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3ªEdição da Revista de Jurisprudência do Copeje

Published by Thiago Álvares da S. Campos, 2021-11-25 16:40:24

Description: Homenagem ao Ministro Luís Roberto Barroso

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JUIZ ZANY ESTAEL LEITE JÚNIOR (JUIZ DO TRE-SC) TRE/SC - N. 0600029-91.2021.6.24.0000 TEMA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA DECISÃO 1. Trata-se de Ação de Decretação de Perda do Mandato Eletivo ajuizada por Rudinei Luis Floriano com base na Res. TSE 22.610/2007 contra a) o Deputado Estadual Carlos Henrique Lima, b) o Partido Liberal – PL em Santa Catarina e c) o Partido Social Liberal – PSL em Santa Catarina, ao argumento de que o primeiro réu teria se desfiliado do PSL sem justa causa. A Coordenadoria de Registro e Informações Processuais (CRIP) assim certificou nos presentes autos por ocasião da sua distribuição (ID 15041155): Certifico que tramita neste Tribunal os autos da PETIÇÃO (1338) N. 0600347-11.2020.6.24.0000, da relatoria do Juiz Rodrigo Fernandes, que trata de pedido de justa causa para a desfiliação partidária do requerido Carlos Henrique de Lima. Certifico, ainda, que deixei de realizar a redistribuição dos presentes autos, por prevenção, nos termos do inc. IX, art. 37, do Regimento Interno deste 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 451

Tribunal, em razão de, tanto o requerente RUDINEI LUIS FLORIANO quanto o requerido PARTIDO LIBERAL (PL) – ESTADUAL – SC, não figurarem como partes naqueles autos. No processo mencionado pela CRIP (0600347-11.2020.6.24.0000), verifiquei que as partes que o integraram foram as seguintes: Carlos Henrique de Lima (polo ativo) e Partido Social Liberal (PSL) – Estadual/SC (polo passivo), tendo o Procurador Regional Eleitoral atuado como fiscal da lei. Constatei, também, que esta foi, na íntegra, a decisão proferida pelo Juiz Rodrigo Fernandes naquele feito: A questão é sui generis e merece atenção para que o deslinde do feito ocorra de forma célere e em respeito aos princípios constitucionais incidentes ao caso em tela. Primeiramente, observo que tanto o representante da agremiação, como os advogados do autor tem poderes para transigir e firmar compromissos (ID 5809555 e ID 5262905). Assim, verifico que as partes são capazes, estando plenamente representadas, podendo dispor do objeto da quaestio (art. 70, CPC). Para deslinde do feito, necessário uma breve digressão dos últimos acontecimentos processuais. O autor trouxe aos autos a seguinte manifestação: “Em data de 05 de fevereiro de 2021, sendo o documento superveniente à instrução processual, portanto, mas sendo de suma importância para o julgamento da causa, o Presidente do PSL oficiou ao Autor para que manifestasse sua intenção de se desfiliar do partido, com a concordância da Comissão Executiva Estadual. Ato contínuo, em 26 de fevereiro de 2021 o Autor manifestou oficialmente ao partido a sua intenção de efetivamente se desfiliar do PSL. Tendo sido ambos os documentos produzidos de forma superveniente, considerando sobretudo sua grande importância para o julgamento do mérito da causa, plenamente justificável e possível sua juntada neste momento. Sobre o mérito da causa, a bem da verdade, a autorização da desfiliação por parte da Comissão Executiva Estadual tem o condão de reconhecer a necessidade da procedência do pedido feito na inicial, que é seja autorizada a desfiliação do Autor do Partido Social Liberal sem a perda do mandato de Deputado Estadual. Diante do exposto requer-se a juntada dos documentos, bem como o prosseguimento do feito, julgando-se procedentes os pedidos feitos na inicial”. (ID 12869355). 452 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Observo ainda, a juntada ao feito do Ofício PSL-SC 003/2020, assinado pelo Deputado Federal Fabio Schiochet, presidente da agremiação no Estado, com o seguinte conteúdo: “Pelo presente, o PARTIDO SOCIAL LIBERAL (PSL) - SANTA CATARINA, partido político inscrito no CNPJ nº 01.292.394/0001- 61, com sede na Av. Prof. Othon Gama D'eça, nº 677, Edifício The Office Avenida, Sala 401, Centro, na cidade de Florianópolis/Se, neste ato representado por seu Presidente, Deputado Federal Fábio Schiochet, vem através do presente, diante dos procedimentos éticos existentes decorrentes de ações de infidelidade partidária elencados no art. 17 c/c art. 135 do Estatuto Partidário Vigente, bem como diante das reiteradas manifestações do nobre deputado em se desfiliar do presente partido, esse partido oficia ao Parlamentar para que manifeste seu interesse em prosseguir como filiado ao PSLSC  ou se pretende a desfiliação com a concordância da Comissão Executiva Estadual, devendo manifestar referido interesse no prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento do presente”. (ID 12869405) - grifei. Em resposta, o autor enviou ofício ao partido, com a seguinte missiva, vejamos: “Ao Deputado Federal Fabio Schiochet, presidente estadual do PSL/SC, oficio para conhecimento e devidas providências, que em concordância a proposta da peça de Of. PSL-SC003/2020; que eu Deputado Estadual Sargento Lima manifesto interesse na desfiliação com a concordância Comissão da Executiva Estadual, conforme questionado no Oficio supra-citado”. (ID 12869455) – grifei. Além destes documentos, o PSL quando intimado, se manifestou expressamente quanto a “sua concordância com a possibilidade de sua desfiliação da agremiação, com a concordância da comissão executiva do partido”. (ID 13512955). Assim, há a aquiescência das partes para transacionarem o direito objeto do feito. O douto Procurador Regional Eleitoral foi lapidar ao afirmar que: “Na espécie, não há mais o que se discutir em relação à alegada justa causa ou ausência desta para a desfiliação pretendida pelo autor, sem a perda de seu cargo, já que o réu, a Comissão Executiva do PSL de SC, expressamente concordou com a desfiliação, abdicando da reinvindicação do cargo objeto da demanda, sendo o caso, portanto, de designação de data para a homologação do acordo havido entre as partes, extinguindo-se, na sequência, o processo, com resolução de mérito, nos termos do art. 485, II, a, do CPC”. (ID 13719455). Nesta linha muito meditei quanto a necessidade de audiência para homologação de acordo, chegando à conclusão que sua realização 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 453

seria desnecessária no caso concreto, pois as partes são capazes e há manifestação expressa destes quanto a desfiliação do autor da agremiação. Ainda, sustento minha conclusão no princípio da cooperação, que determina que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva” (art. 6º, CPC). De outro lado, a norma incidente possibilita o desfecho almejado pelas partes, já que o Código de Processo Civil dispõe expressamente: “Art. 932. Incumbe ao relator: I - dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes; Outrossim, há precedente recente deste Tribunal, possibilitando a homologação de acordo, conforme aresto que transcrevo abaixo: “PETIÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE JUSTA CAUSA PARA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA –ACORDO FIRMADO ENTRE AS PARTES DURANTE A AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO AUTORIZANDO A DESFILIAÇÃO DO PARTIDO COM A MANUTENÇÃO DO MANDATO ELETIVO – HOMOLOGAÇÃO – PRECEDENTE – EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO”. [TRE-SC, autos n. 0600443-60, AC. N. 34271 de 03/03/2020, Relator Vitoraldo Bridi, DJE, Tomo 32, 10.03.2020]. Por outro lado, nessa mesma linha lógica, outros Tribunais Regionais também enfrentaram matéria análoga, verbis: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE JUSTA CAUSA PARA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. 1. Em conformidade com a jurisprudência do c. TSE, na qual “havendo consonância do Partido quanto à existência de fatos que justifiquem a desfiliação partidária, não há razão para não se declarar a existência de justa causa”, impõe-se a homologação do acordo para autorizar expressamente a desfiliação do requerente. 2. Acordo homologado” [TRE-DF. Ac. n. 6878, de 27.4.2016, Relator Juiz Telson Ferreira]. 454 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Nesse contexto, diante dos precedentes citados, bem como da expressa manifestação de todos envolvidos no processo,  homologo o acordo firmado entre as partes, para a  desfiliação do autor do partido PSL, com a concordância da Comissão Executiva Estadual, julgando extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, III, “b” do Código de Processo Civil. Por derradeiro, caso ainda não tenha ocorrido a desfiliação do autor, no sistema filia, oficialmente, determino que os efeitos da sua desfiliação se deem a partir da data da publicação da presente decisão. Por fim, em respeito ao princípio da Colegialidade, encaminhe-se a presente decisão para aprovação ad referendum da Corte. Verifiquei, mais, que a decisão proferida no processo 0600347-11.2020.6.24.0000, transitou em julgado para as partes que o integraram e para o Ministério Público, conforme certificado pela CRIP nos IDs 14130505 e 14130005 daquele caderno processual eletrônico. Em seguida, o Pleno deste Tribunal referendou, à unanimidade, a decisão monocrática proferida pelo eminente Juiz Rodrigo Fernandes, tendo a certidão de julgamento restado assim redigida (ID 9642055 do processo 0600347-11): CERTIDÃO DE JULGAMENTO Certifico que, em sessão realizada no dia 5 de abril de 2021, os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina decidiram, à unanimidade, referendar a decisão monocrática (ID 13956555), que homologou o acordo firmado entre as partes, para a desfiliação de Carlos Henrique de Lima do Partido Social Liberal (PSL), com a concordância da Comissão Executiva Estadual, julgando extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, III, “b” do Código de Processo Civil. Agora, Rudinei Luis Floriano, primeiro suplente do PSL na votação para deputado estadual nas eleições de 2018, peticiona a este Tribunal requerendo a decretação da perda do mandato eletivo do Deputado Estadual Carlos Henrique Lima, por suposta infidelidade partidária, sob o argumento de que inexistiu justa causa para a sua desfiliação do PSL sem a perda do cargo pelo partido que o elegeu. Esse o relato. Passo a decidir. 2. De início, trago os dispositivos do Regimento Interno do Tribunal Regional de Santa Catarina que estabelecem as atribuições do Relator (art. 24), bem como os casos em que é possível decidir o processo monocraticamente (art. 25) – Res. TRE-SC 7.847/2011: Art. 24. O Relator terá as atribuições que a legislação processual confere aos Juízes singulares e aos Relatores nos Tribunais, em especial: [...] 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 455

Art. 25. O Relator poderá decidir monocraticamente: I - pedidos ou recursos intempestivos, manifestamente incabíveis ou prejudicados; II - consultas formuladas por parte ilegítima ou quando já iniciado o processo eleitoral; III - requerimentos para veiculação de inserções de propaganda partidária; IV - pedidos de registro de órgão de partido político em formação; V - pedidos de registro de candidatura nos quais não tenha havido impugnação, estejam preenchidas todas as condições de elegibilidade e não tenha o candidato incorrido em inelegibilidade; VI - prestações de contas de competência originária do Tribunal em que não tenham sido detectadas irregularidades pelo órgão técnico ou nas quais todas as irregularidades apontadas tenham sido sanadas, ensejando parecer favorável à aprovação das contas; VII - pedidos de registro dos comitês financeiros que movimentarão os recursos destinados às campanhas eleitorais dos candidatos a Governador, a Vice-Governador, a membros do Congresso Nacional e a membros da Assembleia Legislativa. Embora a homologação de acordos não conste expressamente do rol dos referidos dispositivos regulamentares, vejo que a solução consensual dos conflitos é um dos princípios basilares do Código de Processo Civil, tendo como função restaurar o diálogo entre as partes, devendo ser estimulada pelos juízes, consoante se infere da leitura dos §§ 2º e 3º do art. 3º do CPC: Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. Do CPC, vale reproduzir, também, o inciso I do art. 932, já citado na decisão do Juiz Rodrigo Fernandes, que possibilita ao relator homologar autocomposição das partes: Art. 932. Incumbe ao relator: I - dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova, bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes; 456 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Dessa forma, o Juiz Rodrigo Fernandes, na direção e solução do processo 0600347- 11.2020.6.24.0000, e diante da expressa manifestação dos envolvidos naquele feito, corretamente homologou monocraticamente o acordo firmado entre as partes que compuseram a lide, para a desfiliação do autor (Carlos Henrique Lima) do partido PSL, com a concordância da Comissão Executiva Estadual. 3. Ressalto, também, que o acordo homologado pelo Juiz Rodrigo Fernandes e referendado à unanimidade pelo Pleno deste Tribunal resolveu o mérito do processo, nos termos do art. 487, III, “b” do Código de Processo Civil: Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção; II - decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição; III - homologar: a) o reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção; b) a transação; c) a renúncia à pretensão formulada na ação ou na reconvenção. Nesse tocante, anoto que a existência de decisão transitada em julgado em que se consignou expressamente a resolução do mérito, faz coisa julgada, não mais sendo admitida a prolação de outra decisão – ou o ajuizamento de outro processo – a tratar dos mesmos fatos. Assim, o trânsito em julgado da decisão homologatória fundamentada expressamente no “artigo 487, III, “b” do Código de Processo Civil” – que, repito, estabelece que homologação de transação acarreta resolução de mérito – inviabiliza a rediscussão da decisão que analisou e resolveu o mérito da lide, bem como o ajuizamento de outro processo versando sobre os mesmos fatos, não podendo mais o Poder Judiciário se manifestar de forma diversa daquilo que foi homologado. 4. Na petição inicial, alega-se que “não houve a publicação do r. acórdão que homologou a transação havida entre as partes, malgrado tenha sido objeto de pedido expresso de Rudinei Floriano”. Ressalto, entretanto, que o autor da presente ação, Rudinei Luis Floriano, não foi parte no processo 0600347-11.2020.6.24.0000. Somente após o trânsito em julgado da homologação do acordo, é que houve o atravessamento, naqueles autos, de embargos de declaração (que não foram conhecidos) e posteriormente agravo regimental (ainda pendente de julgamento). Neste passo, penso que não cabe ao autor da presente ação impor o formato por meio do qual se deva dar publicidade a decisão exarada em processo do qual não fez parte. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 457

Ademais, o Juiz Rodrigo Fernandes, na decisão que não conheceu dos embargos de declaração (ID 14877005 do processo 0600347-11), assentou expressamente a eficácia imediata do acordo homologado: [...] Ao que parece, Rudinei Luis Floriano ao analisar o quadro processual equivocou-se, pois entendeu que a decisão exarada por este Relator só teria eficácia após o referendo do Colegiado. Na verdade, a decisão homologatória, quando publicada se insere plenamente no plano da existência, validade e eficácia, surtindo amplamente seus efeitos, inclusive quanto à possibilidade de as partes questionarem seu conteúdo, por meio da via recursal. [...] [...] a decisão que homologou o acordo revestiu-se de eficácia imediata, gerando de pronto, todos os efeitos e consequências inerentes a esse provimento jurisdicional, inclusive oportunizando as partes a faculdade de recorrerem. Tal assertiva vai de encontro ao fato de que o referendo do Colegiado desta Corte, ocorrido em 05.04.2021, não alterou o conteúdo e os efeitos da decisão monocrática, muito menos sua carga de eficácia. Vale rememorar que o referendo da Corte, quando desafia a decisão do relator se qualifica como verdadeira condição resolutiva, jamais suspensiva da eficácia da decisão homologatória dada monocraticamente. No caso concreto se não houvesse o referendo à decisão, ter-se-ia um novo veredito da Corte, com conteúdo e desfecho oposto ao decidido pelo relator, além de ter uma nova repercussão com respectivos efeitos no patrimônio jurídico das partes, incluindo a possibilidade de esses recorrerem. Desta forma, o requerimento apresentado é intempestivo, não podendo ser conhecido, restando inviabilizada qualquer alegação feita por Rudinei Luis Floriano. [...] Assim, não há qualquer fato obstativo do trânsito em julgado nos autos, estando correta e de acordo com os precedentes a certidão aposta pela CRIP. Portanto, nos termos do artigo 502 do Código de Processo Civil, operou-se, a coisa julgada em 05.04.2021, sendo que todos os pedidos posteriores se encontram manifestamente intempestivos. Desse modo, vejo como desnecessária a lavratura de acórdão em processos como o de número 0600347-11.2020.6.24.0000, sendo a homologação do acordo suficiente para dar início aos efeitos jurídicos para as partes. 5. Considero, ainda, que, no caso concreto, não há falar em infidelidade partidária por parte do Deputado Estadual Carlos Henrique Lima. Isso porque no processo 458 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

0600347-11.2020.6.24.0000, o mencionado deputado buscou, junto à Justiça Eleitoral, o reconhecimento da justa causa para se desfiliar do PSL sem perder o cargo para o qual foi eleito. Só houve a migração do parlamentar para outra agremiação (especificamente para o PL) após a homologação do acordo. Vejamos: a decisão monocrática homologatória ocorreu em 25/03/2021, e a certidão juntada no ID 15039655 do presente processo dá conta de que o cancelamento da desfiliação junto ao PSL, no Sistema de Filiação Partidária, ocorreu no dia 29/03/2021 e a adesão ao PL ocorreu em 01/04/2021. O próprio PSL peticionou ao Relator Juiz Rodrigo Fernandes em 07/04/2021 informando ter procedido à desfiliação no sistema, apresentando o detalhamento do registro da filiação em que consta no campo “Data da Desfiliação” o dia 01/04/2021. Todas as datas mencionadas anteriormente são posteriores ao ajuizamento da ação 0600347-11, bem como da homologação do acordo. Ora, é evidente que o Deputado Estadual Carlos Henrique Lima só mudou de partido porque e quando houve a dita homologação em que ficou mencionada, expressamente, “a concordância da Comissão Executiva Estadual [do PSL]”, o que lhe indicou que não perderia o seu cargo eletivo. Certamente se a decisão no processo 0600347-11 lhe tivesse sido desfavorável, o parlamentar não teria procedido à troca de legenda pois a consequência ter-lhe-ia sido por demais danosa. Trata-se de caso típico a se invocar a aplicabilidade do princípio da proteção da confiança legítima, traduzido na boa-fé que o jurisdicionado deposita nos atos praticados pelos órgãos do Poder Judiciário. Entendimento diverso implicaria violação a tal princípio e à segurança jurídica, consagrados na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça (STF, 1ª Turma, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo n. 861.595 – MT, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27-04-2018, DJe de 22-05-2018; STJ, 1ª Seção, REsp n. 1.487.139 – PR [Tema Repetitivo 928], Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 08-11-2017, DJe de 21-11-2017). Conforme assentado no primeiro dos julgados acima (STF 861.595), o princípio da segurança jurídica, em sua perspectiva subjetiva, “protege a confiança legítima, procurando preservar fatos pretéritos de eventuais modificações na interpretação jurídica, bem como resguardando efeitos jurídicos de atos considerados inválidos por qualquer razão”. “Em última análise”, prossegue o Min. Roberto Barroso, “o princípio da confiança legítima destina-se precipuamente a proteger expectativas legitimamente criadas em indivíduos por atos estatais”. Do segundo julgado mencionado (STJ 1.487.139), vale reproduzir a seguinte passagem: A segurança jurídica, como subprincípio do Estado de Direito, constitui valor singular no sistema jurídico e cumpre função primordial na realização da própria ideia de justiça material. O ordenamento jurídico, tal qual a vida, equilibra-se entre os polos da segurança (na abstrata imutabilidade das situações constituídas) e da inovação (para fazer frente 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 459

ao panta rei). Assim, na relação (fundamental) entre tempo e direito, a expressão princípio da segurança jurídica marca, como signo pleno de significados que é, o espaço de retenção, de imobilidade, de continuidade, de permanência – valoriza, por exemplo, o fato de o cidadão não ser apanhado de surpresa por modificação ilegítima na linha de conduta da Administração, ou por lei posterior, ou modificação na aparência das formas jurídicas. 6. Nesse viés, então, deve ficar assentada a ilegitimidade ativa, bem como a falta de interesse processual do autor (Rudinei Luis Floriano) em ajuizar a presente ação. Isso porque a Res. TSE 22.610/2007, que disciplina o processo de perda de cargo eletivo, bem como de justificação de desfiliação partidária, estabelece, em seu art. 1º, que “o partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa”. Apenas “quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subsequentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público Eleitoral” (§ 2º do art. 1º da Res. TSE 22.610/2007). Sucede que, como já dito no tópico anterior, não houve infidelidade partidária por parte do Deputado Carlos Henrique Lima; ao contrário, houve a busca de reconhecimento, pela Justiça Eleitoral, da justa causa para desfiliação sem a perda do mandato, no que o parlamentar obteve êxito por meio do acordo homologado pelo respectivo relator e referendado pelo Tribunal. Assim, como decorrência lógica da homologação do acordo, falece legitimidade e interesse ao PSL para pleitear o mandato do Deputado Carlos Henrique Lima, e menos ainda poderia o primeiro suplente, Rudinei Luis Floriano, buscar a perda daquele cargo sob a alegação de “infidelidade partidária”, já que sua legitimidade é meramente subsidiária à da agremiação (TSE, ED QP PET nº 56703, rel. Min. Luciana Lóssio, j. 16.11.2016). A migração partidária, como já dito, ocorreu dentro dos princípios da segurança jurídica, boa-fé objetiva e confiança, uma vez que existia ato judicial que assegurava ao deputado Carlos Henrique Lima a mudança sem perda do mandato. De outro norte, a jurisprudência consolidou, como regra geral, o entendimento de que “o processo instituído pela Res. TSE n. 22.610/2007 tem caráter dúplice porque, uma vez julgada improcedente a ação, pelo reconhecimento da justa causa, atestada estará a regularidade da migração partidária, sendo desnecessária e incabível a formulação de pedido contraposto” [TSE. Petição 2778, Acórdão, Relator Ministro Marcelo Ribeiro, Publicação RJTSE 23/04/2009]. Transpondo o entendimento do TSE para o presente caso, e considerando que os Membros do TRE-SC, em sessão realizada no dia 5 de abril de 2021, “decidiram, à unanimidade, referendar a decisão monocrática [...] que homologou o acordo firmado entre as partes, para a desfiliação de Carlos Henrique de Lima do Partido Social Liberal (PSL), com a concordância da Comissão Executiva Estadual, julgando extinto o processo, 460 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, III, “b” do Código de Processo Civil”) – ID 9642055 do processo 0600347-11 – , concluo que a matéria não comporta ulterior discussão, não mais sendo possível ao suplente submeter o referido pacto à reapreciação desta Corte nem, portanto, os fatos versados no processo 0600347-11.2020.6.24.0000 que culminaram no acordo. 7. Vejo, mesmo, que a presente ação visa, em última análise, rescindir a decisão proferida no processo 0600347-11.2020.6.24.0000, a qual já transitou em julgado e gerou efeitos jurídicos para as partes que compuseram aquela lide, sendo de todo descabida a rediscussão dos fatos por meio da presente actio. 8. Diante do exposto, conclui-se que a apreciação das hipóteses narradas na inicial encontra óbice na falta de legitimidade e interesse processual do autor, não havendo outra solução a não ser o indeferimento in limine da petição inicial, nos termos dos incisos II e III do art. 330 do CPC: Art. 330. A petição inicial será indeferida quando: I - for inepta; II - a parte for manifestamente ilegítima; III - o autor carecer de interesse processual; IV - não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321. [...] Ante o exposto, indefiro in limine a petição inicial, o que faço com fulcro nos incisos II e III do art. 330 do Código de Processo Civil c/c o inciso I do art. 25 do Regimento Interno desta Corte. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Florianópolis, 21 de maio de 2021. Juiz ZANY ESTAEL LEITE JÚNIOR RELATOR 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 461

JUIZ RENATO GUANABARA LEAL DE ARAÚJO (JUIZ DO TRE-GO) TRE/GO - N. 0600014-67.2019.6.07.0000 TEMA DECADÊNCIA ACÓRDÃO Nº 9139   AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. LEGITIMIDADE PARA O POLO ATIVO. INÉPCIA DA INICIAL NÃO CONFIGURADA. VIA ELEITA. FINALIDADE DE DESCONSTITUIR MANDATO ELETIVO. ARTIGO 220 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRAZO PROCESSUAL. DECADÊNCIA. 1. Diante da ausência de norma específica para o regramento da AIME, são legitimados para compor o polo ativo da lide aqueles previstos no art. 22 da Lei Complementa 64/90. 2. Não se pode falar de inépcia da inicial quando da leitura da inicial é possível compreender o pedido e os fundamentos da pretensão autoral. 3. A via eleita da AIME é adequada para o requerimento de desconstituição de mandato eletivo pela cassação do registro e do diploma. 462 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

4. O prazo previsto no artigo 14, §10, da Constituição Federal é decadencial, portanto não se interrompe nem se suspende, mas o termo final será prorrogado para o primeiro dia útil seguinte. Ultrapassado este prazo, forçoso é reconhecer a decadência ao direito de ação. 5. O artigo 220 do CPC refere-se à suspensão de prazos processuais, portanto, não atinge o prazo decadencial de ajuizamento da AIME. 6. Processo extinto, com resolução de mérito,  pela ocorrência da decadência.   Acordam os desembargadores eleitorais do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal em acolher, em parte, a preliminar de ilegitimidade ativa para excluir do polo ativo da lide somente a Comissão Provisória Regional do Partido Republicano da Ordem Social, rejeitar as preliminares de inépcia da inicial e de inadequação da via eleita e, no mérito, julgar extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do voto do eminente Relator. Decisão unânime. Brasília/DF, 13/09/2021.   Desembargador Eleitoral RENATO GUANABARA LEAL DE ARAÚJO RELATOR   RELATÓRIO Trata-se de ação constitucional de Impugnação de Mandato Eletivo proposta pelo Diretório Nacional do Partido Republicano da Ordem Social – PROS e pela Comissão Provisória Regional do Partido Republicano da Ordem Social em face de Jaqueline Ângela da Silva, candidata eleita ao cargo de Deputada Distrital nas eleições de 2018. Os autores alegam, em síntese, que o registro da candidatura da ré foi obtido mediante fraude e, portanto, deve ser anulado. Para tanto, afirmam a ausência de condição de elegibilidade, por ser intempestiva e inidônea a prova de filiação partidária produzida pela ré, quando do registro de sua candidatura. Ao final, os autores requerem a cassação do diploma outorgado à ré Jaqueline Ângela da Silva e, por consequência, seja diplomada Telma Rufino Alves como Deputada Distrital. Devidamente citada, a ré apresentou contrarrazões (id. 1088484), aduzindo preliminarmente a inépcia da inicial, sob o fundamento de ilegitimidade ativa das partes, bem como a ausência de indicação da alegada fraude e sua prova, o que afirma ser pressuposto para o manejo da ação de impugnação de Mandato Eletivo, nos termos do artigo 14, §10, da Constituição Federal. Com isto, alega a falta de interesse de agir e a má-fé dos autores. Aduz, ainda, que a ação é deserta, já que a procuração foi outorgada pelo Sr. Eurípedes Gomes de Macedo Júnior, quando não mais estava no mandato de Presidente 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 463

da Comissão Provisória Regional do Distrito Federal do Partido Republicano da Ordem Social – PROS. No mérito, afirma que a inicial não indica a fraude praticada pela requerida, mas apenas aduz que o deferimento do registro de candidatura se deu mediante fraude. Argumenta que o seu registro ocorreu de forma regular, já que demonstrou sua filiação partidária, bem como que essa ocorreu dentro do prazo legal, ou seja, antes dos seis meses que antecederam as eleições de 2018. Desse modo, entende que os requerentes apenas pretendem rediscutir matéria já julgada pela egrégia Corte Superior Eleitoral (processo Respe nº 0601163-35.2018.6.07.0000), mesmo porque não apontaram nenhum fato superveniente que justificasse a propositura da presente AIME.   Por fim, requer que sejam acolhidas as preliminares arguidas para extinguir a ação sem julgamento de mérito e, caso ultrapassadas estas, pugna pela improcedência da demanda, com a condenação dos requerentes por litigância de má-fé. O Ministério Público Eleitoral apresentou parecer opinando pelo acolhimento parcial da arguição de ilegitimidade ativa, para excluir tão-somente a Comissão Provisória Regional do Partido Republicano da Ordem Social do polo ativo da lide, bem como pelo acolhimento da arguição de inépcia da inicial por ausência de interesse processual e consequente extinção do feito, sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485, incisos I e VI, c/c o artigo 15, todos do Código de Processo Civil. Na hipótese de ser aplicado o disposto no artigo 4881 do Código de Processo Civil, o Ministério Público Eleitoral  manifestou-se pela extinção do processo, com resolução de mérito, para que seja reconhecida a decadência do direito de manejar a presente AIME, conforme prescrito no artigo 487, inciso II, c/c o art. 14, ambos do CPC, bem como por estar a pretensão autoral destituída de fundamento, nos termos do artigo 485, inciso I, c/c o artigo 15, todos do CPC. Telma Rufino Alves apresentou, ainda, petição requerendo que fosse concedido o seu ingresso na presente ação na condição de assistente simples (id. 1698434). Intimadas as partes, a requerida Jaqueline Ângela da Silva não se opôs ao pedido (id. 1730534), e os autores se mantiveram inertes. Intimada, a douta Procuradoria Eleitoral pugnou pelo indeferimento do pedido (id. 1741334). Foi deferido o ingresso de Telma Rufino Alves como assistente simples, uma vez que a requerente foi candidata no pleito de 2018 e, com base no artigo 22 da LC 64/90 e na jurisprudência, era parte legítima para, inclusive, propor a presente ação de impugnação de mandato eletivo (id. 2114484). O Desembargador Eleitoral Telson Ferreira, Relator que me antecedeu, determinou a suspensão da tramitação dos presentes autos até que houvesse a solução de lide proposta em outro processo.  A Secretaria Judiciária informou que a presente demanda deve ser julgada até 31/12/2021, porquanto foi identificada como sendo pertencente à Meta 4 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ (id. 2428934). É o relatório.   1. Art. 488 do CPC: Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485. 464 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

VOTO Inicialmente, cumpre destacar que a Meta 4 do CNJ determina que sejam julgados \"até 31/12/2021, 90% dos processos referentes às eleições de 2018 e 50% dos processos referentes às eleições de 2020, distribuídos até 31/12/2020, que possam importar na perda de mandato eletivo ou inelegibilidade”. O Relator antecessor determinou que se aguardasse o julgamento de mérito do MS 600013-48.2020.6.07.0000, que, em sede liminar, vedou a realização de provas testemunhais requeridas nestes autos (id. 2554734). Considerando que se  mostrará  desnecessária a produção da prova oral  para a solução da lide, trago o presente processo à apreciação desta Corte, tendo em vista que o julgamento será computado para efeito de cumprimento da referida meta do Conselho Nacional de Justiça.  PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA São legitimados para compor o polo ativo da AIME aqueles previstos no artigo 22 da LC 64/90, diante da inexistência de norma específica, conforme o entendimento jurisprudencial.  Transcrevo o citado artigo, por entender pertinente:   \"Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor – Geral ou regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículo ou meio de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito (...)” Nesse sentido é a jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral sobre o tema: EMENTA: RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÃO 2000. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO. LEGITIMIDADE ATIVA. LITISPENDÊNCIA. AUSÊNCIA. DÍSSIDIO. NÃO- CARACTERIZAÇÃO. NEGADO PROVIMENTO. I - Na ausência de regramento próprio, esta Corte assentou que, tratando- se de ação de impugnação de mandato eletivo, são “legitimadas para a causa as figuras elencadas no art. 22 da Lei de Inelegibilidade” (Ag nº1.863-SE, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 7.4.2000). II - O reconhecimento da litispendência impõe, além da identidade de partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 465

III - A caracterização da divergência requer, entre outros requisitos, a similitude fática entre os paradigmas colacionados e o caso concreto. (Recurso Especial Eleitoral nº 21218, Relator(a) Min. Francisco Peçanha Martins, Publicação: DJ – Diário de justiça, Volume 1, Data 24/10/2003, Página 129) Ademais, como bem asseverou a d. Procuradoria Eleitoral  “aplicando-se por analogia o sistema de representação dos órgãos partidários ao caso, disciplinado pelo art. 11 da Lei n. 9.096/95, é possível que o Diretório Nacional e a Comissão Provisória Regional do PROS figurem no polo ativo da demanda aforada nesse eg. TRE/DF, já que os mandatários do primeiro (o Diretório Nacional) ‘representam o partido perante quaisquer Tribunal ou Juízes Eleitorais’, e, os do segundo (o organismo partidário regional ou estadual), representem ‘somente perante o Tribunal Regional Eleitoral e os Juízes Eleitorais do respectivo Estado, do Distrito Federal ou Território Federal’ (LPP, art. 11, parágrafo único)” Portanto, se somente assim fosse, não haveria óbice para que o Diretório Nacional ou a comissão provisória Regional do Partido no Distrito Federal figurassem no polo ativo da AIME. Todavia, em relação ao segundo requerente, sua legitimidade deve ser afastada já que se encontra como não vigente no SGIP-TSE, conforme bem asseverou a d. Procuradoria Eleitoral, cujo parecer transcrevo em parte, como razão de decidir: “Todavia, cabe consignar que, segundo informações do Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias do c. TSE (SGIP-TSE) o PROS não possui atualmente diretório ou comissão provisória instalada no Distrito Federal. A extinção do órgão regional acarreta a perda de capacidade processual do segundo autor, afasta sua legitimidade ativa e torna sem efeito a procuração outorgada”. Nesse sentido, acolho em parte a preliminar de ilegitimidade ativa para excluir do polo ativo da lide somente a Comissão Provisória Regional do Partido Republicano da Ordem Social. PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL E FALTA DE INTERESSE DE AGIR POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. Quanto à inépcia da inicial, tenho que esta pressupõe que da narrativa dos fatos não decorra logicamente a conclusão, no entanto, pela leitura da peça inicial é possível compreender o pedido formulado, bem como seus fundamentos, tanto é assim que a defesa pôde exercer o seu direito de resposta, o que afasta a alegada inépcia da inicial. É certo que a exordial não descreve ato ardiloso, enganoso ou de má-fé praticado pela requerente, ou seja, a prática de ato censurável que justificasse a alegada fraude. 466 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Assim, poderia até se concluir que os requerentes pretendem rediscutir matéria já apreciada pela Corte Superior Eleitoral no REspe n. 0601163-35.2018.6.07.0000. No entanto, tal questão se confunde com o mérito, de forma que não cabe sua análise de forma preliminar, nos termos em que foi suscitada pela requerida. Do mesmo modo, tenho que não há como extinguir o feito em razão da inadequação da via eleita, uma vez que os autores pretendem a cassação do mandato eletivo da requerida Jaqueline Angela da Silva, sendo esta justamente a finalidade da AIME, que tem por objetivo desconstituir o mandado eletivo pela cassação do registro e do diploma. Portanto, deixo de acolher as preliminares de inépcia da inicial e de inadequação da via eleita suscitadas nos autos. MÉRITO A Ação de Impugnação ao Mandato Eletivo está amparada pelo artigo 14, §10, da Constituição Federal, onde determina que a ação poderá ser manejada no prazo de 15 dias contados da diplomação. No caso, a diplomação dos candidatos eleitos ocorreu no dia 18/12/2018 (terça- feira), logo, o prazo para interpor a ação iniciou-se no dia 19/12/2018 (quarta-feira) e, por ser decandencial, não se suspende ou se interrompe, vencendo no dia 02/01/2019 (quarta-feira), período em que esta Corte estava de recesso forense. Portanto, o prazo se encerrou no dia 07/01/2019 (segunda-feira), vez que prorrogado para o primeiro dia útil subsequente, conforme já se manifestou o egrégio TSE.  No entanto, a ação foi proposta somente no dia 16 de janeiro de 2019, quanto já operada a perda do direito de requerer a cassação do mandado eletivo de Jaqueline Ângela da Silva. Nesse sentido, trago a baila precedentes do egrégio Tribunal Superior Eleitoral: \"Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CAUTELAR. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. CASSAÇÃO. PREFEITO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. EFEITO IMEDIATO. DECADÊNCIA DO DIREITO. INEXISTÊNCIA. FUMUS BONI JURIS. AUSÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO. 1. O prazo para a propositura da AIME, conquanto tenha natureza decadencial, submete-se à regra do art. 184, § 1º, do CPC, segundo a qual se prorroga para o primeiro dia útil seguinte se o termo final cair em feriado ou dia em que não haja expediente normal no Tribunal. Precedentes. 2. As decisões proferidas em sede de AIME têm efeito imediato, ante a falta de previsão de efeito suspensivo recursal. 3. A ausência de demonstração da viabilidade do recurso inviabiliza a concessão de efeito suspensivo em sede cautelar. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 467

4. Agravo regimental a que se nega provimento.\" (AçãoCautelarnº428581,Acórdão,Relator(a)Min.MarceloRibeiro,Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 14/03/2011, Página 13/14)   \"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. INTEMPESTIVIDADE. AIME. PRAZO. ART. 184 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO. PLANTÃO. DESPROVIMENTO. 1. O prazo recursal é computado nas \"quartas-feiras de cinzas\", salvo comprovada a inexistência de expediente. 2. O prazo para a propositura da AIME, mesmo tendo natureza decadencial, submete-se à regra do art. 184, § 1º, do CPC, segundo a qual se prorroga para o primeiro dia útil seguinte se o termo final cair em feriado ou dia em que não haja expediente normal no Tribunal. 3. O regime de plantão não é considerado expediente normal. 4. Agravo regimental desprovido.\" (Recurso Especial Eleitoral nº 69244, Acórdão, Relator(a) Min. Marcelo Ribeiro, Publicação:  DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 06/10/2010, Página 62). Destaca-se, como bem fez o ilustre representante do Ministério Público Eleitoral, que a suspensão dos prazos, prevista no art. 2202 do Código de Processo Civil, alcança apenas os prazos processuais e, nesse sentido, não tem o condão de atingir a decadência ocorrida na presente ação. Confira-se a manifestação ministerial nesse ponto: “De toda sorte, o fluxo do prazo para ajuizamento da AIME não foi alterada pela entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, nomeadamente pela regra de suspensão dos prazos processuais estatuído no art. 220 da gizada Lei de Ritos. Nesse sentido, confira-se ainda a jurisprudência da eg. Corte Superior Eleitoral, in verbis: ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO EM VIRTUDE DA DECADÊNCIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL EVIDENCIADA. PRAZO DE AJUIZAMENTO DA AIME. NATUREZA MATERIAL. FÉRIAS DOS ADVOGADOS INSTITUÍDA PELO ART. 220 DO CÓDIGO FUX. IRRELEVÂNCIA. RECURSO CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. [...] 3. A redação do art. 220 do Código Fux que instituiu as férias dos advogados, de forma expressa, faz referência a suspensão de prazos de 2. Art. 220 do CPC. Suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 janeiro. 468 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

natureza processual. Assim, não há como, ainda que por meio de uma interpretação extensiva, incluir os prazos de natureza eminentemente material, como o prazo decadencial de ajuizamento da AIME, na suspensão determinada pelo referido dispositivo. 4. Considerando-se que esta Corte Superior possui o entendimento de que o prazo para a propositura da ação de impugnação de mandato eletivo, mesmo tendo natureza decadencial, prorroga-se para o primeiro dia útil seguinte, se o termo final cair em feriado ou dia em que não haja expediente normal no Tribunal, conclui-se que, na hipótese, a AIME deveria ter sido ajuizada até 9.1.2017. [...] (Recurso Especial Eleitoral nº 224, Acórdão, Relator(a) Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 191, Data 24/09/2018, Página 13/14 - destacamos)” Portanto, é manifesta a ocorrência de decadência do direito de ação no presente caso. Ante o exposto, declaro extinto o processo, com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, inciso II, do Código de Processo Civil, por ter se operado a decadência. É como voto. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.   DECISÃO Acolher, em parte, a preliminar de ilegitimidade ativa para excluir do polo ativo da lide somente a Comissão Provisória Regional do Partido Republicano da Ordem Social, rejeitar as preliminares de inépcia da inicial e de inadequação da via eleita e, no mérito, julgar extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do voto do eminente Relator. Decisão unânime. Brasília/DF, 13/09/2021.     3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 469

THIAGO PAIVA DOS SANTOS (JUIZ DO TRE-PR) TRE/PR - N. 0600097-28.2020.6.16.0023 ACÓRDÃO Nº 57.605 TEMA DESINCOMPATIBILIZAÇÃO EMENTA: ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. INELEGIBILIDADE. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. PRESIDENTE DE CONSELHO DA COMUNIDADE. EQUIPARAÇÃO A SERVIDOR PÚBLICO. AFASTAMENTO DE FATO NÃO CONFIGURADO. ABALO À IGUALDADE DE CHANCES PRESUMIDA. PROVIMENTO. 1. O conselho da comunidade é órgão da execução penal ao qual são atribuídas relevantíssimas funções públicas, dentre as quais cuidar da assistência à pessoa presa e fiscalizar o cumprimento das condições de suspensão da execução de pena privativa de liberdade, além de apresentar regularmente relatórios de suas atividades às autoridades. Inteligência dos artigos 10, 61, 81, 139 e 158 da Lei de Execução Penal. 2. Membros de conselhos que desempenham funções públicas são equiparados a servidor público para fins eleitorais. Precedentes do TSE e deste Regional. 470 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

3. Presidente de conselho da comunidade é equiparado a servidor público para fins eleitorais. Precedente deste Regional. 4. Para que se reconheça o afastamento de fato é imperativo que o servidor público, ainda que por equiparação, se afaste por completo das suas funções, de modo que a prática de atos acessórios e a manutenção potencial de atendimento às funções primárias, ainda que não exercidas, é suficiente para caracterizar a não desincompatibilização. 5. Quando o servidor público, ainda que por equiparação, não se afasta de suas funções públicas de fato e sequer formalmente, o abalo à isonomia entre os candidatos é presumida, independentemente da natureza da atividade exercida. 6. Recurso conhecido e provido. DECISÃO À unanimidade de votos, a Corte conheceu do recurso, e, no mérito, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Curitiba, 02/12/2020 (...) VOTO (...) MÉRITO Insurge-se o recorrente contra o deferimento do registro, alegando, em síntese, que são inelegíveis os servidores públicos que não se desincompatibilizarem até três meses antes do pleito, invocando o artigo 1º, inciso I, alínea \"l\", da LC nº 64/90. Descreve que o recorrido é presidente do Conselho da Comunidade previsto nos artigos 80 e 81 da Lei de Execução Penal, a ele competindo \"exercer ações e deliberações sobre matérias que se adequam como funções de natureza pública, à medida que a execução penal é de competência do estado\". Aponta que, no julgamento do recurso eleitoral nº 27534, havido em 10/10/2016, este regional firmou entendimento de que o presidente de conselho da comunidade é equiparado a servidor público, devendo desincompatibilizar-se três meses antes das eleições. Aduz que, na forma do artigo 2º da Instrução Normativa Conjunta nº 02/2014, da Corregedoria-Geral da Justiça do Paraná e do Ministério Público Estadual, o conselho da comunidade \"recebe valores recorrentes de prestação pecuniária, que se caracterizam como recurso público que são geridos pelo presidente do órgão\". Sustenta que, mesmo com a diminuição das atividades forenses, o conselho da comunidade \"continuou a efetuar o pagamento de funcionários e demais despesas administrativas, circunstância que transparece a continuidade do funcionamento da 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 471

entidade, (...) afastando por vez os argumentos da sentença de que a inelegibilidade pode ser afastada ante a ausência de atuação do recorrido no cargo nos últimos meses por conta da pandemia Covid-19\". Refere a existência de prova testemunhal dando conta de o conselho da comunidade ter oportunizado contato telefônico, inclusive via aplicativo Whatsapp, para atender seus usuários, colocando-se à disposição em caso de necessidade, bem como que, no mês de setembro, \"foi protocolado pedido subscrito pelo recorrido para liberação de verbas a serem utilizadas pelo conselho em questão no desenvolvimento de suas atividades no último trimestre de 2020, abrangendo-se (...) a aquisição de cestas básicas e passagens de ônibus\". Nas contrarrazões, o recorrido afirma que o cargo que ocupa não pode ser considerado público, uma vez que o conselho da comunidade \"não é órgão ou entidade da administração direta ou indireta dos entes federativos, bem como não é uma fundação pública ou privada\", constituindo-se \"como pessoa jurídica de direito privado, sob a forma de associação civil\", como previsto no artigo 6º da instrução normativa conjunta nº 01/2014 - CGJ/PR e MP/PR. Defende que interpretação diversa implicaria \"grave ofensa à segurança jurídica, bem como ao princípio da legalidade\". Narra que o conselho se encontra inativo desde quando \"todos os presos foram transferidos para outras comarcas na data de 24 de março de 2020, e após isso, a Cadeia Pública foi totalmente desativada\" e que, \"para não encerrar suas atividades de maneira total, manteve-se atividade administrativa para evitar a falta de prestação de contas, pagamento de tributos e taxas\", mas que \"não houve gastos com alimentação para presos, cestas básicas para familiares ou qualquer outro gasto que leve a crer que o conselho da comunidade funcionou nesse período\". Prossegue indicando que o conselho encontra-se sem sede desde abril de 2020 e que as verbas que recebe não são provenientes do orçamento público, mas sim extraorçamentárias, tratando-se de recursos privados. Conclui que \"a função ocupada pelo recorrido jamais teria o condão de causar desequilíbrio nas eleições que se aproximam, por total ausência de atividade do conselho da comunidade desde o mês de março de 2020\". Pois bem. A questão posta a julgamento está alicerçada no seguinte dispositivo da LC nº 64/90: Art. 1º São inelegíveis: (...) II - para Presidente e Vice-Presidente da República: (...) I) os que, servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos Territórios, inclusive das fundações mantidas pelo Poder Público, não se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito à percepção dos seus vencimentos integrais; (...) V - para o Senado Federal: a) os inelegíveis para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República especificados na alínea a do inciso II deste artigo e, no tocante às demais 472 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

alíneas, quando se tratar de repartição pública, associação ou empresa que opere no território do Estado, observados os mesmos prazos; (...) VII - para a Câmara Municipal: a) no que lhes for aplicável, por identidade de situações, os inelegíveis para o Senado Federal e para a Câmara dos Deputados, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização; No caso concreto, são três os pontos de controvérsia: a equiparação ou não do cargo ocupado pelo recorrido com o de servidor público; reconhecida esta, se estava afastado de fato de suas atividades; não afastado, se o cargo ocupado seria apto a causar abalo à isonomia de oportunidades entre os partícipes da eleição. Passa-se a analisá-los individualizadamente: a) Presidente de conselho - equiparação a servidor público O conselho da comunidade está previsto na lei nº 7.210/84 - Lei de Execução Penal - LEP nos seguintes termos: (...) Dessas disposições deflui que o conselho da comunidade é órgão da execução penal ao qual são atribuídas relevantíssimas funções públicas, dentre as quais cuidar da assistência à pessoa presa e fiscalizar o cumprimento das condições de suspensão da execução de pena privativa de liberdade, além de apresentar regularmente relatórios de suas atividades às autoridades. Note-se que a natureza pública dessa função é decorrência direta de previsão legal, inscrita no artigo 10 da LEP: Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. [não destacado no original] Estando patente que a atividade desempenhada pelos conselhos da comunidade é pública, resta aferir se aquele que a exerce encontra-se equiparado a servidor público. A equiparação do presidente de conselho da comunidade a servidor público para fins da inelegibilidade da alínea \"l\" do inciso II do artigo 1º da LC nº 64/90 já foi objeto de apreciação neste regional: (...) SEGUNDO RECURSO - REGISTRO INDEFERIDO - PRESIDENTE DE CONSELHO DA COMUNIDADE - ARTS. 80 E 81 DA LEP - PRAZO DE DESINCOMPATIBILIZAÇÃO NÃO OBEDECIDO - 3 (TRÊS) MESES ANTES DO PLEITO - INTELIGÊNCIA DO ART. 1º, II, \"l\", DA LC Nº 64/90 - DESPROVIDO. 1. Os conselheiros do Conselho da Comunidade devem se desincompatibilizar dos respectivos cargos, nos 3 (três) meses anteriores ao pleito, quando pretendam 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 473

concorrer em pleitos eleitorais, por serem equiparados a servidores públicos para os fins de desincompatibilização previstos na Lei Complementar nº 64/90. (...) 3. Recurso desprovido. [TRE-PR, RE nº 27534, rel. Josafá Antonio Lemes, PSESS 10/10/2016, não destacado no original] Em pesquisa realizada na jurisprudência, não se logrou localizar outro julgado que trate especificamente dos conselhos da comunidade, mas é farta a produção jurisprudencial em relação a outros conselhos privados que desempenham função pública: (...) 2. Constata-se que o acórdão embargado esclareceu suficientemente o fato de que, no caso dos autos, o embargante ocupa o cargo de Vice-Coordenador do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural de Afrânio/PE e, portanto, consoante à jurisprudência do TSE, equipara-se a Servidor Público. Nesse cenário, de acordo com o entendimento deste Tribunal Superior, deveria ter se desincompatibilizado de fato no prazo de 3 meses antes do pleito, o que não ocorreu, visto que participou de reunião do referido conselho, ainda que em tal ocasião não tenha havido deliberação. Portanto, na espécie, incide a inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso II da alínea \"l\" da LC 64/90. (...) [TSE, ED no AgR no REspE nº 10775/PE, rel. min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE 16/03/2017, não destacado no original] ELEIÇÕES 2016. REGISTRO. CANDIDATO. VEREADOR. DECISÕES. INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INDEFERIMENTO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. CONSELHO MUNICIPAL. NÃO COMPROVAÇÃO. 1. Embora o candidato sustente que houve indevida inversão do ônus da prova quanto à conclusão da falta da sua desincompatibilização do cargo de membro de conselho municipal, fato é que a Corte Regional Eleitoral apontou que ele, em momento algum, refutou a informação de que era presidente ou membro daquele órgão, restringindo-se a defender a impossibilidade de equiparação das funções ao cargo de servidor público e a não incidência da regra do art. 1º, II, l, da LC 64/90. 2. Conforme consignado na decisão regional, o Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável da referida localidade tem competência para executar ações atinentes ao plano municipal de desenvolvimento e, em situações similares, o Tribunal tem entendido exigível o afastamento do candidato. Precedentes: AgR-REspe 30.155, rel. Min. Eros Grau, PSESS em 30.10.2008; AgR- 474 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

REspe 22.493, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, PSESS em 13.9.2004. Agravo regimental a que se nega provimento. [TSE, AgR no REspE nº 15976, rel. min. Henrique Neves da Silva, PSESS 13/12/2016, não destacado no original] (...) 2. Por se tratar de restrição de direitos (por exemplo, restrição ao ius honorum), as normas concernentes a inelegibilidade, nas quais se incluem as regras de desincompatibilização, devem ser interpretadas restritivamente (Cta 459-71/ DF, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 19.5.2016). Assim, não merece reparos a decisão do Tribunal Regional, mormente porque o que deve ser levado em consideração, para fins de eventual equiparação a outros cargos públicos com vistas a estabelecer os prazos de desincompatibilização, são as atribuições e funções próprias do cargo exercido e a sua respectiva colocação na cadeia hierárquica do organograma do ente público, e não a simples nomenclatura do órgão ou do cargo público exercido. 3. O membro do Conselho Municipal de Defesa Civil equipara-se a Servidor Público, para fins eleitorais, devendo se desincompatibilizar do cargo que ocupa no prazo de 3 meses anteriores ao pleito, nos termos da alínea l do inciso II do art. 11 da LC 64/90. Precedente: AgR-REspe 33-77/BA, Rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, DJe 21.10.2013. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento. [TSE, AgR no REspE nº 44986/SP, rel. min. Napoleão Nunes Maia Filho, PSESS 17/11/2016, não destacado no original] RECURSO ELEITORAL - REGISTRO DE CANDIDATURA DE VEREADOR - IMPUGNAÇÃO POR FALTA DE DESINCOMPATIBILIZAÇÃO - CONSELHO MUNICIPAL -- ART. 1, II, \"l\" da LC 64/1990 - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Conforme jurisprudência do TSE, equiparam-se a servidores públicos os membros de conselhos municipais. 2. Comprovada a desincompatibilização tempestiva do recorrente das funções do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional, pois apresentada a comunicação de afastamento ao superior hierárquico em 05/05/2016. 3. Cabe ao impugnante demonstrar que não houve o afastamento de fato do exercício das funções. Precedentes do TSE e desta Corte Eleitoral. 4. Recurso conhecido e provido. [TRE-PR, RE nº 10278, rel. Paulo Afonso da Motta Ribeiro, PSESS 19/10/2016, não destacado no original] 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 475

Desses precedentes extrai-se que para haver a equiparação, é necessário que haja, dentre as atribuições do cargo em discussão, o desempenho de funções públicas, o que está plenamente demonstrado no caso dos conselhos da comunidade, como o presidido pelo recorrido. Em decorrência, tem-se que, no exercício da presidência do conselho da comunidade de Ribeirão Claro, o recorrido é equiparado a servidor público e, por isso, está sujeito à inelegibilidade do artigo 1º, inciso II, alínea \"l\", da LC nº 64/90. b) Afastamento das atividades Com a inicial da AIRC foi juntada prova de que o recorrido, na condição de presidente do conselho da comunidade de Ribeirão Claro, peticionou nos autos nº 0000916-71.2020.8.16.0144 em 14/09/2020 (id. 15306766), firmando pessoalmente a petição nos seguintes termos: (...) Com a contestação, o recorrido juntou documentos, dentre os quais há um cheque emitido no dia 31/08/2020 (id. 15307816) e outros seis emitidos no mês de setembro (id. 15307866). A par disso, também trouxe a prestação de contas do trimestre que vai de julho a setembro de 2020 (id. 15307716). Nesta, embora não esteja adequadamente discriminada como a do trimestre anterior (id. 15307666), é possível inferir que houve pagamento de honorários a psicólogo: (...) Ainda, apresentou cópia do ofício nº 124/20, datado de 24/03/2020, da delegacia de polícia de Ribeirão Claro (id. 15307616), pelo qual a autoridade policial informa a juíza da comarca que treze detentos \"foram removidos do SECAT de Ribeirão Claro-PR\" para outras localidades. (...) Posteriormente, foram juntadas peças dos autos nº 0000916-71.2020.8.16.0144, no qual consta, dentre os vários documentos, um termo de responsabilidade firmado pessoalmente pelo recorrido no dia 29/09/2020, pelo qual o conselho da comunidade de ribeirão claro recebe repasse no importe de R$ 11.650,00 e compromete-se a uma série de obrigações (id. 15308566, folhas 42-44). Em audiência, foi colhido o depoimento da testemunha Julia Maria Chagas Cirelli (id. 15308766). Do seu depoimento, extrai-se que: foi contratada como secretária do conselho da comunidade em abril de 2020 e que, desde então, nenhum serviço foi prestado às pessoas presas ou a seus familiares, referindo-se especificamente à distribuição de cestas básicas; os gastos do conselho no período foram apenas para a sua própria manutenção, ou seja, pagamento de funcionários, tributos, internet; embora contratada em abril, no mês de março participou de uma visita à delegacia, na companhia de pessoas ligadas ao conselho, dentre os quais não estava o recorrido; não houve nenhum atendimento, sequer nos casos de pessoas presas em flagrante. Quanto à possibilidade de algum familiar de detento precisar de atendimento, respondeu: Eles vêm atrás da gente. (...) Eu deixei o meu google disponível, deixei até com os seguranças do fórum (...) não tem um celular próprio pra isso, então 476 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

deixei o meu número pessoal, pra caso alguém precisasse de alguma coisa, mas até hoje, até agora, ninguém, desde o início da pandemia. Informou ainda que houve atuação do conselho em tratativas com entidades do município, como o asilo, a APAE e a ONG de proteção animal, para alocação de condenados para prestação de serviços à comunidade. Do cotejo entre as provas produzidas, verifica-se com meridiana clareza que o conselho da comunidade de Ribeirão Claro manteve-se ativo, inclusive nos três meses que antecederam as eleições, havendo a prática de atos de gestão pessoalmente pelo recorrido, sendo suficiente a prova para atestar que não houve o afastamento de fato de suas atividades como presidente. c) Abalo à isonomia entre os candidatos Pretende o recorrido que, uma vez que a atividade fim do conselho da comunidade não foi exercida nos três meses que antecederam as eleições, seja reconhecido que sua permanência na gestão da entidade não gerou abalos à igualdade de chances entre os candidatos, não havendo justificativa para a declaração de sua inelegibilidade. Este tópico veicula pretensão manifestamente improcedente. Quando se fala em desincompatibilização de servidor público, ainda que por equiparação, deve ser ela total, porque se presume que o exercício de um cargo ou função pública gera uma vantagem competitiva na captação de votos. Assim, ainda que se admita a ideia de que a atividade fim do conselho (assistência aos detentos e seus familiares) não estava sendo exercida, mas apenas as acessórias (pagamentos de funcionários e tributos, além de requisição de valores para custear a manutenção das atividades), o que se tem é pessoa equiparada a servidor público que não se afastou da função de fato e sequer formalmente. Vale lembrar que, no serviço público, há um sem número de cargos que não conferem ao servidor nenhuma vantagem óbvia mas que, mesmo assim, reclamam a desincompatibilização, sob pena de inelegibilidade. Portanto, sendo certo que o recorrido exerce o cargo de presidente do conselho da comunidade de Ribeirão Claro, do qual não se afastou de fato e, tampouco, formalmente nos três meses que antecederam o pleito, praticando atos próprios do seu cargo no período e que, nessas condições, o abalo à isonomia eleitoral é presumido, inarredável a conclusão de que se encontrava inelegível. CONCLUSÃO Sintetizando as considerações expendidas, CONHEÇO do recurso e, no mérito, DOU- LHE provimento para, reformando a sentença, julgar procedente a impugnação e, de consequência, indeferir o registro de candidatura de Marcelo Baggio Molini. THIAGO PAIVA DOS SANTOS RELATOR 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 477

JUIZ GUSTAVO ALVES PINTO TEIXEIRA (JUIZ DO TRE-RJ) TRE/RJ - N. 0600028-59.2020.6.19.0072 TEMA DUPLICIDADE DE FILIAÇÃO PARTIDÁRIA EMENTA: RECURSO ELEITORAL. COEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÕES PARTIDÁRIAS. FILIAÇÕES REALIZADAS NA MESMA DATA. MANUTENÇÃO DA FILIAÇÃO AO PTC. MANIFESTAÇÃO TEMPESTIVA DO ELEITOR E DO PARTIDO. DECISÃO A QUO QUE NÃO MERECE REFORMA. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. 1. Decisão judicial que determinou o cancelamento da filiação do eleitor ao PRTB, e a manutenção do vínculo com o PTC. 2. O art. 22, parágrafo único, da Lei 9.096/95 determina a manutenção da adesão mais recente. Filiações realizadas na mesma data. Ausência de previsão legal para cancelamento de ambas. 3. Não se pode negar o direito de filiação ao eleitor que se manifestou tempestivamente. Evidente intenção de manter-se filiado ao Partido TRABAHISTA CRISTÃO - PTC. Agremiação que também se manifestou favoravelmente a permanência do eleitor em seus quadros. PRTB não fez prova da filiação e reconheceu, após a sentença de primeiro grau, que o eleitor não tem vínculo com a legenda.  4. Manutenção da vinculação ao partido para o qual o eleitor declarou ter se filiado. Precedente da Corte. 478 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

5. Desprovimento do recurso do Ministério Público Eleitoral, mantendo-se in totum a sentença a quo. RELATÓRIO   O Gabinete informa que se trata de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, em face da decisão proferida pelo Juízo da 72ª Zona Eleitoral – Niterói (Id. 10840409), no âmbito de procedimento de dupla filiação partidária, que determinou o CANCELAMENTO da filiação do eleitor MANOEL FRANCISCO HERNANDEZ MORALEZ ao Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), e a MANUTENÇÃO do vínculo com o Partido Trabalhista Cristão (PTC). Em suas razões recursais (id 10841159) o Ministério Público Eleitoral aduz que havendo simultaneidade de filiações impõe-se o cancelamento de ambas. Sustenta que, conforme documentação acostada aos autos (id 1046164), o eleitor recorrido filiou-se, simultaneamente, ao PTC e ao PRTB, no dia 04.04.2020, o que é vedado pela legislação vigente. Afirma, ainda, que não logrou êxito em demonstrar que a filiação ao Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) ocorreu por motivos alheios a sua vontade e que, no caso em comento, a decisão guerreada acaba por privilegiar um candidato em detrimento dos outros, pois lhe foi concedido um prazo maior para a escolha da sua legenda partidária. A Procuradoria Regional Eleitoral (id 10962709) opinou pelo provimento do recurso, por entender que na hipótese caberia o cancelamento de ambas as filiações. Os recorridos, em contrarrazões (id 11194209), pugnam pela manutenção in totum da sentença. É o relatório. VOTO O recurso deve ser conhecido, já que presentes os requisitos de admissibilidade a tanto necessários. Dada a ausência de questões preliminares, passa-se, desde logo, a apreciação do mérito. Após o processamento das relações de filiados aos partidos políticos foi apontada a existência de duplicidade de filiações para o recorrido, que foi vinculado tanto ao PRTB quanto ao PTC no dia 04/04/2020, conforme informação juntada pelo cartório da 72ª Zona Eleitoral (id 10839959). Assim, observando o procedimento previsto na Resolução que dispõe sobre as filiações partidárias, o Juízo da 72ª Zona Eleitoral aguardou o pronunciamento do filiado e dos partidos políticos, após a expedição das notificações diretamente pelo TSE, nos moldes do art. 23, § 1°, da Res. TSE n° 23.596/19. Manoel Francisco Hernandez Moralez, bem como o Partido Trabalhista Cristão – PTC manifestaram-se tempestivamente, conforme id 10840109, requerendo a manutenção da filiação do eleitor a este partido. Na ocasião o recorrido peticionou nos autos informando que sua filiação ao PRTB foi indevida e que sempre teve a intenção de estar filiado ao PTC. O PRTB quedou-se inerte. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 479

Logo em seguida à promoção ministerial pelo cancelamento de ambas as inscrições partidárias, foi exarada sentença determinando o cancelamento da filiação do eleitor ao PRTB, e a manutenção do vínculo com o PTC, o que foi cumprido pelo cartório, conforme certificado no id 10840909. Inconformado com a decisão proferida, o ilustre parquet recorreu. Pois bem, vamos ao pano de fundo da discussão acerca da dupla filiação. O atual comando normativo sobre a coexistência de filiações não determina o cancelamento imediato de todas as inscrições partidárias do eleitor. Como cediço, após a alteração trazida pela Lei nº 12.891/13, não há mais o cancelamento de ambas as filiações, como outrora. A Lei dos Partidos Políticos agora reconhece que, diante da coexistência de filiações partidárias, deve prevalecer a mais recente. Senão vejamos: “Lei nº 9.096/95: Art. 22. O cancelamento imediato da filiação partidária verifica-se nos casos de: (...) V - filiação a outro partido, desde que a pessoa comunique o fato ao juiz da respectiva Zona Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013) Parágrafo único. Havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo a Justiça Eleitoral determinar o cancelamento das demais. *** Res. TSE nº 23.596/2019: Art. 22. Havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo as demais ser canceladas automaticamente durante o processamento de que trata o art. 19 desta resolução (Lei nº 9.096/1995, art. 22, parágrafo único).” Inexiste, pois, no atual ordenamento jurídico previsão de cancelamento imediato de ambas as filiações, medida adotada anteriormente ao advento da Lei n.º 12.891/2013. Assim, temos que para os casos de coexistência de inscrições, a legislação estabelece que deverá prevalecer a mais recente. Pois bem. In casu, verifica-se que ambas as adesões do eleitor foram efetivadas na mesma data, não se podendo precisar qual das duas é a mais recente. Eis o ponto de inflexão. Existindo filiações partidárias simultâneas, o artigo 23 da Resolução TSE n.° 23.596/19 prevê a instauração de procedimento de ofício, pelo TSE, que comporta a oitiva dos envolvidos e decisão por parte da autoridade judicial. Confira-se: “Art. 23. Detectados, no processamento, registros com idêntica data de filiação, serão expedidas, pelo TSE, notificações ao filiado e aos partidos envolvidos. § 1º As notificações de que trata o caput deste artigo serão expedidas por 480 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

via postal ao endereço constante do cadastro eleitoral, quando dirigidas a eleitor filiado, e pela rede mundial de computadores, no espaço destinado à manutenção de relações de filiados pelos partidos, quando dirigidas aos diretórios partidários. § 2º O processo para julgamento das situações descritas no caput deste artigo deverá ser autuado na Classe Filiação Partidária (FP) e será de competência do juízo eleitoral da zona de inscrição do filiado. § 3º As partes envolvidas terão o prazo de vinte dias para apresentar resposta, contados da realização do processamento das informações. § 4º Apresentada a resposta ou decorrido o respectivo prazo, será aberta vista ao Ministério Público, por cinco dias, após os quais, com ou sem manifestação, o juiz decidirá em idêntico prazo. § 5º A situação das filiações a que se refere o caput deste artigo permanecerá como sub judice até que haja o registro da decisão da autoridade judiciária eleitoral competente no sistema de filiação partidária. § 6º Para fins do disposto no § 1º deste artigo, caberá aos partidos políticos orientar seus filiados a manter atualizados seus dados cadastrais perante a Justiça Eleitoral. § 7º Verificados indícios de falsidade, abuso, fraude ou simulação na inclusão do registro de filiação ou na sua retificação, o juiz eleitoral dará ciência ao Ministério Público Eleitoral para as providências cabíveis e apuração de eventual responsabilidade pela prática de crimes eleitorais.” Dos dispositivos legais transcritos depreende-se, a nosso sentir, a intenção do legislador de prestigiar a manifestação de vontade do eleitor. Do contrário, s.m.j., teria sido mantida a previsão de cancelamento automático das filiações simultâneas, independentemente de oitiva das partes. E não foi essa a alteração trazida pela Minirreforma Eleitoral de 2013. Pelo contrário, o legislador optou por criar um critério temporal para definir qual filiação deveria permanecer válida. Acrescente-se a isso a edição de Resolução pelo Colendo Tribunal Superior Eleitoral (acima transcrita) - na expressão de sua função normativa – em que está previsto procedimento para os casos de filiação simultânea, ou seja, aquelas nas quais consta a mesma data de filiação no sistema FILIA. Esses dois movimentos convergentes, legislativo e poder normativo da Colenda Corte Eleitoral, na disciplina da matéria específica não devem ser desconsiderados. Isso porque, para além de seu efeito cogente, essa previsão que permite a manifestação dos interessados se coaduna com a realidade encontrada pelos futuros candidatos em relação à organização de diretórios partidários locais, que, via de regra, não possuem estrutura adequada e que, por vezes, pode conduzir a equívocos nos lançamentos das informações nos sistemas desta Justiça Eleitoral. Aqui, por pertinente, destaco este ponto, a inserção de dados no sistema FILIA. Não raro a coincidência de datas ocorre, pois os partidos deixam para efetivar o referido 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 481

cadastro das filiações na última data, para que seja observado o prazo de 6 meses antes do pleito vindouro. Esse ano a data foi 04/04/2020. Não por coincidência as datas simultâneas são quase sempre dia 3 ou 4 do mês de abril, perto do termo final para a filiação dos futuros candidatos. Da quadra tal como posta, infere-se que o eleitor não detém total controle sobre a efetivação de sua filiação partidária, que se perfaz com o lançamento no sistema FILIA pela própria agremiação. Portanto, o procedimento permite o esclarecimento por parte dos interessados de eventuais discrepâncias nos dados do sistema FILIA e a realidade dos fatos. Dessa forma, entender cabível a manifestação do eleitor, todavia não considerá-la quando da apreciação do pedido parece-me, data maxima venia, fazer letra morta dos dispositivos supracitados. Acrescente-se, ainda, que a interferência desta Justiça Especializada na relação entre filiados e agremiação deve se limitar às hipóteses legais previstas, pois se trata de relação privada que, em regra, é regulada pelos respectivos estatutos partidários. Assim, não havendo determinação legal para o cancelamento de ambas as filiações quando simultâneas, deve-se prestigiar o animus vinculandi do cidadão. É a partir deste vínculo estabelecido que o eleitor pode ostentar a condição de elegibilidade prevista no art. 14, § 1º, V, da Constituição da República, sendo certo que impossibilitar a participação nas eleições vindouras deve ser a última ratio. Todavia, embora por um lado a legislação de regência abra oportunidade para manifestação daquele que se associa à legenda partidária, também estabelece um marco temporal bem definido para o exercício desta faculdade, tanto para o eleitor, quanto para os órgãos partidários acerca de possível equívoco nas filiações detectadas pelo sistema FILIA. A Portaria TSE n.º 131 de 20/02/2020, regulamentando o procedimento previsto na Resolução TSE 23.596/19, estabelece o cronograma para tratamento dos dados sobre filiação partidária e fixa a data de 18 de maio de 2020 como o último dia para apresentação de resposta por filiados e partidos envolvidos. De fato, há que se delimitar a oportunidade de manifestação da vontade do futuro candidato, sob pena de se criar não uma chance para sanar problemas quanto ao vínculo partidário, mas sim um novo procedimento de filiação, no qual Justiça Eleitoral fica à disposição do eleitor. Ademais, admitir que esta manifestação ocorra a qualquer tempo fatalmente causará desigualdade entre os players quanto ao prazo de escolha para a necessária vinculação a uma agremiação. Explico: o filiado que está em situação de duplicidade deve dispor, apenas do tempo suficiente, para esclarecimento de eventuais equívocos, como determina a Resolução supramencionada. Dessa forma, a data de 18 de maio é o termo final para que a manifestação do cidadão e dos partidos envolvidos seja tempestiva e, consequentemente, considerada quando da apreciação do seu pedido. 482 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

No caso em apreço, tão logo intimado sobre a duplicidade de inscrições partidárias, o eleitor manifestou-se no sentido de permanecer filiado ao Partido Trabalhista Cristão (PTC). O PRTB, por seu turno, apesar de notificado no início do procedimento, bem como intimado da decisão de cancelamento das filiações (id 10840759), não trouxe nenhuma comprovação aos autos de que o eleitor recorrido teria solicitado sua inclusão nos quadros desta agremiação partidária. Pelo contrário, em resposta ao e-mail de notificação enviado pelo Cartório da 72ª Zona Eleitoral, o representante da referida legenda afirmou que o Sr. Manoel não integra o partido. Ora, não se pode negar o direito de filiação ao eleitor que se manifestou tempestivamente quando notificado pelo Tribunal Superior Eleitoral sobre a duplicidade de filiações partidárias. A meu sentir, a medida de cancelamento de ambas as filiações traria grave prejuízo ao recorrido, sendo certo que inexiste base indene de dúvida que confirme tenha ele optado por se filiar a dois partidos distintos na mesma data. Esta Corte, já se manifestou pela manutenção da filiação ao partido indicado pelo eleitor em caso similar, senão vejamos:    “RECURSO ELEITORAL. COEXISTÊNCIA DE FILIAÇÕES. NOVA REDAÇÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 22 DA LEI Nº 9096/95. MANUTENÇÃO DA FILIAÇÃO MAIS RECENTE.  INSCRIÇÕES COM A MESMA DATA. IMPOSSIBILIDADE DE CANCELAMENTO DE AMBAS AS INSCRIÇÕES POR FALTA DE PREVISÃO LEGAL. CANCELAMENTO DA FILIAÇÃO AO PRTB. MANUTENÇÃO DA FILIAÇÃO AO PV. PROVIMENTO DO RECURSO.”  RECURSO ELEITORAL .nº 4895, Acórdão de 03/08/2016, Relator(a) JACQUELINE LIMA MONTENEGRO, Publicação: DJERJ - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 195, Data 15/08/2016, Página 33/40  Ressalto, por pertinente, que no precedente citado, o próprio eleitor afirmou ter assinado duas fichas de filiação a partidos distintos, o que não impediu que se adotasse a solução de manter sua filiação à legenda por ele indicada nos autos do processo. Por todo o exposto, voto pelo desprovimento do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral, mantendo in totum a sentença a quo. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 483

JUIZ EDUARDO ANTÔNIO DE CAMPOS LOPES (JUIZ DO TRE-AL) TRE/AL - N. 0600173-60.2020.6.02.0017 TEMA INELEGIBILIDADE. ART. 14, §7º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA ACÓRDÃO ELEIÇÕES 2020. PARIPUEIRA/AL. RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO DE PREFEITO. CÔNJUGE DO RECORRIDO PREFEITA EM MUNICÍPIO VIZINHO. INELEGIBILIDADE. ART. 14, § 7º, DA CF/88. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRECEDENTES DO TSE. NÃO APLICAÇÃO DA TEORIA DOS PREFEITOS ITINERANTES AO CASO. RECURSO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO. REGISTRO DE CANDIDATURA DEFERIDO. RELATÓRIO Cuidam os autos de Recurso Eleitoral manejado por A COLIGAÇÃO “MUDA PARIPUEIRA” e EDVÂNIO DE LIMA SANTOS (VÂNIO MIL COISAS), em face de sentença do 484 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Juízo da 17ª Zona Eleitoral, que julgou improcedente Ação de Impugnação de Registro de Candidatura oferecida em desfavor de CARLOS ABRAHÃO GOMES DE MOURA. Na origem, a postulação inaugural levantava a inelegibilidade do Recorrido ao Cargo de Prefeito do município de Paripueira, em razão de ter sido eleito prefeito do referido município de Paripueira no período de 2009-2012, reeleito para o período de 2013- 2016, além do fato de que sua esposa, Emanuella Corado Acioli de Moura elegeu-se prefeita em Barra de Santo Antônio para o período 2016-2020, candidata à reeleição. Na Sentença recorrida de ID 4565413, o Douto Magistrado da 17ª Zona Eleitoral, afastando a tese impugnatória, entendeu que o Recorrido não seria inelegível ao Cargo de Prefeito do município de Paripueira, em razão de vedação reflexa provocada pelo exercício de mandato executivo de sua esposa no município circunvizinho de Barra de Santo Antônio. Segundo as razões de recurso (ID 4565563) ao caso demonstra uma forma de perpetuação no poder e que a teoria dos prefeitos itinerantes merece ser observada também no caso em que há uma alternância na candidatura de parentes, como forma de se esquivar das regras de inelegibilidade. Nas contrarrazões de ID 4566013 o Recorrido defende ser plenamente elegível, posto que a tese impugnatória amplia restrições à míngua de previsão de regra expressa nesse sentido. Com vistas dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela procedência do presente recurso, posto que, à luz do princípio republicano, não é possível a perpetuação de uma pessoa, ou grupo familiar, a frente da chefia do executivo, exigindo-se a alternância do poder. É o relato dos autos. VOTO De plano, verifico a regularidade do Recurso em apreço, posto que atendidos todos os requisitos para sua admissibilidade, notadamente no que diz respeito à legitimidade das partes, interesse recursal, prazo de interposição, além de se revestir de forma e conteúdo adequados à espécie. Por tal razão, conheço do apelo. Não há preliminares a enfrentar, motivo pelo qual passo, sem maiores delongas, ao exame do mérito da causa. A questão posta nos autos, inaugurada pela Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, desenvolve-se a partir do argumento de que o Recorrido, CARLOS ABRAHÃO GOMES DE MOURA, candidato ao cargo de Prefeito do Município de Paripueira/AL seria inelegível, uma vez que sua esposa, Emanuella Corado Acioli de Moura elegeu-se prefeita em Barra de Santo Antônio para o período 2016-2020, além de ser candidata à reeleição. Na origem, entendeu o Douto Magistrado da 17ª Zona Eleitoral que aludidas circunstâncias não determinam a situação de inelegibilidade do Recorrido. A tese a impedir a candidatura do Recorrido decorre de uma extensão da ratio decidendi do precedente conhecido pela expressão “prefeito itinerante”, uma vez que os 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 485

referidos cônjuges se alternariam à frente do executivo dos municípios circunvizinhos de Paripueira e Barra de Santo Antônio, conforme descrito abaixo: (i) no período de 2009-2012, Carlos Abrahão ocupou o cargo de Prefeito de Paripueira/AL; (ii) no período de 2013-2016, Carlos Abrahão ocupou em reeleição o cargo de Prefeito de Paripueira/AL; (iii) no período de 2016-2020, Emanuella Corado (esposa do Recorrente) exerceu mandato de Prefeita no Município circunvizinho de Barra de Santo Antonio/AL; Inicialmente transcrevo os §§ 5º e 7º do art. 14 da Carta Política de 1988, pontos de partida na tutela da matéria: Art. 14. omissis. § 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente. (…) § 7º - São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. Acerca do tema, cabe relembrar que este Tribunal foi pioneiro ao defender que a candidatura de prefeito reeleito a idêntico cargo em município diverso, configura fraude à Constituição, uma vez que revela a tentativa de exercer três mandatos consecutivos de chefe do executivo municipal, o que é expressamente vedado pelo texto constitucional (art. 14, § 5º). Cito o Acórdão nº 5.579, de 06/09/2008, da lavra do douto Desembargador Eleitoral Manoel Cavalcante de Lima Neto, então membro desta Corte, referente ao Recurso Eleitoral nº 456, que tratou do registro de candidatura do Sr. Cícero Cavalcante de Araújo no pleito de 2008. O colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 637.485/RJ, com repercussão geral, acolheu a tese lançada e alterou a jurisprudência nessa matéria, firmando a proibição de terceira eleição consecutiva para prefeito, ainda que se concorra em municípios diversos. Em razão da segurança jurídica, a Corte Suprema modulou os efeitos da decisão, para que a nova interpretação fosse aplicada apenas no pleito eleitoral posterior ao de 2008. Transcrevo a seguir parte da ementa do referido julgado: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REELEIÇÃO. PREFEITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. I. REELEIÇÃO. MUNICÍPIOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 14, § 486 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

5º, DA CONSTITUIÇÃO. PREFEITO. PROIBIÇÃO DE TERCEIRA ELEIÇÃO EM CARGO DA MESMA NATUREZA, AINDA QUE EM MUNICÍPIO DIVERSO. O instituto da reeleição tem fundamento não somente no postulado da continuidade administrativa, mas também no princípio republicano, que impede a perpetuação de uma mesma pessoa ou grupo no poder. O princípio republicano condiciona a interpretação e a aplicação do próprio comando da norma constitucional, de modo que a reeleição é permitida por apenas uma única vez. Esse princípio impede a terceira eleição não apenas no mesmo município, mas em relação a qualquer outro município da federação. Entendimento contrário tornaria possível a figura do denominado “prefeito itinerante” ou do “prefeito profissional”, o que claramente é incompatível com esse princípio, que também traduz um postulado de temporariedade/alternância do exercício do poder. Portanto, ambos os princípios – continuidade administrativa e republicanismo – condicionam a interpretação e a aplicação teleológicas do art. 14, § 5º, da Constituição. O cidadão que exerce dois mandatos consecutivos como prefeito de determinado município fica inelegível para o cargo da mesma natureza em qualquer outro município da federação. II. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. ANTERIORIDADE ELEITORAL. NECESSIDADE DE AJUSTE DOS EFEITOS DA DECISÃO. (…) IV. EFEITOS DO PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Recurso extraordinário provido para: (1) resolver o caso concreto no sentido de que a decisão do TSE no RESPE 41.980-06, apesar de ter entendido corretamente que é inelegível para o cargo de Prefeito o cidadão que exerceu por dois mandatos consecutivos cargo de mesma natureza em Município diverso, não pode incidir sobre o diploma regularmente concedido ao recorrente, vencedor das eleições de 2008 para Prefeito do Município de Valença-RJ; (2) deixar assentados, sob o regime da repercussão geral, os seguintes entendimentos: (2.1) o art. 14, § 5º, da Constituição, deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição é absoluta e torna inelegível para determinado cargo de Chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos (reeleito uma única vez) em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso; (2.2) as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral ou logo após o seu encerramento, impliquem mudança de jurisprudência, não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. (RE nº 637.485/RJ, Acórdão de 01/08/2012, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 21/05/2013) 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 487

Uma análise apressada do caso ora em julgamento, poder-se-ia levar a rápida conclusão de que deveria ser estendida a decisão da Suprema Corte, que trata do chamado “prefeito profissional ou itinerante”, aos cônjuges e parentes consanguíneos ou afins até o segundo grau ou por adoção do chefe do executivo, em razão do que dispõe o § 7º do art. 14 da CF/88. Convém lembrar, no entanto, que a matéria em apreço trata do direito fundamental de sufrágio, sob a ótica de sua dimensão passiva, ou seja, de ser escolhido, por meio do voto popular, para participar da condução da vida política do Estado e na administração dos interesses da coletividade. Assim, quando se fala em restringir direito fundamental, deve haver, em regra, expressa previsão legal ou constitucional, ou norma implícita na Constituição que autorize a interpretação no sentido de se limitar o exercício de direito político consagrado ao cidadão pelo texto máximo. Em se tratando, portanto, do regime das inelegibilidades a imposição de limites à ampla participação do cidadão ser exceção, justificável apenas em casos específicos. Com efeito, as interpretações a serem atribuídas às normas infraconstitucionais ou mesmo às regras constitucionais devem resguardar, sempre que possível, o pleno exercício dos direitos políticos. Dessa forma, a tese impugnatória presente nos autos, segundo a qual o sentido mais adequada à expressão “território da jurisdição” (art. 14, §7º da CR/88) deva ser ampliado, de modo a não significar mais apenas o restrito espaço territorial de projeção da competência administrativa do cargo eletivo a que se pretende a titularidade, revela- se impertinente e inconstitucional. Deveras, acaso a tese da Impugnação encontrasse aceitação neste julgamento, estar- se-ia privilegiando uma interpretação ampliativa voltada a restringir injustificadamente os direitos políticos fundamentais da Recorrente, invertendo-se toda lógica jurídica da hermenêutica constitucional. As possibilidades semânticas da expressão “território da jurisdição” permitem até melhorar o entendimento acerca do espaço geográfico de incidência da inelegibilidade reflexa, no propósito de compreender que, em verdade, trata-se de “circunscrição” e não propriamente “jurisdição”. Contudo, não há nenhum suporte linguístico que faça com que “território da jurisdição” signifique aleatoriamente “território de influência política da família”, como pretende a tese impugnatória. O texto constitucional não permite essa leitura extremamente ampliativa, concebida com o desiderato de cercear os direitos políticos da Recorrente. Sobre o tema a jurisprudência já vem se posicionando no sentido de que a interpretação a ser feita acerca da parte final do § 7º do art. 14 da Constituição deve ser restritiva, conforme o seguinte julgado do colendo STF, cuja ementa abaixo ilustra: 488 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

EMENTA: Recurso Extraordinário. 2. Matéria eleitoral. 3. Artigo 14, § 7º, parte final, da CF. Cláusula de inelegibilidade. Exceção. Interpretação restritiva que alcança, tão-somente, os titulares de mandato eletivo e não beneficia os suplentes. 4. Recurso Extraordinário que se nega provimento. (RE nº 409.459/BA, Acórdão de 20/04/2004, Rel. Min. Gilmar Mendes, Dj de 04/06/2004) Por óbvio, o § 7º do art. 14 da Carta Política de 1988 encerra, em seu conteúdo, clara restrição a direito político passivo do cidadão, o que requer, em sua interpretação, todo cuidado do aplicador do direito. Não se desconhece que o citado dispositivo foi insculpido no texto constitucional com a finalidade de se evitar o continuísmo familiar, isto é, a perpetuação de um mesmo grupo familiar no exercício do poder político, entretanto, sua aplicação deve ser cercada de cautelas e realizada dentro dos limites objetivos ditados por uma boa hermenêutica. No caso em exame, penso que a Ratio a incidir no caso não deve acompanhar a interpretação extensiva dada ao § 5º do art. 14 da Lei Fundamental, pela Corte Suprema, na hipótese dos “Prefeitos Itinerantes”. Explico o porquê. Da leitura do § 7º do art. 14, observa-se que ele é taxativo em afirmar que a inelegibilidade restringe-se ao território de jurisdição do titular, ou seja, ao local da federação onde o candidato eleito para o Executivo exerce a titularidade do mandato executivo. Muito embora o STF tenha ampliado o conceito de “jurisdição do titular”, leia- se circunscrição eleitoral, penso não ser razoável, no caso em tela, a interpretação extensiva do dispositivo mencionado, pois, em se adotando tal posição, poder-se-ia criar situações paradoxais, ilógicas, a ponto de um filho ou irmão de prefeito reeleito ficar inelegível em qualquer município da federação. Veja-se a seguinte hipótese: Prefeito do Município de Rio Branco, no Estado do Acre, no exercício do segundo mandato consecutivo, tornaria seus filhos, genitores, irmãos e cônjuge, por exemplo, inelegíveis para disputarem qualquer prefeitura em qualquer unidade da federação. Lembro que a decisão do Supremo Tribunal Federal no RE nº 637.485/RJ, julgado com repercussão geral, assentou que “o cidadão que exerce dois mandatos consecutivos como prefeito de determinado município fica inelegível para o cargo da mesma natureza em qualquer outro município da federação.” Pergunto então: pode-se extrair dessa afirmação a premissa de que o cônjuge ou parente consanguíneo ou afim, até o segundo grau ou por adoção, também estaria inelegível para o mesmo cargo do titular, em segundo mandato, em qualquer outro município da federação? A resposta não é fácil, evidente, mas penso que a melhor solução, a mais consentânea com a Constituição e com o sistema de proteção dos direitos fundamentais, é a de que a inelegibilidade do cônjuge e dos parentes até o segundo grau deve ficar restrita ao território (circunscrição eleitoral) onde o 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 489

Chefe do Executivo exerça a titularidade, preservando-se a liberdade do cidadão de acesso aos cargos públicos. Exatamente sobre esta temática, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral já se manifestou em diversas oportunidades, não acolhendo a tese lançada no Recurso, vejamos: AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. INELEGIBILIDADE REFLEXA. ART. 14, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MUNICÍPIO DESMEMBRADO. VÍNCULO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA. NÃO PROVIMENTO. 1. O cônjuge e os parentes de prefeito em segundo mandato são elegíveis em outra circunscrição eleitoral, ainda que em município vizinho, desde que este não resulte de desmembramento, incorporação ou fusão realizada na legislatura imediatamente anterior ao pleito. Precedentes. 2. Na espécie, não há óbice à candidatura da agravada, pois é incontroverso que o Município de Porto Seguro/BA, pelo qual concorre, foi desmembrado do Município de Eunápolis/BA há mais de vinte anos, o que evidencia sua autonomia administrativa (Precedente: AgR-REspe 167-86, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS de 13.11.2012). 3. Agravo regimental não provido. (AgR no REspe nº 832-91/BA, Acórdão de 11/12/2012, Relª. Minª. Nancy Andrighi, Publicado em sessão) CONSULTA. INELEGIBILIDADE. PARENTESCO. CÔNJUGE. PREFEITO REELEITO. MUNICÍPIO VIZINHO. ART. 14, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RESPOSTA AFIRMATIVA. 1. Cônjuge e parentes de prefeito reeleito não são inelegíveis para o mesmo cargo em município vizinho, salvo se este resultar de desmembramento, de incorporação ou de fusão. 2. Consulta respondida afirmativamente. (Consulta nº 1811-06/DF, Acórdão de 05/06/2012, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 22/08/2012) (destaquei) Aliás, esse último precedente, que cuida de uma consulta respondida pela Corte Superior Eleitoral, suscita a discussão de um ponto relevante, que é a segurança jurídica, a preservação da estabilidade das coisas, do direito do cidadão-candidato não ser surpreendido no curso do processo eleitoral, ou pior, após o seu encerramento. É evidente que a consulta respondida pelo TSE não vincula os órgãos desta Justiça, mas serve de norte para os Tribunais Regionais e Juízes Eleitorais, e também para aqueles que almejam disputar um cargo eletivo, para os partidos políticos e até, porque não, para os eleitores. 490 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Parece-me lógico concluir que uma consulta respondida no sentido de atestar que “o cônjuge e parentes de prefeito reeleito não são inelegíveis para o mesmo cargo em município vizinho, salvo se este resultar de desmembramento, de incorporação ou de fusão”, cria, nos atores do cenário político, uma expectativa de direito, uma esperança na estabilidade das decisões e da interpretação da legislação, não sendo, assim, razoável mudar a regra do jogo no decorrer da campanha ou ao final dela. Vale ressaltar que a segurança jurídica, no âmbito eleitoral, está consagrada no art. 16 da Constituição Federal, e não foi por outro motivo que a Corte Suprema, ao alterar a jurisprudência em relação ao chamado “prefeito itinerante”, determinou que a aplicação da decisão somente ocorresse na eleição posterior. A respeito desse ponto, destaco trecho da ementa do RE nº 637.485/RJ: II. MUDANÇA DA JURISPRUDÊNCIA EM MATÉRIA ELEITORAL. SEGURANÇA JURÍDICA. ANTERIORIDADE ELEITORAL. NECESSIDADE DE AJUSTE DOS EFEITOS DA DECISÃO. Mudanças radicais na interpretação da Constituição devem ser acompanhadas da devida e cuidadosa reflexão sobre suas consequências, tendo em vista o postulado da segurança jurídica. Não só a Corte Constitucional, mas também o Tribunal que exerce o papel de órgão de cúpula da Justiça Eleitoral devem adotar tais cautelas por ocasião das chamadas viragens jurisprudenciais na interpretação dos preceitos constitucionais que dizem respeito aos direitos políticos e ao processo eleitoral. Não se pode deixar de considerar o peculiar caráter normativo dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, que regem todo o processo eleitoral. Mudanças na jurisprudência eleitoral, portanto, têm efeitos normativos diretos sobre os pleitos eleitorais, com sérias repercussões sobre os direitos fundamentais dos cidadãos (eleitores e candidatos) e partidos políticos. No âmbito eleitoral, a segurança jurídica assume a sua face de princípio da confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos prélios eleitorais. A importância fundamental do princípio da segurança jurídica para o regular transcurso dos processos eleitorais está plasmada no princípio da anterioridade eleitoral positivado no art. 16 da Constituição. O Supremo Tribunal Federal fixou a interpretação desse artigo 16, entendendo-o como uma garantia constitucional (1) do devido processo legal eleitoral, (2) da igualdade de chances e (3) das minorias (RE 633.703). Em razão do caráter especialmente peculiar dos atos judiciais emanados do Tribunal Superior Eleitoral, os quais regem normativamente todo o processo eleitoral, é razoável concluir que a Constituição também alberga uma norma, ainda que implícita, que traduz o postulado da segurança jurídica como princípio da anterioridade ou anualidade em 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 491

relação à alteração da jurisprudência do TSE. Assim, as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que, no curso do pleito eleitoral (ou logo após o seu encerramento), impliquem mudança de jurisprudência (e dessa forma repercutam sobre a segurança jurídica), não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior. (...) Assim, acompanho a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de que cônjuge de prefeito reeleito não é inelegível para idêntico cargo em município diverso, ainda que vizinho, salvo se resultado de desmembramento, de incorporação ou de fusão, pois, como dito pelo STF, no julgado acima, a segurança jurídica, no processo eleitoral, “assume a sua face de princípio da confiança para proteger a estabilização das expectativas de todos aqueles que de alguma forma participam dos prélios eleitorais.” Assim, voto no sentido de conhecer do presente Recurso, a fim de lhe negar provimento, mantendo a Sentença atacada incólume, para deferir o pedido Registro de Candidatura de CARLOS ABRAHÃO GOMES DE MOURA ao cargo de Prefeito do Município de Paripueira/AL É como voto. DES. ELEITORAL EDUARDO ANTONIO DE CAMPOS LOPES RELATOR 492 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

JUIZ FABRÍCIO FROTA MARQUES (JUIZ DO TRE-AM) TRE/AM - N. 0600039-74.2020.6.04.0050 TEMA INELEGIBILIDADE. ART. 1°, INCISO I, DA ALÍNEA “G”, DA LEI COMPLEMENTAR N° 64/90 EMENTA: ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. ALÍNEA G. REJEIÇÃO DE CONTAS. LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. NÃO OBSERVÂNCIA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROVIMENTO. 1. Os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes (art. 1º, inciso I, alínea “g”, da LC 64/90). 2. Os requisitos que compõem a mencionada alínea são: a) irregularidade insanável; b) emanado por órgão competente a julgar as contas em definitivo; c) ato doloso de improbidade administrativa; d) não for suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 493

3. De acordo com assente jurisprudência do TSE no último pleito, o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, que, juntamente com os demais requisitos identificados, atrai a causa de inelegibilidade da alínea “g” em questão. 4. Em alguns casos, ainda que o ato não observe os ditames da LFR, é possível superar essa irregularidade e afastar a inelegibilidade em questão. No entanto, no caso dos autos, a reprovabilidade revela- se acentuada, porquanto, de acordo com a Corte de Contas regional, o ato reprovado comprometeu o “fiel acompanhamento das ações governamentais, pela sociedade, [im]possibilitando o acesso às informações financeiras e orçamentárias da Administração Pública”. 5. Recurso conhecido e desprovido. RELATÓRIO Trata-se de RECURSO ELEITORAL interposto pelo Ministério Público contra sentença do Juízo da 50ª Zona Eleitoral que deferiu pedido de registro de candidatura de FERNANDES DA SILVA MOTA, ora recorrida, cargo prefeito, eleições 2020, Juruá/AM. Eis o teor da sentença vergastada (ID 4668356): (...) Dessa forma, torna-se impossível agasalhar o argumento do Impugnante, pois evidenciado no Acórdão nº 680/2019 TCE-AM que o impugnado foi condenado ao pagamento de multa, ausente imputação de débito, bem como o reconhecimento de má-fé ou de nota de improbidade, afastando- se, portanto, a existência de locupletamento ilícito, o que inviabiliza a conclusão pelo reconhecimento da inelegibilidade. Isto porque, a decisão de rejeição de contas somente atrairia a mencionada restrição se, além dos demais requisitos legais, decorresse de uma conduta ímproba dolosa do gestor público. Delineado o quadro, inexistentes, no caso concreto, elementos mínimos que revelem o ato doloso de improbidade administrativa, a atrair a incidência da inelegibilidade da alínea g, entendo, em tal hipótese, prevalecer o direito fundamental à elegibilidade. Ante o exposto, com apoio nos fatos e fundamentos jurídicos acima aduzidos, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão deduzida na presente Ação de Impugnação por não restar configurada a inelegibilidade suscitada na presente ação. Por outro lado, preenchidas as condições legais para o registro pleiteado, DEFIRO, nos termos do art. 49 e 50 da Resolução TSE nº 23.609/2019, o 494 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

registro de candidatura de FERNANDES DA SILVA MOTA para o cargo de Vereador, sob o nº 15555, nas com a seguinte opção de nome para a urna: FERNANDES MOTA, no município de Juruá/AM. Em suas razões (ID 4668756), o recorrente aduz: a) O candidato recorrido, por ocasião da presidência da câmara local, teve a prestação de contas anual rejeitada pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, conforme depreende-se do Acórdão nº 11681/2018, o que atrai a inelegibilidade prevista na alínea “g”, art. 1º, inciso I, LC 64/90; b) A Corte de contas anotou como irregularidade nas referidas contas a não observância a dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), uma vez que o agente público ora recorrido deixou de atualizar dados fiscais no Portal da Transparência; c) Com efeito, o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal possui natureza insanável e caracteriza ato doloso de improbidade administrativa, atraindo a incidência da inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do artigo 1º da LC nº 64/1990. O recorrido (ID 4669006), por outro lado, argumenta que a mera reprovação de contas não enseja a inelegibilidade da citada alínea “g”, porquanto o ato sindicado em questão não se reveste de ato doloso de improbidade administrativa. O graduado Ministério Público Eleitoral opinou pelo conhecimento e provimento do recurso (ID 5039306). É o relatório.  VOTO1 A impugnação é tempestiva. A publicação da sentença ocorreu em 19/10/2020. O recurso, por sua vez, foi interposto em 20/10/2020, obedecendo, portanto, o tríduo legal. O apelo foi manejado por quem tem legitimidade e interesse, razão porque merece ser conhecido. Os recorrentes informam que o candidato recorrido, por ocasião da presidência da câmara local, teve a prestação de contas anual rejeitada pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, conforme depreende-se do Acórdão nº 11681/2018, o que atrairia a inelegibilidade prevista na alínea “g”, art. 1º, inciso I, LC 64/90. O recorrido, por outro lado, argumenta que a mera reprovação de contas não enseja a inelegibilidade da citada alínea “g”, porquanto a irregularidade motivadora para reprovação de suas contas não se reveste de ato doloso de improbidade administrativa. Analiso o aventado impeditivo ao ius honorum do recorrido, a saber, reprovação de contas na condição de gestor público. 1. Os destaques consignados nas referências utilizadas neste voto não constam do original, salvo observação diversa. 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 495

Dispõe o art. 1º, inciso I alínea “g”, da LC 64/90. In verbis: Art. 1º São inelegíveis: I - para qualquer cargo: (...) g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição” (...) É dizer, são os seguintes requisitos que compõem a mencionada alínea: i) emanado por órgão competente a julgar as contas em definitivo; ii) não for suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário; iii) o ato contenha irregularidade insanável e iv) ato doloso de improbidade administrativa. Trata-se de efeito (secundário) da decisão de rejeição. De sorte que a “inelegibilidade não é constituída por ato próprio da Justiça Eleitoral, a qual apenas aprecia os fatos e as provas que lhe são apresentados, reconhecendo-a ou a afastando. Cabe a essa Justiça proceder ao enquadramento jurídico dos fatos a partir do acórdão da Corte de Contas ou instrumento semelhante”, conforme anota José Jairo Gomes (2018, p. 236). Os dois primeiros requisitos são objetivos, indubitavelmente reconhecido na espécie, a saber, foi emanado por órgão competente a julgar as contas em definitivo (TCE) e o acórdão não foi suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário. Por outro lado, os requisitos “irregularidade insanável” e “ato doloso de improbidade administrativa” demandam uma perspectiva subjetiva, extraída notadamente a partir da jurisprudência do TSE com vistas a resguardar a segurança jurídica no processo eleitoral. De acordo com a literatura especializada2, insanáveis são as irregularidades graves, decorrentes de condutas perpetradas com dolo ou má-fé, contrárias à lei ou ao interesse público; podem causar dano ou prejuízo ao erário, enriquecimento ilícito, ou ferir princípios constitucionais reitores da Administração Pública. Quanto à irregularidade que “configure ato doloso de improbidade administrativa”, não é exigida a prévia condenação do agente por ato de improbidade administrativa. O requisito tem a única finalidade de estruturar a inelegibilidade. É a Justiça Eleitoral a única competente para apreciar essa matéria e qualificar os fatos que lhe são apresentados, afirmando se a irregularidade apontada é ou não insanável, se configura ato doloso de improbidade administrativa e se constitui ou não inelegibilidade. No caso, a questão a ser respondida cumpre em perquirir se a reprovação de contas 2. GOMES, José Jairo. Direito eleitoral – 12. ed. – São Paulo: Atlas, 2018, p. 237. 496 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

como gestor público em razão de não atualização de dados fiscais no Portal da Transparência pode ser qualificado como ato insanável e doloso de improbidade administrativa, apto a atrair a inelegibilidade da citada alínea “g”? Passo à análise. Para melhor compreensão, transcrevo naquilo que interessa o acórdão condenatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE/AM), a fim de aferir se o ato é insanável, doloso e de improbidade administrativa. Confira-se (ID 4667856, p. 95): PROCESSO N. 11681/2018 – TCE (...) 15. No entanto, o parquet defende o julgamento desta prestação de contas como irregular em virtude do descumprimento aos art. 48, 48-A e art. 49, da Lei de Responsabilidade de Fiscal, com alteração trazida pela LC. nº. 131/09, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências, a fim de determinar a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 16. Neste caso, acompanho as proposições uniformes exaradas pelo Parquet, invocando os argumentos ali aduzidos às presentes razões para decidir, visto que na essência, comprometem a regularidade da Prestação de Contas, na medida em que o atendimento aos arts. 48, 48-A e art. 49, da Lei de Responsabilidade de Fiscal é de primordial importância para o fiel acompanhamento das ações governamentais, pela sociedade, possibilitando o acesso às informações financeiras e orçamentárias da Administração Pública, pondo em prática o princípio da transparência pública. Além disso, com fulcro no art. 308, inciso VI, do RI-TCE/AM, cabe multa ao Ordenador de Despesas da Câmara em face da grave infração aos arts. 48 e 48-A da LRF. Com base nos autos, em consonância com o Ministério Público de Contas e em parcial consonância com o órgão técnico, PROPONHO VOTO no sentido de o Tribunal Pleno: 1 - Julgar irregular a Prestação de Contas Anual da Câmara Municipal de Juruá, referente ao exercício financeiro de 2017, sob a responsabilidade do Sr. Fernandes da Silva Mota, Presidente da Câmara Municipal, nos termos dos art. 22, inciso III, alínea \"b\", da Lei Estadual nº 2423/96, c/c art. 188, §1º, III, alínea \"b\", da Resolução nº 04/2002-RITCE/ AM, considerando a restrição sobredita e não sanada; (...) A partir do aresto da Corte de Cotas, observa-se que o recorrido teve suas contas julgas em razão da inobservância da LRF, porquanto não disponibilizou no portal da 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 497

transparência informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da câmara local, quando presidente daquele parlamento. Com efeito, de acordo com assente jurisprudência do TSE no último pleito, o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, que, juntamente com os demais requisitos identificados, atrai a causa de inelegibilidade da alínea “g” em questão. Confira-se: ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. INDEFERIMENTO. REJEIÇÃO DE CONTAS PELO TCE/RJ. AFERIÇÃO DAS CAUSAS DE INELEGIBILIDADE A CADA ELEIÇÃO. INEXISTÊNCIA DE COISA JULGADA OU DIREITO ADQUIRIDO. PRECEDENTES. DESCUMPRIMENTO DOS ARTS. 1º E 42 DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. EMISSÃO DE ALERTA, PELA CORTE DE CONTAS, NO EXERCÍCIO ANTERIOR. INÉRCIA DO GESTOR. CONFIGURAÇÃO DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INSANABILIDADE. HIPÓTESE DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, \"g\", DA LC Nº 64/1990. PRECEDENTES. AGRAVO DESPROVIDO.1- A decisão proferida em ação de impugnação ao registro de candidatura, afastando a incidência de inelegibilidade, tem eficácia restrita àquele pleito e não produz os efeitos exógenos da coisa julgada para eleições posteriores. Precedentes. 2- O art. 1º, I, \"g\", da LC nº 64/1990 exige, para a sua configuração, a presença dos seguintes requisitos: exercício de cargos ou funções públicas; rejeição das contas pelo órgão competente; insanabilidade da irregularidade verificada; ato doloso de improbidade administrativa; irrecorribilidade do pronunciamento de desaprovação das contas e inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto de rejeição das contas. 3- A inércia do gestor público em reduzir o déficit público, apesar de emitido alerta pelo Tribunal de Contas, evidencia o descumprimento deliberado das obrigações constitucionais e legais que lhes eram impostas e consubstancia irregularidade insanável em suas contas que caracteriza ato doloso de improbidade administrativa. 4- A existência de contratos assinados e despesas decorrentes de empenhos emitidos nos últimos dois quadrimestres do mandato do gestor público, sem suficiente disponibilidade de caixa, indica a existência de irregularidade insanável em suas contas que caracteriza ato doloso de improbidade administrativa. 5- O descumprimento dos arts. 1º, § 1º e 42, da Lei de Responsabilidade Fiscal constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, que, juntamente com os demais requisitos identificados, atrai a causa de inelegibilidade do art. 1º, I, \"g\", da LC nº 64/1990. 6- Agravo regimental a que se nega provimento. (Recurso Ordinário nº 060076992, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 19/12/2018) 498 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE

Em igual sentido Respe n. 50563, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 31/10/2017. Por outro lado, em alguns casos, ainda que o ato não observe os ditames da LFR, é possível superar essa irregularidade e afastar a inelegibilidade em questão, ocorrendo temperamentos admitidos na jurisprudência diante de circunstâncias redutoras do grau de reprovabilidade da conduta do gestor público (Recurso Ordinário n. 060043990, Rel. Min. Admar Gonzaga, julgado em 29/11/2018). No entanto, no caso dos autos, a reprovabilidade revela-se acentuada, porquanto, de acordo com a Corte de Contas regional, o ato reprovado comprometeu o “fiel acompanhamento das ações governamentais, pela sociedade, [im]possibilitando o acesso às informações financeiras e orçamentárias da Administração Pública”. ANTE O EXPOSTO, em harmonia com o parecer ministerial, voto pelo conhecimento e PROVIMENTO do Recurso Eleitoral, a fim de reformar a decisão de piso e indeferir o recurso de FERNANDES DA SILVA MOTA, eleições 2020. É como voto. Manaus/AM, 17 de novembro de 2020. Desembargador Eleitoral FABRÍCIO FROTA MARQUES RELATOR 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE 499

JUIZ HENRIQUE GONÇALVES TRINDADE (JUIZ DO TRE-BA) TRE/BA - N. 0600147-16.2020.6.05.0167 TEMA INELEGIBILIDADE. ART. 1°, INCISO I, DA ALÍNEA “G”, DA LEI COMPLEMENTAR N° 64/90 EMENTA: Agravo interno. Recurso Eleitoral. Desprovimento. Registro de Candidatura. Impugnação. Inelegibilidade. Rejeição de contas pelo TCU. Art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990. Improcedência. Decisão sem anotação de trânsito em julgado. Liminar suspendendo os efeitos da decisão que reprovou as contas. Recurso pendente de julgamento. Afastada a incidência da inelegibilidade. Súmula 41 do TSE. Desprovimento. Preliminar de não conhecimento do agravo. Rejeita-se a prefacial suscitada pelo agravado, quando verificado que o agravante logrou impugnar os fundamentos da decisão guerreada, requerendo a sua reforma, pelo que não configurada a alegada ofensa ao princípio da dialeticidade recursal. 500 3ª Edição da Revista de Jurisprudência do COPEJE


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