelo Ministério Público Eleitoral nos autos da prestação de contas do Partido Progressista (PP) – nacional relativa ao exercício financeiro de 2015, a fim de chamar o feito à ordem para: 1) Observar o rito da Res.-TSE nº 23.604/2019 quanto à prestação de contas do PP relativa ao exercício financeiro de 2015. Mais especificamente, o Parquet alega que “os autos não foram a ele remetidos para emissão do primeiro parecer, logo após exame da unidade técnica do TSE, oportunidade em que caberia ao Ministério Público Eleitoral apontar eventuais novas irregularidades, nos termos do art. 36, § 6º, da Res.-TSE 23.604/2019, atual resolução que disciplina a prestação de contas de partidos políticos”. Por oportuno transcrevo o citado dispositivo regulamentar: Art. 36. Constatada a conformidade da apresentação de conteúdos e peças, nos termos do art. 29, §§ 1º e 2º, as contas devem ser submetidas à análise técnica para exame de sua, que compreende: [...] § 6º Concluído o exame a que se refere o caput deste artigo, o processo deve ser disponibilizado ao Ministério Público Eleitoral, oportunidade em que poderá, sob pena de preclusão, apontar irregularidades não identificadas pela Justiça Eleitoral, no prazo de até 30 (trinta) dias. 2) Encaminhar os autos à Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias deste Tribunal Superior (Asepa) para o exame das contas da fundação ligada ao partido e, posteriormente, para a concessão de nova vista do feito para apresentação do parecer ministerial. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 307

O relator, Ministro Sérgio Banhos, votou no sentido de ser incabível a aplicação da nova resolução de contas, a Res.-TSE nº 23.604/2009, a fase já exaurida do processo de prestação de contas. Quanto ao segundo ponto, entendeu que não cabe à Justiça Eleitoral examinar as contas das fundações vinculadas aos partidos políticos. Na sequência, o Ministro Luis Felipe Salomão acompanhou o relator quanto ao primeiro ponto e divergiu em relação ao segundo, para admitir a possibilidade de haver uma fiscalização concomitante das fundações dos partidos políticos pela Justiça Eleitoral e pelo Ministério Público estadual, aplicando-se esse entendimento a partir do exercício financeiro de 2020. Em seguida, o Ministro Edson Fachin acompanhou o relator. Feitos esses esclarecimentos, passo à análise do caso. 1) APLICAÇÃO DA RES.-TSE Nº 23.604/2019 A FASE JÁ EXAURIDA DO PROCEDIMENTO Conforme informado pelo relator, em 17.12.2019, o Tribunal Superior Eleitoral aprovou a Res.-TSE nº 23.604/2019, que, entre outras matérias, trata do procedimento aplicável aos processos de prestação de contas de exercício financeiro de partidos políticos. Esse novo texto regulamentar substituiu o da Res.-TSE nº 23.546/2017, norma que estava defasada, tendo em conta as recentes alterações legislativas promovidas pelo Congresso Nacional nos anos de 2018 e 2019. Das novas disposições trazidas pela Res.-TSE nº 23.604/2019, destaca-se a introdução de um novo rito procedimental a ser observado nos processos de prestação de contas. Sem prejuízo da possibilidade de o MPE e os demais legitimados impugnarem as contas após a apresentação delas, o novo texto regulamentar estabeleceu, em seu art. 35, que o Parquet deveria, logo em seguida ao primeiro exame das contas pela unidade técnica do Tribunal, apontar, sob pena de preclusão, irregularidades não identificadas pelo órgão técnico. Confira-se o dispositivo: Art. 36. Constatada a conformidade da apresentação de conteúdos e peças, nos termos do art. 29, §§ 1º e 2º, as contas devem ser submetidas à análise técnica para exame de sua regularidade, que compreende: [...] § 6º   Concluído o exame a que se refere o caput deste artigo (1º parecer), o processo deve ser disponibilizado ao Ministério Público Eleitoral, oportunidade em que poderá, sob pena de preclusão, apontar irregularidades não identificadas pela Justiça Eleitoral, no prazo de até 30 (trinta) dias. 308 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Rememoro que o texto revogado previa: (1) apresentação das contas; (2) impugnação (podendo o MP impugnar); (3) parecer preliminar da Asepa; (4) diligências; (5) primeiro parecer da Asepa; (6) diligências; (7) parecer conclusivo da Asepa; (8) parecer do MPE; (9) defesa do partido; (10) julgamento. Com o novo texto regulamentar, a atuação do MPE, com a apresentação de parecer, ocorre logo após a emissão do primeiro parecer da assessoria de contas do Tribunal – a Asepa. A título de informação, seguem as fases do novo procedimento: (1) apresentação das contas; (2) impugnação (podendo o MP atuar); (3) parecer preliminar da Asepa; (4) diligências; (5) primeiro parecer da Asepa; (6) parecer do MPE, apontando todas as irregularidades; (7) diligências; (8) parecer conclusivo da Asepa; (9) alegações finais do partido; (10) parecer do MPE; (11) julgamento. A alteração no procedimento visa, portanto, proporcionar ao partido o pronunciamento, de uma só vez, sobre as falhas apontadas tanto pelo órgão técnico quanto pelo MPE. Nesse novo cenário regulamentar, o MPE apresentou questão de ordem para chamar o feito à ordem, a fim de que o relator observasse, no procedimento, os novos ditames da Res.-TSE nº 23.604/2019. Não obstante a atual fase do procedimento do presente feito já revelar a existência de parecer conclusivo da Asepa, o órgão ministerial requer que as novas disposições regulamentares incidam retroativamente para lhe permitir atuar em fase já exaurida do procedimento, qual seja: a apresentação de parecer para apontar irregularidades não identificadas pela Justiça Eleitoral, no prazo de até 30 dias, conforme prevê o já citado art. 36, § 6º, da Res.-TSE nº 23.604/2019. Como regra geral, estabelecida no art. 14 do Código de Processo Civil/2015, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Tendo como norte esse dispositivo legal, a Res.-TSE nº 23.604/2019 estabelece, em seu art. 65: Art. 65. As disposições previstas nesta resolução não atingem o mérito dos processos de prestação de contas relativos aos exercícios anteriores ao da sua vigência. § 1º As disposições processuais previstas nesta resolução devem ser aplicadas aos processos de prestação de contas que ainda não tenham sido julgados. § 2º A adequação do rito dos processos de prestação de contas previstos no § 1º deve observar a forma determinada pelo juiz ou pelo relator do feito, sem que sejam anulados ou prejudicados os atos já realizados. Para conceder ao relator do feito discricionariedade quanto à adequação do rito, entendo que ele não deve se afastar da regra geral, que, friso, estabelece, em primeiro 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 309

lugar, a imediata aplicação do novo texto processual e, de forma cumulativa, a preservação como válidos dos atos já praticados. Diante disso, acompanho o relator para negar a aplicação da Res.-TSE nº 23.604/2019 a fase já exaurida do processo de prestação de contas. 2)  COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL PARA ANALISAR AS CONTAS DAS FUNDAÇÕES DOS PARTIDOS POLÍTICOS Após o julgamento da questão de ordem na PC nº 246-65, de relatoria do Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, em que assentada a competência do MPE para apreciar as contas das fundações de partidos políticos, e a edição da Res.-TSE nº 23.604/2019, que revogou a controvertida Res.-TSE nº 23.428/2014, que estabelecia a competência da Justiça Eleitoral para a matéria, ficou evidenciada a desnecessidade desta Justiça especializada apreciar os registros contábeis das fundações criadas pelos partidos. Atualmente, cabe à Justiça Eleitoral, tão somente, certificar se a agremiação transferiu para sua fundação o valor mínimo correspondente a 20% do Fundo Partidário, consoante preconiza o art. 44, IV, da Lei nº 9.096/1995. Não obstante seja esse o entendimento, ressalto que nada impede seja realizada uma fiscalização concomitante dessas fundações pelo MP estadual e pela Justiça Eleitoral. A competência do MP para fiscalizar as fundações dos partidos políticos decorre do art. 66 do Código Civil, segundo o qual velará pelas fundações o Ministério Público do estado em que situadas. Trata-se de competência expressa em lei, que, penso, não pode ser desconsiderada por este Tribunal, sob pena de realizarmos uma interpretação contra legem. Como é cediço, o Fundo Partidário tem seus recursos gerenciados pela Justiça Eleitoral, cabendo a esta a tarefa de fiscalizar a correta aplicação desses recursos nas entidades que deles se beneficiam. Ora, se os partidos repassam recursos do Fundo Partidário às fundações e, nesta Justiça especializada, são obrigados a demonstrar a regularidade apenas do repasse do valor mínimo (20%), é de se notar que tais recursos, embora sejam de um fundo público sob responsabilidade da Justiça Eleitoral, não passam pelo crivo de sua análise. Aqui, como bem observado no voto-vista do Ministro Luis Felipe Salomão, nada impede que o partido repasse toda a verba recebida do citado fundo público para a fundação, uma vez que não existe patamar máximo a ser observado, colocando esta Justiça especializada completamente à margem da fiscalização desses recursos. A meu sentir, a fiscalização exercida pelo Ministério Público estadual, embora possa sindicar os registros contábeis das fundações partidárias, visa, precipuamente, garantir a fiel observância dos objetivos institucionais estabelecidos nos estatutos desses entes agregados, ou seja, prima pela observância do caráter finalístico a que se destina a entidade, não constituindo óbice algum, sobretudo por se tratarem de recursos públicos, que haja uma sobreposição de órgãos na fiscalização desses registros contábeis. 310 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Ademais, não se pode desconsiderar a expertise desta Justiça especializada na realização desse trabalho. Afinal, a Justiça Eleitoral vem, ao longo dos anos, executando, com êxito, essa função fiscalizadora. Sendo aceita essa sugestão, recomendo sejam iniciadas tratativas com o MP estadual a fim de, uma vez formalizada a atuação conjunta, poder maximizar o trabalho a ser realizado. Nesse sentido, acompanho o relator quanto à impossibilidade de se aplicar a Res.- TSE nº 23.604/2019 a fase já exaurida do procedimento de prestação de contas – primeiro ponto desta questão de ordem. Quanto à definição sobre qual o órgão competente para analisar as contas da fundações dos partidos políticos, acompanho, na íntegra, a divergência instaurada pelo eminente Ministro Luis Felipe Salomão, para assentar a possibilidade de o MPE e a Justiça Eleitoral atuarem em conjunto nessa análise. Subscrevo, ainda, a tese proposta no voto-vista ajustado do Ministro Luis Filipe Salomão para aplicar esse entendimento somente a partir do exercício financeiro de 2021, deixando de aplicá-la ao caso concreto, por se tratarem de contas do exercício financeiro do partido referente ao ano de 2015. VOTO O SENHOR MINISTRO TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO: Eminente Presidente, diante da riqueza dos debates havidos até o presente momento e do avançado da hora, eu também vou procurar resumir bastante o voto que acompanha a posição encetada pelo eminente relator e seguida pelo Ministro Edson Fachin, trabalhando, portanto, na perspectiva de um empate, que remete ao voto de Vossa Excelência a decisão final. Essa matéria é conhecida de todos – o Professor Humberto Jacques ainda comparecia diariamente ao Tribunal nessa época. Tem exatamente um ano que nós nos dedicamos ao exame dessa matéria. O Ministro Edson Fachin proferiu, ainda em novembro de 2019, uma decisão monocrática na Prestação de Contas 261-34 assentando a competência exclusiva da Justiça Comum para resolver conflitos envolvendo as contas das fundações partidárias. Àquela altura, o eminente Professor Fachin – que nos honra também com um voto belíssimo produzido na noite de hoje – dizia que, do ponto de vista jurídico, não do ponto de vista político, nem de tradições administrativas de órgãos de fiscalização, mas dizia o Ministro Fachin que, do ponto de vista jurídico, a teor do art. 53 da Lei 9.096/95, as fundações têm, inequivocamente, personalidade jurídica própria de direito privado e autonomia administrativa e patrimonial e que, uma vez adquirida essa personalidade jurídica de direito privado, elas devem ser regidas pelas normas do Direito Civil e assim a fundação haverá de ser fiscalizada – dizia o Ministro Fachin – pelo Ministério Público do Estado em que situada, a teor do art. 66 do Código Civil. A esse entendimento monocrático do Ministro Fachin, eu aderi imediatamente, na mesma data, salvo engano, um ou dois dias depois, produzindo também uma decisão 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 311

monocrática ainda, salvo engano, no início, finalzinho de novembro do ano passado, na Prestação de Contas 265-71 e, no âmbito dessa decisão monocrática, eu aderi in totum a uma escorreita fundamentação levada a efeito pelo Ministro Sérgio Banhos, também no âmbito da Prestação de Contas 211-08, do dia 4 de dezembro de 2019. Para não cansar os eminentes pares, já que todos esses fundamentos já foram perfilhados àquela altura, nas magníficas decisões monocráticas, no voto do relator, Ministro Banhos, no voto-vista do Ministro Fachin, apenas lembrar que, nos termos do art. 17, inciso III, do texto constitucional, a referência é só a partidos políticos, somente a eles há o dever de prestação de contas à Justiça Eleitoral: essa é uma norma de competência constitucional. O que diz o Código Eleitoral a esse respeito? Absolutamente nada. Tampouco a Lei 9.096/95, que nem sequer poderia criar uma regra de competência para a Justiça Eleitoral. E todos nós sabemos que regras de competência dizem com limitações necessárias ao arbítrio, limitações necessárias ao poder, que incide sobre a liberdade. Do ponto de vista jurídico, portanto, estritamente jurídico, a fundação não se vincula e não se subordina às esferas partidárias podendo, inclusive, ter administradores não vinculados à legenda. Além disso, há um óbice poderoso de natureza processual, também jurídica, portanto, ao entendimento requestado, ao acolhimento do entendimento requestado pelo Ministério Público e acolhido por três doutos votos. É que não há previsão na nossa resolução, inclusive de integração dessas lides, dessas relações processuais, pelas fundações que, repita-se: têm personalidade jurídica própria e isso conduz, de alguma forma, também ao descumprimento do preceito constitucional que assegura o contraditório e a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes. Com essas breves considerações, que outra coisa não fizeram senão indicar passagens do voto do Ministro Banhos, do voto do Ministro Fachin, das decisões monocráticas até então havidas, eu acompanho o eminente relator, acompanho o Ministro Fachin, pedindo vênia aos eminentes Ministros Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão e Mauro Campbell Marques. É como voto, Presidente. VOTO O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Senhores Ministros, eu também concordo com a conclusão do relator no sentido de ser incabível a adoção do procedimento previsto pela Res.-TSE nº 23.604/2019 nas prestações de contas de exercício financeiro no qual o órgão técnico já tenha emitido parecer conclusivo. 2.   Ademais, na linha do voto do Min. Luis Felipe Salomão, entendo que deve ser fixada tese relativa à competência da Justiça Eleitoral para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário. No entanto, penso que essa tese deve ser aplicada somente ao exercício financeiro de 2021 em diante, a fim de possibilitar a regulamentação dos critérios de controle pela Justiça Eleitoral antes da prestação das contas, em 2022. 312 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

3.   O voto do Ministro Luis Felipe Salomão, trouxe, com profundidade e precisão, algumas das questões que têm me inquietado desde o julgamento da PC nº 246-65/ DF (rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, j. em 17.12.2019). Na ocasião desse julgamento, efetivamente concluí que, diante da literalidade do art. 66 do Código Civil, não haveria embasamento jurídico-normativo para que a Justiça Eleitoral assumisse o papel de fiscalização dos recursos gastos pelas fundações partidárias. 4.  No entanto, após mais detida reflexão, penso não haver incompatibilidade entre a previsão do Código Civil e a atuação desta Justiça Especializada. De fato, conforme bem expôs o Ministro Salomão, não há por que excluir a competência da Justiça Eleitoral para aferir o correto emprego da relevante parcela de recursos públicos que os partidos repassam a suas fundações. O Ministério Público Estadual permanece, sem dúvidas, com a incumbência de fiscalizar o atingimento das finalidades estatutárias das fundações, sem qualquer conflito de atribuições. 5.  Por outro lado, entendo que a segurança jurídica, o princípio do contraditório e mesmo o risco de prescrição recomendam que esse novo entendimento seja aplicado prospectivamente. Isso porque, conforme indicado no voto do Ministro Luis Felipe Salomão, não há até o momento regulamentação a respeito: (i) da integração das fundações e seus representantes aos autos da prestação de contas; (ii) de parâmetros específicos a partir dos quais seja possível verificar regularidade dos gastos da fundação; e (iii) das sanções aplicáveis e sua forma de execução. 6.  Nesse sentido, para que as fundações e agremiações tenham segurança para se ajustarem à futura regulamentação, entendo que a tese deve ser adotada a partir do Exercício Financeiro de 2021, cujas contas serão prestadas em 2022. 7.  Quanto à relevante ponderação do Ministro Edson Fachin referente aos institutos partidários, entendo prudente reservar novos debates quanto ao tratamento da matéria para outra ocasião. Em verdade, parece-me que o caminho é o aprimoramento da Res.-TSE nº 22.121/2005. Afinal, imposta a conversão dos institutos em fundações sem que se estipulasse consequência jurídica para o desatendimento desse comando, infelizmente alguns partidos se portaram como se estivesse à sua escolha cumprir ou não cumprir o determinado. O remédio, a meu ver, é a adoção de medidas indutivas e coercitivas, que levem os partidos a abandonar esse comportamento desidioso. Todavia, essas considerações que faço em nada prejudicam a resolução da questão de ordem quanto à competência para julgamento das contas das funções partidárias. 8.   Com essas considerações, acompanho a conclusão do relator, nos termos do voto proferido pelo Ministro Luis Felipe Salomão, para resolver a questão de ordem no seguinte sentido: (i) é incabível a adoção do procedimento previsto pela Res.-TSE nº 23.604/2019 nas prestações de contas de exercício financeiro no qual o órgão técnico já tenha emitido parecer conclusivo; e (ii) a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário. Essa tese, contudo, deve ser aplicada somente a partir do exercício financeiro de 2021, a fim de possibilitar a regulamentação dos critérios de controle pela Justiça Eleitoral antes da prestação das contas, em 2022. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 313

ESCLARECIMENTO O SENHOR MINISTRO TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO: Ministro Presidente, é muito rápido. Exatamente na linha do que Vossa Excelência já tinha dito na rodada anterior e o Ministro Banhos também. A minha preocupação é que nós teríamos que alterar – até por indicação do Ministro Salomão – a nossa resolução e a prestação de contas em curso não poderia ser colhida pela resolução feita no ano que vem. Então, a rigor – no rigor técnico –, seria incidência a partir de 2022, para que a resolução de 2021 pudesse ser aplicada, sem eficácia retrospectiva. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Bom, eu acho que teríamos, inclusive, tempo de aprovar a resolução para valer a partir de 2021. Para as contas a serem prestadas em 2022, mas no exercício de 2021, já vigeria essa orientação que agora se tornou majoritária. O SENHOR MINISTRO TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO: A minha dúvida é se a resolução vier, por exemplo – a resolução, Vossa Excelência bem sabe porque foi relator de todas as mais recentes, pressupõe um processo bem oneroso de audiências públicas etc. –, se a resolução é publicada depois de votada em Plenário, em abril, março ou abril, como é que ela vai se aplicar a janeiro, fevereiro, março? Ela só poderia ser aplicada dali para frente – entendo eu – e, aí, as contas não poderiam ser colhidas por um marco normativo, apenas na sua metade, ou nos seus dois terços. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Quer dizer, a minha ideia é que as contas de fundações, um pouco diferentes das partidárias, não são prestadas dessa forma. Quer dizer, eu acho que, se nós já tivermos alertado os partidos quanto a esse ponto, com a decisão de hoje, eu acho que eles já estarão preparados. Eu ia ouvi o Ministro Relator – relator não, Ministro que lidera a divergência –, mas pediu a palavra o Ministro Alexandre de Moraes. Com a palavra. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Presidente, essa questão é importantíssima, porque se a maioria, nós agora, reconhecermos que há um gap, há um déficit de fiscalização de 20% dos recursos, nós não podemos deixar isso para 2023. Então, a decisão – como Vossa Excelência bem colocou – já fixa, já é um alerta, já é um aviso às fundações, que elas serão fiscalizadas pela Justiça Eleitoral e nós podemos acelerar os procedimentos, exatamente para fazer valer essa decisão. A Justiça Eleitoral tem que se mostrar célere para esse gap que a maioria reconheceu, senão a decisão também fica totalmente sem sentido. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Obrigado, Ministro Alexandre. O Vice-Procurador-Geral Eleitoral, Doutor Humberto Jacques, pede a palavra também. 314 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

O DOUTOR HUMBERTO JACQUES DE MEDEIROS (vice-procurador-geral eleitoral em exercício): Eu quero ser muito breve. Apenas ressaltar a questão dos institutos. Agora, no final da proclamação do resultado, estamos dando muita atenção às fundações, mas eu queria que deixássemos claro também – para prevenir a necessidade de embargos – a posição que o Tribunal também adotou hoje com relação aos institutos. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Doutor Humberto, em rigor, embora o Ministro Edson Fachin tenha incluído na sua reflexão esse ponto, com o brilho e a densidade costumeiros, esse não é um objeto específico desse julgamento e não houve um debate. O Ministro Fachin tem uma posição antiga, que aqui reiterou, mas acho que esse – com todas as vênias, inclusive, ao Ministro Fachin – não era o ponto de discussão aqui. Seja como for, nós já entendíamos que eles estavam sujeitos à Justiça Eleitoral e assim continuarão. Não há, salvo o ponto trazido pelo Ministro Fachin, reiterando o ponto de vista respeitável que professa, nós e pelo menos a maioria não revisitou essa questão específica. Portanto, continua como sempre foi. Eu ouço o Ministro Luis Felipe Salomão sobre a proposta, que, penso, já tem a adesão do Ministro Alexandre de Moraes, de aplicarmos esse entendimento às contas de 2021, que serão prestadas em 2022. Vossa Excelência está de acordo com esse encaminhamento temporal? O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente, eu ouvi os debates com atenção e não vou ficar vencido. Porém, consultando aqui, eu vejo que, a partir da decisão que agora a maioria já se formou, como foi dito, as fundações que têm uma parcela menor dos recursos, evidentemente, vão se adequar a essa decisão. Não é uma resolução que vai mudar, que vai fazer a adequação, é essa decisão de agora. E até 30 de junho do ano que vem para a prestação dessas contas, 30 de junho de 2021. É bastante razoável. Por isso que eu volto a dizer, eu não fico vencido, mas eu insisto na ideia de ser a partir de 2020. Tem aí um largo semestre, um semestre inteiro, mais três meses, dois meses, para essa adequação. É um período longo aí para poder se adequar. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Ministro Luis Felipe Salomão, vamos cultivar aqui a empatia. Nós temos que declarar o ajuste anual do Imposto de Renda – todos nós. Se em novembro alguém dissesse que desde janeiro eu deveria estar reunindo documentação e me preparando de maneira diferente, eu consideraria que essa é uma surpresa indevida. Portanto, eu me colocando no lugar de quem tem que prestar contas e se organizou ao longo do ano, eu consideraria uma surpresa e acho que o Direito, sempre que possível, deve evitar a surpresa e permitir um certo grau de preparação prévia. Evidentemente, eu não quero diminuir o papel do Ministério Público das Fundações, mas talvez o nível de exigência a ser satisfeito nessa fiscalização seja um tanto diferente do nível de exigência que nós praticamos aqui no TSE, até por sermos uma Justiça Especializada. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 315

De modo que eu consideraria uma surpresa, talvez desnecessária, nós já, praticamente em 1º de novembro, dizermos que desde janeiro eles deveriam estar se preparando para prestar contas de forma diferente. Eu preciso dizer que, por convicção filosófica, tudo que envolva dinheiro público, eu acho que deve ter um rigor fiscalizatório – um rigor razoável, porque também nós não queremos intimidar os gestores com um excesso de rigor. Portanto, eu insistiria com os colegas que acho que, em quase 1º de novembro, hoje é dia 27 de outubro, nós mudarmos essa regra, eu acho que é bastante razoável nós alterarmos para o próximo ano. O próprio tipo de procedimentos, de cuidados, de burocracia que se exigiria para a prestação de contas aqui na Justiça Eleitoral seria diverso. Eu submeto à consideração de Vossa Excelência, que é a posição a qual nós estamos aderindo, essa reflexão. Eu entendi que o Ministro Alexandre teria aderido a essa posição e ouço o Ministro Mauro Campbell. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Pois não. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Só para contribuir. Com essa informação de que podem prestar contas até junho do ano que vem, eu acho plenamente possível nós já insistirmos para que, já no ano que vem, já tenha que prestar contas. Até porque a prestação de contas de dinheiro público corretamente eles já devem ter escriturado. Então, eu acho que seis meses, oito meses, como o eminente Ministro Luis Felipe Salomão disse, com esse prazo eu acho que é viável. Se fosse a partir de janeiro, logicamente, aí sim nós teríamos dois meses. Mas se é até junho, eu acho plenamente possível. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Ministro Alexandre, deixa eu lhe falar. A minha consideração não é o prazo para frente que eles têm para prestar contas, é o tipo de comportamento, de documentação, de atitude. A própria Asepa, nossa, aqui, diz que precisa de uma regulamentação para disciplinar como serão prestadas as contas pelas fundações. Portanto, não é a quantidade de meses para frente, é fazendo a analogia com o imposto de renda. Quer dizer, se você não teria que prestar essas contas e de repente você fica sabendo, você não guardou o recibo do médico, ou não pediu o recibo. O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES: Permita-me um aparte, Presidente? O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Presidente, me perdoe, mas... O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES: Ministro Alexandre, só um aparte. Permita-me... O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: ...dinheiro público, tem que guardar recibo. Diga, Ministro Mauro. Desculpa. 316 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES: Não. Desculpe, eu... Presidente, concede-me um aparte? O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Claro. Com muito prazer. O SENHOR MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES: Veja só. O fulcro da divergência que acompanhamos foi exatamente para fazer valer a especialidade na aferição dessa prestação de contas – Ministro Luis Felipe Salomão e Ministro Alexandre. Se a própria Asepa indica que precisará balizar isso melhor, desde agora, eu acho que, com todas as vênias, a posição mais consentânea é essa que coloca agora o Senhor Presidente, diante da mudança que nós estamos estabelecendo nessa quadra final do ano, do exercício. Ou seja, eu não tenho dúvida de que... eu não estou aqui a falar, Ministro Alexandre, de que não se deva ter aferida a prestação de contas, ou a aferição – melhor dizendo – do gasto, com o que foi gasto o dinheiro público, mas a forma como nós iremos fiscalizar esses gastos, as balizas que vão ser traçadas agora, pela prestação de contas tão bem feita, pela aferição dessas contas, que é tão bem feita pela Asepa. A minha preocupação é dessa ordem, ou seja, é essa a surpresa que nós podemos causar, e causar embaraços de que a composição posterior do Tribunal vai se ver em situações, a meu sentir, um tanto quanto constrangedoras, porque não é o fato de não guardar recibos, é saber de que forma e que tipos de recibo devem ou não ser guardados para essa aferição da prestação de contas. Mas é uma posição que externo. Agradeço a Vossa Excelência, Senhor Presidente e a Vossa Excelência, Ministro Alexandre. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Prazer. E Ministro Mauro: em 17 de dezembro de 2019, um ano atrás, nós dissemos que os partidos, que as fundações, não precisavam prestar contas à Justiça Eleitoral. E aí, em 27 de outubro de 2020 – portanto, nós dissemos, no dia 17 de dezembro, que em 2020 eles não precisariam prestar contas à Justiça Eleitoral – a gente diz que em 2020 eles têm que prestar contas à Justiça Eleitoral. Eu acho que é um fator surpresa. E eu preciso dizer, porque eu acho que é meu papel aqui, institucional, relativamente à questão das cotas raciais – que foi uma decisão que nós tomamos –, os partidos, todos eles, do partido mais à esquerda ao partido mais à direita, todos eles se queixaram – não estou entrando no mérito de se com ou sem razão – de terem sido surpreendidos com esta mudança em cima da hora. Apesar de que a maioria do TSE até tinha dado efeitos prospectivos para 2022. Eu acho que a nossa decisão era correta, mas, de fato, houve um fator surpresa, que acho que neste caso nós poderíamos evitar. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente, apenas um comentário, se Vossa Excelência me permitir. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Claro. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Breve, porque já sei que todos estão cansados a essa altura. É apenas para tentar contribuir. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 317

Claro, muito compreensível a posição de Vossa Excelência. Eu acho que a surpresa nunca é boa. E, naquele caso das cotas, a decisão já foi tomada, não convém voltar, mas ali era para a eleição que está em curso. Aqui, o passado... O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): É para o ano que está em curso. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Mas o passado, nós sabemos que, no final do ano, que nós recolhemos a documentação para poder preparar. É assim que funciona no exemplo do imposto de renda, não é? O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Não, não, não. Já estou juntando recibo desde janeiro. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: E às vezes o recibo não é o adequado, às vezes muda a regra e tal, mas é no final do ano que nos preparamos para apresentar as contas em junho. Então, assim, eu compreendo bem a posição de Vossa Excelência – muito ponderada. Mas se não fosse esses quase nove meses de possibilidade para recolher o que estava inadequado... Quando nós dissemos, lá em 2019, nós falamos para trás. Eu acho que agora nós estamos olhando para frente – 2020. Então, eu acho que é apenas a ponderação. Volto a dizer, vencido eu não fico. Mas... O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Não. Nós vamos construir. Na verdade, eu acho que nós vamos votar. E, aqui, acho que a consideração é a seguinte, até porque senão vai empatar, eu indago dos eminentes colegas – e assim me pareceria o correto. A maioria se pronunciou pela submissão das fundações ao controle da Justiça Eleitoral para fins de prestação de contas. Agora, nós estamos discutindo a partir de qual momento esta nova linha de entendimento deve ser aplicar. O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): E, portanto, até para evitar o empate, a minha ideia seria submeter ao Plenário a questão do marco temporal. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: E quem queria a prestação de contas, obviamente, vai votar para 2030. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Mas vai ficar, inclusive, 2 a 2. Ministro Edson Fachin. O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Embora o momento, do adiantado da hora, provoque frases mais sucintas, e às vezes um pouco lancinantes no debate, eu entendo que a fixação do marco temporal é relevante, independentemente da posição que tenhamos. Já está definida a posição majoritária e, quando principiei o meu voto, eu dizia que esse era o objetivo a ser alcançado. E prevaleceu esta compreensão da submissão das contas das fundações à Justiça Eleitoral. Agora, Vossa Excelência está, em meu modo de ver, coberto de toda razão ao proteger o princípio da confiança. Caso contrário, vamos dar razão a quem afirmou, e por muitos 318 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

é reiterado, que no Brasil até o passado é improvável. É preciso tomar cautela com esse olhar no retrovisor. De modo que Vossa Excelência vai colher as opiniões, mas eu queria – de certo modo, até mesmo já adiantando a minha percepção –, eu iria até, além do ponto de vista da construção, quanto à surpresa para o próprio TSE. Porque esta decisão precisará ser construída do ponto de vista administrativo, da fiscalização dos serviços do Tribunal Superior Eleitoral. E eu não imagino que, nesse interregno, o Ministério Público das Fundações vá cruzar os braços. Nem me passaria isso pela cabeça, que o Ministério Público não está fazendo nada. Portanto, eu até subscreveria a proposta do eminente Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho. Mas, quando menos, a preocupação de Vossa Excelência, com o devido respeito do sentido da imediatidade e da eficácia, aqui é preciso, evidentemente, proteger especialmente o jurisdicionado, mas também preparar o próprio Tribunal para esse exercício. Portanto, eu, na verdade, circundaria a proposta do Ministro Tarcisio, mas, se se formar um consenso, creio que ao menos a proposta de Vossa Excelência deva ser acolhida. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Bom, se não houver consenso, eu acho que, efetivamente, vamos ter que colher a opinião de todos. Até porque, no bloco da posição majoritária, o Ministro Luis Felipe Salomão e o Ministro Alexandre defendem já para este ano, o Ministro Mauro Campbell Marques e eu defendemos para o próximo ano. De modo que... O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): ...a alternativa mesmo é colher os votos. Pois não, Ministro Salomão. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Diante dessas ponderações e, por fim, diante do que se percebe, eu acho melhor a gente, então, caminhar para 2021. Faço a ponderação ao Ministro Alexandre, então, para a gente bater o martelo em 2021. E aí ficamos, eu acho que com a posição da Presidência. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Ministro Alexandre? O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Quem abriu a divergência concorda, eu também concordo. PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Proclamo, então, o resultado. O Tribunal resolveu a Questão de Ordem no seguinte sentido: Por unanimidade, rejeitou a adoção do procedimento previsto pela Res.-TSE nº 23.604/2019 nas prestações de contas do exercício financeiro de 2015, no qual o órgão técnico já tenha emitido parecer conclusivo, nos termos do voto do relator. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 319

E, por maioria, fixou tese, que valerá a partir do exercício financeiro de 2021, no sentido de que “a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações, vinculadas aos partidos políticos, envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário”, nos termos do voto do Ministro Luis Felipe Salomão. Vencidos, quanto a este ponto, os Ministros Sérgio Banhos, Edson Fachin e Tarcisio Vieira de Carvalho Neto. E agora a questão de quem irá lavrar o acórdão. Todos concordamos com o relator na primeira questão e prevaleceu a divergência em relação ao segundo ponto. O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Ministro Salomão. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): É, o mais prático seria: prevalece o voto do Ministro Sérgio Banhos, tal como proferido, e não é preciso mexer, e o Ministro Luis Felipe Salomão agrega o seu ponto de vista ficando como redator para acórdão então. Está certo? Todos de acordo? O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Certo. Correto. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Todos de acordo. O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: De acordo. EXTRATO DA ATA QO-PC nº 192-65.2016.6.00.0000/DF. Relator originário: Ministro Sérgio Banhos. Redator para o acórdão: Ministro Luis Felipe Salomão. Requerente: Ministério Público Eleitoral. Requerido: Partido Progressista (PP) – Nacional (Advogados: Herman Ted Barbosa – OAB: 10001/DF e outros). Decisão: O Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, rejeitou a adoção do procedimento previsto pela Res.-TSE nº 23.604/2019 nas prestações de contas do exercício financeiro de 2015 no qual o órgão técnico já tenha emitido parecer conclusivo, nos termos do voto do relator; e, por maioria, fixou a tese, que valerá a partir do exercício financeiro de 2021, no sentido de que “a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário”. Vencidos os Ministros Sérgio Banhos, Edson Fachin e Tarcisio Vieira de Carvalho Neto. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos. Vice-Procurador-Geral Eleitoral em exercício: Humberto Jacques de Medeiros. SESSÃO DE 27.10.2020.1∗ 1. Sem revisão das notas de julgamento dos Ministros Alexandre de Moraes e Luis Felipe Salomão, e do vice-procurador- geral eleitoral. 320 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

MINISTRO JOELSON DIAS (MINISTRO DO TSE) TSE - ACÓRDÃO - RECURSO ESPECIAL ELEITORAL - Nº 1679-80/2010 TEMA PROPAGANDA ELEITORAL EM GERAL REPRESENTAÇÃO. PROGRAMA DE RÁDIO. PRÉ-CANDIDATA. ENTREVISTA. ANÁLISE POLÍTICA. EXPOSIÇÃO DE PLATAFORMAS E PROJETOS POLÍTICOS. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. NÃO-CONFIGURAÇÃO. ART. 36-A, INCISO 1, DA LEI 9.504/97. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO.DESPROVIMENTO. 1. O inciso 1 do artigo 36-A da Lei n° 9.504197 estabelece que não será considerada propaganda eleitoral antecipada a participação de pré- candidata em entrevistas ou programas de rádio, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, desde que não haja pedido de votos, observado, pelas emissoras, o dever de conferir tratamento isonômico. 2. A entrevista concedida a órgão de imprensa, com manifesto teor jornalístico, em que realizada mera análise política sobre eleições que se aproximam, sem que haja pedido de votos, não caracteriza a realização de propaganda eleitoral antecipada. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 321

3. No regime democrático, plural e de diversidade em que vivemos, devem ser incentivadas, não tolhidas, iniciativas inerentes à atividade jornalística, amparada nos direitos fundamentais de liberdade de informação e comunicação, assegurados pelos artigos 51 , incisos IV, IX e 220, da vigente Constituição da República, que fomentem o debate e a troca de ideias, desde que limitada a eventual participação de pré- candidato ou filiado a partido à exposição de plataformas e projetos políticos, sem pedido de votos e, no rádio e na televisão, assegurado tratamento isonômico aos postulantes no pleito. 4. Recurso desprovido. RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO JOELSON DIAS: Senhor Presidente, o Ministério Público Eleitoral ajuizou representação contra Dilma Vana Rousseff, com fundamento no artigo 36 da Lei n° 9.504197, pela suposta realização de propaganda eleitoral antecipada durante entrevista concedida em 7 de abril de 2010, no programa Rádio Vivo, da Rádio Itatiaia, de Belo Horizonte-MG. Às fls. 47-57, após afastar as preliminares de ilegitimidade passiva e de impossibilidade jurídica do pedido suscitadas pela recorrida, no mérito, após afirmar que o cunho inequivocamente político da entrevista não significava tivesse ela necessariamente também a conotação de propaganda eleitoral, concluí pela não configuração de propaganda antecipada e julguei improcedente o pedido formulado na inicial. Contra a referida decisão, o Ministério Público Eleitoral recorreu (fls. 61-68), argumentando: a) o artigo 36-A da Lei n° 9.504197 não deveria incidir no caso em exame; b) não teria sido conferido tratamento isonômico aos demais candidatos à eleição presidencial; c) por todo o \"contexto da entrevista\", seria inequívoca a existência de pedido de votos pela recorrida, diante das alegadas referências explícitas à candidatura para o pleito presidencial de 2010, exposição das ações políticas prioritárias que pretende desenvolver e comparação entre governos; d) a entrevista em si seria um \"recado direto ao eleitor\", no sentido de que a recorrida seria a pessoa ideal para ocupar o cargo eletivo ao qual concorre, o que também corresponderia a pedido de voto; e) a permissão de exposição de plataformas e projetos políticos em entrevistas concedidas à rádio, televisão e Internet, prevista no artigo 36- A, inciso 1, da Lei n° 9.504197, não deveria ser interpretada no sentido de abranger, também, comparações entre governos e candidatos; 322 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

f) no caso, teria havido nítido propósito de depreciar o candidato adversário; g) \"as comparações entre os governos atual e anterior, denegrindo o governo de Fernando Henrique Cardoso, do qual fez parte José Serra, ao mesmo tempo em que é feita a apologia do governo do atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, concluindo pela melhora do país com este governo, longe de constituírem \"matéria de cunho informativo, inerente à atividade jornalística\", são verdadeira propaganda eleitoral negativa\". (fl. 66) Contrarrazões da recorrida às fls. 71-73, nas quais requer a manutenção integral da decisão recorrida e o desprovimento do recurso, afirmando: a) audição, na íntegra, da entrevista revelaria que o que se buscou foi informar e expor a plataforma de governo e projetos políticos da recorrida; b) não seria razoável atribuir à recorrida o rumo, muito menos o conteúdo das perguntas \"contundente e objetivamente formuladas\" (fl. 72); c) não haveria apelo a votos para o pleito futuro pois, na maior parte dos trechos destacados pelo recorrente, a recorrida teria apenas respondido, \"mediante expressa provocação nesse sentido\" (fl. 73), sobre programas e dados do Governo do qual participou como Ministra; d) não haveria como responsabilizar a recorrida por eventual tratamento desigual conferido pela emissora de rádio aos demais candidatos à Presidência da República. Era o relato necessário. VOTO O SENHOR MINISTRO JOELSON DIAS (relator): Senhor Presidente, o recurso é próprio e tempestivo, razão pelo qual dele conheço. Por não existirem questões preliminares a serem enfrentadas, passo a análise das razões recursais. O recurso não comporta provimento. Inicialmente, rememoro que, ainda na decisão recorrida (fl. 52), consignei o fato de que o então representante, ora recorrente, nada dissera sobre a inovação ocorrida na Lei das Eleições, a partir da edição da Lei n° 12.03412009, que, dentre outros dispositivos, inseriu naquele diploma legal o artigo 36-A e seu inciso 1. A referida regra assegura aos filiados a partidos políticos ou pré-candidatos a participação \"em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, desde que não haja pedido de votos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico.\" 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 323

Como, na espécie, o que se tem é justamente a participação de filiada a partido político e pré-candidata em entrevista realizada por emissora de rádio, afirmei, assim, também naquela ocasião (fl. 52), que, excepcionada pela própria lei a situação, somente se comprovado o descumprimento do mencionado preceito legal é que resultaria, então, configurada a propaganda eleitoral antecipada. Somente agora, em suas razões recursais, é que o Ministério Público Eleitoral então argumenta que, além de não ter sido conferido tratamento isonômico aos demais candidatos à eleição presidencial, também seria inequívoca, \"por todo o contexto\" da entrevista, a existência de pedido de voto por parte da recorrida. Sustenta o recorrente, assim, que, no caso específico dos autos, tais circunstâncias afastariam a incidência do inciso 1 do artigo 36-A da Lei n° 9.504197. Com a devida vênia, tenho que os argumentos do Ministério Público Eleitoral em seu recurso não se revelam suficientes para infirmar a fundamentação da decisão recorrida. Ainda na decisão recorrida (fl. 56), asseverei não ter a inicial cogitado, nem de qualquer outra forma sido evidenciado nos autos, como um dos elementos integrantes do contexto necessário ao exame da aventada conduta ilícita, que a emissora de rádio não tivesse dispensado aos demais pré-candidatos o mesmo tratamento conferido à recorrida. No particular, afirmei (fi. 53): O cunho inequivocamente político da entrevista não significa tenha ela necessariamente também a conotação de propaganda eleitoral, esta sim vedada em lei, se realizada fora de época, nem, tampouco, que, dela, por si só, resulte eventual tratamento diferenciado aos demais postulantes no pleito. Afinal, é mesmo muito comum, no período que antecede a realização de eleições, a participação de pré-candidatos e outros filiados a partidos políticos em entrevistas e programas do gênero, discutindo a conjuntura política, suas idéias e, hoje, como inclusive autoriza a lei, mesmo suas plataformas e projetos políticos, sem que isto possa ser necessariamente configurado como propaganda eleitoral antecipada. No regime democrático, plural e de diversidade em que vivemos, bem assim de liberdade de expressão, de imprensa e de comunicação, iniciativas como essa, que fomentam o debate e a troca de ideias, desde que assegurado o tratamento isonômico a todos os postulantes ao pleito, devem ser incentivadas, não tolhidas. Afinal, inerente ainda a esse mesmo regime democrático é também o direito que tem o próprio cidadão de ser informado. Ainda quanto à necessidade de se dispensar tratamento isonômico aos filiados a partidos políticos e pré-candidatos entrevistados, rememoro que é mais especificamente às emissoras de rádio e televisão que a legislação de regência impõe tal obrigação. 324 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

E, no caso específico dos autos, muito embora em sua inicial até tivesse mesmo cogitado que \"os trechos transcritos demonstram, primeiramente, a evidente conotação eleitoral da entrevista à Rádio ltatiaia; em razão das perguntas formuladas pelos locutores\" (fl. 9), o recorrente voltou sua representação apenas contra a recorrida. O recorrente sustenta ainda que a exceção prevista no artigo 36-A, inciso 1, da Lei n° 9.504197, não deveria ser interpretada no sentido de abranger, também, comparações entre governos e candidatos. Com a devida vênia, tal como decidi antes (fl. 54), continuo a entender como desnecessário para a deliberação do caso específico dos autos aferir se o inciso 1 do art. 36-A da Lei n° 9.504197, além da \"exposição de plataformas e projetos políticos\", também comporta como exceção à configuração da propaganda eleitoral antecipada a comparação entre governos ou candidatos. Sobre o tema, afirmei na decisão recorrida (f1.54): Se o inciso 1 do art. 36-A da Lei n° 9.504197 comporta, além da \"exposição de plataformas e projetos políticos\", também a comparação entre governos ou candidatos, é tema que ainda não foi decidido por esta Corte. Mesmo sem me comprometer com o tema, pois, sobre ele, tenho como desnecessário decidir no caso específico dos autos, conforme explicarei a seguir, não posso deixar de observar o amplo alcance que o vocábulo \"inclusive\" parece emprestar à norma, garantindo a participação de filiados a partidos políticos ou pré-candidatos \"em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos.\" Na presente espécie, porém - e, por isto, é dispensável dizer se a exceção contida na norma legal comporta também a comparação entre governos ou candidatos - uma ou outra referência feita mesmo expressamente ao então pré-candidato José Serra, segundo noticia a inicial da representação, não revela a aventada propaganda eleitoral negativa. Como é sabido, a assim denominada propaganda eleitoral negativa pressupõe adversário político devidamente identificado como alvo das críticas, em desabono da sua conduta, bem assim um beneficiário do qual se exaltam os méritos, o nome, a imagem, os feitos ou a trajetória pessoal.' No caso específico dos autos, no entanto, tenho que a representada não chegou necessariamente a comparar as suas realizações com as de seu adversário político específico, o então também pré-candidato José Serra, nem a formular propriamente crítica em desabono à sua conduta. Para tanto, é importante observar o contexto em que foi respondida a pergunta que poderia levar à conclusão pretendida pelo representante, ou seja, examinar os comentários tecidos pelos jornalistas anteriormente à indagação. E, muito embora não tenha sido transcrito na inicial, a degravação da entrevista, que, com a respectiva mídia, também foi carreada aos autos pelo representante, revela o seguinte trecho (fl. 18): 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 325

Mônica Miranda - Então Ministra a gente vai dar uma parada agora pro noticiário mas, na volta, eu queria fazer uma pergunta pra senhora sobre esse assunto, a senhora sempre está falando do FHC, do governo FHC, e a pergunta que eu vou deixar no ar é: porque falar mais do Fernando Henrique Cardoso do que do seu adversário que vai ser o José Serra? Ou seja, segundo confirmado também pelo trecho transcrito na própria inicial da representação (fls. 3-8), os jornalistas formularam indagação genérica sobre o assunto (\"seus discursos, suas respostas a algumas críticas\"), não tendo se referido a qualquer trecho determinado da mencionada entrevista. Aliás, querendo saber justamente se a comparação não deveria ser feita pela representada com o seu adversário específico. Ademais, a confirmar o que foi dito acima está o inteiro teor da degravação da entrevista, cuja detida análise revela que, se \"alvo das críticas\" houve, não foi exatamente o adversário político da representada e então também pré- candidato José Serra, mas, na verdade, entre \"o governo Lula\" e os \"governos anteriores\" ou, ainda que se quisesse individualizar, e o \"governo FHC\". Para a configuração da pretendida propaganda eleitoral negativa, tenho que também não basta a só afirmação da representada de que \"José Serra não foi um bom ministro\", mormente porque não se pode isolá-la de todo o contexto da entrevista. E, analisado esse contexto, se verá que a representada, muito embora tenha criticado \"os governos anteriores\", limitou-se a dizer sobre o seu adversário político, mais especificamente, que \"vai ter que ser analisado\". Isto é, não chegou a realizar nenhuma comparação específica propriamente dita em relação a ele. Ou seja, o caso específico dos autos não configuraria propaganda eleitoral negativa, à falta, portanto, da comparação entre as realizações de adversários específicos, neste caso Duma Rousseff e José Serra (e não entre o \"governo Lula\" e os \"governos anteriores\" ou, ainda que se quisesse individualizar, e o \"governo FHC\"). À falta, ainda, além da comparação entre as realizações de adversários específicos, também do outro elemento que exige a jurisprudência da Corte em tais casos, isto é, da conduta que objetiva \"ressaltar as qualidades çto responsável pela propaganda e denegrir a imagem do opositor\". Na decisão recorrida, busquei evidenciar, assim, que, a meu sentir, a recorrida não se aproveitara da entrevista para comparar as suas realizações com as de seu adversário político específico, o que, consequentemente, afasta o \"nítido propósito de depreciar o candidato adversário\", aventado pelo Ministério Público Eleitoral em suas razões recursais. Ainda no tocante à análise do contexto da entrevista, observei, ademais, à fl. 52, que a mídia e sua respectiva degravação que acompanharam a inicial da representação não evidenciavam a existência de pedido expresso de votos, tendo a representada se limitado à exposição da sua plataforma e projetos políticos. 326 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Com efeito, o que se tem na referida entrevista é a análise política feita pela recorrida, segundo o que lhe foi perguntado, em relação às eleições que se aproximam, especialmente o seu desempenho em Minas Gerais, os seus projetos políticos para o referido Estado e a sua opinião sobre alguns dos temas principais que permeiam a disputa do certame, como educação, saúde e previdência social. E, conforme salientado antes, o inciso 1 do artigo 36-A da Lei n° 9.504197 autoriza \"a exposição das ações políticas prioritárias\" ou, em outras palavras, \"de plataformas e projetos políticos\" durante entrevista concedida por filiados a partidos políticos ou pré-candidatos, como ocorreu na espécie, sem que tal conduta configure a realização de propaganda antecipada. Em tais casos, o ilícito caracteriza-se tão somente se houver \"pedido de voto\". E isso o recorrente não logrou demonstrar ter ocorrido no caso específico dos autos. Também lembrei na decisão recorrida que, mesmo antes da edição da Lei n° 12.03412009 e, consequentemente, da inserção do inciso 1 do artigo 36-A na Lei n° 9.504197, a jurisprudência deste Tribunal, a depender do caso, já afastava a configuração de propaganda eleitoral antecipada em decorrência de entrevistas concedidas a órgãos de imprensa. A esse respeito, consignei (fis. 56-57): Afinal, \"o direito de informar é garantia constitucional que tem como objetivo aperfeiçoar a transparência dos fenômenos políticos e dar elementos formadores do regime democrático. Se, já naquela época, era \"impossível restringir atividade inerente à imprensa sem apoio legal\", a situação agora prevista no inciso 1 do artigo 36-A da Lei n° 9.504197 somente reforça este impedimento. Afinal, pela sua própria natureza, entrevista é matéria de cunho informativo, inerente à atividade jornalística, amparada no direito fundamental de liberdade de informação e comunicação, assegurados pelos artigos 50, incisos IV, IX e 220, da vigente Constituição da República. E, de modo ainda mais especial no caso específico dos autos, em que, além da jurisprudência desta Corte, também a própria lei, expressamente, passou a excepcionar em tais casos a exposição de plataformas e projetos políticos como configuradora de propaganda eleitoral antecipada. Além de exigir seja dispensado tratamento isonômico aos eventuais pré- candidatos, ou seja, observando os limites impostos à propaganda eleitoral que visam a assegurar justamente a igualdade de oportunidades na disputa norteadora do processo eleitoral. O direito de informar fatos políticos é via de aperfeiçoar a democracia. Por fim, rememoro, o tema das entrevistas concedidas a órgãos de imprensa por filiados a partidos políticos em relação a este mesmo pleito de 2010, e à luz do novel inciso 1 do artigo 36-A na Lei n° 9.504197, já foi examinado por esta Corte, na sessão 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 327

realizada no último dia 5 de agosto, ao deliberar sobre os recursos interpostos nas Representações nos 1346-31, relator o i. Min. Henrique Neves, e 1655-52, relatora a i. Min. Nancy Andrighi. Ante o exposto, não tendo vislumbrado nas razões recursais qualquer argumento capaz de infirmar a fundamentação da decisão recorrida, meu voto, com a devida vênia, é pela sua integral manutenção, negando, consequentemente, provimento ao recurso interposto. É como voto. 328 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

MINISTRO SÉRGIO SILVEIRA BANHOS (MINISTRO DO TSE) TSE/PB - Nº 0600093-07.2020.6.15.0059 TEMA PROPAGANDA ELEITORAL EM GERAL ACÓRDÃO   RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NEGATIVA. PEDIDO DE NÃO VOTO. AUSÊNCIA. NÃO- CONFIGURAÇÃO. SÍNTESE DO CASO 1. Trata-se de recurso especial eleitoral interposto em face de acórdão que rejeitou a preliminar de inépcia da petição inicial e, no mérito, proveu parcialmente o recurso eleitoral para reformar a sentença e determinar a remoção do conteúdo impugnado constante dos endereços eletrônicos indicados na inicial, assim como aplicar multa aos ora recorrentes no valor de R$ 5.000,00, individualmente, por veiculação de propaganda eleitoral negativa extemporânea, nos termos dos arts. 36, § 3º, da Lei 9.504/97 e 38, §§ 1º e 4º, c.c. o 93 da Res.-TSE 23.610, em razão de postagem, nas redes sociais Facebook e Instagram, da imagem de um rato sobreposta à fotografia de agente político. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 329

ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL 2. Na linha da atual jurisprudência desta Corte, para se verificar a configuração da prática de propaganda eleitoral antecipada, faz-se necessário, em um primeiro momento, analisar se a mensagem veiculada possui ou não conteúdo eleitoral. Precedente: AI 0600805-86, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 10.5.2021. 3. No caso dos autos, a partir do teor da propaganda, descrita no acórdão regional, conclui-se que a mensagem veiculada possui conteúdo eleitoral, haja vista que a imagem em questão faz clara referência a pré-candidato ao cargo de vereador no pleito de 2020. 4. A jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que, em regra, para que se alcance a conclusão de que ficou configurada a propaganda eleitoral extemporânea, seja ela positiva ou negativa, é exigível a presença de pedido explícito de votos ou, mutatis mutandis, de pedido explícito de não votos.  Precedente: AgR-REspe 0600004-50, de minha relatoria, PSESS em 23.11.2020. 5. Na espécie, entendo, a partir do contexto fático-probatório descrito no acórdão regional, que a propaganda em comento, consistente na imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, divulgada nas redes sociais Facebook e Instagram, não contém pedido explícito de votos ou de não votos, tratando-se de mera crítica política que, embora ácida, é assegurada nos termos do inciso IV do art. 5º da Constituição Federal e do inciso V do art. 36-A da Lei 9.504/97, que permite expressamente a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas. 6. O caso em exame difere daquele objeto do recente julgamento do AgR-REspe 0600072-23, de 4.5.2021, de relatoria originária do Ministro Luís Roberto Barroso, em que esta Corte, por maioria, deu provimento a agravo interno para julgar procedente a representação e aplicar multa ao agravado pela realização de propaganda eleitoral antecipada negativa, no valor de R$ 5.000,00, nos termos do voto divergente do Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto.  7. Na ocasião, na qual se discutiu mensagem veiculada por meio de vídeo na rede social Instagram, com críticas dirigidas ao Governador do Estado do Maranhão, candidato à reeleição no pleito de 2018, esta Corte consignou a admissibilidade de críticas ácidas e contundentes dirigidas aos cidadãos que ingressam, ou buscam ingressar, na vida pública. Assentou também que a intervenção da Justiça Eleitoral no processo eleitoral, deve se dar apenas no caso de ser necessário o restabelecimento da igualdade e normalidade na disputa eleitoral ou para corrigir condutas que ofendam a legislação eleitoral, a exemplo do “discurso de ódio”, que entendeu presente no caso, em que se atribuiu o adjetivo “nazista” ao candidato.  8. A partir do contexto fático-probatório descrito no acórdão regional, verifica-se que a propaganda em análise, consistente na imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, divulgada nas redes sociais Facebook e Instagram, não contém pedido explícito de votos ou de não votos, bem como não é suficiente para configurar o indigitado “discurso de ódio”, nos termos do que fora decidido por esta Corte no caso supracitado, pois não vai além de mera crítica política, agasalhada pelo 330 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

direito à livre manifestação de pensamento, não configurando, assim, a prática de propaganda eleitoral antecipada negativa.  9. Embora alguns precedentes do TSE tenham reconhecido que mensagens anteriores ao período permitido, ofensivas à honra de candidato, constituem propaganda eleitoral negativa antecipada, nem toda crítica ou ofensa à honra é suficiente para caracterização de tal ilícito, sob pena de violação à liberdade de expressão. 10. Na espécie, as críticas veiculadas por meio da imagem divulgada devem ser admitidas no processo democrático, pois estimulam o debate, entre os eleitores, sobre eventuais características negativas dos integrantes da disputa eleitoral e de seus planos de governo. 11. A crítica em questão, ainda que ácida,  extrapola a esfera eleitoral, devendo o candidato, caso assim entenda, buscar eventual reparação de danos morais na esfera cível da Justiça Comum, também competente para, na esfera criminal, analisar eventual prática de crimes contra a honra.  CONCLUSÃO Recurso especial provido.  Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, em dar provimento ao recurso especial eleitoral interposto por Weberte Viana e Adeilton Souza, para reformar o acórdão regional e julgar improcedente a representação, nos termos do voto do relator.    Brasília, 19 de agosto de 2021.   MINISTRO SÉRGIO BANHOS – RELATOR   RELATÓRIO   O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS: Senhor Presidente, Weberte Viana e Adeilton Souza interpuseram recurso especial eleitoral, com pedido de concessão de efeito suspensivo, (ID 47351688), em face de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (ID 47351288). Na espécie, o Tribunal de origem, por unanimidade, rejeitou a preliminar de inépcia da petição inicial e, no mérito, proveu parcialmente o recurso eleitoral manejado pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) – Municipal – para reformar a sentença proferida pelo Juízo da 59ª Zona Eleitoral daquele Estado, a fim de determinar a remoção do conteúdo impugnado constante dos endereços eletrônicos indicados na inicial, assim como aplicar multa aos ora recorrentes no valor de R$ 5.000,00, individualmente, por veiculação de propaganda eleitoral negativa extemporânea, nos termos dos arts. 36, § 3º, da Lei 9.504/97 e 38, §§ 1º e 4º, c.c. o 93 da Res.-TSE 23.610. Eis a ementa do aresto regional (ID 47351438): 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 331

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA EXTEMPORÂNEA. REDE SOCIAL. FACEBOOK. POSTAGENS. IMAGEM DE RATO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 36, § 3º, DA LEI 9.504/97. PRELIMINAR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. REJEIÇÃO. MÉRITO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA NEGATIVA NA INTERNET. OFENSA À IMAGEM CARACTERIZADA. ABUSO DO DIREITO CONSTITUCIONAL DE LIVRE MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO. DETERMINAÇÃO DE RETIRADA. Preliminar de inépcia da petição do recurso. Razões recursais que dialogam com a sentença. Alegações pertinentes que impugnam o teor da decisão combatida. Preliminar rejeitada. Mérito. Consoante orientação jurisprudencial deste Tribunal Superior, a propaganda eleitoral extemporânea configura-se quando evidenciado o esforço antecipado de influenciar eleitores, o que ocorre utilização, em postagem na rede social Facebook e Instagram da imagem de um rato sobreposta à fotografia de um agente político, evidenciando a manipulação e o propósito de ofender e denegrir a pessoa perante o eleitorado e, ainda, de influenciar negativamente na disputa eleitoral. Essa conduta extrapola o direito à livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica, o que configura propaganda eleitoral antecipada negativa, nos termos do art. 36 da Lei nº 9.504/97. Recurso provido parcialmente. Precedentes do TSE. Os recorrentes alegam, em síntese, que: a) o acórdão de origem afrontou o art. 5º, IV, da Constituição Federal, ao entender configurada na espécie propaganda eleitoral extemporânea negativa; b) a presente representação visa politizar críticas ao mandatário do partido político recorrido, vereador Raimundo Lopes de Farias, na tentativa de blindá-lo de eventuais comentários expressados em razão de sua atuação parlamentar, o que configura ofensa à garantia constitucional da livre manifestação do pensamento; c) é firme o entendimento do TSE quanto à proteção da liberdade de manifestação do pensamento. Neste sentido, cita precedentes desta Corte Superior; d) o ora recorrido não juntou aos autos provas de ser inverídico o conteúdo da publicação e de que, portanto, tratava-se de fake news, o que afasta o argumento de ataque à honra do recorrido; e) trata-se o caso de “crítica a um agente público que ausentou-se de seu dever, enquanto vereador. Se presente, e votante, até poderia se questionar a posição do parlamentar, no entanto, não se pode questionar uma ausência. É FATO. E como fato que o é, repercute perante os munícipes, podendo, por óbvio, ser alvo de críticas pela sua atuação, ou pela ausência da atuação no caso específico” (ID 47351688, p. 12); 332 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

f) não há nos autos prova de que a mencionada publicação teria sido “montada por um profissional de mídia” (ID 47351688, p. 12), bem como que esta foi custeada pelo município de Queimadas/PB. Pugnam pela concessão de medida liminar, a fim de suspender a determinação, constante do acórdão de origem, de retirada das publicações de suas redes sociais, objeto da presente representação. Alternativamente, em caso de manutenção da decisão de retirada das publicações, requerem a reforma do aresto recorrido a fim de afastar a multa aplicada de forma desproporcional. O recorrido, apesar de intimado por meio do mural do PJE em 28.9.2020, conforme consulta pública do PJE do TRE/PB, não apresentou contrarrazões. A Procuradoria-Geral Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso especial (ID 132629838). É o relatório.   VOTO   O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Senhor Presidente, o recurso especial é tempestivo. O acórdão recorrido foi publicado no Diário de Justiça Eletrônico de 25.9.2020, conforme consulta ao sítio eletrônico do TRE/PB (Consulta Pública do PJE), e o apelo foi interposto no dia 27.9.2020 (ID 47351688), em petição assinada eletronicamente por advogada habilitada nos autos (procurações de IDs 47349588 e 47349788). Conforme relatado, o Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba proveu parcialmente o recurso eleitoral manejado pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) – Municipal, para determinar a remoção do conteúdo impugnado constante dos endereços eletrônicos indicados na inicial, assim como aplicar multa aos ora recorrentes, Weberte Viana e Adeilton Souza, no valor de R$ 5.000,00, individualmente, por veiculação de propaganda eleitoral negativa extemporânea, nos termos dos arts. 36, § 3º, da Lei 9.504/97 e 38, §§ 1º e 4º, c.c. o 93 da Res.-TSE nº 23.610, consistente em postagem, nas redes sociais Facebook e Instagram, da imagem de um rato sobreposta à fotografia do vereador Raimundo Lopes de Farias. Os recorrentes apontam violação ao art. 5º, IV, da Constituição Federal, sob o argumento de que, na espécie, houve uma mera crítica a agente público, no exercício da livre manifestação do pensamento, o que não configura propaganda eleitoral extemporânea negativa. Eis os fundamentos do acórdão regional (ID 47351288): Cuida-se de recurso interposto pelo MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB), diretório municipal de Queimadas/PB, contra decisão do Juízo da 59ª Zona Eleitoral - Queimadas/PB que julgou improcedente representação por suposta veiculação de propaganda eleitoral negativa extemporânea proposta em desfavor de WEBERTE VIANA e ADEILTON SOUZA, consistentes em notícias falsas e injuriosa na internet contra o vereador Raimundo Lopes de Farias, com uma imagem sobreposta de um rato. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 333

Colhe-se da decisão recorrida os seguintes fundamentos: “ Analisando o caso concreto, vejo que a simples sobreposição de imagem, onde consta um rato, do tamanho e da forma como realizado, sem qualquer expressão caluniosa ou vexatória, não teria o condão ofensivo o suficiente para autorizar a retirada destas postagens, tal como solicitado. Parece fora de dúvida que a parte ofendida, independente do sucesso e/ou insucesso da representação eleitoral, pode se valer, caso queira, além da ação penal, do juízo cível para buscar eventual reparação por dano que alega ter sofrido (art. 23 da Resolução 23.610/19).” Conforme jurisprudência firmada no Tribunal Superior Eleitoral, no ambiente político deve prevalecer a liberdade de expressão a fim de assegurar a máxima amplitude do debate, devendo o Poder Judiciário intervir de forma mínima. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO N° 758-25. 2015.6.26.0000 - CLASSE 37 - SÃO PAULO - SÃO PAULO - Relator originário: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Redator para o acórdão: Ministro Luiz Fux. Brasília, 30 de maio de 2017. A Resolução TSE n. 23.610/2019, em seu art. 38, expressamente trouxe essa previsão, in verbis: “ Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei n° 9.504/1 997, ad. 57-J). Essa liberdade de expressão é reforçada no parágrafo primeiro desse mesmo artigo, que reza: “Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.” Com efeito, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral firmou-se no sentido de que o pluralismo político, a livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica não encerram direitos ou garantias de caráter absoluto, atraindo a sanção da lei eleitoral no caso de ofensa a outros direitos, tal como o da personalidade. Nesse sentido: “[...] 2. Consoante orientação jurisprudencial deste Tribunal Superior, a propaganda eleitoral extemporânea configura-se quando evidenciado o esforço antecipado de influenciar eleitores, o que ocorre com a divulgação de argumentos que busquem denegrir a imagem de candidato adversário político ou de sua legenda. A proibição de divulgação de críticas em propaganda, cujo único objetivo é denegrir a imagem de adversários políticos, não viola o 334 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

direito à informação, à liberdade de imprensa, tampouco o direito à livre manifestação de pensamento por não serem direitos de caráter absoluto”. Agravo regimental desprovido. (AgR-Al 7-44/RJ, ReI. Mm. Luciana Lóssio, DJe de 10.12.2013). E, ainda: “A propaganda eleitoral negativa que ultrapassa os limites da discussão de interesse político pode sofrer limitações por parte da Justiça Eleitoral, porquanto “as restrições impostas à propaganda eleitoral não afetam os direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de informação e comunicação (art. 220 Constituição Federal), os quais devem ser interpretados em harmonia com os princípios da soberania popular e da garantia do sufrágio.” (AgR-REspe n° 35719/MG, Mm. Aldir passarinho, DJe de 26.4.2011) (Grifei). Na espécie, embora não conste da legenda veiculada em rede social Facebook ofensas ao vereador Raimundo Lopes de Farias, o mesmo não se pode dizer da imagem do rato sobreposta na foto, pois o leitor, ao visualizada, já estabelece psicamente a premissa de que o referido mandatário é corrupto. Ora, levando em consideração o significado do animal em nossa cultura, o “rato” é considerado nocivo ao homem, desprezível, imundo, associado ao roubo. É público e notório que o rato é o símbolo da corrupção em nosso país! Se alguma dúvida ainda existir, consulte o Dicionário e encontrará: Rato: [Figurado] Pessoa que rouba outra; ladrão, gatuno (https://www.dicio. com.br/rato/); 10. Que ou quem trata ardilosamente de qualquer coisa ou que procede com fraude e velhacaria. = ESPERTALHÃO, TRATANTE, VELHACO, “rato”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam. org/rato [consultado em 20-07-2020]. 2 pej Indivíduo que pratica furtos. 3 pej Pessoa de má índole. (https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues- brasileiro/rato) Em pesquisa realizada na internet, constatei que a revista Veja, um dos maiores veículos de comunicação em nosso país, nas edições dos dias 25/05/2005, 05/08/2007 e 08/06/2011, publicou matérias acerca da corrupção no Brasil, cujos títulos foram os seguintes:  “CORRUPTOS”, “POR QUE ELES NÃO FICAM PRESOS” e “A ANATOMIA DA CORRUPÇÃO”. Nas capas das referidas revistas, as imagens ilustrativas não era outra, senão, a de um rato. Finalmente, como bem argumentou o recorrente “ Até em quadro do programa FANTÁSTICO da Rede Globo de Televisão denominado de “CADÊ O DINHEIRO QUE ESTAVA AQUI?” a figura do rato é usada para denotar as más práticas com o dinheiro público.” 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 335

Assim, ao utilizarem a imagem de um rato sobreposta á imagem do vereador Raimundo Lopes de Farias, houve nítida manipulação da imagem do político, com o único e inegável propósito de ofender e denegrir a sua pessoa perante o eleitorado e, ainda, de influenciar negativamente na disputa eleitoral, sobretudo considerando o ambiente em que praticada, no caso, na rede mundial de computadores. No meu entender, referida propaganda ultrapassou os limites da razoabilidade, da liberdade de informação e da mera crítica política. Conforme entendimento do TSE, essa conduta atrai a multa prevista no art. 36, §3º da Lei n. 9.504/97, vejamos: [...] Esse tipo de propaganda é inclusive tipificado como crime, conforme art. 23 c/c o art. 89 da Res. 23. 610/2019, confira-se: “Art. 23. O ofendido por calúnia, difamação ou injúria, sem prejuízo e independentemente da ação penal competente, poderá demandar, no juízo cível, a reparação do dano moral, respondendo por este o ofensor e, solidariamente, o partido político deste, quando responsável por ação ou omissão, e quem quer que, favorecido pelo crime, haja de qualquer modo contribuído para ele (Código Eleitoral, art. 243, § 1º).” “Art. 89. Constitui crime, punível com detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), a contratação direta ou indireta de grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir mensagens ou comentários na internet para ofender a honra ou denegrir a imagem de candidato, de partido político ou de coligação (Lei nº 9.504/1997, art. 57-H, § 1º).” “Art. 93. Constitui crime, punível com detenção de até 6 (seis) meses ou pagamento de 30 (trinta) a 60 (sessenta) dias-multa, injuriar alguém, na propaganda eleitoral ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro (Código Eleitoral, art. 326, caput).” Contudo, em relação à suposta divulgação de conteúdo inverídico, qual seja, a declaração de que o vereador se negou a votar pela redução de salários em razão da pandemia de Covid-19, não houve comprovação nesse sentido. É como voto. A Corte regional entendeu, portanto, que a imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, divulgada nas redes sociais Facebook e Instagram, configurou propaganda eleitoral negativa extemporânea, visto que tal figura buscou associar a imagem do agente político à de político corrupto, o que lhe teria ofendido perante o seu eleitorado. Na linha da atual jurisprudência desta Corte, para se verificar a configuração da prática de propaganda eleitoral antecipada, faz-se necessário, em um primeiro momento, analisar se a mensagem veiculada possui ou não conteúdo eleitoral. 336 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Nesse sentido: “Na análise de casos de propaganda eleitoral antecipada, é necessário, em primeiro lugar, determinar se a mensagem veiculada tem conteúdo eleitoral, isto é, relacionado com a disputa. Ausente o conteúdo eleitoral, as mensagens constituirão ‘indiferentes eleitorais’, estando fora do alcance da Justiça Eleitoral” (AI 0600805-86, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 10.5.2021). No caso dos autos, entendo, a partir do teor da propaganda, descrita no acórdão regional, que a mensagem veiculada possui conteúdo eleitoral, haja vista que a imagem em questão faz clara referência a pré-candidato. No ponto, tenho como correto, pois, os seguintes fundamentos do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, reiterado pela Procuradoria-Geral Eleitoral,  in verbis (ID 132629838):  De início, na esteira da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, tratando-se de ato praticado na fase de pré-campanha, incumbe ao órgão judicante analisar se a publicidade possui conteúdo direta ou indiretamente relacionado com a disputa eleitoral, pois a inexistência desse caráter faz cessar a competência dessa Justiça Especializada (TSE – AgR-AI nº 9-24/SP, rel. Min. Tarcísio Vieira, DJe de 22/08/2018) Na espécie, nota-se que o material questionado possui nítido caráter eleitoreiro, pois contém a expressão “vergonha, seu candidato” e “esse não me representa”, buscando demonstrar que o vereador Raimundo Lopes de Farias não seria uma boa escolha no pleito de 2020. Todavia, a jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que, em regra, para que se alcance a conclusão de que ficou configurada a propaganda eleitoral extemporânea, seja ela positiva ou negativa, é exigível a presença de pedido explícito de votos ou, mutatis mutandis, de pedido explícito de não votos. Destaco o seguinte julgado deste Tribunal quanto ao ponto: ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. FACEBOOK. AUSÊNCIA. PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTO. DESCONFIGURAÇÃO.  SÍNTESE DO CASO  1. O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo afastou a configuração de propaganda eleitoral antecipada, por entender que o vídeo e o texto divulgado em página do Facebook, no dia 22 de fevereiro de 2020, com comentários desfavoráveis ao atual prefeito do município de Vargem Grande do Sul/SP e provável candidato à reeleição no pleito de 2020 e de menção positiva ao seu adversário político, não violou a regra do art. 36 da Lei 9.504/97, diante do permissivo contido no art. 36-A do mesmo diploma legal.  2. Na decisão agravada, o agravo em recurso especial teve seguimento negado, para manter o aresto recorrido.  3. O Ministério Público insiste no argumento de que a configuração de propaganda extemporânea está presente no caso dos autos, diante do pedido de voto não textual veiculado em data anterior ao período permitido pela norma.  3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 337

ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL 4. O agravante defende a configuração de propaganda antecipada, sob o argumento de que, embora não tenha havido propaganda explícita, houve pedido de voto na modalidade não textual, conduta que seria vedada pelas normas que regem a propaganda e não amparada nas exceções contidas no art. 36–A da Lei 9.504/97.  5. A mensagem veiculada no Facebook foi assim descrita no acórdão regional: ”[...] então o meu voto não vai pro senhor devidamente por um monte de funcionário que o senhor colocou aí dentro sem concurso público, funcionários que não têm capacidade pra nada que entraram aí de presente de natal do Papai Noel Amarildo. Então senhor prefeito, esquecendo isso, que já está terminando teu mandato, o senhor não vai entrar lá dentro mais mesmo, certo, eu tenho certeza disso. O senhor não precisa nem se candidatar mais que o senhor não ganha memo (sic) e eu trabalho memo (sic), realmente, vou trabalhar a favor do meu amigo Rossi, todo mundo sabe” (ID 41943788).  6. Esta Corte já manifestou o entendimento de que, “com a regra permissiva do art. 36-A da Lei nº 9.504, de 1997, na redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015, retirou-se do âmbito de caracterização de propaganda antecipada a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais de pré-candidatos e outros atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet, desde que não haja pedido expresso de voto” (Rp 294-87, rel. Min. Herman Benjamin, DJE de 9.3.2017).  7. O posicionamento da Corte paulista está em consonância com a jurisprudência deste Tribunal Superior, a qual se firmou no sentido de que, em regra, a configuração da propaganda eleitoral extemporânea, seja ela positiva ou negativa, exige a presença de pedido explícito de votos ou, mutatis mutandis, pedido explícito de não votos.  8. Conforme destacado em sede do AgR–REspe 502–47, rel. Min. Admar Gonzaga, “no julgamento do AgR–AI 9–24, de relatoria do Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, e do AgR–REspe 43–46, de relatoria do Min. Jorge Mussi, finalizado na sessão do dia 26.6.2018, o Tribunal Superior Eleitoral reafirmou, por ampla maioria, a jurisprudência já firmada para as Eleições de 2016, no sentido da essencialidade do pedido explícito de voto para a incidência da multa por propaganda extemporânea”.  9. Nos casos paradigmas, indicados pelo recorrente, em que esta Corte concluiu pela configuração de propaganda extemporânea (AgR-REspe 84-28, rel. Min. Luciana Lóssio, AgR-REspe 0600100-88, rel. Min. Jorge Mussi), as críticas analisadas atribuíram condutas ilícitas e ofensivas à honra e à dignidade de adversários políticos, o que não se observa na espécie, uma vez que os termos, supostamente ofensivos e utilizados no vídeo impugnado pelo ora agravante, não extrapolam os limites de mera crítica política, demonstrando apenas insatisfação com a gestão do Executivo municipal, conforme consignado pela Corte de origem.  338 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

CONCLUSÃO Agravo regimental a que se nega provimento.  (AgR-REspe 0600004-50, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 23.11.2020, grifo nosso.) Na espécie, entendo, a partir do contexto fático-probatório descrito no acórdão regional, que a propaganda em comento, consistente na imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, divulgada nas redes sociais Facebook e Instagram, não contém pedido explícito de votos ou de não votos, tratando-se de mera crítica política que, embora ácida, é assegurada nos termos do inciso IV do art. 5º da Constituição Federal e do inciso V do art. 36-A da Lei 9.504/97, que permite expressamente a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas. Vale ressaltar, ainda, que: “‘A aferição de propaganda eleitoral antecipada deve ser realizada a partir de dados e elementos objetivamente considerados, e não conforme intenção oculta de quem a promoveu’ (AgR–REspe nº 85-18/SP, rel. Min. Admar Gonzaga, julgado em 3.8.2017, DJe de 13.9.2017)” (REspe 0600001-94, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE de 28.10.2020). Observo também que o caso em exame difere daquele objeto do recente julgamento do AgR-REspe 0600072-23, de 4.5.2021, de relatoria originária do Ministro Luís Roberto Barroso, em que esta Corte, por maioria, deu provimento a agravo interno para julgar procedente a representação e aplicar multa ao agravado pela realização de propaganda eleitoral antecipada negativa, no valor de R$ 5.000,00, nos termos do voto divergente do Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto. Na ocasião, na qual se discutiu mensagem veiculada por meio de vídeo na rede social Instagram, com críticas dirigidas ao Governador do Estado do Maranhão, candidato à reeleição no pleito de 2018, esta Corte consignou a admissibilidade de críticas ácidas e contundentes dirigidas aos cidadãos que ingressam, ou buscam ingressar, na vida pública.  Assentou também que a intervenção da Justiça Eleitoral no processo eleitoral deve se dar apenas no caso de ser necessário o restabelecimento da igualdade e normalidade na disputa eleitoral ou para corrigir condutas que ofendam a legislação eleitoral, a exemplo do “discurso de ódio”, que entendeu presente no caso, em que se atribuiu o adjetivo “nazista” ao candidato.  Destaco o seguinte trecho do voto proferido pelo Ministro Edson Fachin, que inaugurou a divergência: Atribuir o adjetivo “nazista” a um candidato corporifica inadmissível discurso de ódio. Apor a alguém a pecha de nazista busca atribuir a um ser humano características como a de rejeição a determinados extratos sociais, de adoção de pontos de vista ideologicamente extremados e antidemocráticos, além de buscar lhe vestir de toda a rejeição e reprovação que a história mundial assentou sobre todos os homens que perfilharam o ideal do nazismo durante a Segunda Guerra Mundial. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 339

Essa percepção é compartilhada pela sociedade brasileira como bem se viu no episódio que culminou com a demissão de Secretário de Cultura da República Federativa do Brasil em razão de ter feito discurso assemelhado a discurso proferido pelo Ministro da Cultura da Alemanha durante o período do regime nazista. Em uma sociedade que rejeita com veemência a aproximação de seus governantes de condutas e ideologias outrora empregadas pelo Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães – Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei – sinaliza-se a adoção de óbice intransponível de rejeição por qualquer forma de discurso que possa ser associado ao nazismo.  Essa peculiar condição, harmônica com o substrato da sociedade brasileira, autoriza conceber que, entre nós, a designação de um cidadão como “nazista” vocifera inadmissível discurso de ódio. Um segundo ponto que desafia é a aplicabilidade dos limites materiais da propaganda eleitoral ao período de pré-campanha, mais notadamente às hipóteses fáticas que se subsumem ao art. 36-A da Lei nº 9.504/97. O entendimento deste Tribunal Superior Eleitoral é de que os limites da propaganda eleitoral antecipada excluem o pedido expresso de voto ou, no caso da sua versão negativa, o pedido de que não se vote em determinado candidato. Neste sentido, por todos, a ementa do seguinte julgado: “ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. 1. O Tribunal de origem manteve a sentença de improcedência da representação proposta em face dos agravados com fundamento no art. 36, § 3º, da Lei 9.504/97, por entender que os outdoors veiculados não têm conteúdo relacionado direta ou indiretamente com a disputa eleitoral, constituindo–se em indiferente eleitoral em termos de propaganda eleitoral. 2. O Ministério Público sustenta que no caso existem critérios aptos a configurar o pedido explícito de voto, consistentes no teor e demais elementos extrínsecos da mensagem veiculada por meio de outdoor, que se utiliza de expressões semanticamente similares ao pedido de voto. 3. Apesar de a veiculação de publicidade institucional por meio de outdoors ter expressivo conteúdo econômico, não disponível ao candidato médio, é incontroverso que, no caso dos autos, não houve mensagem de promoção pessoal, referência ao pleito ou à candidatura, mas tão somente prestação de contas de atos administrativos e de obras. 4. A decisão do Tribunal Regional do Piauí está de acordo com a atual compreensão desta Corte Superior, no sentido de que, “a alusão a gestões, com enaltecimento de obras, projetos e feitos de um integrante do partido, não desborda do limite da liberdade de expressão e de informação – podendo caracterizar, inclusive, prestação de contas 340 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

à sociedade –, não configurando, bem por isso, propaganda eleitoral antecipada, exceto se houver pedido expresso de votos ou menção à futura candidatura e ao pleito vindouro” (AgR–REspe 419–89, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 12.12.2016). 5. Incidência do verbete sumular 30 do TSE, pois o entendimento da Corte de origem está alinhado à jurisprudência deste Tribunal Superior. Agravo regimental a que se nega provimento.” (Recurso Especial Eleitoral nº 060035184, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 225, Data 22/11/2019). Propõe-se, porém, uma alteração nesse entendimento para que espelhe a evolução da compreensão desta Corte Superior fixada no julgamento do Recurso Especial Eleitoral nº 0600227-31.2018.6.17.0000: “ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ATOS DE PRÉ-CAMPANHA. DIVULGAÇÃO DE MENSAGEM DE APOIO A CANDIDATO. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTO. UTILIZAÇÃO DE OUTDOORS. MEIO INIDÔNEO. INTERPRETAÇÃO LÓGICA DO SISTEMA ELEITORAL. APLICABILIDADE DAS RESTRIÇÕES IMPOSTAS À PROPAGANDA ELEITORAL AOS ATOS DE PRÉ-CAMPANHA. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE APONTAM PARA A CIÊNCIA DO CANDIDATO SOBRE AS PROPAGANDAS. RECURSO PROVIDO. 1.  A realização de atos de pré-campanha, por meio de outdoors, importa em ofensa ao art. 39, § 8º, da Lei nº 9.504/97 e desafia a imposição de multa, independentemente da existência de pedido explícito de voto. 2. A interpretação do sistema de propaganda eleitoral aponta ser incompatível a realização de atos de pré-campanha que extrapolem os limites de forma e meio impostos aos atos de campanha eleitoral, sob pena de se permitir desequilíbrio entre os competidores, em razão do início precoce da campanha ou em virtude de majorada exposição em razão do uso desmedido de meios de comunicação vedados no período crítico. 3. A despeito da licitude da exaltação de qualidades próprias para o exercício de mandato ou a divulgação de plataformas de campanha ou planos de governo, resta caracterizado o ilícito eleitoral quando o veículo de manifestação se dá pela utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda. 4. As circunstâncias fáticas, do caso concreto, de maciço uso de outdoors em diversos Municípios e de expressa menção ao nome do candidato permitem concluir a sua ciência dos atos de pré-campanha, conforme exigência do art. 36, § 3º, da Lei das Eleições. 5. Recurso especial eleitoral provido.” [...] 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 341

A racionalidade exposta busca conceder tratamento isonômico aos períodos de campanha e de pré-campanha, desde que respeitados o limite da inexistência de pedido expresso de voto. Nesse contexto, entende-se lícita a propaganda eleitoral praticada dentro dos parâmetros fixados na legislação específica, assim como se pode afirmar que a observância da vedação de pedido expresso de voto, ou de negativa de voto, importa na adequação do ato de pré-campanha ao ordenamento. Porém, deve-se compreender que o discurso de ódio fulmina a validade dos atos de campanha eleitoral, como inclusive afirma categoricamente o e. Min. Relator e, por simetria, aniquila toda a aderência entre aos atos de pré-campanha e o campo de licitude que lhes é definido pelo art. 36-A da Lei nº 9.504/97. É absolutamente incompatível com a integralidade do ordenamento jurídico brasileiro o discurso de ódio.  Por inescapável consequência, é – tout court – intolerável ato de pré-campanha que incorra em discurso de ódio, sendo despiciendo aferir a existência de pedido expresso de voto para que se reconheça a inadequação da verbalização da ideia com a ordem constitucional vigente na República Federativa do Brasil. Reforce-se. A tentativa de se mascarar a prática de discurso de ódio como ato de pré- campanha constitui conduta proscrita pela Constituição Federal de 1988 e por todo o ordenamento jurídico nacional que, sob o signo democrático e de respeito pelo ser humano, é com ela compatível e vigente. Em razão dessa compreensão, e porque se defende a concretização da jurisdição com o papel de efetivar mudanças positivas na sociedade brasileira, impera a necessidade de se evitar que o discurso de ódio seja tolerado em território nacional, hoje e sempre. Imprimindo esse conjunto de argumentos ao caso concreto, percebe-se que a afirmação de filiação de cidadãos brasileiros ao Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães consubstancia discurso de ódio e incumbe ao Poder Judiciário, em obediência à Constituição Federal, impor a abstenção dessa prática. Ante o exposto, e renovando uma vez mais vênias ao e. Min. Relator e a todos que compreendem a situação da mesma forma, entendo que constatada a presença de discurso de ódio, revela-se acertada a decisão da Corte Regional pelo reconhecimento de propaganda eleitoral antecipada de natureza negativa, reestabelecendo a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão. Conforme afirmou o Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, redator para o acórdão, que votou pela manutenção dos termos do acórdão do TRE/MA, mantendo a multa de R$ 5 mil imposta: “Dúvida não há, ao meu modesto sentir, que as expressões pelo representado do ora agravado, a exemplo da pecha de nazista, ofenderam inexoravelmente a honra do governador Flávio Dino, consubstanciando discurso de ódio passível de enquadramento no campo da propaganda eleitoral antecipada na sua modalidade negativa”.  No caso dos autos, contudo, trata-se, nos termos registrados pelo acórdão de origem, de publicação, realizada pelos recorrentes em suas redes sociais Facebook e Instagram, da imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, 342 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

cenário que entendo não ser suficiente para configurar o indigitado “discurso de ódio”, nos termos do que fora decidido por esta Corte no caso supracitado, pois não vai além de mera crítica política, agasalhada pelo direito à livre manifestação de pensamento, não configurando, assim, a prática de propaganda eleitoral antecipada negativa.  Neste caso, portanto, assim como afirmou o Ministro Luís Roberto Barroso no voto em que proferiu no precedente acima citado: “Embora alguns julgados do TSE tenham reconhecido que a divulgação de publicação antes do período permitido que ofenda a honra de candidato constitua propaganda eleitoral negativa extemporânea, não é, penso eu, qualquer crítica contundente a candidato, ou mesmo ofensa à honra, que caracterizará propaganda eleitoral negativa antecipada, sob pena de violação à liberdade de expressão”. Entendo, pois, que  as críticas veiculadas por meio da imagem divulgada, devem ser admitidas no processo democrático, pois estimulam o debate, entre os eleitores, sobre eventuais características negativas dos integrantes da disputa eleitoral e de seus planos de governo. Concluo, assim, que a crítica em questão, ainda que ácida, extrapola a esfera eleitoral, devendo o candidato, caso assim entenda, buscar eventual reparação de danos morais na esfera cível da Justiça Comum, também competente para, na esfera criminal, analisar eventual prática de crimes contra a honra.  Por essas razões,  voto no sentido de dar provimento ao recurso especial eleitoral interposto por Weberte Viana e Adeilton Souza, a fim de reformar o acórdão regional e julgar improcedente a representação. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Obrigado, Ministro Sérgio Banhos. Eu ouço agora, então, o Ministro Alexandre de Moraes, que pediu destaque.   DECLARAÇÃO DE VOTO (VENCIDO)   O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Senhor Presidente, trata-se de Recurso Especial interposto por Weberte Viana e Adeilton Souza contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (ID 47351288), que deu parcial provimento ao recurso eleitoral manejado pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) – Municipal  para reformar a sentença proferida pelo Juízo da 59ª Zona Eleitoral daquele Estado, determinando a remoção do conteúdo impugnado, assim como aplicar multa aos ora recorrentes no valor de R$ 5.000,00, individualmente, por veiculação de propaganda eleitoral negativa extemporânea, nos termos dos arts. 36, § 3º, da Lei 9.504/97 e 38, §§ 1º e 4º, c.c. o 93 da Res.-TSE 23.610/2019. Sua Excelência, o Min. Relator SÉRGIO BANHOS, propõe o provimento do Recurso Especial para julgar improcedente a representação, considerando “... não caracterizada a propaganda eleitoral negativa consistente na imagem de um rato sobreposta à foto do vereador Raimundo Lopes de Farias, divulgada nas redes sociais Facebook e Instagram, não contém pedido explícito de votos ou de não votos, tratando-se de mera crítica política que, embora ácida, é assegurada nos termos do inciso IV do art. 5º da Constituição Federal e do inciso V do art. 36-A da Lei 9.504/97, que permite expressamente a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas.” 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 343

O processo foi submetido à sessão virtual de julgamento de 04 a 10/06/2021, ocasião em que pedi destaque para melhor analisar o caso. É o relatório. Pedindo vênia ao eminente Relator, Min. SÉRGIO BANHOS, bem como a todos os que pensam do mesmo modo, entendo ser o caso de negar seguimento ao Recurso Especial, uma vez que na hipótese dos autos está efetivamente caracterizada a propaganda eleitoral negativa extemporânea. Conforme temos decidido de forma reiterada, o direito fundamental à livre manifestação de pensamento, consagrado constitucionalmente, deve ser exercido dentro do binômio LIBERDADE - RESPONSABILIDADE. A Constituição protege a liberdade de expressão no seu duplo aspecto: o positivo, que é exatamente \"o cidadão pode se manifestar como bem entender\", e o negativo, que proíbe a ilegítima intervenção do Estado, por meio de censura prévia. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os governantes, que nem sempre serão “estadistas iluminados”, como lembrava o JUSTICE HOLMES ao afirmar, com seu conhecido pragmatismo, a necessidade do exercício da política de desconfiança (politics of distrust) na formação do pensamento individual e na autodeterminação democrática, para o livre exercício dos direitos de sufrágio e oposição; além da necessária fiscalização dos órgãos governamentais. No célebre caso Abrams v. United States, 250 U.S. 616, 630-1 (1919), OLIVER HOLMES defendeu a liberdade de expressão por meio do mercado livre das ideias (free marketplace of ideas), em que se torna imprescindível o embate livre entre diferentes opiniões, afastando-se a existência de verdades absolutas e permitindo-se a discussão aberta das diferentes ideias, que poderão ser aceitas, rejeitadas, desacreditadas ou ignoradas; porém, jamais censuradas, selecionadas ou restringidas pelo Poder Público que deveria, segundo afirmou em divergência acompanhada pelo JUSTICE BRANDEIS, no caso Whitney v. California, 274 U.S. 357, 375 (1927), “renunciar a arrogância do acesso privilegiado à verdade”. No âmbito da Democracia, a garantia constitucional da liberdade de expressão não se direciona somente à permissão de expressar as ideias e informações oficiais produzidas pelos órgãos estatais ou a suposta verdade das maiorias, mas sim garante as diferentes manifestações e defende todas as opiniões ou interpretações políticas conflitantes ou oposicionistas, que podem ser expressadas e devem ser respeitadas, não porque necessariamente são válidas, mas porque são extremamente relevantes para a garantia do pluralismo democrático (cf. HARRY KALVEN JR. The New York Times Case: A note on the central meaning of the first amendment in Constitutional Law. Second Series. Ian D. Loveland: 2000, capítulo 14, p. 435). Todas as opiniões existentes são possíveis em discussões livres, uma vez que faz parte do princípio democrático “debater assuntos públicos de forma irrestrita, robusta 344 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

e aberta” (Cantwell v. Connecticut, 310 U.S. 296, 310 (1940), quoted 376 U.S at 271-72). O direito fundamental à liberdade de expressão, portanto, não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também àquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias (Kingsley Pictures Corp. v. Regents, 360 U.S 684, 688-89, 1959). A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático, como ressaltado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, na ADI 4451, de minha relatoria (DJE de 6/3/2019). Dessa maneira, a plena proteção constitucional da exteriorização da opinião (aspecto positivo) não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas, mas não permite a censura prévia pelo Poder Público. No caso dos autos, tal como assentou a Corte Regional, já na ementa: “a propaganda eleitoral extemporânea configura-se quando evidenciado o esforço antecipado de influenciar eleitores, o que ocorre utilização, em postagem na rede social Facebook e Instagram da imagem de um rato sobreposta à fotografia de um agente político, evidenciando a manipulação e o propósito de ofender e denegrir a pessoa perante o eleitorado e, ainda, de influenciar negativamente na disputa eleitoral. Essa conduta extrapola o direito à livre manifestação do pensamento, a liberdade de imprensa e o direito de crítica, o que configura propaganda eleitoral antecipada negativa, nos termos do art. 36 da Lei nº 9.504/97”. O relator do recurso no TRE/PB, ainda, traz o adequado contorno contextual da imagem veiculada, verbis: “Na espécie, embora não conste da legenda veiculada em rede social Facebook ofensas ao vereador Raimundo Lopes de Farias, o mesmo não se pode dizer da imagem do rato sobreposta na foto, pois o leitor ao vê-la já estabelece posicamente a premissa de que o referido mandatário é corrupto. Ora, levando em consideração o significado do animal em nossa cultura, o “rato” é considerado nocivo ao homem, desprezível, imundo, associado ao roubo. É público e notório que o rato é o símbolo da corrupção em nosso país! Se alguma dúvida ainda existir, abra-se o Dicionário e encontrará: Rato: [Figurado] Pessoa que rouba outra; ladrão, gatuno (https://www.dicio.com.br/rato/); 10. Que ou quem trata ardilosamente de qualquer coisa ou que procede com fraude e velhacaria. = ESPERTALHÃO, TRATANTE, VELHACO, \"rato\", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/rato [consultado em 20-07-2020]. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 345

2 pej Indivíduo que pratica furtos. 3 pej Pessoa de má índole. (https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/ rato). Em pesquisa realizada na internet, constatei que a revista Veja, um dos maiores veículos de comunicação em nosso país, nas edições dos dias 25/05/2005, 05/08/2007 e 08/06/2011, publicou matérias acerca da corrupção no Brasil, cujos títulos foram os seguintes: “CORRUPTOS”, “POR QUE ELES NÃO FICAM PRESOS” e “A ANATOMIA DA CORRUPÇÃO”. Nas capas das referidas revistas, as imagens ilustrativas não era outra, senão, a de um rato. Finalmente, como bem argumentou o recorrente “ Até em quadro do programa FANTÁSTICO da Rede Globo de Televisão denominado de “CADÊ O DINHEIRO QUE ESTAVA AQUI?” a figura do rato é usada para denotar as más práticas com o dinheiro público.” Assim, ao utilizarem a imagem de um rato relacionada ao vereador Raimundo Lopes de Farias há nítida manipulação da imagem do político, com o único e inegável propósito de ofender e denegrir a sua pessoa perante o eleitorado e, ainda, de influenciar negativamente na disputa eleitoral, sobretudo considerando o ambiente em que praticada, no caso, na rede mundial de computadores. No meu entender, referida propaganda ultrapassou os limites da razoabilidade, da liberdade de informação e da mera crítica política.” (ID 47351338). A imagem, de fato, é impactante:     Note-se que os recorrentes, responsáveis pela montagem veiculada, identificam o candidato pelo nome, bem como o cargo por ele exercido, sobrepondo à sua imagem e a tais dizeres de identificação a impactante imagem do rato, de modo a não deixar qualquer sombra de dúvida quanto à intenção de, a um só tempo, a) associa-lo a um símbolo que inequivocamente simboliza algo abjeto e b) inserir tal associação a um contexto político, já que o nome sempre aparece vinculado ao cargo político. Não bastasse, sobrepõe-se à figura do candidato retângulos como se fossem carimbos, estampando as expressões \"vergonha, seu candidato\" e \"esse não me representa\", o que afasta qualquer dúvida acerca do cunho eleitoral das postagens, a caracterizar, estreme de dúvidas, propaganda eleitoral extemporânea negativa, já que veiculadas com escrachado intuito de demonstrar que o vereador Raimundo Lopes de Farias não seria uma boa escolha no pleito de 2020. A jurisprudência desta CORTE SUPERIOR vai no sentido de que \"A divulgação de publicação, antes do período permitido, que ofende a honra de possível futuro candidato constitui propaganda eleitoral negativa extemporânea\" (AgR–AI 2–64, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 22.9.2017). Evidente a afronta aos termos do art. 36, § 3º da Lei n. 9.504/97, art. 38, § 1º e 4º c/c o art. 93 da Res. TSE n. 23. 610/2019, impondo-se a manutenção do acórdão regional, que de resto impôs a multa no patamar mínimo legal. 346 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Ante o exposto, DIVIRJO do Ministro Relator para NEGAR PROVIMENTO ao Recurso Especial Eleitoral, mantendo o acórdão regional. É o voto. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Obrigado, Ministro Alexandre de Moraes. Volto à ordem normal e ouço o Ministro Carlos Horbach.   VOTO   O SENHOR MINISTRO CARLOS HORBACH: Senhor Presidente, correndo o risco de me tornar repetitivo nas manifestações que faço neste Plenário, especialmente quando se discute a questão da propaganda eleitoral antecipada e a interpretação do art. 36-A da Lei das Eleições, eu novamente registro que, durante o período da campanha eleitoral de 2018, em que tive a oportunidade de atuar, juntamente com o Ministro Sérgio Banhos e o Ministro Luis Felipe Salomão, como juiz auxiliar da propaganda, adotei uma leitura bastante aberta, bastante generosa do enunciado do art. 36-A da Lei nº 9.504/97, que leio aqui rapidamente, para reforçar as razões do meu voto. O art. 36-A, que traz balizas muito amplas, com as quais nós podemos até não concordar, mas que pautam a nossa atuação judicante, diz o seguinte: Art. 36-A Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet: E o inciso V desse dispositivo afirma que um desses atos possíveis no período de pré-campanha é exatamente “a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais”. Parece-me que a manifestação do eleitor sobre as posições políticas de um determinado representante – no caso, um determinado vereador – e o ataque a essas posições são manifestações de opinião política que acabam abarcadas por esse inciso V do art. 36-A, assim como o são o questionamento da vida pregressa do pré-candidato ou das ações por ele desenvolvidas no passado. Tudo isso reforçado pelo disposto no § 2º do mesmo 36-A, que tem a seguinte redação: “Nas hipóteses dos incisos I ao VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver”. No caso dos autos, o que se tem é o seguinte: houve um pedido de não apoio, que é legítimo; a divulgação, sim, de pré-candidatura; a menção a algumas ações políticas desenvolvidas pelo pré-candidato; e, em última análise, uma opinião do eleitor em relação ao representante que busca a reeleição. Então, dentro desses parâmetros legais do art. 36-A da Lei nº 9.504/97, não me resta alternativa que não acompanhar o eminente relator. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 347

É como voto, Senhor Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Muito obrigado, Ministro Carlos Horbach. Como vota o Ministro Luiz Edson Fachin?   VOTO   O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Senhor Presidente, eu também estou pedindo vênia à divergência e entendo que a conclusão que Sua Excelência o eminente Ministro Relator trouxe à colação, agora acompanhado pelo Ministro Carlos Horbach, bem desata a questão. Nada obstante, é possível prospectivamente olhar para as legítimas preocupações que estão na premissa do voto do eminente Ministro Alexandre de Moraes. É evidente que Sua Excelência externa um modo de ver, para o período eleitoral que se aproxima, que não apenas espelha conhecimento de causa mas também uma antevisão de um conjunto de circunstâncias desafiadoras para a Justiça Eleitoral. Nada obstante, a realidade que estamos a tratar aqui, ela é o contraponto que se dá ao mandatário que tem, em tese, liberdade para atuar no seu mandato, visto que não há possibilidade, entre nós, do ponto de vista da legislação vigente, da revogação desse mandato, outorgado pela soberania popular. O contraponto é o escrutínio e a crítica que advêm das suas ações ou de suas omissões. Portanto, precisamos, creio, encontrar aqui uma temperança entre aquilo que ultrapassa esse limite da chamada propaganda negativa – ou do não voto – e também uma excessiva inflexão que se pode fazer implicando em algum tipo de silenciamento. Creio que esse equilíbrio é uma boa reflexão e não creio que destoam dela as circunstâncias trazidas à colação pelo eminente Ministro Relator. E, por derradeiro, Presidente, eu também estou votando atento ao que consta do acórdão do Tribunal Regional. Por isso, pedindo as mais respeitosas vênias à divergência, também voto por acompanhar o eminente Ministro Relator. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Obrigado Ministro Fachin. Como vota o Ministro Luis Felipe Salomão?   PEDIDO DE VISTA   O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Eu peço vista, Presidente. O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Muito bem. Ministro Luis Felipe Salomão pede vista. Ministro Mauro Campbell aguarda.  PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO (PROVISÓRIO)   O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (presidente): Proclamo, então, o resultado: iniciado o julgamento, o relator deu provimento ao recurso para julgar 348 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

improcedente a representação, sendo acompanhado pelos Ministros Carlos Horbach e Edson Fachin. O Ministro Alexandre de Moraes divergiu para negar provimento ao recurso e manter a condenação por propaganda antecipada negativa. Pediu vista o Ministro Luis Felipe Salomão.   EXTRATO DA ATA   REspEl nº 0600093-07.2020.6.15.0059/PB. Relator:  Ministro Sérgio Banhos. Recorrentes: Weberte Viana e outro (Advogados: Bruno Lyra Batista – OAB: 22081/PB e outra). Recorrido: Movimento Democrático Brasileiro (MDB) – Municipal (Advogado: André Motta de Almeida – OAB: 10497/PB). Decisão: Iniciado o julgamento, o Ministro Sérgio Banhos (relator) deu provimento ao recurso para julgar improcedente a representação, sendo acompanhado pelos Ministros Carlos Horbach e Edson Fachin. Abriu divergência o Ministro Alexandre de Moraes, no sentido de negar provimento ao recurso e manter a condenação por propaganda antecipada negativa. Pediu vista o Ministro Luis Felipe Salomão. Aguardam os Ministros Mauro Campbell Marques e Luís Roberto Barroso. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Sérgio Banhos e Carlos Horbach. Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco.   SESSÃO DE 29.6.2021.   VOTO-VISTA   O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: 1. Senhor Presidente, a hipótese cuida de recurso especial interposto por Adeilton Souza e Weberte Viana (ID 47.351.688) contra aresto do TRE/PB, que, reformando sentença, impôs aos recorrentes multa individual de R$ 5.000,00 pela prática de propaganda eleitoral extemporânea negativa (art. 36, § 3º, da Lei 9.504/97), haja vista postagem, nas redes sociais  Facebook e Instagram, contendo a figura de um rato sobreposta à fotografia de Raimundo Lopes de Farias – Vereador de Queimadas/PB à época dos fatos. Nesta Corte, o julgamento iniciou-se no Plenário Virtual de 4 a 10/6/2021, quando o douto Relator, Ministro Sérgio Banhos, proveu o recurso para julgar improcedente o pedido, sendo acompanhado pelos eminentes Ministros Carlos Horbach e Edson Fachin. Retirou-se o feito de pauta em decorrência de destaque do eminente Ministro Alexandre de Moraes. Na sessão por videoconferência de 29/6/2019, o douto Ministro Alexandre de Moraes proferiu voto divergente no sentido de negar provimento ao recurso e manter a condenação. Pedi vista dos autos para melhor exame do caso. 2. Consoante o art. 36-A da Lei 9.504/97, no período anterior à campanha é permitida 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 349

a prática de determinados atos que não se enquadram no ilícito de propaganda eleitoral extemporânea, dentre eles a divulgação de posicionamentos pessoais acerca de questões políticas, inclusive nas redes sociais, como se observa do respectivo inciso V. Confira-se: Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet: [...] V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais; [...] Na esteira do referido dispositivo e da garantia fundamental de livre manifestação do pensamento, prevista no art. 5º, IV, da CF/88, penso que via de regra há de se assegurar grande amplitude à exteriorização de opiniões, elogios, divergências e críticas pelos cidadãos no contexto das disputas eleitorais. Nesse sentido, esta Corte já reconheceu que “[o] caráter dialético imanente às disputas político-eleitorais exige maior deferência à  liberdade de expressão  e de pensamento, razão pela qual se recomenda a intervenção mínima do Judiciário nas manifestações e críticas próprias do embate eleitoral, sob pena de se tolher substancialmente o conteúdo da liberdade de expressão” (AgR-RO 758-25/SP, Rel. designado Min. Luiz Fux, DJE de 13/9/2017). A mesma compreensão foi adotada no art. 38 da Res.-TSE 23.610/2019, no qual se estabeleceu: Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J). § 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral. Trata-se, de fato, de assegurar que exista espaço para o debate democrático, que abrange a contraposição de ideias e opiniões, bem como que se possam apresentar críticas aos agentes públicos, ainda que improcedentes ou ácidas. Nesse contexto, é natural que muitas vezes essas manifestações de cunho político- eleitoral ocorram por meio do emprego de imagens e metáforas, que fazem parte de nossa 350 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE


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