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Eixo 6 EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS

Published by Editora Lestu Publishing Company, 2022-09-29 16:46:24

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL THE INCLUSIVE EDUCATION POLICY AND PROFESSIONAL TRAINING IN SOCIAL SERVICE Geovana de Andrade e Silva1 Jeovana Nunes Ribeiro2 RESUMO O presente trabalho aborda a formação profissional a partir do que está posto no documento da Política Nacional de Educação Inclusiva e a realidade vivenciada por estudantes com deficiência. A pesquisa teve como objetivo analisar a formação profissional dos(as) discentes com deficiência matriculados(as) no curso de Serviço Social. Além da análise bibliográfica e documental, foi realizada a pesquisa de campo e a análise dos dados; permitiu perceber avanços na política de educação inclusiva, mas também a urgente necessidade em romper as barreiras arquitetônicas, tecnológica, atitudinais e pedagógicas a fim de garantir não só a inclusão, mas o egresso das pessoas com deficiência que buscam o ensino superior público, gratuito e de qualidade. Palavras-chave: Pessoa com Deficiência; Formação Profissional; Serviço Social. ABSTRACT The present work approaches professional training from what is stated in the document of the National Policy for Inclusive Education and the reality experienced by students with disabilities. In addition to the bibliographic and documental analysis, field research and data analysis were carried out; made it possible to perceive advances in inclusive education policy, but also the urgent need to break architectural, technological, attitudinal and pedagogical barriers in order to guarantee not only inclusion, but the egress of people with disabilities who seek public, free and quality higher education. 1 Graduanda em Serviço Social UFMA e bolsista voluntária PIBIC inscrita no projeto de pesquisa “As pessoas com deficiência no ensino superior: um estudo na Educação Pública do Maranhão”. E-mail: [email protected]. 2 Doutora em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista UNESP/FRANCA/SP. Professora vinculada ao Departamento de Serviço Social, coordenadora do projeto de pesquisa: “As pessoas com deficiência no ensino superior: um estudo na Educação Pública do Maranhão”. E-mail:[email protected]. 2019

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Keywords: People with Disabilities; Professional qualification; Social service. 1 INTRODUÇÃO Primordialmente, faz-se necessário pontuar que segundo a Constituição Federal Brasileira aprovada em 1988, a educação é um direito de todos os seres humanos, sendo dever do Estado promovê-la nos diferentes níveis de escolaridade, sem restrições. Contudo, às pessoas com deficiência se apresentam maiores obstáculos, em decorrência dos limites impostos pela mesma, bem como dos estigmas sociais e culturais, que demonstram a persistência das bases excludentes na vida social. Resultado de um longo processo de desafios e avanços, a educação na perspectiva inclusiva é a consolidação de anos de luta a fim garantir não apenas o acesso, mas também a permanência daqueles que historicamente foram segregados do ensino comum e tiveram suas capacidades subestimadas pela sociedade. Sendo a educação uma das formas mais efetivas de transformação da sociedade, a PNEEPEI (BRASIL, 2008), é uma grande conquista na promoção de um ensino e consequentemente numa sociedade inclusiva. Através da garantia de condições dignas de permanência ao estudante com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação a PNEEPEI orienta as instituições de ensino eliminarem barreiras arquitetônicas, tecnológicas, comunicacionais e atitudinais. Para obtenção dos objetivos propostos, optou-se pela metodologia qualitativa a fim compreender o cenário e os desafios que estão postos no processo de formação acadêmica da pessoa com deficiência e fez-se uso da análise documental, pesquisa bibliográfica, observação participante com registro em diário de campo e questionário virtual estruturado para coleta de dados. Para o estudo foi realizado a coleta de dados, através de um questionário via Google Forms, uma vez que o cenário de pandemia da COVID-19 impossibilitou encontros presenciais com os entrevistados, com discentes e docentes sobre a problemática da inclusão educacional. Fato este que se configurou um obstáculo ao cumprimento desta pesquisa, considerando o distanciamento gerado pela falta do contato visual e a limitação que a comunicação escrita possui ante a comunicação verbal. 2020

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 2 INCLUSÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR Faz-se necessário salientar que a realidade educacional das pessoas com deficiências no curso de Bacharelado em Serviço Social da Universidade Federal do Maranhão foi construída progressivamente ao longo dos anos e está intrinsecamente relacionada com as transformações sociais, econômicas e políticas ocorridas no Brasil. Houve um período em que o Serviço Social atuava em consonância com os interesses das classes dominantes e reproduzia inúmeras formas de exclusão na formação e no fazer profissional. Paulatinamente essa realidade foi modificada e os avanços se deram tanto por esforços internos como por normativas institucionais, fruto da luta das pessoas com deficiência, voltadas para a democratização e o fim de toda e qualquer forma de exclusão e discriminação no ensino superior. Cabe frisar que enquanto profissão inscrita na divisão social e técnica do trabalho, o Serviço Social, apesar de todos os progressos, ainda hoje possui muito a contribuir na realidade contraditória produzida pela fragmentação do processo produtivo e da apropriação privada dos meios de produção. Tal contexto impacta diretamente no processo de formação do futuro assistente social que enquanto estudante se depara com a realidade dos interesses políticos e ideológicos das instituições de ensino e dos limites e possibilidades no sistema capitalista. Posto isto, torna-se necessário perceber como os interesses do capital se manifestam nas Universidades em diferentes momentos, tornando-as, por vezes, tanto espaços de alienação e dominação quanto de contribuição para a transformação social e emancipação das classes subalternas. O denominado projeto ético político do Serviço Social que se consubstancia referenciado nas diretrizes curriculares aprovadas pelo MEC e pelos fóruns da categoria, define-se e se redefine no movimento contraditório da sociedade. Move-se entre a flexibilização posta pela política privatista da educação superior para atender às exigências do mercado e a resistência a essa tendência a partir do compromisso profissional com as lutas democráticas e emancipatórias da sociedade. (ABREU; LOPES, 2007, p. 11 apud SILVA; PEREIRA; GUILHON; SOUSA, 2008, p.25). É nessa realidade conflituosa entre a “lógica do mercado e a dinâmica societária, entre a exigência ética dos direitos e os imperativos de eficácia da economia, entre a ordem legal que promete igualdade e a realidade das desigualdades e exclusões tramada na dinâmica das 2021

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS relações de poder e dominação” que os cursos de graduação estão inseridos (TELES, 1996, p. 85). No âmbito da UFMA esta contradição se manifesta de um lado através da redução do quadro pessoal de funcionários, de verbas destinadas à pesquisa científica, aos projetos de extensão, aos auxílios estudantis, a deterioração e a falta de disponibilidade de equipamentos necessários aos estudantes e por meio do controle de formação pautado. 2.1 ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA E A REALIDADE VIVENCIADA NO ENSINO SUPERIOR É necessário abordar o impacto direto das medidas governamentais na inclusão das pessoas com deficiência. Como exemplo, a adesão da política de cotas, onde a UFMA passou a destinar, por meio de ações afirmativas, 50% de vagas, em seus processos seletivos a negros, estudantes de escolas públicas, pessoas com deficiência e índios em todos os cursos (UFMA, 2006). Fruto de mais uma medida governamental iniciada em 2005, o Programa Incluir, foi instituído na UFMA, no ano de 2009, o Núcleo de Acessibilidade (NUACES-UFMA), hoje denominado de Diretoria de Acessibilidade (DACES-UFMA). Com o objetivo de garantir o cumprimento dos requisitos legais relativos à acessibilidade por meio de propostas, orientações e encaminhamentos, o Núcleo possui um papel significativo na eliminação de barreiras físicas, atitudinais e pedagógicas no contexto acadêmico (PEREIRA, 2015, p. 7). Outra medida governamental indispensável para efetivação da inclusão foi a constituição da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Como fruto de um movimento de debates e discussões a fim de criar-se um sistema de ensino verdadeiramente inclusivo a PNEEPEI foi sancionada, durante o segundo mandato do ex- Presidente Luís Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2008, e se conclama um marco teórico e organizacional na educação brasileira (MOREIRA, 2016). Nesse novo modelo, a educação especial possui um caráter transversal em todas as disciplinas e níveis do ensino regular e não substitutivo à escolarização. A educação especial é uma modalidade de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, realiza o atendimento educacional especializado, disponibiliza os serviços e recursos próprios desse atendimento e orienta os alunos e seus professores quanto a sua utilização nas turmas comuns do ensino regular. (BRASIL, 2008, p.16). 2022

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Portanto, torna-se imperativo ao professor o constante processo de aprendizagem a fim promover a inclusão e autonomia dos estudantes nos espaços educacionais e fora deles. Mas para além dos esforços individuais presentes na relação aluno e professor, é necessário frisar que o êxito da política está diretamente ligado a outros fatores, como ao sistema econômico na qual está inserida e consequentemente debaixo de seus valores e interesses. Deste modo, a análise da PNEPEEI necessita ser feita em consideração a uma perspectiva sistêmica, que investiga quais as causas por traz dos desafios apresentados a materialização da política em uma determinada instituição e a influência do Capital nesta realidade. Dada a função alienante que a educação ocupa no capitalismo, a promoção da igualdade se restringe muito mais ao plano teórico do que em mudanças estruturais a fim de atender indivíduos historicamente excluídos, sejam eles pobres, negros, mulheres ou pessoas com deficiência. A fim de compreender a realidade vivenciada pelos discentes com deficiências na Universidade Federal do Maranhão apresentaremos uma análise qualitativa dos resultados da pesquisa de campo. De acordo com o levantamento realizado pela Diretoria de Acessibilidade no semestre de 2020.1 a UFMA possui um total de 441 matrículas ativas de estudantes com deficiência em seus campus, dentre os quais 8 matrículas são referentes ao curso de Serviço Social. Deste modo, o Serviço Social ocupa a 10ª posição no ranking de cursos com mais alunos com deficiência ativos (DACES/UFMA, 2020). Os dados também apontam, proporcionalmente, um elevado número de desistência ou trancamento no curso, alcançando a porcentagem de 33% dos alunos com deficiência que se matriculam em contrapartida com 13% que concluíram o curso. Outro dado que chama a atenção foi a porcentagem de 100% dos discentes entrevistados afirmarem ter tido o desejo de abandonar ou trancar graduação em algum momento da jornada acadêmica. Apesar dos documentos oficiais estabelecerem igualdades de oportunidades e a inclusão da pessoa com deficiência independentemente do tipo de deficiência e do nível escolar, a realidade universitária tem demonstrado um disparate entre o campo teórico e a prática criando um clima favorável a evasão e tornando a vivência acadêmica uma penosa caminhada de resistência e superação “[...] devido as dificuldades encontradas 2023

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS como já relatadas muitas vezes os pensamentos eram de desamino e desistência mais superação desse contexto é a palavra que mais nos define.” (DISCENTE SEMPRE VIVA, 2021). Ao serem indagados sobre a temática da acessibilidade, foram percebidas diferentes perspectivas nas falas dos discentes e docentes do curso, as quais estão apresentados no Quadro 1, a seguir. Discentes Quadro 1 – Acessibilidade na Universidade Federal do Maranhão entrevistados(as) Você acredita que a UFMA segue todas as normas de acessibilidade que determina as Sempre-Viva leis de inclusão? Por que? Astromélia Hortência “não ainda ha muito que se avançar.” “Sim e não. Nunca recebi nenhuma ajuda.” “[...] Acredito que falta mais entendimento em volta dos discentes, ainda precisa melhorar em termos de palestras, eventos de conscientização desse meio. Deficiencia não é ser anormal, mas necessita de respeito e entendimento, o portador ser mais respeitado e as leis serem mais compreendidadas! [...] Porém em termos de acessibilidade dentro do campus precisa ser melhorado. [...]” Lavanda “Sim. A ufma está sempre buscando acolher pessoas que necessitam de alguma necessidade” Magnólia Flamboyant “Não, pois muitas pessoas não conhecem essas normas” Copo de Leite “Acredito que sim, pois a gestão UFMA demonstra preocupação com os discentes em vulnerabilidade.” “Não segue todas, mas tem trabalhado bastante pra atender, mas falta recursos” Fonte: Primária, 2021. Analisando as falas das discentes Astromélia e Flamboyant, apresentadas no Quadro 2, percebemos que há uma falta de compreensão sobre a temática da acessibilidade ao associar a questão com “ajuda” e “preocupação” institucional. As alunas Copo de Leite, Hortência e Sempre-Viva e as professoras Amora, Cramberry e Mirtilo percebem a falta de acessibilidade, mas também os esforços no sentido de estabelece-las. No que se refere a acessibilidade arquitetônica é perceptível por qualquer pessoa adaptações estruturais como a presença de rampas, a sinalização do piso com textura e a instalação de um elevador que dá acesso ao auditório a fim de atender estes sujeitos. Porém, mesmo as rampas possibilitam acesso dificultoso as salas, auditórios e demais espaços. Razão pela qual alunos com deficiência física solicitam que as aulas ocorram em salas situadas no térreo. Sempre-Viva relata 2024

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS “[...] as aulas muitas das vezes estavam sendo ministradas em andar de difícil acesso e eles (os professores) iam a luta para permitir que eu tivesse acesso em igualdade de condições com os demais, outros não ministravam aulas (no térreo) e muitas das vezes eu ficava em baixo esperando o professor descer e explicar a situação.” (DISCENTE SEMPRE-VIVA, 2021). Outro fator que interfere no processo de ensino e aprendizagem é o acolhimento institucional por parte dos professores e técnicos. No que tange esse aspecto, percebe-se na fala abaixo o despreparo profissional que contribui para a manutenção da exclusão da pessoa com deficiência no âmbito acadêmico. Afirmou a aluna Copo de Leite, que iniciou sua graduação em 2016. “Não me senti acolhida, por isso tranquei, retornei na pandemia, mas ainda com as mesmas dificuldades.” (DISCENTE COPO DE LEITE, 2021). Percebe-se que além do acesso, é necessário assegurar aos alunos a equidade e a igualdade de oportunidades através de uma equipe composta por docentes, servidores e técnicos qualificados profissionalmente. Ao serem questionados se a formação profissional os direcionou a demanda da educação inclusiva, 50% dos docentes entrevistados afirmaram que não. 100% dos entrevistados responderam que nunca participaram de algum curso específico de capacitação, no que tange a metodologia adequada de ensino-aprendizagem a ser utilizada a fim de ultrapassar barreiras pedagógicas entre o professor e aluno. Também constatamos, a partir das respostas dadas, que 50% dos docentes desconhecem as normativas institucionais que orientam o trabalho do docente com o estudante com deficiência. Outrora o estabelecimento da PNEEPEI acreditava-se que os professores necessitavam ter uma inclinação ou “chamado” especial para exercer o ensino a pessoa com deficiência. Nessa nova realidade, todos os professores de turmas regulares são chamados a capacitação e a trabalhar de maneira eficaz no que tange as estratégias e metodologias voltadas à educação inclusiva. É importante frisar que os professores também possuem “o direito de esperar e de receber preparação apropriada na formação inicial em educação e desenvolvimento profissional contínuo durante sua vida profissional.” (MITTLER, 2003 p.35) para que não lhes impute a culpa pelo trancamento ou abandono de discentes no curso e seja colocado sobre seus ombros a responsabilidade do êxito ou fracasso da inclusão. Observou-se também uma linha de pensamento nos discursos dos docentes. Diante dos desafios enfrentados para efetivação da inclusão, é claro o compromisso ético com um processo de ensino-aprendizagem crítico e politicamente comprometido com uma sociedade justa, visto 2025

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS que a defesa intransigente dos direitos humanos é um dos princípios fundamentais que embasam o Serviço Social. O que vai de encontro com a visão de educação como “[...] uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em defesa do direito de todos os estudantes de estarem juntos, aprendendo e participando sem nenhum tipo de discriminação” disposta na PNEEPEI e com a dimensão pedagógica da Profissão na qual o profissional atua promovendo mudanças emancipatórias (BRASIL, 2008a, p.5). Neste sentido, 84% dos docentes afirmaram que buscam proporcionar um atendimento diferenciado na perspectiva da acessibilidade de acordo com a necessidade do aluno e agir no sentido de viabilização de direitos. Estimulando respeito as todas as pessoas, empenho a eliminação de preconceitos, garantia do pluralismo. Atenção ao desempenho e aprendizado desta/e aluna/o, se, necessário, com suporte adicional, como textos com áudio, letras maiores (se for baixa visão), levantamento junto a setor de acessibilidade de equipamentos que favoreça não só a inserção, mas, continuidade e finalização na disciplina com apreensão do conteúdo programático. [...] As estratégias adotadas advêm de leituras individuais e compromisso com educação pública, universal, de qualidade e para todos e todas. Na infância tive colegas surdas e com deficiência visual que muito me ensinaram com a comunicação não verbal - na linguagem de sinais e expressão corporal. Lições que eu cultivo comigo até hoje, bem como o desejo de aprender mais com cursos de aperfeiçoamento em breve. (DOCENTE MIRTILO, 2021). As docentes Cramberry, Mirtilo e Cereja também relatam as ocasiões que recorreram da Diretoria de Acessibilidade e os desafios enfrentados para efetivação de direitos dos alunos, uma vez que, para garantir a igualdade de condições nas aulas faz-se necessário recursos, suportes e serviços especializados. Nas aulas utilizava material disponibilizado exclusivamente para aluno, mas com o mesmo conteúdo. Textos eram encaminhados para o setor de acessibilidade da UFMA para digitalização. Contudo, era muito demorado e aluna preferia que enviasse o texto em formato digital e ela mesma conseguia ampliar a letra. (DOCENTE CRAMBERRY, 2021). “O meu desconhecimento sobre como proceder, além da precariedade de estrutura material e de pessoal na UFMA, à época, que permitisse desenvolver o processo de ensino/aprendizagem em condições adequadas para as estudantes com deficiência”. (DOCENTE CEREJA, 2021). Contudo, foi percebido a falta de conhecimento tanto de docentes como discentes no que diz respeito a Diretoria de acessibilidade. “Sei que se chama Maria Nilza Silva Oliveira. Mas, não tive o prazer de conhecê-la pessoalmente.” Afirmou a docente Mirtilo. No que se refere 2026

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS aos discentes 57% afirmaram não conhecer ou conhecer pouco o DACES e 85% afirmaram que nunca fizeram uso dos equipamentos disponibilizados pelo DACES. Diante disso, nota-se uma relação entre o conhecimento superficial da Diretoria de Acessibilidade e a não solicitação de equipamentos tecnológicos necessários a fim de garantir o máximo de aproveitamento. Outro ponto que chamou nossa atenção sobre os desafios encontrados no processo de aprendizagem foi a porcentagem de 25% das discentes entrevistadas mencionarem experiências de discriminação e indiferença advindas dos colegas de classe. “Os relacionamentos, às vezes sinto uma indiferença visto nem saber porque, pois nunca tive dificuldades de vínculos. Percebo a exclusão.” (DISCENTE HORTÊNCIA, 2021). Deve-se destacar também a necessidade de adaptação curricular. Passados 15 anos desde sua implementação no Curriculum em 2006, a disciplina Pessoa com Deficiência e Políticas Pública ainda possui o caráter optativo. Além disso, faz-se necessário que a temática se constitua, de fato, transversalmente nas demais disciplinas do curso como pontuado em seu projeto pedagógico, uma vez que, não se encontra presente nas referências bibliográficas básicas e complementares atualmente. [...] além da temática constituir-se como tema transversal em disciplinas como Ética Profissional em Serviço Social, Movimentos Sociais e Serviço Social, Política Social I e Política Social II, Direitos Humanos, Necessidades Sociais e Cidadania, Libras, dentre outras. (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DA UFMA, 2016). Tais mudanças contribuirão com a desmistificação de estereótipos e estigmas sobre a pessoa com deficiência no curso, para o aprofundamento do conhecimento acerca desta temática e para a reflexão dos discentes e futuros assistentes sociais que atuarão em programas e projetos de ordem social. Soczek e Alencastro (2012, p. 52) consideram a pesquisa uma importante parte da formação profissional, “um elemento fundante, norteador e incentivador da prática educativa”, afirmando que é a partir dela que o discente tem o primeiro contato com a relação entre a teoria apreendida em sala de aula e a realidade prática, deve-se colocá-la em um lugar de protagonismo. Percebe-se em nosso estudo, um avanço na perspectiva de fomento à pesquisa no curso de Serviço Social da UFMA de modo que esta perpassa disciplinas, seminários, oficinas, atividades complementares. 2027

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Temos como pressuposto que a construção do conhecimento perpassa pelo conjunto de técnicas, métodos e estratégias didático-pedagógicas que possibilitem a apreensão crítica da realidade social. Assim sendo o processo de formação acadêmico profissional se fundamenta em princípios e diretrizes nacionais tais como: Indissociabilidade nas dimensões do ensino, pesquisa e extensão transversal em todos os componentes curriculares: nas disciplinas através de trabalhos que exigem pesquisas de campo, visitas monitoradas a instituições, inserção de alunos nos cinco grupos de pesquisa e extensão existentes no DESES e articulados ao PPGPP onde desenvolvem atividades de iniciação científica, nos estágios obrigatório e não obrigatório e na monografia de conclusão de curso. (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DA UFMA, 2016, p. 20. Grifo nosso). Contudo, no aspecto “grupos de pesquisa”, durante a entrevista, 85% das discentes entrevistadas afirmaram que não participam ou não participaram de grupos de pesquisa e 15% afirmaram ter participado, mas não fazem parte no momento. Essa porcentagem chama atenção haja visto o fato do Serviço Social possuir grupos de pesquisa e nenhum dos discentes entrevistados estarem integrando-os no momento da entrevista. Além de não ocupar espaços de produção como os grupos de pesquisa, estes alunos não se veem reconhecidos através do quadro de docentes do curso que atualmente não é composto por nenhum professor com deficiência. Nessa realidade, não só se deslegitima planos prospectivos de cursar o mestrado ou doutorado como afeta diretamente a visão identitária que o estudante com deficiência possui. Em sua constituição subjetiva, o sujeito não representado é aquele que tem dificuldade em se reconhecer naquele outro posto como padrão, a partir do qual as demais existências serão avaliadas e hierarquizadas. O sujeito negro não-representado só tem como espelho – como ideal social - o branco. (SILVA e SILVA, 2019, p.43). De igual modo a pessoa com deficiência possui como espelho de capacidade, realização e eficiência a pessoa que não têm deficiência e na falta de representatividade reafirma-se o lugar de subalternidade, em que estes sujeitos não se veem capazes de usufruir determinados dos espaços sociais como os casos dos grupos de pesquisas. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo possibilitou conhecer a realidade vivenciada pelos discentes com deficiência no curso de Serviço Social da UFMA e entender como a permanência destes sujeitos é comprometida pela acessibilidade precária a qual estão submetidos. Apesar dos avanços 2028

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS tanto dentro da categoria do Serviço Social como na Legislação Brasileira, ainda existem inúmeros desafios a serem superados a fim de atender todos os requisitos de acessibilidade física, atitudinal e pedagógica. Os dados demonstram como as barreiras estruturais, a falta de formação profissional qualificada e a manutenção da carga histórica atribuída às pessoas com deficiência faz com que os mesmos não ocupem espaços de produção acadêmica e prejudicam a inclusão e o pleno aproveitamento do curso. Por fim, cabe pontuar que este estudo não almeja beneficiar apenas os atuais e futuros discentes com deficiência do curso de Serviço Social, mas avançar no que diz respeito à consolidação da educação como direito de todos e promover debates em torno da formação acadêmica. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília, DF, 2008. Disponível em: http://portal.mec.gov.br. Acesso em: 20 dez. 2020. DACES/UFMA. Relatório da Pesquisa: Demandas Psicossociais com Vista a Acessibilidade Educativa de Estudantes com Deficiência no Contexto de Pandemia Covid-19 no Campus São Luís – MA. São Luís, 2020. MITTLER, Peter. Educação Inclusiva: Contexto Sociais – Porto Alegre: Artimed, 2003. MOREIRA, Carlos José de Melo. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva: Uma análise de três Programas Federais, para a Educação Especial, desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Educação do município de São Luis-MA. Campinas, 2016. 404 p Tese (Educação) - UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS. PEREIRA, Josenilde Oliveira. O processo de inclusão da pessoa com deficiência na Universidade Federal do Maranhão: desafios e perspectivas. Jornada de Políticas Públicas, 2015. Disponível em: http://www.joinpp.ufma.br/ Acesso em: 10 abr. de 2021. Projeto Pedagógico do Curso de Serviço Social da UFMA. São Luís, 2006. SILVA, M. O. S.; PEREIRA, M. E. F. D.; GUILHON, M. V. M.; SOUSA, S. M. P. S. O Protagonismo do Maranhão no Serviço Social Brasileiro. Revista Serviço Social & Sociedade, nº 95, ano XXIX, especial, 2008, São Paulo: Cortez editora. SILVA, A. F. L.; SILVA, G. M. B. . “Falando a voz dos nossos desejos”: os sentidos da representatividade e do lugar de fala na ação política das 2029

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS mulheres negras. REIS, Rio Grande, v. 3, n. 1, p. 42-56, 14 nov. 2019. Disponível em: <https://periodicos.furg.br> Acesso em: 10 de Jan. 2021. SOCZEK, D., ALENCASTRO, M. Pesquisa acadêmica em instituições de ensino superior particulares: desafios e perspectivas. Revista Intersaberes | vol.7 n.13, p. 46 - 66 | jan. – jun. 2012 | ISSN 1809-7286. Disponível em: https://doi.org/10.22169/revint.v7i13.247. Acesso em: 05 de Jul. 2021. TELES, Vera da Silva. Questão Social: afinal, do que se trata? SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, 10(4) 1996. Disponível em: <http://produtos.seade.gov.br>. Acesso em: 14 abr. de 2021. 2030

EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A PRIVATIZAÇAO DA EDUCAÇAO SUPERIOR NO BRASIL: incidências no processo de formação profissional em Serviço Social THE PRIVATIZATION OF HIGHER EDUCATION IN BRAZIL: incidences in the process of professional training in Social Work Selma Maria Silva de Oliveira Brandão1 Zaira Sabry Azar2 RESUMO Análise dos influxos na reconfiguração do ensino superior nas particularidades da formação acadêmica em Serviço Social no Brasil. Recupera elementos sobre as contrarreformas como potencializadoras da privatização dos serviços públicos, em especial da educação superior, cujas alterações legisladas alteram sobremaneira as relações pedagógicas, mas sobretudo a qualidade do serviço oferecido por esta categoria profissional. Apresenta perfil educacional dos cursos de Serviço Social no estado do Maranhão, evidenciando o avanço da oferta privada deste nível de educação. Considera que a privatização da formação em Serviço Social atende a estratégias econômicas e ideológicas do capital, e que o contexto pandêmico acentuou a caracterização do ensino precarizado expresso na modalidade remota Palavras-chave: Ensino superior, privatização, Serviço Social. ABSTRACT Analysis of influxes in the reconfiguration of higher education in the particularities of academic training in Social Work in Brazil. It recovers elements about the counter-reforms as potentiators of the privatization of public services, especially higher education, whose legislated changes greatly alter the pedagogical relationships, but above all the quality of the service offered by this professional category. It presents the educational profile of Social Work courses in the state of Maranhão, evidencing the advance of the private offer of this level of education. It considers that the privatization of training in Social Work meets the 1 Professora do Departamento de Serviço Social (DESES) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected] 2 Professora do Departamento de Serviço Social (DESES) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected] 2031

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS economic and ideological strategies of capital, and that the pandemic context has accentuated the characterization of precarious education expressed in the remote modality Keywords: Higher education, privatization, Social Work.. 1 INTRODUÇÃO O Brasil vive uma complexa conjuntura política, econômica, social e cultural com a crise internacional do capital, a partir dos anos 1970 e os processos de contrarreformas nos países periféricos. Para isso, tem destaque o relevante papel dos organismos internacionais do capital na orientação da agenda geral. A atual reformulação da educação superior no país evidencia, mais uma vez, a disputa entre distintos projetos de educação associados a diferentes projetos de sociedade: um que reforça o padrão de dependência econômica, tecnológica, cultural e, portanto, educacional e outro que defende um sistema nacional de educação laica, financiado, implementado e coordenado pelo Estado, com alocação de verbas exclusivamente para a educação pública, garantindo a democratização do acesso à educação pública e gratuita em todos os níveis, na certeza do papel fundamental que esta, assim concebida, possui na ruptura com o capitalismo dependente (FERNANDES, 1979). Inaugura-se uma nova fase do capitalismo monopolista, o qual não conseguindo se recuperar da crise iniciada na década de 1970 passa a exigir uma nova reconfiguração do Estado, apresentando-se em uma perspectiva neoliberal. O neoliberalismo, como afirma Anderson (1995), “foi uma reação teórica e política veemente contra o Estado intervencionista e de bem-estar”. O Brasil, como economia periférica segue o receituário neoliberal imposto pelos países ricos através de organismos especialmente criados para ditar diretrizes e receituários que garantam a reprodução do capital e os privilégios das economias centrais. Com base nos receituários impostos, as contrarreformas visam descontruir o caráter público dos serviços, incentivando/promovendo adoção de serviços privados a serem ofertados pelo mercado, na lógica do laisser fair tão defendida pelo liberalismo e reatualizada pelo neoliberalismo, que exige o Estado mínimo para as políticas de cunho social. Os organismos do capital internacional se dedicaram a pensar a educação, em especial a superior, como estratégia nas dimensões econômica e ideológica. Neste sentido, as 2032

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS reformulações da política educacional brasileira incidem direta e profundamente no processo de formação profissional do Serviço Social, por tratar-se de uma categoria que tem como objeto a questão social, que sintetiza as contradições de classes e interesses, sendo, portanto, ineliminável no capitalismo. Neste sentido, este trabalho constitui uma pesquisa bibliográfica para compreender como a mercantilização do ensino superior incide sobre o Serviço Social. Na sua estrutura apresenta três itens, além desta introdução e considerações finais. O primeiro trata da política neoliberal adotada pelo Estado brasileiro, na perspectiva das contrarreformas; o segundo aborda as medidas que tendenciam a mercantilização da educação superior; e o último reflete sobre a reconfiguração do ensino superior, com seu perfil privatista evidenciado. Considera-se o avanço da privatização do ensino superior no país como estratégia econômica e ideológica adotada para a mediação entre capital e trabalho. 2 NEOLIBERALISMO À MODA BRASILEIRA: NOTAS INTRODUTÓRIAS No Brasil, a política neoliberal começa a ser desenvolvida na década de 1990, no governo de Fernando Collor de Mello (1990- 1992), mas especialmente a partir do governo de Fernando Henrique Cardoso - FHC (1995-2002), que investiu na privatização clássica das empresas estatais, na recuperação da economia através do controle dos juros, na consolidação do Plano Real e na retirada de direitos do funcionalismo público atacando as políticas públicas, entre outros. A década de 1990 marca, portanto, a contradição entre o início do desenvolvimento da política neoliberal no Brasil e a luta pela efetivação da CF/88 que, apesar de traços liberais, traz em seu conteúdo importantes conquistas para a classe trabalhadora. Na área das políticas públicas e sociais na Carta Magna tem destaque a Seguridade Social (Saúde, Assistência Social e Previdência). O artigo 194 prevê que “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (Brasil, 1988), sendo, portanto, dever do Estado. Daí resultam o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Sistema de Previdência Social contributivo e solidário. 2033

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Esse novo patamar de direito constitucionalmente conquistado foi frontalmente atacado a partir do projeto de reconfiguração do Estado iniciado pela política neoliberal, em especial a partir do Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, conduzido por Luiz Carlos Bresser Pereira, então Ministro da Administração e Reforma do Estado, em 1995, no governo de FHC. As conquistas nem haviam sido consolidadas começam a ser desmontadas: educação, saúde, previdência e assistência social passam a ser consideradas como mercadorias para contribuir na revitalização do capitalismo. A saúde por exemplo, atravessa um longo e penoso processo de privatização interna, com o repasse da gestão de importantes setores, como a atenção básica, para organizações sociais e/ou ONG, aprofunda-se a parceria público-privada com o repasse de verba pública para instituições privadas, em especial no atendimento de alta complexidade e por fim impulsiona-se os planos de saúde privados. A Previdência Social, outro setor do tripé da seguridade social, passa por várias contrarreformas, desde o governo de FHC com a instituição do fator previdência, depois em 2003 no governo Lula, com o fim da paridade entre ativos e aposentados, fim da aposentadoria integral e a taxação dos aposentados e em 2012, no governo Dilma, com a criação da Fundo de Previdência Complementar dos Servidores Públicos Federais (FUNPRESP), que inaugura a aposentadoria complementar para o funcionalismo público federal, colocando os servidores que ingressaram após 2013, no teto do regime geral de previdência social. O último ato contra a Previdência Pública, dirigido pelo governo ultraneoliberal do atual mandatário, Bolsonaro, e aprovado pelo Congresso nacional, pode ser considerada ainda mais perversa para a classe trabalhadora, já que acaba com a perspectiva da previdência pública, vincula o direito à aposentadoria a regimes de capitalização, uma clara ação voltada ao setor rentista da burguesia. Na legislação trabalhista, entre as muitas medidas que retiraram direitos dos trabalhadores e precarizaram as políticas públicas, merece destaque a aprovação da terceirização das atividades meio ainda no governo FHC, que impôs a privatização gradual das políticas públicas, com a terceirização e consequente precarização de vários serviços e setores. Em 2017, no governo Temer, com a aprovação da terceirização da atividade fim, do trabalho intermitente e da contrarreforma trabalhista, praticamente põe fim à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, impondo um retrocesso de 50 anos aos trabalhadores no Brasil. 2034

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Todas essas ações, guardam vínculos com as propostas do Plano Diretor do governo FHC, e, portanto, com o projeto de contrarreforma do Estado do neoliberalismo, que intensificam a submissão da economia brasileira aos interesses do desenvolvimento capitalista internacional e às exigências dos organismos internacionais, como Banco Mundial (BM), Fundo Monetário internacional (FMI) e a Organização para cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE. Nessa direção, Estado e mercado caminharam juntos no fortalecimento do capitalismo ao longo de toda a história brasileira a partir da República. Todos os governos, com tonalidades distintas deram continuidade ao mesmo projeto estrutural do capital. Nos governos de conciliação de classe do PT, tivemos continuidades e descontinuidades, prevalecendo continuidades, em especial no que tange à política econômica. Porém, tais continuidades realizam-se com o diálogo e a absorção de algumas das reivindicações históricas da classe trabalhadora, em especial na área da educação, dos direitos humanos, da assistência social e do combate às opressões. 3 A POLÍTICA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL: ENTRE O MITO DA DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO E O PROCESSO DE MERCANTILIZAÇÃO SEM BARREIRAS Todas as contrarreformas contribuem para o desmonte do sentido do público, para a desvalorização dos servidores públicos, e, portanto, tem rebatimento na forma de estruturação do ensino superior no Brasil. Destaca-se que a história da educação pública superior no Brasil, em especial a partir do período da ditatura civil-militar (1964-1985), com os acordos MEC- USAID, foi direcionada pelos interesses dos organismos internacionais. Gradativamente a educação superior pública passa a ser hegemonizada pela iniciativa privada no Brasil, tendo como marco o período da ditadura militar. Como aponta Sguissard (2008), no início da ditadura militar 61,6% do ensino superior era público e 38,4% privado. Em dez anos o quadro se modifica drasticamente, passando as instituições privadas a controlarem 63,6% das matrículas, enquanto as instituições públicas ficavam com 36,4%. Em 2016 segundo os dados do Censo da Educação Superior, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP-MEC), 82,3% das matrículas em 2016 foram em instituições privadas de ensino, demonstrando a grandiosa mercadoria que a educação superior se transformou. 2035

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS No Brasil, no mesmo período em que se expande o ensino público, com a ampliação do acesso de estudantes dos vários segmentos das classes subalternizadas, através da lei 12.711 de 2012, que institui as cotas sociais e raciais no ensino superior público, também se amplia o repasse de verbas públicas para a iniciativa privada, através de programas como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), criado em 1999 e o Programa Universidade para Todos (PROUNI), 2004, considerados verdadeiros mantenedores de conglomerados empresariais da educação. Esse processo de mercantilização da educação vem sendo marcado por diferentes imposições dos organismos internacionais, que entre suas medidas indica a redução dos gastos públicos, e também pelo Processo de Bolonha, de 1999, que insere um conjunto de novos paradigmas para o ensino superior público, como modelo pedagógico e político, impondo, entre outros elementos, a certificação em larga escala e o aligeiramento da formação profissional, tendo como modelo o Ensino à Distância (EaD). As imposições do Processo de Bolonha vão orientar o Plano Nacional de Educação (PNE) (2014-2024), em especial no que se refere à retirada da obrigatoriedade da destinação de recursos públicos exclusivamente para a educação pública, ou seja, garantindo a apropriação privada do fundo público e também a contrarreforma da educação superior brasileira. Neste contexto o conservadorismo reacionário se intensifica, e se expressa na criminalização dos movimentos sociais, professores e militantes sociais, na tentativa de eliminação do debate de gênero nos espaços públicos, na violência contra pobres, negros e negras e moradores de periferias, no assassinato de quilombolas e indígenas, em chacinas nas grandes periferias brasileiras e na intervenção federal-militar, a exemplo da ocorrida no Rio de Janeiro em 2018. Tudo isso expressa um determinado projeto do capital que tomou o Palácio do Planalto e virou governo no Brasil, com a eleição do presidente Bolsonaro (PSL) e de dezenas de governadores que apoiam sua política e com o assombroso crescimento de seu partido (FARAGE, 2019). Nesse contexto, de desmonte das políticas sociais, cortes orçamentários e avanço do conservadorismo, todos aqueles e aquelas que se identificam enquanto segmento da classe trabalhadora são desafiados/as a decifrar a realidade a partir da categoria totalidade, em busca dos questionamentos necessários à construção de um projeto de educação classista e alternativo ao projeto hegemônico do capital. Todo o movimento político, cultural, social, 2036

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS econômico imposto pelo projeto neoliberal, implementado no mundo a partir da década de 1980, acentuou marcas do neoliberalismo, impondo uma sociabilidade baseada no individualismo, na competição, na destituição da perspectiva de classe, dando lugar à perspectiva da conciliação do inconciliável. Por isso, é fundamental compreender as dimensões da ideologia burguesa, difundidas nas imposições dos organismos internacionais para a educação e suas implicações no projeto de educação no Brasil, materializados na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, no Plano Nacional de Educação (PNE) de 2014, na contrarreforma do Ensino Médio de 2017 na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) de 2018 e nos sucessivos cortes de verbas para a educação superior pública, desde 2015, ao mesmo tempo que mantém e amplia as verbas destinadas à apropriação privada do fundo público. As determinações dos Organismos Internacionais estão claramente expostas: na Carta ao Povo Brasileiro, de Lula, em 2002, na Ponte para o Futuro, do Governo Temer, em 2015 e mais recentemente no “Programa de Ajuste Justo”, do Banco Mundial, de 2017. Nesse sentido, entre as marcas do projeto do capital, que impõem uma verdadeira contrarreforma na educação superior no país - ampliada no contexto da Pandemia Covid 19, destacamos: processo de aligeiramento da educação superior com a diminuição dos currículos de graduação, a expansão do ensino à distância (EaD); intensificação do trabalho docente e penalização do alunado a partir da implementação do Ensino Remoto Emergencial (ERE), com graves implicações no processo de formação acadêmica; tentativa de impor a “neutralidade” aos processos educativos, retirando os conteúdos críticos, os debates sobre gênero e questão racial em uma explícita tentativa de novamente invisibilizar as relações sociais patriarcais, racistas, lgbtfóbicas e sexistas que estruturam o capitalismo no Brasil; e intensificação do adoecimento entre o corpo docente e discente, com agravamento de casos de depressão e suicídio. 4 A RECONFIGURAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR EM SERVIÇO SOCIAL NO CONTEXTO DAS CONTRARREFORMAS NEOLIBERAIS NO BRASIL: IMPASSES E DESAFIOS Com pouco mais de 8 décadas de existência, o Serviço Social brasileiro, na presente conjuntura encontra-se polarizado, nas palavras de Iamamotto (2014) por um duplo e contraditório movimento: o mais representativo impulsiona o processo de ruptura teórica e 2037

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS política com o lastro conservador de suas origens. O 16º. CBAS, realizado entre os dias 30 de outubro e 3 de novembro do ano de 2019, em Brasília, reafirma tal perspectiva, 30 anos após o conhecido Congresso da Virada, marco emblemático do projeto Ético político profissional. Na direção contrária, verifica-se o revigoramento de uma reação (neo) conservadora na profissão, atualmente mais aberta que disfarçada, orientada por uma determinada produção pós- moderna, que nega as mais caras conquistas do avanço histórico da profissão no país, nestes 80 anos (que inclusive o diferencia no cenário internacional) qual seja: a compreensão da história a partir das classes sociais e suas lutas, da centralidade do trabalho e dos trabalhadores e do aporte teórico metodológico da tradição marxista, no diálogo crítico com outras matrizes analíticas (IAMAMOTTO, 2014). Neste campo de disputas de projetos profissionais e societários distintos, a categoria profissional encontra nas entidades político organizativas uma trincheira de luta em defesa do Projeto Ético Político do Serviço Social brasileiro, balizado pelo Código de ética profissional de 1993, pela Lei de Regulamentação da Profissão e pelas Diretrizes Curriculares da ABEPSS de 1996. Na duríssima conjuntura dos anos 1990 no mundo e no país, a categoria profissional, em que pese todos os ataques e retrocessos, foi capaz de construir uma das mais avançadas legislações profissionais do mundo, como um ato de resistência às orientações dominantes dos organismos internacionais, em franca atuação no país a partir de então. Sob essa orientação, os currículos mínimos dos Cursos superiores tiveram que se adequar ao modelo de Diretrizes Curriculares pautadas pela lógica de mercadorização da educação superior no país, sancionada pela LDB, também de 1996, o que resultou, no caso particular da formação acadêmico profissional em Serviço Social, na expansão acelerada da oferta de vagas, principalmente na modalidade à distância, bem como na proliferação de faculdades privadas, muitas das quais ofertando formação de baixa qualidade. Em decorrência desse processo, chama atenção o aumento exponencial do número de registros de assistentes sociais a cada ano. Segundo dados do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), o Brasil tem aproximadamente 190 mil profissionais, com registro nos 27 Conselhos Regionais. Compreende-se a formação do assistente social como um amplo processo determinado socialmente, de um lado pelas relações mais gerais de uma dada formação social e, de outro, pela universidade enquanto instituição responsável pela formação básica do profissional, que 2038

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS inclui na sua estrutura o ensino acadêmico, da graduação e pós-graduação, a prática profissional e organizativa da categoria e a pesquisa como importante instrumento na definição e redefinição do projeto de formação profissional. A partir dos anos 1990, seguindo uma tendência nacional, impulsionada pela contrarreforma do estado e da educação superior – houve uma proliferação de IES, no Maranhão. No ano 2001, segundo dados do MEC, funcionava no Maranhão, um total de 11 instituições de Ensino Superior, das quais apenas 03 públicas. Em 2011, o número total de IES passou para 30, das quais 27 de natureza privada mercantil: 26 faculdades e 01 universidade. A expansão da educação superior via IES privadas mercantis para os municípios localizados no interior do estado é outro fenômeno confirmado pelos últimos dados. Do total de 27 IES desta natureza jurídica, mais da metade funcionam no interior, ou seja, 14, restando 13 em funcionamento na capital (BRASIL, 2011). Em 10 anos, como demonstram os dados acima, mais que dobrou o número de IES no Maranhão, quase todas ligadas a grandes empresas do mercado educacional nacional e local, como, Estácio de Sá e Króton, este último, tornou-se se o maior grupo educacional privado do mundo, após recente incorporação da rede Anhanguera3. Diante de uma enorme demanda por educação, e no caso particular, de nível superior neste estado da federação, que registra altos índices de desigualdades e, em decorrência um dos maiores déficits educacionais do país – da creche à pós-graduação - a saída oferecida pelos governantes, mais uma vez se deu “pelas portas do fundo”. Uma educação de pior qualidade aos que mais precisam, àqueles que foram historicamente alijados de todos os direitos, inclusive o de acessar os bens culturais mais básicos, como a educação. A UFMA permaneceu até o ano de 2005, como a única instituição de ensino superior a oferecer o Curso de Serviço Social no estado. No entanto, a formação profissional em Serviço Social no Maranhão, percorreu um longo caminho até alcançar o nível universitário, através da Escola Maranhense de Serviço Social. Em 1961 a Escola Maranhense de Serviço Social passou à denominação de Faculdade de Serviço Social e integrou-se à Universidade Católica do Maranhão. No ano de 1966, no âmbito desta Universidade, entrou para o sistema federal de ensino universitário, por força da 3 O Grupo Kroton, dono da rede Pitágoras, comprou mais uma instituição de ensino superior no Estado. Trata-se da FAMA, que passou a denominar-se, Centro de Ensino Atenas Maranhense (CEAMA). 2039

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Lei nº 5.152, de 21.10.66, do governo Federal que instituiu a Fundação UFMA, cuja criação foi formalizada no ano seguinte, na data de 27/01/1967 (UFMA, sd). A incorporação da faculdade de Serviço Social à Fundação UFMA se confunde, pois com a própria criação desta instituição em 1966, que se constituiu da junção de várias faculdades isoladas. Algumas fundadas e mantidas pelo governo federal – como Direito, Farmácia e Odontologia e outras -- Ciências econômicas, Enfermagem, Filosofia, Ciências e letras, Medicina e Serviço Social - que pertenciam à Universidade Católica do Maranhão. Dez anos após sua criação a UFMA passa por uma reestruturação, em razão da Reforma Universitária em vigor no país, e as Faculdades dão lugar aos Cursos e Departamentos. Cria-se então o Curso de Serviço Social, enquanto unidade pedagógica e o Departamento de Serviço Social, como unidade administrativa, respectivamente, dirigidos por um (a) coordenador (a) e chefe, como vigora até a presente data. Tal como registrado em todo o país, a partir dos anos 2000 houve uma proliferação de Cursos de graduação em Serviço Social no Maranhão. Com base nas informações presentes no Sistema e-MEC e pelo mapeamento da educação à distância em Serviço Social no Brasil, realizado pelo conjunto CFESS/Conselho Regional de Assistentes Sociais (CRESS), a partir do ano 2000 passaram a funcionar no estado, 14 novos cursos de graduação, 04 presenciais, e 10 na modalidade EAD. Para corroborar com esses dados, entre janeiro a junho de 2009 foram registrados no CRESS 2ª. Região, 268 profissionais formados na modalidade EAD. Este número corresponde a mais de 20% do total de assistentes sociais formadas e em atividade nos 60 anos de existência da profissão no estado (LAUANDE, 2012). Na linha do tempo da formação acadêmica no Maranhão, atualmente existem 21 instituições de ensino superior cadastradas na base de dados do Sistema e-MEC (2001) que oferecem cursos de graduação em Serviço Social, todos oferecidos na modalidade presencial, dos quais 01 em universidade pública, 01 em universidade privada e 19 em instituições de ensino superior privadas de diferentes categorias. Destaca-se ainda que o número total de profissionais ativos, inscritos no CRESS/Ma na data de 31/12/2020, correspondia a 6.470 de assistentes sociais. Entre os meses de janeiro de 2020 a março de 2021, período predominantemente marcado pela pandemia de Covid 19, enquanto o Curso de Serviço 2040

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Social da UFMA formou 25 novas assistentes sociais, foram solicitados ao CRESS/MA, 1.262 novos pedidos de inscrição de profissionais formados nos demais Cursos oferecidos no estado. Conforme o exposto, o ensino superior, nas particularidades do Serviço Social, sofre profunda alteração na sua oferta, apresentando-se promissor enquanto mercadoria a ser oferecida no mercado da educação. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O ensino superior no Brasil, enquanto processo histórico insere-se na dinâmica política e econômica do capital. Com a crise dos anos 1970, conquistas protagonizadas pela Constituição Federal de 1988 não foram consolidadas, sendo destituídas por contrarreformas que afetam todos os setores, com profundos impactos na vida das classes trabalhadoras e populares. Dentre as medidas adotadas pelo Estado brasileiro para garantir o mercado privado, as voltadas à educação superior incidem de forma muito intensa na formação profissional de assistentes sociais tanto econômica quanto ideologicamente, pois se por um lado, os cursos de Serviço Social oferecidos pela rede privada constituem fonte de lucros, por outro, constituem estratégia ideológica de mediação na contraditória relação entre capital e trabalho. Com configuração teórico metodológica que, em muito, negam as diretrizes das entidades representativas da categoria, que não reconhecem e/ou respeitam o projeto ético da profissão, muitos destes Cursos se caracterizam pelo aligeiramento, a separação do tripé ensino, pesquisa e extensão, sendo em geral, restritos ao ensino. Considera-se, com o contexto imposto pela pandemia, o aprofundamento da questão da formação acadêmica em Serviço Social, a que foi imposto o Ensino Remoto Emergencial (ERE), resultante da pressão do mercado para fazer girar “a esteira da indústria educacional”, impulsionou o retorno às aulas, a partir da utilização de estratégias educacionais no modelo virtual. Com o ERE foi foram generalizadas formas ainda mais precarizadas de educação, que desconsideram a inclusão digital, e igualdade de acesso e que por isso mesmo não deve ser confundido com o Ensino na modalidade à Distância. Ainda que análises já apontem sobre os impactos deste processo, questiona-se quais as incidências da política de Contrarreforma da Educação Superior na formação acadêmica em Serviço Social e no trabalho docente, a partir do contexto pandêmico? Quais as implicações da 2041

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Pandemia Covid 19, no processo de formação acadêmica em Serviço Social nos Cursos presenciais no Maranhão, diante da redefinição do trabalho pedagógico na modalidade Ensino Remoto Emergencial e seus rebatimentos no trabalho e saúde docente? Quais os desafios e estratégias de enfrentamento estão sendo adotadas no âmbito das IES presenciais no estado para a realização do componente curricular estágio supervisionado, no contexto da pandemia? Tais questões, obviamente, ficam como reflexões futuras. REFERÊNCIAS FARAGE, Eblin. O desmonte da educação pública superior: as marcas do projeto do capital e a ascensão da extrema direita no Brasil. IN: mesa temática Educação e cultura na luta por emancipação da humanidade: ataques e resistências no governo Bolsonaro; anais da IX Jornada Internacional de Políticas Públicas. São Luís, 2019. FERNANDES, Florestan. A universidade brasileira: reforma ou revolução? 2.a ed. São Paulo: Ed. Alfa-Omega, 1979. GUERRA, Yolanda. Trabalho e formação profissional: desafios e perspectivas atuais ao Serviço Social brasileiro IN: Serviço Social: formação, pesquisa e trabalho profissional em diferentes contextos. (Orgs) Vera Gomes e Edna Juazeiro. EDFPI, 2020. IAMAMOTTO, Marilda Vilella. Paulo, 2014. A formação acadêmica – profissional no Serviço Social brasileiro. In: Revista Serviço Social e Sociedade, n. 120, out/dez, São SGUISSARDI, Valdemar; SILVA JR, João dos Reis Silva. Novas faces da educação superior no Brasil. 2.a ed. Ver. São Paulo: Cortez, 2008. UFMA. Entre o passado e o futuro: um caminho a percorrer. Uma publicação da Universidade Federal do Maranhão, sd. 2042

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A QUEM SERVE AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS? PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO PARA A CLASSE TRABALHADORA NO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (2014-2024) WHO ARE EDUCATIONAL POLICIES FOR? PERSPECTIVES OF EDUCATION FOR THE WORKING CLASS IN THE NATIONAL EDUCATION PLAN (2014-2024) Lucas Leon Vieira de Serpa Brandão1 Tarcia Regina da Silva2 RESUMO O Plano Nacional de Educação, assim como indica seu nome, é um plano, em forma de lei, que dita formas e metas para o desenvolvimento da educação, tido como uma política educacional que vem a se aplicar em forma de políticas públicas, pensando a promoção da educação, da igualdade e a diminuição da vulnerabilidade social. Assim, o trabalho discute os interesses por dentro da elaboração e efetivação do PNE 2014-2024 seguindo a perspectiva da ausência e não-determinação dos interesses da classe trabalhadora, considerando essa a maior força motriz e de produção de riquezas do país. Dessa forma, seguindo os métodos da pesquisa bibliográfica, pretendemos desvelar os interesses na constituição do PNE 2014-2024 a partir de uma escrita agonística, ou seja, que a partir do pertencimento de classe discorra as controvérsias e os modos de fazer, descortinando a lógica por trás da construção do PNE 2014-2024. Palavras-chave: Políticas Educacionais; Classe Trabalhadora; Sociologia da Educação. ABSTRACT The National Education Plan, as its name indicates, is a plan, in the form of a law, that dictates forms and goals for the development of education, seen as an educational policy that comes to be applied in the form of public policies, thinking about the promotion of education, equality and the reduction of social vulnerability. Thus, the work discusses the 1 Mestrando em Educação Contemporânea pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. E-mail: [email protected]. 2 Professora Livre-Docente da Universidade de Pernambuco. Doutora em Educação pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB. E-mail: [email protected]. 2045

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS interests within the elaboration and implementation of the PNE 2014- 2024 following the perspective of absence and non-determination of the interests of the working class, considering this the greatest driving force and production of wealth in the country. That way, following the methods of bibliographic research, we intend to unveil the interests in the constitution of the PNE 2014-2024 from an agonistic writing, that is, from the class belonging to discuss the controversies and the ways of doing, unveil the logic by behind the construction of the PNE 2014-2024. Keywords: Educational Policies; Working Class; Sociology Education. 1 INTRODUÇÃO Na literatura é extensa a divergência entre a data de surgimento do primeiro Plano Nacional de Educação. As produções afirmam diferentes datas, que variam entre 1934 (VIEIRA, RAMALHO e VIEIRA, 2017), 1962 (ALVES, 2010) e 1996 (BRASIL, 1998). Porém esse debate não encontra terreno fértil. É bem verdade que existiu discussões, propostas e elaborações sobre a necessidade de um Plano Nacional de Educação que concentrassem e sistematizassem o sistema de ensino, permitindo a padronização do currículo e as perspectivas avaliativas em todo o território nacional. Porém, apesar das contradições das produções científicas, só conseguimos encontrar evidências fidedignas a realidade a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996. Embora a Constituição Federal de 1934 demande da existência de um plano, este sequer chegou a ser pautado devido aos entraves políticos, bem como aconteceu com a tentativa proposta em 1961 pela Lei nº 4.024, em função do golpe militar de 1964, além do mais as produções dos dois períodos versavam sobre a distribuição de recursos do que efetivamente garantias da educação enquanto política pública. Ou seja, não tivemos sistematização de um plano. Com a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 212, que cita indiretamente o Plano Nacional de Educação, é que há uma reorganização em torno da discussão para a construção de um plano, orientado a partir de lei específica. Então, em 1996, com a nova Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/96), há a clara incumbência (art. 9º) da obrigatoriedade da elaboração de um Plano Nacional de Educação colaborativo entre União, Estados e Municípios no prazo de 1 ano (art. 87º), com diretrizes e metas decenais. 2046

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A partir das discussões iniciadas em 1996, entra em vigor somente no ano de 2001, a partir da Lei nº 10.172, o primeiro Plano Nacional de Educação com validade de 10 anos, estruturado, segundo Aguiar (2010), em três eixos: educação como direito individual, educação como meio de combate à pobreza e a educação como fator de desenvolvimento econômico. O PNE 2001-2011, já nasce influenciado pelo movimento da Nova Gestão Pública, que é pautado sobretudo no sistema organizacional baseado no neoliberalismo e instituindo práticas gerencialistas de gestão, controle e cobrança de resultados por metas, avaliadas pelo Sistema Nacional de Avaliação. Porém esse aspecto, não se destaca dentro do plano. O sentido dado ao trabalho no PNE 2001-2011 fala mais sobre a formação, ampliação dos conhecimentos e as exigências do mercado, do que sobre os interesses do mercado em cima do processo formativo. Para tanto, dentro desse primeiro plano sistematizado, formam definidos 11 campos de incidência do plano, com diagnóstico, objetivos e metas pertinentes ao seu cumprimento, a partir de prioridades. São as prioridades do PNE 2001: 1. Garantia de ensino fundamental obrigatório de oito anos a todas as crianças de 7 a 14 anos, assegurando o seu ingresso e permanência na escola e a conclusão desse ensino; 2. Garantia de ensino fundamental a todos os que a ele não tiverem acesso na idade própria ou que não o concluíram; 3. Ampliação do atendimento nos demais níveis de ensino; 4. Valorização dos profissionais da educação; 5. Desenvolvimento de sistemas de informação e de avaliação em todos os níveis e modalidades de ensino. É importante destacar, para que possamos analisar em seguida, as entidades participantes na confecção desse primeiro plano. Assim, foram consultadas para sua confecção: Conselho Nacional de Secretários de Educação (UNDIME) e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (CONSED), além é claro, do produto de uma mobilização regional e nacional presentes nas conferências da UNESCO apresentadas pelo Brasil (BRASIL, 2001). 2047

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Em dezembro de 2010, chega então com Congresso Nacional o projeto de lei para a aprovação do PNE 2011-2020, optando pela fixação de apenas 20 metas gerais, acompanhadas por estratégias, comas de controle na execução do plano, e por outro lado, o abandono do sentido diagnóstico que era necessário para compreensão do sentido das metas e que poderia ser considerado fundamental para compreensão do sucesso das metas. Faltavam, a exemplo, diagnósticos e dados sobretudo acerca de alfabetização de jovens e adultos (BRASIL, 2015). Os debates do PNE 2011-2020, passaram a tramitar no Congresso Nacional pautado pelo apelo a ampla discussão, da participação de diferentes setores, de audiências públicas e seminários para sua confecção, ou seja, participação efetiva nacional que conjuntasse saberes e práticas, bem como perspectivas, e acima de tudo interesses, ao documento final. Esse interesse de diferentes setores, faz com que o plano atrase por quase 3 anos pela grande quantidade de contradições entre os interesses no plano (OLIVEIRA, 2015). Ilustrando os interesses, estavam presentes na confecção do plano: o governo federal, os parlamentares, a UNDIME, a CONSED e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), como interlocutores prioritários. Os movimentos sociais organizados, sendo eles as entidades representativas dos segmentos da comunidade educacional, entidades científicas, redes de movimento popular. Mas também, fortemente, o setor privado, representado pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, entre eles: o Grupo Positivo, o Sistema S, a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, a Federação Nacional das Escolas Particulares, a Associação Nacional das Universidades Particulares, a Associação Nacional dos Centros Universitários e a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (BRASIL, 2015). O próprio documento escrito pela Câmera dos Deputadas destaca que Em suma, diversos segmentos, com velhos e novos atores, frequentemente com visões, interesses e propostas distintas e conflitantes, passaram a se preocupar com uma participação mais qualificada nos debates e na proposição de políticas educacionais (BRASIL, 2015, p. 17) Esse debate prolongando, fruto do direcionamento dos interesses, faz com que o PNE seja efetivado somente em 2014. Assim, temos um hiato de três anos, fazendo com que sua abrangência passe a alcançar os anos de 2014 a 2024. 2048

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Assim, são descritos como diretrizes do PNE (2014-2024) os seguintes pontos, com destaque para o ponto 5: 1. Erradicação do analfabetismo; 2. Universalização do atendimento escolar; 3. Superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação; 4. Melhoria da qualidade da educação; 5. Formação para o trabalho e para a cidadania com ênfase nos valores morais e éticos em que se fundamenta a sociedade; 6. Promoção do princípio da gestão democrática da educação pública; 7. Promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do país; 8. Estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação com proporção do Produto Interno Bruto (PIB), que assegure atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e equidade; 9. Valorização dos(as) profissionais da educação; 10. Promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade e à sustentabilidade socioambiental. O que se percebe então é a contradição prevista em uma política pública que dispõe em seu texto a disputa pela hegemonia do discurso, pelas práticas de saber, transcendendo até mesmo as próprias estruturas do Estado para tornar a educação pública própria ao atendimento de interesses de determinado setor, orientando o processo educacional. Contradiz até mesmo os elementos fundamentais e os objetivos das políticas públicas. Assim, esse trabalho tem por objetivo analisar e desvelar o PNE 2014-2024 com vistas a inclusão da classe trabalhadora e seus interesses no processo de organização educacional garantidos ou negados no plano nacional de educação a partir de uma escrita agonística. Tem- se por abordagem uma pesquisa qualitativa que irá permitir conhecer e construir novas perspectivas (LÜDKE E ANDRÉ, 2020; GIL, 2019), e como método, vem a se enquadrar como uma pesquisa bibliográfica (GIL, 2019). 2049

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS 2 FORMAÇÃO PARA O TRABALHO, CIDADANIA, VALORES MORAIS E ÉTICOS: HIERARQUIA E DESIGUALDADES A PARTIR DA IDEIA DE MORALIDADE É no destaque 5 ao qual se encontra a maior referência acerca da utilização da educação como formadora para o trabalho, levando em consideração esta a partir de valores morais e éticos – incluindo a formação da cidadania. Ao longo do texto, a articulação ente educação, formação para o mercado de trabalho e necessidades econômicas/empresariais se manifestam, enquanto o conceito de “ética” e “moral” não possuem definição. Assim sendo, iremos considerar moral como referência aos costumes vigentes, dominantes, que se prevalecem hegemonicamente pela sua própria etimologia. Segundo o dicionário Michaelis (2022), etimologicamente a palavra moral tem origem no latim moralis. Moralis seria algo ligado ao comportamento adequado dentro de uma sociedade e literalmente está ligada ao comportamento. Ou seja, a análise do PNE 2014-2024, nos leva a pensar a moral como obediência aos costumes ou valores vigentes. Assim, a moral se destaca por uma preocupação com a sociedade formada de forma hierárquica e o cumprimento dos papéis sociais a partir das disposições de classe, onde cada sujeito deve cumprir seu papel para que consiga atingir os objetivos propostos para o controle social. Pauta-se a ideia dominante da qual seria necessária para funcionamento pleno da sociedade. Nesse sentido, a moral prevista dentro do aspecto da formação para o trabalho é sobretudo uma moral da desigualdade, os costumes de desigualdades, pautada na hierarquia e na desigualdade de oportunidades, que não permite uma sociedade minimamente justa, sobretudo se pensarmos nos aspectos neoliberais presentes na proposta e os interesses para definição do plano. Assim, a educação enquanto fato e a escola como instituição, se aproximam da lógica de mercado. Para Lima e Brandão (2021) podemos perceber a incisiva aproximação da escola com uma racionalidade que admite um novo e específico tipo de formação: aquela que se preocupa e prepara majoritariamente para o mercado de trabalho. Essa perspectiva neoliberal (...) que enxerga o mundo como uma grande empresa e incide sobre os sujeitos as ideias e concepções mercadológicas, vai sendo naturalizada e disseminada com tamanha eficiência que torna, por vezes, uma tarefa demasiadamente difícil darmos conta do quanto essa lógica tem nos orientado e, por consequência, direcionado nossas ações. (LIMA E BRANDÃO, 2021, p. 2). 2050

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Ou seja, o mercado, a partir dos conglomerados de empresas de educação, que ditou as regras e participou integralmente da construção do Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) para garantia de seus interesses, impõe um princípio moral à formação para o trabalho que atenda aos interesses econômicos que foge do sentido educacional, sentido esse como pensa Lima e Brandão (2021), ao afirmar que a educação (...) tem como objetivo a emancipação dos sujeitos a partir da instrumentalização fornecida para estes a fim de que eles se percebam no mundo e no contexto em que estão inseridos, conscientizando-se das desigualdades que os rodeiam e que sob eles se colocam. Nessa concepção, é a partir da formação consciente, crítica e reflexiva que o sujeito se torna capaz de alcançar uma nova realidade. Uma educação crítica e reflexiva, nesse sentido, perpassa pela ideia de uma formação global dos indivíduos visto que, uma educação pautada exclusivamente na transmissão de conteúdo ou puramente tecnicista não daria conta dessa demanda. (LIMA E BRANDÃO, 2021, p. 2). Há de se pensar também que esse princípio de moralidade impõe um princípio de convicção, não pelo medo, não pela ação, ou obediência, mas pela ação de um devir vigilante como condução para um estado de princípio, de conduta para alçar objetivos e como sentido da própria existência, da necessidade laborativa da classe trabalhadora e a admissão de condições de trabalho precárias e subalternas pela noção até mesmo de escolha do necessário, como posta por Bourdieu (2008). Assim, a escola assume como função social e objetivo a formação unicamente para o trabalho, distante da perspectiva de formação humana, pautada na transformação social, tornando os sujeitos reféns das condições de trabalho. Para Oliveira (2015) o que se percebe é uma contradição entre grupos que disputam a hegemonia para o atendimento de determinadas demandas, usando tanto os discursos, quanto o próprio saber, considerando as relações assimétricas da sociedade e o aspecto mais amplo da dominação social. Assim, a sociedade passa a se construir a partir da noção de privilégios, embora a educação seja considerada como modelo social para a garantia de direitos. Segundo Lima e Brandão (2021) as orientações na educação, a partir dos interesses do sistema econômico, ao qual o PNE está inserido, são utilizadas para compor um quadro social onde determinados sujeitos são indicados e legitimados a determinadas posições de classe, sendo possível assegurar a reprodução do sistema e a garantia de perpetuação de gerações em papéis sociais específicos, sendo a classe trabalhadora a destinatária final dessa forte influência. 2051

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Ou seja, é explícita as intenções de um grupo específico em reivindicar espaço para estabelecimento de seus interesses, com foco na formação de uma educação voltada para preparação para a o mercado do trabalho, minando a formação da classe trabalhadora a partir de um princípio moral que diz respeito a uma orientação pautada nos interesses de mercado e pelo controle dos saberes. Dessa forma, as intenções dos grupos educacionais privados demonstram um relativismo ético que diz respeito a motivação que orienta os comportamentos. O que se estabelece, é o uso da educação enquanto unidade formadora para introjetar nas subjetividades uma sociedade hierárquica ditada pelos interesses econômicos, além da naturalização dos privilégios das classes mais abastadas pela fixação da moral da desigualdade. 3 EDUCAÇÃO PARA FORMAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA Refazer o caminho da retomada histórica nos permite constatar, assim como outros autores, que as bases de construção da nação são alicerçadas, integralmente, ao trabalho. A princípio ao trabalho escravo, e em seguida, de forma reiterada, ao trabalho subalterno e precário, que não somente explica a fundação do país, como estabelece a lógica dominante ao qual o Estado se dispõe a discorrer sua realidade social. Rummert, Agebaile e Ventura (2013), a exemplo, destacam a guarda dos valores históricos da dominação e a mentalidade colonial para garantia das expressões da sociedade brasileira atual, expressas em moldes educacionais e de formação humana, não restringindo esse pensamento apenas as ideias econômicas, que traz a classe trabalhadora o histórico de desigualdade pela sua não emancipação. Afinal, como destacam, é fundamental, para a lógica dominante, que a estrutura social posta pelos interesses econômicos não estejam apenas aplicadas a própria estrutura, como também seja construída nas consciências singulares e coletivas dos sujeitos. Expropria-se então a classe trabalhadora de sua consciência de classe, reduz sua força de trabalho, fraciona os postos de trabalho e estabelece uma educação reprodutivista pautada nos princípios econômicos, de modo a desarticular suas pautas e interesses formativos ampliando as estratégias de subalternização e controle social. Afinal, como pontua Bourdieu 2052

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS (2008), as condições de existência se sobrepõem a outras condições quais sejam, o que vem a provocar o distanciamento subjetivo e objetivo do mundo. Já para Abrantes (2013), a disposição dos saberes escolares não toma relevância para os jovens da classe trabalhadora, porque a escola torna-se um preparatório para o desempenho de trabalho em empregos explorados. Ou seja, a escola passa a atender as demandas da produtividade do trabalho de forma seletiva, sendo altamente controlada, gerenciada e avaliada, seguindo os princípios da Nova Gestão Pública, que por sua vez é orientada por grandes organismos internacionais, como a OCDE e por conglomerados de empresas. Embora Rummert, Agebaile e Ventura (2013) avaliem que a educação pode desempenhar um papel essencial contra-hegemômico como a promoção de políticas de redução de pobreza ou encaminhamentos de ações articuladas de atendimento as necessidades da classe trabalhadora, o entrelaçamento das questões pedagógicas enfatizam a individualidade, e nesse aspecto a auto responsabilização pela precarização da vida e perda de direitos, o incentivo ao consumo irracional, transformando, como constatado pelo ex- presidente do Uruguai, Pepe Mujica, cidadãos em consumidores. Outro aspecto, é que a educação para a classe trabalhadora, prevista no Plano Nacional de Educação 2014-2024 relaciona a subalternidade da classe, propondo a mediação dos saberes dessa classe a partir das perspectivas do mercado e as demandas econômicas viabilizadas pelo sistema capitalista. Não há previsão no plano para atendimento das demandas da classe, o que faz do Plano Nacional de Educação uma política pública falha, deslocada da realidade e incongruente com as perspectivas de formação humana e oferecimento de subsídios para atendimento dos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras. Para Silva et al (2021) a inserção dos interesses das elites econômicas na educação, e porque não no Plano Nacional de Educação, é fundamental para a manutenção da lógica do capital e para a produção da consciência da ideologia dominante, que vem a dificultar a articulação e reivindicação possível para a participação e atuação no mundo com vistas as mudanças sociais necessárias. Porém, alguns autores estabelecem uma controvérsia, caso de Ramos (2016), ao afirmar que apesar do passado escravocrata e da história de negação à educação para a classe 2053

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS trabalhadora, o PNE 2014-2024 garante avanços diversos, ao ponto que se contradiz ao afirmar que há uma educação “unitária, politécnica e de formação ominilateral” (RAMOS, 2016, p. 18) o que nos evidencia que as pautas não foram atendidas, reafirmando que a condensação das relações econômicas com as relações empresariais dos poderosos grupos estabeleceram uma priorização de uma educação tecnicista de formação para os postos de trabalho. As conduções para análise são amplas para a construção do documento, vão desde a reforma trabalhista e a precarização do trabalho, passando pela Base Nacional Comum Curricular e a forma como a classe trabalhadora, os filhos dessa classe, estão sendo sistematicamente pensados para atender determinadas demandas. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Como dito por Brandão (2019), acerca do projeto educacional que desmobiliza os sujeitos e os retira o contato de construção de suas subjetividades, e a criação de uma consciência de classe, requer como antídoto dessa desorganização pragmática e programática estaria a organização consciente e a problematização da via dos processos, ou seja, uma problematização criticamente consciente da realidade que estaria em par com a condição para o processo de libertação. (BRANDÃO, 2019, p. 3). Ainda para Brandão (2019), a educação deve se colocar como espaço de libertação aos sujeitos, permitindo o contato direto com a realidade e seus contextos, entendo o processo de ensino-aprendizagem, que não pode ser gerido pela ideia de mercantilização ou formação única para ocupação dos postos de trabalho sem quaisquer catarses. Para Lima e Brandão (2020), a partir dessa constatação, é que há uma formação do que as autoras chamam de homem-empresa, ou seja, aquele que se organiza e se movimenta através dos princípios de concorrência, aptidão e eficiência e alterando a função social da escola que, se antes era pensada como um local de transmissão de conhecimentos para emancipação e formação dos sujeitos de maneira global, passa a ser concebida como um mero trampolim para o mercado de trabalho, desligada do compromisso de formação humana. (LIMA e BRANDÃO, 2020, p. 1). 2054

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Pautamos então a reorganização da classe trabalhadora, pensando em suas reivindicações, além da articulação para as discussões no plano que virá em menos de dois anos, podendo assim, ter suas demandas atendidas e permitindo que uma outra lógica da educação seja formada, longe dos interesses escusos da classe empresarial e dos interesses econômicos. Deste modo podemos concluir respondendo à pergunta título deste trabalho “a quem serve as políticas educacionais?” pautadas a partir do Plano Nacional de Educação: aos interesses de mercado, a lógica do capital, a construção de uma identidade producente e irreflexiva, a desarticulação da classe trabalhadora, às ordens do sistema capitalista para sua própria sustentação, a ação dos aparelhos privados e sobretudo a subalternização da vida desses sujeitos. REFERÊNCIAS ABRANTES, Pedro (comp.). Entre a vida da escola e a escola da vida: diálogos com Aprendendo a Trabalhar de Paul Willis In: SANT’ANA, Ruth Bernardes de; Pedro Abrantes (org). Aprendendo a Trabalhar: um encontro coletivo com a obra de Paul Willis. Curitiba: CRV, 2013. p. 13-17. AGUIAR, Márcia Angela da S. Avaliação do Plano Nacional de Educação 2001-2009: questões para reflexão. Educ. Soc., Campinas, v. 31, n. 112, p. 707-727, jul.-set. 2010 ALVES, João Roberto Moreira O Plano Nacional da Educação e o papel da sociedade no processo de sua construção coletiva. Publicação do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação. Ano 18 - nº 124 - dezembro de 2010. ISSN 1414-4778. BOURDIEU, Pierre. A distinção: Crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp, 2008. BRANDÃO, Lucas Leon Vieira de Serpa. A emergência da educação humanizadora em meio ao caos: contradições da educação remota na efetivação da inclusão social. Anais VII CONEDU - Edição Online... Campina Grande: Realize Editora, 2020. BRANDÃO, Lucas Leon Vieira De Serpa. Da educação popular ao bem estar social: panorama para a superação do Brasil bolsonarista. Anais VI CONEDU... Campina Grande: Realize Editora, 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988 BRASIL. Lei nº 10.172, de 09 de janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Diário Oficial da União: Seção 01, Brasília, DF, p. 1, 10 jan. 2001. 2055

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EIXO TEMÁTICO 6 | EDUCAÇÃO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A RELAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA EM TEMPOS DE PANDEMIA COVID-19 E OS IMPACTOS NO DESENVOLVIMENTO INTEGRAL DA CRIANÇA NO ESPAÇO ESCOLAR THE FAMILY AND SCHOOL RELATIONSHIP IN TIMES OF THE COVID-19 PANDEMIC AND THE IMPACTS ON THE INTEGRAL DEVELOPMENT OF THE CHILD IN THE SCHOOL SPACE Izadora Vieira1 Maria Cristina Piana2 RESUMO A presente pesquisa tem como objetivo compreender a relação família e escola no contexto de pandemia Covid-19, decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em março de 2020, e os impactos da mesma para o desenvolvimento integral da criança dentro do espaço escolar. Visto que o isolamento social, necessário para a redução da disseminação do vírus, extremamente letal, não permitiu que as crianças frequentassem as escolas ao longo dos dois primeiros anos de pandemia. Assim sendo, foi necessária uma reformulação na maneira de ensinar por parte dos professores e uma maior colaboração por parte dos familiares. Essa situação esbarra em diversos aspectos da questão social das famílias e escolas brasileiras, levando em consideração sua história e sua contemporaneidade, além de instigar maneiras de reverter os impactos da pandemia Covid-19 perante a educação da infância brasileira. Palavras-chave: Educação Infantil; Desenvolvimento Integral; Família- escola. ABSTRACT The present research aims to understand the family and school relationship in the context of the Covid-19 pandemic, decreed by the World Health Organization (WHO) in March 2020, and its impacts on the 1 Bacharela em Serviço Social, Universidade Estadual Paulista – UNESP, Campus de Franca. E-mail: [email protected]. 2 Pós-Doutora em Serviço Social, Docente do Departamento de Graduação e do Programa de Pós- Graduação em Serviço Social - Mestrado e Doutorado da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais – UNESP, Campus de Franca. E-mail: [email protected]. 2057

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS integral development of the child within the school space. Since social isolation, necessary to reduce the spread of the extremely lethal virus, did not allow children to attend schools during the first two years of the pandemic. Therefore, it was necessary to reformulate the way of teaching by the teachers and a greater collaboration on the part of the family members. This situation comes up against several aspects of the social issue of Brazilian families and schools, taking into account its history and contemporaneity, in addition to instigating ways to reverse the impacts of the Covid-19 pandemic on Brazilian childhood education. Keywords: Childhood education; Integral Development, Family-School. 1 INTRODUÇÃO A necessidade da escrita desse trabalho ocorreu através da indagação sobre o papel da escola e da família perante o desenvolvimento integral das crianças, entendendo-se por desenvolvimento integral aquele que abrange não apenas os seus aspectos cognitivos, mas também seus aspectos sociais, afetivos, relacionais, emocionais e físicos. Uma atenção especial para o desenvolvimento integral deve ser dada sobretudo no momento inicial do desenvolvimento dos seres humanos como indivíduos sociais: a infância. Momento em que as crianças estão começando a entender o mundo, a se entenderem como parte dele e descobrindo sentimentos e sensações. A criança precisa de auxílio e respaldo para entender seus sentimentos. O que eu estou sentindo? Raiva? Tristeza? Felicidade? Saudade? E esse entendimento necessita da presença de um adulto que preste atenção nesta criança, que a coloque como prioridade e que principalmente a escute, abrace e oriente suas sensações e seus sentimentos. A família é o primeiro contato da criança com a sociedade e a escola, o segundo; dessa forma, ambas precisam caminhar juntas para o desenvolvimento integral das crianças, um diálogo constante precisa ser travado entre elas, contudo, sabe-se que a parceria entre as mesmas possui e sempre possuiu diversas dificuldades e entraves a serem superados. Dificuldades e entraves estes que se agravaram ainda mais pelo contexto de pandemia Covid-19, enfrentada pelo mundo desde março de 2020, na qual o vírus “Sars Cov 2”, causa uma síndrome respiratória grave e levou milhares de pessoas à morte em todo o mundo. Diante desta situação a rotina de todos teve que ser modificada e adaptada para o enfrentamento da pandemia e a tentativa de conter a transmissibilidade do vírus. 2058

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS O contexto pandêmico exigiu um isolamento social e o fechamento das escolas, portanto a educação foi um dos setores que sofreram mudanças drásticas, fazendo com que estratégias precisassem ser tomadas para a continuação das atividades escolares. A opção escolhida foi continuar o ensino por meio das atividades remotas em todas as etapas, desde a Educação Infantil até o Ensino Superior, através da primeira portaria do Ministério da Educação, de Nº 343, de 17 de março de 20203, que dispunha sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus – Covid-19. Assim sendo, a presente pesquisa tem a intenção de analisar como se deu a relação família e escola na Educação Infantil, dentro do contexto de pandemia Covid-19 e os impactos que o isolamento social trouxe para o espaço escolar, para as famílias e para o desenvolvimento integral das crianças. Essa análise foi feita através de uma pesquisa de campo realizada por meio de um questionário semiestruturado o qual foi base para a entrevista com profissionais da Escola Municipal de Educação Infantil (EMEI) do município de pequeno porte estudado, o nome do município e da escola não serão citados neste trabalho a fim de proteger o sigilo das participantes da pesquisa. A entrevista foi realizada em grupo, de forma presencial com as profissionais da referida escola, sendo elas: duas professoras, uma do Jardim I, que dá aula para crianças de 4 anos, e outra do Jardim II, que dá aula para crianças de 5 anos, a coordenadora pedagógica e a diretora da Educação Infantil Municipal. As falas foram gravadas em áudio, com a autorização das participantes, as quais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Unesp, campus de Franca. Os nomes das participantes foram substituídos por nomes fantasias de deusas gregas, sendo elas: Atena4, Afrodite5, Ártemis6 e Gaia7. Levando-se em consideração que todas as 3 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Portaria/PRT/Portaria%20n%C2%BA%20343-20-mec.htm. 4 A deusa Atena possui muitos atributos e é relacionada à sabedoria, arte e criação. Além disso, seu nome está associado à guerra e à justiça. 5 Afrodite é uma deusa que traz como símbolos a beleza e o amor. 6 Ártemis é a divindade da caça, da vida selvagem e da Lua. Ela também era parteira, e por isso protegia os jovens e as crianças. 7 Gaia é a deusa primordial da Terra. Sua origem ocorre quando o caos universal encontra a ordem. Fonte: Toda matéria. Disponível em: https://www.todamateria.com.br/deusas-gregas/. Acesso em: 30 nov. 2021. 2059

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS entrevistadas são mulheres, as quais desde os primórdios tomam a linha de frente da educação, anteriormente relacionada ao cuidado, mas que atualmente representa um espaço de possibilidades, de transformações, de conhecimentos e de muita luta. A entrevista coletiva é interessante pela possibilidade de trocas de informações, percepções e vivências entre os participantes, o que não seria possível na pesquisa individual. “Esse instrumento tem sido empregado em pesquisas qualitativas como uma solução para o estudo de significados subjetivos e de tópicos complexos demais para serem investigados por instrumentos fechados num formato padronizado” (Banister, et al., 1994 apud Szymanski, 2018). A intenção da pesquisa de campo foi obter acesso às percepções das participantes sobre a Educação Infantil atual, o desenvolvimento integral da criança, e a família contemporânea, assim como sobre as experiências vivenciadas pelas profissionais dessa etapa da educação durante o período de pandemia Covid-19, quais foram os desafios e as dificuldades, como foi a relação das famílias durante as aulas remotas e como está sendo o processo de volta às aulas, sempre em um processo reflexivo e coletivo. 2 DESAFIOS, DIFICULDADES E PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO PANDÊMICO A pandemia Covid-19 causou impactos inquestionáveis sobre todas as facetas da vida da sociedade do século XXI. A Educação Infantil brasileira foi uma das parcelas afetadas por ela; portanto, nosso objetivo neste momento é entender como esse impacto se deu e quais são os desafios que os profissionais da educação dessa faixa etária enfrentaram ao longo dos dois últimos anos, assim como as estratégias para o enfrentamento dos desafios que nos serão postos a partir de agora. Segundo Oliveira, a situação de pandemia começa em um momento no qual as novas bases curriculares da Educação Infantil estavam começando a serem aplicadas de fato, bases que fortalecem a quebra de paradigma dessa etapa da educação, anteriormente vista apenas como um espaço de cuidado, assistencialista e atualmente considerado importante para o desenvolvimento e formação dos indivíduos sociais. 2060

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS A necessidade do isolamento social bateu à porta justamente quando as novas disposições da Base Nacional Comum Curricular para a Educação Infantil começavam a serem trabalhadas nos sistemas de ensino. Em 2017, a BNCCEI trouxe mudanças importantes, apontando direitos e objetivos de aprendizagem para bebês e crianças pequenas – um paradigma, muito diferente da concepção assistencialista ou preparatória que marcou a Educação Infantil em nosso país. O período de aproximação, conhecimento e apropriação desse novo referencial chocou-se, então, com a pandemia. (OLIVEIRA, 2020, p. 3). A pandemia Covid-19 influenciou e abalou sem dúvidas tanto os espaços públicos quanto os privados, as relações sociais e as relações familiares. Além de também ter mudado de maneira drástica a situação dos professores brasileiros, que se viram em uma situação na qual precisariam pensar em estratégias, rever suas maneiras de ensinar e em um momento de extrema tensão e ansiedade pela qual todo o mundo passava. Levando esses fatos em consideração, exporemos neste momento os resultados da entrevista, onde as participantes contam um pouco dos desafios enfrentados pela categoria profissional, pelas famílias e pelas próprias crianças. Gaia, que possui formação pelo magistério e posteriormente graduação em pedagogia, e especialização em Educação Infantil, trabalha há 25 anos na EMEI estudada e atua há 3 anos na direção da mesma escola. Atena, com a mesma formação que Gaia, trabalha há 27 anos na área da Educação Infantil, também dentro da EMEI estudada, e há 12 anos na área do Ensino Fundamental I, o qual abarca crianças de 6 aos 10 anos de idade. Atualmente é professora de duas turmas, uma da Educação Infantil, de crianças de 5 anos, e outra do Ensino Fundamental I. Afrodite, formada também pelo magistério, posteriormente graduada em Letras, trabalhava como professora de português do Ensino Fundamental II, o qual abarca a faixa etária dos 11 aos 14 anos e atua há 16 anos na área da Educação Infantil, completando sua formação com a complementação pedagógica necessária para atuar como pedagoga. Atualmente é professora da Educação Infantil para crianças de 4 anos. Ártemis, formada em pedagogia, trabalha como professora na escola estudada há 14 anos, atuando há 10 anos como coordenadora pedagógica da Educação Infantil e com 8 anos de experiência profissional como professora do Ensino Fundamental I. 2061

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Assim sendo, a pesquisadora traz a questão sobre como o desenvolvimento integral da criança é visto pelas participantes da pesquisa, como elas o percebem. Ao passo que Atena respondeu chamando a atenção para o fato de que todos os aspectos que envolvem a criança irão interferir no seu desenvolvimento: “É tudo está interligado né, quando algo não vai bem no social, vai refletir também no cognitivo, ou vice-versa, no cognitivo vai refletir no social, às vezes na família não, mas com os coleguinhas. Então tudo está interligado” (Atena). Afrodite, nessa questão, traz luz para a tecnologia, que atualmente e principalmente em um contexto pandêmico, reflete de maneira importante o desenvolvimento integral das crianças, principalmente no que diz respeito à sua concentração. “[...] E eu vejo, de uns anos pra cá, esses problemas aumentando, porque por exemplo, a criança hoje, com o que ela brinca? Com o celular. Então ela começou a ter outros déficits de atenção, no processo de aprendizagem, na coordenação da escrita. Acho que isso também reflete” (Afrodite). Percebe-se também o fato de que a concentração está intimamente ligada à impaciência das crianças, potencializada pela tecnologia que ocasiona a ansiedade e a possibilidade de se ter tudo na mão na hora que quer, fazendo com que eles não consigam se concentrar por grandes períodos em atividades simples. “E é algo que eu percebo também que mudou muito, é que as crianças... a gente sabe que quanto menor, menos tempo elas conseguem se concentrar em uma atividade. Mas eu percebo que esse tempo vem diminuindo cada vez mais. Por exemplo, eles vão fazer um desenho e em dois minutos “Tia, acabei”. Ou vai fazer outra atividade, “Tia, acabei”, porque no celular é assim: eles tão vendo um vídeo, eles não têm paciência de ver até o fim, eles já vão nas outras opções de vídeos que têm, já clicam nelas e começam outro. Aquilo não interessou, eles já vão pro outro. Eles não têm mais paciência” (Atena). Nesse momento da entrevista, as participantes trazem uma pauta bastante pertinente no século XXI, que é o quanto as telas refletem e muitas vezes, mais prejudicam do que otimizam o desenvolvimento integral da criança, apesar de a tecnologia ser uma ferramenta importante e ter contribuído demasiadamente para a educação no período de pandemia Covid- 19, ela é uma faca de dois gumes. 2062

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Durante o período pandêmico observou-se um uso massivo das telas por todas as parcelas da população, em qualquer idade, exatamente pelo fato de que todos os tipos de relações sociais, o contato físico, a conversa face a face nos foi tirado e a fonte de distração, de prazer e até mesmo de contato social, mesmo que apenas virtualmente, que nos restou, foram as telas. Inclusive as atividades remotas, utilizando-se telas de computadores e celulares, foi a opção encontrada pela educação para que fosse possível a continuidade do processo de aprendizagem durante o período de pandemia, causando indagações aos profissionais da educação sobre como realizar as atividades de uma maneira que não sobrecarregasse as crianças e também não aumentasse ainda mais seu tempo de exposição às telas. A questão da exposição das crianças às telas, fator de questionamento intenso tanto de profissionais da saúde e educação quanto das famílias com relação às propostas remotas para a Educação Infantil, também foi alvo de preocupação e reflexo sobre o que estávamos propondo para crianças entre 1 e 4 anos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Sociedade Brasileira de Pediatria, até os 2 anos as telas não são indicadas a não ser para contato com pessoas próximas que estão distantes. De 2 a 4 anos, não devem superar uma hora por dia, com conteúdo de alta qualidade e na companhia dos pais. (ABBUD, 2020, p. 21). Portanto, houve a necessidade de que os professores pensassem nas atividades que seriam transmitidas às crianças e em seus conteúdos, para que fossem interessantes e instigantes a elas, capturassem sua atenção e produzissem um processo pedagógico que possibilitasse desenvolvimentos e habilidades, que não as deixassem passivas em relação às telas, como os vídeos deixam. Dessa forma, a criança era colocada pelas propostas em posição ativa, e não passiva, por meio de atividades apropriadas e significativas para a faixa etária e para um grupo cujos interesses e características a professora ou o professor pôde conhecer no início do ano letivo. Assim, a qualidade da tela que foi oferecida nesse momento às crianças dependeu da escola e da atuação dos professores na seleção do que e como propor nos vídeos. (ABBUD, 2020, p. 22). As entrevistadas nos expõem o quanto o excesso de telas é prejudicial para o desenvolvimento integral das crianças, mesmo antes da pandemia, a geração atual já passava 2063

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS muito mais tempo sobre elas do que interagindo socialmente, as brincadeiras são jogos eletrônicos, vão se perdendo habilidades importantes em consequência disso. A tecnologia também prejudica o processo das relações sociais, da interação, da convivência comunitária, dificuldade potencializado ainda mais pela pandemia Covid-19, na qual as crianças e os indivíduos sociais como um todo se tornaram cada vez mais individualistas, mais “fechados em seus próprios mundos”, ou no caso, em suas próprias casas, que são ambientes privados. As relações sociais fazem parte do processo de desenvolvimento integral do ser humano, da formação de seres sociais que saberão conviver socialmente, democraticamente, com respeito e empatia. Esse cenário atual, com a decorrente necessidade de distanciamento social, colocou- nos em uma situação bastante desafiadora. Para as escolas, em especial as de Educação Infantil, o desafio que se apresentou foi realmente grande, pois a interação presencial, o olhar, o toque e o colo são aspectos indissociáveis do próprio papel educacional com crianças pequenas. (ABBUD, 2020, p. 6). A autora nos apresenta a importância das relações sociais para a formação das crianças em seres sociais, inclusive expondo que mesmo dentro das condições de pandemia e em um contexto de isolamento social, é valioso o momento em que os familiares se dispõem para passarem com os filhos e na qualidade desse tempo. Claro que precisamos considerar questões como a questão social que atravessa as famílias e muitas vezes compromete esse momento, contudo a presença e a parceria delas para o desenvolvimento das crianças pequenas são essenciais. Para a psicanalista Julieta Jerusalinsky, “a convivência é fundamental para moldar que adultos essas crianças serão amanhã. A gente precisa de gente para virar gente, pois é pela relação com o outro que uma criança se estrutura” (Abbud, 2020). A autora também propõe algo que refletimos ao longo de todo o trabalho: a necessidade de se quebrar o paradigma de que é possível delegar todo o trabalho educacional para a escola, assim como não é possível delegar todo o trabalho para as famílias. O desenvolvimento integral da criança depende de ambas as esferas. Nesse momento surge a questão de que as atividades proporcionadas pelas professoras só eram passíveis de serem realizadas pelas crianças caso os pais proporcionassem essa ponte, 2064

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS esse acesso, já que a faixa etária trabalhada ainda não possui autonomia para terem um celular próprio, nem mesmo o entendimento do que precisaria ser feito, sem o auxílio de um adulto. O que coloca a questão da participação familiar intrinsecamente ligada às atividades escolares realizadas, por esse motivo, a conversa toma o rumo da participação familiar a as dificuldades encontradas nesse contexto. Assim sendo, Afrodite nos apresenta quais foram as estratégias realizadas pela escola quando as famílias não possuíam os bens materiais necessários para a realização das atividades remotas, como celular ou acesso à internet Banda Larga, a fim de que o aprendizado das crianças não ficasse prejudicado por esse motivo. “No caso o que a escola fez: deixava o material aqui pras mães virem buscar, então se ela não tinha o meio de um jeito, a gente tentava fazer com que ela viesse pelo outro. Mas também tem a questão do interesse familiar, quando ela não tinha interesse nenhum ela não se preocupava em querer fazer, em querer buscar... Mas eu acho que a maioria tiveram uma boa participação” (Afrodite). As participantes da pesquisa concordaram em unanimidade que o interesse familiar era essencial para o processo de aprendizagem das crianças durante o contexto de pandemia Covid- 19. Contudo, Ártemis nos chama a atenção para uma questão importante a ser analisada a respeito do entendimento da família sobre o que o espaço escolar proporciona e qual a função dele, assim como o desentendimento de qual é a função familiar perante a educação dos filhos. “Mas ainda tá muito na cabeça das famílias que a educação escolar é apenas da escola, não é da família também” (Ártemis). O que a participante nos expõe é o fato de que as famílias não compreendem o processo pedagógico proporcionado pela escola, que elas ainda entendem a escola, principalmente a Educação Infantil, como um espaço apenas de cuidado, como era anteriormente e não de aprendizado. Esse foi um fator determinante para a dificuldade da realização das atividades pelas crianças, assim como na absorção do conteúdo passado pelas professoras, do aproveitamento pedagógico das atividades, porque como sabemos as composições familiares são distintas uma das outras e as realidades de cada criança também, assim como o material que elas possuem 2065

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS para realizar as atividades, o espaço, o tempo, o auxílio dos pais. Na escola, todas possuem o mesmo espaço, os mesmos instrumentos e sobretudo, a professora com as habilidades necessárias para ministrar o ensino. Também foi necessário retomar que a escola é um lugar onde as crianças podem e apreciam vivenciar experiências diferentes das oferecidas em casa. [...] Essa mistura de contextos, presentes nas videochamadas, motivou a irritação e desorganização das crianças, além, claro, da própria novidade da situação, na qual os sinais de ser visto e escutado não estavam tão claros como nas interações presenciais (ABBUD, 2020, p. 20). Abbud nos expõe acima o fato de que as videochamadas não transpassarem com concretude o momento em que as crianças estavam sendo ouvidas, entendidas e principalmente que o professor estava dando atenção para o que elas estavam expondo. Além também da questão da rotina, quando a criança não tinha a possibilidade de fazer as tarefas sempre no mesmo horário, no mesmo espaço, tudo isso é motivo para uma dificuldade no aprendizado e na apreensão do conteúdo, inclusive na desconcentração, irritabilidade e falta de paciência da criança, sobretudo na faixa etária que estamos estudando. Oliveira sintetiza as mudanças que a pandemia causou no processo educacional para os profissionais da Educação Infantil e também para os familiares dessas crianças, pois não há como negar que o período de pandemia foi um momento de muita tensão, ansiedades e preocupações. Havia preocupação dos pais pela saúde, pela questão econômica quando esses não possuíam trabalhos formais, o desemprego e a insegurança alimentar foram fatores que voltaram a crescer em ritmo frenético durante os anos de 2020 e 2021 no Brasil. A restrição de crianças e jovens ao ambiente familiar provocou os sistemas de ensino a apresentar propostas de continuidade do trabalho pedagógico em todas as etapas da Educação Básica por meio de atividades não presenciais durante o período de afastamento. [...] Em especial, incentivou-se a presença de tarefas em papel ou via computador, justificadas como “passagens de conteúdos”. Tais tarefas em geral ficavam sob os cuidados das mães que, com justeza, têm se queixado de não possuírem o equipamento ou os conhecimentos necessários para orientar seus filhos, além de estarem estressadas e preocupadas com os aspectos econômicos e de saúde nesta situação. (OLIVEIRA, 2020, p. 6-7). Através dessa ideia, podemos destacar que a compreensão da escola perante as dificuldades encontradas pelas famílias é extremamente necessária, não é retirar a 2066

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS responsabilidade da família perante as atividades escolares e sua presença nesse processo de formação de seus filhos, mas entender quais são os contextos em que elas estão inseridas, como elas estão vivendo e sobrevivendo a esse período pandêmico e não cobrar sua participação sem antes entender os motivos de sua ausência. Inclusive, o fato exposto de que muitas vezes a família não compreendem o projeto pedagógico realizado pela Educação Infantil, acontece exatamente pelo motivo de a escola estar afastada da família, por não existirem projetos e espaços que as convidem e proporcionem a oportunidade para que elas entendam o processo de aprendizagem da criança e comecem a participar dele. Portanto, apostar na parceria família e escola em um momento de isolamento social e atividades remotas também diz respeito a entender e observar a situação das famílias envolvidas no processo educacional, dar abertura para o diálogo é essencial, tanto para que as famílias entendam a proposta e as necessidades da escola, quanto para que a escola compreenda as necessidades das famílias. Assim sendo, é real a necessidade de estreitar essa relação, tanto foi durante o período mais árduo da pandemia, onde as crianças estavam afastadas do espaço escolar, como está sendo agora no processo de volta às aulas e continuará sendo após a pandemia. A relação família e escola, quando concretizada, permite uma otimização extrema do processo de aprendizagem das crianças e também no próprio trabalho que a escola tem em relação às famílias, a tensão que sempre existiu entre elas é quebrada e o espaço escolar fica mais atrativo para todos que usufruem do mesmo. Oliveira nos propõe uma maneira de realizar esse diálogo. Uma das maneiras de atuar é trocando opiniões com os pais sobre como a experiência familiar está sendo vivida e sobre os comportamentos diversos das crianças. [...] Sempre é bom reforçar a importância de acolher as diferentes formas de arranjos familiares: crianças criadas só pela mãe, pelo pai, pela avó, criadas com pessoas de outras famílias, filhas de casais homossexuais, entre outras formas possíveis em nossa sociedade. Respeitar o olhar das famílias, que constituem o ambiente primordial de desenvolvimento da criança pequena, sobre suas necessidades, opiniões e aspirações como alguém que conhece a criança e almeja certas aquisições para ela é fundamental. (OLIVEIRA, 2020, p. 17-18). 2067

ANAIS IV SINESPP SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE ESTADO, SOCIEDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS Nesse sentido, a compreensão da escola perante todos os modelos familiares que adentram o ambiente escolar é essencial para uma boa relação e parceria entre as duas esferas. É visto que a baixa escolaridade da parcela da população mais empobrecida da sociedade é um fator para o afastamento delas do espaço escolar, de uma desconexão do desenvolvimento integral de seus filhos, pois acabam não entendendo a importância da escolarização para os mesmos. Fato que precisa ser analisado e que teria como ser revertido e trabalhado através de ações afirmativas do Estado para com essas famílias, políticas públicas, programas e projetos, principalmente associados ao espaço educacional. Como expusemos anteriormente, muitas famílias se sentiram incapazes de auxiliarem no processo educacional das crianças durante o contexto de pandemia. Não existe uma exigência de que os pais se formem em pedagogia para auxiliarem as crianças, mas a participação e a parceria, principalmente quando se trata de crianças pequenas, é e foi essencial, os pais foram o meio de acesso delas às atividades propostas pelas professoras. Contudo, quando os pais não possuem alfabetização, ou mesmo não entendem a função do processo educacional, eles podem omitir seu papel em relação à escola e à educação das crianças, por não compreenderem a real importância dele para o aprendizado de seus filhos, ou nem mesmo conseguir auxiliá-los. Assim sendo, as participantes nos relataram que apesar de haver sim famílias que não participaram do processo de aprendizagem das crianças durante o período de pandemia Covid- 19, elas foram poucas. A maioria aderiu bem, mesmo que com maneiras e frequências variadas. Durante a nossa pesquisa de campo, não encontramos apenas um movimento de aproximação entre a família e a escola, ele existiu sim, em alguns casos, mas também tiveram aquelas que se afastaram completamente, as quais a escola perdeu o contato, não conseguiu acessar durante o período pandêmico e nem mesmo neste momento de volta às aulas. Entretanto, podemos destacar que se algo ficou evidente, foi de que a escola precisa da família, assim como a família precisa da escola e por esse motivo elas precisam ser parceiras, o paradigma da tensão entre esses dois setores da sociedade precisa ser rompido, principalmente pensando na qualidade do ensino a ser ofertado, no desenvolvimento integral da criança sobretudo em um momento como este que estamos vivendo. 2068


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