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Eixo 6 EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS

Published by Editora Lestu Publishing Company, 2022-09-29 16:46:24

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ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS e indústria de beneficiamento; comércio ativo; turismo de negócios e eventos; polos de saúde e educação; produção de açúcar e etanol; extrativismo vegetal: babaçu; agroindústria: cajuína, beneficiamento de castanha de caju, produção de doces; indústrias: cerâmica, vestuário, química, bebidas e alimentos, móveis em madeira e metal; comércio e serviços. (CEPRO, 2007). Os arranjos produtivos locais caraterísticos da microrregião concentram-se na área de serviços e agropecuária. O Campus Angical do Piauí foi implantado no ano de 2010, foi um dos campi criados na segunda fase do processo de expansão e interiorização dos IFs. Destaca-se que a implantação do campus na região, foi uma demanda dos gestores locais, os quais elaboraram conjuntamente um projeto, datado do ano de 2007, com a solicitação e as condições oferecidas para viabilizar a inserção do campus na localidade. Conforme consta no PDI/IFPI (2010-2014), para instalação do campus em Angical foram considerados os seguintes critérios: a proximidade aos arranjos produtivos instalados em nível local e regional; a importância do município para o território Entre Rios, do qual é parte integrante; os valores assumidos pelos indicadores educacionais e de desenvolvimento socioeconômico por aquela região; a existência de potenciais parcerias para a implantação do campus do IFPI. (IFPI, 2010, p. 45 a 46). A localização geográfica central, isto é, quase que equidistante em relação as cidades do entorno, também favoreceu a escolha do município para sediar o campus do IFPI. Atualmente, o IFPI- campus Angical conta com nove cursos regulares presenciais, os quais são: técnico em administração, nas modalidades integrado ao ensino médio e concomitante/subsequente; técnico em informática, nas modalidades integrado ao ensino médio e concomitante/subsequente; técnico em alimentos, nas modalidades integrado ao ensino médio e concomitante/subsequente; licenciatura em matemática; licenciatura em física; bacharelado em administração. O público discente do campus é composto por alunos oriundos de diferentes cidades, principalmente, por aquelas próximas à Angical, o que é uma medida do alcance dessa unidade de ensino na região. Além da cidade de Angical, há muitos alunos provenientes das demais cidades da microrregião do Médio Parnaíba e do Território Entre Rios, sobretudo, daquelas que estão localizadas no entorno. O campus atende até mesmo alunos de outro estado, os quais 2333

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS procuram a instituição para obter uma educação pública de qualidade, evidenciando, o raio de influência do campus na região em questão. Constata-se, portanto, que a interiorização dos IFs proporciona acesso a todos os níveis de ensino gratuitamente à população local e estende seus benefícios para além da cidade onde está instalado, tornando-se uma importante referência do ensino público de qualidade nas diferentes modalidades de ensino no território de abrangência. Principalmente, a importância da interiorização dos IFs é mais valiosa para as pessoas de baixa renda que têm dificuldades de oportunidades no acesso aos elevados níveis de escolaridade. De acordo com as diretrizes dos Institutos Federais e, particularmente, do IFPI, os cursos ofertados pelo campus devem estar sintonizados com as potencialidades produtivas, pois além de favorecer o crescimento econômico, permitirá, com maior efetividade, a empregabilidade na própria região dos alunos egressos, contribuindo, portanto, com o desenvolvimento local. Destarte, analisou-se os Projetos Pedagógicos de cada curso, na forma regular e presencial, ofertado no campus de Angical. Considerando os arranjos produtivos locais, verifica-se que a oferta de cursos voltou-se para os setores terciário e secundário, respectivamente, da economia, o que significa que tais cursos estão sintonizados parcialmente com a economia local, pois ao tempo que oferece formação direcionada aos setores de serviços e indústria, não contemplou a agropecuária, setor da economia local com atividades produtivas potenciais. Sobretudo, ao considerar que, em 2010, das pessoas ocupadas na faixa etária de 18 anos ou mais do município, 37,26% trabalhavam no setor agropecuário, portanto, evidente que é um setor muito significativo na economia local, porém no campus não há oferta de cursos que contemple esse setor econômico. Assim como as ações de ensino desenvolvidas no campus, as atividades de pesquisa realizadas devem contribuir para o desenvolvimento local. Referente ao IFPI- campus Angical, foram analisados 45 (quarenta e cinco) projetos de pesquisa realizados entre os anos de 2015 a 2019, aos quais se teve acesso por meio da Pró-reitoria de Pesquisa e Inovação (PROPI) do IFPI. Há muitos projetos que visam melhorias no processo de ensino-aprendizagem, através do estudo e avaliação de métodos pedagógicos alternativos que possam contribuir para o progresso escolar dos alunos, tanto os que estudam no campus, como os alunos das demais 2334

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS escolas existentes. Outro fator muito importante observado nos projetos de pesquisa diz respeito a participação dos estudantes dos diferentes cursos e modalidades do campus, tornando-os capazes de compreender melhor a complexidade da sua realidade, intervindo diretamente para a transformação do seu meio. Exatamente 52,6%, dos projetos de pesquisa analisados desenvolveram pesquisas cujos objetivos, métodos e público-alvo estavam direcionados à algum aspecto próprio da cidade de Angical ou dos municípios vizinhos, seja na área da educação com projetos que abordaram sobre as escolas municipais da microrregião, seja na área econômica com pesquisas que investigaram a dinâmica do comércio local, como também pesquisas focadas em determinados segmentos sociais da região, por exemplo, sobre os pequenos produtores rurais moradores das localidades próximas. Caracterizam-se por serem pesquisas aplicadas que buscam gerar conhecimento para a aplicação prática e dirigida a solução de problemas locais. Entretanto, 47,4% das pesquisas realizadas, com base nos objetivos e métodos analisados de cada projeto, não trataram diretamente sobre alguma temática aplicada à realidade local, pelo contrário, muitas dessas pesquisas abordaram acerca de assuntos relacionados a questões internas particulares do campus, cujo público-alvo era restrito à alunos e/ou servidores do campus. Caracterizaram-se como pesquisas básicas, ou seja, guiada para a busca de conhecimento, sem aplicação prática e que não contribuem para a realidade local. Acredita-se que um dos fatores que pode ser atribuído ao distanciamento entre pesquisas desenvolvidas na instituição de ensino e a realidade local, diz respeito ao desconhecimento por parte dos servidores (docentes e técnicos administrativos) das diretrizes, das finalidades e objetivos das políticas institucionais. Estar alheio aos parâmetros e orientações que norteiam as atividades nos diversos eixos, ainda mais, considerando a função social como característica marcante dos IFs, repercute na produção de pesquisas que não produzem nenhum conhecimento ou aplicação prática voltada para a realidade local. Referente às atividades extensionistas, analisou-se os projetos de extensão desenvolvidos no IFPI-Campus Angical entre os anos de 2013 a 2019, uma vez que todos os projetos localizados e acessados eram referentes a esse período, a fim de examinar se as ações de extensão do campus seguem as diretivas que orientam a política de extensão no âmbito do IFPI e das instituições de ensino, de maneira geral. Para tanto, foram analisados 197 projetos de extensão realizados no campus Angical durante o intervalo de tempo acima mencionado. 2335

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Uma importante constatação obtida com o levantamento e análise dos projetos de extensão do IFPI-campus Angical, diz respeito ao fato de que, embora a quantidade expressiva de projetos de extensão executados no intervalo de tempo considerado para análise, 82 projetos, equivalente 41,6% do total, não incluíam a comunidade externa ao campus, ou seja, os habitantes locais, nem mesmo voltavam-se para as características e demandas sociais tanto de Angical como das demais cidades circunvizinhas. Tratavam-se de atividades cujos temas poderiam ser de interesse de segmentos da população local e poderiam incluir a comunidade externa ao campus, porém os servidores responsáveis não o fizeram, limitando apenas ao público interno do campus. A extensão, conforme preconiza a Política Nacional de Extensão (2012) e o Plano Nacional de Extensão, deve estar comprometida com a realidade social e com a sua transformação, além de ser caracterizada como um lugar de articulação entre saberes acadêmicos e da vida cotidiana. Considerando o papel dos Institutos Federais de contribuir ao desenvolvimento local e à promoção da cidadania, as atividades de extensão tornam-se essenciais para o diálogo efetivo entre instituição e sociedade. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS As instituições de educação profissional, científica e tecnológica passaram a ter importante papel a desempenhar como espaços de produção de conhecimento, visando sua interação com os arranjos produtivos e culturais locais e regionais, assim, cumprir o papel de agente indutor do desenvolvimento local. Foi possível perceber, com a análise feita sobre o perfil do público discente atendido pelo campus do IFPI na cidade de Angical, que muitos alunos são oriundos de famílias pobres, cuja renda mensal é de até três salários mínimos e ter uma instituição que oferta cursos de nível médio ao superior na região em que moram significa oportunidade de elevar o nível de escolaridade, obter adequada qualificação profissional para inserção no mercado de trabalho, assim, ter melhorias nas condições de vida. Ademais, os gestores do campus devem considerar a importância de ofertar cursos com base nas vocações produtivas predominantes da localidade, pois assim, o campus contribui para o fortalecimento dos arranjos produtivos locais e estimula a empregabilidade dos alunos 2336

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS egressos. No IFPI-Campus Angical, percebe-se que poderia ser ofertado curso na área de agropecuária, tendo em vista a importância desse setor econômico na região. Observou-se que no campus analisado há um considerável número de pesquisas desenvolvidas que não estavam direcionadas à realidade local, ou seja, que não propiciou nenhum benefício direto à comunidade, à região do entorno, sequer considerou algum aspecto próprio da localidade. E, assim, conclui-se que tais pesquisas não seguiram o recomendado nas diretrizes gerais e internas orientadoras da produção científica nos IFs. Com base nisso, vê-se a necessidade premente de realizar avaliação qualitativa das pesquisas executadas por parte dos gestores do IFPI e que estes estimulem o desenvolvimento de pesquisas aplicadas. Já o campo da extensão necessita estar em consonância com vocações, demandas locais e regionais. Contudo, os resultados da análise feita sobre os projetos de extensão do IFPI- Campus Angical atestaram que isso não ocorreu a contento, pois muitas práticas extensionistas ficaram limitadas ao contexto interno escolar ou sequer voltaram-se para as demandas locais. As atividades de pesquisa e extensão, por mais relevantes que possam parecer, se não atualizadas e repensadas crítica e permanentemente, tendo em vista a democratização do saber, ao invés de transformadoras, podem transformar-se em algo alienante e absolutamente desmotivador e deixem então de cumprir seu principal papel social. (AGUIAR; PACHECO, 2017). Evidente, portanto, a importância fundamental que as pesquisas produzidas e as atividades extensionistas desenvolvidas possuem na contribuição aos processos locais. Em suma, pode-se dizer que o IFPI- Campus Angical proporciona contribuições ao município onde está instalado e para a microrregião composta pelos municípios circunvizinhos, através da oferta de cursos de ensino médio à pós-graduação, ampliando as oportunidades de acesso à educação e elevando o nível de escolaridade da população local, o impacto provocado na economia local. Mas o campus possui potencial para ampliar suas possibilidades de contribuições para o desenvolvimento local. Compreende-se que o Instituto Federal integra o conjunto de atores locais, sendo um ator social de relevância com potencial valioso para o desenvolvimento local e regional, se levando em consideração o tripé ensino, pesquisa e extensão, com seus eixos tecnológicos voltadas para as potencialidades das regiões. Pois é missão dessa instituição de ensino, colaborar e promover este desenvolvimento por meio do ensino, da pesquisa e da extensão, aproveitando ao máximo as potencialidades dessas regiões. 2337

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Diante do exposto, depreende-se que essa temática é instigante e exige maiores investigações sobre as diversas realidades brasileiras em que a educação profissional e tecnológica tem sido ofertada, bem como suas respectivas contribuições. Necessário também a realização de mais investigações que possam se debruçar com mais profundidade sobre o tema para comprovar ou não, a influência direta dos campi dos Institutos Federais de Educação para o desenvolvimento local no território onde estão inseridos, considerando também, para tanto, as atividades de pesquisa e extensão realizadas. REFERÊNCIAS AGUIAR, Luiz E. V de; PACHECO, Eliezer M. Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia como política Pública. In: ANJOS, Maylta Brandão dos; RÔÇAS, Giselle. As políticas públicas e o papel social dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Natal: Editora IFRN, 2017. BRASIL. Lei 11.892 de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília: 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11892.htm. Acesso em: 12 jul. 2017. ________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (MEC/SETEC). Um Novo Modelo Em Educação Profissional E Tecnológica: concepções e diretrizes. Brasília, 2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=6691-if- concepcaoediretrizes&Itemid=30192. Acesso em: 05 nov. 2018. CASTIONI, Remi; CARVALHO, Ricardo Feitosa de. Capital Social, trabalho e educação profissional e tecnológica: desafios para os Institutos Federais. In: SOUZA, Eda C. L. de; CASTIONI, Remi. Institutos Federais: os desafios da institucionalização. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2012. CEPRO. FUNDAÇÃO CENTRO DE PESQUISAS ECONÔMICAS E SOCIAIS DO PIAUÍ – Identificação das potencialidades econômicas e áreas carentes de qualificação de mão de obra no Estado do Piauí. Teresina: Editora, 2007. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e estatística. Censo Demográfico 2010. Disponível em: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=220060. Acesso em: 05 jul. 2017. ______. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pi/angicaldopiaui/panorama. Acesso em: 14 fev. 2018. 2338

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS IFPI. Plano de Desenvolvimento Institucional-PDI 2010-2014. Teresina: 2010. Disponível em: http://libra.ifpi.edu.br/acesso-a-informacao/institucional/ifpiPDI_20102014.pdf. Acesso em: 15 jul. 2017. IFPI. INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO PIAUÍ (IFPI). Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) 2015-2019. Teresina/PI: 2014. Disponível em: http://libra.ifpi.edu.br/acesso-a-informacao/institucional/ifpiPDI_20152019.pdf. Acesso em: 15 jul. 2017. PACHECO, E. M. Institutos Federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica. In: PACHECO, E. (Org.). Institutos federais: uma revolução na educação profissional e tecnológica. Brasília/ São Paulo: Fundação Santillana/ Moderna, 2011. p.13-32. Disponível em:http://www.moderna.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A7A83CB34572A 4A01345BC3D5404120. Acesso em: 28 maio 2018. SCHNEIDER, L. Educação e desenvolvimento: um estudo do impacto econômico da universidade federal no município de Santa Maria (RS). UNIFRA: Santa Maria, 2002. 2339

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA, SERVIÇO SOCIAL E POLÍTICAS SOCIAIS UNIVERSITY EXTENSION, SOCIAL SERVICE AND SOCIAL POLICIES Natali Sabrina Fátima Picolloto Zoletti1 Angela Maria Moura Costa Prates2 RESUMO Este estudo tem o objetivo de mostrar a relação horizontal existente entre a Extensão Universitária, o Serviço Social e as políticas sociais, a partir da experiência dos projetos de extensão. Trata-se de uma abordagem qualitativa, com pesquisa bibliográfica, documental e observação participante. Conclui-se que existe uma relação horizontal e fecunda entre a extensão universitária, a profissão de Serviço Social e as políticas sociais, que, ao comporem juntos a rede de serviços prestados pelo município, contribuem de maneira eficaz no enfrentamento das expressões da “Questão Social”, no caso aqui estudado, contribuem para amenizar a precarização e a exploração do trabalho de catadores (as) de materiais recicláveis, ao mesmo tempo em que articulam a garantia de direitos sociais ofertados nas várias políticas sociais. Palavras-chave: Extensão; Serviço Social; Políticas Sociais. ABSTRACT This study aims to show the horizontal relationship between University Extension, Social Service and social policies, based on the experience of extension projects. It is a qualitative approach, with bibliographic and documentary research and participant observation. It is concluded that there is a horizontal and fruitful relationship between university extension, the profession of Social Work and social policies, which, by composing together the network of services provided by the municipality, effectively contribute to facing the expressions of the \"Social Question ”, in the case studied here, contribute to lessening the precariousness and exploitation of the work of recyclable material pickers, while at the same time articulating the guarantee of social rights offered in the various social policies. 1 Graduanda em Serviço Social pela Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO). E-mail [email protected]. 2 Doutora em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e docente do curso de Serviço Social da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO). E-mail [email protected]. 2341

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Keywords: Extension; Social Service; Social Policies. 1 INTRODUÇÃO O presente estudo tem o objetivo de mostrar a relação horizontal existente entre a Extensão Universitária, o Serviço Social e as políticas sociais, a partir da experiência dos projetos de extensão: a) Trabalho social com famílias de catadores (as) de materiais recicláveis de Guarapuava – PR e b) “Esperançar” junto aos (as) catadores (as) de materiais recicláveis de Guarapuava – PR, que são coordenados pelas professoras do Departamento de Serviço Social da Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO) do Estado do Paraná e atuam em parceria com a Prefeitura Municipal de Guarapuava. O primeiro projeto vem sendo desenvolvido desde 2019, com o objetivo de Promover ações interdisciplinares voltadas para o acesso aos direitos sociais, econômico e de educação ambiental dos/das catadores/as de materiais recicláveis e suas famílias participantes do Programa Vida Digna de Guarapuava – PR, bem como contribuir para processos socioeducativos ambientais da comunidade em geral. (TRABALHO SOCIAL, 2021, p. 06). E o segundo projeto vem sendo desenvolvido desde 2021 com o objetivo de Desenvolver ações socioeducativas para o apoio à ocupação e pertencimento ao território e incentivo ao cooperativismo para a geração de trabalho e renda junto aos catadores/as de materiais recicláveis e suas famílias do Jardim das Américas na cidade de Guarapuava/PR. (ESPERANÇAR, 2021, p. 5). As equipes destes projetos são formadas por várias áreas do conhecimento (Serviço Social, Administração, Geografia, Arquitetura e Urbanismo, Comunicação Social e Direito). Os (as) participantes aprendem e constroem cotidianamente as relações interdisciplinares (MINAYO, 2010), numa troca mútua de conhecimentos e vivências. Este texto apresenta os estudos realizados por meio do processo de vivência/supervisão direta de estágio obrigatório em Serviço Social vivenciado pelas autoras no âmbito destes projetos (CFESS, 2008). A abordagem do objeto é através da pesquisa qualitativa, em que o sujeito pesquisador está preocupado com o significado dos dados (MINAYO, 1994). Também articulam-se em reflexões teóricas a partir de um arsenal de bibliografias (MARCONI; LAKATOS, 2003), para pensar o objeto de estudos. Isso foi possível através da observação participante onde as 2342

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS autoras vivenciaram as atividades junto aos (as) catadores (as) de materiais recicláveis (SEVERINO, 2007). E por fim, foi utilizado a pesquisa documental (SEVERINO, 2007) nos Plano de Trabalho Profissional da assistente social coordenadora e dos projetos de extensão. Para dar conta da discussão do objeto num primeiro momento discute-se a universidade pública e um dos seus eixos de atuação que é a extensão universitária; em seguida, mostra-se a relação entre extensão universitária e Serviço Social; e por fim, analisa-se a relação existente entre extensão universitária, o Serviço Social e as políticas sociais que são articuladas junto com os projetos de extensão para ampliar a garantia de direitos sociais dos (das) catadores (as) de materiais recicláveis. 2 UNIVERSIDADE E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA A origem da palavra “Universidade” vem do latim “Universitas”, cujo significado está associado ao termo universo, no latim determinado como universus, formado pelos termos unus, que engloba uma única unidade, e por versus que se refere ao verbo vertere, no sentido de virar, mudar ou derramar (VESCHI, 2019). A etimologia da palavra Universidade possui profunda ligação com o que ela é e representa. A Universidade constitui uma unidade de sujeitos que buscam o desenvolvimento, a produção e a reprodução do conhecimento científico, que resulta em incontáveis transformações sociais. De acordo com o medievalista francês Etienne Gilson, Universitas abrangia na Idade Média “[...] o conjunto de pessoas, mestres e alunos, que participam do ensino dado nessa mesma cidade” (GILSEN, 1998 apud BERLINCK, 2013, s/p), sem se ter necessariamente um lugar determinado. O que mostra que desde os primórdios da universidade, ela ultrapassa os limites físicos de uma construção, Universidade é conhecimento, é a junção de indivíduos, muitas vezes de diferentes origens, que se organizam para estudar e transmitir conhecimento baseado na ciência. Seguindo a mesma linha de reflexão, é de grande importância ainda hoje a Universidade ir além das salas, dos prédios e dos muros que a identificam, a Universidade deve estar presente em meio à sociedade. 2343

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Através dessa preocupação, da socialização da Universidade, foi criada a Extensão Universitária, surgindo na Inglaterra, no século XIX, percorrendo um longo trajeto com constantes transformações para chegar ao que conhecemos hoje (NOGUEIRA, 2000). Atualmente a Extensão Universitária é tida como uma das funções sociais da Universidade. De acordo com a Constituição Federal de 1988, no Artigo 207 - Capítulo III/Seção I, “As universidades brasileiras gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.” (BRASIL, 1988). E no Artigo 213 Inciso II Parágrafo 2º, fica assegurado que “as atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do poder público” (BRASIL, 1988, p.35). A Extensão está inserida como a ação de compartilhar o conhecimento produzido através do ensino e da pesquisa na instituição com o público externo, ou seja, com a comunidade. No entanto, é necessário sempre ter em vista que a Extensão não é um caminho de mão única. Como Verônica Moreno Machado (2013) disserta, a Extensão Universitária é um espaço de integração com a comunidade, um espaço de construção de conhecimentos através da dialogicidade, onde os saberes científicos conversam com os saberes da comunidade construindo novos conhecimentos que objetivam a transformação social. A autora citada traz a concepção freiriana das atividades extensionistas, ressaltando a importância da “comunicação”. No livro “Extensão e Comunicação” (1982), o autor Paulo Freire analisa semanticamente a palavra extensão no sentido de estender, ou seja, de um lado tem o indivíduo que estende o conhecimento e do outro tem o que recebe, tornando assim “[...] a educação como prática de ‘domesticação’ [...]” (FREIRE, 1982 apud MACHADO, 2013, p. 10). Na atividade extensionista como prática transformadora o que mais vale é o ato da “comunicação”, onde todos os sujeitos dialogam, não existindo dessa maneira indivíduos passivos, mas todos são construtores do conhecimento, não ocorrendo transferências de saberes e sim trocas. Para Freire “Não há, realmente, pensamento isolado, na medida em que não há homem isolado.” (FREIRE, 1982, p. 44), dessa maneira através da comunicação os sujeitos constroem o mundo e constroem a si mesmos, e é nesse sentido que a extensão universitária deve acontecer. A Universidade não estende conhecimento à comunidade, através da extensão a Universidade estabelece comunicação com a comunidade e então, através da dialogicidade e de forma horizontal, constroem juntas novos conhecimentos. 2344

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A extensão universitária é o principal instrumento articulador entre as produções acadêmicas da pesquisa e do ensino com a comunidade, contribuindo assim para uma formação superior de qualidade também nos aspectos sociais e humanitários (SOUZA; FERREIRA, 2008). Atualmente, no Brasil, a principal lei que regulamenta a extensão universitária é a Lei nº 9394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), na qual a extensão é citada em diversos artigos, destacando a autonomia universitária e a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (BRASIL, 1996). Entre os artigos que fazem referência à extensão, é importante destacar o último inciso do capítulo IV, artigo 43 da referida lei, onde é afirmado que se deve “[...] promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição” (LDB 9394/96, p.13), e o inciso IV, do artigo 44 da LDB, em que é assegurado que cursos e programas de extensão serão abertos a “[...] candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos em cada caso pelas instituições de ensino” (LDB, 9393/96, p.15). 3 SERVIÇO SOCIAL E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA Ainda no mesmo livro, Paulo Freire (1982) traz o assistente social como um profissional que possui empenho educativo libertador e evidencia a importância do profissional não se reconhecer como o agente da mudança, mas perceber que aqueles com quem ele trabalha são tão agentes quanto ele, fazendo todos assim parte da mudança. Inserida nesta configuração, a Extensão Universitária é destacada com grande importância no espaço de formação e no exercício profissional do Serviço Social, sendo um lugar onde o assistente social entra em contato direto com a comunidade e precisa se reconhecer como parte dela e da mudança que em conjunto está sendo ou será construída. Dentre os projetos de Extensão efetivados no curso, especifico durante a presente caracterização, o trabalho com famílias vinculadas à assistência social e ao Projeto de Extensão Universitária do curso de Serviço Social da Universidade Estadual do Centro Oeste. Neste trabalho caracterizamos o Projeto de Extensão “ESPERANÇAR” Junto aos Catadores (as) de Materiais Recicláveis em Guarapuava-PR, o qual atende aos artigos mencionados, promovendo a extensão à população, difundindo as conquistas e benefícios 2345

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS gerados na instituição, para candidatos que atendem aos requisitos estabelecidos, no caso, as famílias de catadores de materiais recicláveis participantes do Programa “Vida Digna”1. 3.1 Serviço Social, Extensão Universitária e Políticas Públicas A afirmação dos direitos humanos está intimamente ligada à prática profissional das/dos assistentes sociais e foi grandemente ampliada através da Constituição Federal de 1988, estabelecendo assim profunda relação entre a Constituição, os direitos humanos e o Serviço Social. As principais políticas sociais com as quais os projetos de extensão se articulam são as políticas de Assistência social, de Habitação e do Meio Ambiente. Ambas as políticas compõem o Programa Vida Digna da prefeitura. No Brasil, a Assistência Social, é reconhecida pela Constituição Federal de 1988 como direito do cidadão e como dever do Estado (NASCIMENTO, 2010). De acordo com Alex Epifanio (2017), a Assistência Social deve ser tratada como uma prática social, efetivando-se como uma política social ou continuada. A partir da promulgação da Constituição de 1988 e da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) (BRASIL, 1993), a Assistência se tornou “[...] um dos componentes fundamentais na luta pela concretização das práticas de igualdade e justiça estabelecidas na Constituição de 1988” (EPIFANIO, 2017, p. 1-2). No Artigo 203 da Constituição, afirma-se que: A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. (BRASIL, 1988). Muitas foram as conquistas alcançadas por meio da Constituição Federal de 1988 em relação aos direitos humanos e várias leis que regulamentam tais direitos foram aprovadas desde então, entre elas está “a Lei Orgânica da Saúde/LOS (1990), a Lei Orgânica da Assistência 2346

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Social/LOAS (1993) e a Lei de Diretrizes e Base da Educação/LDB (1996), entre outras leis” (NASCIMENTO, 2010, p. 87), as quais fundamentam e direcionam a atual prática profissional das/os assistentes sociais. A Política de Habitação é amparada pela Constituição Federal de 1988, a qual assegura que: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (BRASIL, 1988, Art. 6). No Art. 23, também lemos que “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:” (BRASIL, 1988), “promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico” (BRASIL, 1988 Art. 23, § IX). Além do vínculo existente desde o início do Projeto Trabalho Social com a Política de Habitação, o andamento dele teve a afirmação do direito à moradia constantemente trabalhada, junto às condições dignas de habitação e de existência no espaço urbano, como especificado no Capítulo I do art. 182 da Constituição Federal, o qual faz parte da Lei denominada de Estatuto da Cidade. Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações; (BRASIL, 1988). Cunha, Soares e Pimentel (2017) fazem a seguinte análise acerca da atuação do (a) assistente social e o acesso à moradia: Portanto é dever desse profissional ser compromissado com a qualidade dos serviços prestados à população. Onde a garantia de acesso à moradia não pode ser visto pelo usuário como um favor do profissional, ou que não contempla as necessidades dos mesmos, haja vista que a atuação do Assistente Social deve estar fundamentada na autonomia e ampliação dos direitos dos usuários. Se o direito ao acesso à moradia for compreendido como bondade, benevolência ou caridade por parte do profissional, o mesmo não estará pondo em prática o Código de Ética da Profissão, ou a instrumentalidade exigida em uma atuação profissional de qualidade. (CUNHA; SOARES; PIMENTEL, 2017, p. 7). 2347

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A comunicação junto às famílias sobre leis e políticas públicas relacionadas à habitação, pode ser considerada como parte principal dos encontros do ano de 2021, e continuará a ser trabalhada. Isso para que as famílias avaliem o Programa Vida Digna e o recebimento das casas de forma crítica e para que entendam o acesso à moradia em condições dignas de habitação - com água encanada, rede de luz elétrica, saneamento básico, fora de área de risco e etc. - como um direito constitucionalizado e não como uma benevolência do Estado. Visto que o Serviço Social é uma profissão que está inserida nas questões decorrentes entre o capital e o trabalho, consequentemente a Política do Meio Ambiente também envolve o serviço do assistente social. No capitalismo a matéria prima advinda do meio ambiente é o meio através do qual são produzidos os produtos que causam o desiquilíbrio ambiental conhecido na atualidade. Desde os primórdios da humanidade, o homem tem sido um agente transformador da natureza, vivendo em contato constante com ela e, a princípio, desenvolvendo uma produção voltada apenas a satisfazer suas necessidades imediatas, sem o compromisso com a acumulação de bens e riquezas. (SOUSA; GOMES; SANTOS, 2013, p. 2). O século XVIII foi marcado por várias mudanças consequentes da industrialização. A manufatura passou para a indústria (SOUSA; GOMES; SANTOS, 2013), a produção antes necessária para a sobrevivência se tornou larga e em grande escala aumentando o consumo e automaticamente o descarte de materiais na natureza. Dessa maneira a matéria-prima é retirada da natureza, transformada pelo homem e depois de certo tempo de uso, descartada na natureza, tudo de maneira rápida e numerosa, trazendo incontáveis impactos ambientais. Diante de tais condições a Revolução Industrial desencadeou dois processos que afetaram totalmente o meio ambiente: o aumento de poluentes na natureza e o crescimento do consumo dos recursos que são utilizados como matéria prima. Ambos processos se tornaram os primeiros apresentados como problemas de devastação ambiental. Outro acontecimento que teve destaque foi o impulsionamento da população a deixar as áreas rurais e ocupar os espaços urbanos, gerando um acúmulo de espaços sem infraestruturas e precários para a sobrevivência (SOUSA; GOMES; SANTOS, 2013). Visivelmente de maneira paralela à exploração dos trabalhadores ocorre a exploração ao ambiente em que estão inseridos os trabalhadores: 2348

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS O desenvolvimento de problemas ambientais é próprio de um modo de produção marcado pela exploração que tem como principal objetivo a obtenção de lucro e a exploração do trabalhador, não possuindo características e perspectivas voltadas à preservação do meio ambiente. SOUSA; GOMES; SANTOS, 2013, p. 3). Através do degaste ambiental juntamente ao aumento da força produtiva foi perceptível a necessidade que forças fossem pensadas para a preservação ambiental. (SOUSA; GOMES; SANTOS, 2013). No Brasil a Constituição Federal de 1988 foi a primeira a tratar da questão ambiental. No artigo 225, do capítulo VI, lemos que: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 1988). O trabalho dos (as) catadores (as) é de extrema importância para a preservação do meio ambiente através da colaboração na reciclagem dos resíduos e da limpeza das cidades. Porém, compreendendo a atividade da catação como uma alternativa precária que restou aos (as) trabalhadores (as), como meio de resistência à falta de emprego e renda, os projetos de extensão focam a sua atuação na formação da cooperativa de catadores (as) de materiais recicláveis, a afim de amenizar a exploração e a precariedade do trabalho destes sujeitos. De acordo com Souza, Gomes e Santos (2013), relacionando a atuação do assistente social com as expressões da “Questão Social” e os conceitos ambientais, os (as) profissionais devem reavaliar posturas individuais e incentivar o associativismo, e também lutar pelo direito à moradia e à cidadania de populações que foram atingidas por eventos naturais. Como no caso das famílias de catadores (as) participantes do Projeto, que tantas vezes perderam pertences e até mesmo suas moradias, devido à eventos naturais somados à fatores decorrentes da falta de estrutura e pobreza em que estão inseridos (as). Assim, a atuação do Serviço Social por meio dos projetos extensão junto às famílias, mantendo o trabalho horizontal e dialógico, com o intuito de comunicar direitos garantidos por Lei em relação à moradia, ao trabalho e às condições dignas de vida. Para que assim aumente a autonomia individual e coletiva dentro do grupo como um todo e então progressivamente os direitos sejam reivindicados e afirmados, acontecendo o andamento do processo de emancipação política do coletivo de catadores (as) de materiais recicláveis. 2349

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao concluir essas linhas tem-se a plena certeza de um estudo inconcluso, ainda tanto por descobrir e ao mesmo tempo instigante, pois relaciona questões teóricas fundamentais para compreender a realidade dos (das) catadores (as), mas também, relaciona e colhe o conhecimento que nasce da vida concreta dos sujeitos envolvidos (equipe e participantes dos projetos). Os sujeitos que movem a universidade pública articulam suas ações a partir de um tripé: ensino, pesquisa e extensão. Nenhum destes eixos existem separadamente. Neste estudo foi possível perceber a importância da atividade da extensão, como um espaço para vivenciar tanto o ensino, como a pesquisa também. A extensão é um berço fecundo de conhecimentos e vivências da realidade social dos (as) catadores (as), um espaço fecundo de formação do assistente social, seja por meio do estágio curricular obrigatório ou pela participação dos (das) estudantes enquanto extensionistas. No espaço da extensão os assistentes sociais desenvolvem seu exercício profissional articulando o arcabouço de conhecimentos teóricos-metodológicos, ético-políticos e técnico- operativos, sem desarticular o tripé da universidade (ensino, pesquisa e extensão). Neste espaço de vivências interdisciplinares, os assistentes sociais ensinam e também aprendem, numa troca mútua de conhecimentos, afetos e esperanças. Conclui-se que existe uma relação horizontal e fecunda entre a extensão universitária, a profissão de Serviço Social e as políticas sociais, que, ao comporem juntos a rede de serviços prestados pelo município, contribuem de maneira eficaz no enfrentamento das expressões da “Questão Social”, no caso aqui estudado, contribuem para amenizar a precarização e a exploração do trabalho de catadores (as) de materiais recicláveis, ao mesmo tempo em que articulam a garantia de direitos sociais ofertados nas várias políticas sociais. REFERÊNCIAS BERLINCK, Manoel Tosta. O método científico nos primórdios da Universidade: o caso de Andreas Vesalius de Bruxelas. 2013, Revista Ensino Sperios n 11. Disponível em: <https://www.revistaensinosuperior.gr.unicamp.br/artigos/o-metodo-cientifico-nos- primordios-da-universidade-o-caso-de-andreas-vesalius-de-bruxelas. Acesso em: 25 out. 2021. 2350

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Senado Federal: Brasília, 1988. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). 9394/1996. BRASIL. BRASIL. Lei n. 8.662, de 7 de junho de 1993. Dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras providências. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília-DF, 8 jun. 1993. CUNHA, D. S.; SOARES, M. V.; PIMENTEL, P. G. R. O assistente social na garantia de acesso à habitação. VIII Jornada Internacional Políticas Públicas. Universidade Federal do Maranhão, 2017. Disponível em: <http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2017/pdfs/eixo4/oassistentesocialnagarantiade acessoahabitacao.pdf. Acesso em: 07 mar. 2022. EPIFANIO, Alex. A Assistência Social no Brasil à Luz da Constituição de 1988 e da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS). Universidade Federal Fluminense, 2017. Disponível em: <https://app.uff.br/riuff/bitstream/handle/1/3267/Alex%20Ferreira%20Epif%E2nio.pdf;jsessi onid=69C3E656B60C449BF6DCB177C15A82A4?sequence=1>. Acesso em: 25 out. 2021. FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação? 6ª Ed - Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. CFESS, Conselho Federal de Serviço Social. Resolução nº 533 de 29 de setembro de 2008. Brasília, DF, 2008. MACHADO, Verônica Moreno. Algumas Reflexões sobre as Concepções de Extensão Universitária. Revista Científica Semana Acadêmica. Fortaleza, ano MMXIII, Nº. 000035, 14/08/2013. Disponível em: <https://semanaacademica.org.br/artigo/algumas-reflexoes- sobre-concepcoes-de-extensao-universitaria> Acesso em: 20 nov. 2021. MARCONI, Marina de; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de metodologia científica. 5ª Ed. São Paulo: Atlas 2003. MINAYO, Maria Cecília de Souza. Disciplinaridade, interdisciplinaridade e complexidade. In.: Revista Emancipação (v.10 nº 02, p. 435-442). Ponta Grossa, UEPG, 2010. MINAYO, Maria Cecilia de Souza. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis. Rio de Janeiro. Edit. Vozes, 1994. NASCIMENTO, S. G. do. Direitos Humanos e Assistência Social: A Experiência do Brasil Pós- 1988. Universidade Federal de Pernambuco: Recife, 2010. NOGUEIRA, M. das D. P. (Org.). Extensão Universitária: diretrizes conceituais e políticas – Documentos básicos do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras 1987 – 2000. Belo Horizonte: PROEX/UFMG; o Fórum, 2000. SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23ª Ed – revista e atualizada. São Paulo: Cortez, 2007. SOUZA, O. S. S. de; FERREIRA, L de S. A Regulamentação da Extensão Universitária no Brasil. Revista Mosaicum, n. 8 – ago./dez. 2008. Disponível em: 2351

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS file:///C:/Users/prate/Downloads/admin,+A+regulamenta%C3%A7%C3%A3o+da+extens%C3% A3o+universit%C3%A1ria+no+Brasil.pdf Acesso em: 25 nov. 2021. SOUSA, M. T. C. S. de; GOMES, I. L. S. F.; SANTOS, M. M. S. dos. Serviço social e meio ambiente: Um desafio para a atuação de assistentes sociais. VI Jornada Internacional de Políticas Públicas. Universidade Federal do Maranhão, 2013. Disponível em:http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2013/JornadaEixo2013/anais-eixo11- questaoambientalepoliticaspublicas/servicosocialemeioambiente- umdesafioparaaatuacaodeassistentessociais.pdf. Acesso em: 6 mar. 2022. TRABALHO SOCIAL. Plano Trabalho Social com Famílias de Catadores de Materiais Recicláveis em Guarapuava/PR. Universidade Estadual do Centro-Oeste, 2021. VESCHI, Benjamin. Etimologia de universidade. 2019. Disponível em: <https://etimologia.com.br/universidade/>. Acesso em: 25 out. 2021. 2352

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS INTERVENÇÕES PARA O ENFRENTAMENTO DO RACISMO NA EDUCAÇÃO BÁSICA: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA INTERVENTIONS TO COMBAT RACISM IN BASIC EDUCATION: A BIBLIOGRAPHIC REVIEW Beatriz Malheiros e Silva Soares1 Maria Clara Oliveira Nascimento2 Railda Silva de Sousa3 Milena Moura Fé Araújo Portela4 RESUMO O presente trabalho visa realizar uma revisão bibliográfica tipo exploratória e de caráter crítica sobre as estratégias para o enfrentamento do racismo na educação básica presentes na literatura científica. Foi realizado uma busca nas bases de dados: Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Periódicos Acadêmicos em Psicologia (PePSIC) e no portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), na qual foram utilizados os critérios de inclusão Racismo e Escola. A após a seleção realizada, apenas 11 (onze) artigos científicos contemplaram os critérios de inclusão, na qual 05 (cinco) foram destinados aos docentes, 04 (quatro) para os alunos e 02 (dois) para ambos, o que confirma a pouca produção científica acerca de temas tão pertinentes como as questões étnico- raciais na educação básica. Sendo assim, faz-se necessário a ampliação de pesquisas nesse campo de pesquisa, pois essas discussões são necessárias para o enfrentamento do racismo no ambiente escolar. Palavras-chave: Racismo. Escola. Educação. ABSTRACT The current study main aims to conduct an exploratory and critical literature review on the strategies for confronting racism in basic education present in the scientific literature. The research was accomplished in the databases. Scientific Electronic Library Online (SciELO), Academic Journals in Psychology (PePSIC) and in the journal portal of the Coordination for the Improvement of Higher Education 1 Universidade Federal do Piauí (UFPI). 2 Universidade Federal do Piauí (UFPI). 3 Universidade Federal do Piauí (UFPI). 4 Universidade Federal do Piauí (UFPI). 2353

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Personnel (Capes) whereupon the inclusion criterion Racism and School were used. After the selection, only 11 (eleven) scientific articles met the inclusion criterion, in which 05 (five) were intended for teachers, 04 (four) for students, and 02 (two) for both, which confirms the little scientific production on topics as relevant as ethnic-racial issues in basic education. Therefore, it is necessary to expand research in this field of search, because these discussions are necessary to confront racism in the school environment. Keywords: Racism. School. Education. 1 INTRODUÇÃO Segundo dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2018), o número da população negra no Brasil tem aumentado ao decorrer dos anos, as estatísticas mostram que, o número de pessoas que se autodeclaram negras ou pardas é de 55,7%, ou seja, é mais da metade da população existente no país, sendo assim, o Brasil se constituiu como o segundo território com o maior número de pessoas negras do mundo, ficando apenas atrás da África do Sul. Mesmo com mais da metade da população brasileira sendo negra, o racismo existe. Há uma resistência e uma recusa de pensar no Brasil a partir da sua história, onde paira o mito de uma democracia racial. De acordo com Carneiro (1997), no território brasileiro ainda é presente e vigora ideia de que o Brasil não é um país racista, ocasionando assim duas realidades distintas: uma de Brasil real e outra de Brasil imaginário, onde a discriminação racial se camufla, sendo, portanto, mais difícil de enfrentá-la e combatê-la. E na educação a realidade não é diferente, o racismo é um fenômeno que está bastante presente na realidade das escolas brasileiras. Ele chega de uma forma sutil e simbólica, outras vezes ele vem de uma forma mais explicita com manifestações de violência que afetam a integridade física e mental de alunos negros e educadores negros. Qual seria então as práticas que estão sendo utilizadas no ambiente escolar para o enfrentamento do racismo? Qual o papel da instituição escola em seu combate? Com isso, faz- se necessário que a escola adote seu papel como ambiente socializador e formadora de cidadãos, fazendo com que a experiência de ensino aprendizagem supere a visão eurocêntrica de mundo e que aborde temas presente na realidade do Brasil, produzindo assim uma educação com práticas antirracistas. 2354

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 2 O RACISMO NO BRASIL E O PAPEL DA ESCOLA No Brasil, o negro dificilmente consegue se igualar ao homem branco e que o \"mundo da senzala\" sempre esteve muito distante do \"mundo da casa grande\". Para alcançar pequenas regalias, fosse como escravo ou como homem livre, os descendentes de negros precisavam ocultar ou disfarçar seus traços de africanidade, já que o homem branco era apresentado como padrão de beleza e de moral. Percebe-se que esta ideologia do racismo manteve a sua estrutura fundamental, só alterando apenas as formas de manifestações (CARNEIRO, 2003). De acordo com os autores Karner (2007), Baisley (2014), Gilroy (2012), raça e etnia são fenômenos da vida social utilizados na sociedade moderna em processos de diferenciação de pessoas a fins de dominação, embasados na ideia da existência de alguma superioridade inata ou historicamente construída pelo grupo étnico/racial dominante por meio do compartilhamento de uma língua, cultura, tradições e territórios. A escola surge e atualmente legitima a ordem existente e se converte em válvula de escape das contradições sociais e desajustes sociais (GOMEZ, 1998). Para Lopes (2006) antes de refletir sobre o currículo escolar e suas implicações na constituição de identidades individuais e sociais é preciso refletir sobre a função social da escola e as condições de acesso da população negra ou mestiça a esta instituição e sua permanência na mesma. Pinto (1989) afirma que a educação é o processo pelo qual a sociedade forma seus membros conforme a sua imagem e em função de seus interesses. Logo, se a convivência escolar reproduz as interações sociais, no que se refere ao racismo estrutural, compete a esta escola uma responsabilidade social no enfrentamento ao racismo, conforme a Lei 10.639/03 que implica a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas. Dentro deste contexto, Carvalho (2018) afirma que a escola também tem como dever fiscalizar para que educadores e professores possuam o suporte necessário para que possam exercer um novo significado da cultura afro-brasileira. Além disso, Segundo Oliveira (2004), o currículo escolar não deve ser entendido apenas como uma lista de conteúdo a serem ministrados a um determinado grupo de alunos, mas sim como criação cotidiana daqueles que fazem parte da escola e seus processos interativos e pedagógicos. Silvério (2002) aponta a existência do fenômeno da diferença de anos de escolarização entre brancos e negros na atualidade e afirma que parte deste problema está associada ao 2355

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS racismo e à discriminação racial presentes na sociedade e, consequentemente, na instituição escolar. Portanto, de acordo com Lopes (2005), a escola não pode isentar-se de trabalhar as questões raciais, uma vez que, compete a ela não só evitar a formação de cidadãos racistas e preconceituosos, mas também auxiliar em propostas de enfrentamento a essa temática dentro das escolas. A escola deve estar comprometida com projetos que visem mudanças na forma como a comunidade escolar atua no enfrentamento ao racismo. Considerando o caráter social que a escola possui, entende-se que educação, cidadania e raça devem se correlacionar em práticas pedagógicas efetivas que necessitarão reconsiderar toda a estrutura de interação escolar através de propostas e práticas de intervenção no enfrentamento ao racismo (LOPES, 2005). O presente trabalho visa realizar uma revisão bibliográfica sobre as estratégias para o enfrentamento do racismo na educação básica presentes na literatura científica. Por ser um trabalho que faz uma análise da literatura científica e a utiliza como fonte de dados para sua discussão, a revisão bibliográfica pretende facilitar o trabalho de educadores podendo ser utilizado como recurso para o enfrentamento do racismo na escola. Por tanto, este trabalho faz-se fundamental pelo fato da quase inexistência de trabalhos com a finalidade que integre práticas de enfrentamento ao racismo na escola e uma promoção de uma educação antirracista de forma organizada. 3 METODOLOGIA Esta pesquisa busca realizar uma revisão bibliográfica do tipo exploratória e de caráter crítica relacionando estratégias de combate ao racismo no ambiente escolar. Segundo Rodrigues (2007), o estudo exploratório quanto ao objetivo da pesquisa visa proporcionar maior familiaridade com o problema e é utilizado um levantamento bibliográfico ou entrevistas, sendo utilizado em pesquisa bibliográfica ou em estudo de caso. Foi realizado uma busca nas bases de dados: Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Periódicos Acadêmicos em Psicologia (PePSIC) e no portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Não foi delimitado o ano de publicação dos artigos para não correr o risco de excluir trabalhos importantes, pois como o objetivo é 2356

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS conhecer as estratégias de enfrentamento ao racismo na educação, qualquer trabalho com essa temática independente do ano de publicação sempre será importante. Na primeira triagem foram encontrados mais de 250 resultados nas três plataformas, mas como foram utilizados os critérios de inclusão Racismo e Escola, chegou-se a 35 artigos. Em uma segunda triagem, analisamos todos os 35 artigos e utilizou-se como critério de exclusão artigos que não tivessem estratégias de enfrentamento ao racismo, assim foram selecionados 11(onze) artigos para este trabalho. Em resultado e discussões terá as informações mais relevantes encontradas nos artigos selecionados e analise dos conteúdos encontrados e suas estratégias de combate. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO A partir das análises dos estudos que relacionam as temáticas do Racismo, Inclusão e Educação Escolar, concluímos que a quantidade de artigos publicados ainda é limitada. Neste sentido, considerando que o foco do trabalho é a revisão integrativa de literatura sobre as estratégias de enfrentamento do racismo no ambiente escolar, após a seleção realizada, utilizando como critério de abordagem, as estratégias de enfrentamento ao racismo, foram selecionados, apenas, 11 (onze) artigos científicos. Muito embora o número pequeno de produção científica com enfoque na temática, objeto deste estudo, ressaltamos que algumas práticas/atividades estão sendo elaboradas no ambiente escolar e educacional, todavia, tais práticas/atividades não estão sendo realizadas com caráter científico, o que prejudica a produção da literatura científica pertinente no enfrentamento ao racismo. Analisando a bibliografia selecionada para este estudo (estratégias de combate ao racismo no ambiente escolar), percebemos que, em relação ao público-alvo, dos 11 (onze) artigos, 05 (cinco) foram destinados aos docentes, 4 (quatro) para os alunos e 02 (dois) para ambos, o que confirma a pouca produção acerca de temas pertinentes a questões étnico-raciais e educação básica. No tocante aos estudos dirigidos aos alunos, Silva e Ferreira Faria (2011), aduzem que a baixa autoestima da criança negra na escola é proveniente da interiorização do que está posto na sociedade, ou seja, os modelos inalcançáveis para a grande parcela da população que são, 2357

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS muitas vezes, reproduzidos nos livros infantis, o que resta, facilmente, comprovado, analisando alguns livros didáticos trabalhados no âmbito escolar, por isso, os autores defendem a importância de inserir a literatura afro, com o objetivo de despertar reflexão nos alunos sobre as relações étnicas-raciais. Nesta toada, destacamos a revisão sistemática da literatura de Silva (2015) que desenvolveu práticas educativas, as quais, crianças e adultos puderam e ainda podem vivenciar, com muita criatividade, situações de aprendizagens, compartilhamento e questionamentos sobre a identidade do povo brasileiro e em especial sobre a cultura afro-brasileira, africana e indígena. Ainda sobre os estudos científicos com abordagem direcionada aos alunos, têm-se o estudo de Moreira (2012), que elaborou o projeto “Pretinho, meu boneco querido”, baseado em um livro da autora Maria Cristina Furtado, dirigido aos alunos do 3º ano fundamental, com base na Lei Federal nº. 11.645/2008, que torna obrigatório o ensino das culturas negra e indígena nas Instituições de ensino de todo país, onde fica evidenciado que os docentes até têm o conhecimento da legislação, mas a forma como a lei é trabalhada em sala de aula, na maioria das escolas pesquisadas, deixa a desejar. Ainda, destacamos a utilização do jornal no ambiente escolar, notadamente, aos alunos do 2º ano do Fundamental, onde Moura e Autiello (2017), entendem que a utilização jornal, em sala de aula, como ferramenta pedagógica, poderá contribuir de forma concreta na melhoria da leitura e escrita, na interpretação de assuntos tratados sob uma visão reflexiva, bem como a utilização da literatura e do lúdico com imagens distribuídas no ambiente escolar, conforme o estudo de Silva e Souza (2013). Em contrapartida, nos artigos científicos destinados aos docentes, ou seja, no campo dos estudos que enfatizavam a importância da formação docente como principal estratégia para o enfrentamento do racismo na escola, Camargo e Ferreira (2011), reforçam a importância de as questões raciais serem discutidas dentro da escola e estarem presentes na formação de professores, mas, além disso, enfatizam que a escola, representada por profissionais despreparados, peca pela falta de uma prática diária competente que venha contemplar a diversidade pluriétnica brasileira e colaborar para a construção de uma sociedade mais harmônica, motivo pelo qual, na atividade acadêmica, o debate sobre tais questões deve ser ampliado. Para isso, os autores defendem que se deve de realizar estudos que, se não 2358

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS diretamente voltados para as questões do afrodescendente, pelo menos, assumam como relevantes, as variáveis étnico-raciais, visando diminuir o risco de legitimar a discriminação. Infelizmente na formação docente, ainda é flagrante o despreparo dos professores para lidarem e identificarem as questões raciais na escola, e entre as estratégias sugeridas pelos estudos analisados, têm-se um programa de formação continuada, com uma abordagem ampla, aqui, Carvalho e Silva (2018) consideram que desconstrução de estereótipos e da ideologia do mito da democracia racial, o conhecimento das culturas afro-brasileira e indígena e a inclusão de formas de representação que formem uma visão positiva em relação aos povos indígenas e à população afrodescendente no Brasil, são absolutamente, essenciais para a afirmação da identidade e a autoestima desses grupos sociais. No mesmo sentido, Coelho e Santos (2013) sugerem que deve ser inserido na formação inicial e continuada de professores, a formulação de uma Pedagogia que trabalhe com a diversidade cultural, uma vez que a ausência de tais discursões, fatalmente, inviabiliza a subversão de práticas discriminatórias e estereotipias cristalizadas, em relação ao negro na escola e em seus instrumentos didático-pedagógicos. Corroborando com o estudo referido, Santana e Ferraz (2019) analisaram a importância da formação continuada promovida na universidade, através do curso de especialização “Política de Igualdade Racial no Ambiente Escolar”, para a configuração da prática pedagógica dos cursistas, onde, concluíram, que o curso ampliou a visão e mudou práticas pedagógicas dos educadores acerca do preconceito racial, de gênero e religioso. Nesse sentido, os processos de formação tendem a contribuir com a reflexão e construção de conhecimentos que os profissionais não possuíam, ou que contribuem para o aprofundamento de questões já conhecidas pelos professores. Ainda, destacamos, o estudo específico por área, especificamente, na geografia, destinados aos docentes daquele curso, onde, Girotto e Benedetti (2018), realizaram estudo de caso, acompanhando, por 6 meses, o trabalho de uma docente de geografia em uma escola pública da rede estadual de São Paulo e durante este período, observaram as ações didáticas desenvolvidas pela docente, com o intuito de problematizar e recriar o currículo de geografia, articulando-o com os debates sobre a geografia da África e a Questão Negra no Brasil e no Mundo. Outra temática, objeto dos artigos científicos analisados, diz respeito ao Racismo sob a forma de violência silenciosa, bem como a importância da Pedagogia Institucional no combate, 2359

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS as estratégias de enfrentamento que apareceram nos trabalhos analisados, em especial, no estudo de Silva e Dias (2013), que entendem que, três processos dinâmicos servem de sustentáculo da Pedagogia Institucional, quais sejam: o conjunto de técnicas, o grupo e o inconsciente. As técnicas viabilizam o compromisso do aluno com sua produção concreta, já os grupos favorecem o surgimento de jogos de identificação, individualizando no aluno o que ele tem de particular e agrupando-o no que tem de comum com o outro, por fim, o inconsciente, por ser valorizado, permite ao aluno existir de modo autônomo na sala de aula. Segundo os autores, a união desses três processos potencializa a ação do professor na escola, ajudando a eliminação de toda e qualquer forma de discriminação e preconceito, pois, ajuda na problematização do conflito existente entre o desejo de fazer do aluno e da aluna e a lei necessária a toda vida social. Não obstante os estudos referidos, não restam dúvidas que os resultados obtidos por esta revisão, indicam que os estudos concernentes à temática relacionada ao racismo e a educação básica, precisam se expandir em âmbito local e nacional, dada a importância das informações e debates sobre o tema, além disso, necessário a publicização de todos os meios e recursos que estão sendo utilizados para enfrentar o racismo. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como objetivo realizar uma revisão Bibliográfica sobre as estratégias para o enfrentamento do Racismo na educação, embora venha sendo elaborado práticas/atividades de enfrentamento dentro das instituições, este trabalho poderá está sendo explorado como recurso metodológico para práticas futuras de profissionais da educação que busquem estratégias de enfrentamento ao racismo dentro do contexto escolar. Mesmo com todas essas práticas disponíveis e aqui expostas é urgente a intensificação de medidas que possam ampliar metodologias para essa pauta, destacando a formação continuada de todo o corpo docente, em congruência aos contextos históricos e sociais. Dessa forma, estariam estes preparados para acolher e ampliar o debate nas escolas, não se restringindo somente em “práticas integrativas”, e sim em atuações que vão desde a escolha de autores e referencias até a elaboração dos planos e métodos de ensino, para que possa assim diminuir as lacunas que tornam este ambiente tão contraditório, tornando efetivo 2360

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS o papel socializador e formador da escola. É a partir desse contexto onde se estabelece uma aprendizagem afetiva, que a escola seria um agente ativo para a reestruturação social e de combate ao racismo. REFERÊNCIAS BAISLEY, E. Genocide and constructions of Hutu and Tutsi in radio propaganda. In: Race & Class. Londres: Institute of Race Relations, 2014, vol. 55(3), pp. 38-59. Disponível em: <http://rac.sagepub.com>. BRASIL. Lei 10639/2003. Diário Oficial da União. Brasília/DF, 10 de janeiro de 2003. BRASIL. Lei 11645/2008. Diário Oficial da União. Brasília/DF. 10 de março de 2008. CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. O racismo na História do Brasil. 8. Ed. São Paulo: Ática, 2003. CARVALHO, Guilherme Paiva de et al. As religiões afro-brasileiras na escola. Revista iberoamericana de educación, 2018. DA SILVA, Jerusa Paulino; FERREIRA, Rosângela Veiga Julio; DE SOUZA FARIA, Jeniffer. A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DA CRIANÇA NEGRA: A LITERATURA AFRO COMO POSSIBILIDADE REFLEXIVA. CES Revista, v. 25, n. 1, p. 283-295, 2011. DA SILVA, Tarcia Regina; DIAS, Adelaide Alves. O racismo sob a forma de violência silenciosa e as contribuições da pedagogia institucional no seu enfrentamento. Reflexão e Ação, v. 21, n. 1, p. 72-92, 2013. DE SANTANA, Élida Roberta Soares; FERRAZ, Bruna Tarcilia. Formação continuada para a educação das Relações Étnicas: relatos de cursistas do UNIAFRO-UFRPE. Odeere, v. 4, n. 8, p. 221-235, 2019. DOS SANTOS, Raquel Amorim; COELHO, Wilma de Nazaré Baía. HISTÓRIA DA ÁFRICA E DOS AFRICANOS NAS ESCOLAS BRASILEIRAS: MITO OU REALIDADE?. Reflexão e Ação, p. 123-148, 2013. FERREIRA, Ricardo Frankllin; CAMARGO, Amilton Carlos. As relações cotidianas e a construção da identidade negra. Psicologia: ciência e profissão, v. 31, n. 2, p. 374-389, 2011. GIROTTO, Eduardo Donizeti; BENEDETTI, Amanda Cristina. ” PORQUE ISSO ERA MOSTRAR O QUANTO EU ERA FORTE” A LEI 10639 E O ENSINO DE GEOGRAFIA: UM ESTUDO DE CASO NA CIDADE DE SÃO PAULO. Geo UERJ, n. 33, p. 32396, 2018. GILROY, P. O Atlântico negro. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes – Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2012. 2361

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICA MEDIDAS EXPANSIVAS DO ENSINO PRIVADO: EAD e Serviço Social em questão EXPANSIVE MEASURES OF PRIVATE EDUCATION: distance learning and social work in question Janaína Lopes do Nascimento Duarte1 Tamires dos Anjos Silva2 Natália Teodoro Lima3 RESUMO O texto busca elucidar as principais medidas tomadas pelo governo Temer durante o período de 2016-2018, mostrando quais legislações favoreceram o ensino privado, em detrimento do público, e como essas legislações foram propícias para a ampliação do ensino a distância, considerando seus desdobramentos para a formação em Serviço Social em solo brasileiro. Para construção deste estudo foi realizada ampla revisão bibliográfica e pesquisa documental, referente ao período 2016- 2018, sobre a educação superior e o ensino à distância no Distrito Federal/Brasil. Uma das conclusões importantes é que o padrão dependente de educação não é apenas uma tendência, mas é algo incentivado “por dentro”, por meio dos governos e de suas ações, como elementos estruturantes no capitalismo dependente. Palavras-chave: Educação Superior Brasileira; Ações e Legislações; EAD; Serviço Social. ABSTRACT The text seeks to elucidate the main measures taken by the Temer government during the period 2016-2018, showing which laws favored private education, to the detriment of the public, and how these laws were conducive to the expansion of distance learning, considering its consequences for training in Social Work on Brazilian soil. For the construction of this study, an extensive literature review and documentary research was carried out, referring to the period 2016- 1 Professora do Departamento de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade de Brasília (UnB); Mestre e Doutora em Serviço Social; [email protected]. 2 Estudante do 9º semestre de Graduação do Curso Diurno de Serviço Social da Universidade de Brasília (UnB); [email protected]. 3 Estudante do 9º semestre de Graduação do Curso Diurno de Serviço Social da Universidade de Brasília (UnB); [email protected]. 2363

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 2018, on higher education and distance learning in the Federal District / Brazil. One of the important conclusions is that the dependent pattern of education is not just a trend, but something encouraged “from within”, through governments and their actions, as a structuring element in dependent capitalism. Keywords: Brazilian Higher Education; Actions and Legislation; Distance Learning; Social Work. 1 INTRODUÇÃO O presente artigo é resultado da 1ª fase do projeto de pesquisa “Política de Educação Superior Brasileira no Capitalismo Dependente: Ações governamentais após 2016 e seus desdobramentos para o Serviço Social”, realizada no período 2020/2021, com apoio do Programa de Iniciação Científica (PIBIC) de uma universidade pública brasileira. A construção do estudo está pautada nos fundamentos sobre o Capitalismo Dependente no Brasil, considerando a obra do sociólogo Florestan Fernandes, e nas mediações teórico metodológicas, pautadas na perspectiva crítica dialética, com o objetivo de problematizar o debate educacional brasileiro, considerando a política de educação superior, o processo de expansão do setor privado, com destaque para os cursos à distância (EAD), e os desdobramentos para a formação qualificada em Serviço Social. Nestes termos, o problema de pesquisa se constituía nas ações do Governo Federal direcionadas para a política de educação superior, após 2016, e seus desdobramentos para a formação em Serviço Social, principalmente quanto à expansão do EAD no Distrito Federal (DF), local onde se encontra a capital do país. Assim, foi realizada pesquisa qualitativa, considerando dois relevantes procedimentos metodológicos: a) levantamento bibliográfico sobre a questão educacional no capitalismo dependente no Brasil, suas questões atuais e o EAD na educação superior, a partir de livros, periódicos da área do Serviço Social no Brasil e da Revista Universidade e Sociedade (Revista do Sindicato Nacional de Docentes de Instituições de Ensino Superior no Brasil – ANDES/SN); e b) pesquisa documental realizada a partir de legislações federais brasileiras aprovadas entre 2016- 2018 (decretos lei, projetos de lei, medidas provisórias), documentos em sites oficiais do governo federal, tais como Censos da Educação Superior/ Notas Estatísticas, Câmara Federal, Planalto, Portal da Transparência, MEC/INEP, e informações dos sites das entidades do Serviço Social (CFESS e ABEPSS). 2364

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Sem a pretensão de esgotar o tema, este texto busca apresentar e dialogar sobre os principais resultados da pesquisa, a partir dos seguintes tópicos: 1) o debate sobre capitalismo dependente como fundamento sócio-histórico para o padrão dependente educacional no Brasil; 2) as medidas governamentais de estímulo ao sistema privado e o Censo da Educação Superior, como dados da pesquisa realizada; 3) o avanço da modalidade EAD e a formação em Serviço Social em questão – particularidades do Distrito Federal; e, por fim, algumas considerações finais. Esperamos que as reflexões aqui contidas possam estimular novos estudos e pesquisas, bem como contribuir para a articulação teórica e política na luta pela educação superior de qualidade. 2 CAPITALISMO DEPENDENTE E PADRÃO EDUCACIONAL DEPENDENTE: UM DEBATE NECESSÁRIO NO BRASIL O capitalismo como modo de produção e reprodução social trouxe ao mundo uma dinâmica distinta entre as nações. Segundo a análise desenvolvida na vasta obra do sociólogo Florestan Fernandes, os países capitalistas foram organizados a partir de economias hegemônicas e economias dependentes, refletindo uma estrutura e dinâmica desigual, mas também combinada e necessária à totalidade do mundo capitalista. Neste sentido, os países latino-americanos, em particular o Brasil, apresentam, dentro da engrenagem capitalista, uma peculiaridade referente às outras economias: suas nações vivenciaram um “antigo sistema colonial”, no qual eram submetidos ao poder de Portugal e da Espanha. Como ressalta Fernandes (1975a, p. 13), “os fundamentos legais e políticos dessa dominação colonial exigiram uma ordem social em que os interesses das coroas e dos colonizadores pudessem ser institucionalmente preservados, incrementados e reforçados”. Com a inserção de vez no modo de produção capitalista, os países de caráter dependente, como o Brasil, passaram por um processo de modernização do colonialismo, ou seja, as características do antigo sistema colonial se mantiveram dentro do imperialismo, juntando estruturas arcaicas com estruturas modernas. Entretanto, essa “modernização” só foi possível através da exploração de recursos naturais e da exploração da força de trabalho humana nos países dependentes, alimentando o desenvolvimento das nações hegemônicas e permitindo a manutenção do subdesenvolvimento e da dependência sócio-política-cultural nas 2365

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS outras nações. Isto porque as estruturas dos países capitalistas hegemônicos “absorvem as estruturas dos países de capitalismo dependente, submetendo-as a seus próprios ritmos” (FERNANDES, 1995, p. 139), a partir do consentimento das classes dominantes locais, uma vez que tal dinâmica é útil e necessária também para a manutenção dos seus próprios privilégios. Assim, torna-se impossível um desenvolvimento nacional autônomo, livre das amarras políticas, econômicas e sociais vindas “de fora”. A burguesia interna, aliada a burguesia “de fora”, permite que o progresso interno seja subdesenvolvido para que a 1ª e a 2ª possam manter, ainda que de forma desigual, seus privilégios e dominação. Duarte (2020a, p. 79), a partir da obra florestaniana, destaca que a “composição burguesa nos países dependentes se forja na dominação em sua dupla face, operando um padrão dual de expropriação do excedente econômico, no qual parte fica com a burguesia internacional e outra parte fica com a burguesia local”. Tal condição se preserva e, ao mesmo tempo, conforme análises de Fernandes (1972, p. 14 – nota 2), [...] se redefine no curso da história, de tal modo que a posição heteronômica4 (ou dependente) da economia do País, em sua estrutura e funcionamento, mantém-se constante. O que vai variar é a natureza do nexo de dependência, da polarização da hegemonia e do poder de determinação do núcleo dominante. (FERNANDES, 1972, p. 14 – nota 2). No que se refere à América Latina, Fernandes (1975a, p. 35) destaca que o capitalismo e a sociedade de classes não são produtos de uma evolução interna [...] o capitalismo evoluiu na América Latina sem contar com condições de crescimento autossustentado e de desenvolvimento autônomo. Em consequência, classes e relações de classe carecem de dimensões estruturais e de dinamismos societários que são essenciais para a integração, a estabilidade e as transformações equilibradas da ordem social inerente à sociedade de classes. Desta forma, o padrão dependente acarreta consequências em vários segmentos da sociedade, e influencia diretamente nas políticas públicas, acarretando desdobramentos importantes no campo educacional. Isso significa dizer que as primeiras manifestações educacionais estavam inseridas em um molde vindo “de fora”, sob a condição de transplantação de conhecimentos e estruturas institucionais que causaram na educação 4 Em Florestan (1972) a noção de heteronomia (em contraposição à autonomia) está definida pela capacidade ou não de decisão, direção e gestão do processo de produção e de reprodução do capital nos países, determinando sua condição heterônoma (dependente) em relação ao desenvolvimento capitalista. 2366

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS nacional um “colonialismo educacional”, instaurando-se desde a educação básica até a superior (FERNANDES, 1975b). Situação que fez persistir traços que contribuíram para a constituição de um padrão educacional que aderiu “estrutural e funcionalmente, à concepção conservadora do mundo e as suas implicações educacionais, culturais e políticas” (FERNANDES, 1975b, p. 55). Portanto, quando inserimos a educação superior dentro dessa realidade educacional, podemos dizer que, de acordo com Fernandes (1975b, p. 58), O padrão brasileiro de escola superior pressupõe um ingrediente externo, especificamente político, mas que é essencial - a natureza de sua relação com o sistema de poder de uma sociedade de estrutura oligárquica. As “causas próximas\" das inconsistências e deficiências crônicas da escola superior brasileira constituem meras funções dessa conexão, ao mesmo tempo estrutural e dinâmica. Ou seja, a educação superior brasileira surge e se desenvolve a partir dos interesses políticos e econômicos burgueses. Sendo assim, os avanços da educação superior se dão através de uma “modernização conservadora” e a sua expansão ocorre sob a tutela das elites, em que a ampliação do acesso à educação passou a ser uma exigência do capital, seja de qualificação da força de trabalho para o atendimento das alterações produtivas, seja para difusão da concepção de mundo burguesa sob a imagem de uma política inclusiva. (LIMA, 2007, p. 127). Partindo desse contexto histórico e considerando que tais relações sócio-política- educacional não foram superadas historicamente, é possível afirmar que tal padrão dependente educacional se perpetua e materializa-se no campo jurídico político por meio da aprovação de legislações, medidas, programas e projetos, especialmente mantendo o traço estruturante do favorecimento ao ensino privado, com repasses de verbas públicas para instituições privadas. Cabe dizer ainda que há um desmonte da educação superior pública, por meio da precarização e intensificação do trabalho docente, desvalorização de servidores administrativos, redução geral de investimentos, inclusive no campo das pesquisas e da assistência estudantil (DUARTE, 2020b). Assim, traremos a seguir sobre algumas medidas tomadas no período 2016 e 2018 que elucidam essa realidade tão complexa, especialmente a partir do incentivo à privatização e do desmonte da educação superior no Brasil. 2367

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 3 MEDIDAS GOVERNAMENTAIS DE INCENTIVO AO PRIVADO E CENSO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: DADOS DA REALIDADE PESQUISADA No ano de 2016 ocorreu o golpe de Estado em que a ex-presidenta Dilma foi retirada de seu cargo e seu vice, Michel Temer, passou a assumir a presidência do país. No decorrer do governo de Temer, tiveram diversas medidas que favoreceram a ampliação do setor privado na educação superior. A primeira legislação foi a Portaria Normativa nº 14, de 11/05/2016 (BRASIL, 2016a), em que foram ampliadas as vagas em cursos de Instituições de Ensino Superior (IES) privadas, dissociada da autonomia dessas instituições, com oferta de vagas em processos seletivos do FIES5. A segunda foi, a Lei do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Lei 13.334, de 13/09/2016 (BRASIL, 2016b), destinada à ampliação e a interação do Estado com a iniciativa privada, fazendo com que os recursos passassem a ser descentralizados, ou seja, direcionados também para o setor privado. Esta medida já estava prevista no plano de governo de Temer. Temos que viabilizar a participação mais efetiva e predominante do setor privado na construção e operação de infraestrutura, em modelos de negócio que respeitem a lógica das decisões econômicas privadas, sem intervenções que distorçam os incentivos de mercado, inclusive respeitando o realismo tarifário. (FUNDAÇÃO ULYSSES GUIMARÃES; PMDB, 2015, p. 17). A legislação com maior repercussão em 2016, e que tem repercussões até a atualidade, foi a PEC 95, aprovada em 16/12/2016, que estabeleceu o orçamento baseado nos anos anteriores, de acordo com o índice do IPCA. Conforme análise de Reinholz (2018, on line), “quando a emenda diz que a partir de agora o crescimento é só pelo índice do IPCA, ela está dizendo que os gastos sociais serão reduzidos, porque o crescimento do índice é insuficiente para contemplar o crescimento da população”. Portanto, a PEC 95 provocou o congelamento dos investimentos por um período de 20 anos, incluindo a política de educação6, o que implicou 5 O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) foi criado por meio da Lei nº 10.260, de 12/07/2001 e destinado ao financiamento de estudantes de graduação matriculados em instituições não gratuitas. Aprofundamentos ver: BRASIL. Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre o FIES e dá outras providências. Presidência da República- Secretaria Geral. Subchefia Para Assuntos Jurídicos. Brasília, 2001. Disponível em: https://bit.ly/3yogTJC . Acesso em: 02/03/2022. 6 Para educação, os investimentos mínimos com a manutenção e o desenvolvimento do ensino deveriam ser de 18% da receita de impostos, no caso da União, e de 25% da receita de impostos e transferências, para estados e municípios (REINHOLZ, 2018, online). 2368

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS em cortes, restrições e estagnação, em especial, no ensino superior, sendo as universidades federais atingidas diretamente. Na verdade, a PEC 95 teve repercussões consideráveis nos anos seguintes, em 2017 e 2018, em que, conforme Portal da Transparência (BRASIL/ CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO, 2017; 2018), houve uma quantidade notável de repasse financeiro para o FIES. Em 2017 o repasse foi de 19,14% e em 2018 foi de 12,01%. Cabe destacar que em 2018, o valor repassado para o funcionamento e financiamento das IES públicas foi de R$ 3,85 bilhões e para o FIES foi de R$ 11,48 bilhões. Em contrapartida não houve nenhum repasse para o REUNI7, programa que viabilizou a expansão das universidades públicas. Portanto, observa-se uma ampliação e um financiamento maior voltado para as IES privadas, em que o governo de Temer não só permitiu, mas garantiu suporte jurídico e político. Conforme análise sobre a continuidade deste processo, Duarte e Irineu (2020, p. 2664- 2665) ressaltam que há ainda o crescimento empresarial que detém o monopólio das universidades privadas no Brasil, intensificando-se a partir de 2010 com a Kroton, Estácio, Laureate e Anima, o que gerou um indicador de indústria acadêmica no Brasil. Essa abertura é crescente devido ao Estado se desresponsabilizar cada vez mais na garantia dos direitos sociais, sob alegação de falta de recursos financeiros e orçamentários. Tal cenário expressa a educação superior moldada de acordo com os ditames lucrativos de um país que se encontra na periferia do capitalismo. Os dados dos Censos da Educação Superior - Notas Estatísticas, entre os anos de 2016 – 2018 confirmam o aumento das IES privadas, em detrimento do setor público educacional. No ano de 2016, 87,70% das IES eram privadas e 12,30% eram públicas, incluindo as federais, municipais e estaduais (INEP/MEC, 2016). Em relação às vagas nos cursos de graduação, neste ano, eram 93% na rede privada de ensino e 7% nas instituições públicas. Em 2017, 87,9% das instituições eram privadas e 12,1 % eram públicas. No que se refere às vagas nos cursos de graduação, mais uma vez a rede privada predominou com 92,4% do total e apenas 7,6% na rede pública (INEP/MEC, 2017). No último ano do mandato de Temer, em 7 Criado pelo Decreto nº 6.096/2007, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) tinha como objetivo principal ampliar o acesso e a permanência dos estudantes nas universidades federais, a partir do aumento do número de vagas nos cursos de graduação, em especial noturnos. Para aprofundamentos ver: BRASIL. Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007. Institui o REUNI. Presidência da República- Secretaria Geral. Subchefia Para Assuntos Jurídicos. Brasília, 2007. Disponível em: https://bit.ly/2Uk50FM Acesso em:02/03/2022. 2369

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 2018, o percentual de instituições privadas era de 88,2% e, em relação às públicas era 11,8% (INEP/MEC, 2019). Esses dados elucidam como foi a política de governo de Temer em que a educação pública recebeu ainda menos investimentos para a sua manutenção e permanência, tornando- se a minoria quando comparada a expansão do ensino superior privado. E dentro desta expansão privada a modalidade à distância vem se ampliando cada vez mais, favorecendo a lucratividade dos setores da burguesia local associada à hegemônica. 4 O AVANÇO DA MODALIDADE EAD E A FORMAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL: PARTICULARIZANDO O DISTRITO FEDERAL O Ensino à distância surge com o intuito de ampliar a educação superior a partir de recursos tecnológicos (Internet), conduzindo a um rápido crescimento que vem implicando em ameaça à educação de qualidade. Uma das primeiras formas de incentivo a essa modalidade encontra-se na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, a Lei n° 9394/1996, que no seu Artigo 80 diz que “O Poder Público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada” (BRASIL, 1996). A partir disso, outros Decretos e Resoluções foram aprovados no intuito de garantir a consolidação do EAD no país8. A partir disso, o número de alunos que ingressaram nessa modalidade de ensino cresceu de forma significativa, como é possível identificar nos Censos da Educação Superior. Um dos dados que podemos explicitar foi o aumento de 20% de estudantes no EAD entre os anos de 2015 e 2016 e em contraposição a isso, houve um decréscimo de 3,7% de ingressantes entre esses mesmos anos na modalidade presencial (INEP/MEC, 2020, online). No Censo da Educação Superior - Notas Estatísticas de 2017 (INEP/MEC, 2017) é possível ver que em um período de dez anos (2007 – 2017) o número de ingressos na modalidade EAD passou de 329.271 em 2007 para 1.073.497 no ano de 2017. 8 Alguns exemplos: a) Resolução n°1, publicada no Diário Oficial da União em 11/03/2016 que estabelece Diretrizes e Normas Nacionais para a Oferta de Programas e Cursos de Educação Superior na Modalidade a Distância (BRASIL, 2016c); e b) o Decreto n° 9057, de 25/05/2017, que regulamentou o Art. 80 da LDB de 1996, especialmente no que se refere ao ensino a distância (BRASIL, 2017). 2370

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Em relação à formação em Serviço Social, segundo o Relatório Síntese de Área - Serviço Social, elaborado a partir do ENADE 2018 (INEP/MEC, 2018, p. 24), torna-se explícita a predominância dos cursos privados: “Considerando-se a Categoria Administrativa das IES, destaca-se a predominância das Instituições Privadas de ensino, que concentraram 263 dos 330 cursos de Serviço Social, número correspondente a 79,7% dos cursos avaliados.” Focando no curso de Serviço Social no Distrito Federal, analisamos, a partir do site E- MEC9, que há trinta e cinco (35) IES em atividade que oferecem a graduação em Serviço Social na modalidade EAD e presencial. Dessas 35, identificamos, por meio de pesquisas na Internet e nos sites das instituições, que muitas não possuíam sede física no DF, dificultando uma análise mais aprofundada das condições de oferta dos cursos e do seu funcionamento. Particularizando as instituições que possuíam polos de apoio para EAD ou sede física para cursos presenciais, destacamos que, das 35 instituições, apenas 19 IES se enquadravam nessas condições, constituindo-se em: 14 IES que ofereciam o curso exclusivamente na modalidade EAD; 04 IES ofereciam em ambas as modalidades (presencial e EAD); e apenas 01 oferecia exclusivamente na modalidade presencial, sendo esta uma universidade pública (Universidade de Brasília - UnB). Quanto às IES que ofereciam o curso na modalidade EAD, foi possível identificar alguns problemas acerca da oferta do curso de Serviço Social no DF, tais como: 1) grande quantidade de polos EAD presentes, destacando que esses polos serviam apenas para apoio aos estudantes que cursam essa modalidade e alguns também funcionavam como local para realização de provas semestrais; 2) algumas divergências de informações que foram encontradas no E-MEC em comparação com as disponibilizadas nos sites das IES, tais como: incompatibilidades sobre a quantidade de campus/polos existentes no DF e se as instituições estavam realmente ofertando o curso de Serviço Social10; e 3) ausência de informações gerais sobre o curso de Serviço Social em várias dessas IES. Cabe destacar que os sites muitas vezes não ofereciam recursos suficientes para saber como: as instituições prestavam o serviço educacional; se realizavam os processos seletivos; funcionavam os cursos; quais eram os projetos pedagógicos dos cursos etc. 9 Disponível em: <https://emec.mec.gov.br/>. Vários acessos, sendo o último em: 25/04/2021. 10 No site E-MEC algumas IES constavam ter sedes no DF. Entretanto, fazendo buscas na Internet e nos sites dessas instituições, identificamos que as mesmas não tinham sede e também que outras mostravam estar ofertando o curso de Serviço Social no E-MEC, mas apresentavam o contrário em seus sites oficiais. 2371

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Muitos pontos são questionados na modalidade EAD quando se trata da qualidade da educação superior, especialmente quando se refere à troca de conhecimentos e vivências no ensino a distância, tais como a falta de interação entre professores e alunos, podendo ocasionar dificuldades na comunicação e dúvidas, bem como a ausência de debates que gera limitação na aprendizagem. Além disso, ao ser uma modalidade que depende totalmente das tecnologias, qualquer eventual problema técnico (acesso à internet, problemas nos computadores, etc.) pode comprometer a realização das aulas. O curso de Serviço Social apresenta também problemáticas diante da modalidade EAD, uma vez que o debate da formação profissional dos Assistentes Sociais tem provocado várias reflexões dentro do movimento estudantil, bem como pelas entidades organizativas da categoria profissional do Serviço Social (CFESS e ABEPSS). Neste sentido, alguns problemas podem ser aqui citados: falta de comprometimento do EAD com a realização de pesquisa e extensão; dificuldades enfrentadas no momento do estágio supervisionado obrigatório e na execução dos Trabalhos de Conclusão de Curso, especialmente com redução de exigências necessárias a qualificação da formação (CFESS, 2014). Por ser caracterizada como uma formação aligeirada e precarizada, o Serviço Social diante do EAD aponta várias outras problemáticas específicas, tais como: a falta de um projeto pedagógico que esteja na direção das Diretrizes Curriculares para o Curso de 1996; as contradições diante do Projeto Ético Político da profissão; além da ausência de condições objetivas que promovam a articulação do tripé ensino, pesquisa e extensão (CFESS, 2014). Portanto, nessa modalidade, “quem dá a direção da alocação dos discentes não é o projeto pedagógico do curso, conforme critérios indicados nas Diretrizes Curriculares de 1996, mas a lucratividade da empresa educacional [...]” (DUARTE, 2019, p.165). Assim, é possível afirmar: Um graduado em Serviço Social, formado com frágil embasamento teórico, técnico- interventivo e ético-político, não tem possibilidades efetivas de se contrapor, por meio de estratégias profissionais cotidianas, ao perfil contemporâneo da política social brasileira. (CFESS, 2014, p.34). Desse modo, o EAD causa impactos significativos tanto na formação dos estudantes de Serviço Social, quanto na qualificação do exercício profissional dos Assistentes Sociais, uma vez que uma formação sem aprofundamento crítico pode impactar diretamente na prestação dos serviços sociais e, consequentemente, na vida dos usuários das políticas. 2372

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Concluímos que o padrão dependente de educação não é apenas uma tendência, mas é algo incentivado e facilitado por dentro (pela burguesia local, em associação com os interesses burgueses externos), por meio dos governos e de suas ações, como elemento estruturante no capitalismo dependente. Assim, analisar e compreender as legislações evidencia o processo de continuidade do incentivo à privatização e à mercantilização da educação superior brasileira. Através de uma falácia de ampliação do acesso educacional e “democratização” do ensino, o desmonte vem sendo conduzido e arquitetado por camadas sociais que se beneficiam desse processo: a minoria burguesa que lucra com tal situação, especialmente com a expansão do EAD. Isto porque “a expansão do capitalismo dependente em solo brasileiro realiza a renovação dos padrões dependentes de desenvolvimento e de educação, ratificando desigualdades, concentração de renda, de prestígio e de poder” (DUARTE; IRINEU, 2020, p. 2669). Por fim, é possível identificar que a precarização da educação superior, por meio particularmente da expansão do EAD, especialmente no curso de Serviço Social, prejudica uma formação superior qualificada, bem como a real democratização do acesso à educação de nível superior, comprometendo também a formação de profissionais de fato qualificados e críticos que possam contribuir para um outro patamar de desenvolvimento capitalista que não o dependente. Então, defender a universidade pública é mais do que necessário nos tempos atuais, tendo em vista que só assim será possível uma quantitativa e qualitativa ampliação da educação superior reconhecida como direito social. REFERÊNCIAS CFESS. Sobre a Incompatibilidade entre graduação à distância e Serviço Social - Volume II. CFESS: Brasília, 2014. BRASIL. Decreto nº 9.057, de 25 de maio de 2017. Regulamenta o art. 80 da Lei nº 9.394. Presidência da República- Subsecretaria -Geral. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasília, 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2017/decreto/d9057.htm. Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Portaria Normativa nº 14, de 11 de maio de 2016. Dispõe sobre a ampliação do número de vagas anuais autorizadas nos cursos de instituições de educação superior sem 2373

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS prerrogativa de autonomia em razão da oferta de vagas nos processos seletivos do Fies. Brasília: MEC, 2016a. Disponível em: https://bit.ly/3xoYTxn . Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Lei nº 13.334, de 13 de setembro de 2016. Cria o Programa de Parcerias de Investimentos - PPI; altera a Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, e dá outras providências. Presidência da República- Secretaria Geral. Subchefia Para Assuntos Jurídicos. Brasília, 2016b. Disponível em: https://bit.ly/2VsVC3l . Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Resolução nº 1, de 11 de março de 2016. Estabelece Diretrizes e Normas Nacionais para a Oferta de Programas e Cursos de Educação Superior na Modalidade a Distância. Diário oficial da União- MEC/CNE. Brasília, 2016c .Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/- /asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21393466/do1-2016-03-14-resolucao-n-1-de-11- de-marco-de-2016-21393306. Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Presidência da República- Casa Civil. Subchefia para assuntos jurídicos. Brasília,1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Visão geral da distribuição por subárea (subfunção) - Educação. 2018. In: Portal Da Transparência. Brasília, 2018. Disponível em: https://bit.ly/3xoRhep Acesso em: 01/03/2022. BRASIL. Controladoria-Geral da União. Visão geral da distribuição por subárea (subfunção)- Educação. 2017. In: Portal Da Transparência. Brasília, 2017. Disponível em: https://bit.ly/3AjKjJJ . Acesso em: 01/03/2022. DUARTE, J. L. do N. Notas sobre o pensamento educacional de Florestan Fernandes. In: LIMA, Kátia Regina de Souza (Orgs). Capitalismo dependente, racismo estrutural e educação brasileira: diálogos com Florestan Fernandes. Uberlândia: Navegando Publicações, 2020a, p. 77-93. DUARTE, J. L. do N. Educação Superior e Trabalho Docente no Serviço Social: processos atuais, intensificação, produtivismo e resistências. 1ª ed. Curitiba: Appris, 2020b. DUARTE, J. L. do N. Resistência e formação no Serviço Social: ação política das entidades organizativas. In: Serviço Social e Sociedade. São Paulo, n. 134. p. 161-178, jan./abr. 2019. Disponível em: https://bit.ly/2VZyzx8 . Acesso em: 01/03/2022. DUARTE, J. L. do N.; IRINEU, B. S. A. A educação superior e os desafios à universidade brasileira em tempos de pandemia. In: Anais do III Simpósio Internacional sobre Estado, Sociedade e Políticas Públicas (SINESPP). Teresina: PPGPP/UFPI, 2020. FERNANDES, F. Em busca do socialismo: últimos escritos e outros textos. São Paulo: Xamã, 1995. FERNANDES, F. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1975a. 2374

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS NOVO ENSINO MÉDIO, ITINERÁRIOS FORMATIVOS E DESIGUALDADES EDUCACIONAIS EM DEBATE NEW HIGH SCHOOL, TRAINING ITINERARIES AND EDUCATIONAL INEQUALITIES IN DEBATE Samara Cristina Silva Pereira1 Verissimo Docarmo Neto2 RESUMO A Lei nº 13.415/2017 alterou a LDB/1996, remodelando o ensino médio e introduzindo diversificados itinerários formativos no currículo, a serem ofertados conforme contexto local e possibilidades das instituições escolares. Esta flexibilização do currículo desconsidera, segundo Ferreti (2022), as distintas condições de materialização da proposta, abrindo debate quanto às possibilidades de acesso dos estudantes aos itinerários formativos que desejarem, conforme abordado neste trabalho. Situa-se a discussão do ensino médio na educação brasileira observando as disputas históricas em torno desta etapa formativa, utilizando-se de levantamento da legislação educacional e estudos sobre o tema. Verifica-se ausência de consenso acerca do delineamento da educação de nível médio e a presença da dimensão classista em diferentes propostas, sendo o modelo instituído pela Lei 9.394/1996, pós-constituição de 1988, como aquele que propôs superar essa dimensão. No remodelamento atual, a oferta de distintos itinerários formativos tende aprofundar as desigualdades educacionais frente as condições desiguais das unidades educacionais. Palavras-chave: Política educacional; Novo Ensino Médio; Desigualdades Educacionais. ABSTRACT Law No. 13.415/2017 amended LDB/1996, remodeling high school and introducing diversified training itineraries in the curriculum, to be offered according to the local context and possibilities of school institutions. This flexibilization of the curriculum disregards, according to Ferreti (2022), the different conditions of materialization of the proposal, opening a debate regarding the possibilities of students' access to the training itineraries they wish, as discussed in this work. The 1 Assistente Social do IFPI, Mestre em Políticas Públicas. 2 Professor do IFPI, Mestre em Educação Matemática. 2377

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS discussion of secondary education in Brazilian education is situated observing the historical disputes around this formative stage, using a survey of educational legislation and studies on the subject. There is a lack of consensus about the design of secondary education and the presence of the class dimension in different proposals, with the model established by Law 9,394/1996, post-constitution of 1988, being the one that proposed to overcome this dimension. In the current remodeling, the offer of different training itineraries tends to deepen the educational inequalities in the face of the unequal conditions of the educational units. Keywords: Educational policy; New High School; Educational Inequalities. 1 INTRODUÇÃO O escopo deste artigo discute o delineamento assumido pelo ensino médio nos sistemas de ensino e suas unidades escolares a partir das mudanças engendradas pela Lei n° 13.415 de 16 de fevereiro de 2017, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB n° Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, e passou a ser implementada em todo sistema educacional brasileiro em 2022. As alterações propostas pelo modelo em curso, incluem a ampliação da carga horária desta etapa e define a possibilidade de distintos itinerários formativos em sua composição, com caminhos propedêuticos e profissionalizantes a serem executados pelas unidades educacionais conforme sua realidade e possibilidades locais, dentre outras mudanças. Tal remodelamento flexibiliza o currículo do último ciclo da educação básica, constituindo motivo de dissenso entre educadores, estudantes e formuladores de políticas públicas, e reflete inflexões presentes na concepção e possibilidades de oferta do grau médio desde a insituição do sistema educacional. Considerando-se que as unidades educacionais nos estados e municpios possuem condições estruturais, de recursos financeiros e pessoal muito distintas para a implantação do modelo ora em curso, o presente trabalho objetiva discutir como o novo ensino médio e a sua diversidade de itinerários formativos tendem a repercutir sobre as desigualdades educacacionais entre os estudantes das diferentes classes. As discussões e reflexões elaboradas fundamentam-se nas análises realizadas a partir da revisão documental sobre legislação educacional e produção de estudiosos referente ao nível médio no Brasil. O trabalho está organizado em duas seções principais: a primeira caracteriza a educação de nível médio a partir da constituição do sistema educacional brasileiro, destacando 2378

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS suas interfaces com a educação profissional técnica em cada legislação e sua dimensão classista; a segunda, apresenta os modelos adotados pós Constituição de 1988, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e sua reformulação proposta pela Lei n°13.415 de 2017, discutindo a sua organização, com foco sobre a oferta dos itinerários formativos e as implicações que a oferta destes pode ter sobre as desigualdades educacionais entre os estudantes. Na conclusão, apreende-se que a nova reconfiguração do ensino médio, que flexibiliza o currículo, retoma a possibilidade de oferta educacional desigual com consequências aos estudantes, unidades escolares e todo sistema educacional. 2 CONFORMAÇÃO DO ENSINO DE NÍVEL MÉDIO NO BRASIL: dualismo educacional e diferenças de classe Na década de 1930, o Estado passa ao reconhecimento de direitos no campo do trabalho, da educação, da assistência social e da previdência e, consequente, desenvolvimento das políticas sociais, o que impôs a concepção e materialização de uma complexa máquina administrativa. Nesse período foram criados o Ministério da Educação e Saúde Pública e o Conselho Nacional de Educação, como órgãos de acompanhamento e supervisão, e foram alteradas a organização de todos os graus e modalidades de ensino através das reformas promovidas em 1931, pelo Ministro Francisco Campos, em 1942, pelo Ministro Gustavo Capanema (SCHWARTZMAN; BOMENY; COSTA, 2000). Na educação média, o ensino secundário tradicionalmente voltado à preparação das elites para acesso ao ensino superior e condução do país, teve sua estrutura reformulada pelos decretos n° 19.890, de 18 de abril de 1931, e n° 21.241, de 14 de abril de 1932, de modo que passasse a ter como finalidade a preparação integral do homem para todos os grandes setores da atividade nacional, conforme destaca Campos (1940, apud MORAES, 1992, p. 301). Propunha-se uma formação geral consoante o espírito do estado nacional sob forte influência dos princípios positivistas, devendo habilitar os egressos do grau médio para a vivência cívica com autonomia. Destaque-se a ausência de referência direta à formação para o trabalho. A estrutura do secundário era composta de dois ciclos: fundamental, com cinco anos, e complementar, com dois anos, tendo o primeiro uma matriz curricular unificada e o segundo composto por disciplinas obrigatórias e diferenciadas. As de caráter obrigatório eram 2379

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS propedêuticas e de cunho enciclopédico. As disciplinas diferenciadas dependiam do curso superior pretendido (SCHWARTZMAN; BOMENY; COSTA, 2000, p. 205). O secundário à epoca mantinha as características de um currículo enciclopédico, diversificado e preparatório para continuidade dos estudos em carreira universitária, sendo meio de ilustração dos membros da elite. O ensino profissional de nível médio começava também a ser organizado nesse período, mas sua organização não mantinha qualquer articulação com o ensino secundário e não dava acesso ao ensino superior, sendo sua oferta marcada pela terminalidade (ROMANELLI, 2009). Mantinha-se com tais modelos a clara dicotomia entre educação propedêutica e educação para o trabalho, sendo a primeira símbolo de classe, dirigida aos membros das elites e continuidade dos estudos, enquanto a segunda preparatória dos trabalhadores, favorecendo a reprodução da estrutura social. Na década de 1940, uma nova reforma sobre a educação de nível médio foi procedida através das Leis Orgânicas da Educação, como ficaram conhecidos os decretos instituídos entre 1942 e 1946, que reformaram a educação brasileira e estabeleciam “a educação superior, a educação secundária, a educação primária, a educação profissional e a educação feminina; uma educação destinada à elite da elite, outra educação para a elite urbana, uma outra para os jovens” (SCHWARTZMAN; BOMENY; COSTA, 2000, p. 205). O ensino secundário permaneceu organizado em dois ciclos, mas com estruturas distintas. O primeiro, denominado ginásio, possuía quatro séries, e preparava para ingresso no 2º ciclo do secundário ou nos cursos profissionalizantes de nível médio. O segundo ciclo do secundário era formado de três séries, destinava-se à preparação para ingresso no ensino superior e realizava-se através do curso clássico ou do científico. O clássico, com predomínio de disciplinas vinculadas às letras e às humanidades; e o científico, mais voltado para a matemática e as ciências (SCHWARTZMAN; BOMENY; COSTA, 2000, p. 205). O ensino profissional de grau secundário passou a ser organizado em diferentes ramos e níveis de ensino, mantendo a sua composição e conteúdos voltados à formação de trabalhadores. Dentre os decretos, o Decreto-Lei nº 4.119, de 21 de fevereiro de 1942, que tratava do ensino industrial, previu que egressos dos cursos industriais tivessem acesso ao ensino superior, desde que em curso relacionado ao técnico cursado, mas tal possibilidade não chegou a se efetivar. Nesse período, a estrutura do secundário mantinha-se voltada a 2380

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS manutenção de uma educação centrada na cultura humanística, capaz de promover a consciência patriótica, necessárias à manutenção do Estado Ditatorial e suas instituições. As reformas educacionais do governo Vargas tiveram continuidade no governo provisório de José Linhares, que antecedeu Gaspar Dutra na transição do Estado Novo para o regime democrático. Foram instituídas a Lei Orgânica do Ensino Normal - Decreto-Lei nº 8.530 e a organizado Ensino Agrícola - Decreto-Lei nº 9.613 (SCHWARTZMAN; BOMENY; COSTA, 2000, p. 205), estas não alteraram o modelo educacional dual. Novas mudanças na oferta do grau médio ocorreram através da Lei nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961- LDB/1961 que incluiu disciplinas propedêuticas do secundário no primeiro e segundo ciclo do ensino profissionalizante, além de autorizar a continuidade nos estudos superiores entre estudantes que concluíssem o profissionalizante de nível médio. No nível médio, a Lei institui dois ciclos para o secundário: o ginasial, de quatro séries anuais, e o colegial, de três no mínimo, e admitia para o secundário uma “variedade de currículos, segundo as matérias optativas que forem preferidas pelos estabelecimentos” (BRASIL, 1961), dentre as quais, uma vocacional. No início dos anos de 1970, uma nova reforma sobre a educação acontece por meio da Lei de Diretrizes e Bases de 1971 – Lei n° 5.692, de 11 de agosto de 1971, introduzindo mudanças na educação fundamental e média, com a criação do segundo grau profissionalizante como parte da estratégia dos militares para conter a demanda por ensino superior e, ao mesmo tempo, atender a demanda por mão-de-obra qualificada frente a expansão da industrialização, conforme sublinham Pereira e Passos (2012). No novo modelo, o ensino primário e o ginasial (primeiro ciclo do secundário) foi substituído pelo ensino de 1° grau, com duração de oito anos, voltado à formação geral, à sondagem das aptidões profissionais e à iniciação para o trabalho. Enquanto o colegial (segundo ciclo do secundário) e o técnico (industrial, comercial e agrícola), foram substituídos pelo ensino de 2.º grau de três a quatro anos, conforme o currículo do curso profissional que se realizasse (BRASIL, 1971). Essa Lei tentou substituir o modelo humanístico/científico que contribuía para a busca por ensino superior, constituindo um marco na interface estabelecida entre educação propedêutica e profissionalizante, haja vista que a relegada qualificação para o trabalho, destinada alguns, passa a ser o destino de todos, constituindo o segundo grau profissionalizante a única alternativa para o grau médio. 2381

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Conforme estudiosos da educação, dentre os quais Zibas (2005), a reforma que trouxe a “profissionalização compulsória” enfrentou obstáculos à sua implementação, dentre os quais: os altos custos para garantir a infraestrutura adequada e pessoal especializado para ministrar os cursos; a dicotomia de conteúdos propedêuticos e profissionalizantes sendo ministrados sem qualquer diálogo ou articulação, contrariando o princípio da integração entre os conteúdos de formação geral e para o mundo do trabalho; e o ethos de classe, através da resistência das classes altas e médias desinteressadas do ensino profissionalizante. Nesse contexto, conforme expõe Zotti (2000), a profissionalização compulsória foi flexibilizada através do Parecer 76/1975 que diminuiu as exigências postas à realização da formação profissional e atendeu a reivindicações de proprietários de escolas particulares e das classes médias e altas, interessados na formação preparatória para o vestibular. Em 1982, a Lei nº 7.044, de 18 de outubro de 1982, tornou a formação profissional opcional, a critério do estabelecimento de ensino (BRASIL, 1982), mantendo a possibilidade tanto do profissionalizante quanto do propedêutico, de credenciar para ingresso nos cursos superiores. Nessa esteira, as escolas que não eram profissionalizantes retomaram o currículo propedêutico e preparatório para o vestibular, atendendo ao anseio das classes médias e altas por uma formação preparatória para o ensino superior. Tem-se até esse momento da história uma série de medidas e reformas empreendidas em torno do delineamento do ensino de nível médio na educação brasileira, que revelam as disputas presentes em torno desse nível de ensino. Como o ensino médio se configura a partir do retorno da ordem democrática e dos princípios da Constituição Federal de 1988, é o que se discute no item a seguir, tendo como referências a LDB de 1996, que institui o ensino médio e a Lei nº 13.415/2017 que traz o remodelamento desta etapa da educação básica. 3 O ENSINO MÉDIO PÓS-CONSTITUIÇÃO CIDADÃ: a busca por igualdade na efetivação do direito à educação básica e a reforma do novo ensino médio As análises sobre as concepções e modelos que orientam o ensino médio no bojo do sistema educacional brasileiro tem como uma das principais referências a promulgação da Constituição Federal de 1988, no contexto de retomada da ordem democrática com intensa participação da sociedade civil. A partir da Constituição Cidadã, a educação assume a 2382


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