O processo de seleção e adaptação de aparelho de amplificação sonora ... todo o dia com muita discrição. Uma pequena parte do equipamento ficará exposta na orelha. CIC ou microcanal Colocados completamente dentro do canal auditivo externo. Apenas o minúsculo cabo removível do aparelho auditivo aparece fora do canal auditivo, para facilitar sua retirada. Componentes das próteses auditivas A principal função da prótese auditiva é a amplificação sonora, para que essa amplificação aconteça da forma adequada e satisfatória, existem alguns componentes que são indispensáveis nesse dispositivo, a saber: O microfone ou transdutor de entrada, que capta o som do meio ambiente e transforma-o em onda elétrica equivalente, que será processado dentro da prótese auditiva. O amplificador tem a função de aumentar a intensidade das ondas elétricas captadas pelo microfone. É responsável pelas características de ganho da prótese auditiva. O receptor transforma a energia elétrica já amplificada em onda sonora e transmite à orelha do paciente. O som é transmitido através do molde auricular ou diretamente para a membrana timpânica do usuário da prótese auditiva. O controle de volume permite o ajuste manual do volume de acordo com as necessidades individuais. Há aparelhos em que o controle de volume pode ser regulado pelo controle remoto, outros através de aplicativos disponíveis para a realização desses ajustes. Além de chave liga/desliga que controla a mudança de função, pois, há dois tipos de recursos para ligar e desligar a prótese auditiva: através da chave liga/desliga ou pela abertura e fechamento do compartimento da bateria. A chave de seleção de entrada, importante salientar que os aparelhos de amplificação retroauricular podem ter uma chave onde aparecem as letras M, MT ou T, ou podem até estar juntamente com a chave liga/desliga. Na posição M ativa o microfone para amplificação tanto ambientais quanto de fala. Na posição T ativa para bobina telefônica (ou bobina de indução magnética), que possibilita a captação e amplificação somente dos sons do telefone. A posição MT permite tanto a recepção dos sons ambientais, quanto do telefone. Bateria, é a fonte de energia que alimenta todos os componentes. As baterias vêm com o selo de proteção, e deve-se observar o sinal positivo (+) da bateria que deve estar para o mesmo lado do sinal (+) da prótese auditiva. O desgaste da bateria dependerá da qualidade, da 551
Reabilitação: teoria e prática potência da prótese auditiva e do volume usado. A duração média é de aproximadamente, 12 dias. O tipo de bateria a ser utilizada vai depender do modelo de prótese auditiva. Número de baterias: retroauricular - 675, Miniretorauricular -13, Intra-auricular e microcanal ou CIC 230 ou 10, Intracanal - 312. Os moldes que segundo Bevilacqua, Costa e Bortoluzzi (2012), a escolha do tipo e material do molde auricular deve ser realizada com base nas características de amplificação necessárias e outros fatores como o conforto físico, considerações sobre oclusão, aspectos estéticos, facilidade de inserção e manipulação, sensibilidade da pele. Peças personalizadas, através da pré moldagem, com a função de fixar, vedar e conduzir o som amplificado através do AASI para a membrana timpânica do usuário. Em aparelhos retroauriculares, o molde é acoplado ao gancho do aparelho através do tubo de plástico. Em aparelhos intra-aurais e intracanais, o molde é a própria caixa do aparelho (PEREIRA, 2015). Os moldes podem ser solicitados no material de acrílico ou silicone. Tipos de Adaptação Adaptação Monoaural (unilateral): uso de AASI em uma só orelha; Adaptação Binaural (bilateral): uso de AASI em cada orelha. Em casos de PA bilateral, se não houver contraindicações médica ou audiológicas, deve ser dada ao paciente a oportunidade de experimentar o uso de AASI em adaptação bilateral (ABA, 2011). Campo Livre O campo livre, semelhante a audiometria tonal limiar mas sem fones de ouvido, é utilizado para avaliar os limiares auditivos de aparelho de amplificação sonora (AASI); O estímulo do tom puro ou de fala chega através de caixas de som e depende da colaboração do indivíduo (PEREIRA, 2015). Adaptação cros (Contralateral Routingsignal) Cros - É uma opção para indivíduos com perda unilateral. Um microfone é colocado na orelha perda auditiva e envia um sinal por meio da tecnologia wireless para um receptor acoplado na orelha com audição normal (MONDELLI et al., 2013). 552
O processo de seleção e adaptação de aparelho de amplificação sonora ... Bicros - Há perdas em ambos os lados com grande diferença entre elas, que resultam em uma assimetria. Os sons são recebidos pela orelha não amplificável por meio do cros e transmitidos para o aparelho no outro lado (PEREIRA, 2015). Sistema de Frequência Modula (FM) O sistema de frequência modulada (Sistema FM) é um dispositivo utilizado principalmente em ambiente escolar, constituído por dois elementos: um microfone/transmissor e um receptor. O microfone/ transmissor é utilizado pelo falante, tem função de captar os sons, codificá- los em sinais elétricos e convertê-los em sinais de frequência modulada. O sinal de FM é decodificado pelo receptor, que pode ser acoplado ao AASI ou ao IC utilizado pelo ouvinte, e depois é transformado, novamente, em energia acústica. O FM e sua transmissão reduzem o efeito do ruído e da reverberação sobre os sinais de fala e, aumentando a eficácia da comunicação entre os usuários (JACOB; QUEIROZ-ZATTONI, 2011). Métodos Prescritíveis Os métodos prescritíveis, são elaborados para calcular o ganho por frequência; o objetivo de todos os métodos prescritíveis é fornecer a meta a ser alcançada, representando o ponto de partida para alcançar uma amplificação ideal, o ganho ou amplificação, deve ser maior, onde a perda é maior (FROTA, 1998). O método prescritivo é o ponto de partida dos ajus- tes na adaptação do aparelho de amplificação sonora individual (AASI), especialmente durante o início do processo de seleção, verificação e adaptação. O ob- jetivo principal é a aplicação da amplificação reco- mendada para usuários de AASI, atendendo a seus interesses, geralmente na melhora da percepção de fala. Diferentes métodos, no entanto, podem ter dife- rentes objetivos de ajuste (BERTOZZO; BLASCA, 2019 apud JOHNSON, 2013, p. 2). Verificação e validação A verificação é o mapeamento visível da fala amplificada, com o objetivo de informar o real ganho que o AASI está oferecendo em relação 553
Reabilitação: teoria e prática aos sinais de fala, possibilitando condutas audiológicas para ajustes com plena audibilidade para fala (FERRAZA et al., 2014). A verificação in situ é o método mais eficaz para ave- riguar se os alvos fornecidos pela regra prescritiva fo- ram atingidos. Recomenda-se que os testes sejam fei- tos em, pelo menos, três níveis diferentes de entrada, correspondentes a sons de fraca, média e forte inten- sidade, de modo que todos os sons de fala possam ser audíveis e confortáveis ao paciente (MUELLER, 2006, p.155). A validação dos resultados, deve ser realizada continuamente e serve para informar o real benefício obtido pelo paciente, o que compreende questões subjetivas, como a percepção da melhora das relações comunicativas nas mais variadas situações acústicas do dia a dia, a qualidade do relacionamento social e emocional do paciente adaptado. Além dos testes de fala, os questionários de autoavaliação fornecem importantes informações a respeito da percepção do próprio paciente acerca do benefício obtido com o AASI (BEVILACQUA; COSTA; BORTOLUZZI, 2010). Adaptação e orientação Segundo a Academia Americana de Audiologia (AAA, 2008) o objetivo da etapa de orientação é garantir ao usuário os benefícios oferecidos pela prótese auditiva. Ressalta-se a importância da presença de familiares durante este processo. É fundamental que as informações sejam passadas não somente oralmente, mas também por escrito, devendo ser retomadas em todas as sessões. Na entrega do aparelho auditivo, o paciente recebe as instruções para manuseio e cuidados com o mesmo, acompanha uma ficha com as orientações e o exame realizado na primeira consulta. É realizado a verificação in situ, mapeamento de fala nas intensidades de 55 dB, 65 dB e 75 dB. Solicita-se ao paciente um retorno em trinta (30) dias, para acompanhamento, com possibilidades de ajustes no aparelho, de acordo com a queixa que paciente apresentar. No retorno em 30 dias, ajustes são realizados de acordo com a queixa do paciente, ativa controle de volume (CV) com a possibilidade de aumentar ou abaixar o volume o AASI, sendo orientado quanto ao manuseio. Verifica-se o tempo de uso das próteses durante o período através do DataLogging, recurso que dá acesso aos dados da vida real, facilitando o acompanhamento individualizado. 554
O processo de seleção e adaptação de aparelho de amplificação sonora ... Realiza-se o questionário de satisfação com amplificação na vida diária, reaplica o questionário de zumbido, Tinnitus Handicap Inventory (THI) na versão portuguesa e Escala Visual Analógica (EVA) em caso de pacientes com queixa de zumbido. EVA - consiste em escore de aferição da intensidade de dor pelo paciente. Em caso de crianças com indicação para Implante Coclear, orientar para acompanhamento com o médico otorrinolaringologista. O acompanhamento anual, é realizada avaliação audiológica, consulta médica otorrinolaringológica, atualiza a audiometria no software NOAH para ajustes nos aparelhos (nova configuração), reorientação quanto ao manuseio e cuidados com os aparelhos, reaplicar Questionário de Satisfação e Questionário de Zumbido (paciente com zumbido), atendimento no serviço social e psicológico, quando necessário. Reposição de AASI (BRASIL, 2012) A Indicação de reposição de AASI deve ocorrer nas seguintes situações: • Perda auditiva progressiva comprovada, quando não houver possibilidade de regulagem do AASI anteriormente adaptado; • Perda, furto ou roubo devidamente comprovado com Boletim de Ocorrência; • Falha técnica do funcionamento dos componentes internos e/ ou externos do AASI, findo o prazo de garantia de fábrica do AASI, não havendo possibilidade de manutenção e mediante relatório da assistência técnica, devidamente validado pelo responsável técnico do serviço. Relato de caso Paciente de 30 anos de idade, sexo feminino, apresenta perda auditiva após traumatismo crânioencefálico (TCE), em acidente de motocicleta em maio de 2019. Na avaliação audiológica apresentou perda do tipo neurosensorial de grau profundo bilateralmente e sem reconhecimento de fala. Relatou presença de zumbido, porém, não incomodava. Com diagnóstico médico de hipoacusia bilateral, com indicação de AASI e possível candidata a implante coclear (IC). Foi realizado teste com os aparelhos de alta potência, com amplificação adequada para a configuração da perda auditiva (PA). A paciente no momento do teste com os aparelhos relatou ouvir bem, emocionando-se, expressando muita alegria em poder ouvir novamente. 555
Reabilitação: teoria e prática Após adaptação dos aparelhos auditivos, paciente retornou ao centro para acompanhamento, relatou estar entusiasmada com os aparelhos, referindo boa adaptação com os aparelhos. Apresentou planos para o futuro, retornando às atividades de rotina e motivada a estudar, concluir o curso técnico de enfermagem. Considerações finais A concessão de próteses auditivas no Programa de Saúde Auditiva (PSA) no Centro de Reabilitação, tem possibilitado aos indivíduos com perda auditiva, a oportunidade de se beneficiarem com esses dispositivos, trazendo grandes benefícios, principalmente em suas necessidades de comunicação. Oprocessodeavaliação,seleção,adaptação,verificação,orientação, aconselhamento e validação são etapas a serem criteriosamente seguidas, para que o paciente obtenha melhor desempenho na amplificação, garantindo o sucesso do tratamento audiológico e do processo de reabilitação. Os resultados da intervenção estão diretamente relacionados às necessidades de comunicação e suas expectativas, os quais recebem todo suporte através da equipe multidisciplinar deste centro. Referências bibliográficas AAA. American Academy of Audiology. Guidelines for audiologic management of adult hearing impairment. United States: American Academy of Audiology; 2008. ABA. Academia Brasileira de Audiologia. Guia de orientação para implantação e desenvolvimento da saúde auditiva na atenção primária. Brasília: Conselho Federal de Fonoaudiologia, 2011. AZEVEDO, Milena Manoel et al. Interferência binaural no processo de seleção e adaptação de próteses auditivas: revisão sistemática. Revista CEFAC, v. 15, n. 6, p. 1672-1678, 2013. BERTOZZO, Marília Cancian; BLASCA, Wanderléia Quinhoneiro. Análise comparativa dos métodos prescritivos NAL-NL2 e DSL v5. 0a na adaptação do AASI em idosos. In: CoDAS. Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia, São Paulo, v. 31, n. 4, p. 1-10, ago. 2019. BEVILACQUA, M. C.; COSTA, T.; BORTOLUZZI, S. Protocolo de adaptação de AASI em adultos. In: 27. Encontro Internacional de Audiologia (EIA), International Congress ofAudiology, 15 abr. 2012. Anais [...] Bauru: EIA, 556
O processo de seleção e adaptação de aparelho de amplificação sonora ... 2012. Disponível em: https://www.audiologiabrasil.org.br/eiabauru2012/ foruns/forumconsultapub2012.pdf. Acesso em: 10 abr. 2021. BEVILACQUA, M. C.; COSTA, T.; BORTOLUZZI, S. Protocolo de adaptação de AASI em adultos. In: 27. Encontro Internacional de Audiologia (EIA), International Congress ofAudiology, mar./abr. 2010. Anais [...] São Paulo: EIA, 2010. BRASIL. Instrutivos de Reabilitação Auditiva, Física, Intelectual e Visual (CER e serviços habilitados em uma única modalidade). Ref. Portaria GM 793 de 24 de abril de 2012 e Portaria GM 835 de 25 de abril de 2012. FERRAZ, Tatiane Neves et al. Procedimentos de verificação e validação no processo de seleção e adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual: as escolhas do fonoaudiólogo. Revista Equilíbrio Corporal e Saúde, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 40-47, jan. 2014. FROTA, S. Fundamentos em fonoaudiologia audiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. JACOB, R. T. S.; QUEIROZ-ZATTONI, M. Sistemas de frequência modulada. In: BEVILACQUA, M. C. et al. (Ed.). Tratado de audiologia. São Paulo: Santos, 2011. p. 727-741. JOHNSON, Earl E. Modern prescription theory and application: Realistic expectations for speech recognition with hearing AIDS. Trends in amplification, New York, v. 17, n. 3, p. 143-170, dez. 2013. MELLO, Jaqueline Medeiros de; MACHADO, Priscila Ferreira; OLIVEIRA, Valdéia Vieira de. Questionário IOI-HA, na versão em português (QI-AASI). Fono Atual, São Paulo, v. 8, n. 34, p. 65-73, set./dez. 2005. MONDELLI, M. F. C. G. et al. Unilateral hearing loss: CROS fitting. Brazilian Journal Otorhinolaryngol., São Paulo, v. 79, n. 4, p. 523-43, ago. 2013. MUELLER, H. G. Hearing aid verification: old concepts and new considerations. In: Proceedings of Phonak Internationl Conference on Hearing Care for Adults Chicago, 13-15 nov 2006. Anais […] Chicago: Phonak, 2006. p. 155-65. Disponível em: http://www.phonak.com/content/dam/phonak/ b2b/Events/conference_proceedigs/adult_conference_chicago_2006/ monday/2006proceedings_mueller.pdf. Acesso em: 30 abr. 2021. OMS/OPAS. Organização Mundial da Saúde. Organização Pan-Americana da Saúde. OMS e União Internacional de Telecomunicações recomendam novo padrão global para prevenir perda auditiva entre 1,1 bilhão de pessoas. Brasília: OMS/OPAS, 2019. PEREIRA, R. C. Prótese auditiva. Rio de janeiro: Revinter, 2015. ROCHA, Andressa Vital; MONDELLI, Maria Fernanda Capoani Garcia. Sound 557
Reabilitação: teoria e prática generator associated with the counseling in the treatment of tinnitus: evaluation of the effectiveness. Brazilian Journal of Otorhinolaryngology, São Paulo, v. 83, n. 3, p. 249-255, jun. 2017. 558
41 A psicologia na reabilitação / habilitação auditiva no centro integrado de reabilitação Darleny do Nascimento Vilanova Marta Maria de Brito Soares Ravena Rhara de Paiva Abreu Alice Dolores Magalhães Carneiro A audição é importante para o contato do ser humano com o ambiente, tanto para seu desenvolvimento pessoal quanto para as relações sociais e qualidade de vida. Portanto, a saúde auditiva também é, invariavelmente, pensada no âmbito psicológico, uma vez que a perda auditiva afeta o emocional e o bem-estar das pessoas. No atendimento de quem sofre de perda auditiva, o psicólogo contribui para o processo de aceitação do uso do aparelho auditivo, favorecendo a adesão à reabilitação / habilitação, autoestima, estimulação cognitiva, inserção social e ao melhor desempenho na aprendizagem e no trabalho, isto é, no cotidiano. Em Teresina – Piauí, o trabalho desenvolvido pelo Centro Integrado de Reabilitação (CEIR) atende pessoas de todo o Estado mediante engajamento de equipe multidisciplinar composta por otorrinolaringologista, fonoaudiólogo, psicólogo e assistente social no atendimento junto ao Programa de Saúde Auditiva para seleção dos que precisam de Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) e o recebem
Reabilitação: teoria e prática via Sistema Único de Saúde (SUS). Ou seja, os indivíduos são avaliados para serem submetidos, caso seja necessário, à reabilitação / habilitação graças ao uso do AASI, prática adotada no âmbito do CEIR. As famílias constituem parte integrante do processo como um todo, já que fazem parte do dia a dia desses indivíduos e, por conseguinte, estão envolvidos emocionalmente, o que demanda ações fundamentais que lhes proporcionem informações e garanta sua implicação, de modo a lhes proporcionar suporte e melhor evolução dos pacientes. Diante do exposto até então, o capítulo objetiva analisar a atuação do CEIR, ênfase para a atuação do profissional psicólogo no que concerne aos cuidados na reabilitação / habilitação dos pacientes, como especialista na citada equipe multidisciplinar com atribuições devidamente planejadas. Atendimento do psicólogo no Programa de Saúde Auditiva O CEIR integra o Programa de Promoção e Prevenção da Saúde Auditiva do Governo Federal, devidamente habilitado pelo Ministério da Saúde como Centro Especializado em Reabilitação (CER), mediante a instalação do Programa de Saúde Auditiva, vinculado ao SUS, com o objetivo de cuidar da saúde auditiva de pessoas que sofrem com déficit leve, moderado, severo e profundo de audição. Acresce-se que o CEIR foi inaugurado no dia 5 de maio de 2008 para atendimentos de média e alta complexidade voltados para indivíduos com deficiência no Piauí, em quaisquer faixas etárias, bem antes da implantação do Programa de Saúde Auditiva no ano de 2015. Os pacientes, quando se submetem ao processo de seleção para o aparelho auditivo e os que precisam do uso do AASI, após atendimento (triagem) da equipe multidisciplinar, são acompanhados sistematicamente para reavaliações e ajustes dos dispositivos, além de avaliados a fim de possível encaminhamento à reabilitação / habilitação. O Programa de Saúde Auditiva contempla avaliações psicológicas desses indivíduos, com escuta, acolhimento, entrevista psicológica e observação do comportamento, com o objetivo macro de identificar junto a eles e/ou familiares como está se dando a vivência da perda auditiva e se há registro de alterações, como a presença de zumbidos, e quais as principais dificuldades enfrentadas nos contextos familiar, escolar, laboral e social como um todo. Também visa detectar expectativas e crenças relacionadas à perda auditiva e ao uso do AASI e a respeito de seu diagnóstico e prognóstico, com a identificação (ou não) de possíveis alterações cognitivas, emocionais ou comportamentais, bem como quadros psicopatológicos específicos 560
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... relacionados à perda auditiva ou à presença dos zumbidos, com o fim de efetivar abordagens específicas e os devidos encaminhamentos (Figura 1). Figura 1: Atendimento na saúde auditiva Fonte: Arquivo pessoal, 2022 Durante o atendimento psicológico são adotados técnicas como: escuta, intervenções para regulação emocional e psicoeducação do paciente e família para conscientização acerca do uso do AASI com o fim de atingir adesão mais efetiva do Programa de Saúde Auditiva e habilitação / reabilitação. Como mencionado, os pacientes são atendidos em várias etapas desde a avaliação e a depender da necessidade, novas reavaliações, quando há demandas identificadas pelo psicólogo ou outro profissional da equipe, podendo ocorrer discussão do caso em equipe. A inserção do psicólogo na saúde auditiva desbrava um cenário de possibilidades com vistas a analisar a subjetividade do indivíduo como sujeito operante no contexto de uma equipe multidisciplinar em saúde, o que, no mínimo, atesta a relevância da intervenção desse profissional na esfera ampla, até porque a surdez é vivenciada de maneira única e singular. O impacto que a deficiência auditiva ocasiona no sujeito é macro e traz mudanças à sua vida em diversas situações emocionais, indo desde 561
Reabilitação: teoria e prática a escolarização até a socialização em diferentes circunstâncias, tais como ambiente familiar, Igreja, lazer e mercado de trabalho. Como Sobreira (2015) reforça, a principal conexão do ser humano com seu meio é a audição. Afinal, para que ocorra comunicação efetiva entre duas ou mais pessoas, é essencial primeiro ouvir e compreender para, então, elaborar uma resposta e manifestá-la via linguagem. A aquisição da linguagem, portanto, depende da integridade do sistema auditivo e quando este está prejudicado por perda auditiva, é importante a intervenção terapêutica para que o cidadão possa ter a chance de desenvolver a fala, e, assim sendo, atingir nível razoável de aprendizagem e ampliação de novos conhecimentos. Logo, é inegável que a privação de audição ocasiona consequências emocionais e sociais que podem repercutir de forma negativa na qualidade de vida. Para Fonsêca e Dutra e Ferreira (2020), o AASI mantém a função de ampliar os sons para a pessoa utilizar sua audição remanescente, de modo a colaborar com sua qualidade de vida. Caso contrário, a perda auditiva acarreta isolamento em qualquer faixa etária de vida e limita a realização das atividades diárias, haja vista que traz consigo dificuldades na compreensão da fala, sobretudo, nos idosos, com consequências psicossociais e prejuízos que alcançam sua capacidade de se proteger em situações de riscos de vida (PICININI et al., 2017). Trata-se de mais uma evidência que comprova a importância do Programa de Saúde Auditiva e dos bons resultados da reabilitação / habilitação, quando o indivíduo usa corretamente e sistematicamente o AASI, o que torna indispensável o envolvimento do profissional psicólogo ao longo do processo como um todo. Saúde auditiva e reabilitação / habilitação auditiva: atuação do psicólogo Como antevisto no decorrer do capítulo, ao se dissertar sobre o atendimento do psicólogo no Programa de Saúde Auditiva, é evidente que a saúde auditiva está impreterivelmente contemplada na esfera mental e psicológica dos seres humanos. Reitera-se que o profissional psicólogo consiste como peça fundamental para os que sofrem de perda auditiva no sentido de lhes ajudar a superar os eventuais impactos, com destaque para a autoestima e a inserção social em qualquer segmento. Quer dizer, o processo de reabilitação / habilitação assume papel importante e fundamental no que diz respeito à minimização de eventuais sequelas dos pacientes auditivos, lhes favorecendo funcionalidade ideal na 562
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... interação com seu ambiente e provendo as ferramentas necessárias para alcançar sua independência e autodeterminação. A este respeito, Ramos e Casalis (2007) reforçam o trabalho da equipe multidisciplinar. Em conjunto e em respeito às especificidades de cada área, além de avaliar cada paciente, vão bem adiante: estimulam e auxiliam a descoberta do potencial remanescente, facilitando a inclusão social e superando as inevitáveis limitações impostas pela deficiência. A detecção e, sobretudo, a intervenção precoce da deficiência auditiva consiste em fator importante no incremento das habilidades auditivas e de comunicação oral. É evidente que quanto mais cedo acontecem as intervenções, mais oportunidade para alcançar o desenvolvimento auditivo e de linguagem, fundamentais para a inclusão social e o desempenho comunicativo das crianças. Ao tempo em que a surdez impacta negativamente o aprendizado da fala, mediante a reabilitação auditiva, é possível restabelecer o limiar auditivo para que as pessoas tenham acesso aos sons, possibilitando a consecução do fenômeno da comunicação. Esse processo propicia a adaptação a aparelhos auditivos ou a implantes cocleares, estimulando as destrezas importantes para o sujeito aprender e reaprender que escutar traz em si valor semântico, subjacente e importante (BICAS et al., 2017). Segundo parâmetros e orientações do Guia de Orientações na Avaliação Audiológica Básica (2020), é importante identificar em que momento de vida, ocorreu a perda auditiva; quando a pessoa iniciou os cuidados; qual o grau e o tipo de perda auditiva, com o intuito de definir a conduta para os cuidados e acompanhamento contínuo. Os tipos de perda auditiva são condutiva, sensório-neural e mista. Quanto aos graus de perda auditiva, para Lloyd e Kaplan (1978) podem ser assim categorizadas: audição normal; perda auditiva de grau leve; moderado, moderadamente severo; severo; e profundo. O treinamento auditivo associado ao uso do aparelho auditivo promove diagnóstico efetivo, desenvolve a neuroplasticidade com o intuito de gerar mudanças na morfologia e no desempenho auditivo após a estimulação da audição. Com tal método e estratégia, o paciente pode ressignificar cada som que escuta e, então, as atividades para aprimorar a percepção auditiva refletem-se em mudanças estruturais e funcionais, facilitando o ensino-aprendizagem, como Sales e Resende e Amaral (2019) chamam atenção. O sofrimento e a capacidade de superação do paciente com a perda auditiva dependem de uma série de fatores, ênfase para as características e a estrutura de personalidade, o contexto social, histórico e cultural no 563
Reabilitação: teoria e prática qual está inserido. Daí a necessidade de conhecer as idiossincrasias de cada sujeito. É o momento de atuação do psicólogo para identificar como a perda auditiva está repercutindo nos aspectos cognitivo, afetivo, social e educacional, não importa as faixas etárias das crianças, dos adolescentes, dos adultos e dos idosos, até porque se trata de algo que, sem dúvidas, vai afetar não somente o indivíduo isoladamente, mas os grupos sociais no qual ele interage (BALEN et al., 2010). Como decorrência, desde o primeiro contato com o paciente e a família, é fundamental que o psicólogo favoreça um espaço acolhedor para facilitar a interação e a avaliação do paciente, traçando o perfil de sua história de vida e a dinâmica familiar. Saber como ele lida com a perda auditiva e com o uso permanente do AASI vão contribuir bastante para o acompanhamento do deficiente auditivo e para o avanço do planejamento das intervenções durante a reabilitação / habilitação. Em outras palavras, a entrevista psicológica é basilar no trabalho do psicólogo porque através dela são coletados dados e informações para a formulação do diagnóstico clínico, além de permitir conhecer a dinâmica emocional do paciente (CUNHA, 2007). Isto é, o entrevistador é participante e usa a observação como técnica para coleta e organização das informações de que necessita para avaliação das funções psíquicas do paciente. Deve manter contato visual com o paciente com perda auditiva e deixar que o mesmo tenha oportunidade de visualizar sua boca e suas expressões faciais, usando também gestos e escritos, sempre que necessário. No decorrer de todo o processo de interação, recomenda-se usar o tom de voz normal e de forma bem articulada, destacando palavra por palavra, sem excessos e exageros, segundo Balen et al. (2010) alertam. Os profissionais do campo da psicologia na reabilitação / habilitação auditiva auxiliam a minimizar prejuízos associados à perda auditiva nas habilidades de compreensão, abstração, formação de conceitos simbólicos, aquisição, expressão, evocação, concentração, atenção, memória, linguagem, humor e socialização. Aliás, se tais elementos não são trabalhados podem trazer prejuízos nas habilidades apontadas, como Schlindwein-Zanini (2015) alerta. E, por fim, no caso específico do CEIR, realizam-se os seguintes procedimentos: orientação familiar; curso para pais e adultos; formação de grupos. Como adendo, para enfatizar quando possível nos contatos com os profissionais de todas as demais áreas são realizadas orientações e também são realizados atendimentos agendados com psicólogos com cada familiar e/ou cuidador do paciente. 564
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... Orientação familiar A orientação familiar se dá face às demandas de um paciente ou da necessidade familiar, em atendimentos com cada família (geralmente um comparece). É o momento em que o profissional psicólogo instrui familiares e/ou cuidadores sobre como lidar com as questões emergentes e como estimular o paciente na esfera familiar. Dizendo de outra forma, a orientação familiar visa esclarecer acerca da deficiência em si, da reabilitação / habilitação; do apoio essencial frente às dificuldades para que desenvolvam habilidades no suporte aos pacientes. Inclui, ainda, orientação sobre aspectos cognitivos, socioemocionais, comportamentais, de aprendizagem e da dinâmica familiar, escolar e social; bem como da importância do uso do aparelho auditivo e da realização de novos encaminhamentos, sempre que preciso for. Para Balen et al. (2010), mais do que nunca, a psicologia assume papel relevante nesse momento, uma vez que auxilia na superação de conflitos sobre eventuais preconceitos, no avanço do autoconhecimento, da autoaceitação e da autoconfiança, lidando da melhor forma com as adversidades do dia a dia e com as relações sociais de diversas naturezas que se impõem aqui e ali. O psicólogo orienta as famílias sobre o suporte necessário às pessoas com perda auditiva e para estimular suas potencialidades mediante valores positivos, como coragem, realismo, apoio e entusiasmo. Na opinião de Oliveira (2011), aliás, consensual dentre os diferentes teóricos, a família constitui o primeiro núcleo social da pessoa, que impulsiona seu desenvolvimento. Aprende a escutá-la e a estimular sua fala, ou seja, há todo um envolvimento e referencial para a construção da linguagem. Logo, na reabilitação auditiva, o profissional que acompanha, assume a função de acolher a família, orientá-la, aconselhar e reforçar a confiança dos cuidadores, proporcionando-lhes autoconfiança e as informações imprescindíveis e os conhecimentos essenciais para que adotem técnicas que viabilizem, ainda que gradativamente, a comunicação efetiva do filho com o mundo, o que exige sua participação ativa na terapia. Curso para pais e adultos Os cursos para pais e adultos destinam-se a familiares e/ou cuidadores de pacientes que estão em reabilitação / habilitação auditiva para lhes esclarecer acerca de aspectos alusivos à perda auditiva do paciente, ao diagnóstico, ao uso e à adaptação do AASI, incluindo, também, informações sobre reabilitação / habilitação e busca de estratégias para 565
Reabilitação: teoria e prática lidar com as demandas e dificuldades tanto desses indivíduos quanto dos pacientes. Configura-se como procedimento em grupo, cuja finalidade mor é manter um canal de informações atualizadas sobre a patologia e os tratamentos do paciente. Inclui esclarecimentos sobre aspectos clínicos e técnicos. A cada semana um profissional das diferentes especialidades envolvidas na reabilitação / habilitação comparece para uma aula-sessão, sanando as frequentes dúvidas de familiares ou responsáveis com vistas à conscientização consolidada frente à seriedade do tratamento global do paciente e da adesão da família. Segundo Madaleno et al. (2007), são ações que objetivam acentuar o desenvolvimento físico, mental e emocional dos indivíduos com problemas de audição, sempre com vistas à sua inserção social. Como antevisto, é em meio à família, que o ser humano forja sua personalidade, aprende e consolida sua visão de mundo, e, portanto, a forma com que seu contexto familiar lida com a perda auditiva o influencia de forma expressiva. Grupos Os grupos são organizados de acordo com a faixa etária, seu desenvolvimento cognitivo e o nível de perda auditiva, com pacientes que lançam mão do AASI. Antes da pandemia do coronavírus, cada grupo incluía quatro pacientes. Agora, apenas um. São os grupos assim descritos: grupo infantil I (zero a quatro anos); grupo infantil II (quatro anos e um mês a 12 anos e 11 meses), os quais contam com dois psicólogos; grupo de adolescentes (13 a 15 anos; 15 a 17 anos e 11 meses), com acompanhamento de um psicólogo e um fonoaudiólogo; grupo adulto (18 até 59 anos), com um psicólogo e um fonoaudiólogo; grupo de idosos (a partir de 60 anos), contando com a assistência efetiva de um psicólogo e um fonoaudiólogo. Nos grupos, os objetivos dos profissionais da psicologia priorizam a psicoeducação a respeito do diagnóstico, prognóstico e processo de reabilitação. A meta mor dos grupos é contribuir com a adesão do paciente ao AASI; assegurar suporte psicológico e comportamental na reabilitação / habilitação auditiva; estimular o avanço individual; tentar minimizar dificuldades relacionadas à perda auditiva. Obviamente, isto conduz a outras ações, tais como: intervir em demandas emocionais e comportamentais; promover interação familiar e social com o treino de habilidades; estimular o processo cognitivo; e facilitar a inserção escolar, até porque, como antes citado, após a seleção do AASI, é vital a adaptação do aparelho com início do processo terapêutico, inclusive com terapia de linguagem (MIGUEL; NOVAES, 2013). 566
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... Estimular as vias auditivas periféricas e centrais contribui significativamente para o domínio de habilidades auditivas e de comunicação oral. A intervenção fonoaudiológica é fundamental para prevenir nas crianças alterações secundárias relacionadas à perda auditiva. É importante avaliar no avanço das habilidades auditivas e de comunicação oral alguns fatores, a saber: nível de perda auditiva do paciente; estabilidade da perda; adaptação ao aparelho auditivo; e reabilitação auditiva. A adaptação adequada ao AASI possibilita às crianças receberem estímulos auditivos orais para a melhoria de seu poder de comunicação (BICAS et al., 2017). Prosseguindo com procedimentos em grupo Considerando a relevância do cuidado da pessoa com perda auditiva, desvenda-se, a seguir, alguns procedimentos envolvendo grupos de faixa etária similar. Isto porque, em se tratando do acompanhamento de crianças tanto do grupo infantil I quanto do grupo infantil II, quando da atividade terapêutica para os deficientes auditivos, muitas vezes, o psicólogo precisa lançar mão de uma série de estratégias e “artifícios”, como gestos, escritos e desenhos. Figura 2: Atendimento (I) da psicologia no grupo infantil Fonte: Arquivo pessoal, 2022 567
Reabilitação: teoria e prática Figura 3: Atendimento (II) da psicologia no grupo infantil Fonte: Arquivo pessoal, 2022 São casos em que a comunicação verbal é insuficiente ou deficiente. Quer dizer, com as crianças, adotam-se atividades neuropsicológicas e recursos lúdicos, haja vista que, ao brincar, qualquer criança tente a assimilar com maior rapidez, a imitar, a representar e recriar a realidade. Com isto, estimulam a atenção, a memória e a imaginação, como vê-se adiante (Figuras 2 e 3), que são tão somente exemplos de experiências no atendimento. Na abordagem com adultos e idosos, pode-se utilizar esses materiais e procedimentos, porém devidamente ajustados à faixa etária e à escolaridade. Os atendimentos em grupo oportunizam o intercâmbio de experiências e vivências, o que auxilia a aproximação social, atuando para fortalecimento do ego e expressão dos sentimentos (BALEN et al., 2010). No caso dos grupos de quatro a 12 anos, é fundamental a intervenção de psicólogos, que recorrem tanto à entrevista quanto à aplicação da escala Vineland com a família, além da técnica de observação comportamental do paciente e de outras intervenções. Desse modo, são identificadas suas demandas e planejados os respectivos atendimentos. Ao final do processo, crianças e/ou adolescentes são reavaliados para definir 568
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... novas condutas pelos terapeutas, sempre com a participação das famílias. O importante é estimular a criança o mais cedo possível para melhoria de suas habilidades auditivas e contribuir com seu desenvolvimento afetivo e cognitivo, e, portanto, com qualidade de vida mais e mais promissora. Evidencia-se que as crianças em atendimento demonstram boa aceitação e adaptação ao AASI, com gradação na interação e nas habilidades sociais, apresentando maior disponibilidade para realizar atividades que necessitam de atenção e concentração, contribuindo para o desempenho escolar, conforme relato dos pais e avaliação / observação dos psicólogos. Durante a pandemia, os procedimentos foram adaptados com medidas de segurança para evitar riscos de contágio da Covid-19 e os profissionais tiveram que usar maior nível empatia e estratégias inovadoras para se comunicar com as pessoas com perda auditiva devido ao uso de máscaras, pois muitos usam a observação das expressões faciais com leitura labial para contribuir com a compreensão do que é comunicado durante a interação com outra pessoa. Considerações finais O descrito ao longo do capítulo pretende apresentar o trabalho realizado com as pessoas com perda auditiva mediante atenção humanizada e competência, pondo em relevo o trabalho em equipe multidisciplinar na esfera do CEIR e a relevância do psicólogo nessa equipe no cuidado com essas pessoas a fim de assegurar seu desenvolvimento e sua qualidade de vida. Inexiste qualquer pretensão de enaltecer o CEIR no Estado do Piauí e noutras Unidades Federativas vizinhas, mas, sim, o reconhecimento de sua atuação, no campo da psicologia na reabilitação / habilitação auditiva em sua esfera de atuação, haja vista que vem conquistando credibilidade por seus resultados promissores. Decerto, a ansiedade de pacientes e familiares ou cuidadores está presente durante o Programa de Saúde Auditiva para quem necessita fazer uso do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI), durante triagem da equipe multidisciplinar, como antes descrito. Se há parcela significativa da população com deficiência auditiva que acredita nos benefícios do AASI tanto na saúde em geral, quanto nas áreas sociais, emocionais e cognitivas, há quem demonstre dificuldades em aceitar o uso do referido aparelho por desconhecimento ou por nutrirem crenças disfuncionais relacionadas a seu uso, as quais podem estar associadas à dificuldade em serem assertivos diante de pessoas desinformadas a respeito da importância do AASI. Em qualquer circunstância, porém, a psicologia tem contribuído de maneira significativa no sentido de proporcionar um espaço de escuta, reflexão e orientação aos 569
Reabilitação: teoria e prática pacientes com perda auditiva e a seus familiares, no intuito de compreender cada sujeito em sua singularidade. Eis o momento de o profissional psicólogo entrar em ação desde a seleção dos pacientes até o acompanhamento contínuo dos pacientes, conduzindo-os a uma percepção não somente mais adequada e positiva, mas devidamente esclarecedora. De fato, em se tratando, mormente, dos grupos infantis, mediante avaliação dos psicólogos via observação do comportamento aliada a relatos mais completos dos pais, infere-se que a maioria das crianças em atendimento demonstra boa aceitação e adaptação do AASI, com uma série de fatores positivos. Ênfase, por exemplo, para melhor interação familiar e social, desenvolvimento de habilidades sociais e disponibilidade para execução de ações que exigem atenção e concentração, o que repercute de forma positiva na vida escolar. Referências bibliográficas BALEN, Sheila Andreoli et al. Saúde auditiva: da teoria à prática. São Paulo: Santos, 2010. BICAS, Rafaela da Silva; GUIJO, Laura Mochiatti; DELGADO-PINHEIRO, Eliane Maria Carrit. Habilidades auditivas e de comunicação oral de crianças e adolescentes deficientes auditivos e o processo de reabilitação fonoaudiológica. Revista CEFAC, v. 19, p. 465-474, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rcefac/v19n4/ pt_1982-0216- rcefac-19-04-00465.pdf. Acesso em: 6 fev. 2020. COMISSÕES DE AUDIOLOGIA DO SISTEMA DE CONSELHOS DE FONOAUDIOLOGIA. SOCIEDADE BRASILEIRA DE FONOAUDIOLOGIA. ACADEMIA BRASILEIRA DE AUDIOLOGIA (ABA). Guia de orientação na avaliação audiológica. 2020. Disponível em: https://www.fonoaudiologia. org. br/comunicacao/guia-de-orientacao-na-avaliacao-audiologica/#. Acesso em: 2 jan. 2022. CUNHA, Jurema Alcides (Col.). Psicodiagnóstico 5. São Paulo: Artmed, 2007. FONSÊCA, Rodrigo Oliveira da; DUTRA, Monique Ramos Paschoal; FERREIRA, Maria Ângela Fernandes. Satisfação de usuários com aparelhos de amplificação sonora individual concedidos pelo Sistema Único de Saúde: revisão integrativa. Audiology-Communication Research, São Carlos – SP, v. 25, e2296, p. 1-9, 2020. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/acr/ v25/2317-6431-acr-25-e2296.pdf. Acesso em: 30 abr. 2021. LLOYD, L. L.; KAPLAN, H. Audiometric interpretation: a manual of basic audiometry. Baltimore: University Park, 1978. MADALENO, Iracema Maceira Pires et al. Psicologia na reabilitação infantil 570
A psicologia na reabilitação/habilitaçãoauditiva no centro integrado de ... e adultos. In: FERNANDES, Antonio et al. AACD medicina e reabilitação: princípios e prática. São Paulo: Artes Médicas. 2007. p. 833-852. MIGUEL, Juliana Habiro de Souza; NOVAES, Beatriz Cavalcanti de Albuquerque Caiuby. Reabilitação auditiva na criança: adesão ao tratamento e ao uso do aparelho de amplificação sonora individual. Audiology Communication Research, São Carlos – SP, v. 18, n. 3, p. 171-178, 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/acr/v18n3/a06v18n3.pdf. Acesso em: 30 abr. 2021. OLIVEIRA, Maria do Carmo Conti Vaz. O impacto da deficiência auditiva sobre a família. Orientadora: Valícia Ferreira Gomes. 2011. 49 f. Monografia (Especialização em Desenvolvimento Humano, Educação e Inclusão Escolar) – Departamento de Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano, Universidade de Brasília, Brasília, 2011. Disponível em: https://bdm.unb. br/bitstream/10483/2341/1/2011_MariadoCarmoContiVazdeOliveira.pdf. Acesso em: 30 abr.2021. PICININI, Taís de Azevedo et al. Restrição de participação social e satisfação com o uso de aparelho de amplificação sonora individual: um estudo pós adaptação. Audiology Communication Research, São Carlos – SP, v. 22, e1830, p. 1-8, 2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/acr/ v22/2317-6431-acr-2317-6431-2016-1830.pdf. Acesso em: 6 fev. 2020. RAMOS, Alice; CASALIS, Maria. Aspecto multidisciplinar do atendimento e sequência do atendimento. In: FERNANDES, Antonio et al. AACD medicina e reabilitação: princípios e prática. São Paulo: Artes Médicas. 2007. p. 4-12. SALES, Cristiane Bueno; RESENDE, Luciana Macedo de; AMARAL, Carlos Faria Santos. Reabilitação auditiva em adultos: resultados de um programa de treinamento. Revista CEFAC, São Paulo, v. 21, n. 5, e10318, p. 1-12, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rcefac/ v21n5/pt_1982- 0216-rcefac-21-05-e10318.pdf. Acesso em: 30 abr. 2021. SCHLINDWEIN-ZANINI, R. Programa de reabilitação neuropsicológica do Núcleo de Neuropsicologia do Hospital Universitário / Universidade Federal de Santa Catarina: aspectos teóricos. In: CONGRESSO SUL BRASILEIRO DE COGNIÇÃO, 2015, Florianópolis – SC. Anais... Florianópolis: UFSC, 2015. SOBREIRA, Ana Carolina. Desenvolvimento de fala e linguagem na deficiência auditiva: relato de dois casos. Revista CEFAC, São Paulo, v.17 n.1, jan. /fev. 2015. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext & pid=S1516-18462015000100308. Acesso em: 17 mar. 2021. 571
42 Serviço social e saúde auditiva: relato de experiência em um centro de reabilitação Ana Kelly Pereira da Silva Karina Raquel de Sampaio Lemos Islany Ribeiro de Vasconcelos Pitanga Izabel Herika Gomes Matias Cronemberger Nayanna Alves Bezerra Leal de Alencar Este capítulo põe em cena o processo de trabalho dos profissionais assistentes sociais no Setor de Saúde Auditiva, desenvolvido em um Centro Especializado em Reabilitação (CER) tipo III, que garante protetização e o cuidado integral dos usuários, a partir do trabalho desenvolvido por uma equipe multiprofissional, envolvidos na melhoria da qualidade de vida das pessoas com perdas auditivas. Com o início do processo de implantação da Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva (PNASA) em 2004, o cuidado auditivo ganhou novos olhares, com ações direcionadas para a prevenção, diagnóstico, intervenção e tratamento da deficiência auditiva, alargando as possibilidades de acesso ao cuidado humanizado, para além de adaptações de Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (AASI), como antes limitava a primeira portaria SAS/Ministério da Saúde n°432 de 2000. Mesmo com o início do processo de ampliação dos serviços auditivos e fortalecimento das práticas de fomento ao cuidado integral, ainda é visível a necessidade de melhor distribuição dos serviços no território brasileiro, com ênfase no acompanhamento individual e reabilitação auditiva, a partir da prática interventiva de equipe multiprofissional, capaz de impactar positivamente a vida das pessoas que necessitam de cuidados auditivos.
Reabilitação: teoria e prática O centro de reabilitação deve buscar através do atendimento interdisciplinar, o cuidado integral e a emancipação dos usuários assistidos. O presente capítulo configura-se como relato de experiência e objetiva estimular o debate sobre o processo de trabalho do(a) assistente social em equipe multiprofissional com ação interdisciplinar. A metodologia de pesquisa é a observação participante, estabelecendo contato direto com o fenômeno observado, além também da pesquisa documental e bibliográfica, por meio da leitura e análise de documentos institucionais, portarias, instrutivos, leis e literatura contextualizada. Os caminhos e construção de possibilidades da Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva no Brasil A saúde auditiva contribui com o desenvolvimento do indivíduo desde o nascimento e é essencial para aquisição da linguagem até a velhice, diminuindo os impactos negativos na vida de muitas pessoas que venham a sofrer com deficiências ou perdas auditivas. Segundo estudo publicado pela Organização Mundial de Saúde no primeiro Relatório Mundial sobre Audição (OMS, 2021), existem no mundo cerca de 1,5 bilhões de pessoas com algum grau de perda auditiva, desses cerca de 430 milhões precisam de serviços de reabilitação. Estima-se que haverá quase 2,5 bilhões de pessoas com algum grau de perda auditiva e pelo menos 700 milhões precisarão de reabilitação no ano de 2050, considera-se então, primordial impulsionar a integração dos cuidados auditivos nas políticas de saúde no Mundo. No Brasil, dados publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no levantamento do censo demográfico de 2010 identificou 9,8 milhões de pessoas com deficiência auditiva, representando 5,1% da população. Dentre esses, 1,3% estaria na faixa etária de zero a 14 anos, 4,2% na de 15 a 65 anos e 25,6% na faixa de 65 anos ou mais. Considerando os dados nacionais demonstrados no último censo, identifica-se uma população, em sua maioria de idosos, necessitam de cuidados auditivos, o que requer mais recursos e cuidado integral utilizando-se de técnicas e métodos terapêuticos específicos na promoção, prevenção, diagnóstico e tratamento. As políticas públicas direcionadas para as demandas auditivas da população brasileira foram aprimoradas e em 2004 o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva (PNASA) através da portaria GM/MS n.º 2.073 de 28/09/2004 (BRASIL, 2004) propondo a organização de uma rede com base nos princípios e diretrizes do SUS, 574
Serviço social e saúde auditiva: relato de experiência em um centro de ... constituída pelos componentes fundamentais: atenção básica, a média e alta complexidade. É notório que após a implantação da PNASA houve o fortalecimento das ações de acesso aos serviços de saúde auditiva no país, impulsionando os cuidados auditivos na cultura brasileira, dando visibilidade para as demandas das pessoas com deficiência auditiva. Como apresentado em estudo avaliativo sobre a PNASA no Brasil, a partir da cobertura de serviços e procedimentos diagnósticos, entre 2002 e 2005 houve no Brasil crescimento de 200% na oferta de serviços de diagnóstico, dispensação e acompanhamento dos indivíduos que fazem uso de próteses auditivas pelo SUS, o que representa um olhar integral aos usuários, que passam não somente a receber um Aparelho de Amplificação Sonoro - AASI, mas um acompanhamento multidisciplinar especializado. Isto registra um incremento no número de serviços da rede de saúde auditiva especializada, com aumento dos procedimentos relacionados à adaptação de prótese auditiva, no período de 2004 a 2011 (SILVA, 2014). Contudo, muito embora os estudos sobre a implantação da PNASA no Brasil apresentem expressivos avanços a partir de 2004, ainda se observam números desiguais de acesso e eficácia dos serviços, como aponta Andrade (2013, p. 409): Apesar da implantação da PNASA em 2004, moldar o cenário da Saúde Auditiva no Brasil e atribuir ao por- tador da deficiência auditiva uma assistência mais hu- manizada, beirando a integralidade e universalidade à saúde, a execução desse programa, quase dez anos de- pois, ocorre de forma desigual e ineficaz. É perceptível que a maioria das regiões administra suas unidades em desacordo com alguns parâmetros estabelecidos pelas Portarias que normatizam, organizam e operacionali- zam a PNASA. Essa insuficiência e desigualdade na distribuição da oferta de procedimentos de atenção à saúde auditiva no Brasil, traz consequências para o alcance de melhores níveis de qualidade de vida, principalmente para os considerados deficientes auditivos, que têm no acesso às políticas um meio de garantir outras conquistas pessoais e sociais. A falta de informação e as atitudes estigmatizantes na sociedade, referentes aos problemas auditivos, também são barreiras que limitam a ampliação satisfatória dos níveis de cuidados. O Relatório Mundial sobre a Audição (OMS, 2021) prevê um mundo em que nenhuma experiência individual de perda auditiva 575
Reabilitação: teoria e prática devido a causas evitáveis possam atingir seu pleno potencial através das ações de reabilitação, educação e formas de empoderamento. É notório que o desenvolvimento de políticas públicas e o planejamento podem garantir os mais elevados níveis de qualidade de vida dessas pessoas. Os serviços de saúde auditiva habilitados pelo Ministério da Saúde devem seguir as diretrizes de orientação às equipes multiprofissionais (Portaria MS nº 2.776, 2014), oferecendo um processo de reabilitação que garanta não só a seleção e a adaptação do AASI, mas também o acompanhamento periódico para o monitoramento audiológico e a terapia fonoaudiológica. Como relata Teixeira (2007, p. 17) A falta de acompanhamento dos deficientes auditivos traz grandes consequências para os mesmos e para a sociedade. O uso não efetivo da prótese, assim como a ausência do atendimento terapêutico para auxiliar no desenvolvimento da linguagem e/ou estratégias de escuta, compromete a integração social, incluindo a educação e o trabalho. Além disto, não se admite que as políticas públicas perpetuem o modelo do diagnós- tico sem o respectivo tratamento de reabilitação, pois fere os princípios éticos e os definidos na Constituição Federal de 1988. Destaca-se que as ações de incentivo à qualidade da assistência na saúde auditiva, trouxeram avanços significativos, mas é preciso uma soma de esforços das instituições, profissionais de saúde e sociedade civil organizada, em busca de um acesso igualitário, com maiores níveis de interação entre os serviços, com prioridade para as ações de incremento ao cuidado integral, para inclusão social e participação do indivíduo em todos os espaços da sociedade. O processo de trabalho do(a) assistente social na Saúde Auditiva O trabalho da(o) assistente social na saúde é desenvolvido em conformidade com a Lei de Regulamentação da Profissão nº 8662 de 1993, com o Código de Ética Profissional, seguido pelos “Parâmetros para a Atuação de Assistentes Social na Saúde” (CFESS, 2009), profissional de saúde reconhecido pelo Conselho Nacional de Saúde através da Resolução nº 218, de 06 de março de 1997, historicamente envolvido nas lutas de fortalecimento e defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse processo de trabalho, reconhece-se os/as assistentes sociais como importantes 576
Serviço social e saúde auditiva: relato de experiência em um centro de ... agentes de interação entre as diversas políticas públicas, na promoção da integralidade e intersetorialidade das ações, na produção de conhecimento, no planejamento da política de saúde, numa construção de sua intervenção profissional fundamentada na legislação social brasileira. É evidente o compromisso deste profissional para a plena efetivação do conceito ampliado de saúde, porém como bem aponta Iamamoto (2009), as (os) assistentes sociais não detêm todos os meios para efetivar seu trabalho [...] dependem de recursos previstos nos programas e projetos da instituição que o requisita e o contrata, tendo ênfase o foco na interdisciplinaridade. O Serviço Social constitui-se uma profissão essencialmente interdisciplinar, já que não conta com uma teoria própria e sim dialoga com diversas teorias, na busca de compreender e responder às questões oriundas da questão social. Contudo, o (a) Assistente Social também possui seus limites e não pode ser capaz de responder à complexidade que se evidencia na sociedade. Bravo e Matos (2008, p.17) relatam que a atuação do/a assistente social “[...] na área da saúde passa pela compreensão dos aspectos sociais, econômicos, culturais que interferem no processo saúde doença e a busca de estratégias para o enfrentamento destas questões “o que torna a prática profissional em contexto de crise ainda mais desafiadora. O Serviço Social contribui para a produção e reprodução desta sociedade, ele participa deste processo enquan- to trabalhador coletivo que, por meio de seu trabalho, garante a sobrevivência e a reprodução da força de tra- balho. É desta forma, uma profissão socialmente neces- sária “[...] por que ela atua sobre questões que dizem respeito à sobrevivência social e material dos setores majoritários da população” (IAMAMOTO, 2009, p. 67). Nas instituições, as (os) Assistentes Sociais atuam diretamente com equipes multidisciplinares, onde o trabalho é realizado com enfoque interdisciplinar, o que favorece uma troca de saberes e os objetivos de cada setor se fundem numa prática coletiva. É a integração desses conhecimentos que resulta no suporte eficaz aos usuários (pessoas com perdas auditivas) e sua família no processo de reabilitação e inclusão social, podendo exercer uma importante estratégia de intervenção diante da complexidade do contexto social vivenciado na sociedade capitalista. O cenário de atuação descrito neste trabalho, é um centro especializado em reabilitação, que atua integrado e com base nas normativas 577
Reabilitação: teoria e prática do SUS, especializado no tratamento multidisciplinar e multiprofissional de pessoas com deficiência física/motora, auditiva e intelectual. O Setor de Serviço Social tem como objetivo contribuir com promoção e inclusão da Pessoa com Deficiência (PCD) e de sua família na sociedade. Os profissionais assistentes sociais colaboram com o acesso e a expansão aos direitos sociais, possuindo uma postura de trabalho em prol do tratamento digno na área da reabilitação de pessoas com deficiência, participando do atendimento no horário integral do centro. O Programa de Saúde Auditiva - PSA desenvolve ações integradas de avaliação diagnóstica, tratamento clínico, seleção, adaptação e fornecimento de Aparelhos de Amplificação Sonora Individual - AASI, assim como acompanhamento fonoaudiológico, social e psicológico, para tanto conta com uma equipe multidisciplinar: fonoaudiólogas especialistas em audiologia, otorrinolaringologistas, psicólogas e assistentes sociais. A quantidade de atendimento e a equipe vem aumentado significativamente em números nos últimos anos. O funcionamento dos centros de reabilitação/habilitação auditiva representam avanços e ampliação para a saúde auditiva de uma população crescente no mundo todo, tendo como foco, um cuidado voltado para a pessoa e acessível para todos. Nesta perspectiva, o setor de serviço social, na atuação em prol da saúde auditiva, apresenta como objetivo superior o fortalecimento do processo de inclusão da pessoa com deficiência auditiva ou mesmo com perdas auditivas, por meio de orientações qualificadas sobre o serviço de reabilitação auditiva desenvolvido na instituição e os serviços da atenção básica, para contribuir com o apoio, orientações à população usuária na perspectiva da garantia dos direitos e inclusão da pessoa com deficiência rumo ao processo de emancipação social. A intervenção da(o) assistente social é voltada para o desenvolvimento e expansão de potenciais existentes em cada usuário(a), objetivando seu desenvolvimento global, através do acesso a bens e serviços públicos. Apresenta como objetivos, a avaliação das condições socioeconômicas do usuário quanto à adequação da prótese auditiva ao seu estilo de vida; orientação sobre os direitos enquanto deficientes auditivos; deliberação junto com demais membros da equipe, sobre a indicação de protetização auditiva, analisando individualmente os casos elegíveis para o serviço. A atuação do Serviço Social, junto à equipe multiprofissional, segue protocolos institucionais que, em linhas gerais, apresenta o seguinte fluxo: após consulta com médico especialista (otorrinolaringologista), que avalia a potencial protetização, realiza-se entrevista social, para compreender os 578
Serviço social e saúde auditiva: relato de experiência em um centro de ... interesses, necessidades do usuário(a) e da família; é realizada a avaliação socioeconômica, utilizando-se instrumental específico, com entrevista semiestruturada, gerando dados sociais para construção do perfil socioeconômico dos(as) usuários(as) atendidos e subsídios para orientação de benefícios e outros encaminhamentos, momento oportuno de cuidado em saúde auditiva e apreensão da realidade das famílias. Os profissionais assistentes sociais realizam orientações sobre questões inerentes ao PSA e os direitos da pessoa com deficiência, como acesso a serviços, benefícios e projetos sociais com informações qualificadas sobre formas de acesso. Ressalta-se que os casos que não são elegíveis para proposta do programa ou que necessitam de atendimentos complementares, são encaminhados para outros serviços na rede de atenção à pessoa com deficiência auditiva. Na oportunidade da entrevista social, o usuário é orientado sobre o protocolo informativo do programa, autorizações de uso de imagem e voz, solicitação de laudos para acesso aos benefícios, além da escuta qualificada que é essencial no processo de acolhimento desse usuário ao programa, com registro obrigatório de todas as condutas realizadas em prontuário eletrônico do paciente. Destaca-se o desenvolvimento de estratégias de diálogo entre a equipe multidisciplinar, com a realização de reuniões para estudos de caso, quando identificado por algum profissional, momento em que todos os membros da equipe realizam estudo partilhado de análise interdisciplinar, para o direcionamento de encaminhamentos e assistência qualificada ao usuário(a). Vale destacar que cada atendimento social gera outros demandas e atendimentos, que por sua vez, gera encaminhamentos, desde o processo educativo até a eliminação de barreiras que impedem as pessoas com perdas auditivas de viver plenamente. As principais demandas apresentadas, são orientações para acesso aos benefícios como Benefício de Prestação Continuada (BPC), acesso a passes livres, articulação institucional e inclusão escolar, gerando demandas via encaminhamentos para os demais profissionais da equipe, como a emissão de laudo médico, exames audiológicos e relatórios multiprofissionais. O acesso ao setor de Serviço Social é previamente agendado, como os outros atendimentos exigidos no Programa: consulta médica - otorrinolaringologista, realização de exame audiológicos, avaliação de moldes para AASI, atendimento psicológico e atendimento social, sendo estes preferencialmente agendados para um único e mesmo dia, considerando que o público atendido é, em sua grande maioria 579
Reabilitação: teoria e prática proveniente de outros municípios, além de favorecer os estudos de caso quando necessário, oportunizando a troca de informações entre a equipe e encaminhamentos assertivos. A partir da intervenção multiprofissional e análise das necessidades dos usuários, presta-se o cuidado integral com foco na pessoa, as ações são realizadas para além de entrega de AASI, mas principalmente a plena realização dos interesses dos assistidos, de forma participativa, respeitando as individualidades do cuidado partilhado. É importante desta forma a qualificação da equipe e a boa comunicação interna, o que acontece semanalmente por meio de reuniões e socialização de informações. Considerações finais A PNASA tem papel crucial no processo de ampliação das ações de promoção e prevenção na rede de atendimento à saúde auditiva no Brasil, um salto qualitativo no cuidado integral, principalmente nas ações de intervenção precoce em crianças com a ampliação da oferta de avaliações em bebês, o que certamente gera impactos financeiros e de saúde na vida das pessoas. Há desigualdade na oferta dos serviços, o que prejudica o acesso da população mais afastada dos grandes centros urbanos e em situação de vulnerabilidade social. Como aponta o Relatório Mundial sobre Audição (OMS, 2021), o cuidado deve estar acessível para todos, o desenvolvimento de políticas de acesso e o planejamento podem gerar maiores impactos no cenário da saúde auditiva mundial. O setor de serviço social no atendimento às demandas da saúde auditiva promove impactos positivos na vida das famílias atendidas, que em sua maioria, chega ao setor em situação de vulnerabilidade e até de exclusão social, baixa autoestima, estigmatizadas e desacreditadas nas ações das políticas públicas. Após a protetização, usuários(as) e famílias experienciam novas formas de ver, sentir e viver no mundo. Isso certamente construído através do cuidado em saúde auditiva, que não está consubstanciado somente na protetização, mas em todo um conjunto de orientação quanto ao acesso aos direitos, escuta e cuidados qualificados e individualizados. É fato que ainda há necessidade de superação dos resquícios de modelos de atendimento centrado no problema auditivo, mas para isso é preciso aperfeiçoamento e novos estudos, avaliações da PNASA, para o aprimoramento das intervenções multiprofissionais no cuidado integral e o alcance de melhores níveis de saúde auditiva bem como inclusão de mais usuários e familiares. 580
Serviço social e saúde auditiva: relato de experiência em um centro de ... Referências bibliográficas ANDRADE, Caio Leônidas, et al. Programa Nacional de Atenção à Saúde Auditiva: avanços e entraves da saúde auditiva no Brasil. Rev. Ciênc. Méd. Biol., Salvador, v. 12, especial, p. 404-410, dez. 2013. Disponível em: https:// periodicos.ufba.br. Acesso em: 14 marco 2021. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº. 2.073, de 28 de setembro de 2004. Institui a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva. Disponível em: http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2004/GM/GM2073. htm. Acesso em: 18 abr. 2021. BRAVO, M. I. S.; MATOS, M. C. Projeto ético-político do serviço social e sua relação com a reforma sanitária: elementos para o debate. In: MOTA, Ana Elisabete; BRAVO, Maria Inês Souza; UCHÔA, Roberta. (Orgs.). Serviço social e saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2008. p. 197-217. BRAVO, Maria Inês de Souza. Serviço social e reforma sanitária: lutas sociais e práticas profissionais. São Paulo: Cortez, 1996. IAMAMOTO, M. V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 16. ed. São Paulo: Editora Cortez, 2009. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010: características gerais da população, religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. ONU. Organização Mundial de Saúde. Relatório mundial sobre audição 2021. Disponível em: https://news.un.org/pt/tags/relatorio-mundialsobre- audicao-2021. Acesso em: 12 abr. 2021. SILVA, Luciana S. G. et al. Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva: um estudo avaliativo a partir da cobertura de serviços e procedimentos diagnósticos. CoDAS, v. 26, n. 3, São Paulo maio/jun. 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo. Acesso em: 15 abr. 2021. TEIXEIRA, C. F. Estudo avaliativo da política de atenção à saúde auditiva: estudo de caso em Pernambuco. 2007. 159 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) - Fundação Oswaldo Cruz, Centro de Pesquisas Ageu Magalhães, Recife, 2007. 581
43 Classificação internacional de funcionalidade (CIF) Nidiany da Silva Medeiros O objetivo do presente capítulo é discutir sobre a Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) no processo de reabilitação. Inicialmente, será realizada uma contextualização sobre o histórico da CIF, uso clínico e seus componentes e, em seguida, sua classificação e aplicabilidade. No final do século XX, alguns modelos de classificação de incapacidades foram propostos a fim de nortear as discussões e as pesquisas sobre funcionalidade e incapacidade. A primeira classificação foi criada, em 1976, pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Esta não ganhou versão brasileira, mas foi traduzida em Portugal, ficando conhecida no Brasil como Classificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (CIDID), que propunha uma sequência em que as alterações funcionais e as incapacidades ocorriam devido a uma determinada doença, ou seja, um modelo de causalidade linear. Após 25 anos de estudos e testes, na 54º Assembleia Mundial de Saúde, a OMS aprovou uma nova versão da classificação, chamada de Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), no ano de 2001. O modelo foi alterado para um multidirecional, ou seja, não dependem apenas da doença, mas também do meio ambiente físico e social, das diferentes percepções culturais e atitudes em relação à deficiência, da disponibilidade de serviços e da legislação (ARAÚJO, 2010). No dia 6 de novembro de 2009 foi criado a Resolução Nº 370 que dispõe sobre a adoção CIF por Fisioterapeutas e Terapeutas
Reabilitação: teoria e prática Ocupacionais, segundo recomenda a OMS, no âmbito de suas respectivas competências institucionais. No contexto atual, antes que se faça uso clínico, é preciso entender o modelo multidirecional proposto pela classificação como modelo de funcionalidade. Em geral, os profissionais de saúde tem a formação centralizada na doença, sendo este o ponto de partida para suas intervenções. No entanto, o modelo da CIF mostra que a presença de doença pode ser consequência de alterações da funcionalidade e é este enfoque que deve ser observado pelos profissionais que utilizarão a classificação. A CIF não classifica pessoas, mas descreve a condição de cada pessoa contextualizada em uma escala de domínios de saúde. Além disso, a descrição é sempre feita dentro do quadro que compõe os fatores ambientais e pessoais. A qualquer pessoa pode ser atribuída uma quantidade de códigos alterados em cada nível. Estes podem ser independentes ou inter-relacionados. Os profissionais selecionarão os códigos mais relevantes para o propósito de descrever a experiência de saúde, de acordo com as circunstâncias em que realizou a abordagem (CORDEIRO; BIZ, 2017). O modelo da CIF é composto por sete itens: função, estrutura do corpo, atividade, participação social, condição de saúde (transtorno ou doença), fatores ambientais e fatores pessoais. Esses itens se interrelacionam, não havendo um ponto de partida pré-determinado. Todos os itens são classificados, exceto o de condição de saúde para o qual se usa a Classificação Internacional de Doenças (CID-10) e os fatores pessoais, para os quais ainda não há classificação pela sua subjetividade e se consideram informações como gênero, idade, etnia, religião, cultura, antecedentes pessoais. A divisão da CIF ocorre em duas partes: parte 1 (Funcionalidade e Incapacidade) que compreende os componentes da função do corpo, estrutura do corpo, atividades e participação; e a parte 2 (Fatores contextuais) com os componentes fatores ambientais e fatores pessoais. A CIF apresenta uma lista de capítulos dentro de cada componente, uma lista de códigos dentro de cada capítulo e listas de códigos detalhados dentro de cada código genérico. Em qualquer momento, esse código deve ganhar o acompanhamento de um qualificador para que se dê significado ao código (ARAÚJO, 2011). O componente de função do corpo relaciona-se as funções fisiológicas dos sistemas do corpo e são representados pela letra “b”. A estrutura do corpo são as partes anatômicas como órgãos, membros e seus componentes e começam com a letra “s”. Todo código de atividades e participação começam com a letra “d”. A atividade é caracterizada pela 586
Classificação internacional de funcionalidade (cif) execução de uma tarefa ou ação por um indivíduo. Em geral, o indivíduo faz sozinho. Já a participação é o envolvimento em situações de vida diária. Em geral, o indivíduo faz com outras pessoas. A letra é seguida pelo número do capítulo contido no componente, por exemplo, o capítulo 6 de funções do corpo é relacionado às funções geniturinárias e reprodutivas, assim, o código inicial “b6”. Dentro de cada capítulo, temos o detalhamento dos conteúdos. Dessa forma, os códigos vão ficando maiores. Por exemplo: b6 (funções geniturinárias e reprodutivas); b620 (funções urinárias); b6202 (continência urinária). No entanto, cada domínio traz apenas uma descrição do item, seja ela uma função, estrutura, atividade, participação ou fator ambiental. Para que o código ganhe um significado, ele tem que ser complementado pelo qualificador. Isso quer dizer que o trabalho de quem classifica não consiste em escolher códigos e sim em escolher um qualificador para cada um dos códigos (ARAÚJO, 2011). O qualificador é o número que identifica se há problema e qual a magnitude do mesmo de acordo com o seu componente. No componente função do corpo o qualificador indica o grau de alteração funcional, deficiência e disfunção. Pode ser classificado em 0 (nenhuma deficiência); 1 (deficiência leve); 2 (deficiência moderada); 3 (deficiência grave); 4 (deficiência completa); 8 (não especificado); 9 (não aplicável). Nesse sentido, seguindo o código supracitado, a classificação de uma incontinência urinária moderada seria “b6202.2” (ARAÚJO, 2011). Vale ressaltar que para classificação do qualificador deve-se, preferencialmente, utilizar escalas ou questionários validados específicos para os objetivos da codificação. Por exemplo, utilizar o Pad test que é um método diagnóstico usado para detectar e quantificar a perda urinária de forma objetiva em perda leve (entre 1,1 e 9,9g), moderada (10 a 49,9g) ou grave (>50g), além de avaliar o sucesso terapêutico. Para sua realização, a paciente utiliza absorvente previamente pesado por um período de uma hora (teste de curta duração) ou 24 horas (teste de longa duração). Diferenças maiores que 1g entre peso inicial e o final indicam perda urinária significativa (PALMA et al, 2014). No que concerne à estrutura do corpo podem ser utilizados três qualificadores: o primeiro, refere-se à extensão da lesão e classifica-se em 0 (nenhuma deficiência); 1 (deficiência leve); 2 (deficiência moderada); 3 (deficiência grave); 4 (deficiência completa); 8 (não especificado); 9 (não aplicável). O segundo qualificador indica a natureza da alteração estrutural e compreende 0 (nenhuma mudança estrutural); 1 (ausência total); 2 (ausência parcial); 3 (parte adicional); 4 (dimensões aberrantes); 5 (descontinuidade); 6 (posição desviada); 7 (mudanças qualitativas na estrutura, incluindo 587
Reabilitação: teoria e prática acúmulo de líquido); 8 (não especificada); 9 (não aplicável). O terceiro qualificador é opcional e trata-se de um complemento topográfico podendo ser 0 (mais de uma região); 1 (direita); 2 (esquerda); 3 (ambos os lados); 4 (parte anterior); 5 (parte posterior); 6 (proximal); 7 (distal); 8 (não especificado); 9 (não aplicável) (ARAÚJO, 2011). Exemplificando, o capítulo 7 de estruturas “s7” refere-se às estruturas com o movimento. “s740” é a estrutura da região pélvica e “s7402” é são os músculos da região pélvica. A classificação de um paciente com deficiência moderada dos músculos da região pélvica seria “s7402.299”. Existem algumas escalas de avaliação digital que classificam o grau de força muscular, tais como: Ortiz e a Oxford. A escala de Ortiz gradua de 0 a 4. A escala de Oxford modificada é uma escala ordinal de 0 a 5 pontos, que gradua dois aspectos da contração muscular: compressão e elevação do AP (PALMA et al, 2014). Na atividade e participação são dois qualificadores: o de desempenho (o que o indivíduo faz em seu ambiente habitual, experiência vivida) e o de capacidade (habilidade de um indivíduo de executar uma tarefa ou ação). Pode ser o seguinte: 0 (nenhuma dificuldade); 1 (dificuldade leve); 2 (dificuldade moderada); 3 (dificuldade grave); 4 (dificuldade completa); 8 (não especificada); 9 (não aplicável). Um exemplo poderia ser no capítulo 4 “d4” que refere-se à mobilidade. O código “d455” é deslocar-se. “d4553” significa pular. O paciente que não desempenha e nem é capaz de realizar a atividade de pular devido,por exemplo, perder urina pode ser classificado em “d4553.44”. Os fatores ambientais possuem um qualificador e constituem o ambiente físico, social e de atitudes em que as pessoas vivem e conduzem sua vida. Compreendem os seguintes qualificadores: 0 nenhuma barreira ou 0 nenhum facilitador; 1 barreira leve ou +1 facilitador leve; 2 barreira moderado ou +2 facilitador moderado; 3 barreira grave ou +3 facilitador considerável; 4 barreira completa ou +4 facilitador completo. Exemplificando, o capítulo 1, “e1” refere-se aos produtos e tecnologias. “e115” produtos e tecnologia para uso pessoal na vida diária. “e1150” produtos e tecnologias gerais para uso pessoal na vida diária. Para os componentes atividade, participação e fatores ambientais podem ser utilizados os dados da anamnese e a utilização de questionários de qualidade de vida validados (ARAÚJO, 2011). Um paciente com diagnóstico clínico de traumatismo cranioencefálico (TCE) após exame físico e codificação pela CIF poderá apresentar uma descrição detalhada do seu estado da seguinte forma: Paciente com bom estado geral, colaborativo e sem alterações cognitivas e comportamentais; Controle cervical e de tronco; ao avaliar o membro 588
Classificação internacional de funcionalidade (cif) inferior esquerdo foi observado deficiência grave de força muscular (b7302.3), deficiência leve de tônus muscular (b7352.1) e funções dos reflexos motores com deficiência leve (b750.1). Apresenta dificuldade leve para andar com órtese (d4508), controle anal voluntário e independente (b5253.0); controle vesical voluntário com dificuldade leve (b6202.1), por independência modificada (utiliza coletor urinário, especialmente, à noite para urinar). Além disso, tem dificuldade leve para transferências de deitado para sentado (necessita de supervisão e preparação de terceiros- d420.1). Para caminhar e subir/ descer escadas (independência modificada, necessitando de goteira suropodálica articulada à esquerda e segurar no corrimão da escada- d4551.1). É independente para mobilidade/ transferência para o vaso sanitário e chuveiro (d4200.0 e d4208.0). Estudo realizado para caracterização do desenvolvimento neuropsicomotor de crianças até três anos acompanhadas nos Núcleos de atenção à saúde da família (NASF) destaca a necessidade da utilização de instrumentos adequados para planejar ações na atenção básica, para que crianças que apresentem risco de atrasos do seu desenvolvimento possam ser incluídas em programas de intervenções precoces, para viabilizar o NASF enquanto espaço de acompanhamento e promoção da saúde. A CIF foi considerada um instrumento de classificação adequado e válido para este contexto (ARAUJO et al, 2018). Já outra pesquisa que verificou o uso da CIF no Sistema Único de Saúde (SUS) construiu uma planilha de fácil uso e capaz de identificar os indicadores sobre funcionalidade humana. Com dados gerados pelo uso da CIF foi possível observar como esse instrumento permite ser adaptado aos prontuários físicos ou eletrônicos utilizados nos serviços dos SUS, gerando informações sobre a funcionalidade dos seus pacientes (ARAUJO, 2014). Considerações finais Diante do exposto, o domínio desses pressupostos teóricos e de como realizar a codificação é essencial, não apenas para garantir a segurança e a qualidade do atendimento no processo de reabilitação, mas também para que se possa esclarecer e transmitir, com confiança, as informações que o paciente almeja, para elucidar as dúvidas, os conceitos inadequados, realizar uma avaliação de qualidade e buscar a melhor abordagem no processo de reabilitação. 589
Reabilitação: teoria e prática Referências bibliográficas ARAÚJO, Eduardo Santana. CIF e o diagnóstico em fisioterapia. São Paulo: Fisiobrasil, 2010. ARAÚJO, Eduardo Santana. Manual de utilização da CIF em Saúde Funcional. São Paulo: Andreoli, 2011. ARAÚJO, Eduardo Santana. Uso da CIF no SUS: a experiência no município de Barueri/SP. Revista CIF Brasil, v. 1, n. 1, p. 10-17, 2014. ARAUJO, L.B et al. Caracterização do desenvolvimento neuropsicomotor de crianças até três anos: o modelo da CIF no contexto do NASF. Cad. Bras. Ter. Ocup., São Carlos, v. 26, n. 3, p. 538-557, 2018. CORDEIRO, E.S; BIZ, M.C. Implantando a CIF: o que acontece na prática? Rio de Janeiro: Editora Wak, 2017. PALMA, C.R.P. et al. Urofisioterapia: aplicações das técnicas fisioterapêuticas nas disfunções miccionais e do assoalho pélvico. 2. ed. Campinas: Paulo Palma, 2014. 590
44 Avaliação e prescrição de cadeira de rodas Richelliany Julião dos Santos Cardoso Bento Almeida Rocha Júnior Ao visualizar uma pessoa utilizando uma cadeira de rodas, automaticamente o pensamento é direcionado para a incapacidade e dependência. Entretanto, a cadeira de rodas pode proporcionar ao usuário liberdade de se mover em variados ambientes, muitas vezes sem precisar da ajuda de terceiros. O uso da cadeira rodas permite que seus usuários realizem atividades de vida diária, atividades instrumentais de vida diária e as demais ocupações do seu dia a dia. Uma cadeira de rodas adequada favorece a mobilidade, a autoestima, autoconfiança, independência e a saúde. O objetivo deste capítulo é abordar as noções básicas para uma correta avaliação e prescrição de cadeira de rodas. O mundo da cadeira de rodas Histórico Por meio de um registro artístico em um vaso encontrado na cultura grega, foi possível identificar o que os pesquisadores acreditam ser a primeira cadeira de rodas da história. Neste vaso foi pintado uma cama com rodas no século VI aC. (Figura 1) (KAMENETZ, 1969). E desde então a cadeira de rodas vem sendo modificada para se tornar cada vez mais funcional e moderna.
Reabilitação: teoria e prática Figura 1: Primeira representação, vaso grego Fonte: (KAMENETZ, 1969). Definições A cadeira de rodas é considerada um recurso de tecnologia assistiva, que tem como finalidade promover apoio ao esqueleto, manter a integridade física e proporcionar mobilidade, possibilitando a integração comunitária e interação social. Para este recurso de tecnologia assistiva ser considerado adequado é necessário que atenda os critérios citados no Quadro 1 (OMS, 2012). Quadro 1: Critérios para uma cadeira de rodas adequada 1 Responda às necessidades do usuário e considera as condições ambientais; 2 Seja apropriada e ofereça suporte postural; 3 Segura e durável; 4 Disponível no país; 5 Manutenção e conserto podem ser realizados no próprio local em que o usuário habita. Fonte: OMS, 2012. 592
Avaliação e prescrição de cadeira de rodas As partes de uma cadeira de rodas manual (Figura 2) são basicamente manopla, encosto, apoio para os braços, almofadas, assento, faixa de panturrilha, apoio para os pés, roda dianteira, aro de impulsão, suporte de apoio para os pés, trilho do assento e a roda traseira. Figura 2: Partes da cadeira de rodas manual Fonte: (OMS, 2012). Os benefícios do uso de cadeira de rodas para as pessoas que tem sua capacidade de locomoção reduzida ou ausente são inúmeros, entre os principais estão a mobilidade, a saúde, independência, autoestima, autoconfiança e o acesso à vida comunitária. Políticas públicas A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (UNCRPD) entrou em vigor em 3 de maio de 2008. Neste documento são encontrados 50 artigos que abordam direitos humanos que se aplicam a todas as pessoas. Dentre estes artigos a mobilidade pessoal é tema presente (BRASIL, 2009). A mobilidade pessoal significa a capacidade de se mover como e quando a pessoa quiser. O artigo 20 diz: “os Estados devem adotar medidas efetivas para garantir a mobilidade pessoal com a maior independência possível para as pessoas com deficiência” (BRASIL, 2009). E a UNCRP explica sobre outros direitos que as pessoas com dificuldades de mobilidade possuem ao fazer uso de uma cadeira de rodas adequada, veja o Quadro 2. 593
Reabilitação: teoria e prática Quadro 2: Direitos humanos que as pessoas com mobilidade reduzida ou ausente podem desfrutar se tiverem uma cadeira de rodas adequada Artigo 19 Viver independentemente e ser incluído na comunidade; Artigo 24 Direito à educação Artigo 25 Direito a desfrutar o melhor padrão possível de saúde; Artigo 27 Direito a trabalho e emprego; Artigo 29 Direito de participar da vida política e pública; Artigo 30 Direito de participar da vida cultural, recreação, lazer e esporte. Fonte: BRASIL, 2009. As etapas para fornecimento de uma cadeira de rodas Ao pensar em fornecer uma cadeira de rodas para uma pessoa, é necessário que a equipe técnica que está prestando o serviço encontre a cadeira de rodas mais adequada para o seu usuário. As Diretrizes para Cadeira de Rodas da Organização Mundial da Saúde descrevem oito etapas que os profissionais devem seguir para fornecer uma cadeira de rodas (OMS, 2008).O objetivo deste capítulo é abordar as noções básicas para correta prescrição de cadeiras de rodas; a ênfase será no processo de avaliação e prescrição, apresentando de forma resumida as demais etapas para o fornecimento de uma cadeira de rodas (Quadro 3). Quadro 3: Etapas para fornecimento de uma cadeira de rodas Etapas Resumo 1.Encaminhamen- O modo de encaminhamento de to e agendamento usuários varia. Eles podem chegar ao serviço por conta própria ou ser encaminhados por profissionais ou voluntários que trabalham nas re- des de saúde e reabilitação gover- namentais ou não governamentais da região, distrito ou comunidade. Alguns serviços de cadeiras de rodas podem ter que identificar usuários potenciais ativamente se ainda não estiverem recebendo nenhum servi- ço social ou de saúde ou participan- do de atividades em escolas, traba- lho ou comunidade. 594
Avaliação e prescrição de cadeira de rodas Etapas Resumo 1.Encaminhamen- O modo de encaminhamento de to e agendamento usuários varia. Eles podem chegar ao serviço por conta própria ou ser en- caminhados por profissionais ou vo- luntários que trabalham nas redes de saúde e reabilitação governamentais ou não governamentais da região, distrito ou comunidade. Alguns ser- viços de cadeiras de rodas podem ter que identificar usuários potenciais ativamente se ainda não estiverem recebendo nenhum serviço social ou de saúde ou participando de ativida- des em escolas, trabalho ou comuni- dade. 2.Avaliação Cada usuário precisa de uma avalia- ção individual que leve em conta o estilo de vida, trabalho, ambiente e condição física. 3.Prescrição Usando as informações da avaliação, é feita uma prescrição de cadeira de rodas junto com o usuário, fami- liares ou cuidadores. A prescrição (seleção) detalha o tipo e tamanho da cadeira de rodas escolhida, carac- terísticas especiais e modificações. Também descreve o treinamento que o usuário precisa para usar e manter a cadeira de rodas adequa- damente 4.Financiamento Uma fonte de financiamento é iden- e aquisição tificada e a cadeira de rodas é re- quisitada do estoque mantido pelo serviço ou pelo fornecedor. 595
Reabilitação: teoria e prática 5.Preparação do O pessoal capacitado prepara a ca- produto deira de rodas para a adequação inicial. Dependendo do produto e instalações disponíveis, isso pode incluir montagem e possíveis modi- ficações de produtos fornecidos por fabricantes na oficina do serviço. 6.Adequação O usuário experimenta a cadeira de rodas. Ajustes finais são feitos para garantir que a cadeira de rodas esteja adequadamente montada e preparada. Se forem necessárias modificações ou componentes de suporte postural, pode ser preciso fazer novos ajustes. 7.Treinamento de O usuário e os cuidadores são usuário treinados sobre como usar e manter a cadeira de rodas com segurança e eficácia 8.Manutenção, O serviço de cadeira de rodas oferece reparos e acom- manutenção e consertos para pro- panhamento blemas técnicos que não possam ser resolvidos na comunidade. É apro- priado realizar as atividades de acom- panhamento na comunidade tanto quanto possível. Agendamentos de acompanhamento são uma oportu- nidade para verificar a adequação da cadeira de rodas e dar mais trei- namento e suporte. O momento para isso depende das necessidades do usuário e de outros serviços que estejam disponíveis para ele. Se for verificado que a cadeira de rodas não é mais apropriada, uma nova cadeira precisa ser fornecida, começando da etapa um. Fonte: Organização Mundial de Saúde. Diretrizes para fornecimento de cadeira de rodas manual em locais com pouco recursos, Tabela 3.2. Genebra, 2008, p. 76. 596
Avaliação e prescrição de cadeira de rodas Avaliação No processo de avaliação é necessário ter o conhecimento de quem precisa de fato de uma cadeira de rodas. Uma pessoa geralmente precisa de uma cadeira de rodas se não puder andar, ou puder andar mas com dificuldade ou apenas por curtas distâncias. O processo de avaliação é necessário pois permite a obtenção de informações para auxiliar a selecionar a cadeira de rodas mais apropriada para o usuário; escolher os componentes de cadeira de rodas mais apropriado; e a descobrir qual treinamento o usuário e/ou a família precisam fazer para o melhor uso da cadeira de rodas. O espaço adequado para realizar a avaliação deve ser limpo e tranquilo, pode ser realizada na própria instituição onde o usuário realiza sua reabilitação ou em um centro que ofereça o serviço ou até mesmo em sua própria casa. Vale destacar que o profissional ou a equipe técnica que irá realizar a avaliação deve respeitar a dignidade e a privacidade do usuário, independente de seu gênero, idade, religião ou situação econômica. Caso seja necessário avaliar se tem a presença de feridas, úlceras ou qualquer outro fator que possa expor o usuário deve ser realizada em um local privado. A OMS (2008) preconiza que a avaliação seja realizada em duas partes, que são: a entrevista e a avaliação física. Entrevista A entrevista é a melhor maneira de obter informações sobre o usuário. A ficha de avaliação do usuário irá orientar a equipe técnica do serviço de cadeira de rodas para que façam as perguntas mais relevantes da avaliação. As perguntas abordarão informações sobre o usuário (Figura 3), condições físicas (Figura 4), estilo de vida e ambiente (Figura 5), e cadeiras de rodas atual (Figura 6), se for o caso. Figura 3: Informações sobre o usuário Fonte: OMS, 2012. 597
Reabilitação: teoria e prática Figura 4: Condições físicas Fonte: OMS, 2012. Figura 5: Estilo de vida e ambiente Fonte: OMS, 2012. Figura 6: Cadeira de rodas atual Fonte: OMS, 2012. 598
Avaliação e prescrição de cadeira de rodas Avaliação física A avaliação física abordará úlceras/feridas, método de impulsão e medidas. Em relação as úlceras/feridas os questionamentos giram em torno de presença, risco ou histórico, já no método de impulsão é sobre a forma como o usuário impulsiona a cadeira de rodas, e por fim a mensuração das medidas. As Figuras 7, 8 e 9 exemplificam como construir cada tópico da avaliação física. Os instrumentos para realizar a medição podem ser uma trena, paquímetros, livros para colocar na lateral do corpo do usuário e blocos para apoiar os pés (OMS, 2012). Muitos profissionais tem dúvidas ou até mesmo o desconhecimento de como fazer as medidas de um usuário para confeccionar uma cadeira de rodas, para responder tal demanda seguem algumas orientações da OMS, ilustradas no Quadro 4. Figura 7: Presença, risco ou histórico de úlceras/ feridas Fonte: OMS, 2012. Figura 8: Método de Impulsão Fonte: OMS, 2012. 599
Reabilitação: teoria e prática Figura 9: Medidas Fonte: OMS, 2012. Quadro 4: Orientações para mensuração das medidas do corpo para a confecção de uma cadeira de rodas A Verifique se não há nada nos bolsos do usuário antes de medir. Meça quadris ou a parte mais larga das coxas. Segure duas pranchetas/livros nas laterais do usuário para ajudar a obter as medi- das corretas B Coloque uma prancheta/livro nas costas do usuário para ajudar a obter uma medida correta. Meça da parte traseira da pelve até atrás do joelho em uma linha reta. Sempre meça as duas pernas. Se houver uma diferença entre as pernas, verifique se o usuário está sentado ereto com a pelve nivelada. Se ainda houver diferença, faça a prescrição da cadeira de rodas segundo o lado mais curto. C Meça da parte de trás do joelho até a base do calcanhar. Assegure-se de que os tornozelos do usuário estejam em um ângulo de 90 graus (se possível). Sempre meça as duas pernas. O usuário deve estar com os sapatos que usa com maior frequência (se houver). D Meça do assento até a última costela. Para ajudar a encontrar a última costela, coloque as mãos de ambos os lados da pelve. Aperte ligeiramente as mãos para dentro e deslize-as para cima. A última costela é logo acima da cintura. E Meça do assento até o ângulo inferior da escápula em uma linha vertical. Para ajudar a encontrar o ângulo inferior da escápula, peça que o usuário encolha os ombros. Fonte: OMS, 2012. 600
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